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Case da NEXT Chemical

DESAFIOS DE UMA STARTUP DE NANOMATERIAIS: CASE DA NEXT CHEMICAL

por Anne Elize Puppi Stanislawczuk

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Startup é uma palavra em voga nos últimos anos. Contudo, muito maior do que apenas uma palavra, ou até mesmo do que um conceito, startup se tornou um universo. Ocorre que, no Brasil, este universo é composto majoritária, senão quase que exclusivamente, por empresas de tecnologia da informação. Hoje, após quase oito anos acompanhando startups, principalmente na área de nanotecnologia e materiais, compreendo o porquê.

O desafio de uma startup de nanotecnologia e materiais é hercúleo. O desenvolvimento e validação da tecnologia em si é apenas parte de um sistema bastante complexo, onde ser uma startup muitas vezes se resume, infelizmente, a ser apenas uma palavra da moda.

Maturidade tecnológica e o vale da morte

A correta avaliação do nível de maturidade tecnológica (TRL) numa startup é crucial, pois a parte do desenvolvimento experimental, entre TRL 3 e 6, exige investimentos massivos, conforme se verifica através da curva de dispêndio na Figura 1.

Esta é a fase de maior risco do projeto, o famoso vale da

morte, onde o capital é aportado sem haver uma certeza sobre a tecnologia. Contudo, é justamente nessa fase em que se encontram as pequenas empresas (HENSEN et al, 2015). As grandes corporações e parte dos editais de fomento exigem um grau de desenvolvimento tecnológico maior – e preferencialmente uma carteira de clientes – competindo assim à startup suportar boa parte dos custos de desenvolvimento muitas vezes com capital próprio, financiamentos bancários ou através instrumentos de captação, como investidores anjo, seed ou venture capital. Contudo, apesar destes recursos existirem, sua obtenção ainda não é tão trivial.

Nesse ínterim, ecossistemas públicos e privados de inovação voltados para nanotecnologia e materiais são essenciais ao desenvolvimento de novas startups, provendo estrutura física, auxílio na gestão burocrática e visibilidade para a captação de recursos. Ademais, novos editais de fomento, com valores não irrisórios, exclusivos para startups – mesmo com baixo TRL –, e iniciativas como EMBRAPII para a contratação de projetos são fundamentais.

A meu ver, desenvolver uma startup de nanotecnologia e materiais completamente isolada é improvável. Não somente pela estrutura física necessária de uma planta industrial piloto e um laboratório analítico de última geração, mas principalmente pelo desenvolvimento do conhecimento e validação da tecnologia. São necessárias diversas equipes pensando sobre diferentes temas coligados.

Além disso, é importante considerar questões burocráticas como arcabouço regulatório e tributário aplicáveis, pois apesar de ser uma startup não há um sandbox regulatório para novos materiais, ou seja, há uma extensa legislação a ser cumprida.

Aceitação de novas tecnologias

A aceitação de novas tecnologias se impõe como uma barreira de difícil transposição. A primeira questão enfrentada é a econômica, pois tecnologia muitas vezes é vista como sinônimo de custo.

Figura 3. Possibilidade de redução significativa no consumo de cimento

O fascínio que muitas vezes temos pelas propriedades agregadas pela nanotecnologia nem sempre é compartilhado com o mesmo entusiasmo pelos compradores. O investimento em tecnologia para a melhoria da qualidade dos produtos é raro, geralmente há que se agregar um conjunto de benefícios para facilitar a aceitação. Aliado a isso, a tecnofobia é, ainda por cima, surpreendentemente comum. Transmitir um alto grau de confiabilidade se torna indispensável e isso pode dificultar o lançamento de uma startup. Assim, inserir uma tecnologia nova no mercado é um grande desafio, mas é possível.

NEXT Chemical

A NEXT Chemical faz parte do Grupo Intrepid, que investe principalmente em energia, com a Electra Energy, uma das maiores comercializadoras independentes de energia do país e projetos de geração. O grupo possui um braço de investimentos em tecnologia através da Tendrix Labs, que atua como uma gestora privada de inovação, investindo em inteligência artificial, nanotecnologia e fotônica.

O grupo investe em nanotecnologia desde 2013, inicialmente com nanotecnologia aplicada a catalisadores para biodiesel. Contudo, este projeto sofreu uma série de desafios, especialmente quanto à aceitação da tecnologia e valores necessários para investimentos em capex, o que levou ao seu encerramento e completa remodelação da companhia sob minha gestão. Assim, no ano de 2018, originou-se a NEXT Chemical.

A empresa conta com um laboratório muito bem equipado com FTIR, DRX e UV-VIS, dentre outros equipamentos, corpo técnico altamente qualificado em diferentes especialidades e uma planta industrial piloto em operação com capacidade de produção de 40 ton/mês. Atualmente, a produção está concentrada em nanopartículas de sílica, óxido de zinco e dióxido de titânio, através de variadas rotas, conforme tamanho e morfologia específicos para diferentes aplicações, primando sempre pela qualidade e segurança de nossos produtos.

As nanopartículas de sílica produzidas pela NEXT Chemical possuem alta pureza, elevada área superficial, baixo índice de refração, uniformidade, grande estabilidade, e podem ser funcionalizadas para diversos objetivos, como a obtenção de caráter hidrofóbico e a formação de redes mesoporosas. Trata-se de um material extremamente versátil, não tóxico, com preço competitivo, e possui aplicações em diversos segmentos como construção civil, agricultura, tintas e coatings, polímeros, fármacos e cosméticos, eletrônicos, além da possibilidade de formação de nanocompósitos.

No concreto, a adição de nanosílica à mistura do traço melhora consideravelmente suas propriedades mecânicas. As nanopartículas de sílica podem potencialmente se ligar à portlandita ou ao hidróxido de cálcio remanescentes formando ligações adicionais de C-S-H, promovendo a aceleração no processo de dissolução e melhor hidratação do cimento, além de reduzirem a

porosidade com o aumento das cadeias de silicato, densificando a mistura e promovendo, consequentemente, maior resistência mecânica e durabilidade ao concreto.

Considerando estas propriedades, desenvolvemos uma linha de aditivos para concreto, que após fase de testes, inclusive através do ISI em Engenharia de Estruturas de Maringá e LACTEC, iniciam a fase de comercialização trazendo um grande ganho de resistência no concreto já no estágio inicial, mantendo a trabalhabilidade e fluidez da massa, o que nos possibilita efetuar uma considerável redução no consumo de cimento, conforme Figura 03, aliando economia e a possibilidade de obtenção de selo verde pela redução de emissões de CO2 equivalente.

Outras aplicações desenvolvidas pela NEXT Chemical se referem ao setor de tintas e coatings, inclusive para materiais poliméricos e cerâmicos, drug delivery e encapsulamento de ativos em parceria com o Laboratório BIOPOL da UFPR liderado pelo Prof. Dr. Rilton Alves de Freitas.

As nanopartículas de óxido de zinco e dióxido de titânio possuem reconhecida atividade biocida. Com o advento da pandemia de COVID, passamos a desenvolver o nosso produto tecnológico base, formulado com uma blenda de nanopartículas. O produto base em diferentes superfícies e aplicações já foram testados por laboratórios terceiros comprovando a atividade bactericida (CONTROLBIO teste JIS Z 2801; IST teste AATCC TM 100:2012), fungicida (TECLAB testes SM 9215/C, SM 9610/C, SM 9260/B, SM 2017; CONTROLBIO teste NBR 15987) e antiviral (IMUNOVA).

É um produto economicamente viável, não citotóxico, passível de ser modificado para atender diferentes demandas, inclusive para polímeros e fibras sintéticas, conforme projeto em andamento com o SENAI CETIQT, sendo importante citar que utilizamos somente nanopartículas consideradas como seguras e eficazes, denominadas GRASE – generally recognized as safe and effective – pela agência norte-americana FDA.

No tocante ao grafeno, a sinergia entre ele e outras nanopartículas, como óxido de zinco e sílica, tem se mostrado bastante promissora na literatura para áreas como sensores, filtros, baterias, polímeros, etc. A nanosílica, por exemplo, possui estrutura ideal tanto para mitigar a agregação do grafeno, como para atribuir novas propriedades aos nanocompósitos. A combinação de grafeno com algumas de nossas nanopartículas vem sendo testada num projeto de eletrodo nanoestruturado multifuncional para células solares com o Grupo de Dispositivos Nanoestruturados da UFPR liderado pela Prof. Dra. Lucimara Stolz Roman.

Referências

ABGI BRASIL. TRL: recursos financeiros por níveis de maturidade tecnológica. Disponível em: https://brasil.abgi-group.com/radar-inovacao/artigos-estudos/trlrecursos-financeiros-por-niveis-de-maturidade-tecnologica/.

HENSEN, Jan LM et al. Using Building Simulation for Moving Innovations across the ‘Valley of Death.’. REHVA Journal, v. 52, n. 3, p. 58-62, 2015.

WANG, Ming-Shan et al. In situ catalytic growth 3D multi-layers graphene sheets coated nano-silicon anode for high performance lithium-ion batteries. Chemical Engineering Journal, v. 356, p. 895-903, 2019.

WANG, Rui et al. A novel nanosilica/graphene oxide hybrid and its flame retarding epoxy resin with simultaneously improved mechanical, thermal conductivity, and dielectric properties. Journal of Materials ChemistryA, v. 3, n. 18, p. 9826-9836, 2015.

YANG, Kaijie; CHEN, Baoliang; ZHU, Lizhong. Graphene-coated materials using silica particles as a framework for highly efficient removal of aromatic pollutants in water. Scientific reports, v. 5, n. 1, p. 1-12, 2015.

Profa. Dra. Anne Elize Puppi Stanislawczuk, Diretora de operações da NEXT Chemical, startup nacional na área de materiais voltada para nanotecnologia.

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