O PrĂncipe e o Cavalheiro de Pedra
de Carmen Leonora
Š Carmen Leonora, 2004
A ação se passa em reino indefinido, no fim do século XIX, em IV atos. As cenas descritas pela narração são encenadas. Personagens: Príncipe Felipe José , filho do sapateiro do Rei Gisela, a princesa ciumenta, irmã de Felipe Maria, a princesa encantada Três andorinhas Mãe lua Serpente de duas cabeças Dois soldados
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ATO I CENA I No Palácio do Rei *NARRAÇÃO – Fundo Musical Há mais de duzentos anos, em uma bela ilha, havia um reino pequenino. O Rei, viúvo, tinha dois filhos, Felipe e Gisela, que viviam cercados de cuidados. O Rei preparava os príncipes para assumirem a coroa, e por isso eles viviam ocupados o tempo todo. Tinham muitas aulas e compromissos, seus professores eram super exigentes e os horários rígidos. E não tinham amigos para brincar. Gisela, que era mais nova do que o irmão, a tudo obedecia de boa vontade. Fazia de tudo para deixar o pai contente. Já Felipe, a contragosto, cumpria suas obrigações. Detestava não poder escolher o que fazer. Por isso, sempre que podia, saía escondido na hora da sesta: as duas horas preciosas em que todos se recolhiam para descansar, logo depois do almoço. Todo o dia esperava ansiosamente a manhã passar. E assim que o castelo ficava em silêncio, lá ia ele passear e tomar banho de mar. E nunca encontrava ninguém, até que um dia... *(as cenas descritas pela narração são encenadas)
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CENA II No campo, a caminho da praia. Felipe atravessa o campo. JOSÉ – Schhh! FELIPE - Olá! JOSÉ – Schhh! FELIPE - O que você está fazendo? JOSÉ – Schhh! (faz um sinal para o outro esperar, dá um salto leão e pega uma andorinha entre as mãos) Ah! Peguei! (José mostra a rolinha.) FELIPE - Ih, pegou mesmo. Como é que você faz isso? JOSÉ – Esse é o salto leão. FELIPE - É? JOSÉ – Foi meu amigo que me ensinou. FELIPE - Ah é? Quem? JOSÉ – O Leão. FELIPE - Ãhn? (José ri) Ah, sim! Um leão é que não foi! JOSÉ – Meu pai tem um gato. Ele se chama Leão. (José e Felipe riem) E faz assim pra pegar os pássaros. FELIPE - Seu pai não dá comida pra ele? JOSÉ – Dá, mas ele gosta de caçar. Adora sair por aí. Ele é nosso, mas vive solto. Quer segurar? (José dá a andorinha ao príncipe) Ih, legal, ela gostou de você. FELIPE –(segura, e abre as mãos; a andorinha não voa) O que você vai fazer com ela? Vai botar na gaiola? JOSÉ – Não, ela mora ali. Tem uma porção delas ali. À tardinha, elas voam todas juntas, e são muitas, muitas... fazem uma porção de desenhos no céu. Só não se pode bobear e parar ali embaixo da árvore, tá vendo? Até o 4
mato já está marrom, de tanto cocô de passarinho... FELIPE - Posso soltar? JOSÉ – Se ela quiser voar...(Felipe solta a andorinha). Como é o seu nome? JOSÉ – José. E o seu? FELIPE - É... olha, é que... JOSÉ – Ah, você é o João filho da costureira. FELIPE - Não, não. JOSÉ – Você não é o Pedro da camareira? FELIPE - Não, não. JOSÉ – Onde você mora? FELIPE – Aqui... perto. JOSÉ – Hum. Bom, então, até outro dia. (afasta-se) FELIPE - Espera! José... JOSÉ – Quê? FELIPE - É, porque... JOSÉ – (volta) O quê? FELIPE - Nada, não. JOSÉ – O quê que é? FELIPE - É que... bem, eu queria ser seu amigo. JOSÉ – Então, vem aqui mais tarde ver a revoada dos pássaros! FELIPE - Mais tarde? JOSÉ – Quando estiver entardecendo. Vou esperar você aqui. (José sai correndo e fala de longe) Agora tenho que ir lá dentro ajudar o meu pai. Até logo! FELIPE - Até! (ele se despede de José, que também sai. A tarde cai.) CENA III No campo ao entardecer. FELIPE - (chega usando uma capa com capuz) José! 5
JOSÉ – Oi amigo! FELIPE - Onde vamos? JOSÉ – Vamos ali que dá pra ver melhor. Chegou em boa hora! (José sai correndo) FELIPE - Ei! Espera! (sai correndo, sua capa se abre e seu capuz cai, revelando as vestes de príncipe). JOSÉ – Ei, você é o Príncipe Felipe! FELIPE - Às vezes saio do palácio, sem ninguém saber. JOSÉ – Você não avisou em casa? FELIPE - Não, ah, não iam deixar eu vir. JOSÉ – Ah, tá. Mas eles não vão ficar preocupados? FELIPE - Vamos ver um pouco que ninguém vai perceber. E se der, amanhã eu volto!!! Olha, parece um furacão! (eles imitam as coisas) Huuuuuuum! JOSÉ – Parece um elefante! Riiiii, riiii! FELIPE - Um anjo, olha, outro! JOSÉ – Olha, arco e flecha! FELIPE - Um palhaço!!! Olha, parece um Rei! JOSÉ – Mas tem nariz de águia! Parece o Rei dos Pássaros!!! Olha isso! FELIPE - Os cabelos parecem penas!!! JOSÉ – É ele! É o Rei dos Pássaros!!! Cuidado, fecha os olhos! Dizem que quando a gente vê a sua imagem ele nos leva com ele! FELIPE - Eu queria mesmo! Viajar pelos ares! (Felipe se eleva sob a mágica do Rei e flutua). JOSÉ – Seu maluco, fecha os olhos! (Felipe flutua sem ouvi-lo). Felipe!!! (José lança uma pedrinha em Felipe, ele reage e ouve meio inconsciente). O Rei prende os homens no seu reino, como os homens fazem com os pássaros! Você quer morar numa gaiola?
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FELIPE - Ah, não, (fecha os olhos rapidamente) isso não! (Felipe cai no chão) JOSÉ – Você tá bem?(Felipe faz que sim. Eles ficam de olhos fechados, José abre os olhos primeiro) Pode olhar agora! Ele foi embora. Você tá bem mesmo? FELIPE - Estou. (Felipe se levanta, mas seus pés continuam flutuando) JOSÉ – Põe aqui os meus sapatos... (Felipe veste e para de flutuar) FELIPE - Mas você vai descalço? JOSÉ - Moro logo ali. FELIPE - (Felipe consegue andar) Obrigado, depois te devolvo. JOSÉ – Pode ficar pra você. Meu pai é o mestre sapateiro da vila. Sapato é que não falta lá em casa. FELIPE - Aparece aí amanhã, depois do almoço, que dessa vez eu te trago um presente! JOSÉ - Até amanhã! CENA IV Na praia. NARRAÇÃO – No dia seguinte, Felipe levou um pé de pato para José, para eles nadarem juntos. Ficaram muito amigos. Brincavam todas as tardes na hora da sesta. E como as brincadeiras eram muito divertidas, Felipe começou a se atrasar para as aulas da tarde. E assim, seus passeios e sua nova amizade foram descobertos. CENA V No campo. 7
(Felipe chega em cortejo com dois soldados). SOLDADO 1 - (fanfarra) PRÍNCIPE FELIPE DE ACELÓIS, DUQUE DE SULPÉGADOS III DA ORDEM DE MARQUIZANES. (José fica estarrecido, sem saber o que fazer. Felipe o cumprimenta como a um súdito). (fanfarra) (José o cumprimenta, orientado pelo soldado 2). NARRAÇÃO - O Rei não gostou nem um pouco de saber que o príncipe o estava desobedecendo há tanto tempo. Mas, como não via problema no filho se distrair de vez em quando, autorizou sua ida à praia, durante duas horas, duas vezes por semana, desde que acompanhado dos soldados da segurança. SOLDADO 2 – Vossa Majestade pode ficar à vontade, partiremos às 15 horas e 15 minutos. Cena com música. FELIPE - (Felipe e José brincam de luta) Ahá! JOSÉ – Eu sou o Vingador Mascarado!! FELIPE - Este é o seu fim, Vingador! Prepare-se para morrer!! SOLDADO 1 – Vossa Majestade, por favor... SOLDADO 2 – Vossa Alteza! (Os soldados não permitem a brincadeira) Assim não. Esta brincadeira é muito agressiva. JOSÉ – Ah, aqui, eu trouxe a bola!! FELIPE - Vamos jogar?
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JOSÉ – Você não me pega... (José sai jogando, mas Felipe o desarma. Eles brincam e se afastam dos soldados, que vão atrás deles, com dificuldade, até conseguirem dominar a bola. E delimitando um espaço mínimo para a brincadeira.) SOLDADO 1 – Vossa Majestade, por obséquio... SOLDADO 2 – Vossa Alteza! SOLDADO 1 – Vossa Majestade, jogue apenas neste espaço. (José e Felipe desistem do jogo com bola) FELIPE - Uffa!! Que chatice! (José se senta no chão, Felipe vai também se sentar, mas antes, um dos soldados põe uma banqueta no lugar, para Felipe se sentar) JOSÉ – (José tira um doce do bolso e come) Quer um? FELIPE - Obrigado. (Felipe desembrulha o doce, enquanto o outro soldado corre até ele) SOLDADO 1 – Vossa Majestade, por favor... SOLDADO 2 – Por Deus, Vossa Alteza! SOLDADO 1 – Vossa Majestade, deixe-nos experimentar. (pega o doce para provar, entrega a outro soldado, este cheira e prova o doce). SOLDADO 2 – Um momento, por gentileza, Majestade. (eles aguardam um pouco; o soldado 2 passa ao soldado 1, que também tira um pedaço. Ele devolve o doce, Felipe olha para o doce mordido) FELIPE - Podem ficar. (Felipe devolve o doce e os soldados se distraem). Vamos até ali? (Felipe
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faz um sinal que é só para se afastarem um pouco dos dois soldados) JOSÉ – Ah!! (Felipe e José caminham desolados, os soldados os seguem) FELIPE - (sussurrando) Vamos até a árvore das andorinhas... (José faz um sinal para Felipe, os soldados pisam no cocô de passarinho, escorregam e se sujam todos. Os meninos riem). SOLDADO 1 – (ajeita-se, e em tom solene) Majestade, é hora de partir. SOLDADO 2 – Vossa Alteza! (Os soldados sujos de cocô formam o cortejo) SOLDADO 1 - (tentando recobrar a dignidade, toca a fanfarra) PRÍNCIPE FELIPE DE ACELÓIS, DUQUE DE SULPÉGADOS III DA ORDEM DE MARQUIZANES, SAÚDA A TODOS. CENA VI No Palácio, salão real. REI FELIPE REI FELIPE REI FELIPE REI FELIPE REI FELIPE
Mas meu filho... este rapazinho é filho do sapateiro! Brincar duas vezes na semana é mais do que suficiente. - Papai... deixa... Já disse que não. Não sei se é boa companhia pra você. - É sim, ele já é o meu melhor amigo. Ah, o meu único melhor amigo. Ele não é um nobre. - Mas é filho de um homem honrado e trabalhador. Você conhece o Pai dele?!! - Não, pai. Mas o José sempre fala que o pai... Felipe! A casa é longe e não tem segurança. - Não tem problema, papai. 10
REI -
FELIPE REI FELIPE REI FELIPE REI FELIPE REI FELIPE REI FELIPE REI -
FELIPE REI FELIPE REI FELIPE REI FELIPE
Eu sempre te falo, observe as pessoas que se aproximam de você. Você é responsável por suas amizades. Passarinho que... (juntos) anda com morcego, dorme de cabeça para baixo. - (juntos) Anda com morcego, dorme de cabeça para baixo. (pausa) A gente só quer brincar um pouco. Nããão. - Eu posso ir sozinho... Nããão. - Ninguém vai me reconhecer... Nããão. - Mas pai... Eu já disse que não. E palavra de Rei não volta atrás. - E por quê não? Mas o quê é isso, rapazinho? – É...só curiosidade. Repara... Um rei ... A bem da verdade, (vaidoso) um rei pode, um rei pode tudo. Até voltar atrás. Afinal, fui escolhido por Deus e assim como faço, desfaço... se assim eu decidir... - (tem uma idéia) Aha! Filho? - Nada não. É que...Se ao menos houvesse um jeito de poder estar sempre com ele... Com quem? - Ora, com meu amigo, o José. Ah, sim! - (meio forçado) Não consigo pensar em um jeito de poder ir até a casa dele...
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REI -
Ora meu filho, é muito simples, bastaria que ele morasse bem perto do palácio. FELIPE - Nossa pai, que idéia brilhante! Divina! REI Você achou, filho? FELIPE - A gente pode ver se ele quer morar na casa do embaixador que foi para o continente. REI Ele não pode morar na casa do embaixador. Ele não tem um título. FELIPE - Ah... é verdade.... REI É, é pena. (o Rei se levanta para se retirar) FELIPE - Pai, como uma pessoa recebe um título? REI Bem, de acordo com os serviços prestados à coroa, o Rei concede títulos e dá cargos de confiança aos homens de valor, que passam... FELIPE - (com entusiasmo, fala ao mesmo tempo em que o pai) O pai do José é mestre sapateiro, e tem vários aprendizes que aprenderam com ele, e inclusive este sapato aqui foi o José que fez e me deu (tira o sapato e dá ao pai). REI ... a receber o respeito de toda a côrte... (pega o sapato) Ótimo acabamento, hein? FELIPE - E o couro? De primeiríssima!! REI É macio por dentro! (veste o sapato, caminha) Hum... (tira o outro pé de seu próprio sapato) O outro! (José entrega o outro pé) Esplêndido! Pode ficar com o meu. (o Rei se retira) FELIPE - Mas pai! E o meu amigo? REI Ãhn? Ah! (em tom imperial) O que você acharia do Rei conceder um título de “Sapateiro do Rei”? CENA VII Cena com música. Nos jardins em volta do palácio. 12
FELIPE - “ concede ao ilustre súdito o título honorário de Sapateiro do Rei... tátátá tátátá tátátá... entregar 30 pares femininos e 60 pares masculinos de acordo com as recomendações abaixo descritas... tátátá tátátá tátátá e receber 3 mil coroas no período de um ano e tátátá tátátá tátátá ocupar a Casa Verde ao lado do Palácio”. Que tal? JOSÉ – Meu Deus! Felipe! Muito obrigado, amigo. José corre em direção à sua casa, rindo de contente. Volta sem o documento e corre pelos jardins em direção ao palácio. FELIPE - José !!! JOSÉ – Papai nem acreditou! FELIPE - E a sua casa nova? JOSÉ – Um casarão! FELIPE - A gente vai poder brincar toda a hora! (Felipe dá um salto leão) JOSÉ – Andou treinando, hein? (eles brincam de luta) ATO II CENA I No jardim interno. José e o Príncipe brincam. Os amigos vão crescendo: música e passagem de tempo. NARRAÇÃO – Felipe e José cresceram como dois irmãos, estudavam juntos, treinavam esgrima, aprendiam a tocar violão... A família de José adorava Felipe, e era muito grata ao Rei. José 13
era um bom amigo, um menino comum, simples e de boa índole, e aos poucos conquistou a confiança do Rei. Em todo o palácio, todos gostavam muito do filho do sapateiro. (José tem agora 18 anos, Felipe 19 anos e Gisela, 16). NARRAÇÃO – Apenas a princesa Gisela, às vezes, implicava com José, porque morria de ciúmes de seu irmão. JOSÉ – E são cinco os rios que cortam o Reino de Acelóis... (Gisela aparece espionando, entre os arcos do Jardim interno do palácio) FELIPE - Rio de Acelóis, Rio dos Arcos, Rio da Ponte Velha, Rio São Miguel e... JOSÉ – Rio da Pedra da Lua! FELIPE - E são três os... (saem) GISELA - Estão crentes que sabem tudo! Humpf! Princesa fica só sem ter o que fazer, resolve ir atrás dos dois. JOSÉ – A esfinge perguntava: que animal anda primeiro com quatro pés, depois com dois, e por fim com três? FELIPE - Então várias pessoas... GISELA - Ai, muito fácil! É o ... (sai) JOSÉ – O Príncipe voltou e respondeu: “ o homem” , libertando seu povo da maldição. FELIPE - Depois então ele foi coroado... GISELA - Ai até parece! O homem! Que besteira!
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Príncipe Dom José se voltam e observam a princesa escondida. FELIPE - Mas o quê é isso? Você está espiando? GISELA - Não. Estava só passando e ouvi essa bobajada. FELIPE - Essa bobajada é um dos maiores autores gregos da Humanidade, sua burra! JOSÉ – (ri) Que é isso, amigo! A gente também não sabia. GISELA - Por quê o homem?? FELIPE - O bebê anda de quatro, o homem anda em pé, e o velho com bengala. É Sófocles, viu? GISELA - Grande coisa! JOSÉ – A gente está estudando grego, tragédias. É historia do Rei Édipo. GISELA - Ah, já ouvi falar, ele é amigo do papai. (José e Príncipe riem). GISELA - Ih... O quê que é, hein? FELIPE - Ele não nenhum rei amigo do papi, sua anta! Ninguém nem sabe se ele existiu de verdade! JOSÉ – E se existiu, já morreu há muito tempo! FELIPE - Vamos, José. JOSÉ – Até logo!! GISELA - (aborrecida) José isso, José aquilo... “Vamos, José”... Humpf! Podem ser mais chatos? Humpf! Se eu quisesse separava os dois pra sempre! (pega um livro e deita-se para ler) José volta. JOSÉ – Ah, esta história é ótima! GISELA - Mesmo?... JOSÉ – Você gosta de biografias? 15
GISELA JOSÉ – GISELA JOSÉ – GISELA JOSÉ – GISELA JOSÉ –
GISELA JOSÉ – GISELA JOSÉ – GISELA
- Assim, assim. É para a aula de história? - É. A gente já leu esse, o Felipe... - Ah, pois é, vocês são inseparáveis. É que depois do terceiro capítulo fica... - Tenho que terminar até amanhã. Ah... boa leitura. (Gisela volta a ler) Sabe, o Felipe me deu essa mesma história escrita por um autor de teatro, com diálogos, com certeza você vai gostar mais. - O Felipe te deu? E posso te emprestar. - Leva hoje à biblioteca, às 6 horas. Está combinado. - Obrigada!
CENA II No salão real, em frente à biblioteca JOSÉ – FELIPE JOSÉ – FELIPE JOSÉ – FELIPE JOSÉ – FELIPE
Oi amigo! - Oi José! Ah, vamos lá no... Eu vim encontrar a Princesa Gisela.... - A minha irmã?? Trouxe este livro pra ela. - Ah. Até já. - Até.
José entra. FELIPE - O que será que eles??? ...
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Cena com música. Príncipe caminha até a porta da biblioteca. Anda de um lado para o outro, impaciente. José sai levando vários livros. Felipe abre a porta da biblioteca, chama por Gisela, mas não tem ninguém. FELIPE - Gisela! Gisela!!! Que coisa mais... esquisita! NARRAÇÃO – Nos dias seguintes, Felipe encontra José novamente entrando e saindo da biblioteca, levando consigo gravuras, mapas e livros. José entra na biblioteca, Felipe, que vinha passando, pára desconfiado. FELIPE - Que coisa mais... estranha! Felipe cola o ouvido à porta, de repente sai e esconde-se. José sai levando vários mapas. Felipe abre a porta da biblioteca, chama por Gisela, mas não tem ninguém. FELIPE - Gisela! Gisela!!! CENA III No salão real. REI -
Ele é seu amigo... Tem que prestar atenção! Não tem nada, vem pra cá, brinca, estuda, ganha uma porção de coisas! Passa o tempo todo no que há de bom e de melhor... Quem é que não quer? Tem que ver é seu amigo por interesse! (pausa) Então, o quê que tem o José? FELIPE - Tem ido todo o dia à biblioteca. REI Sei. Bom sinal, está estudando.
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FELIPE - Mas da primeira vez levou com ele um monte de livros. Disse que tinha vindo encontrar Gisela, mas não tinha ninguém lá quando ele saiu. REI Então ele estava sozinho? FELIPE - É. REI Na biblioteca? FELIPE - É. REI Hum. (pausa – o Rei está ocupado) FELIPE - Ontem ele ficou uma hora e levou um monte de mapas. REI De novo? FELIPE - É. REI Hum. (pausa) FELIPE - É. E hoje ele ficou mais de uma hora! E saiu carregado de gravuras e documentos! REI E é só agora que você me fala isso? Eu sou sempre o último a saber das coisas neste reino! Assim não dá! Assim não é possível! Estes documentos podem trazer segredos de Estado!!! FELIPE - Ele não pode estar fazendo nada de mais! REI Nós confiamos demais neste rapaz! Ele está nos traindo!!! Chamem a Princesa Gisela aqui, imediatamente! NARRAÇÃO – A princesa Gisela só queria tentar atrapalhar a amizade dos dois amigos – e 18
afastá-los um pouco. Como também não estava entendendo nada de História, aproximou-se de José, pedindo sua ajuda para uma pesquisa. Mas não queria que ninguém descobrisse. Por isso, ela entrava e saía da biblioteca pela entrada secreta que dava para o quarto de costura, que apenas as mulheres conheciam. (Gisela se apresenta ao Rei). Quando o Rei a chamou para confirmar seu convite a José e esclarecer a saída dos livros, mapas e gravuras, Gisela negou tudo. Felipe verificou que todos os documentos tratavam da História da Ilha, dos acordos políticos com o continente, assuntos de Estado do Reino de Acelóis. Desconfiado de uma alta traição o Rei então decide: REI -
Está decidido: “ O Rei de Acelóis vem participar a Dom José e a seu pai, “o Sapateiro do Rei” que devem sair do Reino de Acelóis amanhã pela manhã, sem nunca mais voltar.”
JOSÉ – Sem nunca mais voltar... Não estou entendendo, o quê aconteceu, Felipe? FELIPE - José! (eles se abraçam) JOSÉ – Por favor, entregue estes papéis à Princesa Gisela.... FELIPE - O quê é isso?? JOSÉ – É uma... Olha, eu prometi dar isso pra ela, é segredo. 19
FELIPE - Ah. JOSÉ – Pergunta pra ela... Até um dia, amigo. FELIPE - (eles se abraçam) Até logo, José. CENA IV No quarto da princesa. FELIPE - Vamos, Gisela. GISELA - Não vou, não quero. FELIPE - Você precisa se levantar, você não está doente! GISELA - O que eu sinto é pior que doença! FELIPE - Você precisa me contar o que aconteceu. GISELA - O José deve estar tão longe.... tão triste... FELIPE - Ele ficou arrasado. Ontem consegui sair para falar com ele. Ah, ele me pediu para te dar isso. O quê é? GISELA - (envergonhada) Ele não te disse? JOSÉ - Ele não quis me falar nada. (pausa) Eles trabalharam a noite inteira para terminar a encomenda de sapatos deste ano. (pausa) Já devem ter chegado ao continente. GISELA - Você promete segredo? (Felipe faz um juramento com as mãos). Foi tudo minha culpa! NARRAÇÃO – A Princesa Gisela contou a seu irmão tudo que tinha feito, do medo que tinha de ser castigada e de quanto estava arrependida. Felipe ficou muito aborrecido. FELIPE - Como você pôde deixar o José partir sem fazer nada?! GISELA - Você jurou segredo!! O quê que a gente vai fazer agora? FELIPE - A primeira coisa é levantar da cama. GISELA - Não. 20
FELIPE - Vem.( Gisela dá a mão a ele.) Meu Deus, você está ardendo em febre! CENA V No salão real. NARRAÇÃO – Felipe não entendia por que José não se defendera, e não contara a verdade nem a ele mesmo, seu melhor amigo. Mas, como tinha jurado segredo à Gisela, não podia simplesmente contar tudo ao Rei e deixar de ser leal à princesa. Ele então resolveu conversar com o pai. FELIPE - Tenho certeza de que José é inocente. REI Todo o material retirado da biblioteca foi devolvido, estava na casa do José. (pausa) Você e sua irmã estão me escondendo alguma coisa... FELIPE - Não poderia imaginar o que aconteceu. Quem sabe quando Gisela estiver melhor ela não conversa com o senhor? REI Há quantos dias ela está com febre? FELIPE - Há uma semana. REI É muito tempo. Nunca vi ela ficar doente desse jeito. FELIPE - Tenho certeza de que se ele voltar... REI Muito bem, muito bem. Vamos chamar o José! Exijo uma explicação! FELIPE - Tenho certeza de que ela vai melhorar. REI E eu tenho a certeza de que alguém está mentindo nessa história. ATO III
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CENA I No campo. Cena com música. (O Príncipe caminha pelos jardins em torno do palácio e encontra uma abóbora encantada, de onde sai um feixe de luz com os dizeres: PARA O FIEL DOM JOSÉ. Ele fica fascinado com a magia da abóbora, lentamente decide mexer, mas desiste.) FELIPE - Não, não, não. Vou esperar o José. JOSÉ – FELIPE JOSÉ – FELIPE JOSÉ –
Oi amigo! - José! Como vai? - Bem. Quer dizer então que Gisela resolveu contar a verdade? FELIPE - O pior é ela se entender com El Rei, que está uma fera. Sabe, você chegou em boa hora! JOSÉ - O quê é? (O amigo o leva logo para ver a abóbora). FELIPE - Olhe! Tem um presente pra você! (José abre a abóbora e de dentro dela sai a mais linda moça. É uma princesa [usa uma tiara]). JOSÉ –
Meu Deus!
(O príncipe fica fascinado pela beleza da princesa Maria, aproxima-se dela; José recua um pouco, de forma que Maria se dirige a Felipe, quando fala.
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PRINCESA ENCANTADA – Meu nome é Maria. Sou a filha caçula da rainha Luana, do Antigo Reino da Pedra da Lua. FELIPE - Maria... PRINCESA ENCANTADA – Quando eu era bebê um terremoto destruiu nossas terras, e fui encantada dentro desta abóbora pelo Rei dos pássaros. Vivi em seu reino até que você me libertou. Agora pertenço a você, José, o amigo dos pássaros. JOSÉ – Maria. (José se aproxima e desfaz o engano, apresentando Felipe) Maria este é o Príncipe Felipe, meu grande amigo. E eu sou José. (pausa) Meu amigo, tudo o que eu sou hoje, devo a você, à sua amizade. Aceite a mão da princesa Maria. O Príncipe abraça José, recebe Maria pela mão e a conduz; conversam. José fica todo contente. O casal se acomoda em baixo de uma árvore frondosa, José fica ao longe observando-os. CENA II No campo (Maria e Felipe conversam ao longe. Aproximam-se de José, aos poucos, três andorinhas). JOSÉ – Olá! ANDORINHA 1 – Olá, amigo! O príncipe está muito vaidoso por ter recebido a princesa, mas ...quando passarem o rio ela pedirá água corrente e bebendo morrerá.
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ANDORINHA 3 – E quem isto ouvir e contar, em pedra mármore há de se virar! ANDORINHA 2 – E se a princesa não morrer da água corrente há de morrer quando beber a primeira colher de sopa no jantar dessa noite. ANDORINHA 1 – E quem isto ouvir e contar, em pedra mármore há de se virar! ANDORINHA 3 – E mesmo que a princesa escape da água e da colher envenenadas, será devorada pela serpente de duas cabeças, de madrugada. ANDORINHA 2 - E quem isto ouvir e contar, em pedra mármore há de se virar! O casal se levanta e vai até José. FELIPE - José, eu e Maria vamos nos casar. Quero pedir sua mão esta noite. JOSÉ - Parabéns! (abraçam-se) Amigos, vamos dar as boas notícias a todos! CENA III No campo, ao longe um riacho. O casal e José caminham, vêem ao longe um riacho. MARIA - Ah, que bom! Uma água fresquinha da fonte! FELIPE - Oba! Também estou morrendo de sede! JOSÉ - Vão seguindo, vão seguindo, que eu vou buscar água e levo. FELIPE - Quê é isso, vamos lá com você! JOSÉ - Não precisa, aqui, estou com o meu cantil. FELIPE - Obrigado. JOSÉ - Até já!
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Príncipe e Maria seguem. Dom José corre até o riacho, lava seu rosto e molha sua roupa. JOSÉ - (alcançando-os) Sou um estabanado! Caí e derrubei toda a água! Desculpem-me. FELIPE - Maria, quer que eu volte lá? JOSÉ - Já estamos chegando ao palácio. FELIPE - Se quiser pode esperar ali na sombra, vou rapidinho. MARIA - Não precisa, se já estamos chegando... JOSÉ - Lá você vai beber a água mais pura do reino. CENA IV No salão real. REI -
E é com muito orgulho que chamo à mesa o fiel Dom José! (puxa as palmas) JOSÉ - Obrigado, Majestade. (Rei o conduz ao lado de sua filha, cumprimentam-se) REI E agora peço ao padrinho, que chame os noivos! JOSÉ - A Princesa Maria e o Príncipe Felipe! (puxa as palmas) (Todos se sentam à mesa: Maria ao lado de José, o rei ao lado da filha, o príncipe na cabeceira). REI -
Maria, esta noite vamos apreciar alguns de meus pratos preferidos. Esta sopa é uma especialidade de nosso chef. (leva a colher de sopa à boca e bebe) MARIA - Com frutos do mar! (pega a colher de sopa) JOSÉ - Ah, ia me esquecendo. (Maria serve sua colher) Meu presente aos noivos. (Maria levanta a colher em direção à boca; José entrega os 25
talheres de ouro a Felipe, Maria repousa a primeira colher e pega a segunda). FELIPE - Não precisava.... MARIA - São lindos! JOSÉ - E estão limpos, podem usá-los! (todos riem). (O jantar se segue ruidosamente. Ao final, estão todos em pé reunidos em volta da mesa, em pequenos grupos). JOSÉ – Você nos dá licença um minuto, Maria? (ao Príncipe) Preciso lhe pedir um favor, mas não posso lhe dizer porquê. FELIPE - Ora, o que é? JOSÉ – Quero que tire a chave da porta do quarto de Maria, para que fique aberta. À meia-noite vou entrar. Não se preocupe, não vou acordá-la. FELIPE - José, isso é muito estranho. JOSÉ – Eu bem sei, meu amigo, mas é preciso. FELIPE - Por que está me pedindo isso? JOSÉ – Não posso lhe dizer. Mas juro que não vou me aproximar de Maria. FELIPE - (pensa um pouco) Não vou negar nada a você, meu amigo, padrinho, que me deu a mão de minha mulher em casamento. JOSÉ – Obrigado. FELIPE - Não fale nada a ninguém. Nem à Maria. JOSÉ – Está bem. CENA V No quarto de Maria. Cena com música. (José entra no quarto; Maria está dormindo. José aguarda junto à janela. José bebe água, afia sua espada, joga água no rosto para se manter acordado. Surge um enorme monstro com duas cabeças 26
à janela do quarto. José, que aguardava em espreita, num só golpe, atinge um olho de uma cabeça e corta a outra fora. A serpente enrola-se em José, levando-o para o mar. Lá os dois lutam, até José ferir o outro olho da serpente. Sem vê-lo, ela é abatida por José. Ele volta ao quarto, limpa o sangue e joga ao mar a cabeça da serpente. Aproxima-se de Maria para limpar as gotas de sangue que caíram na parede e em seu rosto. Sobe na cama e quando encosta em Maria, ela acorda assustada e grita. Felipe logo entra no quarto. FELIPE JOSÉ – FELIPE JOSÉ – FELIPE
- O que está fazendo? Eu... - Saia já daqui. Calma, não é o que ... - Chega, José!! (Felipe dá um tapa no rosto de José) Prepare-se para me enfrentar em duelo amanhã, às dez horas da manhã, no salão real. JOSÉ – Eu... eu... lamento... (sai do quarto) . FELIPE - Maria, vou avisar o Rei. ATO IV CENA I No quarto de Maria. (Maria está desolada. Senta-se à janela. Lá fora a Lua está grande e cheia). MÃE LUA - (aproxima-se da janela) Maria.... filha da Rainha Luana... do antigo Reino da Pedra da Lua... MARIA – Mãe Lua! Minha madrinha... MÃE LUA -Você encontrou o seu destino no Reino de Acelóis... 27
O Príncipe Felipe será um rei forte e sábio. Mas por ora tem um coração de pedra - ainda é muito jovem e está tomado de ciúmes. Maria, José é inocente. Esta noite ele te salvou do último encanto do Rei dos Pássaros. (Maria se assusta) Você não deve ter medo. Eu vim ajudar... Maria... este é o óleo da vida. Faça com que o Príncipe e Dom José – os dois - passem o óleo em suas espadas. O óleo dá a vida e cura qualquer ferida. A espada banhada no óleo protegerá o outro. Ninguém vencerá, e ao fim da luta, exaustos, eles vão fazer as pazes. MARIA – Estou entendendo... MÃE LUA - Mas preste atenção: o óleo torna o outro invencível. Se eles souberem a verdade não vão usar. MARIA – O Príncipe está com tanta raiva! MÃE LUA - Não diga nada à ninguém. MARIA – Mas como vou fazer para eles usarem o óleo? MÃE LUA - Você vai saber... Boa Sorte, e adeus Maria... (Mãe Lua volta ao céu). MARIA – (O Príncipe volta) Felipe, acabo de receber um presente da Mãe Lua: este é o óleo da vida. Se você passar em sua espada, o encanto vai proteger e defender você de qualquer ferida. FELIPE - Obrigado, Maria. Agora vá se deitar. Amanhã teremos um dia cheio. MARIA – Boa Noite, Felipe.
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CENA II À frente do quarto da princesa. MARIA - Preciso falar com você. GISELA - Sim. MARIA - José e Felipe brigaram e vão se enfrentar em duelo amanhã cedo. GISELA - Não!!! Por quê? MARIA - É um engano terrível, tenho certeza de que José é inocente, mas Felipe já foi avisar o Rei e a guarda. Preciso agora de sua ajuda: este óleo é encantado e vai proteger Dom José de qualquer ferida. Faça com que ele te prometa que vai passar em sua espada, assim não será atingido. GISELA - Está bem, fique tranqüila. MARIA - Leve já para ele. GISELA - Onde? MARIA - Ele acaba de ir para casa. Vá sozinha e não deixe ninguém vê-la, a lua iluminará teu caminho. GISELA - Pode contar comigo. Conheço um caminho secreto. (a Princesa põe seu manto com capuz e sai. Passa pela Casa Verde e chama José. Ele não está). José!! José! Onde será que ele foi? (a Princesa vai à praia) . CENA III Na praia GISELA - José! José! Dom José! JOSÉ – Princesa Gisela! GISELA - Olá. Acabei de estar com Maria. Preste atenção, ela me pediu para te dar este frasco. Este é um óleo encantado muito poderoso. Passe na sua espada que ele vai te proteger. 29
JOSÉ – GISELA JOSÉ – GISELA JOSÉ – GISELA JOSÉ – GISELA JOSÉ GISELA JOSÉ GISELA JOSÉ GISELA JOSÉ – GISELA JOSÉ –
Eu não quero. - José, por favor... O que Maria disse sobre o que aconteceu? - Ela só me disse que Felipe está transtornado. Felipe acha que eu o traí. - Quero que você saiba que eu não acho que isso seja verdade. Como ele pode pensar isso de mim? Ele me conhece há tanto tempo! - Felipe às vezes é muito duro... muito exigente com ele mesmo. Ele um dia será o nosso rei... E daí? Sempre fui seu amigo, e não me importo com essas coisas do reinado. Já tive que ir embora uma vez... - José, por favor, me perdoe pelo o que aconteceu. Eu já te perdoei há muito tempo. Mas acho que não devia ter voltado. Ele não pode ser meu amigo. - Por que você não conta exatamente o que aconteceu? Não posso. Vou enfrentá-lo amanhã e depois vou me embora. Não quero ficar igual a ele, com um coração de pedra. - Não fique assim. (a Princesa o beija). Fique com o óleo, por favor. Vou voltar. Eu te levo. - É melhor não. No palácio a guarda já está avisada contra você. Obrigado. (a Princesa o beija novamente e sai).
CENA IV No salão real.
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Cena com música. (O príncipe e José estão prontos para o duelo. O Rei e as princesas assistem ao fundo. Eles duelam bravamente. O Príncipe atinge José em pequenos golpes, mas não o fere. José se defende sem atacar, mas acaba, mesmo assim, ferindo o Príncipe). FELIPE - AH! JOSÉ – Não! Não! O Príncipe cai, com a mão cobrindo a ferida. Rei e princesas se aproximam. REI Meu filho! Guardas, prendam este homem! JOSÉ – Por favor, Majestade, eu não quero ser preso. Deixem-me falar. (pausa) A princesa Maria foi encantada pelo Rei dos Pássaros, e até ontem, o encanto ainda não havia passado. Três andorinhas me avisaram que ela poderia morrer, e se eu revelasse como, seria transformado em pedra. Porém, eu poderia salvá-la, primeiro, evitando que ela bebesse a água do rio. FELIPE - José derramou a água do riacho e não deu à Maria... (José se transforma em mármore até a cintura). JOSÉ – Depois, ela não poderia tomar a primeira colher de sopa. REI Meu Deus! O presente! MARIA - Os talheres de ouro! (José se transforma em mármore até o pescoço). 31
JOSÉ – Mas se mesmo assim, ela vivesse, uma serpente de duas cabeças a atacaria de madrugada. Eu a salvei, mas Felipe me viu ... FELIPE - Não! Não é justo! O meu amigo! (José se transforma em pedra). REI -
Que tristeza esta manhã nos traz. O sol com pena se fechou no céu. Fechem os portões, abaixem a bandeira. Choramos sete dias o rapaz. Meus filhos, meu reino não mereceu esta benção: a amizade verdadeira.
CENA V Passagem de tempo. Praia. (Gisela passeia pela praia, cantarolando triste. Encontra um grande peixe rosado à beira mar. Ele ainda está vivo e Gisela tenta pegá-lo, sem jeito). GISELA - Ah, coitadinho, morreu encalhado na beira d’água! Opa, está vivo! Peraí, deixa eu te ajudar... Vem cá, seu peixe fujão! (ele escorrega) Opa! Assim você está se enrolando, vai ficar sem ar!! Opa peixe!! Para, peixe! Deixa eu te levar (consegue pegá-lo) para a água. (leva,mas ele não se mexe mais, põe na água rasa) Ah, seu bobo, agora não respira mais... Bom, vou te levar pra casa. Há tanto tempo
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não temos uma alegria... Quem sabe um belo jantar não melhore nossa noite? CENA VI À mesa no salão real. Todos sentados à mesa degustam o peixe rosado, o Príncipe está com um curativo grande no peito. REI -
Vejam o que nosso chef de cozinha me deu. Encontrou na barriga do peixe.
(O Príncipe toma o frasco em sua mão). FELIPE - Era pra ser um óleo encantado... MARIA - Espere. (Maria pega o frasco, todo esfarrapado, e vê de perto) Este é o óleo que ganhei de presente na noite em que José matou a serpente. REI Do quê você está falando? MARIA - É o óleo da vida, foi Mãe Lua quem me deu. FELIPE - Ora, este óleo não serve pra nada. MARIA - Calma. FELIPE - Ele deveria ter me protegido ... passei em toda a minha espada, e quase fui ferido de morte. MARIA - Felipe, me desculpe, mas o óleo não serve para proteger, Mãe Lua me disse que serve para curar as feridas e dar a vida. FELIPE - Mas então... MARIA - Mãe Lua me deu dois frascos, um para você e outro para Dom José. Se vocês dois passassem o óleo em suas espadas, elas não poderiam feri-los. GISELA - Eu levei o de Dom José, como você me pediu. FELIPE - Você mandou um frasco para ele? 33
MARIA - Sim, pedi à Gisela para levar até ele. Não pude dizer a verdade porque você estava cego de ciúmes e queria duelar com José, jamais ia querer protegê-lo. FELIPE - O que você fez, Maria? MARIA - Eu disse que o óleo te protegeria dos golpes, senão você não usaria. Na verdade ele acabou protegendo José. FELIPE - Por isso os meus golpes não o feriam. MARIA - Este deve ser o frasco de Dom José. FELIPE - Claro, pois se eu fui ferido! GISELA - Ele não queria aceitar... mas eu insisti e ele acabou ficando com o frasco. MARIA - Ficou com o frasco mas não o usou. Por isso Felipe foi ferido. Ele certamente jogou o frasco ao mar... e este peixe o trouxe de volta. (pausa) Felipe! Agora podemos salvá-lo. (Felipe se levanta bruscamente). REI Graças a Deus!!! CENA VII Jardim interno, com a estátua de pedra de Dom José. (O Príncipe derrama o óleo em José, e ele torna a viver). JOSÉ – Meu amigo! FELIPE - Chegou em boa hora! Maria aparece em pé, está grávida. A Princesa beija José. O Rei vem à boca de cena. REI -
Que Deus seja louvado! Abram todos os portões! Avisem a todo o reinado! Chamem os foliões, 34
Os músicos, o bôbo, chamem logo o circo todo! Viva José, nosso amigo! TODOS – Viva!!! REI Que ele seja muito bem vindo! TODOS – Viva!!! REI Esta noite vai ter festa, Até o dia clarear, até a hora da sesta... TODOS – Viva!!! Viva!!! REI Vamos, vamos comemorar! FIM
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