DEPOIMENTO
HELVÉCIO RATTON
Lente para mudanças AUTOR DE FILMES QUE REPERCUTEM QUESTÕES SOCIAIS, COMO A SAÚDE MENTAL E A POLÍTICA, CINEASTA MINEIRO VIVENCIA PAUSA PARA PENSAR EM FUTUROS PROJETOS
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Bianca Aun
“A
té hoje, sinto os cheiros de lá. Cheiros de suor, de sofrimento, de sujeira… Algo que nunca mais saiu de mim”, conta Helvécio Ratton sobre o período em que registrou o modo como sobreviviam milhares de homens e mulheres internados no Hospital Colônia de Barbacena (MG). O ano era 1979, e o cineasta, recém-formado em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, havia conseguido a permissão da Secretaria de Saúde do estado para entrar e registrar as atrocidades que depois o Brasil e outros países iriam assistir no média-metragem Em Nome da Razão (1979), obra que teve um importante papel na luta antimanicomial e que estreia neste mês na programação do SescTV. Curiosamente, o mais recente filme de Ratton também trata de um estado que beira a loucura, mas sob a ótica da ficção. Baseado no conto homônimo do escritor mineiro Murilo Rubião (1916-1991), o longa-metragem O Lodo (2020) foi exibido na programação online da 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, entre outubro e novembro do ano passado. Mesmo que debruçado sobre temas densos, como as produções já mencionadas e Batismo de Sangue (2007), baseado no livro de Frei Betto sobre a participação de frades dominicanos na luta contra a ditadura militar, Ratton também ajusta a lente para a beleza da infância vivida por ele no quintal de casa, subindo em árvores, brincando com amigos e jogando futebol na rua. Lembranças que acompanham longas como Menino Maluquinho – O Filme (1995), inspirado na obra de Ziraldo, e Uma Onda no Ar (2002), que evidencia a criatividade e iniciativa de jovens em uma grande favela de Belo Horizonte. “Sempre quis fazer filmes que tivessem, de alguma forma, uma repercussão social”, conta o cineasta, que, ao lado da produtora e parceira Simone Magalhães Matos, criou e coordena a Quimera Filmes.