Smart Living - O Poder dos Dados nas Cidades Inteligentes [Revista IT Insight]

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SMART LIVING O PODER DOS DADOS NAS CIDADES INTELIGENTES Cada vez mais cidades tomam partido da transformação digital para otimizar a gestão dos serviços municipais, melhorar a qualidade de vida dos seus habitantes e reduzir a sua pegada ecológica. MARGARIDA BENTO

DE ACORDO COM AS NAÇÕES UNIDAS, até 2050, 70% da popula-

Contudo, tudo isto tem algo em comum: dados. São os dados que per-

ção do mundo irá viver em áreas urbanas. Como tal, a pressão já exis-

mitem suportar a tomada de decisões, a extração de insights valiosos

tente sobre os recursos urbanos – e consequente degradação da qualida-

que permitam otimizar o planeamento urbano e a criação de sistemas

de de vida, sustentabilidade, e funcionamento dos serviços municipais

inteligentes e dinâmicos para maximizar a eficiência dos serviços muni-

das cidades – atingirá níveis incomportáveis. Torna-se, então, necessário

cipais.

recorrer a tecnologias que permitam, através da digitalização, agilizar todos os processos de forma a tomar o máximo partido dos recursos

CLOUD E EDGE

municipais existentes.

Como tal, um dos fatores mais fulcrais para o sucesso de qualquer pro-

O processo de transformação de uma smart city pode abranger varia-

jeto de smart city são os recursos de computação, agregados na cloud

das áreas: desde a mobilidade urbana até à saúde, gestão de resíduos,

ou em data center, ou descentralizados no edge, consoante as necessi-

sustentabilidade, segurança pública e qualidade de vida. Cada cidade

dades específicas de cada aplicação. Para o processamento e tomada

é, inevitavelmente, um caso, e os projetos implementados vão sempre

de decisões em tempo real, o edge computing, enquanto complemento

depender das necessidades específicas de cada uma.

da cloud, é a opção ideal, oferecendo baixa latência para uma rápida ITInsight 36


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tomada de decisões em aplicações críticas. Por outro

tra forma é apenas possível com uma grade sobredi-

lado, para uma análise contextualizada desses da-

mensionação da capacidade computacional.

dos, bem como para a gestão integrada e holística

Numa cidade, e com a exceção de algumas raras

de todos sistemas, é necessário agregar e tratar todos

aplicações, a tendência é sempre para a centraliza-

estes dados na cloud.

ção, de forma a tomar o maior partido possível dos

Sendo isto o cenário ideal, muitas vezes o sucesso

dados na tomada de decisões informadas, atempadas

da implementação de projetos smart city é limitado

e contextualizadas, total visibilidade dos sistemas e

pela infraestrutura de IT à disposição do município–

extração de insights que assistam no planeamento

motivo pelo qual, explica Pilar Torres - Directora do

urbano.

- Bruno Gonçalves Responsável de Negócio para o mercado de ITS da GMV em Portugal

Setor Público da AWS Iberia, serviços cloud acabam

Em Portugal, no entanto, este nem sempre é o caso:

por se tornar uma opção mais eficiente do que o uso

“A maior tendência que vemos nos municípios são

de um data center nativo:

sistemas distribuídos, que não comunicam entre si.

“As smart cities geram volumes enormes de dados

O futuro passa por ligar estes sistemas de forma a

oriundos de sensores e outros dispositivos. Integrar,

que se possa gerir e controlar, de forma centralizada,

armazenar e analisar esses dados em tempo real re-

todos os aspetos relacionados com a cidade. Os pro-

quer uma grande capacidade de computação, o que

jetos que temos vindo a desenvolver com os municí-

não é possível fazer sem recursos a serviços de cloud

pios já assentam em arquiteturas com IoT, Redes de

computing que assistam no processo".

Comunicação Inteligentes e Plataformas de Gestão

É também necessário que os recursos computacio-

Centralizada”, relata Henrique Mourisca, Diretor

nais sejam escaláveis, não só ao longo do tempo,

Geral Adjunto da Softinsa.

- João Paulo Fernandes -

para permitir a integração de novas workloads no

“A dimensão das nossas cidades talvez seja a chave

Diretor-Geral NEC Portugal

futuro, como também em curtos períodos de tempo,

para a explicar”, acrescenta João Paulo Fernandes,

como seja a diferença entre o volume de dados de

Diretor-Geral da NEC Portugal, “dado que na maior

trânsito em diferentes horas do dia, o que de ou-

parte dos casos essa dimensão não é provavelmente ITInsight 37


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suficiente para que os benefícios do edge computing “A localização faz parte do dia-a-dia de qualquer se possam tornar evidentes”.

cidadão e é informação essencial para qualquer ac-

Joana Miranda, Diretora das Áreas de Administra- ção que se tome sobre o território”, explica Sandra ção Pública e Saúde na Minsait em Portugal, por Novais Neves, Sector Lead – Local Government da outro lado, relata uma visão menos otimista: ape- Esri. “Com a habilitação geográfica de dados e sistesar de este ser, de facto, o objetivo dos municípios, mas empresariais, os municípios podem gerar inteé raro estes terem a capacidade de implementar os ligência de negócios, estabelecer fluxos de trabalho - Joana Miranda Diretora das áreas de Administração Pública e Saúde na Minsait em Portugal

sistemas necessários, por temas organizacionais ou mais eficientes, melhorar a comunicação e resolver de aplicações.

um problema na sua totalidade, em oposição às suas partes individuais”.

GEOREFERENCIAÇÃO

Assim , conclui, sistemas de informação geográfica

Se a contextualização dos dados representa um pa- ajudam os municípios a a reduzir custos, agilizar e pel fulcral em qualquer smart city, não há contex- apoiar a tomada de decisões, e definir políticas que to mais relevante que a localização – não só de um melhoram a qualidade de vida geral – não só como ponto de vista estritamente técnico, como também um todo, mas também bairro por bairro, no conpara a contextualização dos dados obtidos em dife- texto dos problemas, características e necessidades rentes áreas de uma mesma cidade, que será, regra específicas de cada área. geral, extremamente heterogénea. De certa forma, - Pilar Torres Directora do Setor Público da Amazon Web Services (AWS) Iberia

podemos dizer que não há smart cities sem georre- MOBILIDADE ferenciação, dependendo desta o funcionamento de A mobilidade urbana é sem dúvida um dos temas qualquer sistema que inclua elementos móveis, seja mais prementes na área de smart cities, não só pelo nos transportes, gestão de resíduos, ou aplicações seu forte impacto na qualidade de vida dos cidadãos móveis usadas pelos cidadãos e colaboradores mu- como também pela sua forte relação com a sustennicipais numa variedade de contextos.

tabilidade ambiental. ITInsight 38


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O panorama da mobilidade urbana em Portugal,

“Do lado da tecnologia, é geral a exigência da do-

apesar de ter demonstrado alguma evolução nos

tação de todas as concessões de sistemas de apoio à

últimos anos, ainda tem um muito longo caminho

exploração, informação ao passageiro, ou bilhética,

a percorrer.

assegurando interoperabilidade, liberdade de escolha

“Continuamos a observar a preferência pelo ex-

no meio de suporte a títulos de transporte e na forma

cesso de automóveis em detrimento dos trans-

de pagamento, bem como na intermodalidade permi-

portes públicos, bem como a poluição que daí

tida, assegurando em alguns casos que o mesmo títu-

advém”, relata Bruno Gonçalves, Responsável

lo permita o acesso a vários modos de transporte”,

de negócio para o Mercado de ITS da GMV em

relata Bruno Gonçalves.

Portugal “Continuamos a ter transportes públicos

Olhando para o futuro, as maiores disrupções tec-

insuficientes e desadequados, por vezes inexisten-

nológicas serão, para além da mobilidade elétrica e

tes, mais uma vez empurrando as pessoas para o

autónoma, a infraestrutura inteligente, que permitam

transporte privado”.

a comunicação bilateral entre veículos, condutores,

Por outro lado, tem vindo a ocorrer nos últimos

peões, estacionamentos, entre outros, dotando todos

anos uma pressão contrária por parte do planea-

os agentes envolvidos de dados que permitam tomar

mento urbano, por um lado através da restrição

decisões em tempo real, desde a condução autónoma

de vias e criação de zonas de acesso reduzido ou

até à gestão de estacionamento.

- Henrique Mourisca Diretor Geral Adjunto, Softinsa

proibido, devolvendo a cidade às pessoas e criando fricção contra o uso do automóvel pessoal.

DE 2021 EM DIANTE

Por outro lado, através da facilitação de meios

Nos próximos anos, prevê Pilar Torres, a maturi-

de transporte alternativos, através da construção

dade do 5G virá a impulsionar o desenvolvimento

de ciclovias, implementação de novos modelos de

de smart cities, permitindo uma maior cobertura e

mobilidade e investimento nos transportes públi-

menor latência nas comunicações celulares e, como

cos multimodais.

tal, agilizando qualquer sistema que envolva grandes

- Sandra Novais Neves Sector Lead – Local Government da Esri

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volumes de dados, mobilidade, ou rapidez de

“Um dos principais desafios será também a

resolver que resultará o plano diretor para a

resposta.

recuperação do turismo, que vai exigir uma

transformação digital da cidade, que deverá

“No caso dos transportes, soluções com base

maior transparência e confiança, de forma

ser a pedra basilar para o início de qualquer

no 5G teriam a capacidade de recolher dados

a que os turistas considerem retomar as via-

projeto de cidade inteligente.“

de múltiplas fontes e agrega-los numa central

gens”, acrescenta.

Outro desafio na conciliação da tecnologia

de controlo quase em tempo real para otimizar

Contudo, uma smart city não começa nem aca-

e gestão municipal é apontado por Sandra

a gestão da infraestrutura de transportes pú-

ba com a tecnologia. João Paulo Fernandes

Novais Neves: nenhuma tecnologia, e certa-

blicos “, refere o responsável.

prevê que o principal desafio para os próximos

mente nenhum sistema desta magnitude e cri-

Adicionalmente, o uso de tecnologias como a

anos será o das cidades resistirem ao efeito

ticidade, pode ser simplesmente instalada e

inteligência artificial e machine learning permi-

“moda” do movimento smart city e implemen-

deixada a funcionar até ao fim da sua vida.

tirá tirar o máximo partido dos dados, especial-

tarem projetos que realmente façam sentido

Qualquer sistema tem de ter uma constante

mente em conjunção com tecnologias de IoT.

para as necessidades da sua cidade, ao invés de

atualização de dados, manutenção das plata-

“Uma implementação bem sucedida de uma

tornar a cidade uma mera montra para a tecno-

formas e continuidade de acções de inovação

estratégia de smart city requer consolidação

logia sem benefícios concretos para o cidadão.

tecnológica. Isto equivale não só a um cons-

e integração de dados, parcerias público-pri-

”A tecnologia deve ser vista como um instru-

tante investimento financeiro, como também à

vadas e a implementação de análise preditiva,

mento e não como um fim em si, o que signifi-

alocação de recursos humanos, ambos já sob

insights que só podem ser obtidos através da

ca que cada cidade deve começar por fazer um

pressão na maior parte dos municípios.

tecnologia”.

trabalho de identificação dos seus principais

“Um desafio importante será conseguirem en-

Joana Miranda prevê também que haverá um

problemas e prioridades, cruzando-os com o

contrar o equilíbrio entre estas duas dimen-

forte crescimento na área de prestação de ser-

valor que as ferramentas tecnológicas podem

sões, o investimento financeiro e a capacidade

viços móveis no âmbito da assistência social,

aportar na resolução de cada um desses pro-

de manter vivos os sistemas, o que obrigará a

prestação de cuidados de saúde, proteção civil

blemas e prioridades”, conclui o responsável.

um planeamento estratégico bem definido de

e segurança, áreas para as quais a pandemia

“Será desse cruzamento entre os problemas

quais as áreas para reforço de investimento”,

veio a chamar atenção.

da cidade e a capacidade da tecnologia em os

conclui. ITInsight 40


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