Zine-Ocupa

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Ocupa é um lugar onde artistas visuais pretos tem um refúgio para divulgar sua arte e ao mesmo tempo pessoas não artistas conhecer a arte de pessoas pretas. Esse zine foi feito para empoderar artistas e ao mesmo tempo informar ao público a se inteirar do que a de novo (e até de velho) na arte visual afro-brasileira. Então, sinta-se em casa e ocupe esse espaço que sempre foi nosso!

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Biografia

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Maria Auxiliadora, uma pintora brasileira Se liga ai!

Arte periférica em ambiente digital Conheça

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Juliana e as cores Alexandre dos anjos funde orixas e moda urbana em nova coleção ispiritual Indica ai!

Galeria

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Biografia

Ma ria Au xil iad ora, um a pin to ra bras ile ira

Uma exposição no MASP revaloriza a obra da neta de escrava, uma das grandes artistas do século XX Matéria: RUAN DE SOUSA GABRIEL/ Epoca Fotos: Divulgação MASP

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Auxiliadora “ Maria é uma precursora da body art

Em 1970, o jornal Dia e Noite publicou a crítica da exposição de arte em cartaz na galeria do Consulado Americano em São Paulo. O título do artigo nada dizia sobre as telas expostas, mas sublinhava a origem social de sua autora: “Empregada doméstica trocou o aspirador pelos pincéis”. A “empregada doméstica” era Maria Auxiliadora da Silva (1935-1974), que nascera em Campo Belo, no oeste de Minas Gerais, morava no bairro da Casa Verde, na Zona Norte de São Paulo, e vendia seus quadros na Praça da República, no centro da capital paulista. Maria Auxiliadora crescera numa família de trabalhadores e artistas autodidatas, militantes do movimento negro — sua avó fora escrava. Como pintora, produziu obra singular, avessa ao bom gosto convencional e atravessada pelo protagonismo dos corpos negros e das tradições culturais e religiosas afro-brasileiras. Além de ressaltar a origem social de Maria Auxiliadora, o crítico do Dia e Noite implicou com sua técnica pouco acadêmica e apontou para a “ingenuidade, natural numa moça que, entre uma profissão e outra (empregada doméstica e pintora), não teve oportunidade wonde receberia os ensinamentos que dão segurança e continuidade ao trabalho”.

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(arte corporal) no Brasil. Colocar mecha de cabelo crespo numa tela é também uma forma de afirmação identitária, de afirmação da negritude da artista”

Renata Bittencourt, diretora do Instituto Brasileiro de Museus do Ministério da Cultura

Nos anos 1970, a obra de Maria Auxiliadora migrou das feiras de rua paulistanas para os museus. Na Praça da República, ela conheceu o físico e crítico de arte Mário Schenberg (19141990), que se deslumbrou com as cores e a técnica de Maria Auxiliadora. Schenberg a apresentou ao cônsul americano Alan Fisher, que organizou a primeira exposição individual da pintora. O prestígio de Maria Auxiliadora cresceu e suas obras passaram a ser disputadas por colecionadores estrangeiros e a figurar em exposições no Brasil e no exterior. Em 1973, ela participou da Exposição afro-brasileira de artes plásticas, no Masp. Pietro Maria Bardi (1900-1999), o icônico diretor do Masp, publicou um livro sobre ela em quatro idiomas. O museu paulistano tem quatro telas da pintora em seu acervo.

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Ao pintar os negros em posições de destaque, a obra de Maria Auxiliadora se contrapõe à tradição artística brasileira, que representou os negros como escravos e trabalhadores braçais ou domésticos. Nas obras dela, negros podem ser professores e estão livres do jugo do trabalho braçal: namoram, dançam, passeiam pela cidade, participam de rituais religiosos. Maria Auxiliadora subverte também as técnicas e as matérias de pintura. Ela trabalhava com uma mistura de tinta a óleo feita no Brasil, massa plástica Wanda (recomendada para pequenos reparos domésticos) e mechas do próprio cabelo crespo, usado para dar volume aos corpos negros.

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obra de Maria não “ AAuxiliadora é política como

um manifesto, mas como materialização da expressão pessoal de uma mulher negra que encontra sua voz olhando para perto, para si e para os seus, ao tratar de seus desejos e de sua inserção no mundo

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se liga ai!

Arte periférica em ambiente digital No Festival Pangeia a Exposição Origens #3 possibilita acesso à arte e cultura em tempos incertos Matéria: Mariane Del Rei/ Revista Periferias

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Após um ano da pandemia, a sociedade teve que se ajustar à vivência dos novos tempos. Para a arte e cultura, não foi diferente. Segundo pesquisa realizada pelo International Concil of Museums - Brasil (ICOM BR) a ampliação da presença digital dos museus já não era novidade, mas foi acelerada pela pandemia. A princípio, a exibição das obras foi idealizada para ocorrer no formato presencial, no Centro Cultural do Grajaú, em São Paulo. Devido a pandemia, foi transferida para o meio virtual, aumentando o seu alcance e chamando a atenção do público — não só do Brasil, como de outros países. A exposição recebeu visitantes internacionais de diversas localidades como Estados Unidos, México, Angola, Moçambique, Equador, Holanda, Áustria e Itália.

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Acreditamos que a maior movimentação contrahegemônica possível para artistas marginais é entender os processos individuais de cada artista e, assim, fortalecer as iniciativas independentes. Na mesma medida, a noção de comunidade é muito presente nestes artistas, não sendo raro conexões e parcerias sob diversos parâmetros de troca. Isso cria redes autossuficientes de produção e apreciação artística, possibilitando a existência, não de um, mais de vários circuitos periféricos de arte

As pessoas estão acostumadas a olhar as obras de arte de perto, ver textura, sentir cheiro, ver o tamanho, ter uma sensação presencial, e isso nos deixou muito apreensivos, preocupados pela experiência não se dar por completo por ser virtual.

A mostra paulistana foi composta por mais de 50 obras entre pinturas, colagens, artes digitais e fotografias produzidas pelos artistas Isabela Alves "Afrobela", Cauã Bertoldo, Cassimano, Paulo Chavonga e Ione Maria — artistas plurais que retrataram em suas obras as origens diaspóricas envolvidas em seus cotidianos, refletindo essências da diáspora africana nas realidades periféricas.

Assim, as obras concebidas para a exposição são afetações ligadas a essas duas propostas, deixando evidente, quando apreciamos essas obras, toda a vivência desses artistas com base nos lugares onde vivem e a busca pela ancestralidade relacionada a conexão afrodispórica, uma vez que todes são pessoas pretas”, destacou. Priscila Magalhães também contou sobre o grande desafio de levar apresentação artística para a internet, um desapegar da experiência presencial que leva a pensar numa disposição mais atrativa para o público das obras no site. “Claro que, de modo geral, uma exposição presencial traz mais sensações ao público, mas tivemos que nos adaptar e levar arte às pessoas de uma forma diferente. Tivemos um público bem expressivo, dando indicativo que a apreciação aconteceu, de fato, mesmo que em ambiente virtual”, enfatizou a produtora cultural.

Em entrevista, a responsável pela curadoria da Exposição Origens #3, Priscila Magalhães, falou como a vivência dos artistas, oriundos de territórios periféricos, contribuiu efetivamente para a construção das obras expostas e para a exposição em si. “A ideia de curadoria da exposição estava atrelada à visão de artistas periféricos relacionada ao território e a ancestralidade.

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Conheça!

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Juliana e as cores Design e ilustradora, Juliana Menezes de 22 anos traz cores vivas e representatividades em sua arte.

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Uma das características que mais chama atenção no trabalho da Juliana é as cores e as representatividades em seus desenhos. Juliana traz em seus trabalhos, traços semelhantes ao cartoon, marcado por cores alegres e retratando corpos fora do padrão. Aos 22 anos, a artista é formada em design e já desenhou para Capricho e atualmente faz parte da equipe criativa da marca de maquiagem Dailus. Como surgiu seu interesse pelo design e ilustração? Desde pequena eu sempre gostei muito de desenhar, dessa parte visual, desenhos animados, gibis da turma da mônica e livros ilustrados. Era algo que sempre faziam brilhar os olhos! Lá pra pré adolescência, comecei a consumir muitas revistas teens e minha paixão por design e diagramação começou a crescer. Todas aquelas texturas, desenhos, cores, tipografia e a forma como eram distribuidos os elementos dos artistas que eu tanto amava e que também me inspiravam, era demais! Você teve dificuldade para desenvolver um estilo próprio de ilustração? Eu acredito que nosso estilo tá sempre evoluindo, sempre pegando pequenas coisas que gostamos e adicionando aos nossos desenhos. E descobrir aquilo que você gosta no meio de tanta gente talentosa é dificil, pois você sempre acaba se fazendo autocobranças, achando que o estilo de desenho de tal artista é melhor ou mais legal que o seu , que a forma como ele desenha x coisa é mais criativa e interessante. Então por acabar gostando de vários e vários estilos

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de desenho, criar o meu próprio estilo foi e é um desafio! Ainda mais por querer ter algo único, querer ser reconhecido por algo que só você faz e que a pessoa bate olho e fale antes mesmo de ver quem é o autor: “puts, essa ilustração aqui é da artista x!”. Amo que seus trabalhos possuem muita representatividade de corpos e raças. Você acha importante essas representatividades no mundo da arte? Demais! Acredito que essa representatividade é essencial para mostrar ao mundo aquilo que é “diferente” também é bonito, também deve ser representado e fazer com que as pessoas se identifiquem.

Como foi ver uma ilustração sua em um livro? Foi surreal! Foi uma realização imensa, ainda mais por terem me procurado para fazer parte desse projeto simplesmente porque gostaram daquilo que eu produzo, de como eu produzo e de como é meu olhar para retratar certas coisas. É um misto de sentimentos, ver algo que você produziu sendo consumido por outras pessoas espalhadas pelo Brasil é muito massa.


Que dicas você daria para quem está começando nesse mundo do design e da arte? Não tenha medo de errar, de tentar algo novo e expor pro mundo. Não fique preso na ideia de que tudo tem que ser perfeito, até porque essa ideia de perfeição não existe, além de que, estamos sempre evoluindo para melhor. Então faz aquilo que você gosta e você tem vontade de fazer, mesmo com medo mesmo e sem essa pressão de que precisa ficar uma obra prima. Você também não precisa mostrar pra ninguém algo que você não queira, então tá tudo bem se não ficar como você imaginou ou você acabar não gostando.

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Conheça!

ALEXANDRE DOS ANJOS FUNDE ORIXÁS E MODA URBANA EM COLEÇÃO ESPIRITUAL Memórias dos carnavais e de seu primeiro jogo de búzios baseiam arte em movimento do estilista na Casa de Criadores. Matéria: PEDRO DINIZ/ Elle Brasil

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Alguns processos criativos precisam ser explicados para que seu valor não se perca em leituras apressadas. À primeira vista, as roupas que Alexandre dos Anjos mostrou neste segundo dia da Casa de Criadores se resumem a variações de casacos pesados, vestidos longos e conjuntos de camisas e calças amplas tingidas com pinceladas grossas de colorido elétrico. E ponto. Mas não é bem assim.

Os arquétipos de orixás se materializaram nessa conexão espiritual implementada em bases lisas.

O filme foi gravado em meio às memórias guardadas no barracão da escola de samba VaiVai e mostra como o designer transformou o corpo em tela em branco para pintar uma moda figurativa, baseada no primeiro jogo de búzios tirado por ele, em 2013.

Pinturas de rostos surgem na tela, resgatando as lembranças que o estilista guarda do chão apinhado de gente dos carnavais. Nesse misto de homenagem ao passado e reverência ao presente exposto na imagem urbana, caótica como as pichações que agora enchem coleções mundo afora, Anjos cria um universo paralelo ricamente adornado em cores e linhas irregulares.

Com um certo teor alegórico, tal qual a memória da primeira vez que cruzou um sambódromo, ele aplica detalhes em tule e franjas nas barras, acessórios de brilho e grafismos que, misturados, amplificam o choque de colagens proposto pela apresentação.

É o tipo de roupa que exige ser vista, tocada e sentida nas minúcias, como acontece com aquelas guardadas no armário mais por causa de seus significados do que pelas possibilidades de uso no dia a dia.

Há ancestralidade na costura concebida para esta coleção, mas ela aparece quase como uma obra de arte em movimento, explosiva e carregada de elementos que só de perto podem ser entendidos.

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Indica ai!

Galeria JUlho 22

Os meninos Analogica 2022

GUTO EZEK Fotógrafo e historiador da arte em formação, Guto mora no centro de São Paulo. Suas fotográfias registram o cinza do centro de sampa e seu cotidiano. Instagram: @Gutoezek

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a amante, presa na terceira dimensão tinta acrílica sobre tela 30 x 30 cm

Nina Satie Nascida na zona norte de São Paulo, no bairro do Tremembé, Nina Satie transita entre as mídias tradicionais, como pintura e desenho, e enxerga um futuro em que sua arte ocupe inúmeras outras possibilidades. Instagram: @ninasatie

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A saudade de quem fica. Lapis de cor sobre o papel 29x21

Bisoro Artista plástico recifense que reside em São Paulo, trabalha com múltiplas linguagens artísticas. Influenciado pelo universo dos quadrinhos, o artista cria uma atmosfera baseada na melancolia e na profundidade de sentimentos que são transmitidos pela expressão, formas e cores de suas criações. Instagram: @bis0ro

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Meu eu. tinta acrilixa sobre tela 29x21

Larissa de Souza Artista paulistana de 26 anos, que plasma em suas telas a memória de sua ancestralidade, os afetos de sua identidade e as lembranças de cenas que ela gostaria de ter visto enquanto crescia. Instagram: @azuoslarissa

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