ABZOLUTA! ALCIDES NOGUEIRA
ABZOLUTA…………………………………………………………………………………………………….2
personagem:
TETÉ ALVARENGA, um transexual de meia-idade
a ação acontece no quarto de um hospital, momentos antes de TETÉ ser levada para o centro cirúrgico, para a operação de troca de sexo
para Francarlos Reis, com admiração e carinho A.Nogueira – São Paulo/outono de 2002
ABZOLUTA…………………………………………………………………………………………………….3
CENA 1 Luz acende lentamente sobre TETÉ, que está deitada na cama do quarto de hospital, encolhida, com medo. Ela veste trajes hospitalares. Sua aparência é masculina, apesar dos seios de silicone, que formam um volume sob o avental. A barba está crescida... Uma touca não deixa ver seus cabelos mais ou menos longos... Um tempo de silêncio. Subitamente, TETÉ salta da cama, já falando com alguém imaginário, que está ali no quarto com ela.
TETÉ Eu vou fumar, caralho!!!! Claro que eu vou fumar!... (PEGA UMA BOLSA E REMEXE FRENETICAMENTE) Levaram o meu maço... Odeio que mexam nas minhas coisas! Odeio!... Quem eles pensam que são?... Com quem eles pensam que estão lidando?... Não precisa responder, Samanta... JAMAIS vou me esquecer que sou MARIA ESTEFÂNIA PAES DE ALMEIDA TELLES ALVARENGA... TETÉ... TETÉ ALVARENGA... Prefiro, você sabe muito bem disso!... (T) TETÉ ALVARENGA, caceta!... Ninguém me detona como se fosse a bala que matou Kennedy não!... Estão pensando o quê?... Me dá um cigarro, Samanta!... Como não?... Não vê que estou a ponto de ter um ataque de nervios maior do que a Carmen Maura no filme do Almodóvar?... Pára com essa história de que aqui não pode fumar!... Estou pagando... Estou pagando uma fortuna por este quarto... Estou torrando toda a minha grana nessa operação... EU TENHO O DIREITO DE FUMAR!!!!. E de tragar, entendeu?... (T) Devia ter trazido uns baseados escondidos no sutiã... Não precisa me corrigir, Samanta... Eu sei que tiraram meu sutiã, minhas calcinhas, minhas meias, me deixaram uma ninguém!... Por favor, Samanta... Eu não paguei a sua passagem do Brasil até aqui... Como?... Ah, tá boa!... Queria vir na primeira classe comigo?... Está conhecendo a Suíça de graça e ainda fica reclamando porque veio no Pavilhão 9 do avião?... Devia beijar meus pés nem que tivesse vindo pendurada na asa... O cigarro!... JÁ!... Como parou de fumar?... Ontem ainda parecia uma chaminé... Era um atrás do outro... Já reparou a ponta do seu dedo, queridinha?... Está a-ma-re-lo... Amareladérrimo... Está certo que as cores cítricas estão na moda... Mas não no dedo... (T) Tudo bem... Não vou rastejar por causa de um cigarro... (OLHA PARA UM PONTO, SE APRESSA) Mas vou fuçar na sua bolsa, meu amor, como fizeram com a minha... Quieta aí!... (MEXE NA BOLSA E PEGA UM CIGARRO E ISQUEIRO. ACENDE. DÁ UMA LONGA BAFORADA)... Ahhhhhhhhhhhhh... Como se fosse o primeiro cigarro da minha vida... O quê?... Vira essa boca, Samanta... Imagina se pode ser o último!... Já sei, já sei... Você vai me falar que é como aquelas cenas de filme, quando o condenado à morte fuma seu último cigarro... Eu estou condenada à vida, meu amor!... À vida que sempre sonhei... Até parece que você não é uma traveca!... Não é completinha porque é bundona!... Não têve coragem de se operar!... Pára
ABZOLUTA…………………………………………………………………………………………………….4
de dizer bobagem!... Só vão cortar um pedaço de carne que eu não uso para nada... Você sabe muito bem que NÃO consigo ser ativa!... Nunca fui... (T) Sou uma fêmea!... Nem você é ativa... Vive se coçando por causa da alergia que te dá o emplastro... Falta de dinheiro?... Se tivesse economizado dez por cento de tudo o que já gastou com roupa, maquiagem, sapato, bijoux, peruca, perfume e o caralho a quatro... teria grana pra estar aqui, como eu... Eu sei que não foi desse jeito que as freiras do Sacre Coeur me ensinaram a falar... Nem minha mãe, coitadinha... Mas estou tensa... Tensa, deprimida, nervosa, em pânico, me cagando toda!... Imagina se é por causa do pau... Já disse que essa tripinha não vai me fazer a menor falta... É outra coisa que estou sentindo... Você não tem capacidade pra entender, deixa pra lá... Deixa pra lá e me passa mais um lexotan!... Também parou de tomar?... Você, a rainha de todos os benzodiazepínicos?... Eu acredito em Papai Noel, duende e na Regina Duarte... Fica aí!... Se tentar me segurar eu berro que tá pegando fogo aqui no quarto... (PEGA DE NOVO A BOLSA DE SAMANTA, REMEXE)... É... Não tem nenhum... (T) Você parou mesmo?... Gente, eu não acredito mais em Papai Noel, nem em duende e nem na Regina Duarte... (T) O que é isto aqui?... (PEGA UM PAPELOTE) Não acredito, amiga!... Um glitterzinho básico?... (T) Fica aí!... Era seu!... Agora é meu!... Fica por conta das suas despesas... Devia ter pensado duas vezes antes de trazer uma acompanhante... Devia ter convidado a Cherry... A Cherry, que é que tem?... Exatamente por isso... Ela ficou surda e muda, de tanto bagulho que usou... Parece que pó, mais pico, mais álcool, mais ecstasy, mais maconha, mais cigarro, mais tudo.... NO CASO DELA.... a coisa não pegou bem!... Neurônio derretido, coisa assim... Você sabe que não entendo muita coisa de neurologia... Mas ela NÃO IA ficar me enchendo o saco, como você!... (T) Não tá batizada, né?... Sei lá... Esse cara que tá te passando agora vou te contar.... Eu tinha um amigo... O Gui... Ele deve ter começado a cheirar no berçário... Muito louco... Um dia, estava com a grana curta e comprou pó de um sujeito que ele não conhecia... Pó de mármore puro... Quase morreu... Se ainda tivesse virado uma estátua... (CHEIRA) É das boas... Puríssima, amiga... Quanto você pagou por isto aqui?... (CHEIRA MAIS) Fico imaginando o Gui de David de Michelangelo... Era lindo... Gostosérrimo... Eu?... Nunca... Nunca dei pro Gui... Amigo de infância!... Questão de ética... Não faço sexo com amigos... Crescemos juntos... Ele me acompanhava nos mingaus do Paulistano... O Gui estava sempre cheirado... Achava o máximo eu aparecer no clube de mulherzinha... (CHEIRA) A última fileira... Pena... (T) Eu deixava toda a minha roupa escondida no jardim... Você não conheceu minha casa... Era enoooooooooorme... Velho São Paulo, Samantíssima... No jardim, tinha uma verdadeira floresta de azaléias... Minha mãe vivia dizendo que ia mandar arrancar tudo aquilo, que azaléia era flor de pobre, que tinha pela cidade inteira... E eu batia o pezinho... Não deixava arrancar nenhuma... Ela achava que eu amava de paixão aquelas flores horrendas... Mal sabia que eu dava escândalo pra ninguém acabar com o esconderijo das minhas
ABZOLUTA…………………………………………………………………………………………………….5
roupas... Onde eu ia me montar se alguém derrubasse aquela moita?... Imagina que eu consegui até um ferro de passar a pilha, bem pequenininho, só pra assentar o modelito... Claro que tem ferro a pilha... Uma amiga minha que me trouxe de Nova York... (RI) Gente, acho que eu fui a única pessoa do mundo que têve um closet de azaléia... (T) Um dia eu me aprontei todinha... Estava linda... Já era outono, e minha madrinha tinha me dado um conjuntinho de banlon... Verde-água... Combinava... Estava me achando o máximo com sapatinho salto dois, saia plissada... Só detestava aquela peruca com bombril dentro... Claro que tinha de usar peruca, Samanta... Como eu ia deixar crescer o cabelo?... (T) Já estava com o bananão na cabeça, meio agachada dentro da moita, esperando o Gui... Foi quando eu ouvi o barulho... (T) Uma batida seca... Um corte... Como se uma faca estivesse cortando minha pele... Mas não doía... Era um NADA... (T) Depois, eu comecei a ouvir gritos... Eram as pessoas que estavam saindo da minha casa... Das casas vizinhas... De repente, ficou tudo muito longe... Como se eu não quisesse escutar mais nada... Não quisesse ouvir a sirene da ambulância que estava chegando... (T) Mas eu saquei o que tinha acontecido... O carro do Gui... Entrei em casa montada mesmo... Estava todo mundo tão passado... Minha mãe e minhas irmãs chorando... Meu irmão chutando a porta, como se fosse um cachorro nervoso... que ninguém nem notou nada... Acho que pensaram que eu fosse alguma mocinha da vizinhança... Alguma amiga do Gui que tinha ficado sabendo do acidente... Da morte dele... Da morte dele na frente da minha casa!... (T) Eu saí da sala... Passei pela cozinha... As empregadas estavam chorando... Todo mundo chorava pelo Gui... Aí, dei a volta e cheguei de novo no meu closet de azaléia... Tudo tão louco... Eu não sentia nada... Ia trocando de roupa... tirando aquele bananão da cabeça... Botando a cueca, as calças, a camisa... Sem pensar em nada... Minha cabeça parecia que estava ôca... Mas não estava, Samanta.... Estava cheia, muito cheia... Cheia de medo... Era a primeira vez que eu encarava a morte... (T) Como está agora... Por isso fico enchendo minha cabeça com essas lembranças... Pra não pensar no que vai me acontecer, amiga... Depois que eles chegarem aqui, me colocarem na maca, me derem o pré-anestésico... eu vou ficar como aquela tarde na moita de azaléia... Parada!... Sem saber de nada... Não vou ver nada... Não vou saber de mais nada... (T) Chega!... Canta pra subir!... Tô louca?... Eu sempre quis isso... Virar mulher... Minha opção... Sou politicamente correta, Samanta... Vou seguir minha verdadeira orientação... Não quero continuar sendo um gay que se veste de mulher... QUERO SER UMA MULHER!!!!!... E vou ser!.... Completa... Perfeita... (RI) Como dizia a louca da Abigail... ABZOLUTA!... (T) Coitada... Sempre trocava as letras... Abzoluta... Abzorvente... Obzão... Abzesso... Ah, também que importância tem isso?... Dava um charme... Eu me lembro a primeira vez que eu ouvi a Abigail dizer ABZOLUTA... Foi num show da Bethânia... Todas as bichas gritando MARAVILHOSA... MARAVILHOSA... Aí, ela soltou o ABZOLUTA!... Depois pegou... No outro show, a Abigail detonou de novo... Depois de todo mundo berrar ABZOLUTA, ela gritou:
ABZOLUTA…………………………………………………………………………………………………….6
NEZESSÁRIA!... (T) Nunca tinha pensado nisso... Nezessária... (T) Necessária... A Bethânia, necessária... Aquela magia em cena, necessária... A emoção, necessária... (VAI INDO PARA A CAMA) É... Necessária pra gente agüentar o tranco... Agüentar todas as barras da vida... (DEITA-SE) E eu?... Será que, alguma vez na vida eu fui necessária?... (T) Não vem dar uma de Polyanna que eu detesto... (ENCOLHE-SE) Necessária para alguém... Como se a pessoa não conseguisse viver sem mim... Será que eu fui necessária para um homem?... Para um cachorro?... Para uma pulga?... Para uma ameba?... Tantos anos de análise e nunca falei sobre isso no divã... Só queria falar de sexo... Do que estava acontecendo comigo... Do prazer que eu queria sentir... Dessa história do pau, que eu detestava... E agora você vê... O que vai acontecer com o meu pau?... (VOLTA-SE) Será?... Numa lata de lixo, você acha?... (T) Deixa de ser boba, Samanta... Eles devem ter o Museu do Pau... Claro... Pensa no tanto de gente que se opera aqui... Gente do mundo inteiro... É a clínica mais famosa, mais respeitada... mais cara!... Tenho certeza de que, em algum lugar do prédio, deve ter o Museu do Pau... Cheio de redomas... Em cada uma, um pau diferente... Pau de alemão... Pau de brasileiro... Pau de americano... Pau de judeu... Pau de africano... Pau de japonês... (T) Achei que a coca era pura, mas é vagabunda, sabia?... Tá me dando um sono... Nunca vi isso!... Será que deu algum revertério com os remédios que eu tomei?... Ah, imagina... A louca da Shirley toma todos os remédios do coquetel e cheira, fuma, bebe e não acontece nada... Por que iria acontecer comigo?... (T) Não vai acontecer nada... Nada... (AMOLECENDO) Eu não sou necessária, Samanta... Não sou necessária nem pra você... Se eu apagar, sei muito bem que vai dar a elza na minha grana... usar meu cartão de crédito... Ir pra Zurique, Paris, Milão... (T) Eu não tenho nenhuma importância, mesmo que você fique falando e falando e falando que tenho sim, que você me adora, que é minha amiga, que está aqui porque quer me ver transformada em mulher, que deseja minha felicidade, que sabe que serei uma mulher esplendorosa... (T) Fica quietinha, Samanta... Vou fingir que acredito em tudo o que você fala pra não me deixar down... Eu acredito em você, em Papai Noel, em duende e na Regina Duarte... Pronto... E a vida é sonho!... A vida é sono!... O sono que desce sobre mim... O sono que parece aos outros o sono de dormir... O sono da vontade de dormir... O sono de ser sono... Mas é mais de dentro, mais de cima... (T) Não tô delirando não, boba!... É Fernando Pessoa... (T) Me deu vontade de ficar quietinha aqui, só recitando Fernando Pessoa... Como se fosse um mantra... (T) Como se eu falasse só para mim... É o sono de haver mundo comigo lá dentro, sem que eu houvesse contribuído em nada para isso... Meu Deus, tanto sono!... (ADORMECE)
A luz vai baixando, enquanto vai-se ouvindo, cada vez mais forte, o Adagietto da Sinfonia n# 5, de G. Mahler. Black-out. A música toma toda a cena. Tempo. Corta com TETÉ pulando da cama. Luz.
ABZOLUTA…………………………………………………………………………………………………….7
CENA 2
TETÉ Nem pensar que eu vou morrer como o Dick Bogart em “Morte em Veneza”... A maquiagem borrando a cara... Mahler tocando.... Pára com essa cena, que eu estou indo pro camarim retocar... CHEGA!... I will survive... A letra dessa música não tem nada a ver, but I will survive!... (T) Samanta, você tá aí?... Ah... Claro que achei que tinha saído do quarto... Podia estar dando uma volta pelo hospital... Ter seguido um médico e entrado no banheiro... Ah, Samanta, você se esquece que a gente se conheceu no banheirão daquela buate?... Eu não me esqueço não... O quê?... Eu fui fazer pipi... Sentada.... Você que estava lá, olhão de cobra, vendo quem entrava, quem saía... Louca pra fazer uma gulosa... (T) Nem vem... Você acha que eu, Teté Alvarenga, sou mulher de fazer pegação desse jeito?... O quê?... NUNCA freqüentei aquele lugar onde tinha caminhoneiro... (T) A morte do Gui não me sai da cabeça... Não precisa fazer nenhum comentário, Samanta... Eu sei porque estou pensando tanto nele... E pensando nele falando como a Abigail: ABZOLUTA!... Será que operaram minha cabeça antes de cortarem meu pau?... Imagina se estou arrependida... (T) Estou balançada... Normal, não acha?... Não vou cortar as unhas nem fazer depilação... VOU MUDAR DE SEXO!!! (T) Será que isso vai resolver alguma coisa?... Não, Samantíssima, eu não estou falando de prazer, de ter ou não ter orgasmo, de gozar com a cabeça... Já pensei nessas coisas... Passei noites e noites em claro pensando nisso... Eu encaro!... Estou sendo uma romântica idiota, eu sei... A Marcinha, tão doce, tão linda... sempre me fala que não passo de uma romântica incurável... (T) Mas será que isso resolve a minha carência?... Será que isso acaba com a solidão?... Sabe no que fico pensando?... Na solidão de Florbela Espanca... Claro que você não sabe quem foi Florbela Espanca, biba!... Uma poeta portuguesa... Maravilhosa... ABZOLUTA!... Ela, sim, foi necessária, Samanta... E era um poço de solidão no meio da charneca... Ah, meu Deus, não vou te explicar o que é charneca... Pega um dicionário e procura o que quer dizer... (T) Florbela... Pantera cética... É isso que me deixa apavorada, Samanta... A minha solidão vai acabar com uma xoxota fabricada num centro cirúrgico?... Esse incômodo de estar no mundo é só uma questão de pau ou buceta?... Não... Se for só isso, alguma coisa vale a pena?... (T) À noite, quando volto para casa e tiro a maquiagem, fico olhando para o espelho... Sempre me vejo envolta em brumas... Não, amor, não são as de Avalon... Brumas sebastianistas... Como se eu também estivesse esperando algo... Alguém... Esperando um SIM... Ou um NÃO... Mas nunca um TALVEZ... Só que eu sou um TALVEZ... (T) Foi o Gui quem me leu pela primeira vez um poema de Fernando Pessoa... Ele era um playboy... (RI) Playboy, que coisa mais antiga, oh my!... Ele era um lesado que gostava de poesia... Gostava muito de poesia... Eu decorei o primeiro poema que ele
ABZOLUTA…………………………………………………………………………………………………….8
me leu... Sperae, cahi no areal e na morte adversa que Deus concede aos seus... (T) Chuta que é macumba!... Que horror ficar falando essas coisas... Morte adversa!... Nenhuma morte é adversa... Mesmo se a gente é só um TALVEZ... (T) Samanta, você não imagina a produção que eu já deixei preparada pra quando sair do hospital... O vestido é tudo... Não mostro agora de jeito nenhum... Dá az/ Dá má-sorte... Ainda bem que ninguém mexeu na minha mala... Já conferi... Está tudo lá... O vestido... Os sapatos... Os bijoux, que não sou louca de usar jóia verdadeira... Nem aqui na Suíça, meu bem... Até o perfume... Vou arrasar, Samantíssima... (OLHA PARA ONDE SERIA A PORTA) A enfermagem... Chegou a hora, Samanta... Não, não vai embora... Fica aqui, minha amiga, pelo amor de Deus... Segura a minha mão... Finge que é o Gui... Você pode... Não cortou o pau... Finge que é o Gui me levando para a moita de azaléia... Eu vou me montar lá... Pra sair daqui ABZOLUTA... (T) Cuidado com essa injeção!/... (T) Samanta... Desculpa pelo pó que eu roubei de você... Te compro dois papelotes, quando a gente voltar pra São Paulo... Juro... Promessa de Teté Alvaren/... (FECHA OS OLHOS SEDADA, ENQUANTO A LUZ CAI TOTAL).
CENA 3 No black-out, ouve-se a voz de TETÉ.
TETÉ É você, Gui?... Deixa ver... É... É você mesmo... Então já sabe que não deu certo... Choque anafilático... Claro que vão descobrir que eu estava cheirada quando fui pro centro cirúrgico... (T) Morrer é assim?... Tão simples desse jeito?... Tão sem charme?... Com você foi a mesma coisa?... (T) O que me deixa triste é que eu ainda achava que/... Deixa pra lá... Nem o número de sair do hospital toda produzida eu vou poder fazer... LUZ SE ACENDE. TETÉ ESTÁ DEITADA NA MACA, TOTALMENTE COBERTA POR UM LENÇOL. TETÉ Minha vingança é que meu pau não irá pro Museu deles... Jamais terão um pau de uma Alvarenga dentro da redoma... (T) Gui... Estou me sentindo leve... Feliz... (T) Agora eu sei porque eu não chorei quando você morreu... Não era necessário... Necessário era você... Não o meu choro... (T) Gui... Eles vão fazer autópsia... A tonta da Samanta não fez nada pra impedir... Vai dar o maior bode... Claro que a imprensa vai explorar o caso... Eu descobri uma coisa, Gui... Eu não sei o fim desta história... Não sei para
ABZOLUTA…………………………………………………………………………………………………….9
onde vou, para onde não vou... Não acredito mais em Papai Noel, nem em duende, nem na Regina Duarte e nem em você... Eu inventei um Gui esse tempo todo para segurar minha cabeça... Acabou... TETÉ ARRANCA O LENÇOL E A MACA FICA NA POSIÇÃO VERTICAL. TETÉ ESTÁ MUITO BEM VESTIDA, ELEGANTÍSSIMA, SORRINDO, FELIZ... ELA SAI DA MACA... CAMINHA, ALTIVA, ATÉ A FRENTE DO PROSCÊNIO... OUVE-SE UMA GRITARIA EM OFF: VOZES (OFF) MARAVILHOSA!... LINDA!... PODEROSA!... MARAVILHOSA!... LINDA!... ABZOLUTA!... ABZOLUTA!... ABZOLUTA!... NECESSÁRIA... TETÉ CHEGA BEM DIANTE DA PLATÉIA. CRUZA OS BRAÇOS, FAZ A REVERÊNCIA, SE ABAIXANDO, COMO MARIA BETHÂNIA. TETÉ Obrigada, senhores!... (T) Eu sou necessária sim... Eu sou necessária para mim... (T) E O MUNDO QUE SE FODA!!!!
ELA SE LEVANTA E OLHA FIXAMENTE A PLATÉIA, PODEROSA. APENAS UM FOCO NELA, ENQUANTO OUVE-SE, COM TUDO, O “I WILL SURVIVE”, COM GLORIA GAYNOR. LUZ VAI CAINDO EM RESISTÊNCIA. BLACK-OUT.
FIM