ofício: farpa: afonso tostes: floresta d’água: pompeia 7 de maio a 18 de agosto de 2019
© JULAY BARRETTI
ofĂcios compartilhados
Idealizadas por Lina Bo Bardi como espaço de democratização dos fazeres artísticos e manuais, as Oficinas de Criatividade do Sesc Pompeia fomentam iniciativas de ensino/ aprendizagem desde a década de 1980, período de sua abertura para o público. O incentivo à prática criativa, ao possibilitar sua apropriação pelos diversos segmentos sociais, reforça e distribui as potencialidades da invenção em arte e no campo das manualidades, contribuindo com o processo de construção da cidadania cultural. Este é o lastro do projeto Ofício, que ora se inicia. Periodicamente, artistas serão convidados a desenvolver trabalhos inéditos, concebendo-os especificamente para o contexto das Oficinas. Com tais intervenções, procura-se explorar os elementos estruturais dos ofícios artísticos e artesanais, cotidianamente investigados e testados nos ateliês. Inaugural, a presente edição elege a madeira como base de processos contemporâneos em artes visuais. Ofício: farpa corresponde ao capítulo inicial da série, aludindo ao que sobra nas mãos do artista quando ele encerra sua rotina de trabalho. Afonso Tostes é o primeiro convidado da sequência vindoura. Sua Floresta d’Água lança mão de expedientes da marcenaria para constituir um conjunto de instalações que combinam elementos oriundos de ambientes naturais, recolhidos pelo artista durante suas viagens de pesquisa. Acolher o trabalho de Tostes representa, para o Sesc, a oportunidade de povoar e afetar as Oficinas de Criatividade com exemplares de uma trajetória artística que já dura três décadas. Realizar o projeto Ofício num lugar historicamente consagrado ao compartilhamento do fazer criativo significa reiterar a relevância da cultura artística, tanto do ponto de vista da fruição como da produção, postulando-a como dimensão fundamental da vida – na medida em que favorece a produção de novos sentidos para a existência. Acompanhar os caminhos percorridos pelos artistas permite-nos compreender algo da gênese da criação, entendida como capacidade inerente a todos. SESC SÃO PAULO
afonso tostes: entre รกguas e florestas
A exposição Floresta d’Água explora elementos fundamentais para o ciclo da vida, como a água, a flora, a terra, o ar, a luz e a espiritualidade. A mostra tem seu início ontológico a partir de pequenas sementes lançadas em terrenos férteis. Elas, ao receberem água e luz, germinaram e cresceram até se tornarem árvores de folhas verdes, produtoras de oxigênio, geradoras – ou não – de frutos. Por algum motivo, natural ou provocado, tais árvores tombaram na terra, retornando para onde um dia nasceram. Esse foi o primeiro ciclo expositivo de boa parte das obras presentes na exposição. Num segundo ciclo, após terem se tornado apenas madeira, e terem sido manufaturadas ou abandonadas, a ação do artista, escultor-artesão, reativa a energia vital dessas árvores, que renascem como obras de arte. O escultor Rodin comentava: “A arte é a contemplação; é o prazer do espírito que penetra a natureza e descobre que a natureza também tem alma”. Troncos secos, madeiras de demolição, remos, cordas, águas doce e salgada, correntes, pedras, barro, cobre, cromo. Um amálgama de materiais poveri e nobres, e de materiais oriundos da natureza, que carregam estéticas e histórias de nossa miscigenada cultura. Afonso Tostes adentra os elementos naturais e objetos apropriados, ao mesmo tempo de forma brutal e sutil, como quem um dia sai para caçar e no outro dia se recolhe para construir. Um artista viajante, que se desloca, troca e recolhe, e também um escultor que lapida incansavelmente formas carregadas de signos. A exposição Floresta d’Água se apresenta de maneira orgânica pelos corredores e em diálogo direto com a arquitetura do galpão das oficinas do Sesc Pompeia. O título da mostra faz referência direta aos ambientes de origem da maioria dos elementos e objetos que compõem as obras A escultura Igbo (2019), formada expostas. por três grandes pedaços de troncos empilhados de maneira
irregular, sustentados por outras esculturas, desloca o visitante para outro espaço e tempo. O impacto visual causado pela grande escala da obra é ampliado pela relação inerente de sua coluna natural com a estrutura amadeirada do telhado do edifício. As instalações Deitadas (2019) e Linha do Tempo (2019), criadas especialmente para ocupar os corredores laterais do edifício, representam respectivamente, de modo metafórico, a floresta e o rio, ambientes de trabalho do artista. Deitadas emana a mesma força crua de Igbo, provinda da relação entre os seres humanos e a floresta. A instalação é composta de uma enorme árvore, que se encontrava estendida em repouso terminal na mata e foi reanimada pela intervenção, quase cirúrgica, realizada pelo artista. Cortada ao meio e cuidadosamente separada, criou-se um espaço vazio entre suas partes. O espaço foi então preenchido por uma conexão escultórica, que liga o aqui e o agora a tempos passados, quando ainda era natureza, e a tempos futuros, em seu devir como obra de arte. Linha do Tempo, por sua vez, retrata o percurso que o artista realizou pelas águas brasileiras em busca de remos de madeira utilizados por embarcações de diferentes regiões. Dois deles, um cromado e outro apenas esculpido, em conjunto com pedaços de cordas amarradas, estruturam a aparente instabilidade da obra. Além dos remos e cordas, outros achados recolhidos pelo caminho compõem a instalação, que resgata não apenas os objetos mas também as lembranças de outras realidades a que eles pertenceram. Linha do Tempo aponta para uma fragilidade, quase líquida e permeável, que se reflete na sociedade contemporânea, incluindo a brasileira. Varais com desenhos, em pequenos formatos, de elementos que evocam o universo “floresta-rio”, como folhas, flores, frutos e galhos, ocupam o corredor central, pendurados assim, “entre a floresta e o rio”, aqui representados pelas instalações montadas nos cor-
redores laterais. São partes reconstruídas com o sutil traço do artista em folhas de papel apropriadas de distintas publicações, e que revelam presenças ocultadas pelo longo trajeto metafísico entre o meio de vida natural, o humano e o artístico das obras. Uma série de esculturas compostas da união desses elementos colhidos e ressignificados pelo artista completa a exposição. Os mesmos troncos e remos utilizados nas outras instalações foram formalizados aqui com um grande rigor escultórico, alguns inclusive fundidos e cromados posteriormente. Formas realizadas com instrumentos e materiais tradicionais, como a serra, o formão, a plaina e o barro, se unem a outras, algumas modeladas diretamente com a serra elétrica, que deixou então de ser vilã para se tornar a protagonista de uma transformação positiva. O gesto escultórico de Afonso Tostes, herdado de grandes mestres da arte, é potencializado pela intensa vivência do artista com culturas tradicionais brasileiras. Um contexto que se apresenta de forma subliminar em sua produção, mas que fica evidente para aqueles que se deixam envolver por meio da livre contemplação e penetram na alma de sua criação. DANIEL RANGEL: CURADOR
Linha do Tempo (2019) retrata o percurso que o artista realizou pelas águas brasileiras em busca de remos de madeira utilizados por embarcações de diferentes regiões. Dois deles, um cromado e outro apenas esculpido, em conjunto com pedaços de cordas amarradas, estruturam a aparente instabilidade da obra. Além dos remos e cordas, outros achados recolhidos pelo caminho compõem a instalação, que resgata não apenas os objetos mas também as lembranças de outras realidades a que eles pertenceram. Linha do Tempo aponta para uma fragilidade, quase líquida e permeável, que se reflete na sociedade contemporânea, incluindo a brasileira.
© LEANDRO CUNHA
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A escultura Igbo (2019), formada por três grandes pedaços de troncos empilhados de maneira irregular, sustentados por outras esculturas, desloca o visitante para outro espaço e tempo. O impacto visual causado pela grande escala da obra é ampliado pela relação inerente de sua coluna natural com a estrutura amadeirada do telhado do edifício.
Deitadas (2019) emana a mesma força crua de Igbo (2019), provinda da relação entre os seres humanos e a floresta. A instalação é composta de uma enorme árvore, que se encontrava estendida em repouso terminal na mata e foi reanimada pela intervenção, quase cirúrgica, realizada pelo artista. Cortada ao meio e cuidadosamente separada, criou-se um espaço vazio entre suas partes. O espaço foi então preenchido por uma conexão escultórica, que liga o aqui e o agora a tempos passados, quando ainda era natureza, e a tempos futuros, em seu devir como obra de arte.
© LEANDRO CUNHA © LEANDRO CUNHA
Varais com desenhos, em pequenos formatos, de elementos que evocam o universo “floresta-rio”, como folhas, flores, frutos e galhos, ocupam o corredor central, pendurados assim, “entre a floresta e o rio”, aqui representados pelas instalações montadas nos corredores laterais. São partes reconstruídas com o sutil traço do artista em folhas de papel apropriadas de distintas publicações, e que revelam presenças ocultadas pelo longo trajeto metafísico entre o meio de vida natural, o humano e o artístico das obras.
SESC – SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO Administração Regional no Estado de São Paulo Presidente do Conselho Regional ABRAM SZAJMAN Diretor do Departamento Regional DANILO SANTOS DE MIRANDA Superintendentes Técnico-social JOEL NAIMAYER PADULA Comunicação Social IVAN GIANNINI Administração LUIZ DEOCLÉCIO M. GALINA Assessoria Técnica e de Planejamento SÉRGIO JOSÉ BATTISTELLI Gerentes Artes Visuais e Tecnologia JULIANA BRAGA DE MATTOS Estudos e Desenvolvimento MARTA RAQUEL COLABONE Artes Gráficas HÉLCIO MAGALHÃES Sesc Pompeia MONICA CARNIETO Equipe Sesc ALCIMAR FRAZÃO, BARBARA RODRIGUES, DIOGO DE MORAES, GABRIELA BORSOI, HUGO CABRAL CARNEIRO, IAN HERMAN, IGOR CRUZ, ILONA HERTEL, JOÃO VICTOR GUERRERO, JOSÉ RENATO ALEGRETI DIAS, KARINA MUSUMECI, LEONARDO BORGES, LESLIE ROBERTA BALHE, LIZANDRA MAGALHÃES, NILVA LUZ, PAULO DELGADO, RAFAEL DELLA GATTA, RAQUEL LOPES PY, SÉRGIO PINTO, SILVIO BASILIO, SUELLEN BARBOSA, VICTOR BUCK
ofício: farpa: afonso tostes: floresta d’água: pompeia Curadoria DANIEL RANGEL Coordenação geral TÊRA QUEIROZ Produção executiva N+1 ARTE CULTURA Coordenação de produção BIANCA VOLPI Assistente de produção BRENO DE FARIA Identidade visual e projeto gráfico JÚLIA MASAGÃO e ELISA VON RANDOW Assistente de design gráfico BEATRIZ DOREA Arquitetura/Suportes de sinalização NADEZHDA MENDES DA ROCHA Projeto luminotécnico CHARLY HO Assistentes de artista SILVIO DE CAMILLIS BORGES, ODARAYA MELLO, ZAGATTI e RICARDO IANUSI Coordenação de montagem AFONSO TOSTES Equipe de montagem SILVIO DE CAMILLIS BORGES, ODARAYA MELLO e ZAGATTI Consultoria técnica FERNANDO OGANGO e RAFAEL GOMES Consultoria Ambiental CIRO GUILHERME GENTIL CROCE Registro Fotográfico ADERBAL ASHOGUN, LEANDRO CUNHA e ODARAYA MELLO Coordenação educativa CINTIA MASIL Performances ADERBAL ASHOGUN (Treme Terra) e AFOXÉ OGUM PÁ Assessoria de imprensa SOFIA CARVALHOSA COMUNICAÇÃO Revisão de texto ANA ROMAN, JULIANA ANTUNES e PAULO KAISER Fotografia da Oficina de Marcenaria JULAY BARRETTI Fotografia obra Ana Mazzei EVERTON BALLARDIN Agradecimentos ILÊ OMIOJUARO, MALU GALLI e FAZENDA SANTA ADELAIDE (JOÃO AUGUSTO PEREIRA DE QUEIROZ, ISABEL PEREIRA DE QUEIROZ, MAUCHA PEREIRA DE QUEIROZ E TODA A EQUIPE DA FAZENDA) Os troncos utilizados nesta exposição foram árvores que caíram por causas naturais, reaproveitados pelo artista.
© EVERTON BALLARDIN
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ofício: farpa: ana mazzei: pompeia
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