Aline Bei Poesia, dramaturgia e oralidade na obra da escritora
Aziz Ab’Saber 100 anos do geógrafo que decifrou os biomas do país
Engajamento verde
A mobilização dos jovens em defesa do meio ambiente
Os Satyros, 35 anos Galeria de imagens conta a história do grupo teatral
O projeto celebra a criatividade de jovens e incentiva a expansão de suas fronteiras geográficas e culturais, promovendo criações e destacando talentos que se apresentam pela primeira vez.
São mais de 50 atrações gratuitas em 24 unidades do Sesc São Paulo, entre cursos, oficinas, apresentações, feiras e debates.
De 1 a 31 de outubro
14 BIS • 24 DE MAIO • BELENZINHO • BOM RETIRO • CAMPINAS • CAMPO LIMPO
CINESESC • CONSOLAÇÃO • CENTRO DE PESQUISA E FORMAÇÃO • GUARULHOS
RIBEIRÃO PRETO • RIO PRETO • SANTO AMARO • SANTO ANDRÉ • SÃO CARLOS
TAUBATÉ • THERMAS DE PRESIDENTE PRUDENTE
Saiba mais em: sescsp.org.br/arteterritorio
CAPA: Detalhe da instalação Imaterialidade (2015), do artista plástico Carlito Carvalhosa (1961-2021), feita com copos transparentes e lâmpadas fluorescentes. A obra foi apresentada pela primeira vez na exposição coletiva de mesmo nome, realizada no Sesc Belenzinho, e a partir de 8/10 integrará a exposição A natureza das coisas – Carlito Carvalhosa, no Sesc Pompeia. A mostra é a primeira retrospectiva de instalações do artista, com curadoria de Luís Pérez-Oramas e Daniel Rangel, sob assistência e pesquisa de Lúcia Stumpf, em colaboração com o Acervo Carlito Carvalhosa.
Crédito: Everton Ballardin
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Protagonismo do setor de comércio e serviços
APP Sesc São Paulo para tablets e celulares
Legendas Acessibilidade
Em estabelecimentos de uso coletivo é assegurado o acompanhamento de cão-guia. As unidades do Sesc estão preparadas para receber todos os públicos.
O setor de comércio e serviços desempenha papel central na criação de empregos e na economia brasileira. Aproximadamente 70% do PIB – Produto Interno Bruto do Brasil – é gerado por esse segmento. Milhões de trabalhadores atuam em diversas áreas, oferecendo produtos essenciais para o bem-estar e prestando serviços fundamentais para a vida contemporânea nas cidades.
Neste mês de outubro, em que o Dia do Comerciário é celebrado, no dia 30, o Sesc ressalta a relevância do setor e reforça sua missão de promover o bem-estar dos trabalhadores, de suas famílias e da sociedade em geral.
Fundada em 1946 por iniciativa dos empresários, a entidade realiza uma ação educativa contínua nas áreas da cultura, esporte, lazer, turismo, saúde e alimentação, promovendo encontros, valorizando conhecimentos diversos e incentivando o desenvolvimento interpessoal.
Ao investir tempo e recursos nessa ação duradoura, os empresários de comércio e serviços renovam o compromisso assumido há 78 anos, colaborando ativamente para melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores e para o desenvolvimento da sociedade.
Abram Szajman Presidente do Conselho Regional do Sesc no Estado de São Paulo
Juventudes e a questão ambiental
A postura questionadora, inquieta e transformadora costuma ser atribuída como um marco das juventudes. A essa fase da vida estão relacionadas descobertas e escolhas que vão pautar os caminhos na maturidade, assim como a contestação de modelos consolidados, mas que precisam ser revistos diante dos novos desafios. É essa a pulsação que gera mudanças e permite que a sociedade reflita sobre seus paradigmas e realize alterações de rotas, quando necessário.
O tema da crise climática e as questões ambientais têm ocupado um lugar central no cenário contemporâneo, chamando a atenção, também, das parcelas mais jovens da população. Assim, é crescente a mobilização em torno da reflexão e do protagonismo em busca de soluções para mitigar as consequências das mudanças climáticas, como aborda reportagem deste mês da Revista E
Não se trata mais da projeção de um futuro ameaçado, mas de uma realidade que já afeta o cotidiano no tempo presente. Diante dessa desafiadora condição – e tomados pelo senso de coletividade e de urgência – esses jovens assumem o protagonismo de alertar e de promover transformação, utilizando dos meios digitais e das tecnologias para atrair outros jovens e fazer essa corrente crescer.
Boa leitura!
Luiz Deoclecio Massaro Galina Diretor do Sesc São Paulo
SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO – SESC
Administração Regional no Estado de São Paulo Av. Álvaro Ramos, 991 – Belenzinho
CONSELHO REGIONAL DO SESC EM SÃO PAULO
Presidente: Abram Abe Szajman
Diretor do Departamento Regional: Luiz Deoclecio Massaro Galina
Efetivos: Arnaldo Odlevati Junior, Benedito Toso de Arruda, Dan Guinsburg, Jair Francisco Mafra, José de Sousa Lima, José Maria de Faria, José Roberto Pena, Manuel Henrique Farias Ramos, Marcus Alves de Mello, Milton Zamora, Paulo Cesar Garcia Lopes, Paulo João de Oliveira Alonso, Paulo Roberto Gullo, Rafik Hussein Saab, Reinaldo Pedro Correa, Rosana Aparecida da Silva, Valterli Martinez, Vanderlei Barbosa dos Santos.
Suplentes: Aguinaldo Rodrigues da Silva, Antonio Cozzi Junior, Antonio Di Girolamo, Antônio Fojo Costa, Antonio Geraldo Giannini, Célio Simões Cerri, Cláudio Barnabé Cajado, Costabile Matarazzo Junior, Edison Severo Maltoni, Omar Abdul Assaf, Sérgio Vanderlei da Silva, Vilter Croqui Marcondes, Vitor Fernandes, William Pedro Luz.
Adauto Perin, Airá Fuentes Tacca, Alan Dias Fernandes, Alexsandra Xavier do Egito Costa, Aline Carvalho Silva, Amanda Santos Sobral, Ana Carolina Costa Simões, Ana Cristina Amaia Batista Mendes de Souza, Andre Leite Coelho, André Venancio da Silva, Andressa Kelly Ribeiro Ivo, Anna Luisa de Souza, Artur Felipe de Carvalho, Barbara Caroline da Silva Ramos de Freitas, Barbara Cristina Roncati Guirado, Barbara Duarte Camilotti, Bruna Zarnoviec Daniel, Caio Wallerstein Ferreira Gomes, Camila Oliveira da Silva, Carla Valeria Tureta, Carlos Henrique de Souza, Cinthya de Rezende Martins, Claudine Souto Marques, Corina de Assis Maria, Danilo Cava Pereira, Danny Abensur, Diego Polezel Zebele, Edmar Rodrigues de Fátima Júnior, Elmo Sellitti Rangel, Emily Fonseca de Souza, Enio Rodrigo Barbosa Silva, Fernanda Porta Nova Ferreira da Silva, Fernando Archano Brizolla Ribeiro, Flavia Teixeira Coelho, Flavio Aquistapace Martins, Francisca Meyre Martins Vitorino, Gabriela Camargo das Graças, Gabriela Zumiani Navarro, Geraldo Soares Ramos Junior, Giulia Maria de Campos Manocchi, Gleiceane Conceição Nascimento, Gloria Rodrigues Ramos, Graziela Delalibera, Henrique Vizeu Winkaler, Ivan Destro, Ivy Granata Delalibera, Jackeline Reis Ferreira Simon Costa, Jade Stella Martins, Janete Bergonci, Jean Guilherme Paz, Jefferson de Almeida Santanielo, Joana Carolina Teixeira Mota, Jose Mauricio Rodrigues Lima, Juan Victor Gonçalves, Julia Parpulov Augusto dos Santos, Juliana Neves dos Santos, Karen Cristine Pimentel dos Santos, Liliane Martins Machado, Lucidalva Teixeira de Matos, Marcel Carlos Catingueiro, Marcela Oliveira Fonseca, Marcelo Baradel, Marcelo Dias de Carvalho, Marcos Afonso Schiavon Falsier, Mariana Benatti, Mariana Lins Prado, Mariana Marquiori, Mariano Ribeiro da Silva, Marina Borges Barroso, Mauricio Lemos, Michel Enrique dos Santos, Monique Mendonça dos Santos, Patricia Rapace Russo, Rafael Lima Peixoto, Reinaldo Simon Costa, Renata Barros da Silva, Renato Shigueru Yoshinaga, Ricardo Lemos Antunes Ribeiro, Roberta Beatriz Bernardo, Roseane Silveira de Souza, Sabrina dos Santos Rodrigues, Sandra Ribeiro Alves, Silvia Cristina Garcia, Stephany Tiveron Guerra, Talita Ferreira dos Santos, Tamara Demuner, Teresa Maria da Ponte Gutierrez, Thais Cristina Kruse, Thais Ferreira Rodrigues, Thais Heinisch de Carvalho e Silva, Veronica de Lelis Alves, Viviane Machado Lemos, Vivianne de Castro, Willian Pereira de Oliveira
Coordenação-Geral: Ricardo Gentil
Coordenação-Executiva: Lígia Moreira Moreli e Silvio Basilio
Editora-Executiva: Adriana Reis Paulics • Projeto Gráfico e Diagramação: Bruno Thofer e Larissa Ohori • Edição de Textos: Adriana Reis, Guilherme Barreto, Maria Júlia Lledó e Rachel Sciré • Revisão de Textos: Pedro P. Silva • Edição de Fotografia: Adriana Vichi • Repórteres: Luna D’Alama, Manuela Ferreira, Maria Júlia Lledó, Marina Pereira, Rachel Sciré • Coordenação Editorial Revista E: Adriana Reis Paulics, Guilherme Barreto e Marina Pereira • Propaganda: Edmar Júnior, Janete Bergonci, Jefferson Santanielo, José Gonçalves Júnior • Apoio administrativo: Juliana Neves dos Santos e Talita Ferreira dos Santos • Arte de Anúncios: Nilton Andrade Bergamini, Leandro Henrique da Silva Vicente, Raphael Viana Morata Valverde, Daniele Barros dos Santos, Cesar Albornoz, Ian Herman e Humberto Vieria Mota. • Supervisão Gráfica: Rogerio Ianelli • Finalização: Bruno Thofer e Larissa Ohori • Criação Digital Revista E: Rodrigo Losano • Circulação e Distribuição: Nelson Soares da Fonseca
Jornalista responsável: Adriana Reis Paulics (MTB 37.488)
A Revista E é uma publicação do Sesc São Paulo, sob coordenação da Superintendência de Comunicação Social
Distribuição gratuita Nenhuma pessoa está autorizada a vender anúncios
Esta publicação está disponível para retirada gratuita nas unidades do Sesc São Paulo e também em versão digital, em sescsp.org.br/revistae e no aplicativo Sesc SP para tablets e celulares (Android e IOS).
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Entre os destaques de outubro, Experimenta! Comida, Saúde e Cultura promove diversas atividades voltadas à alimentação nas unidades do Sesc São Paulo
Especializado em turismo comunitário, o pesquisador catalão Ernest Cañada reflete sobre o turismo enquanto ferramenta de emancipação social
A crescente mobilização de jovens de diferentes perfis e territórios em defesa do meio ambiente
As contradições de uma metrópole como São Paulo compõem a pesquisa e criação do grupo Os Satyros, que há 35 anos leva aos palcos trabalhos autorais e provocativos
O legado do geógrafo e defensor da conservação da biodiversidade brasileira
Aziz Ab’Saber, cujas expedições permitiram um estudo minucioso das paisagens naturais do país
Poesia, contos e romances saltam dos livros para conquistar leitores em outros suportes, como as revistas literárias, expandindo a experiência da leitura
dossiê entrevista juventudes bio gráfica literatura
Adriana Vichi (Entrevista) / Pessoas perfeitas (2014, São Paulo), com Ivam Cabral. Foto: André Stefano (Gráfica)
Aline Bei, autora premiada, fala sobre influência da dramaturgia e da poesia em sua escrita
Textos assinados por Daniel Bento Teixeira e pela dupla Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva e Ana Cristina Juvenal da Cruz debatem sobre educação antirracista
Janaina Tokitaka (conto e ilustrações)
Combinando performance e diferentes sonoridades, o duo Tiquequê celebra mais de 20 anos no cenário musical infantil
Ô de casa! Conheça cinco casarões centenários abertos à visitação e que ajudam a contar a história da cidade de São Paulo
em pauta encontros
Ana Cristina Amaia Batista
Em PopFilosofia, Marcia Tiburi parte do conceito homônimo proposto por Gilles Deleuze para pensar uma fi losofi a aberta a mover-se de seu posto acadêmico, historicamente distante da vida contemporânea. Em Falsolatria, Jean Wyllys faz um depoimento-ensaio sobre um mundo povoado de fake news, onde tudo reluz e nada (ou quase nada) é ouro.
A atriz Patrícia Gonçalves no palco do Sesc Bom Retiro, durante o espetáculo G.O.L.P., uma parceria entre o Teatro Experimental do Porto, de Portugal, com o Teatro La María, do Chile. A produção foi apresentada no MIRADA – Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas, no Sesc Santos, e também circulou na Extensão MIRADA, na capital paulista, no mês passado. Com tons de absurdo, a peça reflete sobre regimes sociais em um tempo de descontentamentos. A programação da Extensão MIRADA segue neste mês, até o dia 27/10.
Terça a Sábado, das 10h às 21h
Domingos e Feriados, das 10h às 18h Grátis / Livre 8.10.24-9.2.25
Sesc Pompeia
Rua Clélia, 93 - São Paulo tel. +55 11 3871.7700 /sescpompeia sescsp.org.br
DOSSIÊ
Vivências, oficinas e outras atividades com especialistas de diversas formações na área da alimentação fazem parte da programação do Experimenta! neste mês.
De 15 a 27 de outubro, todas as unidades do Sesc no estado de São Paulo recebem atividades gratuitas como parte da programação do Experimenta!
Comida, Saúde e Cultura. Em sua oitava edição - realizada no mês do Dia Mundial da Alimentação (16/10) -, o projeto visa refletir sobre o que comemos e suas interfaces com a sociedade, a saúde, a cultura e o meio ambiente.
Segundo Mariana Meirelles Ruocco, gerente da Gerência de Alimentação e Segurança Alimentar do Sesc São Paulo, um dos objetivos do Experimenta! é fomentar o diálogo entre a área da alimentação e outros campos do conhecimento, promovendo autonomia para que cada indivíduo faça reflexões e escolhas alimentares conscientes. “As múltiplas e transversais dimensões da alimentação se interrelacionam com aspectos culturais, sociais, econômicos, ambientais e da saúde, desde as formas de produção, processamento, abastecimento,
comercialização e distribuição, até o consumo dos alimentos e a geração e destinação de resíduos.”
A programação do Experimenta! Comida, Saúde e Cultura está dividida em sete eixos temáticos: “Comer é cultura”; “A saúde está na mesa”; “Diversidade no prato: sabores da natureza”; “Aqui se planta, aqui se come”; “Se está na época, tem na feira”; “Cozinhar é preciso”; e “Conexão comida”. Na programação, feiras, vivências, oficinas, bate-papos e palestras com a participação de chefs de cozinha, nutricionistas, historiadores, produtores agrícolas e especialistas com diversas formações na área.
Além do prato
Mais de 130 ações gratuitas compõem o Experimenta! Comida, Saúde e Cultura, projeto que aborda o comer em diálogo com diferentes campos do conhecimento
Na abertura, o Sesc Pinheiros recebe, na noite de 15/10, o bate-papo Caminhos para a comida de verdade, com a participação do professor e pesquisador da Universidade de São Paulo Carlos Monteiro, coordenador geral do Guia Alimentar para a População Brasileira (Ministério da Saúde, 2014), lançado há 10 anos; o médico Chris Van Tulleken, autor do livro Gente ultraprocessada: por que comemos coisas que não são comida, e por que não conseguimos parar de comê-las (Elefante, 2024); e a chef de cozinha, apresentadora e escritora Rita Lobo.
Programação completa em sescsp.org.br/experimenta
As
múltiplas e transversais dimensões da alimentação se interrelacionam com aspectos culturais, sociais, econômicos, ambientais e da saúde
Mariana Meirelles Ruocco, gerente da Gerência de Alimentação e Segurança Alimentar do Sesc São Paulo
Mariana Rosa
VIVER NO CORRE
As reflexões do projeto AmarElo Prisma, do rapper Emicida, inspiram o espetáculo Tá pra vencer!, que entra em cartaz no Sesc Ipiranga em 18/10. A peça, idealizada por Jennifer Souza e dirigida por Naruna Costa, traz como tema as dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores periféricos. Com dramaturgia inédita de Jhonny Salaberg, a montagem também é livremente inspirada no romance O barão nas árvores (1957), de Ítalo Calvino. Emicida assina ainda
a direção musical e a trilha sonora original do espetáculo. No enredo, uma família negra e periférica se reúne para organizar uma festa surpresa em homenagem a Rafael, um membro da comunidade que conseguiu ascender socialmente. No elenco, Ailton Barros, Bibi Wine e Filipe Celestino, além de Jennifer Souza. A temporada vai até 21/11 (exceto dias 27/10 e 14/11), com sessões quintas, sextas e sábados, às 20h; domingos, às 18h. Informações em sescsp.org.br/ipiranga
Inspirada nas reflexões do projeto AmarElo Prisma, do Emicida, a peça Tá para vencer!, que também conta com direção musical e trilha sonora original do rapper, entra em cartaz neste mês no Sesc Ipiranga.
VALE A PENA OUVIR DE NOVO
Artistas contemporâneos celebram o aniversário de 50 anos de álbuns clássicos da MPB. Essa é a proposta do projeto 74/24 – Meio século de discos históricos, realizado pelo Sesc 24 de Maio. Desde setembro, a unidade no Centro de São Paulo recebe uma série de espetáculos que revisitam o repertório de importantes álbuns de 1974, imprimindo novas sonoridades a canções consagradas. Neste mês, Juliana Linhares canta O romance do pavão mysteriozo, de Ednardo (4 e 5/10); Ayrton Montarroyos interpreta o disco Elis e Tom, de Elis Regina e Tom Jobim (12 e 13/10); as Pastoras do Rosário fazem uma releitura do álbum Canta, canta, minha gente, de Martinho da Vila (19 e 20/10); e por fim, Carne Doce celebra o disco Ave Sangria, de Ave Sangria (25 e 26/10). Mais informações em sescsp.org.br/24demaio
grupo Carne Doce
O
faz uma releitura do disco Ave Sangria, de Ave Sangria, pelo projeto 74/24 – Meio século de discos históricos, realizado pelo Sesc 24 de Maio.
Gabriel Lara Arruda (Carne Doce) / Helbert Rodrigues (espetáculo Tá para vencer! )
DOSSIÊ
Carvalhosa em retrospectiva
A partir de 8/10, quem visitar o Sesc Pompeia poderá conhecer obras com tecido, madeira, cera, espelhos e som do artista plástico Carlito Carvalhosa (1961-2021). A exposição A natureza das coisas – Carlito Carvalhosa, com curadoria de Luís Pérez-Oramas e Daniel Rangel, sob assistência e pesquisa de Lúcia Stumpf, em colaboração com o Acervo Carlito Carvalhosa, é a primeira retrospectiva de instalações do artista. Até 9 de fevereiro de 2025, a exposição ocupa a Área de Convivência da unidade
na zona Oeste da cidade, reunindo os principais materiais utilizados pelo artista em seus projetos adaptados à arquitetura do espaço. A mostra contará ainda com uma área voltada ao processo criativo de Carvalhosa, a partir de projetos originais que reúnem maquetes, desenhos, anotações, fotografias, reportagens e vídeos, além do molde da obra Já estava assim quando cheguei (2006), que integra o Acervo Sesc de Artes, instalada na unidade de Guarulhos. Saiba mais em sescsp.org.br/anaturezadascoisas
A bruxa está solta!
Histórias de medo e encantamento vão assombrar o Sesc Vila Mariana, neste mês e no início de novembro, com o projeto Tétrica – do Feitiço ao Espanto, que traz programações para falar sobre o universo sombrio e mágico que envolve a literatura de fantasia, fantástica e de horror. Entre exibições de filmes, vivências, bate-papos e cursos, há atividades para todas as idades. A abertura será em 5/10, às 10h30, com "Bruxas, bruxinhas e bruxões!", mediação de leitura de histórias com seres de universos horripilantes, realizada pelo Coletivo Brotando em Mim, no Espaço de Leitura da unidade, na zona Sul de São Paulo. Outro destaque é o curso Escrevendo contos fantásticos e de horror, com o escritor, crítico literário e professor Cristhiano Aguiar, de 23/10 a 1º/11, quartas e sextas, às 10h, no Espaço de Tecnologias e Artes. Saiba mais em sescsp.org.br/vilamariana
Diretora do premiado grupo francês Théâtre du Soleil, Ariane Mnouchkine pelas lentes da cineasta Jeanne Dosse no documentário Todas por uma (na programação do SescTV), durante o processo de montagem da peça As comadres
RETRATOS FEMININOS
Estreia no SescTV, neste mês, o documentário Todas por uma, que acompanha a montagem teatral no Brasil da comédia musical As comadres, realizada pela francesa Ariane Mnouchkine, diretora do lendário Théâtre du Soleil. O filme dirigido pela cineasta Jeanne Dosse acompanha o processo de criação da peça, que reuniu 20 atrizes brasileiras, e retrata o universo
feminino e o esforço das mulheres em ressignificar estruturas dominantes da sociedade. A obra, que foi exibida na 46a. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2022, aborda também os paradigmas do trabalho coletivo. O lançamento no canal será no dia 11/10, às 22h. O filme ficará disponível sob demanda no sesctv.org.br/todasporuma
FAÇA SUA CREDENCIAL PLENA
Pessoas que trabalham ou se aposentaram em empresas do comércio de bens, serviços ou turismo podem fazer gratuitamente a Credencial Plena do Sesc e ter acesso a muitos benefícios. São aceitos registro em carteira profissional (com contrato de trabalho ativo ou suspenso), contrato de trabalho temporário, termo de estágio e de jovem aprendiz, e pessoas desempregadas dessas empresas até 24 meses.
Para fazer ou renovar a Credencial
Plena de maneira online e de onde estiver, baixe o app Credencial Sesc SP ou acesse centralrelacionamento.sescsp. org.br. Se preferir, nesses mesmos locais é possível agendar horário para ir presencialmente a uma das Unidades (compareça com a documentação necessária).
A Credencial Plena é o acesso para trabalhadores e dependentes ao uso dos serviços e programações nas Unidades do Sesc.
Acesse o texto
Tudo o que você precisa saber sobre
a Credencial Plena do Sesc
Sobre a Credencial Plena:
• É gratuita
• Tem validade de até dois anos
• Pode ser utilizada nas Unidades do Sesc em todo o Brasil
• Prioriza os acessos às atividades do Sesc
• Oferece descontos nas atividades e serviços pagos
Faça a sua Credencial Plena online!
Baixe o app Credencial Sesc SP ou acesse centralrelacionamento. sescsp.org.br
PARA FAZER OU RENOVAR A CREDENCIAL PLENA DO SESC SÃO PAULO
Ricardo Ferreira
Recalcular a rota
Especializado em turismo comunitário, pesquisador catalão Ernest Cañada defende a importância da valorização dos interesses sociais para o desenvolvimento turístico responsável e ético
POR MARIA JÚLIA LLEDÓ
Instrumento de desenvolvimento pessoal e coletivo, o turismo se reinventa com o passar da história. Diante de diferentes contextos culturais, políticos, econômicos e ambientais, assume diversas formas para atender aos desejos e necessidades de cada tempo, local e grupo social. Modalidades como o turismo comunitário, o turismo social ou o ecoturismo são exemplos de iniciativas que buscam oferecer uma experiência turística respeitosa e consciente tanto para quem visita quanto para quem recebe.
Segundo o artigo primeiro do Código de Ética Mundial do Turismo, do qual o Sesc São Paulo é signatário, “a compreensão e a promoção dos valores éticos comuns da humanidade, em um espírito de tolerância e respeito à diversidade, às crenças religiosas, filosóficas e morais são, ao mesmo tempo, fundamento e consequência de um turismo responsável”.
Esse é o campo de atuação do catalão Ernest Cañada. Doutor em geografia e integrante do Alba Sud, centro de pesquisa especializado em turismo responsável (do qual é membro fundador), Cañada dedica-se a pesquisas e ações propositivas neste setor, especialmente na Espanha e América Latina. Entre idas e vindas ao Brasil, esteve no litoral paulista, em 2022, para a produção de um relatório
sobre a experiência do Centro de Férias do Sesc Bertioga, a partir de um olhar para o turismo social na América Latina, e em agosto passado, no Centro de Pesquisa e Formação (CPF) do Sesc São Paulo. Na ocasião, Cañada falou sobre a pesquisa Turismo comunitario urbano en Brasil: autoorganización popular ante la desigualdad y la exclusió [Turismo comunitário urbano no Brasil: auto-organização popular frente à desigualdade e exclusão], realizada junto à turismóloga Aline Bispo, com o apoio da Diputación de Barcelona [instituição do governo local que fomenta o desenvolvimento da cidade e o bem-estar dos cidadãos].
Na pesquisa, Cañada e Bispo jogam luz sobre experiências de turismo comunitário urbano no Brasil, tendo como recorte grupos de Recife, Salvador, Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. Essas iniciativas são exemplos de como organizações sociais buscam não só a geração de renda em seus territórios, mas também o sentimento de pertencimento entre os habitantes.
Nesta Entrevista, Ernest Cañada reflete sobre o caráter emancipatório do turismo, analisa as raízes do processo de turistificação em destinos como Barcelona, na Espanha – cidade que enfrentou, em julho passado, uma onda de protestos contra o turismo em massa –, além de apontar caminhos para práticas turísticas mais conscientes.
Adriana
Vichi
Apesar de distintos, ainda há confusão quanto ao conceito de turismo comunitário e turismo social. Poderia diferenciá-los?
O turismo comunitário é, fundamentalmente, um modelo de gestão. É uma forma de gerir a atividade turística baseada no objetivo de uma organização coletiva. As formas podem ser de diferentes maneiras: cooperativas, associações, grupos comuns. E esses modelos decidem como vai ser organizada a oferta. Ou seja, é a ideia da comunidade, do coletivo organizado que busca assumir as formas como se gerenciam as atividades turísticas. Já o turismo social nasce em outro contexto, como parte de políticas para tornar acessíveis atividades turísticas para diferentes grupos sociais que não conseguiriam ter acesso a elas. Isso pode ser organizado por políticas públicas do Estado, por iniciativas mistas e, em algumas ocasiões, em contato com o turismo comunitário. Ambos são conceitos que, de alguma maneira, estão buscando uma certa integração e inclusão de populações não hegemônicas e que, seja do lado da oferta ou da demanda, possibilitem o acesso às atividades turísticas. Hoje, tanto o turismo comunitário quanto o turismo social encontram-se em contextos de disputas. O turismo comunitário é, fundamentalmente, um modelo de gestão.
O que representa esse território de disputa?
Tem a ver com lógicas que mudaram a organização do turismo. Passamos de um modelo fordista a um modelo pós-fordista. Não desapareceram as formas como organizávamos aquelas férias com tudo incluído e nas quais todos faziam o mesmo roteiro. Antes, organizava-se a atividade turística, fundamentalmente, como uma atividade de grandes proporções – todo mundo tentava obter a mesma experiência. Em termos culturais, a ideia era: “Eu também fui lá”. Só que, a partir dos anos 1990, houve uma mudança e as formas de organização do turismo começaram a se fragmentar e reduzir.
Surge a ideia: “Olha para onde eu fui”. Ou seja, busca-se uma diferenciação do outro. Nesse contexto, tudo se transforma em atração turística, desde paisagens e lugares ameaçados pelas mudanças climáticas, ou mesmo lugares de pobreza. E aí, o turismo comunitário encontra-se em disputa. Porque, por um lado, o objetivo de comunidades marginalizadas e empobrecidas é ter o controle da atividade turística, mas, ao mesmo tempo, o que elas estão oferecendo passa a ser objeto de interesse de quem está de fora. Com o turismo social, acontece algo parecido. Segmentos sociais que não têm acesso à atividade turística passam a ser vistos como “nicho de mercado”. Temos a contradição: há quem olhe para o turismo social como uma oportunidade de fazer negócios, quando na verdade ele é um direito. Devemos garantir que as pessoas possam descansar, ter espaços de ócio e de tempo livre, e isso pode ser organizado de diferentes maneiras.
No caso da apropriação de um território por agentes de fora, podemos apontar como um exemplo os passeios que ainda ocorrem em comunidades do Rio de Janeiro?
coletiva.
Eu acredito que o turismo urbano comunitário está em permanente tensão entre a intenção de gerar uma economia local, de melhorar as condições de vida e de revalorizar espaços e territórios para que se livrem de um estigma e, ao mesmo tempo, a intenção de apropriação dessas atividades e desses espaços para o lucro privado. Acredito que o fundamental para organizar isso, em um sentido ético, tem a ver primeiro com quem organiza. Quem tem o controle da atividade turística? São agentes de fora da comunidade ou é a comunidade organizada que desenvolve e cria as normas do que oferece, do que se pode ou não fazer ali? Por exemplo: o turista pode ter uma ideia de perigo, de risco, porém, ele pode sair deste território percebendo a capacidade da comunidade de se organizar, de transformar seu espaço, de oferecer uma gastronomia popular bastante rica etc. Quer dizer, ele pode vir com uma certa ideia e sair com outra. Creio
Podemos
pensar e organizar o turismo em
função das necessidades da maioria da população, com objetivos de emancipação social
que isso é parte do processo e que é fundamental tirar do espaço esses atores externos que tentam utilizar as favelas ou os bairros populares como se fossem um "safári". É preciso reorganizar esses territórios a partir da reapropriação feita pela própria população, com base em como ela quer ser vista e representada.
Quais aspectos foram observados nas iniciativas de turismo comunitário urbano, que compõem a pesquisa Turismo comunitario urbano en Brasil: autoorganización popular ante la desigualdad y la exclusión?
A pergunta que fazíamos, Aline Bispo e eu, tinha a ver com o que estávamos percebendo: o turismo comunitário urbano estava crescendo em muitos lugares da América Latina. Vimos experiências na Argentina, Colômbia, Brasil, e nos demos conta de que, até agora, havíamos estudado o turismo comunitário como uma realidade do mundo rural. No entanto, o que estávamos vendo é que nas grandes metrópoles estavam aparecendo formas de organização de turismo comunitário. Então, nossa pesquisa procurou saber como essas atividades eram organizadas. Partimos de três perguntas: qual era a motivação para organizar essa atividade? Por meio de quais estruturas ela era realizada? Qual era o papel do turismo nessas comunidades? Partimos de uma hipótese, provavelmente ingênua, que se tratava de pensar que, de alguma maneira, o turismo comunitário
urbano havia nascido como uma resposta ante o mal-estar que provocavam esses "safáris", e que havia uma certa ideia de que a comunidade reivindicava: “Não quero ser vista dessa maneira”. Com a pesquisa, nos demos conta de que as motivações iam muito além, eram mais complexas e ricas.
E quais eram as motivações dessas organizações sociais?
Nós visitamos oito experiências em cinco cidades: São Paulo (SP), Brasília (DF), Rio de Janeiro (RJ), Recife (PE) e Salvador (BA). Trabalhamos por um ano nessa investigação. O que percebemos, e acredito que foi o principal, é que entre as motivações há uma pluralidade de objetivos, ainda que esteja presente uma certa rejeição a formas externas de organização do turismo, sobretudo, nas favelas. Em primeiro lugar, está a busca de uma economia local: busca-se gerar renda para a comunidade sem que ela precise sair do território, ou seja, há uma dinamização da economia. Outra motivação está relacionada à manutenção das organizações populares – o turismo poderia ser não apenas um mecanismo para manutenção das famílias, mas também para gerar recursos à gestão das atividades das organizações sociais. Também encontramos respostas pelas quais não esperávamos. Por meio do turismo, a comunidade decide mostrar-se e, assim, construir alianças com pessoas de outros lugares. Num contexto de muita desigualdade, exclusão e violência, isso move a busca por alianças e, de alguma forma, a criação de uma espécie de “cordão de segurança” que, por sua vez, está associado a uma cultura de paz. Também está entre as motivações a vontade de derrubar certos estigmas. Há lugares onde as pessoas não conseguem trabalho porque quando lhe perguntam o endereço, elas são associadas ao perigo e à insegurança de onde vivem. A ideia é reverter isso e converter o território em um lugar de orgulho local e de pertencimento. Acredito que o turismo e as motivações do turismo comunitário urbano que podemos encontrar em diferentes cidades do Brasil respondam a essa complexidade de motivações.
Que reflexões se somaram à pesquisa com a inclusão da Comunidade Cultural Quilombaque, no bairro do Perus, zona noroeste da cidade de São Paulo? Trabalhamos com os membros da Quilombaque, uma experiência que nasce fundamentalmente desse desejo de sair do estigma de bairro-dormitório, e de uma vontade de alavancar uma economia local, além de fomentar atividades culturais e gerar um sentimento de pertencimento e orgulho. Acredito que esse seja um dos casos que mostra essa capacidade e potência da
entrevista
organização popular, e do uso de diferentes linguagens artísticas como forma de reivindicação popular e de demonstração de orgulho. Esse tipo de organização é parte de outras organizações. Ou seja, a atividade turística é parte de um conjunto. De alguma maneira, o turismo não nasce sozinho, mas nasce a partir de contextos nos quais há altos níveis de organização social e, ao final, o turismo é um complemento dos múltiplos outros que existem. A base dessas experiências é a potência da organização popular e de que maneira essa organização utiliza o turismo como uma ferramenta a serviço de diferentes objetivos. Acredito que essa seja a chave no caso da Quilombaque. O que estamos vendo é que primeiro essa potência de organizações sociais nasce e, então, nasce a atividade turística.
Isso também pode ser constatado em outras iniciativas de turismo comunitário urbano?
A lógica é essa: partimos da organização popular para resolver, primeiro, problemas imediatos da vida cotidiana – moradia, ruas, segurança, arte e cultura. Então, em algum momento, identifica-se o turismo como um possível instrumento a serviço desse desenvolvimento de caráter popular. Também se trata de promover identidade em torno do desenvolvimento urbano que está sendo gerado. Ou seja, é um caminho inverso do que algumas agências de turismo fazem quando querem mostrar esses bairros como se fossem algo “exótico”, na lógica de satisfazer a curiosidade dos turistas de fora. Outro aspecto importante que o turismo comunitário urbano me mostra no Brasil é que ele também passa a ser presente para parte da população local que não conhece esses lugares e que desejaria conhecer. Então, há um vínculo com o turismo doméstico, o turismo nacional, o turismo de proximidade, que também são muito importantes.
Recentemente, protestos foram realizados em Barcelona, sua cidade natal, contra o tipo de turismo praticado por lá. Quais as motivações desses protestos?
Barcelona tem uma população de um milhão e 600 mil pessoas e recebia, antes da pandemia da Covid-19, 28 milhões de turistas [por ano]. Assim como em Barcelona, em Maiorca e outras cidades da Espanha, esses protestos surgem acompanhados por grandes problemas. Há o deslocamento da maioria da população, uma vez que o turismo provocou aumento de aluguel e compra de residências; aumento do custo de vida; problemas de transporte, principalmente em lugares que conectam os espaços turísticos, mas onde também
Teresa Mendoça
Ernest Cañada, acompanhado da guia de turismo local Salete Martins, na comunidade Santa Marta, no Rio de Janeiro, para a pesquisa Turismo comunitario urbano en Brasil, realizada em 2023.
vivem moradores; e o fechamento do comércio de bairro. Além disso, o emprego no turismo é precarizado. Então, temos essa contradição. A partir de 2008, começa a crescer a atividade turística. Houve, então, uma expansão em termos quantitativos e qualitativos. Em 2014, começamos a ver os primeiros efeitos dessa dinâmica de turistificação, e isso gerou um primeiro ciclo de protestos na Espanha. Em 2020, temos a pandemia de Covid-19, um momento em que o turismo desaparece e nos mostra, com toda crueza, sua vulnerabilidade. Vemos aí o problema do emprego, mas ao mesmo tempo, a sociedade descobre o que é viver em uma cidade sem turismo. Depois da pandemia, o turismo reage com muita pressão e força. No entanto, é preciso levar em consideração uma crise climática de grandes consequências, uma crise energética, tensões geopolíticas cada vez maiores, porém nenhum investimento numa transição socioecológica justa para garantir tempo livre, férias, espaços de ócio para a maioria da população.
É nesse cenário que emerge o conceito de “turismofobia”? O que está por trás dessa ideia?
Nas raízes dos protestos contra as dinâmicas da lógica da turistificação, há um conceito que não é teórico nem acadêmico: “turismofobia”. Essa ideia é usada para identificar os mobilizadores de protestos sociais. Como se suas ações fossem algo irracional e sem sentido, deslegitimando-as. Em cidades como Barcelona e Palma de Maiorca esse processo de especialização em atividades turísticas está gerando problemas sociais muito graves em relação à moradia, ao transporte, à vida cotidiana.
E os protestos não estão dirigidos aos turistas. Nesse processo aparece outro conceito que, de alguma maneira, é contraditório: “o turismo massivo”. Mas o problema não é esse tipo de turismo; o problema é a turistificação, que trata de envolver todo um território a serviço do setor turístico. Essa turistificação pode ser um turismo de
Devemos garantir que as pessoas possam descansar, ter espaços de ócio e de tempo livre e isso pode ser organizado de diferentes maneiras
massas ou um turismo de elites, para poucos. Precisamos aprender com outros países como desenvolver políticas de turismo social muito mais fortes e pensadas para a maioria da população. Não é possível que só possamos pensar a atividade turística sob uma única lógica. Acredito que podemos pensar e organizar o turismo em função das necessidades da maioria da população, com objetivos de emancipação social.
Fale um pouco de sua próxima pesquisa, que relaciona turismo a movimentos sociais de luta pela memória e contra a impunidade. O Alba Sud está trabalhando, há algum tempo, em uma pesquisa entre Espanha e América Latina, que partiu da demanda de um movimento de memória na Espanha que estava organizando rotas nas montanhas que percorriam as lembranças da guerrilha antifranquista, durante a ditadura na Espanha (1939 a 1975). Chegamos à conclusão de que em muitos desses movimentos e espaços de memória contra a impunidade e a violação dos direitos humanos durante as ditaduras, o turismo estava presente. Em alguns casos, esses movimentos se aproximaram do turismo como uma forma de chegar a mais setores sociais. Em outros, já havia lugares de memória, recebiam turistas, mas não sabiam exatamente
como se relacionar com o público. Percebemos que esse é um debate que precisava ser abordado. O que estamos trabalhando nesta nova pesquisa é a sistematização de experiências na Espanha e na América Latina, tentando entender como estão sendo produzidas essas relações visando fortalecer a lógica de que, por meio do turismo, podemos atingir vários objetivos associados à emancipação e às necessidades humanas. Em alguns casos, satisfazer a necessidade de descanso, de ócio, de saúde, mas em outros casos, o turismo pode estar associado a um caráter cultural, de memória. O turismo é uma ferramenta que podemos utilizar para tudo isso.
Assista a trechos da entrevista realizada com o pesquisador Ernest Cañada, realizada em agosto de 2024, no Centro de Pesquisa e Formação (CPF) do Sesc São Paulo.
juventudes
geração
Photo by IISD-ENB / Natalia Mroz
geração PLANETA
Jovens se mobilizam, questionam discursos e práticas ambientais do presente e propõem alternativas para garantir um futuro com melhores condições de vida no mundo
POR LUNA D’ALAMA
A jovem indígena Taily Terena (ao centro, em pé), de 31 anos, que participa ativamente de eventos internacionais sobre o clima desde os 16 anos, planeja estar nas discussões da COP30, em Belém (PA) no próximo ano.
Mais de 47 milhões de jovens entre 15 e 29 anos vivem hoje no Brasil, um número que corresponde a 23% da população do país, segundo o Censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A maioria dessas pessoas pertence à geração Z, ou seja, nascidos entre 1997 e 2010. Também chamada de zoomers, essa é uma geração de nativos digitais, conhecida por questionar regras e hierarquias, e com base em outros propósitos, por exemplo, mais equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Além disso, gostam de novidades, não temem mudanças e têm levantado, principalmente nas redes sociais, discussões sobre saúde mental, equidade de raça, gênero e orientação sexual, sustentabilidade e o futuro do planeta. Um dos maiores exemplos mundiais é a ativista ambiental sueca Greta Thunberg, de 21 anos. A jovem foi eleita personalidade do ano pela revista estadunidense Time, em 2019, e indicada duas vezes ao Prêmio Nobel da Paz.
Segundo Tiaraju Pablo D’Andrea, especialista em juventudes periféricas urbanas, coordenador do Centro de Estudos Periféricos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e morador do bairro de Itaquera, zona Leste de São Paulo, os jovens brasileiros, sobretudo nas periferias, têm se organizado cada vez mais politicamente, seja em movimentos sociais, de luta por moradia, em cursinhos, igrejas ou coletivos culturais (saraus, slams, grupos de teatro, hip hop, funk, samba). “São muitas reivindicações que emergiram nas últimas décadas, e tem ficado evidente a importância da organização política das juventudes por meio da
cultura”, aponta. “Além disso, as redes sociais são fundamentais para qualquer tipo de mensagem que os jovens – e qualquer outro grupo – queiram passar no mundo contemporâneo. Eles dominam o uso das ferramentas digitais, e aqueles com maior consciência ecológica e ambiental também militam por essa causa. Mas é importante observar que o terreno das redes está em disputa permanente”, complementa.
Doutor em sociologia da cultura pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de livros como A formação das sujeitas e dos sujeitos periféricos: Cultura e política na periferia de São Paulo (Dandara, 2022), D’Andrea analisa que a crise climática está cada vez mais evidente, por isso o jovem é impelido a agir. “As mudanças do clima não estão mais batendo à nossa porta. Já estão deitadas no sofá da sala, mudando o canal da TV. Esse cenário atinge, principalmente, as periferias urbanas, locais com menos áreas verdes, muito asfalto, ilhas de calor, e onde há um grande deslocamento diário da casa para o trabalho”, explica. Para o especialista, esse padrão de urbanização tem sido cada vez mais discutido e questionado por toda a sociedade. “Precisamos de mais políticas públicas, parques e espaços de lazer, porque a tragédia já está posta. A chamada de uma consciência ecológica vinda dos jovens já tem se refletido em outros grupos geracionais e em seus discursos e práticas”, avalia.
D’Andrea reforça que os problemas ambientais vêm se agravando em todo o mundo. Enquanto a Europa e países da Ásia têm sofrido com enchentes e incêndios, o Brasil enfrenta, pelo menos desde junho, queimadas (espontâneas e criminosas) em vegetações nativas de várias partes do Centro-Oeste, do Norte e do Sudeste. Em setembro, a capital paulista figurou por cinco dias
Aos 25 anos, a comunicadora e ativista climática Marcele Oliveira atua como diretora executiva do canal PerifaLAB, rede de lideranças periféricas, e como cofundadora da coalizão O Clima é de Mudança.
Arquivo pessoal
de Marcele Oliveira
seguidos em um ranking global de pior qualidade do ar, segundo a plataforma suíça IQAir. “Os incidentes climáticos, de responsabilidade humana direta ou indireta, vêm se intensificando. Em 2015, tivemos o rompimento de uma barragem em Mariana (MG), em 2019 outro rompimento em Brumadinho (MG). Mais recentemente, além das queimadas e enchentes, enfrentamos a seca dos rios na Amazônia e a alta poluição em várias cidades por conta da fumaça das queimadas. É um tema muito presente, que impacta diretamente a vida dos brasileiros”, ressalta.
Frente a esse cenário, as juventudes têm levantado bandeiras e debates sobre os cuidados do planeta nos próximos anos. “São pessoas que nasceram e cresceram com a crise climática invadindo suas mentes,
corações e construindo suas subjetividades. Elas, portanto, não veem outra saída a não ser lutar por melhores condições de vida, por seu futuro”, enfatiza.
ATIVAR MUDANÇAS
Moradora de Realengo, na zona Oeste do Rio de Janeiro (RJ), Marcele Oliveira, 25 anos, é ativista climática, comunicadora e graduada em produção cultural pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Atua como diretora executiva do canal PerifaLAB, rede de lideranças periféricas, e como cofundadora da coalizão O Clima é de Mudança, que denuncia o racismo ambiental e aborda questões de adaptação e educação climáticas. “Por meio da arte e da cultura, engajo
Diretora executiva do Instituto Periferia Sustentável e conselheira do Pacto Global da ONU, Amanda Costa participou de mesas de debate do Brazil Climate Summit, em setembro de 2023, na cidade de Nova York, Estados Unidos.
juventudes nas pautas de justiça ambiental. Os jovens brasileiros estão antenados, mobilizados, são criativos e propositores de mudanças fundamentais. Entendemos que é importante falar de territórios, defendê-los, e que o direito ao lazer e à natureza não é menos importante que à saúde e à educação”, acredita.
Em 2023, Oliveira foi representante das juventudes brasileiras em diálogo com o presidente Lula na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP28, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Em agosto deste ano, trabalhou como secretária de mobilização do grupo oficial de engajamento de juventude do G20, o Youth 20 (Y20), no Rio. A jovem entende que não basta falar nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), ou em ESG (sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança) nas empresas. “É preciso que haja uma mudança radical das relações humanas com o meio ambiente. Necessitamos de uma virada cultural, no sentido mais amplo da palavra ‘cultura’, em termos de comportamentos, crenças, valores e padrões sociais. As pautas climáticas devem, também, sair da bolha dos e das ativistas, pois seus impactos se traduzem no valor do transporte público, na forma como são realizados os grandes eventos, na nossa segurança alimentar etc.”, explica.
A jovem carioca lembra ainda que, no início deste ano, bairros do Rio como Realengo e São Gonçalo, além de cidades da Baixada Fluminense, ficaram submersos. “Muita gente perdeu tudo, inclusive a casa. Foi um cenário de tragédia. A água chegou a lugares que nunca tinha alcançado antes. Mas se isso ocorre todo ano, é preciso adaptar as cidades e educar as pessoas para viver num cenário de risco”, alerta.
Desde que ocupou a escola onde estudava no ensino médio, em 2016, Oliveira aprendeu que os jovens devem trabalhar coletivamente, se organizar e dialogar. Este ano, outra luta que abraçou rendeu frutos: o Parque Realengo Susana Naspolini foi inaugurado oficialmente. “Participei ativamente para que esse lugar se tornasse um parque urbano. Usamos o Instagram, o Tik Tok, carro de som e faixas como formas de comunicação. E, assim, conseguimos a cobertura de jornais e a realização de audiências públicas. É uma forma de diminuir o intenso calor na zona Oeste do Rio”, explica. Localizado a 15 minutos – a pé – de sua casa, o novo parque abarca áreas verdes, pista de skate, churrasqueiras e torres que tocam música.
RESISTINDO E RE-EXISTINDO
Aos 22 anos, a produtora cultural e artista Stefany de Lucas está prestes a concluir a graduação em direito na Universidade Federal do Paraná (UFPR), enquanto integra o coletivo Resistência Ativa Preta, o Fórum Paranaense de Religiões de Matrizes Africanas e, também, pesquisa relações raciais e epistemologias de terreiro. Para ela, as juventudes são muito diversas, pois abrangem uma grande faixa de idades, raças, gêneros, orientações sexuais, níveis socioeconômicos, territórios e experiências de vida. “Nossas principais preocupações se referem às possibilidades de continuarmos existindo. Resistindo e re-existindo. Estaremos vivos daqui a dez anos? E em quais condições? Por que o mundo está acabando? Será que está terminando para todos?”, questiona. Na opinião da jovem, a pandemia de Covid-19 acelerou esses questionamentos.
Segundo Stefany, que vive em Curitiba, a sustentabilidade precisa parar de ser uma pauta e virar realidade, uma preocupação que não se restrinja pontualmente ao combate às queimadas, mas que reflita, profundamente, sobre os modelos hegemônicos de agricultura e pecuária adotados no Brasil. “Toda crise climática é também social e racial. A natureza responde a recorrentes formas de opressão, é uma lei de retorno. As coisas estão insustentáveis há muito tempo. As regiões periféricas do país já sofrem com desigualdades ambientais há décadas, mas agora chegaram aos lugares ricos, à maior cidade do Brasil e da América Latina. Acredito que, se não houver democracia social, racial, de gênero e ambiental, não haverá democracia de fato. Portanto, reivindicamos questões que são bem anteriores à crise climática”, considera.
A futura advogada também diz que a geração Z precisa contradizer o que está ultrapassado. “São jovens que questionam o porquê de tudo e como fazer diferente. São aguerridos, críticos, com discursos fortes. Claro que podemos e devemos ter diálogos intergeracionais, há pessoas mais velhas que são sábias, experientes, estão no front conosco. Quem veio antes não é, necessariamente, conservador e retrógrado”, observa. Stefany de Lucas acrescenta que, de acordo com perspectivas ancestrais, o meio ambiente não é um sujeito à parte, mas uma extensão dos seres humanos, que formam um grande ente. “É por isso que todos nós estamos adoecidos, precisando repensar a existência da humanidade. Aumentamos nossa expectativa
juventudes
SÃO MUITAS REIVINDICAÇÕES QUE EMERGIRAM NAS ÚLTIMAS DÉCADAS,
E TEM FICADO EVIDENTE A IMPORTÂNCIA
DA ORGANIZAÇÃO POLÍTICA DAS
JUVENTUDES POR MEIO DA CULTURA
Tiaraju Pablo D’Andrea, coordenador do Centro de Estudos
Periféricos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
de vida, mas não a qualidade. E as comunidades tradicionais têm muito a nos ensinar sobre como viver de maneira respeitosa com a natureza, pois para essas pessoas não há divisão entre humanos, animais e vegetais. Estamos todos interligados, e todas as vidas têm o mesmo valor”, observa.
Outra voz potente em defesa do meio ambiente é Amanda Costa, diretora executiva do Instituto Periferia Sustentável, conselheira do Pacto Global da ONU e integrante da Rede Vozes Negras pelo Clima, coletivo nacional formado por 11 mulheres em defesa do meio ambiente e dos territórios. Moradora de Brasilândia, zona Norte da capital paulista, a jovem formada em relações internacionais lembra que, quando era pequena, morava em um puxadinho na casa da avó, onde a cozinha inundava sempre que chovia muito. “As mudanças climáticas são uma realidade em todo o mundo, ainda mais visível entre os empobrecidos e marginalizados. Falar desse tema, portanto, é lutar pelo meu presente, pelo meu futuro e pelo daqueles que represento”, disse a ativista em entrevista à edição de junho da Revista E.
Citada na lista Forbes Under 30 em 2020/21, a conselheira do Pacto Global da ONU destaca
que as mudanças climáticas também impactam a saúde de forma geral. “Sofremos mais com doenças respiratórias, por conta da poluição e das ondas de calor. Isso sem falar em doenças, como dengue, febre amarela e hepatite A. Além disso, muitos idosos acabam morrendo em decorrência do excesso de calor, e nos atestados de óbito são descritas outras causas”, alerta Costa que, desde 2017, roda o mundo para discutir a agenda climática global. “Não dá para enfrentar essa crise sem o protagonismo das mulheres pretas, indígenas e quilombolas. Esse é um debate decolonial, precisamos de soluções que venham da base, dos territórios, dos que sofrem os piores impactos e as consequências das mudanças do clima”, reflete.
FUTURO ANCESTRAL
Nascida e criada em Brasília, a indígena Taily Terena, de 31 anos, é ativa na luta ambientalista e hoje vive na Terra Indígena Taunay-Ipegue, a cerca de 60 quilômetros de Aquidauana (MS). “Participo de eventos desde os 16 anos e planejo estar na COP30, em Belém, em 2025”, conta. Graduada em ciências sociais pela Universidade de Brasília (UnB), Terena revela que sua comunidade e todo o entorno do
Marcele Oliveira e outros jovens comunicadores que participaram da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2023, a COP28, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
Arquivo pessoal
de Marcele Oliveira
juventudes
pantanal e do chaco boliviano têm sofrido com incêndios recorrentes, que se arrastam desde o início do inverno. “Vivemos os últimos meses com muito calor, de quase 40° C, e ar seco. O fogo chegou muito próximo da gente por causa do vento, impactou a disponibilidade de água. As cheias já deveriam ter começado nesta época, mas ainda não vieram”, detalha.
Terena acompanha questões de direitos indígenas em convenções internacionais, sobretudo temas como saúde ambiental e soberania alimentar. “A juventude da minha etnia está se organizando. Lutamos pela garantia dos nossos territórios, não apenas pela demarcação, mas também por nossa saúde e segurança. Temas que nos preocupam muito hoje são: saúde mental, condições básicas de vida, perspectivas futuras. Cuidamos muito da nossa região, mas está faltando água”, alerta. Segundo ela, os jovens indígenas têm se organizado em escolas de ensino médio nas aldeias e nas universidades, e o que mais os preocupa é a falta de responsabilização dos agentes que causam
diretamente as mudanças climáticas. “Muito se fala em adaptação, alternativas sustentáveis, transição energética. Mas ninguém trata da responsabilização efetiva dos atores envolvidos, do julgamento e da condenação pelos crimes cometidos, do quanto o agronegócio polui o meio ambiente com agrotóxicos e emissões de gases de efeito estufa”, aponta.
Taily Terena diz, ainda, que os jovens indígenas estão vivendo entre dois mundos: um tradicional, da cultura dos povos originários; e outro da sociedade urbana, capitalista, de alta competitividade. “Muitos de nós apresentam doenças físicas por conta do consumo de alimentos contaminados ou ultraprocessados, isso sem mencionar as ameaças, violências e discriminações que sofremos”, denuncia. Além disso, Terena lembra que, com a derrubada e a queimada de tantas árvores, muitas plantas medicinais acabam sendo exterminadas. “As comunidades indígenas não chegam, atualmente, a 1% da população total do Brasil, por isso precisamos de aliados. Senão, essa conta não vai fechar”, conclui.
POR MEIO DA ARTE E DA CULTURA,
ENGAJO
JUVENTUDES NAS PAUTAS DE JUSTIÇA AMBIENTAL. OS JOVENS BRASILEIROS ESTÃO
ANTENADOS, MOBILIZADOS, SÃO CRIATIVOS E PROPOSITORES DE MUDANÇAS FUNDAMENTAIS.
Marcele Oliveira, 25 anos, ativista climática e comunicadora do Rio de Janeiro (RJ)
As potencialidades dos territórios debatidas na programação do Fórum Nacional Sesc de Juventudes em 2023 seguem em pauta na edição deste ano, no Sesc Belenzinho.
para ver no sesc / juventudes
FORÇA IDENTITÁRIA E RESILIÊNCIA
De 1º a 3 de outubro, Sesc Belenzinho recebe quarta edição do Fórum Nacional Sesc de Juventudes do LABmais, com discussões sobre arte, cultura e meio ambiente
Por meio de seu Departamento Nacional, o Sesc realiza, em 18 estados do país, o Projeto Laboratório Sesc de Mídias, Tecnologias e Juventudes (LABmais), que busca promover uma aproximação com as juventudes, especialmente aquelas em situação de vulnerabilidade social, por meio da inovação e das tecnologias digitais. Com ações educativas e de transformação social, a iniciativa considera os jovens como protagonistas em processos de criação artística, mediação cultural e curadoria. Para isso, desde 2021, consolida essas experiências e apresenta seus resultados no Fórum Nacional Sesc de Juventudes do LABmais. Entre os dias 1º e 3 deste mês, o Sesc Belenzinho recebe a quarta edição do evento, que desta vez tem como tema Sustentabilidade
Criativa: Arte e Cultura como Força Identitária e Resiliência das Juventudes. A programação tem curadoria realizada de forma
participativa com as juventudes, fortalecendo a cooperação comunitária e a diversidade, e reúne painéis e oficinas culturais.
Segundo Janaina Cunha Melo, diretora de Programas Sociais do Departamento Nacional do Sesc, projetos como o LABmais fortalecem o compromisso da instituição com os jovens, valorizando o potencial dessa geração. “A iniciativa aposta no protagonismo como agente transformador, unindo criatividade, tecnologia e sustentabilidade. Temos a expectativa de que esse projeto movimente, cada vez mais, a economia da cultura, criando oportunidades de capacitação, geração de renda, reconhecimento profissional e social de adolescentes e jovens”, destaca. Além disso, acrescenta Melo, o evento reforça o compromisso da entidade ao promover a escuta ativa e o empoderamento das juventudes, permitindo que elas liderem
discussões sobre seus territórios, identidades e futuros, com base em uma visão integrada de cultura, arte e sustentabilidade, pilares da missão educativa do Sesc.
Inscrições em: sescsp.org.br/forumjuventudes
BELENZINHO
Fórum Nacional Sesc de Juventudes do LABmais Programação reúne jovens de diferentes partes do país para mesas de debate, painéis e oficinas culturais. Presenças de Amanda Costa, Stefany de Lucas, Tel Guajajara, Rose Martins, Emilly Vitória, Mila Moreira, Raelli Souza, João Victor, Nandyala Waritirre, Milena Makuxi, Rafaela Correia, Rodrigo Gabriel e Alan Avelino, dentre outros. Dias 1º, 2 e 3/10. Terça, das 17h às 22h. Quarta, das 16h às 20h30. Quinta, das 14h30 às 21h. GRÁTIS.
VISIONÁRIO DA biodiversidade
Como
o geógrafo Aziz Ab’Saber decifrou
as paisagens naturais brasileiras e lutou pela conservação dos nossos biomas
POR MANUELA FERREIRA
Florestas, montanhas, rios, vales e sertões eram mais do que paisagens naturais aos olhos do geógrafo Aziz Ab’Saber (1924-2012). Eram, também, testemunhas da história da Terra e habitat da milenar passagem humana pelo planeta. A partir dessa visão, o cientista mapeou o Brasil em profundidade, deixando um inestimável legado em diferentes campos do saber, como ecologia, geomorfologia, biologia evolutiva, fitogeografia, geologia e arqueologia.
Além de compreender as dinâmicas dos ecossistemas brasileiros pelas perspectivas acadêmica e científica, Ab’Saber foi um pensador humanista, um intelectual que também dedicou sua vida a desvendar o país em sua grandiosidade territorial, desigualdades regionais e desafios socioeconômicos. No ano em que seu centenário é celebrado, a obra de Ab’Saber segue como uma bússola na busca por soluções que possam equilibrar desenvolvimento humano e conservação dos recursos naturais.
“O trabalho do professor Aziz Ab'Saber fornece uma sólida base científica, essencial para a compreensão dos biomas brasileiros, e continua a ser uma referência importante para as discussões a respeito de conservação e planejamento. Sua abordagem multidisciplinar ajudou
a formar uma visão mais integradora e informada a respeito da relação entre espaços biodiversos, paisagens e as formas de humanidade existentes”, explica o geógrafo e pesquisador Reinaldo Corrêa Costa, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).
Para Costa, o legado de Ab’Saber, de quem foi aluno e amigo, influencia e baliza questões sobre preservação de espaços naturais no Brasil. “Ele foi um defensor da conservação ambiental e do uso responsável e ético dos recursos naturais com utilização do planejamento, e quem alertou sobre os riscos da exploração predatória e do desmatamento, especialmente na Amazônia. Destacava a importância de políticas que considerem as características naturais e culturais dos lugares, assim como as limitações dos biomas”, afirma.
VOZ DA TERRA
Outra contribuição imprescindível de Ab’Saber foram as pesquisas para a formulação de um Código da Biodiversidade, em lugar do mais recente Código Florestal (Lei 12.651/2012) — lei federal que determina a forma como a vegetação deve ser tratada no Brasil, especialmente dentro de áreas rurais privadas. Em vigor desde 2012, a lei
André Lessa / Estadão Conteúdo
Nascido em São Luiz do Paraitinga (SP), filho do comerciante libanês Nacib e da agricultora brasileira Juventina, Aziz Ab’Saber foi um defensor da democratização da ciência e da universidade pública.
Da esquerda para direita, Aziz Ab'Saber é o segundo e está ao lado de Pierre Monbeig, geógrafo francês que viveu no Brasil entre 1935 e 1946, e foi um dos principais construtores de uma geografia acadêmica moderna no país.
recebeu, à época de sua aprovação, duras críticas públicas de Ab’Saber. “O Brasil é muito mais que florestas, há várias formas de biodiversidade, para além das florestas em importância socioeconômica e cultural, por isso a necessidade de um Código da Biodiversidade. O trabalho de Ab’Saber influenciou a formulação de políticas ambientais e de conservação no Brasil e suas pesquisas forneceram fundamentos e argumentos científicos para a criação de unidades de conservação, reservas ecológicas e práticas de manejo, a partir do uso do Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) com estratégias de escalas e método, entre eles o uso das células espaciais”, explica Costa.
Ab’Saber também teve papel primordial na educação e na conscientização sobre a importância da conservação com uso do planejamento, conforme analisa o pesquisador do Inpa. “Seus estudos ajudaram a sensibilizar setores da sociedade e alguns gestores públicos para a necessidade de proteger os biomas e entender a complexidade ambiental do Brasil, utilizando a educação ambiental com o uso da escala, desde a escala doméstica, local e regional até a escala planetária”, acrescenta.
Costa considera que o mestre Ab’Saber via o Brasil como uma sociedade, sobretudo, desigual, tanto que cunhou a expressão “geografia humana sofrida”, utilizada para descrever situações de desigualdade e sistemas de exploração no Nordeste brasileiro, referindo-se à circunstância em que alguns grupos enfrentam dificuldades significativas devido a fatores políticos e econômicos que os exploram. “O professor usava esse termo para descrever como alguns contextos socioeconômicos podem atuar negativamente na vida e no desenvolvimento das pessoas e, consequentemente, do país”, diz Costa.
EDUCADOR EM ESSÊNCIA
Nascido em São Luiz do Paraitinga (SP), filho do comerciante libanês Nacib e da agricultora brasileira Juventina, Aziz Ab’Saber ingressou na Universidade de São Paulo (USP) aos 16 anos. Mais do que observar os domínios naturais geográficos, era um jovem que gostava de desenhar, por isso a escolha pela geografia. Na instituição de ensino, ele trabalhou, em um primeiro momento, como jardineiro, função que exerceu mesmo depois de se pós-graduar. Também foi contratado como prático de laboratório até defender a livre-docência em 1965. Anos mais tarde, passou a ministrar as aulas de geomorfologia na graduação e pós-graduação da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, inspirando gerações de estudantes e pesquisadores pelo vasto conhecimento e paixão pelo ofício. Ab’Saber se manteve em atividade mesmo após a aposentadoria, concentrando suas pesquisas no Instituto de Estudos Avançados (IEA-USP) e na atuação no Instituto da Cultura Árabe (ICÁrabe), entidade da qual foi presidente de honra.
Defensor da democratização da ciência e da universidade pública, era incansável, ainda, na luta pela difusão e acesso ao conhecimento científico às pessoas socialmente vulneráveis, conforme atesta o professor Vicente Lemos Alves, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Ele foi um entusiasta da abertura da universidade para os mais pobres, não somente para que os filhos de trabalhadores pudessem estudar em uma instituição pública de qualidade, mas também defendeu que a universidade se aproximasse dos movimentos sociais rurais e urbanos de distintos segmentos da sociedade organizada. Ele era um militante fervoroso do estabelecimento de diálogo com os movimentos sociais ou de iniciativas de promoção social e/ou cultural”, relata o docente.
Ele foi um defensor da conservação ambiental e do uso responsável e ético dos recursos naturais com utilização do planejamento, e quem alertou sobre os riscos da exploração predatória e do desmatamento, especialmente na Amazônia
Reinaldo Corrêa Costa, geógrafo e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa)
CIÊNCIA INTEGRADORA
Nos anos 1980 e 1990, Ab’Saber assumiu um papel pioneiro na promoção de discussões sobre a preservação ambiental no debate nacional. O geógrafo se tornou uma das primeiras figuras públicas a ser reconhecida como ambientalista no Brasil.
“Quando foi presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), de 1993 a 1995, ele promoveu ações para que pesquisadores brasileiros realizassem estudos interdisciplinares com foco na questão da preservação ambiental e para que o Estado nacional brasileiro desenvolvesse políticas de proteção às nossas riquezas naturais, em um momento em que essa questão ainda não despertava grande interesse da sociedade”, relembra Alves.
Em paralelo às salas de aula, Ab’Saber também
esteve à frente da presidência do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat). Em sua gestão, pautas associadas ao tombamento de áreas naturais ganharam amplo incentivo, com atenção especial à formação de uma equipe técnica de apoio aos estudos de tombamento. “Foi sob a influência das ideias do mestre Aziz que ocorreram avanços importantes nas discussões e efetivação de políticas de proteção ambiental no estado de São Paulo, como os tombamentos do Parque Estadual da Serra do Mar (PESM), do Parque Estadual da Serra da Cantareira e da Serra do Japi. Em todas essas iniciativas, a participação de Ab’Saber foi marcante e deixou como herança a preservação de remanescentes de Mata Atlântica”, ressalta o professor da Unicamp.
CLIMAS E FORMAS
Já o conceito de "domínios morfoclimáticos brasileiros", registrado por Ab’Saber em 1970, revolucionou o modo de compreender a paisagem brasileira e sua evolução temporal e espacial, nas palavras do professor e cientista Miguel Trefaut Rodrigues, do Instituto de Biociências da USP. “Este foi o maior avanço teórico depois dos conceitos paisagísticos de Carl Friedrich Philipp von Martius [naturalista alemão (1794-1868)], que se baseavam apenas na vegetação. Foi a partir desse conceito que se começou a pensar seriamente nas alterações dos domínios morfoclimáticos no tempo e no espaço”, detalha Rodrigues.
As conceituações de tais domínios (classificados em amazônico, caatinga, mares de morros, cerrado, araucárias e pradaria) foram fundamentais para que o zoólogo Paulo Vanzolini (1924-2013) delineasse, na mesma época, a hipótese dos refúgios paleoclimáticos, conhecida como Teoria dos Refúgios. “Ficou claro que enclaves fora dos domínios principais, como os brejos na caatinga ou as ilhas de cerrado na Amazônia, deviam-se a alterações climáticas. E isso teve um monumental impacto na conservação dessas paisagens de exceção. Ab’Saber era também um defensor fervoroso por manter intactas as planícies de inundações dos grandes rios. Se o tivéssemos escutado, as enchentes avassaladoras que vimos e testemunhamos não teriam afetado tanto a vida nas grandes cidades”, destaca o professor e cientista Miguel Trefaut Rodrigues.
Com profundo compromisso comunitário, Aziz Ab’Saber já apontava para uma solução: o trabalho em conjunto das ciências e a aproximação da sociedade da pesquisa científica para uma valorização do trabalho essencial dos cientistas. “Para que as ciências sejam úteis às sociedades, é preciso que estejam combinadas entre si. Não existe uma ciência aplicada. Existem ciências que, se combinadas, aplicam-se a descobertas novas. As ciências, no entanto, têm de dirigir-se à sociedade, à comunidade humana, e isso torna o tema mais complexo. Por isso, as ciências do homem são fundamentais em todo o corpo geral das ciências, a fim de que o progresso científico não fique por demais distanciado da realidade das comunidades humanas às quais será aplicado”, disse Ab’Saber ao médico Drauzio Varella em 2012, em uma de suas últimas entrevistas, ao médico Drauzio Varella.
Eu faço uma Geografia Humana baseada no fato de que o homem habitante está com os pés no chão e trabalha sobre um solo, sobre um espaço ecológico, e é o componente antrópico de uma paisagem Aziz Ab’Saber em entrevista a José Carlos Vilardaga e Rosana Miziara para o Museu da Pessoa, em junho de 2000
para ver no sesc / bio
PENSAMENTO EM AÇÃO
No ano do centenário de Aziz Ab’Saber, legado do cientista é celebrado em simpósio no Sesc 24 de Maio
as dinâmicas da natureza e sua relação com a sociedade em distintas áreas do conhecimento.
Programado para o dia 26 de novembro, o evento conta com colaboração e curadoria da Cátedra Edward Said de Estudos da Contemporaneidade, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e do Instituto de Cultura Árabe (ICArabe), entidade que já foi presidida por Ab’Saber.
o professor Aziz Ab’Saber participou inúmeras vezes de atividades nas unidades. “Gentil, atencioso e profundo conhecedor das paisagens e suas ocupações, certa vez, no gramado do Sesc Bertioga, ele nos disse: ‘a melhor maneira de fazer educação ambiental é estar na natureza, observá-la com atenção. Está tudo lá’”, recorda.
A programação completa será divulgada no portal do Sesc São Paulo no início de novembro.
Para homenagear os 100 anos do cientista Aziz Ab’Saber, que seriam comemorados no dia 24 deste mês, o Sesc 24 de Maio prepara um simpósio sobre a trajetória do geógrafo que, ao longo de quase sete décadas de pesquisas e docência, ressignificou
O simpósio é composto por três mesas de debate, com nomes que refletem sobre as contribuições acadêmicas e científicas, a visão ambiental, o papel de Ab’Saber como educador e sua profunda integração com a comunidade árabe-brasileira.
Denise Baena, gerente na Gerência de Educação para a Sustentabilidade e Cidadania do Sesc-SP, lembra que
24 DE MAIO
Simpósio: Expedição
Aziz Ab’Saber 100 anos 26/11. Terça, das 13h às 20h30. Teatro
Inscrições: sescsp.org.br/24demaio
Em novembro, o Sesc 24 de Maio realiza o Simpósio: Expedição Aziz Ab'Saber 100 anos, com mesas de debate sobre o legado acadêmico e científico do geógrafo.
CARTOGRAFIAS CÊNICAS
Os Satyros celebram 35 anos em cena, persistindo num trabalho autoral, provocativo e atento às contradições humanas e às questões sociais da metrópole
POR LUNA D’ALAMA
Espetáculo El truco (2007), com Ivam Cabral e elenco.
André Stefano
Eduardo Chagas na montagem de Pessoas sublimes (2016).
André Stefano
AA história da Cia. de Teatro Os Satyros está intimamente ligada à Praça Roosevelt, no Centro de São Paulo. Mas o grupo, fundado em 1989 pelo curitibano Ivam Cabral e o paulistano Rodolfo García Vázquez, teve outras sedes até se estabelecer na região. No início dos anos 1990, os dois se mudaram para a Europa e basearam a companhia em Lisboa, Portugal. Em 1997, começaram a trabalhar em Berlim, na Alemanha, empreitada que durou uma década. Também mantiveram, em paralelo, uma unidade em Curitiba, até 2010. “A gente abriu a sede na Roosevelt em 2000 e ressignificou esse espaço público com gente, toque, abraço, afeto. O Centro era um lugar deteriorado, inabitável, mas vimos ali muito potencial. Viramos uma espécie de guardiões da praça”, lembra o ator, dramaturgo, diretor e cineasta Ivam Cabral.
A partir da experiência dos Satyros, outras companhias teatrais chegaram à Roosevelt, como os Parlapatões, em 2006. O grupo também encabeçou a criação da Associação dos Artistas Amigos da Praça (Adaap) e da SP Escola de Teatro, além de ser responsável pelo renascimento do Cine Bijou, em 2022. Ao longo de 35 anos em cena, os Satyros têm impactado a região do ponto de vista artístico, pedagógico, urbanístico e social.
Entre os trabalhos mais recentes do grupo, estão
As Bruxas de Salem (2023) e A Casa de Bernarda Alba (2024), último texto escrito pelo espanhol Federico García Lorca (1898-1936). Com uma estética gótica e vários efeitos visuais, Bernarda Alba esteve em cartaz, entre julho e agosto, no Sesc 14 Bis, e até 10 de novembro será apresentada no Espaço dos Satyros, com sessões de quinta a domingo. Segundo Cabral, as mais de 140 peças já montadas pelo grupo trabalham questões como liberdade, transgressão e alteridade. “Buscamos falar e pensar sobre as possibilidades e contradições do ser humano. Propomos o difícil exercício de se colocar no lugar do outro, de sentir sua dor, de enxergá-lo de fato, para que o mundo em que esse outro vive seja visto e reconhecido. Os tabus, os diferentes e os incoerentes
fazem parte da nossa essência”, analisa Cabral, que também é diretor executivo da SP Escola de Teatro.
De acordo com o escritor e crítico literário e teatral Marcio Aquiles, que organizou o livro Os Satyros: teatricidades – experimentalismo, arte e política (Edições Sesc São Paulo, 2024) [leia mais em Teatro na cidade], o grupo tem uma estética própria, influências underground e uma radicalidade explícita, provocante. “Além disso, eles trabalham diversas linguagens, sempre com uma ótica social, sobretudo acerca de pessoas que vivem na marginalidade. Há peças trágicas, farsas, textos épicos, performáticos, commedia dell’arte, simbolismo, expressionismo, teatro digital, ciborgue, decolonial, críticas sociais alegóricas e questões de matrizes identitárias”, elenca Aquiles. Isso sem falar no braço cinematográfico do grupo, a produtora Satyros Cinema, que lançou os filmes Hipóteses para o amor e a verdade (2015) e A filosofia na alcova (2016). Aquiles acrescenta que a atuação dos Satyros se baseia num tripé de trabalho colaborativo, horizontalizado, de preocupação com processos pedagógicos e de aterramento histórico, conectada com pautas do seu tempo e da sua geografia. “Eles vivem naquele território e se apropriam dele”, pontua o crítico.
Aquiles ressalta, ainda, que o grupo paulistano é, assumidamente, influenciado pelo Teat(r)o Oficina. Mas, enquanto a trupe criada por José Celso Martinez Corrêa (1937-2023) é mais festiva, carnavalesca e dionisíaca, Os Satyros trilham um lado trágico, obscuro – com destaque para a Tetralogia Libertina, baseada na obra do Marquês de Sade (1740-1814). “O grupo tem, ainda, um lado de transformação social muito forte”, explica o autor, ao citar casos de pessoas marginalizadas do entorno, que tiveram a chance de atuar como técnicos de sonoplastia, iluminação e cenografia nas montagens dos Satyros. Entre os projetos de oficinas oferecidos pela companhia, estão o Lab (para o público em geral), o Teens (para adolescentes e jovens) e o Silenos (para pessoas idosas). “Os Satyros são um grande representante do teatro de grupo no Brasil, com muita inventividade, renovação, amadurecimento e uma voz bem autoral. Ninguém ali tem medo de ousar”, conclui.
Ivam Cabral, Helena Ignez e Gustavo Ferreira (da esquerda à direita), em Pessoas sublimes (2016).
André Stefano
Na Praça Roosevelt, a atriz Cléo De Páris encena Édipo na praça (2013).
André Stefano
Cristiano Pepi
Elenco misto do espetáculo
A Casa de Bernarda Alba (2024).
E se fez a
Justine (2009), com Diego Ribeiro (à direita).
humanidade em sete dias / Não amarás (2014), com Fernanda D’Umbra e Ivam Cabral.
Haiti somos nós (2016), com Pascoal da Conceição, Maria Casadevall e Isam Ahmad Issa (à esquerda).
Pink Star (2017) com Diego Ribeiro.
Fotos:
André Stefano
Ivam Cabral e elenco em Mississipi (2019).
André Stefano
para ver no sesc / gráfica
TEATRO NA CIDADE
Livro publicado pelas Edições Sesc São Paulo registra memórias da companhia teatral marcada pela liberdade, transgressão e alteridade
Lançado neste ano pelas Edições Sesc São Paulo, o livro Os Satyros: Teatricidades – experimentalismo, arte e política traz uma série de reflexões sobre as práticas e atividades do grupo sediado na Praça Roosevelt, no Centro de São Paulo. Organizada pelo crítico de arte Marcio Aquiles, a obra aborda o impacto dos Satyros não apenas na cena teatral, mas na vida social da metrópole. Imagens selecionadas de espetáculos e trechos de críticas jornalísticas complementam os textos de Kil Abreu, Marici Salomão, Miguel Arcanjo Prado, Guilherme Genestreti, Beth Lopes, Silas Martí e do casal estadunidense Dana e Ricky Young-Howze. Entre os temas abordados pela publicação, estão: teatro de grupo, teatro digital, cinema, dramaturgia
no Brasil, representação cênica e representatividade social, trabalhos com atores não profissionais, ações formativas e pedagógicas, além de questões urbanísticas da Praça Roosevelt.
O organizador Marcio Aquiles revela que Ivam Cabral e Rodolfo García Vázquez, fundadores dos Satyros, colecionam mais de 30 pastas com reportagens e críticas de jornais (nacionais e estrangeiros), publicadas desde 1989. Vários desses materiais foram, então, digitalizados, transcritos, traduzidos e atualizados, num processo que levou cinco anos. “E aí convidamos pessoas que têm conexão afetiva com o grupo e também são especialistas em suas respectivas áreas”, conta Aquiles.
Para Iã Paulo Ribeiro, gerente das Edições Sesc São Paulo, a publicação contempla mais de três décadas de experimentações artísticas dos Satyros. “Essa obra tem a potência de, por meio do palco, alcançar uma praça de identidades sui generis e de sociabilidades que inspiram a criação de novas e novos personagens. Tais práticas retornam ao espaço cênico sob a forma de reflexões que só um teatro essencialmente aberto ao social pode conceber”, enfatiza.
EDIÇÕES SESC SÃO PAULO
Os Satyros: teatricidades – experimentalismo, arte e política (2024)
Marcio Aquiles sescsp.org.br/edicoes
Elenco de A vida na praça Roosevelt (2005).
André Stefano
No século 19, os jornais brasileiros e a literatura caminhavam de mãos dadas nas mesmas páginas impressas.
A exemplo do Correio Mercantil, que publicou em folhetim a obra Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida (1831-1861), entre 1852 e 1853. Ainda no século 19, surgiram as primeiras revistas literárias, como a Revista Brasileira, criada pela Academia Brasileira de Letras (ABL) em 1855, na qual foi publicada a primeira versão de Memórias póstumas de Brás Cubas (1881), de Machado de Assis (1839-1908). Já no século 20, outra revista chamou a atenção de leitores em todo o país ao fazer chegar um dos mais relevantes manifestos estéticos e políticos, o Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade (1890-1954).
As páginas da Revista de Antropofagia também deram espaço a autores estreantes, entre eles, o mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), que aos 26 anos lançava sua mais famosa poesia, “No meio do caminho”, na capa de julho de 1928.
Desde então, a literatura brasileira escaparia dos livros para ganhar novos meios de difusão. Para além de bibliotecas e livrarias, contos, poemas, crônicas e outros gêneros chegariam aos leitores em revistas literárias e outras plataformas. Editor, escritor e um dos curadores do projeto Revistaria – encontro de revistas literárias brasileiras –, Pedro Spigolon explica que, depois dos anos 1920, as décadas seguintes acompanhariam uma profusão de revistas literárias, responsáveis
por promover debates, reunir críticas, abrir espaço para autores em começo de carreira, e para a publicação de textos experimentais que, dificilmente, encontrariam espaço no mercado editorial.
“Já nas décadas de 1970 e 1980, houve uma grande proliferação das revistas literárias, ultrapassando as centenas de títulos. Conhecidas como ‘imprensa nanica’, essas publicações possuíam, em geral, pequenas tiragens, mas que circulavam de mão em mão, dando a conhecer a intensa e vibrante produção literária da época. Sua importância era tamanha que Paulo Leminski (1944-1989) chegou a dizer que ‘os maiores poetas dos anos 1970 não eram gente, mas sim revistas’”, descreveu Spigolon em artigo publicado na Revista E, na edição de junho de 2021.
LITERATURA fora dos livros
Dedicadas
à discussão, reflexão e divulgação de escritores, revistas literárias atravessam décadas cativando e
ajudando a formar novas gerações de leitores
POR MARIA JÚLIA LLEDÓ
Com o avanço da internet, a partir da década de 1990, as revistas voltadas às artes, especialmente à literatura, passaram a ocupar, também, o meio digital. Desde então, a impressão e distribuição, que antes impunham elevados custos à publicação, não mais restringiriam o surgimento de novos títulos. Paralelamente, outras revistas começaram a adotar um modelo híbrido (impresso e digital). Atualmente, o número exato de revistas literárias no país é desconhecido, mas estima-se que existam dezenas criadas e distribuídas em todas as regiões do país. Desde as independentes, como a Intempestiva (SP), Olympio (MG) e Acrobata (PI), até as institucionais, como a Serrote (do Instituto Moreira Salles), o Suplemento Pernambuco (da Companhia Editora de Pernambuco - CEPE
junto ao governo do estado) e a Palavra – criada pelo Departamento Nacional do Sesc, voltada ao fomento de diferentes formas de produção e circulação da literatura [leia mais em Travessias literárias].
O mundo conectado também facilitou a criação de diferentes plataformas digitais responsáveis por desenhar um novo espaço para a divulgação literária, a exemplo do Medium, que estreou no Brasil em 2013 e se tornou um território criativo para a publicação autoral. Na esteira da cena digital, canais no YouTube, redes sociais – como o Instagram e o Tik Tok –, além de podcasts, passaram a ser espaços de resenhas, críticas, entrevistas e de fomento à criação de clubes de leitura, expandindo ainda mais a ação da literatura e estreitando a relação entre autores e público.
ABRIR CAMINHOS
Quem folheia ou visualiza as páginas de uma revista literária pode encontrar não apenas resenhas e críticas de novos títulos, mas também ser surpreendido pelo texto inédito de um autor sobre o qual nunca ouvira falar – ou que estava, até então, “escondido” em prateleiras de bibliotecas e livrarias. Por isso, o autor de romances, contos e livros infantojuvenis Marcelo Maluf acredita que as revistas literárias se comunicam diretamente com os leitores.
“Seja pela diversidade de autores, seja pela possibilidade de, numa mesma revista, os leitores terem contato com diversas linguagens e modos de se produzir literatura contemporânea”, observa o escritor paulista, cuja obra A imensidão íntima dos carneiros (2015) foi
A GENTE CRIA COMUNIDADES E ACHO
QUE ESSE É UM GRANDE FEITO DAS REVISTAS LITERÁRIAS, EM GERAL
Paulo Werneck, editor e diretor de redação da Quatro Cinco Um
finalista do Prêmio Jabuti e vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura, em 2016.
Assim como tantos escritores e escritoras que tiveram seus textos publicados em revistas literárias, Maluf lançou seus primeiros contos numa revista chamada Pista, de São Paulo, em 2004, depois em 2009, na Coyote, de Londrina (PR). Ele também já publicou na São Paulo Review (SP), Ruído Manifesto (MT) e na própria Revista E. “O retorno, muitas vezes, é sempre mais imediato do que o livro. E, sem dúvida, acredito que seja um espaço para pôr os textos à prova. Encarar o leitor de frente, se lançar no mundo como escritor. Além de fazer seu nome começar a circular”, constata Maluf.
Essa divulgação se deve, segundo o crítico literário, professor e escritor paraibano Cristhiano Aguiar, ao fato de que as revistas literárias exercem um papel fundamental ao dar visibilidade às novas trajetórias da literatura contemporânea. “Mesmo autores com uma caminhada bem profissional apreciam publicar em revistas literárias. Isso se deve ao fato de que muitas vezes nós, autores, temos ideias para narrativas ou poemas, ou estamos com estes textos na gaveta, e gostaríamos que eles se
conectassem com nossos leitores antes que um livro pudesse ser publicado. Além disso, seja para iniciantes ou veteranos, uma revista literária muitas vezes é um lugar de maior liberdade criativa, de menos pressões editoriais, um precioso lugar de teste para as novas ideias que nos surgem”, observa.
Atualmente, o autor de Gótico nordestino (2022), vencedor do Prêmio Clarice Lispector de melhor livro de contos, em 2022, segue colaborando com resenhas e contos autorais em revistas literárias. “Uma das publicações mais recentes foi justamente na Revista E [o conto de terror "Anunciação", na edição de junho de 2024]. O texto teve uma ótima repercussão entre os leitores, o que foi uma grata surpresa. Houve até a sondagem para que ele, no futuro, possa virar um curta, ou média metragem, realizado por uma produtora da Paraíba”, celebra.
VIDA LITERÁRIA
Mais do que promover o encontro entre autores e leitores, e criar um espaço para críticos, as revistas literárias carregam o potencial de construir comunidades. Grupos que sentem uma lacuna entre o ato de escrever ou ler e maneiras de elaborar e
compartilhar, coletivamente, novos conhecimentos e percepções sobre enredos e personagens. Para o editor e diretor de redação da Quatro Cinco Um, Paulo Werneck, essas publicações compõem a cena de uma “vida literária”, em alusão ao conceito cunhado pelo crítico Brito Broca (1903-1961).
“O que é essa 'vida literária'? Ela acontece na livraria, na revista, nos festivais literários, nos saraus nas periferias etc. A gente tem uma ideia de que a leitura é uma atividade solitária, mas ela não é. Quando fazemos uma revista, estamos acenando para milhões de pessoas que gostam de ler. A gente cria comunidades e acho que esse é um grande feito das revistas literárias, em geral”, observa Werneck.
Revista multiplataforma de crítica de livros, a Quatro Cinco Um foi lançada em maio de 2017 com a alcunha “a revista dos livros”,
e publica resenhas, reportagens, entrevistas, notas e outros conteúdos sobre lançamentos no Brasil, em mais de 20 áreas. Desdobrando-se em diferentes formatos – edição impressa mensal, site, podcasts, newsletters e clubes de leitura –, a revista, com sede na cidade de São Paulo, é orientada pela bibliodiversidade e pelo pluralismo.
“Eu acho que o ‘grande autor’ ou a ‘grande autora’ tem que estar do lado do autor iniciante. A gente tem que, de alguma forma, promover esse diálogo das novas gerações com as antigas. Eu quero misturar o autor consagrado com o autor da periferia de São Paulo”, explica Werneck.
GIRAR A CHAVE
Também nesse meio editorial, o jornal Rascunho foi criado em abril de 2000 pelo jornalista e escritor Rogério Pereira. O veículo é reconhecido pela publicação de ensaios, resenhas, entrevistas, textos de ficção, HQs e ilustrações de autoria brasileira e estrangeira em suas páginas físicas e virtuais. “A ideia era fazer um jornal de literatura que fosse panorâmico e democrático. Nasceu de uma vontade de viver da literatura, de fazer literatura. E sempre foi um projeto colaborativo: tenho mais de 130 colaboradores, mas começamos com sete ou oito amigos na mesa de um bar”, lembra Pereira, editor da publicação, que tem sede em Curitiba (PR) e é distribuída para todo Brasil e exterior.
Durante essa caminhada de quase 25 anos do Rascunho, Pereira observa que as revistas literárias precisam ser valorizadas como importantes registros históricos. "Elas ajudam a contar a história
daquele momento. Por isso, eu acho que são um depositário da memória e da história da literatura brasileira”, defende.
Outra contribuição é sua capacidade de provocar a curiosidade de leitores e, em alguns casos, a formação deles. “Acredito que uma revista literária pode formar leitores se ela for usada como um dos recursos pedagógicos possíveis em uma proposta educativa, seja na educação básica, no ensino superior ou em cursos livres de formação de leitores ou de mediadores de leitura”, defende o escritor e crítico literário Cristhiano Aguiar. Ele pondera, no entanto, que há uma limitação nesse sentido. “A revista por si só, contudo, me parece mais focada em um nicho de leitores já formados ou no mínimo em formação avançada enquanto leitores”.
pode se tornar um ofício. "Você pode virar tradutor, revisor, jornalista, professor... Eu acho que, de alguma forma, a gente contribui para a formação de leitores profissionais”, vislumbra.
MUNDOS POSSÍVEIS
Para o diretor de redação da Quatro Cinco Um, Paulo Werneck, a revista literária é um ponto de apoio para os leitores. "Eu não sei se quem não é leitor vai pegar para ler a Quatro Cinco Um, por exemplo, e vai se tornar um leitor. Mas, talvez, a gente tenha alguma contribuição para a formação de leitores profissionais como na seção ‘Leitores de carteirinha’”, conta. Nesta página assinada por jovens frequentadores de bibliotecas comunitárias do Brasil, fruto de uma parceria com a Rede Nacional de Bibliotecas Comunitárias (RNBC), são eles que escolhem um título para ler e tecer reflexões. “São resenhas muito boas e sinceras. Você vê talentos literários”, constata.
Para Werneck, esse tipo de ação contribui para que jovens leitores percebam que aquela colaboração para uma revista literária também
O que pode a literatura numa realidade em que tudo parece mais urgente que a literatura? A pergunta lançada pela escritora Carola Saavedra em O mundo desdobrável – Ensaios para depois do fim (Relicário, 2021) poderia ser respondida de diferentes formas. Talvez a literatura possa fabular outros mundos possíveis e devolver ao leitor a capacidade de sonhar. Fato é que as trilhas da literatura se ampliam significativamente quando ela ganha corpo fora dos livros. Para o editor do jornal Rascunho, Rogério Pereira, a literatura pode tudo e nada, a depender do espaço que ocupa.
“A literatura tem a capacidade de dilatar a consciência do ser humano em relação ao meio em que ele vive, a partir das palavras num pedaço de papel ou digitalmente, num livro ou numa revista literária”, defende. "Como iluminar a escuridão com uma lanterna apagada? Muitas vezes, nós não avançamos porque não fazemos da literatura a potência que ela deveria ser no cotidiano das pessoas, na vida corriqueira, no dia a diadaquele menino”, conclui.
para ver no sesc / literatura
TRAVESSIAS LITERÁRIAS
Oficinas, debates, lançamentos e publicação de revistas pelo Sesc expandem a literatura e aproximam o público de outras formas de leitura
Em diversos projetos e ações, o Sesc São Paulo pavimenta estradas que aproximam a literatura do público, contribuindo para a formação de leitores e para o fomento de debates, cursos, circulação de livros e publicações. Além de uma programação dedicada à literatura nas unidades do Estado de São Paulo, o Sesc mantém uma editora de livros, as Edições Sesc São Paulo, dedicada a publicação de obras de não ficção nos campos das artes e das ciências humanas.
Neste mês, o Sesc estará presente, pelo oitavo ano consecutivo, na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), entre 9 e 13/10, com uma programação composta por lançamentos de livros, bate-papos, atividades culturais, oficinas e vendas de livros na Casa Edições Sesc, no Centro Histórico da cidade.
Lançada em 2009, a revista Palavra é outra iniciativa literária da instituição, realizada pelo Departamento Nacional do Sesc. Feita, neste ano, em parceria com o Sesc São Paulo, a publicação dedica-se ao fomento da leitura, com páginas compostas por textos inéditos de autores e autoras de diferentes regiões do país que participam do projeto Arte da Palavra – Rede Sesc de Leituras, maior circuito literário do Brasil, com cerca de 50 artistas
da palavra escrita e da oralidade. Desde 2022, a Palavra conta com QR Code para a produção da literatura oral, como contação de histórias, slams, entre outros.
Confira destaques da programação e outras ações literárias do Sesc São Paulo:
EDIÇÕES SESC SÃO PAULO
Flip 2024
A Casa Edições Sesc integra a programação da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), com uma programação composta por lançamentos de livros, bate-papos, além de um espaço dedicado à venda das publicações e a sessões de autógrafos. De 9 a 13/10, em Paraty (RJ). Confira a programação em sescsp.org.br/edicoes
14 BIS
Projeto Tramas do Luto
Série de encontros literários com escritores, filósofos, jornalistas e cineastas sobre o luto, o amor e as possibilidades de ressignificar perdas. Entre os convidados, Natalia Timerman, Guarani Jerá Guarani, Ana Claudia Quintana Arantes e Marcelo Rubens Paiva. De 16/10 a 13/11, quartas às 19h, na Biblioteca. GRÁTIS.
Capa produzidas pelo artista Chris M. Brito para Contos da selva, de Horacio Quiroga: obra disponibilizada gratuitamente pelo projeto Literatura Livre.
Projeto Litera - Festa das Letras e da Voz
Na capital nacional da literatura infantil, o Sesc realiza uma festa literária voltada ao incentivo à leitura, à cultura do livro e da literatura em suas variadas vertentes. De 16 a 20/10, quarta a domingo. GRÁTIS
DIGITAL
Literatura Livre
Fruto de uma parceria entre o Sesc São Paulo e o Instituto Mojo de Comunicação Intercultural, o projeto promove o acesso gratuito a obras clássicas da literatura mundial em tradução direta do idioma original. Em sua segunda edição, lançada em agosto, o Literatura Livre conta com 15 e-books de obras de George Orwell, Katherine Mansfield, Horacio Quiroga, entre outros autores e autoras. Leia aqui: literaturalivre.sescsp.org.br
TAUBATÉ
15 a 27 de outubro 2024
Diálogos sobre o universo da alimentação e suas interfaces com a sociedade, a saúde, a cultura e o meio ambiente.
Palestras, oficinas culinárias, feiras e bate-papos gratuitos e para todas as idades nas unidades do Sesc São Paulo. sescsp.org.br/experimenta
ANTIRRACISTA educação
Em 2009, quando a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie falou sobre “o perigo de uma história única”, em uma palestra que depois seria transformada em livro, ela não imaginava que seu discurso explicaria tão bem os desafios da contemporaneidade. Reconhecida mundialmente, Chimamanda argumentou como nasce o preconceito, atribuindo responsabilidade às histórias que escutamos. Quanto menos diversas, e mais centralizadas, maiores as chances de desenvolvermos uma visão estreita e deturpada da pluralidade de identidades que coabitam um território.
Até 20 anos atrás, nas salas de aula brasileiras, era comum que se ignorasse a história, cultura e tecnologia de cada povo africano trazido pelos colonizadores. Foi apenas em 2004 que o ensino sobre história e cultura afro-brasileira passou a fazer parte dos currículos escolares com a aprovação da Lei 10.639/2003, tornando-se instrumento para uma educação antirracista.
O Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), organização não governamental que busca garantir os direitos da população negra, acompanha práticas escolares que propõem outras possibilidades de educação a
partir do reconhecimento de grupos sociais que sofreram apagamento na historiografia do país.
Sobre essas práticas, Daniel Bento Teixeira, diretor executivo do Ceert, enxerga mudanças sociais significativas que têm ajudado a tornar a educação universalista, “deixando de ser uma saída eurocêntrica e excludente para promover o necessário reencontro com o Brasil, a partir da riqueza de suas pluralidades e tendo no antirracismo seu fundamento”, constata.
Para as pesquisadoras Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, professora emérita da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e Ana Cristina Juvenal da Cruz, diretora do Centro de Educação e Ciências Humanas da UFSCar, falar de uma educação que valoriza e difunde outras cosmovisões, saberes e narrativas da população negra significa valorizar a ancestralidade e incorporá-la como chave de mudança hoje. “Essa ancestralidade, que carrega em si a dualidade da continuidade e do recomeço, abre o significado do tempo de olhar para o passado para (re)compor o presente”, escrevem.
Neste Em Pauta, um artigo assinado por Teixeira e outro feito em coautoria por Silva e Cruz trazem reflexões sobre a adoção de uma educação antirracista para a conquista de uma sociedade equânime.
Um gesto afirmativo para conduzir a própria vida
POR PETRONILHA BEATRIZ GONÇALVES E SILVA E ANA CRISTINA JUVENAL DA CRUZ
mudança estrutural, alteraram institutos e universidades brasileiras, em especial as públicas. Hoje, esses espaços de formação superior e universitária estão mais pluralizados e convivem com as questões referentes à presença e aos questionamentos dos corpos das pessoas que chegam pelas múltiplas políticas de ação afirmativa, as quais alteram não apenas o perfil de estudantes, servidoras e servidores, como também a composição e produção intelectual que emana dessas pessoas.
Em 2024, completam-se duas décadas das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História
Afro-Brasileira e Africana (DCNERER). Publicadas em 2004, um ano após a sanção da Lei 10.639/2003, as diretrizes estabeleceram caminhos para o ensino da história afro-brasileira e africana nos currículos da educação brasileira, constituindo as bases curriculares para a educação das relações étnico-raciais. Naquele momento, o Brasil colocava diante de si questões sobre as condições materiais e simbólicas da sua população negra e o debate sobre a adoção das políticas de ação afirmativa em vários setores da nação.
Assistíamos, assim, à integração de um movimento de longa duração histórica cujo embasamento enseja a lógica de reparar, de reconhecer uma história do Brasil que necessitava ser escrita. Uma história que, ao mesmo tempo que evidenciava as formas estruturais de espoliação, extermínio e as hierarquias das experiências de humanidade, abrigava uma emergência de lutas e de elaborações teóricas por justiça e igualdade.
Vivenciamos, nas últimas duas décadas, iniciativas para tornar a educação um direito efetivo para todas as pessoas, e assim, testemunhamos a política mais revolucionária do ensino superior brasileiro, a saber, as políticas de ação afirmativa, na modalidade de cotas que, em termos de volume, impacto e
Visualizamos o reconhecimento de que essas medidas compõem uma trajetória de lutas e de exigências da educação como um direito da população negra e, como tal, de toda a sociedade brasileira. E mais, do pensamento elaborado pela experiência da diáspora negra, como um legado traçado pela presença das pessoas que vieram antes de nós e de quem herdamos em nosso corpo, ideias, sonhos e tessituras expressas na força vital de nossa existência.
Mesmo na ação de celebrar, cabe a análise crítica de que ainda atiça, sempre à espreita, a sombra do racismo, capilarizado nas nossas relações sociais e nas salas de aula. Infelizmente, ainda nos deparamos com relatos de práticas preconceituosas e discriminatórias que apontam que o longo caminho que percorremos possui ainda alguns relevos. Ao mesmo tempo, acompanhamos as elaborações criativas e comprometidas que emergem do trabalho das pessoas que atuam na educação, de professoras e professores, com implicações efetivas na vida de quem adentra instituições de ensino em busca do pensamento e do saber. São pessoas que se constituem como tal, trazendo em si as tradições de pensamento elaborados a partir das matrizes africanas, ou seja, que se colocam para “construir a própria vida”.
Nessa formulação assentam elementos que constituem a educação como processo de conduzir a própria vida, que se expressam nas formas africanas e da diáspora cuja centralidade está no corpo. Ao dançar, ouvir e falar, realizamos uma edificação de nossa existência. Nesse movimento do corpo, identificamos a constituição conceitual aplicada ao sen-
tido de educar-se vinculada ao pensamento da diáspora negra. É digno de nota que todos esses termos são ligados ao corpo. Ao verificarmos que se trata de atributos com designação direta do corpo, que se dá através e com o corpo em seu movimento, encontramos a proposição de que se projeta em coletivo. Aqui vêem-se as proposições de “encontrar o elo” e permitir-nos “decifrar este mundo”. Ao atribuir tal centralidade ao corpo, verifica-se uma inversão atribuída a ele. Em outras palavras, as transformações de fundamento ocidental atribuíram ao corpo uma função menor, mas, e em especial, no caso da história da presença africana e negra no mundo, o corpo sempre foi central.
As experiências da escravização e do colonialismo remeteram à população africana e à sua descendência, o corpo. E foi esse o maior instrumento da vida dessas pessoas. Foi com o corpo que essas pessoas trouxeram conhecimentos, saberes, afetos e práticas que foram transmutados ao longo do tempo da vida, que se seguiu e que pulsa em nós. Léopold Sédar Senghor [escritor e político senegalês (1906-2011)] deslocou o logos ocidental do “penso, logo existo”, de [René] Descartes [filósofo e matemático francês (1596-1650)], ao centralizar o corpo como um “puro campo de sensações”. Para Senghor, “eu sinto, eu danço o Outro; eu sou”. É no gesto e movimento dos corpos que vemos as criações na música, na poesia, nas palavras e nas africanidades brasileiras.
Em uma tradição de pensamento africano, toda pessoa é renascida de um ancestral. Essa ancestralidade, que carrega em si a dualidade da continuidade e do recomeço, abre o significado do tempo de olhar
para o passado para (re)compor o presente. Trata-se de “conduzir a própria vida” como uma experiência de aprendizagem na qual se revigora para uma outra forma e outra estética no tempo, o presente. É a constituição de ensino e aprendizagem que se presentificam na história da educação das relações étnico-raciais que é múltipla, africana e brasileira.
A tarefa política que emerge da grandeza desse pensamento é a de constituir uma experiência de vida plena que possa ser vivenciada por todas as pessoas. De uma educação antirracista que aponte para a força de sedição e rompimento, que erija nossa capacidade de crítica e de mobilização. Que possibilite fluir nossa energia para a intervenção e elevar nossos enunciados para um projeto radical de transformação das nossas experiências e de nossos modos de ver e sentir, ressoando formas de solidariedade que sempre fizeram parte da história da diáspora negra. Uma atitude afirmativa, por excelência, que conduz e eleva a vida.
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva é professora emérita da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Grau de Cavaleiro da Ordem Nacional do Mérito do Brasil, Somghoy Wanadu-Wayoo, do Povo Songhoy, no Mali.
Ana Cristina Juvenal da Cruz é diretora do Centro de Educação e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Carlos (CECH-UFSCar) e coordenadora de educação e relações étnico-raciais da ANPEd (GT21).
Uma educação antirracista que aponte para a força de sedição e rompimento, que erija nossa capacidade de crítica e de mobilização
A saída é pela educação?
POR DANIEL BENTO TEIXEIRA
Quando alguém pretende encerrar (ou lacrar) um debate público sobre a agenda social e política brasileira, a bala de prata é sempre a mesma: a saída é pela educação! Seja o debatedor de esquerda, de direita ou dos tantos matizes de centro encontrados na política brasileira, o mecanismo funciona igualmente. Afinal, é difícil se contrapor a essa ideia de que a educação seria não só uma prioridade, mas a saída para superar nossas mazelas. Porém, adiciono sinal de interrogação à frase mágica não só por acreditar no poder dos questionamentos em tempos de afirmações categóricas sobre tudo, mas por realmente entender que a resposta é: depende. Se for uma educação que reproduz o racismo, ela não só deseduca, como busca desumanizar mais da metade da população brasileira, além de projetar superioridade à outra quase metade.
Gosto de definir o racismo como um sistema de opressão que hierarquiza a vida de pessoas de acordo com o pertencimento étnico-racial. É dizer que, se sou branco ou se sou negro, ele vai afirmar se a minha vida tem mais ou menos valor. Essa foi a primeira matriz de desigualdades da sociedade brasileira desde a invasão portuguesa, propiciando expropriação violenta do trabalho e políticas de extermínio de indígenas e negros ao longo da história do país. Dessa matriz derivam as desigualdades engendradas nas relações sociais ao longo dos séculos.
Além de ter papel fundamental para a formação da identidade brasileira, via de regra, o racismo permeia algumas das primeiras impressões de uma criança em relação à própria identidade, a partir do olhar de outras crianças e educadores na esco-
la. Em geral, isso se dá de forma negativa, a partir de xingamentos que a desumanizam, sendo “macaco(a)” o mais conhecido. Foi assim também comigo. Infelizmente, educadores e gestores de escola não estão, em geral, preparados para lidar com essas situações (isto, claro, quando há interesse de se tomar alguma providência).
Temos observado a omissão sistemática de escolas há anos, projetando o mito da democracia racial, que o Brasil adotou desde a década de 1930, na negação das manifestações racistas que, em contrapartida, se tornam cada vez mais violentas, materializando discriminações que podem apresentar intersecção com outros sistemas de opressão, a exemplo da LGBTQIAPN+fobia, como vem ocorrendo em diferentes escolas.
É necessário repensar a educação para que o antirracismo componha sua própria definição. É preciso também que isso se dê em perspectiva interseccional, considerando outros sistemas de opressão. Somente assim a escola será verdadeiramente acolhedora para crianças e adolescentes negros, deixando de ser espaço de reprodução da violência racial que contribui para a evasão escolar de estudantes negros, sensivelmente maior do que a de estudantes brancos, sobretudo nos anos finais do ensino fundamental e ensino médio. Além das violências raciais na escola, que vão desde o não reconhecimento das contribuições civilizatórias da população negra no currículo até as omissões em manifestações racistas, a evasão (ou expulsão, como diria Fúlvia Rosemberg [educadora brasileira, 1942-2014]) escolar das crianças e adolescentes negros redunda em mais violências fora da escola.
Um estudo, lançado neste ano pelo Unicef e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, demonstrou que um menino negro tem 21 vezes mais chance de ser vítima de homicídio do que uma menina branca. Entre 2021 e 2023, do total de mortos entre 15 e 19 anos (13.829), 90% são meninos e 82,9% (cerca de 11.5 mil) são negros. Portanto, é necessário que a escola seja efetivamente parte do sistema de garantia de direitos das crianças, adolescentes e jovens, considerando o princípio da proteção integral e da
É necessário repensar a educação
para que o antirracismo componha sua própria definição. É preciso também que isso se dê em perspectiva interseccional, considerando outros sistemas de opressão.
prioridade absoluta, conforme previsto na legislação. As escolas precisam ter protocolo para providências internas em caso de discriminação racial, abrangendo a família, comunidade escolar e a relação com outras instituições do sistema de garantia de direitos. Mas é preciso iniciar o trabalho na cultura institucional preventivamente, ou seja, antes que a discriminação ocorra ou se torne recorrente.
No que diz respeito ao fazer pedagógico e gestão escolar, o acervo do Prêmio Educar para a Equidade Racial e de Gênero do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert) oferece pistas importantes para avançarmos na construção de uma educação antirracista, a partir de experiências por ele contempladas, ao longo de 20 anos. Um exemplo é a experiência “Educação antirracista: afrobetizando alunos para a construção de cultura e identidade”, da escola municipal de ensino fundamental São Judas Tadeu, no município de Bujaru, no Pará, representada pela professora Rosiete Lessa dos Reis. Esse projeto de educação escolar quilombola diz respeito ao reconhecimento e à valorização de características étnicas dos diversos grupos sociais que constituem o povo brasileiro. Nesse sentido, evidencia, na escola, a contribuição civilizatória de grupos cujo protagonismo social e político é comumente invisibilizado na historiografia oficial brasileira.
Outra experiência exitosa foi “A literatura escrita por mulheres negras: uma experiência de leitura na alfabetização”, realizada pela escola municipal Florestan Fernandes, no município de Belo Horizonte, em Minas Gerais, representada pela profes-
sora Danielle Aparecida Barbosa Cardoso. O projeto é uma prática de leitura elaborada a partir de estudos sobre relações étnico-raciais e de gênero. As crianças em fase de alfabetização tiveram contato com a literatura escrita por mulheres negras para que, conferindo visibilidade a essas autoras, pudessem se identificar com elas e se projetar em espaços diferenciados na estratificação social, além de potencializar mulheres da própria comunidade escolar e ampliar o repertório literário e linguístico das crianças, colaborando na construção de identidades e autoestima.
É fácil perceber que práticas escolares como essas propõem outra possibilidade de educação, a partir do justo reconhecimento de pessoas e grupos na sociedade que foram e continuam sendo apagados da historiografia. Dessa forma, a educação se torna verdadeiramente universalista, deixando de ser uma saída eurocêntrica e excludente para promover o necessário reencontro com o Brasil, a partir da riqueza de suas pluralidades e tendo no antirracismo seu fundamento.
Daniel Bento Teixeira é diretor executivo do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), advogado especializado em Direitos Difusos e Coletivos, pela Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e integrante da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-SP.
VAZIO ocupar o
Autora do premiado
O peso do pássaro morto, Aline Bei revela o processo criativo que dá corpo a uma escrita norteada pela poesia, dramaturgia e oralidade
POR RACHEL SCIRÉ
No mês em que faz 37 anos, a escritora Aline Bei comemora o desdobramento de seus livros em versões para o teatro e cinema.
Lorena Dini
Um sorriso se derrama pelo rosto de Aline Bei e ali se acomoda, enquanto a escritora paulistana comenta sobre a adaptação de seus dois romances para o teatro e cinema. O orgulho não é pouco para ela que sempre quis ser atriz e se formou pelo teatro-escola Célia Helena, além de ter cursado a faculdade de letras – como uma forma de atenuar a pressão familiar por uma vida profissional com maior estabilidade.
Apesar de sempre ter sido uma grande leitora e de desenhar contornos poéticos a cada um de seus pensamentos, Aline Bei afirma que a escrita floresceu como uma forma de ocupar o vazio deixado pelo teatro. E é a partir do universo cênico que a autora-atriz pensa a sua literatura, seja nos métodos para a construção de personagens, no hábito de encenar e gravar, com a própria voz, passagens dos textos que compõe, ou na ideia do livro como palco de um “teatro possível”.
Antes de lançar sua obra mais recente, Pequena coreografia do adeus (2021), que foi finalista do prêmio Jabuti, a romancista estreou na literatura com O peso do pássaro morto (2017), vencedor do prêmio São Paulo de Literatura e do prêmio Toca. Em 2020, O peso... foi adaptado para o teatro, em formato virtual devido à pandemia da Covid-19, com idealização e atuação de Helena Cerello e direção de Nelson Baskerville, e desde 2021 tem circulado pelos palcos. A mesma obra também será adaptada para o cinema, com roteiro de Ana Pacheco e Isabel Teixeira no papel da protagonista.
Prestes a completar 37 anos de idade, no dia 9 deste mês, Aline Bei comemora o fato de Pequena coreografia do adeus também estar com os direitos reservados para o cinema e fala, neste Encontros, sobre os caminhos estéticos, narrativos e estilísticos de sua escrita.
GESTO LITERÁRIO
A minha escrita começa sem nome e em lugares deslocados, a partir das artes, das leituras e do teatro. Num primeiro momento, não sei se ela estava conectada com a literatura em si, mas com um vazio que o teatro deixou em minha vida. Escrevi a partir da minha formação teatral. Não tinha nenhuma pista de que seria escritora. Também porque a escrita fica quase em um lugar secreto, feita por pessoas que parecem todas mortas. Só fui me conectar quando entrei na faculdade de letras e, pela primeira vez, conheci pessoas que escreviam. Três forças me norteiam, desde o início: a poesia, a dramaturgia e a oralidade. Eu fui começar a escrever aos 21 anos e só depois me autoproclamar escritora, que é um gesto superpolítico, bastante performático e difícil de fazer, especialmente para as mulheres. O livro é muito importante, mas ele se torna um objeto-palco, que tem a ver com esse teatro possível que criei a partir da escrita.
ACONTECIMENTO POÉTICO
Quando comecei, tomei a liberdade de me autointitular poeta. Uma ingenuidade, como se bastasse amar a poesia para ser poeta.
EM ALGUNS MOMENTOS, TEM UM GRANDE PÁSSARO QUE SOBREVOA O MEU TEXTO E NUNCA POUSA: É A POESIA
Percebi que não se faz um poeta. Na prosa, sim, é possível trabalhar e conquistar um espaço próprio, com muito esforço. Mas na poesia, não. Você não força o nascimento de um poeta e eu não sou, infelizmente, mas isso não me torna menos leitora de poesia e menos apaixonada por ela. Em alguns momentos, tem um grande pássaro que sobrevoa o meu texto e nunca pousa: é a poesia. Conforme dei continuidade à minha pesquisa na escrita, fui assumindo cada vez mais esse quase acontecimento poético que me toma.
ESCULPIR PALAVRAS
Meu interesse pelos poetas concretos virou o jogo quando eu entendi que um poema também tem um apelo pela plasticidade, pela forma visual. A gente pode trabalhar a palavra como um escultor trabalha o seu material, sem ser óbvio, por meio do qual o poema e a mensagem se relacionam e se complexificam, geram a experiência de estar diante de algo que bagunça o leitor, que é da ordem do inexplicável, da
arte. Por que a prosa não pode ter essas páginas de acontecimento plástico também? Por que a ideia comportada do parágrafo? Claro que isso deve existir, mas sempre? Por que não enlouquecer um pouco a prosa também? A pergunta formal que guia o meu primeiro livro [O peso do pássaro morto] é justamente essa: será que esse meu modo de escrever dá conta de uma história mais longa? No segundo livro, é uma pergunta formal ainda mais grave: será que consigo adentrar mais complexidade, mais profundidade nos personagens, com essa linguagem fragmentada?
PRESSENTIR A VIDA
A criação de personagens talvez seja o meu grande acontecimento de texto. Eu entro no trabalho por eles, o que tem muito a ver com o fato de eu ter sido atriz, porque o teatro é esse lugar em que o ator defende o ponto de vista de um personagem com paixão, seja protagonista ou figurante. Quando o ator é comprometido com a cena, consegue trazer a vida toda
em uma fresta, às vezes sem verbalizar. Pelo modo como toca em determinado objeto, dirige o olhar ou se movimenta, coloca o espectador numa espécie de pressentimento da vida em que aquela figura está imersa. Isso para mim é muito importante, não só dizer quem são essas pessoas, mas fazer o outro pressentir, trazer também a imaginação do leitor, a perspectiva do público, e completar as lacunas que o texto sempre deixa, em especial o meu, porque sou uma escritora mais da ordem do silêncio e do vazio do que da expressividade. Quando eu começo a escrever, não sei exatamente quem são essas pessoas, muitas vezes tenho pouquíssimos elementos.
TROCA DE PELE
Sinto uma mudança grande de um livro para o outro, porque a escrita é muito porosa. A escrita tem uma efemeridade, tem seus jogos de improviso e de acaso, que não se repetem. E cada vez que a gente escreve um livro, está sendo transformada pela própria feitura do trabalho – quiçá quando se passam anos, porque sou uma autora que demora em cada processo. Estou escrevendo meu terceiro livro há três anos. Tenho um intervalo entre livros, até a publicação, e vou virando outra pessoa. Sinto, inclusive, que mudei de forma mais radical agora, para escrever o terceiro livro, especialmente por viver a vida de autora publicada e, de repente, ter um espelho na frente do meu processo. Em O peso do pássaro morto, por exemplo, eu era pura ingenuidade, ninguém me perguntava o que eu estava fazendo. Depois que comecei a
publicar, participar de evento, passei a ter de sustentar publicamente o meu gesto estético e íntimo. E, de tanto dizer, comecei a inventar também, comecei a ter de incorporar essa invenção na minha própria escrita. A gente amadurece, perde muita coisa e ganha outras. Não sei o resultado de todas essas questões, mas a mudança é realmente inevitável, é quase como uma pele que a gente fica tentando manter, mas que vai se transformar
por conta do sol, do tempo, do riso, da expressão. E a gente precisa aceitar essas mudanças.
ESCRITORA MONOGÂMICA
Eu fico rodeada por possibilidades de livros que não são necessariamente histórias, porque não sei se vão acontecer. Tenho impressões, pressentimentos que hoje já consigo reconhecer que
Adaptado para o teatro, com atuação de Helena Cerello e direção de Nelson Baskerville, O peso do pássaro morto conta a história de uma mulher, dos oito aos 52 anos, atravessada por singelezas cotidianas e tragédias.
têm fibra para se tornarem um livro, para se tornarem uma história que posso escrever, bem ajustadas ao meu tipo de escrita. Eu não escrevo vários livros ao mesmo tempo, costumo dizer que sou uma "escritora monogâmica". Mas durante o processo, ou quando termino, algumas coisas ficam abertas. Quando estava escrevendo A pequena coreografia do adeus, em um dado momento a personagem ficava sonhando em ser mais próxima da avó. Com isso, um portal se abriu e eu soube que o terceiro livro estava ali. E foi a personagem quem me deu, eu não escreveria aquilo sem o intermédio dela. Estava escrevendo quase como uma atriz, que descobre um gesto quando está em cena, por intermédio da personagem. Eu fico grata, porque sei que isso vai continuar me assombrando, pairando, e na hora certa vai incorporar, vai se transformar em texto.
VERSÕES EM ADAPTAÇÕES
Eu fico muito interessada em ver como o livro vai acontecer no cinema. São coisas completamente diferentes, uma obra nova que vai surgir. Eu prefiro ficar de fora. Já permaneci muitos anos com os livros, é hora de outras pessoas lidarem com essa história e a transformarem em outra proposta. No caso do teatro, foi muito impressionante. Confesso que é uma das coisas de que mais me orgulho, porque sendo uma escritora que foi atriz, não tem nada mais bonito do que perceber que a sua escrita pode se desdobrar em outras possibilidades, inclusive cênicas.
inéditos
O PORCO FRAMBOESA
UM CONTO DE FADA PARA CRIANÇAS
TEXTOS E ILUSTRAÇÕES
POR JANAINA TOKITAKA
Havia muitos anos atrás, um porco que nasceu com perfume de framboesa. Não havia quem não elogiasse muitíssimo o odor natural do bicho que exalava perfume de frutas vermelhas de sua pele cor de rosa.
Pois bem, havia também, naquele mesmo reino, uma princesa cujo sonho era ter um porco de estimação. Seus pais, o Rei e a Rainha, impuseram, porém, uma única condição: o animal tinha que ser limpo e cheiroso para não emporcalhar os salões branquinhos e os pisos de mármore do palácio.
O porco framboesa, que era um porco selvagem, ouviu esse rumor que começou na cidade e foi se propagando até chegar no meio da floresta. Imediatamente, pôs-se a marchar para o tal do palácio, afinal, aquela vaga só podia ser dele.
O castelo era a quilômetros dali, longe, bem longe, quase em outra cidade. Fazia tempo que não chovia e o pó das estradas de terra foi grudando nos seus pelos cor de rosa. Estava um calor danado e cada passo alimentava com firmeza na direção do castelo alimentava o chulé dos cascos do porco framboesa.
Depois de muito caminhar, finalmente o porco chegou ao castelo. Sem papas na língua, já chegou
se autoproclamando a solução para todos os problemas. Afinal, ele era O Porco Framboesa! Um porco perfumado e limpíssimo.
A princesa, emocionada, bateu palmas e correu na direção do visitante, pronta para abraçar aquele milagre, mas... A verdade é que o bicho fedia tal e qual qualquer porquinho normal. O Rei e a Rainha se prepararam para expulsar aquele animal sujo e mentiroso do palácio real, mas a princesa, aos prantos, disse que podia provar que aquele era um porco framboesa sim!
Com esforço, carregou o porco no colo até o banheiro real. Lá, encheu a banheira de porcelana de água morna e deu um banho de espuma no porco. Passou hidratante nos pés do bicho e talco atrás de suas orelhas.Depois disso, a Rainha deu uma boa fungada no pelo cor de rosa e teve que concordar que aquele porco era Framboesa, sim.
E assim, todos os dias, a princesa continuou dando banho de espuma, lavando os pelos do porquinho com sabonete de lavanda e shampoo. E assim, eles continuaram juntos e perfumados para todo o sempre. Afinal, aquele era sem dúvida alguma o Porco Framboesa. Ou não era?
ROUPA DE SAIR
UM CONTO DE FADA PARA JOVENS
Dizem que nos mares escuros e agitados vive a Selkie, um ser híbrido de duas peles.
Quando a Selkie sente vontade de entrar em farmácias de luz azulada, passar os dedos despreocupadamente por infinitos vidrinhos de esmaltes, dançar usando sandálias que machucam a pele fina de seus pés ou beber aquele líquido ultradoce, gasoso e escuro de dentro de um cilindro de metal vermelho, ela abandona sua pele de foca nas rochas da praia e anda por aí como uma mulher de cabelos pretos e compridos.
Conta-se que certa vez uma Selkie se casou com um pescador e passou cinquenta anos a seu lado. Certa manhã, acordou, vestiu sua pele de foca e voltou para o mar.
Dizem também que Oyá, a orixá, mulher búfala, casou-se com Ogum, foi feliz no casamento, teve muitos filhos e depois retornou ao estado animal quando reencontrou sua verdadeira pele, deixando aquela casa para trás.
Minha mãe tinha uma jaqueta de couro vermelha guardada na parte de baixo do armário, dentro de uma sacola de supermercado, amarrada com três nós bem apertados. Eu descobri aquele segredo brincando de esconder com minha irmã mais nova. Ignorei os nós e rasguei o plástico fino com toda a força dos meus dedos pequenos. No escuro, com o queixo apoiado nos joelhos, desdobrei a peça de roupa mais bonita que já tinha visto na vida: tão linda quanto as roupinhas das bonecas de plástico da minha irmã. Aproximei ela do meu nariz: tinha cheiro de mofo, suor, desodorante e maresia. Sem pensar, vesti a jaqueta em cima
do meu moletom manchado de groselha. Imediatamente, espirrei: o barulho denunciou meu esconderijo. Minha mãe abriu a porta, mandou eu tirar a jaqueta e me deu uma bronca. Aquilo não era fantasia, não era de brincar.
Mas se não era de brincar, para que aquela cor toda, as franjas, o forro estampado? Perguntei porque ela não usava aquela jaqueta todos os dias. Ela respondeu que aquela não era uma jaqueta para ir ao supermercado ou buscar criança na escola. Era roupa de sair.
A frase ficou na minha cabeça. Roupa de sair: o contrário de roupa de ficar.
Imaginei minha mãe vestindo aquela jaqueta e indo embora, no meio da noite, muitas e muitas vezes, depois das nossas trocas de gritos de todos os dias. Cheguei a sonhar com a cena: às vezes ela deixava um bilhete na porta da geladeira. Outras, uma mensagem de voz no celular. Muitas vezes, nada. Eu assistia televisão com minha irmã no sofá da sala, ouvindo as vozes dos personagens se misturando ao barulho da minha mãe lavando louça ou andando de um lado para o outro no quarto, monitorando sua presença.
Minha mãe nunca saiu daquela casa. Nós saímos, eu e minha irmã, ela aos poucos, uma escova de dentes e par de chinelos por vez, eu de repente, no meio da noite, depois da última de nossas brigas. Estava muito frio. Espirrei. Minha mãe acordou, pegou a sacola de supermercado e me deu: “Toma, Gabriel. Tá gelado lá fora. Não me serve mais.” Vesti aquela jaqueta vermelha com franjas, que me serviu como uma segunda pele: Minha roupa de sair.
DESEJOS
UM CONTO DE FADA PARA MULHERES DE MEIA IDADE
— “Ah, não lhe dê ouvidos”, disse a fada de meia idade, cutucando um gato gordo com a varinha de condão. “Uma fada madrinha de verdade não concede desejos a homens, querida.”
O gato pulou na barriga da fada, amassando o tecido da saia com as patas, como quem sova uma massa de pão.
—“Homens não sabem desejar. Sempre pedem a mesma coisa: tudo!”, ela continuou, gargalhando ao final da frase. “Só os muito, muito pobres não são completos egoístas, filhinha.”
A fada jovem piscou seus olhos redondos, sem olheiras nem rugas.
—“Mas… Esse moço…”
—“Menina, escute bem. Ou ele quer todo o ouro do mundo ou a mais bela princesa, o que quer dizer que deseja reinar, na verdade. Não, não, não, não.”
—“Cinderela também queria um príncipe!” a fada jovem retrucou, irritada.
—“Cinderela queria era parar de esfregar aquele chão imundo e não ter que alvejar as roupas de baixo das irmãs todo santo dia. Mulheres são mais razoáveis.”
A fada continuou, arrepiando o pelo do gato com os dedos. “O que elas querem? Uma criança, não
morrerem devoradas, salvar os irmãos da morte, ou, como a pobre Pele de Asno, só imploram pelo amor de deus para não terem de ser obrigadas a casar com o próprio pai.” O gato espreguiçou-se e levantou do colo da fada, pulando para o chão. “Já os homens, vamos lá. Querem que tudo que toquem vire ouro!” ela continuou, abanando as mãos. “Dê três desejos a um homem e ele desperdiçará os três. Não vale a pena, querida.”
A fada jovem fez um bico, levantou da cadeira, sacudiu os cabelos e saiu, batendo a porta, sem dizer nada. O gato miou.
—“Ah, gato, cedo ou tarde ela vai perceber”, a fada mais velha disse, arrumando os óculos. “No fundo ela tem bom senso. Todas elas têm.”
Janaina Tokitaka é escritora, ilustradora e roteirista formada pela ECA/USP. Dois milhões de exemplares de seus livros foram distribuídos pelo programa Itaú Social em todo o território brasileiro. Foi finalista do Prêmio Jabuti, recebeu o Prêmio Cátedra Unesco de Literatura e suas obras compõem o catálogo do clube ONU de leitura. Especialista em contos de fada, já publicou títulos pela Companhia das Letrinhas, também ilustrou e traduziu o livro Contos de fada japoneses (Todavia), lançado neste ano.
depoimento
Com 384 mil inscritos em seu canal no YouTube, a dupla Tiquequê já lançou cinco álbuns e criou sete espetáculos ao longo das duas últimas décadas.
Nina Jacobi
TIQUE O QUÊ?
Dedicado há mais de 20 anos à criação musical para crianças, duo Tiquequê convida seu público a brincar com diferentes sonoridades e ritmos
POR MARINA PEREIRA
Ela cresceu em uma família rodeada por grandes nomes do universo musical, e depois se especializou na área da educação. Ele abraçou sua paixão pela música na adolescência, e resolveu se graduar em composição musical.
Juntos, Diana Tatit - sobrinha de Paulo Tatit, do Palavra Cantada, e de Luiz Tatit, do Grupo Rumo - e Wem, nome artístico de Leonardo Wem Mason, formam o Tiquequê, duo criado há mais de duas décadas com a seguinte defesa: crianças são inteligentes e merecem conteúdo artístico de qualidade. Como diz a frase de abertura do site oficial da dupla: “Nada de musiquinha, historinha ou showzinho! Aqui fazemos canções e espetáculos para crianças, com toda a qualidade que elas merecem”.
No início formado como um quarteto, o Tiquequê nasceu apresentando releituras de músicas infantis e do cancioneiro popular. Ao longo dos anos, o repertório autoral foi ampliado e deu origem a seis espetáculos: Toc Patoc (2001),
Tu toca o quê (2008), Canta outra (2011), O gigante (2015), Barulhinho, Barulhão (2017) e Todo dia (2022).
O Tiquequê já coleciona cinco álbuns e se destaca no mundo digital com mais de 300 milhões de visualizações nas redes sociais, para as quais produzem conteúdos educativos e artísticos dedicados à primeira infância. Um deles é o programa Clubinho todo dia com Tiquequê, lançado em 2020, com atividades online voltadas para o desenvolvimento infantil.
Em abril deste ano, estreou seu sétimo projeto musical, Bailamos, turnê que chega, neste mês, ao Sesc Mogi das Cruzes (12/10) e ao Sesc Santos (13/10). Neste Depoimento, Diana Tatit e Wem relembram a relação dos dois com o universo musical, contam os desafios de criar música para crianças e refletem como as tecnologias audiovisuais acompanham as novas gerações.
começo
Diana: Eu fiz meu primeiro show aos 11 anos, quando [a Palavra Cantada] lançou Canções de ninar
(1994). Éramos eu e todas as minhas primas no palco. A gente não cantava, mas fazia cenas. Acho que foi esse o começo da proposta de criar um espetáculo que fosse musical e cênico. Quando paramos [de trabalhar] com a Palavra Cantada, fizemos um grupo nosso, o Coro das Primas, com essa mesma proposta, e acho que isso está nos primórdios do Tiquequê. Daí, quando acabou essa “brincadeira” é que eu tive a ideia de montar o grupo para continuar, de certa forma, fazendo esses espetáculos. Mas eu tive toda uma carreira na área da educação, porque não imaginava que aquilo era para valer.
Wem: O meu pai é muito musical. Minha avó sempre tocou, meus tios todos tocam. Minha mãe fala que, quando eles se casaram, antes de comprar a geladeira meu pai comprou um aparelho de som. Mas o meu lance mesmo era jogar bola. Eu morava numa chácara longe da cidade e passava muito tempo no quintal pensando, cantarolando. Só na adolescência é que se deu minha iniciação musical.
A CRIANÇA NÃO TEM TEMPO A PERDER, ELA NÃO VAI FICAR POR "EDUCAÇÃO". SE ELA NÃO CURTIR, VAI SE LEVANTAR E SAIR.
Diana Tatit
Eu tocava saxofone na Banda Lira, da prefeitura de Mogi Mirim (SP), e logo depois comecei a compor. Daí eu vim para São Paulo para fazer faculdade de música, e foi quando eu encontrei o Tiquequê. Eu já tinha feito umas canções infantis e temos [Diana e Wem] um amigo em comum, o Estevão Marques. Quando a Tati, prima da Diana, estava saindo do Tiquequê e precisava de uma pessoa para entrar, ele me indicou.
aprendizado
Diana: Quando a criança está ali, por inteiro, vivenciando uma experiência legal, artística, ela vai aprender coisas e vai se desenvolver. A gente sempre fala que acredita muito na inteligência das crianças e que não precisa fazer musiquinha para ela aprender, porque ela já está no mundo.
Wem: A gente faz música para ser bem-acabada, bem-feita em todos os sentidos. Se a melodia está bem-acabada, se ali tem um discurso bem-feito, então já está legal. Isso é para qualquer pessoa. É para o adulto e é para a criança. No fundo, a gente quer fazer a melhor canção. A criança é inteligente, ela só tem menos
experiência e menos repertório que a gente. Mas tem, completamente, a capacidade para entender aquilo.
geração
Wem: Criança é criança. Independentemente de qual geração. Criança tem espontaneidade. Como isso se dá no dia a dia é o que muda. Por exemplo, hoje, a gente tem a questão das telas, e como se dão os desdobramentos na rotina de cada uma. Mas, na essência da criança, a criança como criadora, como exploradora, pronta para entender esse mundo, isso não muda.
Diana: Tem uma mudança na nossa produção. No começo dos anos 2000, era uma estética mais artesanal. A gente teve um cenário que era feito com caixas de madeira, por exemplo. De um tempo para cá, a gente tem trabalhado mais com cenário em vídeo, com outras possibilidades de interação. Nesse show mais recente [Bailamos (2024)] tem muitos efeitos que são de redes sociais, dessa linguagem do reels do Instagram. Então, a gente vai se atualizando e, claro, isso também conversa com o contexto em que as crianças estão, a cultura e o momento histórico em que vivem.
conexão
Wem: “Quero começar” é uma música minha, de um trabalho anterior, que podia falar tanto com as crianças quanto com os adultos. E, de repente, ela se tornou uma música muito mais do Tiquequê do que minha. Do ponto de vista da composição, tem coisa que eu escrevo e já entendo que é do Tiquequê. Eu fico querendo entender como essa canção chega ao ouvido da criança de um jeito rico.
Diana: Quando começamos o Tiquequê, fazíamos shows em festas de aniversário, sem microfone, em buffet. Pensa nesse contexto, que é o mais disperso possível. A gente chegava no meio de um monte de cor, luzes, e pedia para as crianças se sentarem ali. Tínhamos 40 minutos para nos conectar com elas. Sempre fomos assertivos, porque a criança não tem tempo a perder, não vai ficar por “educação”. Se ela não curtir, vai se levantar e sair.
releituras
Diana: No início do projeto, a gente fazia releituras de outras músicas, e não necessariamente infantis. Por exemplo, “Cultura”, do Arnaldo Antunes, que a Palavra Cantada gravou e a gente também fez uma versão, é uma canção teoricamente
adulta. A gente adorava pegar músicas “adultas” [a exemplo de obras de Noel Rosa (1910-1937) e Jorge Ben] e regravar. Até porque, na nossa infância, a gente ouvia o que os nossos pais ouviam. Tem muita música que, se você for pensar, poderia ser infantil. Por exemplo, “Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça/ É ela a menina, que vem e que passa (...)”, ou “É pau, é pedra, é o fim do caminho (...)”. É simples de entender. Acho que a gente tem claro que compõe pensando na criança, mas é muito nesse espírito de que, no fundo, a boa composição precisa ser simples.
influências
Wem: Meu pai tinha uma discografia muito rica, todos os clássicos, os grandes compositores da música brasileira. E ele também gostava de música erudita. Ao mesmo tempo, como uma criança dos anos 1990, eu escutava muita música, tudo o que chegava, bastante cultura de massa, que era boa e ruim também. Mas, produção infantil mesmo, eu não ouvia. Fui conhecer esse universo mais velho, por conta do Tiquequê.
Diana: Em casa a gente escutava muito Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jorge Ben, Rita Lee (19472023). Na casa da minha avó, tinha todos os discos da Rita Lee, junto aos da Angélica, da Xuxa, do Balão Mágico. E de música internacional, ouvia muito Michael Jackson (1958-2009), meu pai gostava bastante. Eu tinha muitos discos de vinil da Coleção Disquinho, com as histórias infantis. Inclusive, no primeiro show do Tiquequê, a gente fez “Festa no céu”, uma versão dessa coleção. Até hoje, eu sei de cor o disco Os Saltimbancos (1977): as músicas, as falas dos personagens, do começo ao fim.
telas
Wem: Todos nós vivemos a individualização do entretenimento por meio das telas. Porque você pode ver o que quiser. Só que tem um lado ruim: é algo solitário. Você nunca está compartilhando um momento, uma experiência de entretenimento com alguém. E eu acho que quando a gente faz música para criança – no Tiquequê – a gente está sempre dialogando diretamente com elas. A gente pensa também na família, no adulto. Porque espera que o adulto curta aquilo e quebre um pouco essa sensação de solitude, de cada um estar em frente a uma tela.
Então, existe essa experiência das telas, mas, ao mesmo tempo, uma cumplicidade fora, com mais de uma pessoa ou pessoas de gerações diferentes: pai, mãe, irmãos, avós.
Assista ao vídeo com trechos da entrevista com a dupla Diana Tatit e Wem, do Tiquequê, gravada em julho de 2024, no Sesc Vila Mariana.
Adriana
Vichi
Diana Tatit, mestre em educação pela USP, e Wem, bacharel em composição, combinam experiências acadêmicas e profissionais para enriquecer a faceta educativa que o duo musical incorpora.
ALMANAQUE
Mais de cem
Conheça cinco casarões centenários que estão abertos à visitação e ajudam a contar a história da cidade de São Paulo
POR LUNA D’ALAMA
Neste ano, edifícios icônicos da cidade de São Paulo completam um século de existência. Um deles é o Palácio das Indústrias, obra do engenheiro e arquiteto Ramos de Azevedo (1851-1928) que, no passado, já abrigou a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, a Prefeitura de São Paulo e, desde 2009, é a sede do Museu Catavento.
Outros dois importantes prédios também acabam de completar cem anos: o Edifício Martinelli – que começou a ser construído em 1924 e foi inaugurado cinco anos depois – e o Edifício Sampaio Moreira, sede da Secretaria Municipal da Cultura desde 2018. Assim que terminou de ser erguido, o Martinelli
ostentou o título de maior arranha-céu da capital, mas perdeu o posto para o Banespa (atual Farol Santander), em 1944. Atualmente, o prédio tem promovido visitas guiadas (mediante agendamento online) e festas em comemoração ao centenário. Tanto o Martinelli quanto o Sampaio Moreira foram projetados em estilo arquitetônico eclético, misturando elementos clássicos, medievais, renascentistas, barrocos e neoclássicos.
A seguir, conheça outros cinco prédios da capital paulista que já chegaram aos cem anos – ou ultrapassaram a marca de um século –, são patrimônios históricos e culturais da cidade e estão de portas abertas para visitação gratuita. Bom passeio!
João Caldas Filho
INSTITUTO ARTIUM
Construído entre 1920 e 1921, por um industrial sueco, o Palacete Stahl tem referências da arquitetura eclética do século 20 e, também, do estilo Luís 16, com cores claras e detalhes em dourado. Testemunha de diferentes ciclos econômicos e transformações urbanas de São Paulo, o casarão já serviu de residência para os cônsules da Suécia e do Japão, além de ter
sido o lar de um cafeicultor e de um banqueiro. Por quase três décadas, entre 1980 e 2007, a edificação – localizada próximo ao Parque Buenos Aires – ficou fechada, até ser comprada e restaurada. Desde 2021, abriga a sede do Instituto Artium de Cultura e é considerado patrimônio histórico municipal, com amplos cômodos, jardins externos e bancos
Além de abrigar exposições, o Artium recebe espetáculos teatrais e recitais em seus cômodos.
CASA DA IMAGEM
Conhecida como Casa nº 1 da cidade de São Paulo e situada ao lado do Solar da Marquesa de Santos, a Casa da Imagem data do fim do século 19. No entanto, registros apontam que, antes dela, havia uma residência de taipa de pilão no terreno, pertencente ao sertanista Francisco Dias Velho (1622-1687), que a vendeu ao bandeirante Gaspar Godoy Moreira (1635-1693). Por volta de 1880, o major e banqueiro Benedito Antônio da Silva (1822-1902) demoliu o casarão e construiu um imóvel de três andares, que se mantém até hoje. A Casa nº 1 foi vendida ao Estado em 1894 e, por mais de um século, abrigou diversos órgãos e instituições públicas ou sem fins lucrativos, como o Instituto Genealógico Brasileiro e o Departamento do Patrimônio Histórico. Em 1998, a edificação foi incluída no tombamento da região do Pátio do Colégio. O prédio foi restaurado entre 2008 e 2011, quando foi inaugurada a Casa da Imagem, que detém uma coleção de 84 mil fotografias pertencentes ao Museu da Cidade – formado por outros 11 casarões históricos, como o Solar da Marquesa e a Casa Modernista. Criada para ser a sede do acervo iconográfico paulistano, a Casa da Imagem desenvolve ações voltadas à memória da imagem documental da cidade, promovendo sua preservação, pesquisa e difusão.
Rua Roberto Simonsen, 136-B, Sé, São Paulo (SP). Terça a domingo, das 9h às 17h. GRÁTIS. museudacidade.prefeitura.sp.gov.br
para leitura. Até 3 de novembro, o Artium apresenta a exposição Matéria prima, da artista Gisela Colón, sob curadoria de Simon Watson.
Rua Piauí, 874, Higienópolis, São Paulo (SP). Quarta a sexta, das 12h às 18h. Sábados e domingos, das 10h às 18h. GRÁTIS. @institutoartium
No acervo da Casa da Imagem, a história de São Paulo é contada por meio de registros fotográficos da arquitetura, do cotidiano e dos habitantes da cidade.
ALMANAQUE
MUSEU DO TJSP
MUSEU DO LIVRO ESQUECIDO
A Casa Ranzini foi construída há exatos cem anos, em estilo eclético florentino, com fachada ornamentada com elementos renascentistas, para residência do arquiteto italiano Felisberto Ranzini (1881-1976). O neto do proprietário viveu no endereço até 2006, quando o casarão foi vendido e passou a abrigar oficinas e exposições de arte e fotografia. Em 2021, foi adquirido por um grupo de sócios, que restaurou parcialmente o local e o transformou no Museu do Livro Esquecido, inaugurado há dois meses. O acervo inclui três mil itens, entre obras raras e primeiras edições de literatura brasileira e estrangeira, além de títulos acadêmicos ligados à
história do livro e da tipografia. Está em cartaz no local, até 23 de fevereiro de 2025, a exposição A solidão e a escrita, que destaca a trajetória e os trabalhos das brasileiras Carolina Maria de Jesus (1914-1977) e Teresa Margarida da Silva e Orta (1711-1793), além da italiana Cristina de Pisano (1364-1431). O museu oferece visitas guiadas e audioguias. A casa também abriga um laboratório de restauro e encadernação de livros em seu porão.
Rua Santa Luzia, 31, Sé, São Paulo (SP). Sábados e domingos, das 10h às 17h. Durante a semana, funciona mediante agendamento. GRÁTIS. @museudolivroesquecido
O acesso aos livros do acervo do Museu do Livro Esquecido é feito mediante solicitação de consulta por telefone ou e-mail.
No alto de uma colina, com vista para o vale do rio Tamanduateí, foi erguido o Palacete Conde de Sarzedas, entre 1891 e 1895. O nome faz referência ao patriarca da família proprietária, o administrador português D. Bernardo José de Lorena (1756-1818), que governou a capitania de São Paulo por quase uma década e recebeu, do rei da Espanha, o título de 5º Conde de Sarzedas. Os descendentes de Lorena ocuparam o imóvel até 1939. Em 2002, o casarão foi restaurado e tombado pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) e, em 2007, passou a abrigar o Museu do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Trata-se de um espaço de difusão cultural, cujo objetivo é preservar e expor objetos, documentos, móveis, símbolos e outros elementos ligados à história do Poder Judiciário paulista. No local, há mostras, eventos e outras atividades relativas à memória do tribunal.
Rua Conde de Sarzedas, 100, Sé, São Paulo (SP). Segunda a sexta, das 13h às 17h. GRÁTIS. tjsp.jus.br/museu
da mala" e o "Crime do restaurante chinês", entre outros casos que marcaram a história de São Paulo.
Pedro
Zimerman
(Museu do Livro
Esquecido)
/
Klaus
Silva
(Museu do TJSP)
No núcleo Tribunal do Júri, o visitante do Museu do TJSP encontra o processo do "Crime
CASA DA BOIA
Considerada referência na venda de produtos de cobre, latão, bronze e alumínio, além de boias para caixa-d'água e itens de jardinagem, a Casa da Boia teve sua sede edificada em 1909, em estilo eclético e com elementos de art nouveau. O sobrado tem dois pavimentos (o andar inferior era comercial e o superior, residencial) e foi fundado
pelo empresário de origem síria Rizkallah Jorge Tahan (1895-1949). Em 2003, uma sala no segundo piso foi reformada e passou a abrigar o Museu Rizkallah Jorge, com fotos, documentos, peças e máquinas antigas da empresa. Em 2008, a Casa da Boia foi restaurada e recuperou suas cores originais. Além dos clientes habituais, o casarão recebe
visitas monitoradas e gratuitas, na última quinta-feira de cada mês, em dois horários: às 10h e às 14h. Os guias são historiadores que recebem turmas de até 30 pessoas.
Rua Florêncio de Abreu, 123, Centro, São Paulo (SP). Segunda a sexta, das 8h às 17h45. GRÁTIS. casadaboia.com.br
No terceiro andar da Casa da Boia, onde fica o museu, foram preservados, em algumas paredes, detalhes da decoração original.
Tudo o que aprendo com as juventudes
Depois de cinco anos imersa em ações dedicadas às infâncias, atuo, desde 2022, com o programa Juventudes, do Sesc São Paulo. Se as crianças me mostraram o mundo pela curiosidade e descoberta, as juventudes vêm me ensinando o valor da inquietação, da busca por identidade e da constante transformação. Elas trazem uma pluralidade de olhares que desafiam percepções e ampliam minha compreensão sobre o que significa viver e resistir em um mundo em constante mudança. O aprendizado é diário e profundo, vai além de qualquer estrutura geracional. Suas vivências são moldadas pelos corpos que habitam, pelos territórios que ocupam e pelas experiências que carregam – todas únicas. Cada jovem é um universo singular, repleto de histórias, sonhos e desafios.
Aprendi que as juventudes exigem um olhar atento, respeitoso e empático por parte da sociedade. Elas não querem apenas ocupar espaços; querem redefinir esses espaços com suas vozes, atitudes e formas de ser. E é nossa responsabilidade acolher esses movimentos, pois neles residem demandas por reconhecimento e justiça. Suas manifestações, sejam artísticas, políticas ou sociais, são reflexos de uma geração que não aceita o conformismo e nos convida a revisitar nossos conceitos de cidadania e pertencimento. Precisamos ouvi-las com seriedade, pois seus gritos de alerta apontam para questões que afetam a todos nós, mas que muitas vezes são negligenciadas.
As juventudes são, também, porta-vozes de uma nova consciência. Elas nos lembram, com urgência, dos perigos da crise climática e da importância de construirmos cidades e ambientes mais saudáveis e receptivos.
Em cada debate e ação, elas demonstram uma capacidade extraordinária de reimaginar o futuro – não como uma espera distante, mas como uma construção do presente, feita aqui e agora. Nos desafiam a ver o mundo com novos olhos, com a clareza de quem entende que a transformação não pode mais ser adiada. Esse processo de aprendizado mútuo não é apenas enriquecedor para o meu trabalho, mas essencial para o avanço de uma sociedade que precisa de novos paradigmas. As juventudes são o presente pulsante que exige ser ouvido, valorizado e respeitado.
A prática da alteridade também é fundamental para a relação entre o universo adulto e as juventudes. Enxergar os jovens a partir da alteridade significa abrir espaço para uma escuta genuína, na qual suas vivências são reconhecidas como próprias e válidas. Apenas através desse olhar respeitoso conseguimos criar um diálogo real e construir pontes entre gerações.
A alteridade nos desafia a sair de nossos lugares de conforto e a nos colocarmos na posição de aprendizes. Quando vemos os jovens através desse prisma, percebemos que suas inquietações e sonhos são expressões legítimas de um desejo de transformar o presente. Para que as juventudes possam exercer plenamente seu papel transformador e sejam respeitadas em sua diversidade, é essencial fortalecer ações sociais e criar espaços de acolhimento, diálogo e expressão, promovendo o desenvolvimento de uma consciência crítica e colaborativa que resulte em soluções criativas para os desafios contemporâneos. Por meio de programas como o Juventudes, o Sesc São Paulo oferece um ambiente acolhedor, seguro e plural, onde os jovens encontram ferramentas para explorar suas potencialidades, compartilhar suas inquietações e contribuir para uma sociedade mais alegre, reflexiva e equânime.
Ana Cristina Amaia Batista é mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e atua na Gerência de Estudos e Programas Sociais do Sesc.