26 Andes Cadernos
ISSN 18677-8707
CAPA
A Educação como ferramenta de luta
outubro/2015
26 Andes Cadernos
ISSN 18677-8707
A Educação como ferramenta de luta
outubro/2015
Cadernos ANDES-SN
A Educação como ferramenta de luta Número 26 Outubro/2015 Brasília/DF
Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior www.andes.org.br
Comissão Editorial Francisco Jacob Paiva da Silva Giovanni Felipe Ernst Frizzo Marta Maria Azevedo Queiroz Olgaíses Cabral Maués Tiago Leandro da Cruz Neto Projeto Gráfico Paola Rodrigues (10982 DRT-DF) Normalização Bibliográfica CEDOC/ANDES-SN Edição e Revisão Imprensa ANDES-SN Marinalva Oliveira (Encarregada de Imprensa) Renata Maffezoli (Jornalista responsável - Mtb 37322) Fotos Renata Maffezoli Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior Sede Nacional - Setor Comercial Sul (SCS), Quadra 2, Edifício Cedro II, 5º andar, Bloco “C”, - CEP: 70302-914 - Brasília-DF Fone: (61) 3962-8400 - Fax: (61) 3224-9716 www.andes.org.br
Catalogação da fonte Cadenos ANDES - n.1 (1988) n.26 ISSN: 1677-8707 1.Educação - Periódicos 2. Ensino Superior - Periódicos 3. Ensino Superior - Financiamento - Periódicos 4. Ensino Superior - Fundações Privadas Periódicos 5. Movimento Docente - Periódicos 6. Sindicalismo - Periódicos
Apresentação........................................................... 09 A Educação Básica na ótica da “Pátria Educadora”....... 13 O sistema nacional de educação na perspectiva do projeto “Pátria Educadora”: a Cooperação Federativa.............. 25 O sentido da PEC 395/2014 para a Educação Pública... 41 O projeto de lei 4372/2012: a regulação e a avaliação da Educação................................................................. 47
Sumário
Apresentação
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Apresentação
O
ANDES-SN dá continuidade a uma atividade muito importante que é a publicação das análises e avaliações da legislação educacional, incluindo projetos de lei, proposta de emenda constitucional e leis, além de documentos elaborados pelo Ministério da Educação e outros órgãos governamentais, que abordem ou não a temática da educação. Nos últimos tempos, o material referente à política da educação tem sido abundante, para todos os níveis, etapas e modalidades de ensino. Esse conjunto de normas e leis tem vindo ao encontro das novas concepções de educação emanadas do Capital e assumidas pelo governo brasileiro. Esse quadro tem exigido que o ANDES-SN faça uma crítica fundamentada, tendo como objetivo subsidiar a sua base para os enfrentamentos necessários às alterações decorrentes dessas políticas. Com a Reforma que o Estado se submeteu, para se adequar à globalização transnacional, ou a uma nova fase do capitalismo, houve a alteração de grande número das normas existentes e, consequentemente, a criação de novas regulamentações que pudessem, dentro de outra lógica, restabelecer o equilíbrio necessário para o funcionamento do sistema. A mercantilização e a privatização da educação vêm sendo a tônica dessas políticas educacionais, que, para serem implementadas, precisam criar novas regulações. Estas são resultantes de injunções que incluem o próprio fenômeno da globalização, bem como as mediações feitas em nível local que tentam ajustar os contextos mais amplos às realidades menores. A partir dessa nova regulação, políticas de gestão, de financiamento e de avaliação são estabelecidas, adequando, dessa forma, as normas, as orientações e as regras aos interesses do governo, que visa equilibrar a educação ao ajuste demandado pelo Capital. Na retomada da publicação do Caderno estão sendo analisados alguns documentos produzidos pelos poderes Executivo e Legislativo. Foram selecionadas as seguintes proposições: Documentos da Secretaria de Assuntos Educacionais (SAE): 1. Pátria Educadora: a Qualificação do Ensino Básico como obra de Construção Nacional; 2. Pátria Educadora. Eixo 1Federalismo Cooperativo. Além desses, foram também apreciados o Projeto de Lei (PL) 4312 de 2012 e a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 395 de 2014.
12 O primeiro documento da SAE se propõe a indicar caminhos para a construção de um “projeto nacional de qualificação do ensino básico”, defendendo a “qualidade”, mas criando, na realidade, uma escola dualista e discriminatória, e adotando um sistema de controle e avaliação que busca o alcance de metas, ignorando o aluno enquanto sujeito e considerando-o como “produto”. O segundo documento da SAE trata da criação do Sistema Nacional de Educação, trazendo inclusive uma proposta de projeto de lei. Além dos inúmeros fatores que são analisados referentes ao documento, destaca-se a ausência total de referência da fonte dos recursos necessários a sua implementação. Em relação ao projeto de Lei 4.372 de 2012, que propõe a criação do Instituto de Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (INSAES), a análise realizada aponta para a duplicidade de funções com outros órgãos existentes no Ministério da Educação (MEC), como o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) e a Secretaria de Educação Superior (Sesu), além da concepção de que um mesmo órgão execute as atividades de supervisão e avaliação. Finalmente, o Caderno do ANDES-SN analisa a Proposta de Emenda Constitucional 395 de 2014, que objetiva acabar com a gratuidade dos Cursos de Especialização, Extensão e do Mestrado Profissional, aprofundando as políticas de privatização e mercantilização da educação. A seleção do material para compor este Caderno se baseou na Resolução do 60º Conad (2015), realizado em Vitória-ES, e na própria conjuntura que vem exigindo respostas mais ágeis às questões educacionais. As análises feitas e que se constituem no corpus do Caderno estão apoiadas nos princípios defendidos pelo ANDES-SN e publicizados no Caderno nº 2 e nas resoluções aprovadas em Congressos e Conad, traduzindo, portanto, a defesa intransigente da educação pública, gratuita, laica e socialmente referenciada, feita pelo Sindicato Nacional. Espera-se que o Caderno 26 do ANDES-SN possa contribuir efetivamente com as análises críticas das medidas privatizantes que vem sendo regulamentadas pelo governo e por organizações não estatais, e que sirvam para elaboração de outras políticas voltadas para os interesses da classe trabalhadora e da sociedade como um todo.
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A Educação Básica na ótica da “Pátria Educadora”
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A Educação Básica na ótica da “Pátria Educadora”
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texto tem como objetivo apresentar uma análise do documento da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República do Brasil, intitulado “Pátria Educadora: A qualificação do ensino básico como obra de construção nacional”, apontando que o slogan “Pátria Educadora” é o instrumento viabilizador que busca dar o arremate ao projeto de privatização da educação. Nos anos de 1990, com a reforma do aparelho administrativo do Estado brasileiro (governo FHC), foi iniciada a implementação de políticas educacionais de caráter neoliberal, orientadas pelo Banco Mundial, com base no Consenso de Washington. Dada a dificuldade de correlação de forças, sobretudo no Congresso Nacional, e em face da resistência dos movimentos sociais representados pelo Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, o governo de Fernando Henrique Cardoso não conseguiu alcançar todos os objetivos pretendidos. O governo de Luis Inácio Lula da Silva deu continuidade a essas políticas, contando com significativo apoio de parte do Congresso Nacional, como também de segmentos importantes do movimento social: entidades, sindicatos, ONG, cujos representantes passaram a constituir equipes de governo para a construção e implementação dessas políticas, pautadas em marcos regulatórios sob a égide do grande Capital. Nesse governo ficou mais clara a opção pelo setor privatista, quando ocorreu a criação do PROUNI – Programa Universidade para Todos, a expansão do “crédito educativo” via FIES - Fundo de Financiamento Estudantil, o fortalecimento do Sistema S, entre outros. O governo Dilma Rousseff (2011-2014; 2015) acentua a lógica privatizante e mercantil na educação, apoiada em significativos marcos regulatórios, entre os quais o Plano Nacional de Educação (2014-2024), que ressignifica o caráter público da educação, expande as parcerias público-privadas, garante o investimento público no setor privado da educação, fortalecendo a lógica empresarial, com a formação voltada para o mercado de trabalho.
A qualificação do ensino básico O documento da SAE apresenta “proposta preliminar para discussão,
16 diretrizes de um projeto nacional de qualificação do ensino básico”. Está dividido em duas partes: 1) A tarefa: onde é apresentado o ideário do projeto; 2) Iniciativas: onde é apresentado um conjunto de ações que, segundo o documento, se “executadas em ordem sucessiva, começariam a dar realidade ao ideário” (BRASIL, SAE, 2015, p. 1). A qualidade do ensino é o mote principal do documento em questão e das ações nele propostas: “a onda da ampliação precisa ser seguida agora por onda de qualificação” (BRASIL, SAE, 2015, p. 3). O debate sobre a qualidade do ensino público sempre esteve presente nas discussões e proposições de projetos de política educacional dos setores em defesa da educação pública gratuita. Porém, o que se observa é a polissemia do conceito de qualidade e, consequentemente, quais ações devem ser implementadas para garantir a tão propalada qualidade da educação. A depender dos sujeitos sociais e do projeto de educação que se defenda, a representação da qualidade tem diversos sentidos. A história da educação brasileira sempre foi marcada pelas tensões existentes entre o projeto de educação dos setores privados e o projeto de educação pública, gratuita, laica e de qualidade socialmente referenciada, de cuja defesa o ANDES-SN é um dos protagonistas. Na atual conjuntura, essas tensões têm sido demarcadas pelos avanços dos setores privatistas da educação, integrados na coalização, empresarial e midiática, intitulada “Todos Pela Educação”. Estes, tanto no bojo da sociedade civil quanto no interior dos governos federal, estaduais e municipais têm expandido os seus espaços para ratificar e construir seu projeto ético-político de educação privada. Para tais setores, a qualidade da educação tem como referência a experiência da gestão empresarial. Ao significar o estudante como “produto”, este passa a ser o elemento fundamental da ação educativa. É, nessa representação, que são definidos os esteios da qualidade para a educação na ótica privada, que garantirão meios para o mercado, enfatizando a “concorrência”, a “rentabilidade” e o “produtivismo”, e pressupondo a exclusão dos considerados “menos aptos”. O documento “Pátria Educadora” afirma como estratégia de desenvolvimento para a qualidade o “produtivismo includente”, pautado pela “democratização do lado da demanda” através do financiamento bem como pela “democratização do lado da oferta” com “inovações institucionais”. (BRASIL, SAE, p. 4). Para a “democratização do lado da oferta e da demanda”, a proposta, segundo a SAE, é: “aprender com a orientação empresarial”, aproveitar a “lógica da eficiência empresarial (fixação de metas de desempenho, continuidade da avaliação, uso de incentivos e métodos de cobranças, despolitização da escolha de diretores, individualização do ensino); “modificar a
17 maneira de ensinar e aprender” através de um “aprofundamento seletivo” focados em “análise verbal e de raciocínio lógico”; “organizar sistema nacional de ensino” (BRASIL, SAE, p. 5-6).
O debate sobre a qualidade da educação para o ANDES-SN: apontamentos Para o ANDES-SN, a qualidade da educação pública está relacionada à qualidade socialmente referenciada, tomando como referência o PNE da Educação: proposta da sociedade brasileira (PNE, 1997, p. 10): A qualidade social implica providenciar educação escolar com padrões de excelência e adequação aos interesses da maioria da população. Tal objetivo exige um grande esforço da sociedade e de cada um para ser atingido, considerando as dificuldades impostas pela atual conjuntura. De acordo com essa perspectiva, são valores fundamentais a serem elaborados: solidariedade, justiça, honestidade, autonomia, liberdade e cidadania. Tais valores implicam no desenvolvimento da consciência moral e de uma forma de agir segundo padrões éticos. Assim, a educação de qualidade social tem como consequência a inclusão social, através da qual todos os brasileiros se tornem aptos ao questionamento, à problematização, à tomada de decisões, buscando as ações coletivas possíveis e necessárias ao encaminhamento dos problemas de cada um e da comunidade onde vivem e trabalham. Incluir significa possibilitar o acesso e a permanência, com sucesso, nas escolas, significa gerir democraticamente a educação, incorporando a sociedade na definição das prioridades das políticas sociais, em especial, a educacional.
O ANDES-SN, no Caderno 2 (2013 – Edição revisada), apresenta os “princípios que fundamentam o Padrão Unitário de Qualidade”:1. Ensino público, gratuito, democrático, laico e de qualidade para todos; 2. Autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial; 3. Democratização interna e liberdade de organização; 4. Indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; 5. Condições de trabalho dos docentes (ANDES, 2013, p.50) A implantação do padrão unitário de qualidade implica em elaboração de políticas que se contraponham a uma política de educação que concebe o dualismo educacional, a coexistência de “centros de excelência” e de “instituições periféricas”. O padrão unitário de qualidade busca instituir uma educação emancipadora, desenvolvendo um processo de ensino, de gestão democrática e avaliação, que possibilitem aos sujeitos a consciência do papel político que devem desempenhar.
18 Construir o Federalismo Cooperativo no Ensino Básico A proposta de construção de um Federalismo Cooperativo do documento em questão vem ao encontro do que aparece no PNE (2014-2024) como Regime de Colaboração, estratégia de responsabilização compartilhada entre União, Estados e Municípios, no sentido do cumprimento das metas e estratégias aprovadas no Plano Nacional. Para o documento “Pátria Educadora”, com um discurso justificado pela extensão territorial, pela complexidade e tradições políticas do país, a solução “não é federalizar o ensino básico”, mas sim “organizar o federalismo cooperativo em educação”, reconciliando “a gestão local com padrões nacionais”, a partir de três instrumentos: “1) sistema nacional de avaliação e acompanhamento; 2) mecanismo para redistribuir recursos e quadros de lugares mais ricos para lugares mais pobres; 3) procedimentos corretivos para consertar redes escolares locais defeituosas” (BRASIL, SAE, p.7) Tal proposta trata o federalismo desconsiderando a diversidade regional, as condições socioeconômicas e as tradições culturais locais, como se fosse possível homogeneizar a heterogeneidade, marca indelével da sociedade brasileira. Para sua consecução, pretende também assegurar um rigoroso processo de seleção através da Prova Brasil para segregar alunos “talentosos” dos alunos que apresentam “inibição sócio emocionais” destinando-os a tipos diferenciados de escolas, mantendo a velha dualidade presente na educação brasileira, de escolas para ricos e escolas para pobres, que assegura a continuidade da pirâmide educacional em que apenas uma pequena parcela dos que ingressam na educação básica conseguem concluir a educação superior. Uma outra pretensão da proposta é “identificar experimentos exitosos no sistema público de ensino e disseminá-los” (p. 9), o que caracteriza, mais uma vez, o desrespeito à diversidade e condições locais, responsabilizando novamente a gestão e os professores, pelo sucesso ou fracasso dessas experiências. Em princípio, a distribuição de recursos entre os entes federados teria origem no FNDE e seria feita no sentido de realizar as correções de acordo com o sucesso ou não no cumprimento das metas. Para o futuro, o documento aponta que poderá ser criado um terceiro fundo, além do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) e do FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), a partir de recursos como os do Pré-Sal, para financiar as ações corretivas (BRASIL, SAE, p. 8-9).
19 Mudar o paradigma curricular e pedagógico no Ensino Básico Baseado, principalmente no senso comum, o documento sustenta que a opção curricular da escola brasileira é por um “enciclopedismo raso”, no qual a memorização aparece com predominância e o livro didático como manual prático da ação docente. A perspectiva de superação de tal orientação curricular centra-se na lógica da “diversidade” e no aprofundamento em “focos temáticos mutáveis e itinerantes”, não ficando claro em que a diversidade propugnada se coaduna com um rígido sistema de controle e avaliação, imanente em todo o projeto. Na mudança do paradigma, o currículo é concebido como uma “sequência de capacitações”, identificando-se a “sequência padrão”, prevista no que a proposta do documento “Pátria Educadora” denomina Currículo Nacional, organizado como “sequência de capacitações”, adquiridas e exercitadas em campos variados. Como metodologia propõe-se o aprofundamento seletivo em lugar da abrangência, a ser incentivado à medida que se caminha pelas diversas etapas do ensino básico, até tornar-se exclusivo no ensino médio (BRASIL, SAE, p. 10-11) O documento “Pátria Educadora” traz também a concepção de “sequências especiais”, que devem constituir-se em espaços ainda mais abertos ao experimentalismo pedagógico e à individualização do ensino. É, por meio das “sequências especiais”, que se espera serem atendidos os alunos com maior potencial. Contudo, essas sequências especiais “precisam ser encarnadas em rico repertório de protocolos disponibilizados aos professores”, que “darão exemplos práticos e pormenorizados de como liderar cada aula em cada disciplina”. Pergunta-se: onde ficará o “experimentalismo pedagógico” dos professores? (BRASIL, SAE, p. 10-11) Muito superficialmente, o documento também prevê o recurso às “sequências especiais” para o atendimento de alunos com dificuldades na “sequência padrão”. Os alunos com maior potencial, entretanto, podem ainda ser atendidos por programas especiais a serem criados nas escolas comuns das redes ou, ainda, com ênfase, e preferencialmente, em escolas médias de “referência”, que, não por acaso, já estão batizadas de escolas Anísio Teixeira, às quais o acesso deve ocorrer por processo seletivo (BRASIL, SAE, p. 11-12). Seriam tais escolas espaços privilegiados de experimentalismo pedagógico e de sequências curriculares mais avançadas e rigorosas. O documento pressupõe que tal vanguardismo possa, com adaptações, espraiar-se por todo o sistema. Neste ponto, não há qualquer menção ao financiamento do sistema regular e do especial, o que pode claramente ser caracterizado como persistência do dualismo pedagógico, onipresente
20 como política educacional do país. Enfatizando a importância do desenvolvimento da “capacidade analítica” como verdadeira revolução no processo educativo, volta-se o documento para a análise das “condições pré-cognitivas” que no seu entendimento a tornariam viável. Centra-se, então, numa avaliação simplista dos alunos oriundos de famílias de classe média e de famílias pobres, com relação ao seu domínio, atribuindo, aos primeiros, maior propensão à posse de tais “capacidades” e, por consequência, maior possibilidade de êxito educacional. Por outro lado, ao atribuir ao estudante pobre menor posse dessas condições, o identifica com maior dificuldade para transpor obstáculos em sua caminhada em direção à obtenção das “capacitações analíticas”. Curioso aqui é a pretendida associação de tais limitações ao que chama de “inibições sócio emocionais”, que camufla as questões socioeconômicas, estas sim, responsáveis por essas dificuldades, jamais mencionadas pela proposta. As questões de classe são completamente omitidas no documento, que não as considera, e, nesse tipo de abstração, transfere a questão do processo de aprendizagem a aspectos subjetivos, que encobrem, de certa maneira, a real situação da classe trabalhadora que, historicamente, está alijada do direto à educação. Ao exemplificar as capacitações pré-cognitivas com “disciplina” e “cooperação”, deve-se inferir, pelo déficit de predisposição dos mais pobres, que são mais indisciplinados e menos cooperativos? De qualquer forma, propõe como possibilidade de preencher tal lacuna, a criação de um quadro de Agentes Comunitários, que poderiam auxiliar as famílias (que comumente são identificadas como portadoras de carências diversas), no atendimento às necessidades desses estudantes e suas possíveis dificuldades no cotidiano escolar.
Diretores e Professores Neste eixo, o documento traz como principal discussão a qualificação dos diretores e professores. Parte da afirmativa de que “mais salários não implicam em melhor ensino” (BRASIL, SAE, 2015, p. 15). É fato que o aumento de salários como medida isolada não resolve os problemas relacionados à qualidade da educação pública e gratuita no Brasil, o que não é uma novidade. O ANDES-SN sempre criticou as medidas isoladas dos governos que não enfrentaram, de forma articulada, através de políticas, as questões sobre a qualificação da educação, as condições de trabalho, a carreira, a política de qualificação e capacitação, e salários efetivamente dignos. Fica evidente, no entanto, que o ponto de partida problematizado pelo documento quanto ao aumento de salários dos professores tem relação direta com a lógica privada de premiação. Assim, as proposições enuncia-
21 das são iniciativas como as que “podem aproveitar, em grande escala” o “potencial dos diretores para promover mudanças: as que premiam escolas por alcançar metas de desempenho [...]” (BRASIL, SAE, 2015, p. 16). Da mesma forma quando, equivocadamente, o documento propõe uma carreira especial e suplementar ligada à premiação por desempenho. Para o ANDES-SN, a carreira deve estar acompanhada da estabilidade e valorização salarial do professor e não de premiações. A avaliação não ocorre por estabelecimento e cumprimento de metas. A avaliação de desempenho deve ser realizada de forma rigorosa, considerando o local e as condições de trabalho, a partir dos planos de trabalho propostos pelos professores, elaborados de forma democrática e aprovados no âmbito da instituição. Afirma o documento que “tudo pode começar a mudar na escola com bom diretor”, daí resulta a implantação de iniciativas que visam utilizar o potencial gerencial presumível nos diretores. A criação de Centros de Formação de Dirigentes e a adoção de padrões rígidos de avaliação e sistema de recompensas e punições, associado ao desempenho e ao cumprimento de metas, afronta radicalmente os princípios e fundamentos da gestão democrática, cuja vivência é fundamental nos espaços de formação humana. É contundente aqui a aposta na afirmação da administração gerencialista (setores privados) em detrimento da gestão democrática (setores da educação pública). Os Centros de Formação inicialmente se dedicariam à capacitação dos que já são diretores e, em seguida, passariam a formar candidatos à função, estabelecendo um rol de possíveis diretores a serem escolhidos pelos entes federados. Em relação aos professores, o documento em análise propõe a criação de Centros de Qualificação Avançada, o que de certa forma vai na contramão da perspectiva de formação continuada em serviço e permanente, que materializa a premissa de que conceber, implementar e avaliar o projeto político pedagógico é o mais legítimo processo de atualização docente. Para os autores do documento “Pátria Educadora”, “a grande maioria dos professores, [é] formada em instituições particulares, muitas de seriedade duvidosa, dedicadas ao lucro e carente de recursos intelectuais” (idem, p. 16). É apresentada uma avaliação pessimista da qualidade da formação de professores obtida nas licenciaturas, e é defendida uma proposta de cursos e centros específicos de formação, associada estritamente a uma metodologia recomendável ao preparo dos professores no domínio dos “protocolos” que seriam exigidos pelo Currículo Nacional. Tal processo dar-se-ia nas chamadas escolas de “referências” definidas, também, como espaços privilegiados de experimentos e inovações pedagógicas.
22 Ainda, com relação aos professores, institui a Carreira Nacional e a Prova Nacional Docente, prevendo mobilidade dos mesmos, associada ao cumprimento de metas, as quais se vinculam também gratificações adicionais. Outro ponto muito discutível é aquele que defende a polivalência, assegurando que cada professor no ensino básico tenha a versatilidade para ensinar duas ou três disciplinas. Mais grave na proposta com relação à formação e atualização docente é a clara cisão entre o pensar e o fazer; entre concepção e realização do trabalho docente, com clara repercussão na realização profissional.
Tecnologia e Técnicas Trazendo o “experimentalismo” do setor privado como proposição, neste eixo, o documento aposta em técnicas combinadas entre ensino presencial e EAD. Apresenta a “cooperação” como a “melhor maneira de superar obstáculos e de aproveitar oportunidades, inclusive o potencial destas (aulas em vídeos e os softwares interativos) tecnologias”. Organizados em equipe, os alunos “aprendem a ensinar uns aos outros com a ajuda de seus mestres” (BRASIL, SAE, 2015, p. 19-20). Na proposição, as aulas em vídeos enriquecem e sacodem o “ambiente da escola com inspiração vinda de fora”. Mais uma vez, a proposição não foge à essência presente no ideário exposto no documento, alijada do reconhecimento e de um diagnóstico sobre as precárias condições de trabalho nas quais os professores ministram suas aulas. As técnicas e tecnologias indicadas articulam-se com os protocolos, os critérios homogêneos e centralizadores de avaliação, de currículo nacional comum sob o signo do pragmatismo raso. Entendemos que as tecnologias são instrumentos pedagógicos que auxiliam o professor em sala de aula. O professor, valorizado, com condições efetivas de trabalho e políticas de qualificação e capacitação garantidas, deve ser é o mediador do processo político-pedagógico. Na contramão, o documento, atribui ao professor a execução de protocolos e o repasse de vídeos de aulas, na lógica “semipresencial”, que não possibilita o desenvolvimento dos processos pedagógicos.
Considerações Finais O documento “Pátria Educadora”, oriundo da SAE, contempla um ideário que se expressa na tese de que “houve uma grande ampliação da oferta do ensino sem alcançar a universalização desejada e que é preciso avançar, agora, para cuidar da qualidade do ensino”. Expressa certa arrogância ao
23 desconsiderar o esforço que, historicamente, vem sendo feito pelos educadores brasileiros na disputa por um projeto de educação o qual seja, em concepção e prática, assumido pela Nação como direito, comprometendose, de fato, com a inclusão social para o exercício da cidadania plena. O ANDES-SN, ao longo de sua existência, tem protagonizado, com outros sujeitos coletivos, o chamamento e reuniões em torno de um projeto de educação para o Brasil. Os resultados dessa coalizão civil estão contemplados no Plano Nacional de Educação da Sociedade Brasileira, democraticamente construído nos Congressos Nacionais de Educação - CONED. Nesse projeto, a educação é direito público subjetivo e dever do Estado; pauta-se em valores de solidariedade, justiça, autonomia, liberdade e cidadania. Valores que se opõem frontalmente aos defendidos pelo “Pátria Educadora”, quais sejam: a centralização da gestão, de caráter empresarial, na figura do diretor, que fragiliza e pode levar à extinção da participação, elemento fundamental para o exercício da autonomia e da democracia; avaliação de resultados pautada nos princípios da meritocracia e da concorrência entre escolas, que provoca a exacerbação do individualismo; e o financiamento pautado nos resultados do desempenho dos alunos e da escola, que leva ao ranqueamento, responsabilizando a gestão e os professores pelo não cumprimento das metas de aprendizagem previamente estabelecidas e tomando como centralidade a meritocracia, que gera a quebra de isonomia entre os que desempenham as mesmas tarefas no campo educacional. Embora o documento defenda que o ideário precisa ser construído, em nossa avaliação, as estratégias para a materialização das políticas para a educação básica revelam esse ideário quando, por exemplo, apontam a qualidade no viés da concepção defendida pelos reformadores empresariais da educação, cujo produto será o trabalhador, para atender às exigências do mercado produtivo, como também consumidor dessa produção. E mais, traz como perspectiva a supervalorização da gestão empresarial como vetor da qualidade educacional, com a centralização na figura do diretor, respaldando-se em experimentos que seguiram a lógica da eficiência empresarial e “valendo-se de fixação de metas de desempenho, a continuidade da avaliação, uso de incentivos e métodos de cobrança e o acompanhamento e/ou o afastamento de diretores quando necessário; a despolitização da escolha de diretores e a individualização do ensino”. Há, portanto, uma intencionalidade de romper com a democracia existente, mesmo que frágil, nas escolas da educação básica quando o documento defende a despolitização da escolha de diretores, como se a escola fosse neutra, abrindo espaço para propostas do tipo do PL 867/20151 , que vai na contramão de conquistas no campo das questões de gênero, liberdade religiosa e culturais; a concorrência entre escolas reforçando a meInclui, entre as diretrizes e bases da educação nacional, o “Programa Escola sem Partido”. 1
24 ritocracia e a competitividade; uma base nacional comum curricular, que permite a separação entre estudantes talentosos e portadores de “inibições sócio emocionais” criadoras de impedimentos para que o aluno prossiga seu caminho de aprendizagem, ignorando as barreiras socioeconômicas, estas sim, principais obstáculos à aprendizagem; a criação de escolas de referência para os alunos brilhantes, o que acentuará ainda mais as desigualdades. Neste cenário, é fundamental a rearticulação de todos os setores que defenderam e defendem historicamente a educação pública, gratuita, laica de qualidade social para fazer frente aos setores privatistas da educação. Ao ANDES-SN e suas Seções Sindicais compete fortalecer e intensificar a ofensiva contra esse nefasto projeto para a educação brasileira. Para tanto, torna-se necessário e urgente concentrar esforços na construção dos Encontros Preparatórios Estaduais e/ou Regionais que culminarão com o II Encontro Nacional de Educação (ENE), a ser realizado em junho de 2016, espaço no qual, de forma coletiva e contundente serão formuladas, a partir de intensos debates, estratégias para barrar a ofensiva do Capital na educação pública que tem, no “Pátria Educadora” uma das ameaças mais recentes e mais graves a um projeto de educação emancipadora.
Referências BRASIL, Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE). Pátria Educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional. Brasília, abril, 2015. _____. Pátria Educadora: EIXO 1 - Federalismo Cooperativo. Versão preliminar. Brasília, julho, 2015. _____. Lei nº 9.394 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 20 de dezembro de 1996. _____. Lei nº 13.005 - Plano Nacional de Educação PNE. 2014. ANDES-SN. Caderno 2 - Proposta do ANDES-SN para a Universidade Brasileira, 4ª edição atualizada e revisada, 2013. Disponível em http://portal. andes.org.br/imprensa/documentos/imp-doc-811277708.pdf. Acesso em 04 de setembro 2015. PNE. Proposta da Sociedade Brasileira, 1997. Disponível em: http://www. adusp.org.br/files/PNE/pnebra.pdf. Acesso em 06 setembro de 2015.
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O Sistema Nacional de Educação na perspectiva do Projeto “Pátria Educadora”: a cooperação federativa
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documento “Pátria Educadora”, elaborado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), propôs recentemente a instituição do Sistema Nacional de Educação (SNE), com base na concretização de um “Federalismo Cooperativo” do Ensino Básico, tomando como uma das referências o Sistema Único de Saúde (SUS). É importante ressaltar que não há, no documento, nenhuma normativa que trate conceitualmente de “Ensino Básico”, conforme enunciado no Artigo 21 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei 9.394/96). O presente texto se refere à parte do documento denominado “Pátria Educadora: Eixo 1: Federalismo Cooperativo”, lançado em julho de 2015. O documento “Pátria Educadora”, de julho, após uma espécie de apresentação, já coloca a público o “Anteprojeto de Lei Complementar, destinado a regulamentar o artigo 23, V e artigo 211 da Constituição Federal, instituir o Sistema Nacional de Educação e dar outras providências”, composto de cinco capítulos e trinta e oito artigos. Esse Anteprojeto mostra o modo como se pretende implementar o projeto “Pátria Educadora” na educação brasileira.
“Pátria Educadora”: regulamentação antidemocrática do Sistema Nacional de Educação É salutar esclarecer que a propositura acerca da criação do SNE não é nova. A sua organização está prevista na Constituição Federal, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394-96), no Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/2014) e no Plano Nacional de Educação (PNE da Sociedade). Além destes documentos e leis, o Ministério da Educação (MEC) tornou público o texto “Instituir um SNE - uma agenda obrigatória para o País”, em junho deste ano, sendo este totalmente desconsiderado
28 pela SAE. Por fim, há um prazo legal para a instituição do SNE, conforme definido no artigo 13 da Lei que, em junho de 2014, promulgou o PNE e este corresponde a dois anos, a partir dessa data. O PNE da Sociedade, consolidado em novembro de 1997 no II Congresso Nacional de Educação (CONED), foi fruto de um grande esforço de consensualização realizado por intermédio do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (FEDEP), organismo que, até começos da década de 2000, aglutinava dezenas de entidades que lutavam em defesa da educação pública. O ANDES-SN é uma das entidades fundadoras do FEDEP, que chegou a realizar cinco CONED, os dois últimos destes, respectivamente, nas cidades de São Paulo e Recife, ainda com grande afluência de congressistas. O PNE da Sociedade representa, pois, uma síntese das melhores reflexões que já foram produzidas democraticamente a respeito da Educação no Brasil. Nos argumentos apresentados, na Seção 3.1 do PNE da Sociedade, a favor da instituição do SNE, podem ser destacados os seguintes: 1) o SNE seria o mecanismo necessário para a instituição do padrão unitário de qualidade – defendido até hoje pelo ANDES-SN, para todas as instituições educacionais; 2) o SNE deveria simbolizar e incorporar “o esforço organizado, autônomo e permanente do Estado e da sociedade brasileira pela educação”; 3) o SNE, ao ter como instância máxima o Fórum Nacional de Educação (FNE), concebido como organismo democrático de representação da sociedade e dos órgãos estatais responsáveis pela efetivação da oferta educacional, deliberaria e organizaria a cooperação federativa na área da educação. Por óbvio, o FNE atualmente existente não materializou o organismo democrático que poderia exercer o papel a ele conferido pelo PNE da Sociedade; muito menos o atual Conselho Nacional de Educação se adequaria para ser o órgão normativo do SNE, como lá fora proposto. Por isso, o FEDEP, que ainda se encontrava organizado em começos da década de 2000 e contava com atuação engajada do ANDES-SN, desenvolveu e apresentou um anteprojeto de lei, que definia a constituição de ambos os organismos – FNE e CNE, em termos de uma representação democrática. Dadas as condições políticas, que continuaram pouco favoráveis a iniciativas democratizantes, essa proposição não prosperou. Não se pode negar, diante da realidade desigual do Estado brasileiro, com enorme descompasso entre os diferentes níveis e modalidades de educação, principalmente no que se refere ao acesso, à permanência e ao
29 critério de qualidade, que deve ser socialmente referenciada, a necessidade de instituirmos um Sistema Nacional de Educação que vise a construção do “Padrão Unitário de Qualidade”, resguardado o respeito à diversidade inerente e própria de cada instituição. A garantia de oferta de escolas públicas e gratuitas em todos os níveis, mantidas pelo Estado, oferecendo a toda criança e jovem oportunidades iguais de acesso e de permanência, conforme defende o ANDES-SN (Caderno 2) e o PNE da Sociedade, deveria ser um pilar básico desse SNE. Entretanto, o Anteprojeto de Lei, contido no documento “Pátria Educadora”, logo em seus “Princípios e Diretrizes” (Cap. I, Seção II), apresenta uma contradição com esses pressupostos ao afirmar (Art.2º, inciso II), como um dos princípios e diretrizes do SNE, a superação das desigualdades educacionais, ignorando, contudo, que essas desigualdades não podem ser superadas sem que haja uma indicação clara sobre uma fonte adicional de recursos (ausente na breve Seção I do Capítulo III, quando, no artigo 12 são apenas citadas fontes já conhecidas, sem menção a esforços visando seu aumento) e também sem serem indicados caminhos para um rompimento da desigualdade sistêmica, congênita ao modo capitalista de produção. O que se coloca em questão, mesmo diante desta realidade, é a metodologia seguida pelo documento “Pátria Educadora” na proposição do Sistema Nacional de Educação. Podemos assinalar que o documento “Pátria Educadora”, produzido no âmbito de uma Secretaria (SAE), de assessoria direta da Presidência da República, e que não contou com a participação democrática da sociedade civil, expressa, em sua origem, o germe do cunho autoritário e antidemocrático. De fato, como será demonstrado pela análise mais detalhada a seguir, a essência do documento deixa clara a defesa de uma agenda baseada no interesse do Capital, ao propor a reforma da educação brasileira fundamentada na preparação das crianças e da juventude brasileiras para a execução de testes de aprendizagem e controle de seus resultados. Contrastando com os conceitos desenvolvidos pelo FEDEP e consolidados no PNE da Sociedade para o Sistema Nacional de Educação, o documento “Pátria Educadora”, na proposição de organização do SNE, o seu gerenciamento e controle ficarão a cargo de “Comissões de Cooperação Federativa” (Tripartite, Bipartite e de Polo Regional de Educação), compostas, respectivamente, por detentores de cargos executivos da União, dos Estados e dos Municípios da área da Educação, ou seja, por pessoas ocupantes de cargos, por nomeação do respectivo governante. Assim, por exemplo, a Comissão Tripartite (CTC), totalizando apenas 15 membros, será constituída por: 05 representantes do MEC; 01 representante dos Secretários de Educação de cada uma das 05 regiões do Brasil; e apenas 01 representante por região das centenas de municípios, de características
30 dramaticamente diferentes, que compõem cada uma das regiões (Art. 22, §1°, Cap. IV). Além de haver, por certo, enorme dificuldade em decidir quais as indicações para o cargo. As duas outras Comissões de Cooperação Federativa obedecem a mesma lógica de indicação para os cargos e destinam-se a organizar a cooperação nos níveis mais baixos da Federação. Não obstante, e ainda que, no que se refere à estrutura organizativa e de gerenciamento do SNE, o Anteprojeto de Lei do “Pátria Educadora”, novamente, já no capitulo I (seção IV, Art. 4), indique que a integração dos Sistemas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, será efetivada com “autonomia e liberdade”, sob coordenação da União (§ 1°), é importante assinalar que, em outro parágrafo (§ 4°) deste mesmo Capítulo, o Conselho Nacional de Secretários de Estado da Educação (CONSED) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) serão reconhecidos como entidades de utilidade pública, representativas dos entes que compõem a estrutura do SNE. Essa providência pode ser extremamente útil para, na prática, contornar as dificuldades acima apontadas, para a representação de Estados e Municípios nas Comissões de Cooperação Federativa (Art. 21, Cap. IV). Há muitos outros motivos para preocupação, a partir da leitura do Artigo 22 (Cap. IV), quanto à atuação, na prática, dessas Comissões de Cooperação propostas no Anteprojeto sob análise. Por exemplo, o seu segundo parágrafo define o que deve constar no regimento interno da Comissão Tripartite de Cooperação (CTC) e contém os incisos IV (dispõe que as formas de deliberação podem variar conforme o assunto em apreciação) e VIII (que deixa em aberto a forma de registro e divulgação de seus atos). Muito mais grave, ainda, é o que consta do parágrafo quinto desse mesmo artigo: “a CTC possui autonomia técnica e suas deliberações não estão sujeitas a recurso hierárquico ou revisão por outros órgãos”. Desse modo, a “Gestão Colaborativa” será formulada por representantes indicados pelos executivos das diversas esferas da União (Capítulo IV, seção I, II, III e IV), com a total exclusão de representantes da sociedade civil, por exemplo, dos profissionais da educação, e com atribuições que extrapolam, em muito, o que seria razoável. Neste caso, pode-se afirmar que a “Pátria Educadora”, ao contrário do discurso dos seus arquitetos, não objetiva “ampliar a transparência e a participação social” (Art. 29, § 1º, VI). Verifica-se, pois, que a gestão democrática da educação, defendida pelo ANDES-SN e inscrita no PNE da Sociedade é o oposto da formulação apresentada pela “Pátria Educadora”, que exclui dos processos decisórios a sociedade brasileira e os profissionais da educação. Evidencia-se, mais uma vez, que o projeto apresentado pela SAE e aquele apresentado pelo Fórum Nacional em Defesa da Educação Pública continuam em disputa.
31 O que é a Mobilização Federativa pela Educação? Apenas na última Seção do Capítulo IV do Anteprojeto de Lei surge um ente que pode ser chave para a implementação do projeto. O Artigo 32 define: “A Mobilização Federativa pela Educação é expressão concreta da cooperação federativa orientada para a superação das desigualdades educacionais e qualificação da educação básica consoante padrões nacionais”. Estranhamente, apenas no quarto parágrafo deste artigo, quase no final do Anteprojeto, é afirmado: “A Mobilização Federativa pela Educação é órgão vinculado ao Ministério da Educação para efeitos administrativos e operacionais”. Os três parágrafos anteriores do artigo já se manifestam sobre a atuação desse ente, sem tê-lo definido. Aliás, pergunta-se: qual o caráter de um órgão que, estranhamente, é uma ação? No artigo seguinte (Art. 33) aparece uma nova dúvida: de que equipe (inciso I), termo que não apareceu antes, estar-se-ia falando? Apenas a leitura dos outros incisos parece indicar que se trataria de uma das equipes a serem formadas pelo ente Mobilização Federativa pela Educação (MFE) para efetivar, conforme inciso III, os “procedimentos de assistência técnica e pedagógica para implementação da Base Comum Curricular”. Vale notar que este conceito, que não está definido no Anteprojeto, deve referir-se a algo descrito no documento anterior como “Currículo Nacional - sequência de capacitações” (p. 10). Outro alerta, reforçando alguns já feitos durante essa análise, se encontra no parágrafo terceiro desse mesmo artigo, que determina que a MFE, “no exercício de suas atividades, pode contar com a colaboração técnica e material de instituições sem fins lucrativos, na forma do regulamento”. Assim também, a Mobilização Federativa pela Educação, órgão operacional e administrativo, vinculado ao Ministério da Educação, será “composta por servidores públicos dos sistemas de ensino Federal, Estadual, Distrital e Municipal, mediante adesão voluntária dos profissionais com habilitação específica para atuação pedagógica ou de gestão” (Art. 34, caput), mas seu parágrafo quarto prevê que, em não havendo a adesão, abra-se a possibilidade de contratação temporária de profissionais da Educação ou de se firmar convênios com instituições sem fins lucrativos. Percebe-se, assim, que os profissionais da Educação nessa proposta de “Pátria Educadora” têm exclusivamente papel de executores do grande Projeto. Isso contrasta em tudo com o que as pesquisas mais recentes vêm apontando para o bom ensino, o que também foi formulado no PNE da Sociedade (Seção 3.1, Sistema Nacional de Educação, Diretrizes Gerais) historicamente defendido pelo ANDES-SN: “Assegurar a autonomia das escolas e universidades na elaboração de seu projeto político-pedagógico
32 de acordo com as características da comunidade”.
Qual a essência da Gestão Colaborativa, segundo o Anteprojeto de Lei? A Gestão Colaborativa é tema do Capítulo IV, em sua Seção III. O texto sobre gestão colaborativa dos serviços públicos de Educação começa (Art. 29, §1º) pela definição de seus objetivos, dos quais destacaremos: 1) alcançar as metas previstas no PNE - as quais são, lembremos, meramente quantitativas, em sua grande maioria (Inciso I); 2) “racionalizar” a alocação, redistribuição e execução dos recursos financeiros (Inciso III) e 3), ampliar a transparência e a participação social (Inciso V). Apenas o conteúdo do inciso III é, de fato, discutido no artigo 29 e, também, nos outros dois artigos que compõem a Seção. Por outro lado, se observarmos todos os demais parágrafos desse artigo e dos seguintes, nada é indicado para que os objetivos citados nos incisos I ou V possam ser alcançados. Será, então, que o não cumprimento das metas do PNE poderá ser atribuído a uma potencial má gestão e não à falta de recursos financeiros? De modo análogo, como a gestão colaborativa objetiva ampliar a participação social? É preciso lembrar que, para além do discurso fácil, abstrato e não contextualizado, seria adequado ponderar que o termo “social” concerne à sociedade e não à união de várias pessoas. Além disso, o documento deixa indefinido o modo como pretende mostrar transparência. Tomado mais amplamente e considerando o que vem acontecendo, mais recentemente, no Brasil, o termo participação social pode também ser ligado a uma sociedade “sem fins lucrativos” ou “organização social” (OS), com a qual o governo pode fazer alianças, no sentido de se desincumbir de suas obrigações constitucionais, cedendo às OS a gestão do Ensino Básico, como já foi feito com os “equipamentos” do SUS – Sistema tomado como referência nos documentos “Pátria Educadora”. Contudo, a gestão privada da Educação pública deste país teria efeitos desastrosos, pois interferirá diretamente na construção da visão de mundo das novas gerações e, isso, a partir da mais tenra infância. Dando concretude a essa preocupação, mais adiante, no artigo 33, § 3º, afirma que: a “Mobilização Federativa pela Educação, no exercício de suas atividades, pode contar com a colaboração técnica e material de instituições sem fins lucrativos, na forma do regulamento”. Essa colaboração é indicada também no documento “Pátria Educadora: a Qualificação do Ensino Básico Como Obra de Construção Nacional”, na Parte II - Iniciativas, uma formulação ainda mais esclarecedora e, por outro lado, que reforça nossas
33 preocupações, quando, no item 8, propõe: “Aproveitamento de instrumentos jurídicos como as Organizações Sociais e as Sociedades de Fins Específicos para facilitar o engajamento experimental de educadores vindos de fora do sistema público na construção deste sistema.” Há, entretanto, mais perguntas do que respostas, dando margem para indagações, no próprio Anteprojeto de Lei, apresentado em julho: é razoável apresentar uma delegação dessa amplitude, sem especificar a quem isso será transferido? Não se trataria aí da intervenção do MEC nas Comissões Estaduais (Bipartites) e nos Polos Regionais, o que configura uma situação contrária à proposta de colaboração?
A questão da qualidade do ensino e seu “padrão”: a avaliação e o planejamento em foco Focando, agora, em outro ponto importante, é preciso discutir o que é desvelado quando analisamos o conteúdo do documento, Seção III, Capítulo I, que contém apenas no artigo 3º, com treze incisos, que se refere aos “Objetivos” declarados para o SNE. O inciso I determina “universalizar o acesso à educação básica e seu padrão de qualidade no território nacional.” Qual é a referência de padrão de qualidade proposto para os proponentes do documento? Segundo a formulação do PNE da Sociedade (1997, p. 9), em sua Introdução, os movimentos e entidades reunidos tinham claro que: A qualidade social implica providenciar educação escolar com padrões de excelência e adequação aos interesses da maioria da população. […] são valores fundamentais a serem elaborados: solidariedade, justiça, honestidade, autonomia, liberdade e cidadania. […] A educação de qualidade social tem como consequência a inclusão social, através da qual todos os brasileiros se tornem aptos ao questionamento, à problematização, à tomada de decisões, buscando ações coletivas possíveis e necessárias ao encaminhamento dos problemas de cada um e da comunidade onde vivem e trabalham.
Tendo em vista, especialmente, a diversidade política, econômica e cultural do território nacional, seria essencial que o documento também explicitasse sua concepção a respeito da qualidade educacional. Em contraposição, embora o documento não a especifique, pode-se obter indicações a respeito dessa importante questão se atentarmos para outros incisos, do mesmo artigo, que indicam, respectivamente: VII - valorizar, no currículo, o aprofundamento seletivo em detrimento da
34 abrangência superficial; X - incorporar tecnologias da informação e do conhecimento nas práticas pedagógicas escolares; XII - promover o uso dos sistemas de avaliação para desenvolver as práticas pedagógicas; XIII – propiciar flexibilidade para o reconhecimento de experiência educativa extraescolar.
Vale notar que alguns termos empregados na importante Seção que define os objetivos do “Pátria Educadora”, não são esclarecidos no Anteprojeto e nem são de uso corriqueiro na área da Educação, embora tenham sido expostos no documento anterior dessa mesma proposta. O que será a seleção do aprofundamento? O que seria a tecnologia do conhecimento? A que flexibilidade se refere o inciso? Por outro lado, não há menção alguma a como a proposta “Pátria Educadora” fomentaria a consolidação de ingredientes reconhecidamente importantes para a qualidade da educação e do êxito escolar, como equipamentos básicos (bibliotecas, laboratórios, espaços para atividades culturais e esportivas) e, principalmente, salários e condições de trabalho adequadas para professores e demais funcionários, em todas as redes. Ao contrário, incentiva que as práticas pedagógicas se adequem aos resultados de avaliações unificadas. A educação e a cultura em geral são fundamentais para a melhoria da qualidade de vida e a construção da cidadania do brasileiro, assim o padrão de qualidade da educação básica, que deve ser estendido para todo o território nacional, mas precisa resultar de discussão pública, entre todos os envolvidos com a Educação, para consensuar o que realmente significa esse padrão de qualidade, que, até mesmo, poderia variar ao longo do tempo e cujo ingrediente principal, provavelmente, não seria a tecnologia. Caminhando em direção contrária ao que boas práticas vêm indicando, também desconsiderando resultados internacionalmente aceitos, o Anteprojeto foca toda sua atenção em processos de avaliação, aos quais é dedicada praticamente todo Capítulo II. A importância dada ao processo de avaliação transparece em ambos os documentos da “Pátria Educadora” sob análise (o de abril, que chega a afirmar que “na avaliação estamos na vanguarda mundial” e esse, de julho), até mesmo pela posição ocupada (o conceito surge logo no início de ambos os textos). Embora no Anteprojeto, a avaliação se restrinja, aparentemente, aos sistemas de ensino, é evidente que esta está baseada na avaliação estudantil por meio de provas universais. Tais provas podem en-
35 sejar vícios diversos, com destaque para o possível treino para realizá-las, conforme demonstrado internacionalmente e também no Brasil. Exemplo disso são os semestres de treino, empregados por diversas Instituições privadas de Ensino Superior frente ao ENADE e, anteriormente, ao Provão. Desse modo, ao invés de promover a Educação, podem degradar, até mesmo, o objetivo menos ambicioso, o ensino. Logo em seu Capítulo I, Introdução, o PNE da Sociedade conceitua o seu modo de entender uma avaliação realimentadora e positiva: “a avaliação é processo contínuo a partir de objetivos estabelecidos para cada uma das etapas do trabalho pedagógico, do papel social das instituições educacionais e das políticas públicas para a área” (p. 10). Na contramão dessa concepção, o Capítulo II do Anteprojeto de Lei, deixa claro: o processo de avaliação do sistema educacional ocorrerá a partir do “produto” final e não do processo educativo como um todo, sendo aplicado em datas específicas, ao longo da jornada escolar. Isso é consequência do encadeamento dos objetivos que foram determinados para esse instrumento pelos autores, embora não haja no texto uma definição clara das formas e instrumentos de avaliação, para além da exigência (Art. 9°, inciso II): realizar processo nacional do rendimento escolar na educação básica e na educação superior. Vale enfatizar que apenas os artigos 1º e 9º mencionam esse nível de ensino – ensino superior. Quem “controlará” o processo de avaliação do SNE? O órgão avaliador e classificador será o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), submetido aos critérios definidos pela CTC, tendo como referência o índice de desenvolvimento da educação básica (IDEB), até disposição legal em contrário. É importante ressaltar que a nova Comissão centralizará os processos de avaliação do SNE, entendendo que sua efetivação será realizada de forma “cooperativa” com instituições nacionais e internacionais, abrindo possibilidades de atuação de instituições privadas na elaboração e aplicação dos instrumentos de avaliação. Pouco há a comentar sobre o “Planejamento da Educação”, tema do Capítulo II do Anteprojeto de Lei apresentado juntamente com o tema “Avaliação”. De saída é de estranhar que não haja uma Seção denominada “Planejamento”, mas apenas uma, na seção II, do mesmo capítulo, sob título de “Dos Planos de Educação”. E, muito estranhamente, é exatamente disso que constam o Artigo 11 e os três parágrafos que o acompanham, com conteúdos que em nada extrapolam o que já está determinado a respeito. No Anteprojeto de Lei, a avaliação e o “planejamento” da educação, na verdade, centram-se nos resultados de rendimento escolar, assim como na seleção das “experiências educacionais exitosas” da Federação Brasileira, que se pretende serem usadas como potencial aplicável em outros
36 contextos. Certamente permanecerão, como em outros governos, desconhecidas as realidades estruturais e conjunturais desses outros contextos. A proposta do “Pátria Educadora”, como apresentada, ao padronizar o processo educativo, em detrimento das peculiaridades das regiões brasileiras, poderá ser responsabilizada pela perda de um componente muito importante do cabedal brasileiro, que é sua riquíssima diversidade cultural. De modo geral, será deixado a cargo da base (professores, gestores, escolas) a “obrigação” de resolver os problemas da educação, inclusive o de como lidar com a proposta uniformizadora. Nesse ponto vale retomar uma função adicional prevista para o sistema de avaliação, que, por enquanto, se encontra apenas no documento de abril: além de selecionar os sistemas “exitosos”, a avaliação seria também utilizada para selecionar os alunos “em dificuldades” e aqueles “de maior potencial”, dando-lhes destinos diferentes. Para isso, a organização de um Cadastro Nacional dos estudantes do Ensino Básico, prevista no Artigo 9º, inciso IV, parece ser um instrumento valioso, mas que é por muitos educadores avaliado como extremamente controverso e potencialmente perigoso.
O Anteprojeto de Lei da “Pátria Educadora” não prevê os recursos a serem aplicados no pretendido resgate da Educação pública e gratuita Quando nos reportamos à avaliação e ao planejamento da educação, explícitos nos capítulos II e III do documento têm-se como elemento a considerar os mecanismos e destino de redistribuição de recursos (Capítulo III), elemento importante na promoção do regime de colaboração entre os sistemas de ensino. Em referência à redistribuição de recursos financeiros, o anteprojeto sob análise indica apenas fontes dos recursos já conhecidas (Art. 12), não mencionando a evidente necessidade de sua ampliação. Vale ressaltar que, em relação a recursos oriundos da exploração de petróleo da camada pré-sal, as perspectivas não são as anteriormente previstas para a educação, depois da queda geral dos preços desse produto. Na Seção II, “Do Custo Aluno-Qualidade - CAQ”, no referido Capítulo também nada de substancial é acrescentado pelos dois artigos (13 e 14) àquilo que já consta a respeito do CAQ na Lei 13.005/14 (PNE), tanto é que, em praticamente todos os seus parágrafos é feita referência às suas “estratégias” 20.8 e 20.7. Estranho e preocupante é, também, que o último capítulo do Anteprojeto de Lei (Cap. V), novamente, se preocupe primordialmente com o CAQ e a implementação de sua versão inicial, o CAQi, sem trazer maiores novidades.
37 Na Seção III, “Da Função Redistributiva se Supletiva”, do Capítulo III deveriam ser esperadas informações importantes para a efetivação da proposta “Pátria Educadora”, já que é sabido que a União concentra a maior parte dos recursos tributários e que há Estados e Municípios com muitas dificuldades financeiras. Contudo, pouca iniciativa nova é apresentada. De resto, a função de redistribuição de recursos financeiros, da União e dos Estados (Art.15) continuará, prioritariamente, a cargo do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), segundo o § 1°, enquanto caberá ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), a função supletiva, esta exercida pela União (§ 1°), sem que seja definida nova fonte de recursos. O que de novidade podem proporcionar o FNDE ou o FUNDEB? Esses fundos não ampliam recursos, como se faz necessário. O seu papel é redistributivo, isto é, com os mesmos valores, a partir de alguns critérios, os recursos têm diferentes destinações. Por isso, não é de estranhar que o Artigo 17, que se ocupa de detalhar a função supletiva, declare que esta, “exercida pela União e pelos Estados, prestada mediante assistência técnica e financeira [...]”, deve “articular a assistência financeira à assistência técnica para potencializar o desenvolvimento da gestão da educação.” Também, todo Artigo 18 é dedicado a detalhar a tal assistência técnica.
Considerações finais Tomada em seu todo, o documento “Pátria Educadora”, principalmente se analisado com foco no Anteprojeto de Lei, que lhe dará concretude, é altamente preocupante, pois em sua concepção germina o caráter privatista da educação pública brasileira, pautados, especificamente, nos seguintes pontos: • Processos avaliativos unificados e censitários que resvalarão, com quase certeza, numa uniformização indevida do ensino, em todo diversificado território nacional. • Criação de um Cadastro Nacional de todos os estudantes, a partir, inicialmente, da Prova Brasil, que poderá reforçar a competição entre escolas e estudantes, situação altamente prejudicial ao bom andamento da verdadeira Educação de qualidade. • Promoção do uso dos sistemas de avaliação para desenvolver as “práticas pedagógicas exitosas”. Isso corresponde à total inversão de tudo o que foi e é considerado adequado para uma boa prática de ensino, nos meios que pesquisam e entendem de Educação; • Indefinição na conceituação de Educação e Ensino;
38 • Gestão do SNE antidemocrática, sem participação da sociedade e dos profissionais da educação; Ademais, ao não demonstrar empenho em fazer acompanhar as prometidas ações de resgate dos sistemas e das escolas, pelo necessário reforço em recursos a lhes ser destinado - já que não indica qualquer real fonte adicional de financiamento - é necessário duvidar da eficácia dessas ações. Quanto à prometida eficácia da intervenção nas escolas e nos sistemas, há ainda muita margem para dúvida, já que o instrumento desenhado para isso, o órgão “Mobilização Federativa pela Educação”, vinculado ao MEC, não demonstra, por sua constituição e objetivos, capacidade de influir de modo positivo em seu funcionamento. Também as Comissões destinadas a operacionalizar a cooperação federativa – Tripartite, Bipartite e de Polo Regional – não demonstram, em particular por sua constituição nada democrática e representativa, que possam efetivamente produzir os resultados de que estariam incumbidas. Por fim, o Sistema Nacional de Educação, além de muito mal descrito no Anteprojeto, pelo pouco que foi exposto, se parece, sobretudo, com um reforçado Sistema Nacional de Avaliação, com direcionamento distante daquilo que seria desejável: ser um instrumento democratizante e eficiente na equalização das oportunidades educativas.
Referências BRASIL, Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE). Pátria Educadora: a qualificação do ensino básico como obra de construção nacional. Brasília, abril, 2015. _____. Pátria Educadora: EIXO 1 - Federalismo Cooperativo. Versão preliminar. Brasília, julho, 2015. _____. Lei nº 9.394 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 20 de dezembro de 1996. _____. Lei nº 13.005 - Plano Nacional de Educação PNE. 2014. ANDES-SN. Caderno 2 - Proposta do ANDES-SN para a Universidade Brasileira, 4ª edição atualizada e revisada, 2013. Disponível em http://portal.
39 andes.org.br/imprensa/documentos/imp-doc-811277708.pdf. Acesso em 04 de setembro 2015. PNE. Proposta da Sociedade Brasileira, 1997. DisponĂvel em: http://www. adusp.org.br/files/PNE/pnebra.pdf. Acesso em 06 setembro de 2015.
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O sentido da PEC 395/2014 para a Educação Pública
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O sentido da PEC 395/2014 para a Educação Pública
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final do século XX passou a considerar a educação e o conhecimento como forças produtivas na sociedade capitalista. Como tal, a valorização desses fatores tem sido proporcional à importância que lhes é conferida em uma sociedade que se autodenomina de “sociedade do conhecimento”. A definição dada pela Organização Mundial do Comércio (OMC) para a educação como serviço abriu as portas para a mercantilização desse, então, direito, sobretudo quando se passa a considerar a imensa clientela existente no mundo, correspondendo a trilhões de dólares. Os organismos internacionais como a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o Banco Mundial (BM) passaram focar a educação superior nessa lógica, vendo-a e tratando-a enquanto uma mercadoria. Ao mesmo tempo, o governo brasileiro, balizado pelas orientações desses organismos, vem alterando gradativamente as políticas inerentes ao financiamento da educação. A Reforma do Estado de 1995 colocou a educação superior e os institutos de pesquisa na categoria de serviços não exclusivos do Estado, sinalizando oficialmente a forma como as políticas públicas seriam direcionadas, levando em consideração esses aspectos, eximindo o poder público, cada vez mais, da responsabilidade constitucional de oferecer Educação Pública à toda a população. A década de 1990 e as subsequentes vêm aprofundando a privatização do ensino e alterando o sentido da relação público – privado, havendo, em relação a esse último, quase um apagamento das fronteiras que delimitam essas instâncias. As políticas públicas educacionais vêm sinalizando na direção tanto da mercantilização, quanto da privatização, confirmando essa ressignificação do público e do privado, no tocante ao financiamento. O Plano Nacional de Educação, Lei nº 13.005 de 25 de junho de 2014, no § 4o do artigo 5º deixa evidente a compreensão sobre o assunto (público-privado), quando inclui como investimento público em educação, dentre
44 outros, “os recursos aplicados nos programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior, os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil e o financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial. [...].” Dessa forma, os recursos destinados ao PROUNI, ao FIES, ao Programa Ciências sem Fronteiras, às creches privadas serão considerados investimentos públicos em educação. Assim, o indicado na Meta 20 do referido Plano, ou seja, a aplicação de 10% do PIB para educação passa a cobrir todas essas atividades. O ano de 2015 acentuou a privatização do ensino. O ajuste fiscal trouxe um corte de mais de 11 bilhões de reais para a área, incidindo fortemente sobre as instituições federais de ensino. As Universidades e os Institutos Federais vivem momentos de corte de serviços básicos como energia, água, segurança. A pós-graduação stricto-sensu teve parte dos recursos do Programa de Apoio à Pós-Graduação (PROAP) cortados. Os Editais apresentados pelos órgãos federais de fomento (CNPq) para financiamento de pesquisa não ocorreram este ano. A PEC 395 de 2014 é apresentada no bojo dessa conjuntura, na qual os recursos para a Educação Pública escasseiam e que o governo acena com a priorização para o setor privado, com programas como o FIES, o PROUNI e o PRONATEC. O FIES, por exemplo, teve um crescimento exponencial no último período. Segundo dados oficiais da plataforma Transparência DO Governo Federal, em 2012 foram destinados R$ 4,38 bilhões de recursos diretos do orçamento do Ministério da Educação. Já em 2013, o valor saltou para R$ 7,59 bilhões e em 2014 para R$ 13,8 bilhões. Em 2015, até 20 de outubro, já haviam sido empenhados R$ 8,5 bilhões, além de títulos do Tesouro Nacional emitidos em favor do FIES. Em relação ao PROUNI, em 2013 a renúncia fiscal correspondeu a R$ 625 milhões (dado de 2013 do Projeto de Lei Orçamentária Anual da Secretaria da Receita Federal). Enquanto o orçamento da educação sofre um corte de mais de R$ 11 bilhões, o governo deixa clara a sua prioridade, na medida em que na prática continua valorizando as instituições privadas, o que sinaliza o projeto de educação voltado para beneficiar a iniciativa privada. A aprovação dessa PEC aprofundará ainda mais a mercantilização e a privatização da educação, levando as instituições federais de educação a buscarem recursos que possam complementar os orçamentos necessários à manutenção das atividades inerentes a essas instituições. A indicação da PEC que “altera a redação do inciso IV do art. 206 da Constituição Federal, referente à gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais” poderá ser o início de um processo de total privatização da educação superior. Os cursos de Especialização e de Extensão,
45 necessários para a qualificação de tantos profissionais, bem como de técnicos e docentes, passarão a cobrar mensalidades, quebrando assim um direito social inalienável. Além desses cursos, o substitutivo da PEC incluiu o Mestrado Profissional, o que, malgrado a não aprovação do ANDES-SN referente a esse tipo de curso, é preciso mencionar que essa inclusão certamente beneficiará muito a iniciativa privada. Em julho de 2015, foi constituída a Comissão Especial da Câmara de Deputados destinada a proferir parecer sobre a matéria, tendo a mesma, por solicitação, realizado três Audiências Públicas, tendo o ANDES-SN participado daquela ocorrida no dia 20 de agosto. A posição do ANDES-SN, expressa na Audiência, deixou clara a contrariedade dessa entidade em relação ao assunto, na medida em que destaca que tal alteração constitucional virá a prejudicar as pessoas que tenham interesse em se atualizar, ferindo o que historicamente o ANDES-SN defende, explicitado no Caderno 2 – Proposta de Universidade Brasileira: A educação deve ser pública e gratuita, em seus diferentes níveis e modalidades, pois é um direito social inalienável da população brasileira e não um serviço ou uma mercadoria, constituindo-se em obrigação do Estado, que deve proibir a cobrança de qualquer tipo de taxa. (ANDES, 2013, p.16)
O ANDES-SN vê nessa medida a mercantilização da educação, além da privatização, pois, para efeito de reforço ao orçamento que vem sofrendo cortes, as Instituições, via Institutos, Faculdades, Cursos poderão criar Especializações, oferecer Mestrado Profissional com qualidade duvidosa e com finalidade questionável, visando, sobretudo a angariar recursos para fazer face as suas necessidades. Além disso, no caso das Instituições Federais e das Instituições Estaduais, os governos, federal e estaduais, investirão menos ainda em educação superior, apoiados na possibilidade que essas instituições terão de arrecadar recursos, via cobrança de cursos. A PEC 395/2014 fere profundamente os princípios que o ANDES-SN defende e que estão explicitados em seus documentos, com destaque para o Caderno 2, Proposta do ANDES-SN para a Universidade Brasileira, 4ª edição atualizada e revisada, datada de 2013. Nesse documento o Sindicato dos Docentes coloca, entre outros, como princípio “a manutenção e ampliação do ensino público e gratuito”. Nos Fundamentos Conceituais da Proposta de Universidade do ANDES-SN, apresentados no Caderno 2, fica explícito que “a educação deve se pública e gratuita”, salientando-se que é um “direito social inalienável da população
46 brasileira e não um serviço ou uma mercadoria”, devendo, nessa lógica constitui-se “em obrigação do Estado que deve proibir a cobrança de qualquer tipo de taxa”. Contrapondo-se a esse princípio defendido pelo ANDES-SN, a justificativa apresentada pelo deputado que encaminhou ao Congresso a Proposta de Emenda Constitucional se apoia no argumento que “as atividades de extensão caracterizadas como cursos de treinamento e aperfeiçoamento, assim como os cursos de especialização”, e o Mestrado Profissional (este último acrescido no Substitutivo da PEC 395-A), são destinados a profissionais que têm condições de arcar com esse tipo de despesa. A partir desse argumento, adicionado àquele que explicita que as universidades carecem de recursos suficientes para desenvolvimento das atividades inerentes a seu papel, o Parecer da Comissão responsável pelo assunto “vota pela admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição nº 395, de 2014”. O ANDES-SN, na defesa de seus princípios, se manifesta contrário a tal emenda constitucional, indicando que se houver tal alteração as instituições públicas de educação superior estarão reforçando a desigualdade de oportunidades, beneficiando aqueles que têm condições objetivas de efetuarem pagamento de cursos, aumentando as diferenças e aprofundando a privatização do ensino e a mercantilização da educação.
Referências ANDES-SN. Caderno 2 - Proposta do ANDES-SN para a Universidade Brasileira, 4ª edição atualizada e revisada, 2013. Disponível em http://portal. andes.org.br/imprensa/documentos/imp-doc-811277708.pdf. Acesso em 04 de setembro 2015.
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O projeto de lei 4372/2012: a regulação e a avaliação da educação
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O projeto de lei 4372/2012: a regulação e a avaliação da educação
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Projeto de Lei 4.372 de 2012 “cria o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior - INSAES”, como autarquia federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC), com a finalidade de “supervisionar e avaliar instituições de educação superior e cursos de educação superior no sistema federal de ensino, e certificar entidades beneficentes que atuem na área de educação superior e básica”. O Projeto de Lei encaminhado pelo Executivo tem sofrido críticas de vários setores da sociedade, incluindo, outro órgão também vinculado ao MEC, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), que, via servidores, aponta a duplicidade de funções com este órgão e com as atribuições da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior do MEC. (Servidores, s/d) Para o funcionamento dessa autarquia, se faz necessário, segundo o PL, a criação de 550 novos cargos que vão de especialistas a pessoal operacional. A carreira desses novos servidores, incluindo as tabelas salariais e as funções gratificadas são arroladas no referido Projeto. No arrazoado encaminhado à Presidente da República é citada, para justificar a criação desse novo ente, a necessidade e importância da qualidade da educação superior face à expansão que esse nível de ensino vem passando. Para tal, segundo a lógica dos proponentes do Projeto, a criação desse Instituto é fundamental, na medida em que poderá realizar de forma ágil as funções de supervisão e regulação dos cursos presenciais e a distância, que, segundo o documento citado, totalizam 7000 avaliações in loco, por ano, além do credenciamento de novas instituições. Fica evidenciado que o novo Instituto assumirá o papel da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (SERES) e de parte das funções do INEP, relacionados à avaliação das instituições federais e privadas e dos cursos de graduação, ficando o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais responsável apenas pela avaliação da aprendi-
50 zagem, isto é, do “desempenho estudantil”. Outro argumento levantado pelos formuladores dessa política é que a atividade de visitas é feita por um grupo de consultores ad hoc e que, com a constituição de um corpo de servidores desse órgão, tal papel ficaria a cargo desses últimos, que poderiam coordenar as equipes que vão a campo para a realização do trabalho. Isso levará, se aprovado, à criação de outra estrutura organizacional, de uma nova autarquia que terá um presidente, seis diretores (administração, regulação, supervisão, avaliação e tecnologia da informação e de certificação de entidades beneficentes), além de outros cargos. Um dos argumentos utilizados para a criação do Instituto, aliás, praticamente o único, é a necessidade da ampliação do número de servidores qualificados para a realização das atividades que garantam a qualidade da educação superior, por meio da atualização de “mecanismos de avaliação e supervisão da Educação Superior no Brasil, por meio das melhores práticas nacionais e internacionais em processos gerenciais, metodológicos e organizacionais customizadas à realidade nacional” (documento enviado à Presidência da República, 2012). A análise do Projeto de Lei revela a abrangência do Instituto, que tem como proposta realizar a regulação, a supervisão, a avaliação, a tecnologia da informação e de certificação e chama a atenção ao fato de um mesmo órgão realizar a regulação e a avaliação dos cursos. A regulação é entendida como o processo de produção de regras e de orientação das condutas dos sujeitos; representa um conjunto de mecanismos que vai permitir o controle, através do qual um sistema busca manter o equilíbrio, ou orientar as suas ações. Ou seja, a regulação corresponde a arranjos institucionais tais como as regras e leis que são definidos pelo Estado, visando a ajustar as ações a determinadas finalidades. (Barroso, 2005) Em relação à avaliação, o Estado brasileiro assumiu o papel de avaliador, em função das características gerencialistas que adquiriu na reforma sofrida que visou alinhá-lo aos interesses mercadológicos, tendo o governo central passado a exercer um forte controle sobre as instituições de ensino. O mercado passou a ter grande interesse por essa política de avaliação e vem atuando de maneira agressiva em diferentes sistemas educacionais dos estados e municípios, exigindo, por meio de políticas estabelecidas, a definição de indicadores que possam atender a seus interesses. A regulação e a avaliação devem ser exercidas por entes diferentes, tendo em vista que um estabelece as regras e outro deverá verificar o cumprimento das mesmas. Assim, o INSAES não deveria abarcar as 2 funções, mesmo que essas ocorram em setores diferentes. Precisa-se ter claro que o papel do Estado, enquanto um ente Regula-
51 dor e Avaliador, está estreitamente vinculado ao processo de globalização que impulsionou a reforma nos Estados nacionais, buscando dar ênfase à mundialização financeira que acaba por determinar as funções que os aparelhos da sociedade política e civil devem desempenhar A defesa da criação dessa instituição se prende no argumento da qualidade do ensino, sem deixar explícito o que entende por tal e também no crescimento desordenado de instituições privadas de ensino. Nenhum desses dois argumentos se sustenta, pois não será a criação de um Instituto que permitirá a melhoria do ensino superior, nem a diminuição do número de escolas superiores que são autorizadas pelo governo a funcionar. Até porque, como já explicitado anteriormente neste texto, já existem órgãos do próprio Ministério da Educação que tem como função atender a esses pontos. Tal projeto de lei teve aprovação para tramitar na Câmara de deputados em regime de urgência. Contudo, por motivos não claros, isso não ocorreu, ou seja, a votação. Caso o Congresso aprove tal ideia, ressalte-se encaminhada pelo executivo, mais uma vez fica evidente a falta de sensibilidade dos deputados e senadores em relação ao teor do projeto, sobretudo em um momento de grave crise pela qual passa o país.
Referências BARROSO, João. O Estado, a Educação e a Regulação das Políticas Públicas. Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n. 92, p. 725-751, Especial - Out. 2005 7 BRASIL. Presidência da República. Subchefia de Assuntos Parlamentares, 2012. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Projetos/ExpMotiv/EMI/2012/199%20-%20MP%20MEC%20MF.htm. Acesso 4 et 2015 MEC/INEP/SERVIDORES. Que lástima, Ministro. s/d. Disponível em: https://blogdoinep.wordpress.com/category/insaes-2/. Acesso 05 set 2015