A Miss達o do Administrador
A Missão do Administrador Administração Como Filosofia de Vida
Stephen Kanitz
A Missão do Administrador Direito autoral Š 2014 This book was produced using PressBooks.com, and PDF rendering was done by PrinceXML.
Conteúdos
Capa vii Introdução viii Um Brasil Mal Administrado x Como Mudar o Mundo xv A Nova Realidade Econômica xix A Função do Administrador 200 Anos Atrás xxiv O Verdadeiro Significado da Palavra Gestão xxxi O Que Falta Para o Brasil dar Certo? xxxiv
Part I. As Principais Funções 1. A Função do Administrador 200 Anos Atrás 2 2. A Função do Presidente de Uma Empresa 9 3. Administrar é Ter Acabativa 14 4. Administrar é Realizar o Sonho dos Outros 19 5. Administrar é Nunca Acumular Problemas 24 6. Administrar é Saber Delegar 35 7. Administrar é Por Fim a Incompetência 38 8. Administrar é Saber o Intervalo Entre Ação e Reação 42 9. Administrar é Ter Que Lidar Com Problemas Brochantes 45 10. Administrar é Por em Ordem o Progresso 49 11. Administrando Pessoas Estranhas 53 12. Administrando Pessoas Muito Estranhas 59 13. Administrando Com Desconfiança 63 14. Administrar é Saber Delegar - II 68 15. Administrar É Saber Fazer as Perguntas, Não Achar as Soluções 71
16. Administrar é Ser Ágil na Ação e Decisão 76 17. Criando Laços de Confiança 79 18. A Função Mais Difícil do Administrador 83 19. Se Karl Marx Tivesse Estudado Administração 86 Part II. Postura Ética 20. O Atributo Mais Importante do Administrador: Sua Ética 93 21. A Primeira Regra Ética a Seguir 97 22. O Administrador é Íntegro 100 23. O Administrador é Humilde 105 24. O Administrador e o "Poder" 108 25. O Administrador é Um Democrata 111 26. O Administrador é Um Mediador de Conflitos 115 27. Administradores ou Revolucionários ? 120 28. Existem Administradores de Esquerda 124 29. Administrar é Cuidar do Capital Social da Sociedade 128 Part III. O Futuro 30. Administração Tem Que Ser Divertida 133 31. A Importância de Uma Visão do Futuro 137 32. Chegamos na Era do Administrador, Finalmente 140 33. A Nova Sociedade Brasileira 145 34. O Administrador Como Um Político 149 35. Empresas Preparadas Para Servir 153 36. Capitalismo Beneficiente 156
Part IV. Problemas 37. Você Não Entende Absolutamente Nada de Administração? 160 38. Jornalista Precisa Ser Treinado, Administrador Não? 164 39. A Função do Gestor e a Função do Administrador 166 40. A Lei do Mínimo Esforço 169 41. Se Karl Marx Tivesse Estudado Administração 174 Part V. Conclusões 42. Por Um Brasil Bem Administrado 182 43. A Lei 7988/45 Que Atrasou o Brasil 185 44. Quem Salvará o Capitalismo dos Capitalistas? 188 45. A Missão do Administrador Brasileiro 192
Capa
A capa foi feita por Helio de Almeida, 30 anos atrás, que eu considero a melhor capa da Edição de Melhores e Maiores.
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Introdução
Este livro não é um livro de administração comum. Ele não irá discorrer sobre técnicas administrativas nem sobre as melhores práticas usadas pelas Melhores e Maiores empresas do país. Mas será um livro que fará de você um administrador melhor. Ele abordará a missão do administrador como um agente da sociedade, a função do administrador na sua plenitude. Mostrará o espaço maior da existência de um ser humano. A Missão do Administrador mostra a administração como uma filosofia de vida, mostra o significado maior da tarefa de ser um administrador. Prometo que no fim deste livro você terá um maior significado para sua vida, uma maior clareza e porque estamos fazendo o que fazemos. Embora eu esteja usando o termo administrador, isto não significa que eu esteja advogando que o mundo seria melhor na mão de administradores. Eu realmente acredito nisto, mas rapidamente vou acrescentar que eu acredito é que todos nós deveríamos ser administradores das nossas vidas, das nossas atividades econômicas, das nossas famílias e das nossas finanças.
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Introdução
No meu mundo ideal, todos teriam noções de Administração. Seja como um pós-graduação para complementar a sua profissão de médico, engenheiro, etc, não somente os administradores de fato. No meu mundo ideal, os administradores de fato são somente os mais especialistas no assunto e que servirão de mentores, professores, observadores e pesquisadores. Eu sou um caso típico. Se eu fosse o Presidente de uma empresa, provavelmente eu seria um desastre. Mas isto não me impede de ser um bom administrador como consultor, mentor, escritor e pesquisador do assunto. Portanto, vocês das outras profissões não sintam que eu estou sendo classista ou corporativista quando eu uso o termo Administrador. Estou sempre me referindo à sua parte ainda não desenvolvida de administrador, que acho que todos deveriam ter. Minha grande frustração na vida é que a maioria dos jornalistas, economistas, contadores, políticos, juízes e sociólogos com quem conversei na vida, nem sequer entendiam o que eu estava falando, de tão atrasados que eles eram em termos de conhecimento administrativo. Administração é o único curso que ativamente procura no MBA formandos de outras disciplinas, porque achamos a complementaridade necessária. Se todos nós nos imbuirmos da missão e das funções do administrador lato sensu, tenho certeza que o Brasil será um país melhor. Stephen Kanitz
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Um Brasil Mal Administrado
Mas existe uma solução
Um país do tamanho do Brasil, com os recursos naturais e a população que tem, não é exatamente um país com problemas econômicos. Mas o mantra todo dia nos jornais é sobre os problemas econômicos deste país. Somos, sim, um país muito mal administrado. Não sabemos administrar os Estados, não sabemos administrar nossas dívidas, não sabemos administrar nossa previdência nem nossa segurança. Nossos governantes e ministros normalmente não são formados em administração nem fizeram aqueles cursos de MBA que proliferam por aí. A maioria dos nossos ministros nunca trabalhou numa das 500 maiores empresas do país, nem como presidente nem como diretor. Fernando Henrique Cardoso teve como ministros muitos professores brilhantes, que administravam sessenta obedientes alunos e de um momento para o outro passaram a administrar mais de 5.000 funcionários públicos, sem formação em administração, recursos humanos, motivação, liderança nem avaliação de desempenho. Teriam sido bons assessores, não executivos.
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Um Brasil Mal Administrado
O socialismo que prometia justiça, progresso e melhoria para as classes menos favorecidas, fracassou nos maiores países que o abraçaram. Vladimir Putin, presidente da Rússia, se elegeu com a bandeira que o Comunismo foi o maior erro da história da Rússia. O Capitalismo, com seus bancos alavancados 20 vezes e totalmente descontrolados, ou supostamente controlados internamente por algoritmos falhos, ou então controlados externamente por acadêmicos teóricos, vive entrando em crise e levando dezenas de outros setores de roldão. A Social Democracia Europeia, que poderia ter sido o meio termo salvador, está atolada de ineficiência e dívidas impagáveis. O Brasil está atolado em problemas cada vez maiores, que em vez de serem resolvidos à medida que aparecem vão se acumulando sem solução, piorando o problema. A tese deste livro é que todos estes fracassos e todos estes problemas advêm do fato de que o mundo está cada vez mais mal administrado. Governos são administrados por políticos, cujo único conhecimento formal que tiveram em administração é o de Marketing Eleitoral. O Banco Mundial, o FMI, o FED, o Banco Central e o BNDES são dirigidos por pessoas indicadas por estes mesmos políticos, e que também não têm nenhuma educação prática ou formal das várias competências necessárias para serem administradores destes organismos nacionais e federais. Parte-se do pressuposto que o problema destes organismos é saber o que fazer, quando na realidade a falha destes organismos é não saber implantar o que já sabem e, aliás, todo mundo já sabe. Todo jovem de 16 anos já sabe quais são nossos problemas: ineficiência do Estado, gastar mal, corrupção e falta de auditoria, con-
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Um Brasil Mal Administrado
tratação de amigos e parentes e não de profissionais para administrar a coisa pública. Esta é a missão social do administrador. Mudar o Brasil. Trocar os donos do poder por administradores do bem-estar social. Tirar os amigos e parentes, conselheiros e puxa-sacos. Trocálos por administradores éticos e responsáveis, cuja lealdade seja para com os princípios da administração, com a função do administrador, e não com os interesses do Partido que os indicaram. Embora o Brasil forme administradores públicos competentes, eles são os primeiros preteridos para os principais cargos da administração pública. O escolhido é amigo de campanha ou um colega da época estudantil. Os Estados Unidos são a maior potência econômica não pela qualidade de suas teorias econômicas, mas pela qualidade de suas teorias administrativas. Algumas são modismos, outras funcionam. Embora a imprensa americana sempre se refira ao governo como administração Bush ou “the Clinton administration”, poucos jornais brasileiros usariam a expressão administração Cardoso, Lula ou Dilma para descrever nosso governo. Lacan explica. Quarenta por cento dos colunistas americanos são gurus de administração, como Peter Drucker, Tom Peters e Michael Porter, que disseminam diariamente o mantra da eficiência, competência e boa administração. No Brasil, eles são substituídos por ex-ministros que escrevem justificando seus erros no governo e sobre como se deveria “administrar” o estrago que deixaram, como Maílson da Nóbrega na Veja, ou Delfim Netto na Folha, e como se deveria “administrar” corretamente um país.
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Um Brasil Mal Administrado
Em pleno século XXI, temos pouquíssimos administradores com uma coluna fixa na grande imprensa brasileira. Todo jornal brasileiro tem seu caderno de Economia. Por que não criar os cadernos de Engenharia, de Sistemas, de Advocacia ou de Administração para poder ouvir as outras profissões que têm contribuições a dar sobre os problemas do país? No rol dos alunos famosos da Harvard Business School há dezenas de ministros que serviram ao governo. George W. Bush foi meu calouro em Harvard, onde ele aprendeu a defender a indústria americana como ninguém, algo que Fernando Henrique Cardoso obviamente não aprendeu em seu curso de Sociologia. O problema de Bush é que Harvard não nos ensinou a fazer guerra, matéria em que Saddam Hussein e Osama bin Laden eram professores. Mitt Romney foi outro colega, e se formou entre os 5% melhores alunos da Faculdade, e mesmo assim preferiram dar uma segunda chance a Obama. Nunca tivemos no Brasil um presidente formado em Administração nem que tenha sido presidente de uma das 500 maiores empresas privadas antes de dirigir todo um país. Criticaram Lula, mas ele poderá ser o primeiro presidente a ter pelo menos trabalhado numa das 500 maiores empresas privadas do Brasil, as Indústrias Villares. Mas esquecemos disto ao eleger a Dilma. Este livro faz parte de uma luta que teremos que enfrentar. Uma luta para que administradores profissionais e testados na prática sejam escolhidos para o primeiro escalão do governo. Executivos de primeira e ministros com experiência administra-
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Um Brasil Mal Administrado
tiva que tomem decisões não por critérios políticos, mas por critérios de custos e eficiência. Um projeto e tanto para salvar este país.
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Como Mudar o Mundo
Continuadamente, Constantemente, Diariamente e não Revolucionariamente
Todo jovem quer mudar o mundo. Isto é bom e ruim ao mesmo tempo. Bom, porque é uma força inovadora e idealista. Ruim, porque a maioria dos jovens não tem os conhecimentos necessários para mudar o mundo. Não estudaram organização, métodos, recursos humanos, planejamento, finanças, etc, áreas necessárias para tirar grandes ideias do papel. Pior, no Brasil e no Mundo temos um histórico de jovens e intelectuais que pregam revolução, que é justamente destruir toda a organização que existe por aí, sem nenhum conhecimento de como organizar o novo mundo. O problema de ser jovem é não entender como implantar as suas ideias de como mudar o mundo, e na maioria das vezes só pioram a situação como a turma de 1968 fez com o Brasil. Não mudaram nada e assustaram a ditadura militar em ficar mais 20 anos no poder. Existem duas formas de mudar o mundo, a forma revolucionária típica de partidos de esquerda, e a forma conservadora típica de partidos de direita, liberal e neoliberal.
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Como Mudar o Mundo
A forma revolucionária é mudar tudo que está aí, de preferência de uma vez só. Parte da premissa de que “tudo que está aí” é inútil e precisa ser mudado. Daí o termo revolucionário. A forma ultra conservadora acha que o mundo não precisa de muitas mudanças, que o problema reside nas mudanças equivocadas já feitas, daí o termo “conservador”. Quero que o leitor aceite uma terceira opção. A do administrador e administradores. Uma das nossas funções é realizar mudanças constantemente, pequenas suficientes para serem incorporadas por todos, mas sempre mudanças porque o mundo é mutável e inconstante. A opção que observa o que nossos antepassados construíram de bom, e mudar aquilo que é ruim. Concentrarmos mais em tentar disseminar as boas práticas, as melhores, as mais eficientes, replicar as boas soluções. Normalmente os progressistas, que também querem mudar o mundo como nós, se concentram em eliminar o que eles veem de ruim, a ponto de querer mudar “tudo que está aí”, criar o “novo”, implantar ideias nunca antes testadas. Só que mudanças bruscas e revolucionárias, como todo administrador aprende, têm enormes chances de dar errado, e ao invés de melhorar pioram a situação. Normalmente queremos testar ideias novas e revolucionárias cientificamente, com calma, num beta test ou num “projeto piloto”, antes de adotar para toda a população de uma forma revolucionária. Algo que nós administradores sabemos fazer muito bem, e fazemos o tempo todo.
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Como Mudar o Mundo
Infelizmente, nossos jovens revolucionários e os professores que os incentivam não acreditam em “pesquisa de mercado”, “beta tests”, plano piloto, “best practices”, escolas modelos, que deveriam primeiro fazer testes antes de generalizar, e partem para a tomada de poder, a revolução. Acham que o sistema já é podre na sua essência, que solução teórica e ótima não precisa ser previamente testada. Ou, se frustraram nas várias tentativas de implantar melhorias que não deram certo. Por isto o Administrador é tão importante como mediador dos conflitos naturais de uma sociedade. Lidamos com conflitos diariamente. De todos os revolucionários da história nenhum era administrador, ou que tivesse feito um curso de administração que já existia na França desde 1802. Nenhum trabalhou numa empresa, por exemplo: Karl Marx, Hegel, Rosa Luxemburg, Lenin, Mao Tsé-Tung, Fidel Castro. Nenhum foi treinado para implantar projetos nem medir o sucesso na prática, e deu no que deu. Administradores não se frustram com tudo o que está errado por aí. Sabem que mudanças sempre partem do existente, começar do novo é fórmula para o desastre. Também percebem como estão mudando diariamente os seus departamentos, hospitais, escolas e empresas, e que o problema é generalizar e disseminar estas melhorias rapidamente mais do que destruir tudo que está aí e começar do zero. Revolução para o Administrador são as ideias que foram implantadas rapidamente em cima do que já existia, como por exemplo, o uso do computador. Revolução para os não administradores é tomar o poder seja
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Como Mudar o Mundo
pela democracia, seja pelas armas. É dar as ordens certas, as diretrizes certas que todos precisam obedecer imediatamente. Vejam as resoluções do Partido em cada país que adotou essa linha administrativa. Acham que o mundo é ineficiente por ideologia ou por falta de vontade política, e não por incompetência administrativa. Por isto a maioria dos administradores é de esquerda na agenda social, mas na forma de implantar esta agenda social é de centro direita. Curiosamente todos os países, que adotaram a Revolução como forma de mudar o mundo, mudaram tudo que estava ali de um dia para o outro, mas nos 50 anos seguintes quase nada mudaram. Não há nada mais conservador do que isto. Stalin, Fidel Castro e Mao Tsé-Tung permaneceram 30 anos no poder, mudanças constantes não faz parte do ideário revolucionário. Cuba, Rússia, China, Albânia e Coreia do Norte são hoje os países que mais estagnaram nos 50 anos seguintes. Quase nada mudaram após a grande mudança revolucionária. China é uma exceção, porque passados 50 anos eles decidiram tratá-la como uma empresa, com o concurso de milhares de administradores e engenheiros de produção, que será assunto de um outro livro em breve, Introdução à Administração Socialmente Responsável. Se você é jovem e quer mudar o mundo, aprenda a ser administrador ou complemente o seu curso profissional com um MBA. Aí sim, mude o mundo constantemente, diariamente, com pequenas melhorias, pequenos processos, pequenas ideias, e não destruindo tudo o que está aí, na esperança de termos um mundo melhor.
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A Nova Realidade Econômica
A Importância do Stakeholder superou a do Stockholder
Boa parte da teoria econômica e política do passado parte do pressuposto de que as empresas são criadas e controladas por empresários. Nunca imaginaram que o “capital” cairia nas mãos de administradores profissionais que poderiam ser treinados, como o foram em escolas como Harvard e Stanford a serem socialmente responsáveis. A Nova Teoria Administrativa substitui o conceito de acionista controlador como peça fundamental da empresa, para um conceito mais pluralista de parceiros reunidos num mesmo local para uma cooperação mútua. A empresa é vista como a organização de vários grupos de interesse, empregados, clientes, fornecedores, governo e acionistas em torno de um objetivo comum. O acionista não é mais a peça fundamental, mas um dos componentes cujos interesses também precisam ser satisfeitos. A missão e função do administrador profissional, ao contrário do empresário acionista, passa a ser aquele que tenta conciliar todos estes interesses difusos. Agradando na medida do possível a todos, e não a um único grupo – o acionista. É o conceito de Stak Stakeeholder em vez do Stoc Stockh kho older er.
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A Nova Realidade Econômica
Fonte http://www.ebah.com.br/
Stake, significa compromisso ou participação. Um formando que decide trabalhar numa empresa, também está investindo por assim dizer na empresa, também está correndo riscos “capitalistas”, também tem algo a perder se a empresa não der certo. Idem para um cliente, fornecedor e colaborador externo. O administrador profissional pode ser agora despedido ad nutum, algo que não ocorria no acionista controlador familiar. Agora veja um diagrama de Stakeholders vs Stockholders na prática, neste caso da CHESF.
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A Nova Realidade Econômica
Fonte: http://www.ebah.com.br/ e CHESF
Pelo organograma da CHESF percebe-se que a preocupação das empresas é bem mais ampla. Karl Marx achava que o mundo era a luta entre duas únicas classes. A luta é muito pior, é entre dezenas de grupos de interesses. Todos com suas agendas próprias e representando demandas diferentes. Tudo isto tem de ser politicamente gerenciado por hábeis administradores profissionais. O que Marx, Engels, Lenin, Rosa Luxemburg e tantos outros não diagnosticaram, é que os trabalhadores de chão de fábrica, assunto de suas análises, passariam a ser um dos inúmeros grupos de interesse de uma empresa, e que hoje representam somente 10% dos custos dessa empresa. E, as margens de lucro da empresa seriam até menores, de 4% sobre vendas. Esta perda de poder do Stockholder, do acionista, que de controlador e majoritário passou a ser minoritário e sem muito poder
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A Nova Realidade Econômica
de decisão, veio acompanhada de uma tendência contrária de fortalecimento do administrador em relação aos acionistas, agora minoritários. Mais do que maximiza maximizarr o lucro ucro,, minimiza minimizarr o custo de ca capi pital tal se torn tornou ou fa fator tor determinan terminante te pa para ra os administra dministrad dores profissi profissionais, onais, poderíamos dizer que isto é uma guinada de 180 graus no capitalismo de antigamente. Em vez de explorar o trabalhador pagando salários mínimos, passamos literalmente a explorar o capitalista fazendo IPOs onde se cobra P/Ls máximos. O objetivo é vender uma quota do capital da empresa pelo preço máximo, e não pagar o mínimo para nossos companheiros e trabalhadores. Para o Administrador Profissional, os funcionários da empresa são mais próximos a ele do que os acionistas pulverizados e dispersos mundo afora. Os acionistas viraram distantes, e os trabalhadores da empresa e colegas de trabalho viraram próximos e objetos da nossa proteção. Sou membro do Novo Mercado, onde se iniciou este paradigma, mas ainda são poucas as empresas que adotam esta postura. E mesmo assim, muitas empresas do Novo Mercado são controladas pelo Partido ou pelo Governo Único, como o Banco do Brasil, única estatal a aderir ao novo mercado.
Sua missão como administrador é tentar tornar todas as empresas “capitalistas” em empresas Democráticas de capital pulverxxii
A Nova Realidade Econômica
izado diminuindo o poder individual do capitalista, e aumentando o poder do Administrador. Por isto, nossa ênfase na Administração Socialmente Responsável.
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A Função do Administrador 200 Anos Atrás
Os Ensinamentos de Jean Baptiste Say
Um dos primeiros a perceber a necessidade de uma profissão e uma função administrativa foi Jean-Baptiste Say, um administrador industrial que escreveu um dos primeiros tratados de Economia, A Treatise on Political Economy, 1803. Say foi o fundador da primeira Escola Superior de Comércio da França, com o objetivo de formar administradores profissionais para as indústrias têxteis e comércio em geral. A Escola Superior de Comércio de 1819 foi o primeiro reconhecimento da necessidade de formar administradores profissionais, e organizar melhor o comércio e a indústria francesa e acabar com o amadorismo da empresa familiar. Em 1810, Say escreve uma frase que temos repetido e que tem sido a bandeira de todos os formados em administração no Brasil. “Sob todas as formas de governo, um Estado pode prosperar, se este for bem administrado.” Algo que a sociedade e intelectualidade brasileira ainda não percebeu. Mesmo no socialismo, a forma de governo preferida por nossos intelectuais, os administradores são necessários. Nossos intelectuais de esquerda têm entregue o poder adminis-
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A Função do Administrador 200 Anos Atrás
trativo a economistas de esquerda, e nosso crescimento tem sido pífio como consequência, e a qualidade dos serviços e eficiência do governo lamentável. Say é nosso guru, e já dizia 200 anos atrás o que estamos lutando por aqui para tornar o governo brasileiro mais bem administrado. O Brasil, devido à influência portuguesa de Pombal, foi um dos países que imediatamente mais se interessou pela nova escola francesa, tendo enviado cinco alunos brasileiros para a turma de 1824. Os Estados Unidos enviaram somente dois alunos, Alemanha quatro, Portugal dois. Comparado aos demais países, estávamos bem na frente. O filho de Say, Horace Émile Say, veio até morar no Brasil e escreveu “A História das Relações Internacionais entre a França e o Brasil”, e foi árduo defensor do Brasil quando voltou a viver na França. O Brasil poderia ter se tornado o que os Estados Unidos são hoje, se este interesse pelo estudo de administração tivesse se aprofundado. Esta deve ter sido mais uma das oportunidades perdidas pelo Brasil, ao longo de sua extensa história em recusar ideias inovadoras. Mas como veremos no livro “Administração e o Futuro do Brasil“, o Brasil desenvolveu subsequentemente uma ideologia popular que a função de administrador poderia ser exercida por qualquer um. Adam Smith e Karl Marx dois autores muito influentes na nossa direita e esquerda respectivamente escreveram sempre contra a função do administrador. Adam Smith em seu livro “A Riqueza das Nações“, desaconsel-
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A Função do Administrador 200 Anos Atrás
hava a contratação de administradores preferindo a “mão invisível do dono do negócio”. The directors of such companies, however, being the managers rather of other people’s money than of their own, it cannot well be expected that they should watch over it with the same anxious vigilance with which the partners in a private company frequently watch over their own. Negligence and profusion, therefore, must al alwa wayys prevail evail, more or less, in the management of the affairs of such a company. Riqueza das Nações é a bíblia das nossas escolas de economia, de onde surge a grande maioria de nossos Ministros da Fazenda, Ministros da Educação e Ministros e Secretários de Planejamento. Portanto, vejam o estrago de um livro estrangeiro na cultura de uma nação como a brasileira. Marx, como todos sabem, queria que administradores e capitalistas fossem enforcados. O que literalmente ocorreu na Rússia, e a produção russa despencou 34% em 1918. Segundo Antonio Gramsci, que também advogava o fim do administrador e a instituição de autogestão dos trabalhadores em: The application of union principles to the textile industry has allowed in Russia a reduction of the bureaucracy from 100,000 employees to 3,500. Chamava administradores de burocratas. Administradores contadores, operadores logísticos, orçamentistas e apontadores de custos eram todos vistos como burocratas, parasitas do sistema capitalista. A Rússia eliminou, além do primeiro escalão das empresas como recomendava Maquiavel, todo o segundo escalão da sociedade soviética: os gerentes, supervisores, contadores, super-
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A Função do Administrador 200 Anos Atrás
visores, orçamentistas, auditores, que considerava lacaios do capitalismo. No Brasil este mesmo pensamento levou ao fechamento de todas as escolas de administração, como iria fazer a Ditadura Vargas no Brasil em 1949 vide a lei 7988 de 1945. Max Weber também disseminou que administradores, gerentes, supervisores, orçamentistas, auditores se tornariam parasitas e burocratas, e que precisavam ser coibidos. Não mencionou uma única vez que uma das formas de impedir a burocracia é criar escolas de formação para estas funções. Você leitor já deve ter usado o termo “Burrocrata”, concordando com nossa afirmação de que estes cargos precisam de pessoas treinadas e não desqualificadas como muitos o são. Marquês de Pombal e Say foram dos poucos que desde o início perceberam a importância de formar estes cargos. Administradores, chamados de master agents, ou empreendedores por Say, são os responsáveis pela produtividade. “The mater agent shifts economic resources out of an area of lower and into an area of higher productivity and greater yield.” The master agent is one who undertakes an enterprise, especially a contractor acting as the intermediary between capital and labour”. Adam Smith, como já vimos, achava o contrário. Que tudo chegava na mesa do consumidor na hora certa, na quantidade certa, com a qualidade certa, graças à mão invisível do mercado, o egoísmo do padeiro e do açougueiro. Santa ingenuidade em que milhares de economistas clássicos acreditam até hoje. Tanto que fecharam as nossas escolas de administração quando criaram suas escolas de economia. Lei 7988/45 Karl Marx e Antonio Gramsci achavam que trabalhadores
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A Função do Administrador 200 Anos Atrás
poderiam autogerir as fábricas tomadas dos “capitalistas”, sem problema nenhum. Say foi o primeiro a perceber que entre o capital e o trabalho precisava haver um elo, um profissional que garantisse o preço certo na quantidade certa. Seus livros são obrigatórios para qualquer Administrador, e infelizmente seu tratado foi duramente criticado por Keynes, na sua “Teoria Geral do Emprego”, onde começa detonando a teoria de Say. Como todo bom estudante de economia, e acreditando em Keynes, não vi na época necessidade de estudar uma teoria supostamente equivocada, a de Say. Somente quando passei a desconfiar que Keynes estivesse errado, e passei a procurar alternativas ao Keynesianismo é que me dei conta que esta procura deveria ter começado com Say. Talvez Say estivesse certo desde o início, e Keynesianismo foi um desvio infeliz da história econômica do mundo. Say aponta um dado que Marx infelizmente não percebeu, aliás ele sequer o leu. Os prim primei eiros ros ca capi pitalistas talistas nã não o fforam oram ca capi pitalistas. talistas. Os primeiros capitalistas foram os engenheiros, que por sorte nasceram ricos e tinham vontade de empreender e dinheiro poupado suficiente para investir no negócio. Say foi um deles, estudou Administração na Inglaterra, trabalhou em várias empresas, uma de seguros, e abriu uma fiação com 400 funcionários em Calais. E vivia com dificuldades financeiras, como os empreendedores brasileiros têm até hoje. História bem diferente daquela contada por Karl Marx, filósofo que nunca trabalhou numa fábrica na vida.
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A Função do Administrador 200 Anos Atrás
A ideia de capitalistas idiotas, que não entendiam de nada e ganhavam fortunas, jogando golfe o dia todo graças à espoliação sistemática dos seus funcionários era totalmente falsa. Os primeiros engenheiros mas administrativamente incompetentes logo quebraram ou foram roubados pelos próprios funcionários e especialmente seus contadores. O problema do capitalismo no seu início era justamente o contrário: Falta de administradores competentes e que estivessem dispostos a arriscar suas pequenas fortunas num negócio novo e competitivo. Say, um administrador, achava que a nova renda criada deveria ser distribuída entre os funcionários, os administradores e os investidores das máquinas inventadas. Algo que acabou ocorrendo no capitalismo, e que Marx não percebeu. Trabalhadores passaram a ganhar mais, administradores passaram a ganhar pela sua função de administradores, bem como os contadores, advogados, vendedores, distribuidores, transportadores etc. E para melhorar a situação de todos, os preços dos produtos caíram vertiginosamente, numa tendência que dura até hoje, beneficiando todos, especialmente os trabalhadores e os mais pobres. O erro de Karl Marx foi não perceber que no início, engenheiros, administradores e investidores eram a mesma pessoa, razão talvez porque Marx chegou à conclusão de que ganhavam demais. Mas com o tempo as funções de engenheiro, administrador e investidor se separaram, e tragicamente Karl Marx argumentava, indiretamente, que só o trabalhador merecia receber os ganhos de produtividade criado por estes engenheiros, administradores e investidores, a famosa “mais valia marxista”.
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E Marx argumentava que administradores, gerentes, contadores, engenheiros, advogados, gerentes de recursos humanos, operadores logísticos, inspetores de qualidade, orçamentistas, propagandistas, eram no fundo capitalistas, e portanto mereciam quase nada, e na Rússia foram literalmente eliminados. Esta é também a cultura brasileira, pelo menos entre intelectuais, jornalistas, escritores e artistas. É nesta enrascada que o Brasil se encontra, e talvez esta seja a primeira missão dos jovens administradores brasileiros. Mostrar que Adam Smith, Karl Marx, Engels, Max Weber, John Maynard Keynes, e a grande maioria dos intelectuais brasileiros estão errados, criminosamente errados, e que estes estão retardando o progresso, a inclusão social, e o fim da pobreza neste país. Vocês têm uma missão e tanto a cumprir.
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O Verdadeiro Significado da Palavra Gestão
Gestão vem de fazer um gesto apontando para alguém.
Muitos administradores usam a palavra gestão como sinônimo de administração. Gestã estão ov vem em d dee Gesto Gesto,, Gesti Gesticula culaçã ção o. Gestores eram aqueles que gesticulavam, que apontavam com o dedo indicador, 200 anos atrás, onde o carregamento de alimentos deveria ser deixado ou estocado. Ou apontavam quem deveria fazer uma tarefa. “Coloque este fardo aqui.” “Você, venha já.”
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O Verdadeiro Significado da Palavra Gestão
Gestores ainda usam termos como: “in “indi dica cad dores ores” de produção, “a “apon ponta tar” r” uma solução, “aapon pontam tamen entos” tos” de uma reunião, remanescentes da época em que administrar era basicamente apontar com o indicador a di direçã reção o a seguir. Isto não é Administração do Século XXI, isto é gestão do Século XVI. Quem usa o termo Gestão está 500 anos atrasado, e pior, nem sabe disto, porque normalmente são aqueles que não são formados em Administração, e não querem admitir o fato. Administrar não é mais mandar. Nem dirigir os estoques para serem colocados aqui e ali. Administradores nem dirigem mais, não somos mais dirigentes nem diretores. Somos criadores de sistemas, adoramos empresas que andam sozinhas, delegamos, treinamos, damos poder aos nossos colegas contratados. Administrar vem de servir, como em ministério, ministrar, ser religioso.
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O Verdadeiro Significado da Palavra Gestão
Gestores por outro lado querem gesticular sobre tudo. Dão ordens, dão murros na mesa. Gritam para subordinados que não cumprem as ordens. É o estilo Comand and Control das organizações militares. Se você usa ainda o termo Gestão, cuidado. Você está mostrando para todo mundo que acredita que administrar é dar ordens para subordinados. Esta não é a missão de um administrador.
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O Que Falta Para o Brasil dar Certo?
Desde a ditadura militar, o Brasil segue a visão economicista, que acredita que o desenvolvimento depende exclusivamente da estabilidade econômica, algo que se persegue há 50 anos, sem sucesso. Esta visão acredita que basta um ambiente econômico propício, que o crescimento emergiria naturalmente. Espontaneamente, como segue a cartilha da Escola de Chicago. Infelizmente, não é bem assim. Já se foi o tempo de Adam Smith, John Maynard Keynes e Karl Marx, que acreditavam que um pouco de ganância e capital seriam suficientes para gerar empresas e empregos. Já se foi o tempo em que “agentes econômicos”, com um mínimo de “espírito empreendedor”, abriam empresas bem-sucedidas. Esta é a visão que reina neste país. Basta uma boa política econômica, que os empresários farão o resto. Hoje em dia, para montar uma empresa e ter sucesso, são necessários sólidos conhecimentos práticos e teóricos de administração de empresas. Oitenta por cento das empresas brasileiras quebram nos primeiros cinco anos, por cometer um dos 100 erros banais citados nos livros de administração.
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O Que Falta Para o Brasil dar Certo?
Só que o Brasil formou nestes últimos vinte anos menos de 250.000 administradores de empresas. O Conselho Federal de Administração tem menos de 90.000 inscritos. Por isto temos uma taxa de poupança tão baixa. A poupança que temos é desperdiçada em empresas que jamais darão certo. Aí está a principal razão para o nosso atraso, a desorganização de nosso Estado e a estagnação econômica. Com 4.650.000 empresas, nem sequer temos um administrador por empresa, que permita que problemas não acumulem e atolem de vez a empresa. Pela falta crônica de administradores formados, temos médicos que administram hospitais, enfermeiros que tocam laboratórios de análises, e engenheiros mecânicos que administram carteiras de ações. Um desperdício! No Brasil perdemos assim excelentes médicos e engenheiros mecânicos formados com dinheiro público e ganhamos péssimos gestores sem formação, que nem sabem o verdadeiro significado da palavra. E pior, acabam aprendendo a gerir empresas à moda antiga: errando. Os Estados Unidos tomaram outro caminho. De 1960 para cá formaram nada menos que 8 milhões de administradores de empresas. É a profissão mais frequente, com 19% do total de 50 milhões dos americanos formados. É também a que dá o tom, a filosofia, o modus operandi de toda a economia americana. É o segredo bem escondido da economia americana.
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O Que Falta Para o Brasil dar Certo?
Nossos economistas levaram 40 anos para aprender que países precisam manter reservas internacionais, algo que se aprende no primeiro ano de Administração Financeira. Só começamos a acumular reservar internacionais quando tivemos um administrador no Banco Central. Pode uma coisa desta? Empresários aprendem com os livros de administração vendidos nas livrarias de aeroportos, uma péssima forma de aprender administração, a um custo social monstruoso. De 1,5 milhões de formados pelas nossas universidades federais e estaduais, somente 4,5% são de administradores de empresas. Muitos governos de esquerda inclusive foram contra esses cursos, coisa da direita a ser custeada pela iniciativa privada e não pelo Estado. Jamais! Eu pessoalmente pedi ao antigo Capes uma Bolsa de Estudos para um Mestrado nos Estados Unidos, e me disseram que jamais concederiam. “Peça às empresas, seu pequeno burguês.” Eu não era, era é pobre. Os próprios empresários achavam esses cursos desnecessários, já que suas empresas seriam geridas pelos filhos, treinados pela família. Em pós-graduação a situação piora ainda mais. A Harvard Business School forma por ano mais MBAs que o Brasil inteiro. Os Estados Unidos têm 2.400.000 MBAs, 10% deles trabalhando no governo. O Brasil possui no máximo 5.000 mestres em administração, e a impressão que se tem é que nenhum deles trabalha no governo. O Ministro da Fazenda acredita que o país crescerá na hora que ele achar oportuno.
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O Que Falta Para o Brasil dar Certo?
Os “desenvolvimentistas”, do outro lado, acham que sete economistas estrategicamente colocados farão o país crescer na intensidade e direção que eles determinarem. Ledo engano. A mão invisível de Adam Smith não funciona mais no mundo moderno. Toda nação requer a mão firme e visível de centenas de milhares de pessoas treinadas e preparadas para criar empregos e organizações. O futuro do Brasil depende da disseminação de livros como este. Vamos torcer.
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Part I
As Principais Funções
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A Função do Administrador 200 Anos Atrás
Um dos primeiros a perceber a necessidade de uma profissão e uma função administrativa foi Jean-Baptiste Say, um administrador industrial que escreveu um dos primeiros tratados de Economia, A Treatise on Political Economy, 1803. Say foi o fundador da primeira Escola Superior de Comércio da França, com o objetivo de formar administradores profissionais para as indústrias têxteis e comércio em geral. A Escola Superior de Comércio de 1819 foi o primeiro reconhecimento da necessidade de formar administradores profissionais, e organizar melhor o comércio e a indústria francesa e acabar com o amadorismo da empresa familiar.
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A Missão do Administrador
Em 1810, Say escreve uma frase que temos repetido e que tem sido a bandeira de todos os formados em administração no Brasil. “Sob todas as formas de governo, um Estado pode prosperar, se este for bem administrado.” Algo que a sociedade e intelectualidade brasileira ainda não percebeu. Mesmo no socialismo, a forma de governo preferida por nossos intelectuais, os administradores são necessários. Nossos intelectuais de esquerda têm entregue o poder administrativo a economistas de esquerda, e nosso crescimento tem sido pífio como consequência, e a qualidade dos serviços e eficiência do governo lamentável. Say é nosso guru, e já dizia 200 anos atrás o que estamos lutando por aqui para tornar o governo brasileiro mais bem administrado. O Brasil, devido à influência portuguesa de Pombal, foi um dos países que imediatamente mais se interessou pela nova escola francesa, tendo enviado cinco alunos brasileiros para a turma de 1824. Os Estados Unidos enviaram somente dois alunos, Alemanha quatro, Portugal dois. Comparado aos demais países, estávamos bem na frente. O filho de Say, Horace Émile Say, veio até morar no Brasil e escreveu “A História das Relações Internacionais entre a França e o Brasil”, e foi árduo defensor do Brasil quando voltou a viver na França. O Brasil poderia ter se tornado o que os Estados Unidos são hoje, se este interesse pelo estudo de administração tivesse se aprofundado. Esta deve ter sido mais uma das oportunidades perdidas pelo Brasil, ao longo de sua extensa história em recusar ideias inovadoras.
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Mas como veremos no livro “Administração e o Futuro do Brasil“, o Brasil desenvolveu subsequentemente uma ideologia popular que a função de administrador poderia ser exercida por qualquer um. Adam Smith e Karl Marx dois autores muito influentes na nossa direita e esquerda respectivamente escreveram sempre contra a função do administrador. Adam Smith em seu livro “A Riqueza das Nações“, desaconselhava a contratação de administradores preferindo a “mão invisível do dono do negócio”. The directors of such companies, however, being the managers rather of other people’s money than of their own, it cannot well be expected that they should watch over it with the same anxious vigilance with which the partners in a private company frequently watch over their own. Negligence and profusion, therefore, must al alwa wayys prevail evail, more or less, in the management of the affairs of such a company. Riqueza das Nações é a bíblia das nossas escolas de economia, de onde surge a grande maioria de nossos Ministros da Fazenda, Ministros da Educação e Ministros e Secretários de Planejamento. Portanto, vejam o estrago de um livro estrangeiro na cultura de uma nação como a brasileira. Marx, como todos sabem, queria que administradores e capitalistas fossem enforcados. O que literalmente ocorreu na Rússia, e a produção russa despencou 34% em 1918. Segundo Antonio Gramsci, que também advogava o fim do administrador e a instituição de autogestão dos trabalhadores em: The application of union principles to the textile industry has allowed in Russia a reduction of the bureaucracy from 100,000 employees to 3,500.
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A Missão do Administrador
Chamava administradores de burocratas. Administradores contadores, operadores logísticos, orçamentistas e apontadores de custos eram todos vistos como burocratas, parasitas do sistema capitalista. A Rússia eliminou, além do primeiro escalão das empresas como recomendava Maquiavel, todo o segundo escalão da sociedade soviética: os gerentes, supervisores, contadores, supervisores, orçamentistas, auditores, que considerava lacaios do capitalismo. No Brasil este mesmo pensamento levou ao fechamento de todas as escolas de administração, como iria fazer a Ditadura Vargas no Brasil em 1949 vide a lei 7988 de 1945. Max Weber também disseminou que administradores, gerentes, supervisores, orçamentistas, auditores se tornariam parasitas e burocratas, e que precisavam ser coibidos. Não mencionou uma única vez que uma das formas de impedir a burocracia é criar escolas de formação para estas funções. Você leitor já deve ter usado o termo “Burrocrata”, concordando com nossa afirmação de que estes cargos precisam de pessoas treinadas e não desqualificadas como muitos o são. Marquês de Pombal e Say foram dos poucos que desde o início perceberam a importância de formar estes cargos. Administradores, chamados de master agents, ou empreendedores por Say, são os responsáveis pela produtividade. “The mater agent shifts economic resources out of an area of lower and into an area of higher productivity and greater yield.” The master agent is one who undertakes an enterprise, especially a contractor acting as the intermediary between capital and labour”. Adam Smith, como já vimos, achava o contrário. Que tudo chegava na mesa do consumidor na hora certa, na
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quantidade certa, com a qualidade certa, graças à mão invisível do mercado, o egoísmo do padeiro e do açougueiro. Santa ingenuidade em que milhares de economistas clássicos acreditam até hoje. Tanto que fecharam as nossas escolas de administração quando criaram suas escolas de economia. Lei 7988/45 Karl Marx e Antonio Gramsci achavam que trabalhadores poderiam autogerir as fábricas tomadas dos “capitalistas”, sem problema nenhum. Say foi o primeiro a perceber que entre o capital e o trabalho precisava haver um elo, um profissional que garantisse o preço certo na quantidade certa. Seus livros são obrigatórios para qualquer Administrador, e infelizmente seu tratado foi duramente criticado por Keynes, na sua “Teoria Geral do Emprego”, onde começa detonando a teoria de Say. Como todo bom estudante de economia, e acreditando em Keynes, não vi na época necessidade de estudar uma teoria supostamente equivocada, a de Say. Somente quando passei a desconfiar que Keynes estivesse errado, e passei a procurar alternativas ao Keynesianismo é que me dei conta que esta procura deveria ter começado com Say. Talvez Say estivesse certo desde o início, e Keynesianismo foi um desvio infeliz da história econômica do mundo. Say aponta um dado que Marx infelizmente não percebeu, aliás ele sequer o leu. Os prim primei eiros ros ca capi pitalistas talistas nã não o fforam oram ca capi pitalistas. talistas. Os primeiros capitalistas foram os engenheiros, que por sorte nasceram ricos e tinham vontade de empreender e dinheiro poupado suficiente para investir no negócio.
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A Missão do Administrador
Say foi um deles, estudou Administração na Inglaterra, trabalhou em várias empresas, uma de seguros, e abriu uma fiação com 400 funcionários em Calais. E vivia com dificuldades financeiras, como os empreendedores brasileiros têm até hoje. História bem diferente daquela contada por Karl Marx, filósofo que nunca trabalhou numa fábrica na vida. A ideia de capitalistas idiotas, que não entendiam de nada e ganhavam fortunas, jogando golfe o dia todo graças à espoliação sistemática dos seus funcionários era totalmente falsa. Os primeiros engenheiros mas administrativamente incompetentes logo quebraram ou foram roubados pelos próprios funcionários e especialmente seus contadores. O problema do capitalismo no seu início era justamente o contrário: Falta de administradores competentes e que estivessem dispostos a arriscar suas pequenas fortunas num negócio novo e competitivo. Say, um administrador, achava que a nova renda criada deveria ser distribuída entre os funcionários, os administradores e os investidores das máquinas inventadas. Algo que acabou ocorrendo no capitalismo, e que Marx não percebeu. Trabalhadores passaram a ganhar mais, administradores passaram a ganhar pela sua função de administradores, bem como os contadores, advogados, vendedores, distribuidores, transportadores etc. E para melhorar a situação de todos, os preços dos produtos caíram vertiginosamente, numa tendência que dura até hoje, beneficiando todos, especialmente os trabalhadores e os mais pobres. O erro de Karl Marx foi não perceber que no início, engen-
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heiros, administradores e investidores eram a mesma pessoa, razão talvez porque Marx chegou à conclusão de que ganhavam demais. Mas com o tempo as funções de engenheiro, administrador e investidor se separaram, e tragicamente Karl Marx argumentava, indiretamente, que só o trabalhador merecia receber os ganhos de produtividade criado por estes engenheiros, administradores e investidores, a famosa “mais valia marxista”. E Marx argumentava que administradores, gerentes, contadores, engenheiros, advogados, gerentes de recursos humanos, operadores logísticos, inspetores de qualidade, orçamentistas, propagandistas, eram no fundo capitalistas, e portanto mereciam quase nada, e na Rússia foram literalmente eliminados. Esta é também a cultura brasileira, pelo menos entre intelectuais, jornalistas, escritores e artistas. É nesta enrascada que o Brasil se encontra, e talvez esta seja a primeira missão dos jovens administradores brasileiros. Mostrar que Adam Smith, Karl Marx, Engels, Max Weber, John Maynard Keynes, e a grande maioria dos intelectuais brasileiros estão errados, criminosamente errados, e que estes estão retardando o progresso, a inclusão social, e o fim da pobreza neste país. Vocês têm uma missão e tanto a cumprir.
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A Função do Presidente de Uma Empresa É olhar para fora da empresa, não para dentro.
A função do cargo de Presidente, seja de uma empresa, seja de uma nação, é pensar grande, pensar no todo. Infelizmente no Brasil, temos uma visão equivocada ou melhor atrasada da função do administrador/a, que muitos confundem com a de gestor estor, termo ainda muito usado no Brasil. Como vimos no capítulo anterior, gestor era aquele que fazia gestos, gesticulava e apontava quem deveria fazer o quê. Rima com Feitor. Administrar para esta linha de pensamento era dar ordens. “Empregados” não tinham uma função a realizar. “Empregado” tinha que obedecer as ordens do Gestores, justamente em troca de um “emprego”. Administração não é nada disso.
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Administração é criar um sistema operacional de tal forma que a empresa ande sozinha. Sem que precisemos dar ordem alguma. Administradores não possuem “empregados”. Administradores possuem funcionários, pessoas que treinamos para exercerem uma função. Uma função que independe de estarmos dando ordens a torto e direito. Eles já sabem o que fazer. Não somos Gestores, somos talvez Supervisores. Na maior parte do tempo podemos até não fazer nada, até que um problema surja que necessite da nossa atuação. Ou, até que um funcionário fique na dúvida sobre o que fazer e nos peça uma opinião. Para a Teoria da Gestão, o Presidente da Empresa é o dirigente supremo. Ele é quem decide tudo. Tudo passa pela mão dele. É a visão do empresário. Do Gestor Familiar. Do capo supremo. Da máfia inclusive. A visão daqueles que acreditam que “É o Olho do Dono é Que Engorda o Gado”. A verdadeira função de um Presidente na visão da Teoria da Administração é olhar para fora da empresa. Não para dentro, dando ordens para todo mundo. A Missão do Administrador é cuidar da empresa para fora, não empresa para dentro. É cuidar das relações com a sociedade, com o governo, cuidar de
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A Missão do Administrador
alianças estratégicas, da expansão da empresa, com as vendas no exterior. Foi o estilo Lula, que vivia viajando pelo mundo afora, criticado constantemente pelo seu Aero Lula, bem diferente do estilo Dilma, que administrava o Brasil para dentro, seus ministros e secretários, cobrando resultados, dando esporros de tempos em tempos. O Presidente “Administrador” tem tempo para cuidado do futuro, da expansão dos negócios, porque a empresa, lembre-se, anda sozinha, ou praticamente sozinha. Lula foi um administrador neste sentido. Justamente porque cuidou do Brasil para fora, e como fruto desse esforço o Brasil teve um prestígio jamais visto, até vir a Dilma. Dilma é uma Gestora, o que faz parte de seus problemas, e do Brasil. Ela vê seu cargo de Presidente como uma controladora de gastos, da corrupção, realiza o micro-management, que deveria ser feito pelos seus Ministros e não por ela. Ela nem tem tempo para supervisionar 39 Ministros e 230 Secretários. Suas reuniões Ministeriais são totalmente improdutivas, a maioria dos participantes nem abre a boca. Bastaria ler a ata da reunião.
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Mas todos os seus Ministros escolhidos também não entendiam absolutamente nada de administração. E as consequências estão aí. E como ela está descobrindo, Gestor não tem tempo para tudo isto, fica atolado controlando todas as áreas de sua empresinha. Verdade seja dita que nosso governo não anda sozinho. Esta é a missão de vocês jovens administradores. Agir politicamente para mostrar que o Brasil está 500 anos atrasado e exigir que o país seja administrado por administradores, aqueles que têm tempo para pensar no todo, no Brasil, no Brasil para fora e não para dentro.
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A Miss찾o do Administrador
Presidentes que pensam estrategicamente para ampliar os neg처cios, e n찾o ficar atolados nos problemas internos que se acumulam dia a dia.
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Administrar é Ter Acabativa Saber acabar o que você iniciou
Iniciativa é a capacidade que todos nós temos de criar, iniciar projetos e conceber novas ideias. Algumas pessoas têm muita iniciativa e outras têm pouca. Iniciativa tem sido um atributo cantado em verso e prosa por filósofos, cientistas, economistas e políticos. Uma das correntes políticas mais discutidas chama-se inclusive “livre iniciativa“. Vou mostrar neste artigo que todos estão equivocados. De nada adianta “livre iniciativa” sem uma classe na sociedade preocupada com acabativa. Acabativa é um neologismo que significa a capacidade que algumas pessoas possuem de terminar aquilo que iniciaram ou concluir o que outros começaram.
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A Missão do Administrador
É a capacidade de colocar em prática uma ideia e levá-la até o fim. Os americanos dividem o mundo em duas categorias, os dreamers e os doers, os sonhadores e os fazedores.
Mas os seres humanos podem ser divididos em quatro grupos, dependendo do grau de iniciativa e/ou acabativa de cada um: os empreendedores, os iniciativos e os acabativos e os mantenedores * Empreendedores são aqueles que têm iniciativa e acabativa. Um seleto grupo que não se contenta em ficar na ideia e vai a campo implantá-la. São estatisticamente
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muito raros. Menos de 1% da população. São os Thomas Edison, Bill Gates, Steve Jobs, e muitos outros. * Iniciativos são os criativos, os que têm mil ideias, mas abominam a rotina necessária para colocá-las em prática. São filósofos, cientistas, professores, intelectuais. Acabativa é o ponto fraco desse grupo. São os Thomas Moore, os Karl Marx, os Augusto Compte, os Rousseau que sonhavam com uma sociedade melhor, mas nunca delinearam como estas sociedades funcionariam de fato, achando que o amor e a fraternidade resolveriam todos os problemas operacionais. São os sonhadores utópicos. * Acabativos são aqueles que gostam de implantar projetos. Sua atenção vai mais para o detalhe do que para a teoria. Não se preocupam com o imenso tédio da repetição do dia-a-dia e não desanimam com as inúmeras frustrações da implantação. Nesse grupo está a maioria dos executivos, empresários, administradores e engenheiros. A ênfase que muitos no Brasil estão dando ao empreendedor é equivocada. Eles são muito raros e normalmente veem prontos, não dá para formá-los em MBAs e universidades. Como iremos ver, o que o Brasil deveria esta incentivando é a formação de Acabativos, e incentivar a cooperação dos Iniciativos com os Acabativos. Este grupo representa 80% da população e não somente 1%. Esta é outra missão Missão do Administrador. Terminar o que 40% da população inicia mas não termina. Essa singela classificação explica muitas das contradições do mundo moderno. Empresários, normalmente associados à “livre iniciativa” desco-
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brem rapidamente que ficar implantando suas próprias ideias é coisa de narcisista. E portanto, egoísta. Existem muito mais pessoas com excelentes ideias do que pessoas capazes de implantá-las. É por isso que empresários ficam ricos e intelectuais, professores – entre os quais me incluo - morrem pobres. Temos ideias, mas não sabemos implantá-las. Mesmo se soubéssemos, jamais implantaríamos ideias de outros intelectuais. No ramo intelectual o narcisismo e o egoísmo imperam, justamente o contrário do que pregam. Se Bill Gates tivesse se restringido a implantar suas próprias ideias teria parado no Basic. Ele fez fortuna porque foi hábil em implantar as ideias dos outros – dizem as más línguas que até copiou algumas. Essa classificação explica porque intelectual normalmente odeia empresário, e vice-versa. Há uma enorme injustiça na medida em que os lucros fluem para quem implantou uma ideia, e não para quem a teve. Só que uma ideia somente no papel é letra morta, inútil para a sociedade como um todo. Um dos problemas do Brasil é justamente a eterna predominância, em cargos de ministérios, de professores brilhantes e com iniciativa, mas com pouca ou nenhuma acabativa. Para o Brasil começar a dar certo, precisamos procurar valorizar mais os brasileiros com a capacidade de implantar nossas ideias. Tendemos a encarar o acabativo, o administrador, o executivo, o empresário como sendo parte do problema, quando na realidade eles são parte da solução. Iniciativo almeja ser famoso, acabativo quer ser útil. 17
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Mas a verdade é que a maioria dos intelectuais e iniciativos não tem estômago para devotar uma vida inteira para fazer dia após dia, digamos bicicletas. O iniciativo vive mudando, testando, procurando coisas novas, e acaba tendo uma vida muito mais rica, mesmo que seja menos rentável. Por isso, a esquerda intelectual e a direita neoliberal conviverão às turras, quando deveriam unir-se. Há um di dita tad do chin hinês, ês, “Quem sa sabe be e nã não o faz, no fun fund do, nã não o sa sabe be”” - muito apropriado para os dias de hoje. A Função Primordial de um Administrador é ser o acabativo de uma sociedade. É se prestar para colocar em ação as ideias, e tirá-las do papel. O sistema que deveríamos apoiar é o de “livre acabativa“. Nem o conceito correto acertamos. No próximo capítulo revelarei a função mais nobre de um Administrador. A de realizar os sonhos dos outros.
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Administrar é Realizar o Sonho dos Outros O Líder Servidor
Existem mais pessoas no mundo com ideias, do que pessoas capazes de implantar estas ideias. Sabemos que 4 entre 5 empresas quebram nos primeiros 5 anos de vida. Isto é um desastre mundial e brasileiro. Isto significa para 80% da população de empreendedores e seus trabalhadores um fracasso total. Tempo e dinheiro totalmente desperdiçado. Significa 80% dos trabalhadores desempregados em 4 anos, com um péssimo currículo. Significa 80% de ex-capitalistas, agora sem capital e provavelmente com pesadas dívidas e impostos em atraso. Tudo isto seria amenizado se pudéssemos ter uma classe profissional com talento e treinamento em acabativa.
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Para isto precisamos motivar e treinar jovens para estarem dispostos a realizar os sonhos dos outros. Aceitar a ajudar os criativos, os intelectuais, aqueles com ideias inovadoras a passarem do papel para a realidade. Realizar os sonhos dos outros não é uma tarefa fácil nem recompensadora. Significa treinar jovens que não sejam egoístas, narcisistas, arrogantes, donos da verdade, egocêntricos e preocupados com si. Significa treinar pessoas dispostas a implantar as ideias dos outros, deixar os outros com a fama da inovação, deixar os outros ditarem as ideias, deixar os outros com boa parte da glória. Quem foram os administradores que colocaram as ideias de Steve Jobs em prática? Poucos sabem. Deveriam ter dividido o mérito com Steve Jobs? Sem dúvida. Mas estes administradores não se preocupam com fama, holofotes, dedicação aos sonhos dos outros. Nosso sonho é ajudar as pessoas com ideias a colocá-las em prática. Por isto eu discordo desta ênfase que o PSDB, o PT e o PMDB dão para o Empreendedorismo. Por isto eu discordo destas faculdades que ensinam Empreendedorismo.
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A Missão do Administrador
Na sua essência, Empreender é saber realizar o seu próprio sonho. É a atitude mais egoísta e egocêntrica que se pode tomar. E é o problema que o mundo ocidental enfrenta, o do egocentrismo e do narcisismo dos nossos políticos e intelectuais. Não precisamos de faculdades que incentivem o empreendedorismo, mas sim que incentivem a criação de uma classe de profissionais que esteja disposta a realizar os sonhos dos outros, colocando o seu próprio ego de lado. Não que nós administradores não daremos palpites, que não escolheremos o nosso jeito de implantar, e derivar daí muita satisfação. Mas quem irá brilhar no final é o outro, o inovador, o criador. Como o anônimo pedreiro e obreiro de construção, nossa satisfação é ver o prédio pronto. Eu realmente acredito que uma sociedade centrada no administrador e na administradora, aqueles que se preocupam de fato com os sonhos dos outros, será a sociedade ideal. Muito melhor que a sociedade socialista e marxista preconizada por Marx, ou a “livre iniciativa” preconizada por Milton Friedman. A história mostra que ambos incentivam a competição de indivíduos ou de grupos ideológicos antagônicos, digladiando-se pelo poder de mandar nos outros. Nossa cultura é toda voltada a não realizar os sonhos dos outros.
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Realizar os sonhos dos outros é considerado ser feito de bobo. Não é. Precisamos de pessoas como você, disposta a realizar os sonhos dos outros. Que aceita ser humilde, deixar a glória para o outro que teve a ideia. Estamos acima disto. Por isto na Índia havia duas castas, a dos Intelectuais, os Brahmins com suas ideias, e os Chátrias, os administradores com a tarefa de implantá-las. Na Índia jamais deixam o “dono” da ideia implantá-la, para não incorrer no que chamamos no Ocidente “cegueira profissional”. Por isto dizemos que só o Administrador pode salvar o Economista, o Sociólogo e o Cientista Político do fracasso, porque trazemos para a realidade suas teorias nem sempre malucas, mas normalmente mal executadas quando executadas por eles mesmos. Realizar os sonhos dos outros requer um tipo de ser humano infelizmente raro. Um ser humano desapegado de si, confiante o suficiente em si para deixar os outros brilharem. Um ser humano que de fato ouve os outros, que esteja disposto a servir e até obedecer os outros. Disposto a devotar uma vida onde os outros se realizam e nós seremos meros coadjuvantes.
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Seres humanos onde não impera a soberba, a arrogância, o autoritarismo, o egocentrismo. Espero que você seja um deles. Uma das tragédias do Brasil é que tantos jovens idealistas preferem ser filósofos, assistentes sociais, historiadores, jornalistas de denúncia, marxistas e revolucionários, querendo destruir tudo que está aí, em vez de dedicar a sua vida a realizar o sonho de seus concidadãos vivos e criativos. Pergunte a qualquer trabalhador do mundo se eles estão felizes com os intelectuais que tomaram o poder em nome deles. Pergunte se estes intelectuais de fato realizaram os sonhos dos trabalhadores do mundo e dos trabalhadores brasileiros. O caminho para melhorar o mundo não passa pelo Marxismo nem pelo Liberalismo, mas por uma classe de profissionais competente em administração e cooperação humana, disposta a servir os outros. Esta é a nossa missão.
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Administrar é Nunca Acumular Problemas O ótimo é o maior inimigo do bom
O segredo para o sucesso de toda família, empresa e governo é nunca acumular problemas. Este é o segredo da administração profissional.
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Quando problemas acumulam, o diagnóstico dos problemas seguintes fica mais difícil. As soluções ficam mais complicadas, a implementação fica mais comprometida, e a avaliação dos resultados fica bem mais questionada. O vigésimo problema é na realidade consequência do oitavo problema não resolvido. O décimo quinto, consequência do terceiro. Aí, você terá enormes problemas ao discutir “prioridades”, quais dos 20 problemas atacar primeiro, e para piorar a sua situação os escolhidos não serão o primeiro, segundo e terceiro como deveriam ser. Por isto administradores profissionais são tão necessários em empresas, governos e até para administrar conflitos familiares. A primeira função do administrador é nunca permitir problemas acumularem. Por isto somos chatos, queremos tudo para ontem. 25
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Eles se dedicam integralmente para que problemas não se acumulem, facilitando a vida de todos os envolvidos. Por isto mulheres estão cada vez mais sendo requisitadas para cargos administrativos. Elas possuem a maioria das qualidades que se espera de um administrador moderno. Ou como já coloquei anteriormente, a Administração Moderna incorpora muitos dos valores que consideramos mais femininos do que masculinos. O que torna o homem administrador não mais feminino, como imaginariam alguns, mas mais humano. Como sempre, estamos sugerindo o caminho do meio, administradores menos autoritários e agressivos, e administradoras mais efetivas e incisivas. Pergunte a um engenheiro, advogado ou psicólogo qual é o estilo gerencial do administrador comum, e eles provavelmente também usariam um único adjetivo. Provavelmente nos definiriam de “imediatistas”, preocupados com lucros de curto prazo, como Paul Krugman e seus colegas não param de escrever no New York Times. Administradores, segundo a visão popular, querem tudo para “ontem”, vivem dizendo que “o ótimo é o inimigo do bom”, que precisamos mais de “acabativa” e não de iniciativa. Algo que uma mãe já sabe intuitivamente que é a única forma de gerenciar uma família. “Vamos promover um debate e consultar as bases” não é administrar, mas sim postegar. Infelizmente, a maioria dos administradores não consegue provar a sua utilidade nem sabe explicar exatamente o que faz. Por isto, eles não ganham o que merecem, por isto não são valorizados.
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Muitos acham que administrar é liderar, executar, coordenar, valores essencialmente masculinos. Isto está até escrito em inúmeros livros de Administração adotados pelas nossas Faculdades de Administração. Uma organização complexa, que é a empresa moderna, requer a cooperação de milhares de pessoas, dentro e fora da empresa. E isto inclui cooperação de mulheres em postos de comando, algo que a civilização europeia, americana e brasileira estão longe de implantar. E, esta cooperação multipessoal gera inúmeros problemas que se não forem solucionados a tempo afetarão todos os parceiros envolvidos na empresa. Não permitir que problemas se acumulem talvez seja a tarefa mais importante para o bom andamento de toda família, empresa e nação. Quando o mundo era gerido por açougueiros, padeiros e fábricas de alfinetes, como observou na época Adam Smith, de fato não havia muitos problemas “acumulados”. Nem havia necessidade para se contratar administradores. Tudo funcionava pela Mão Invisível do mercado. Hoje, o mundo é bem mais complexo e rápido, razão pela demanda crescente de profissionais em administração. Toda empresa e nação precisa de um corpo de profissionais treinado e dedicado a resolver os problemas de forma rápida. Não somos imediatistas como muitos acreditam, nós simplesmente estamos evitando que problemas se acumulem um atrás do outro, e nestes casos rapidez de raciocínio e ação são essenciais. Por isto, nós nos preocupamos tanto com acompanhamento, qualidade total, processos, auditoria, recursos humanos, etc. Infelizmente, não é assim que a maioria dos intelectuais
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brasileiros que ocuparam tantos cargos de destaques neste país pensam. Toda a filosofia de ensino, pelo menos a partir do iluminismo e cientificismo, é voltada para resolver pro prob blemas corre corretam tamen ente te,, até a segun segunda da casa d decimal. ecimal. Ra Rapi pid dez, só n no ov vesti estibula bularr. Países dominados por professores acadêmicos, como o Brasil, estão fadados ao atraso. Para um acadêmico, todos os dados precisam ser precisos e rechecados. Decisões são postergadas até “termos melhores dados“. Um acadêmico precisa estar “absolutamente certo”, prefere não tomar uma decisão se não tiver todos os dados necessários. Quando se acusa o PSDB de ficar sempre em cima do muro, na realidade se comete uma injustiça. O PSDB, que é um partido de acadêmicos e intelectuais, simplesmente é mais demorado na tomada de decisão, como todo intelectual. Eles vivem pensando, literalmente.
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Só que resolver problemas corretamente hoje em dia não é o suficiente. Eles precisam ser resolvidos rapidamente, algo que nossos formadores de opinião, jornalistas e acadêmicos simplesmente não compreendem. Temos que tomar decisões com os dados que temos, não com os dados que gostaríamos de ter. O Brasil é um país atrasa trasad do porq porque ue estam estamos os eternam ternamen ente te acumulan uland do pro prob blemas emas. É tão óbvia esta constatação que é um espanto que a nossa opinião pública, nossos intelectuais e professores de história nunca perceberam esta simples verdade da história brasileira. Quando se diz que precisamos fazer a Reforma Política, a Reforma Tributária, a Reforma Judiciária, o que queremos dizer é que deixamos tantos problemas se acumularem nestas áreas que somente uma ampla reforma resolverá o problema. Se tivéssemos resolvido os problemas na medida que surgiram, o Brasil teria evoluído, teria caminhado para um sistema ótimo, em vez de termos que criar revoluções e enormes reformas de tempos em tempos, que no fundo nos atrasam ainda mais.
Temos problemas no judiciário, na previdência, na logística, na
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infraestrutura, na educação, na economia, simplesmente porque não temos um estilo gerencial que se preocupa com a rápida solução de problemas. E problemas que se acumulam crescem exponencialmente, não linearmente, como todo administrador sabe por experiência. Quatro entre cinco empresas quebram no Brasil porque são geridas por profissões que não percebem que problemas não podem se acumular. Aí, qualquer crise ou evento fora do comum as abate. Nenhuma empresa quebra por uma única razão, nenhum avião cai por causa de um único problema. Estas quatro empresas quebram a um custo de capital monstruoso para o país, por falta de um estilo gerencial apropriado. O Brasil não poupa o suficiente para crescer; e pior, torramos 80% desta poupança em empresas que irão quebrar em quatro anos. Eu não diria, e nunca disse, que o estilo gerencial do/a administrador/a é superior ao do/a engenheiro/a, do advogado/a ou contador/a. Infelizmente, estas profissões se sentem ameaçadas pelos administradores à toa. E se mostrarmos que mulheres são excelentes administradoras, as ameaças se tornam maiores ainda para aqueles que não entendem de administração. Não queremos comandar, gerir, tomar o lugar de ninguém, nem mesmo as administradoras, embora muitas feministas coloquem isso como meta. Quero deixar claro para todo empresário, sociólogo, engenheiro e político que possam se sentir ameaçados, que o estilo do/a administrador/a não é superior. Ele é simplesmente necessá ecessári rio o. Não podemos permitir que nossos problemas se acumulem sim-
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plesmente porque cada profissão acha que seu estilo gerencial é superior. Nós administradores aceitamos que engenheiros sejam perfeccionistas, que advogados sejam detalhistas, que economistas queiram dados precisos, mas tudo isto tem de ser adequado para não atrapalhar os outros dentro da empresa ou do governo. Não podemos ficar esperando enquanto os outros seguem seus estilos individuais. Engenheiros, advogados, contadores enfim, precisam entender que seus estilos gerenciais podem ser superiores e apropriados quan uand do se tra trabalha balha sozinh sozinho o, mas quan uand do se tra trabalha balha em grupo én necessá ecessári rio o con concilia ciliarr. Trabalhando em grupo, um simples atraso numa reunião atrapalha os outros, imagine um problema que não foi solucionado por anos a fio. Quando vejo acusarem administradores e empresários de “imediatistas”, que pensamos somente no curto prazo, percebo que estas pessoas nada entendem das funções do administrador, de crescimento, de justiça social, de democracia e de um mundo feliz cheio de realizações, porque tudo é feito na velocidade necessária. Se você está cansado de um país estagnado, que cresce aquém de suas possibilidades, que acumula pobreza, corrupção, injustiça e inúmeros problemas, converse mais com um administrador. Ele o ajudará a decidir e implantar suas ideias muito mais rapidamente do que você vem fazendo até hoje. Mais do que ninguém elas sabem que problemas não podem ficar sem solução por muito tempo, enquanto o maridinho fica pensando por aí. O problema do Brasil é que devido a 50 anos de gestão acadêmica deixamos dezenas de problemas acumularem e agora a
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grande discussão é qual resolver primeiro, já que não temos recursos para resolver todos. Tudo isto exige preparo, treinamento, um código de ética, uma visão epistemológica do mundo, uma determinação e uma coragem que leva tempo para ensinar. Por isto o curso de Administração não é para qualquer tipo de pessoa, ele não combina com alguns tipos de personalidade, especialmente os perfeccionistas, por exemplo. Se sua empresa, seu governo ou sua ONG anda devagar, parada porque acumulou problemas demais e agora não consegue resolvê-los, contrate um administrador profissional, alguém treinado para resolver problemas de forma competente. Mas contrate antes disto tudo acontecer porque senão será tarde demais, e não haverá muito que um administrador possa fazer, a não ser lentamente fechar as portas de sua empresa ou organização. Como administradores conseguem sucesso numa área onde tantos fracassam como os empresários, empreendedores, políticos e governo? Lei Núm úmero ero 1. Pro rob blemas precisam ser iden entifi tifica cad dos log ogo o que ocorrem. Administradores irão implantar um complexo sistema de avaliação e contabilidade, para identificar todos os problemas no nascedouro. Irão estabelecer padrões, benchmarks, orçamentos, planos, para justamente identificar problemas assim que eles ocorram. Eles estarão medindo a sua “pressão” constantemente. Lei Núm úmero ero 2. Pro rob blemas precisam ser reso resollvi vid dos assim que ocorrem. Um dos problemas em empresas “administradas” por profis-
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sionais de outras áreas é que o mundo acadêmico preza análises e decisões bem feitas, de pref preferên erência cia perf perfei eitas. tas. Engenheiros, psicólogos, advogados, todos passaram pela experiência de ter tirado zero numa prova por um pequeno erro ou detalhe. Às vezes, erro de aproximação por calcular 3,9 em vez de 4,0. Isto leva a um erro administrativo que chamamos de “anal analysis ysis pa paral ralysis ysis”. Se todo problema for analisado a exaustão, a empresa para. Mas no mun und do aca cad dêmi êmico co na nada da precisa ser fei eito to pa para ra amanhã ou on ontem. tem. Professores levam meses para corrigir provas de alunos, nunca leram a lei número um acima. Lei Núm úmero ero 3. Pro rob blemas precisam ser reso resollvi vid dos sem term termos os tod todos os os da dad dos à n nossa ossa disposi disposiçã ção o. Isto em Engenharia e Economia seria uma heresia e uma irresponsabilidade. Como não saber todos os fatos antes de tomar uma decisão? Por isto não é fácil ser administrador. A responsabilidade é enorme, justamente porque tomamos algumas decisões “irresponsavelmente” na terminologia de pessoas leigas. Fazemos isso porque sabemos que não tomar uma decisão, de ficar paralisado analisando um problema à exaustão, também é uma forma de ser irresponsável. O que na realidade ocorre não é que tomamos decisões às cegas, mas normalmente juntamos dados com diferentes níveis de precisão. Em contabilidade isto é muito claro. Os valores do Caixa são precisos até duas casas decimais, os
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centavos, mas tranquilamente somamos com os valores de Estoques e Ativo Fixo que não tem nem perto, a mesma precisão. Muitos empresários nem sabem que os dados dos Ativos das empresas são agregados com diferentes níveis de significância. Os formuladores dos Acordos da Basileia não sabem que o valor do Patrimônio dos Bancos é totalmente impreciso, justamente porque não se permite no Brasil a correção monetária dos balanços. E mesmo assim usam este valor para criar leis como os Acordos da Basileia, tema que não vou remoer mais uma vez aqui. Lei Núm úmero ero 4. Uma decisã ecisão o mal fei eita ta é melh lhor or do que uma decisã ecisão o nã não o ffei eita. ta. A primeira vez que eu ouvi este conselho, de um dos meus professores de Harvard, tive a mesma reação que você está tendo agora. Malucos, óbvio que estão brincando, não pode ser sério. O raciocínio é mais ou menos assim. Se você tomou uma decisão errada, rapidamente através dos indicadores que já estabeleceu para avaliar tudo o que você faz descobrirá que sua decisão foi equivocada. E como você é rápido, logo irá corrigir o problema. É uma questão de postura, mais do que de ciência.
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Administrar é Saber Delegar Aquilo que você já sabe fazer
Um dos grandes problemas dos Gestores é o pavor de delegar aquilo que não entendem. Querem centralizar tudo e poder acompanhar tudo de perto, especialmente aquilo onde sentem insegurança. Por isto, os Gestores são verdadeiros ditadores, centralizadores, desconfiados ao extremo e inseguros. Vemos isto claramente na Gestão Familiar, onde o velho patriarca não larga o osso e não confia nem nos próprios filhos. Colocar os pés na mesa e não fazer nada, nem pensar. “Esta empresa não anda sem mim, ela precisa de mim.“ Para o Gestor Familiar, o objetivo NÃO é criar uma empresa que ande sozinha.
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Por isto a maioria das empresas familiares não sobrevive à morte do fundador. Se você quiser subir na vida, saiba delegar. Se você quer ser um Administrador, saiba delegar em vez de gerir tudo sozinho. Agora, existe um grave problema: saber delegar exige conhecer bem o assunto que você está delegando. Quem nunca estudou administração nem sabe como delegar. Muitas pessoas leigas não apreciam ou não entendem o significado de SABER delegar. Saber delegar não significa saber Como Delegar, mas sim saber O Que Está Sendo Delegado. Por isto, os acadêmicos e a maioria dos brasileiros acha que qualquer um pode ser Gestor. Basta dar os gestos e ordens necessárias para fazer uma empresa funcionar. Saber delegar é conhecer bem o assunto que você está delegando. Muitos acham justamente o contrário, que se delega aquilo que não se entende. Se você não entende de Marketing, delega-se a um executivo de Marketing que entenda. Assim, no limite, um Presidente de uma empresa não pre36
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cisa entender de nada, basta ter executivos de “confiança” que entendam. Que é o que acontece na maioria das empresas estatais e Ministérios entregue a políticos de partidos aliados. Saber delegar é justamente saber o que está sendo delegado. Caso contrário, você não saberá se o que foi delegado foi bem feito. Você pode ser enganado, e muito bem enganado pelo seu confiado. Você também não saberá ajudar o seu delegado quando os problemas começarem a se complicar. Por isto, é muito difícil encontrar bons Presidentes de Empresas. Porque são pessoas que entendem um pouco de tudo, se interessam um pouco por tudo. Sabem dialogar com competência com todas as áreas de uma empresa. Podem não saber os detalhes, mas sabem o que é essencial. Muitos leitores se surpreendem que eu escrevo sobre muitos assuntos diferentes como casamento, família, ciência, economia, dança de salão, etc… Nós administradores somos treinados a nos interessar por tudo. Somos fuçadores por excelência. Estamos procurando sempre a essência das coisas.
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Administrar é Por Fim a Incompetência Todo Mundo Tem Que Ser Imcompetente?
Casar com a filha do dono da empresa, arrumar emprego público, ter padrinho político ou obedecer piamente às ordens do chefe eram, em linhas gerais, os caminhos para o sucesso no Brasil. QI no Brasil é sinônimo de “quem indica”. Ter um MBA no exterior, falar cinco idiomas, desenvolver nova tecnologia, caminhos certos para o sucesso no Primeiro Mundo, em nada adiantavam no Brasil. Fui um dos primeiros brasileiros a me formar pela Harvard Business School, achando que eu seria cortejado para ser professor titular da FGV, eleito para uma diretoria do Conselho Regional de Administração, cortejado pelo Ministério da Educação, convidado para assessor do Presidente da FIESP, ter dezenas de head hunters querendo a minha cabeça. Nada disto aconteceu. 38
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Competência no Brasil é justamente uma ameaça ao status quo dos medíocres. E são os medíocres que infelizmente dominam o país. Sua missão será mudar esta visão de mundo. Visão de mundo inclusive incentivada pela classe de intelectuais e os formadores de opinião, na maioria tão medíocres quanto. Muitas empresas brasileiras ainda preferem mamar nas tetas do governo, do BNDES, com créditos subsidiados, numa economia protegida por acadêmicos no poder, do que gerar competência própria. Até um perfeito imbecil toca uma empresa brasileira naquelas condições. Fato que irrita sobremaneira a esquerda e os nossos intelectuais marxistas, com toda razão. Contratar pessoas competentes, além de não ser necessário, era desperdício de dinheiro. Competência num ambiente desses não tem razão para ser valorizada. Até hoje no Brasil, os jovens não veem necessidade de adquirir conhecimentos. Acham que o objetivo é passar de ano. Felizmente, tudo isso já está mudando. Empresários incompetentes estão quebrando ou vendendo o que sobrou de suas empresas para as multinacionais. Por muitos anos, no Brasil, quem tivesse um olho era rei. Daqui para a frente, serão necessários dois olhos, e bem abertos. Sai o improvisador e o esperto, entra o Administrador formado em cooperação e treinamento. A Função Social do Administrador é promover e treinar a competência. É identificar aqueles que têm talento e supervisioná-los.
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É medir os resultados dos velhos incompetentes e sugerir que se retirem de cena. A regra básica daqui para a frente é a competência, e não a filiação política, a amizade ou o parentesco. Competência profissional, experiência prática e não teórica, habilidades de todos os tipos. De agora em diante, seu sucesso será garantido não por quem o conhece, mas por quem confia em você. Estamos entrando numa nova era no Brasil, a era da meritocracia. Felizmente, para os jovens que querem subir na vida, o mérito será remunerado e não desprezado. Já se foi a época em que o melhor aluno da classe era ridicularizado e chamado de CDF, o Cu de Ferro, nome que dávamos para quem estudava e sabia a matéria, em vez de fazer política estudantil. Se seu filho de classe média não está levando o 1º e o 2º grau a sério, ele será rudemente surpreendido pelos filhos de classes mais pobres, que estão estudando como nunca. As classes de baixa renda foram as primeiras a perceber que a era do status quo acabou. Hoje, até filho de rico precisa estudar, e muito. Há vinte anos eram poucas as empresas brasileiras que tinham programas de recrutamento nas faculdades. As empresas administradas por administradores colocam esta meta em primeiro lugar. Hoje, as empresas possuem ativos programas de recrutamento nas faculdades não somente aqui, mas também no exterior. Os 200 brasileiros que estão atualmente cursando mestrado em administração no exterior estão sendo disputados a peso de ouro.
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Infelizmente, os milhares de jovens competentes de gerações passadas acabaram não desenvolvendo e tiveram seu talento tolhido pelas circunstâncias. Talvez eles não tenham mais pique para desfrutar essa nova era, e na minha opinião esta é a razão da profunda insatisfação atual da velha classe média. Mas os jovens de hoje, especialmente aqueles que desenvolveram um talento, os estudiosos e competentes, poderão finalmente dormir tranquilos. Não terão mais de se casar com a filha do dono, arrumar um padrinho, aceitar desaforo de um patrão imbecil. O talento voltou a ser valorizado e remunerado no Brasil como o é mundo afora. Talvez ainda mais assustador é reconhecer que o Brasil não será mais dividido entre ricos e pobres, mas sim entre competentes e incompetentes. Os incompetentes que se cuidem. ( Publicado originalmente na Revista Veja edição 1536 ano 31 nº 9 de 4 de março de 1998 )
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Administrar é Saber o Intervalo Entre Ação e Reação Nada é instantâneo no mundo real, só na teoria
Você pede desculpas ao seu marido, mas ele continua brigando. Você traz flores para a sua esposa, só que ela não o perdoa no ato. Infelizmente, ação e reação instantâneas só acontecem na física. Na psicologia, nas finanças, na economia, nas empresas, nas relações de trabalho sempre existe um intervalo demorado entre ação e reação. Não saber avaliar corretamente o intervalo de reação da sua esposa, do seu chefe ou de uma política econômica tem sido a principal causa dos conflitos entre seres humanos. Não saber ao certo esse intervalo causa enormes problemas. Primeiro, nunca se consegue avaliar se: 42
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1) suas políticas fracassaram, ou se 2) você errou nas estima estimati tivas vas do in interval tervalo o de rea reaçã ção o, ou se 3) você errou na dose da ação interventora. Quando uma política econômica ou social não dá os resultados esperados, os que a implantaram invariavelmente se defendem pedindo mais tempo. É sempre assim, nunca aceitam que erraram na política ou na medida econômica. Aí temos o famoso problema administrativo do culpado fazer “mais do mesmo“, aumentando a taxa de juros, pedindo mais verbas para segurança e educação. Aumentam a dose da medida em vez de abandonar a ideia por inteiro. Aí elevam ainda mais os juros dando maiores subsídios, aumentando ainda mais os gastos públicos, e assim por diante. Foi dessa forma que nossos juros, nossos impostos, os gastos de governo foram subindo, subindo, subindo, em vez de se mudar a política econômica. Só quando a política está prestes a arruinar o país é que se muda a equipe e sua nefasta política. Muitas vezes se faz o movimento diametralmente oposto, que também não é necessariamente a solução correta. Essas duas políticas, “mais da mesma coisa” e “guinada de 180 graus“, resumem praticamente 95% das políticas econômicas implantadas neste país nos últimos 35 anos. O famoso “stop and go” que faz até parte da literatura econômica. Agora imaginem, em vez de lidar com uma única variável, tipo juros, e seu intervalo de reação, tem temos os que li lida darr com cin cinco co ou mais va variá riáv veis aao om mesm esmo o tem tempo po. Quem já tomou banho de chuveiro em casa antiga sabe como é
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difícil ajustar a temperatura quando é grande o intervalo de reação entre abrir a torneira de água quente e ter um fluxo de água na temperatura desejada. Requer paciência, num vai e vem sutil, requer disciplina. Imaginem agora acertar a temperatura com cinco torneiras e cinco intervalos de reação diferentes e desconhecidos. Isto é o que nós administra dministrad dores fazem fazemos os tod todo o dia. E nã não o sã são o5 mas 50 50.. Tentamos calibrar a dose certa e observar os efeitos antes de agir novamente. As doses são homeopáticas e impera a paciência. Agora imaginem tentar controlar as duzentas variáveis necessárias para desenvolver um país. “Vamos usar todas as medidas que forem necessárias.“ Mas se com uma única variável já é complicado os economistas acertarem a mão, imagine com 10 “medidas macro prudenciais“. Lidar com 50 variáveis ao mesmo tempo é a tarefa do Administrador, uma das razões que as mulheres têm se destacado nesta área cada vez mais. Administradores são treinados para lidar com 50 variáveis ao mesmo tempo, e não somente duas ou três como juros e câmbio, inflação e emprego. O mundo do administrador é muito mais complexo que o do economista. Lidar com 50 variáveis ao mesmo tempo é a seara da Administração e não se aprende isso somente em quatro anos de teoria.
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Administrar é Ter Que Lidar Com Problemas Brochantes Ninguém quer tirar o lixo e lavar a louça
Nossa educação, cultura, nossos poetas, historiadores e escritores escrevem milhares de textos contando os efeitos e as glórias daqueles que resolveram as grandes questões da humanidade. Aqueles que lidam com as grandes perguntas da ciência, da filosofia, da política, que vou chamar de Perguntas Edificantes. Perguntas que uma vez respondidas nos permitiram o uso da luz, do rádio, do voo à lua, da internet, da eliminação da pobreza, da melhor distribuição da renda. Estes são os heróis das novas gerações. Responder as Perguntas Edificantes dá fama e prestígio. Devido a este viés infeliz da nossa cultura, somente assim você irá se tornar herói, merecedor de um Prêmio Nobel, de uma entre45
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vista em jornal, de pertencer a uma academia exclusiva de notáveis. Não é por acaso que todo jovem quer se tornar engenheiro, cientista político, sociólogo, jornalista, juiz, economista, e dedicar a sua vida para resolver estes problemas edificantes de justiça, ciência, economia e bem-estar social. Mas o mundo moderno não é mais o mundo simples de Platão, Aristóteles, Durkheim, Kelsen e Karl Marx. Hoje, nosso problema não é mais descobrir coisas novas, mas manter as velhas funcionando. Tanto é que o edifício de nossos Edificadores está ruindo. E você sabe disto. Nosso edifício de justiça, democracia, educação e economia, está ruindo rapidamente. O povo está cada vez mais descrente de nossos cientistas, sociólogos, intelectuais, e veem que o mundo melhor que prometeram está gerando aquecimento global, crises financeiras em todos os países ditos desenvolvidos, justamente os já edificados. Por quê? Muito simples, e é assustador que a maioria assustada nunca leia algo como o que mostrarei em seguida. Existe outro tipo de problema no mundo. Os Problemas Brochantes. Os Problemas Brochantes são aqueles que nos levam para trás, e não para frente. São problemas que deveríamos colocar como prioridade, mas não o fazemos. Ainda aplaudimos os que nos prometem ir para frente, ignorando que estamos indo para trás.
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Obviamente, ninguém quer lidar com os Problemas Brochantes que cada sociedade gera. Não dá Ibope. Não ganha eleição. Ninguém quer lidar com problemas como falha de qualidade, atraso, descumprimento do planejado, roubos de produtos feitos, desvios de recursos distribuídos, intrigas entre colaboradores, falta de dinheiro para implantar soluções edificantes, pagar os impostos atrasados, resolver estes gargalos de falta de quase tudo. Ninguém quer lidar com a manutenção do edifício, sua limpeza e contabilidade de custos. Ninguém quer lidar com problemas que estão nos levando para trás, todos obviamente querem lidar com problemas que nos levam para a frente. Mas precisamos destas profissões mais e mais. A medida que nos tornamos mais civilizados e edificados, precisamos mais e mais de profissões que mantêm as fronteiras do que aquelas que abrem novas fronteiras. Precisamos de profissões que sejam treinadas e estejam dispostas a lidar com nossos problemas brochantes com criatividade e sorriso no rosto. Todo mundo quer mudar o mundo, e não manter os edifícios já existentes que os edificantes do passado construíram. Pior, nunca valorizamos as profissões que lidam com os problemas brochantes da sociedade. Cite um auditor, contador, fiscal, engenheiro de manutenção, psicólogo, geriatra, administrador, que tenham sido premiados com um Prêmio Nobel. Cite um auditor, contador, fiscal, engenheiro de manutenção,
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psicólogo, geriatra, administrador, que tenham sido enaltecidos e elogiados por algum blog de renome. Cite um auditor, contador, fiscal, engenheiro de manutenção, psicólogo, geriatra, administrador, que você admira porque eles cuidam dos problemas brochantes da sociedade. Agora pergunte a um auditor, contador, fiscal, engenheiro de manutenção, psicólogo, geriatra, administrador, se eles estão felizes por serem ignorados pelos nossos poetas, historiadores e blogueiros. Pergunte a um auditor, contador, fiscal, engenheiro de manutenção, psicólogo, geriatra, administrador, se eles não gostariam de serem reconhecidos, validados e motivados de vez em quando. A todo auditor, contador, fiscal, engenheiro de manutenção, psicólogo, geriatra, administrador, o meu muito obrigado por resolverem os problemas brochantes que têm de ser feitos. Esta é uma missão edificante, podem crer.
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Administrar é Por em Ordem o Progresso Ordem e Progresso ou Progresso e Ordem, eis a questão.
Um dos modismos em administração de empresas na década de 80 foi a criação da “missão da empresa” e da “carta de princípios“, que você encontra incrustadas nas paredes da maioria das salas de recepção das grandes empresas. Algumas têm cinco pontos básicos, outras chegam a ter doze ou mais. A “missão” mais antiga que eu conheço tem 1.000 anos e pertence a uma entidade beneficente, a Ordem dos Cavaleiros da Cruz de Malta, “Obsequium Pauperum“, servir aos pobres, uma missão que se mantém até hoje. O Brasil é um dos poucos países do mundo que possui uma “carta de princípios“, nisto somos administrativamente inovadores. Nossa carta de princípios reza “Ordem e Progresso“, nesta ordem, o lema positivista de Auguste Comte gravado em nossa bandeira. 49
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“Ordem é a precondição para todo progresso“. “Ordem por base, progresso por fim”, diz Comte em seu “Cours de Philosophie Positive“.
Boa parte das políticas econômicas de Getúlio Vargas, fã de Augusto Comte, dos Governos Militares, seguiram o lema positivista de manter a casa em ordem, sem inflação, por exemplo, como precondição para o progresso. Temos uma Constituição de mais de 300 parágrafos que põe “ordem” em tudo, ou em quase tudo. Para abrir uma empresa no Brasil são necessárias dezenas de autorizações prévias para podermos começar tudo em “ordem”. O governo Fernando Henrique Cardoso e o Ministro Pedro Malan seguiram mais ou menos o mesmo princípio. Colocando a casa em ordem, o progresso viria automaticamente. Nosso lema deixa bem claro que “ordem” vem em primeiro lugar, sem “ordem” não há progresso. Ricardo Semler, um dos primeiros a escrever um livro de administração no Brasil que se tornou best-seller popular, Viran rand do aP Pró rópria pria M Mesa esa, mostra uma interessante inconsistência. “Ordem e progresso são incompatíveis“, argumenta Semler. Progresso, por definição, é desordem.
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Criatividade é bagunça e confusão. Basta observar a mesa de um cientista, injustamente chamado de louco por suas atitudes desordeiras. “Ou se escolhe ordem ou se escolhe progresso”, diz Semler. Sem dúvida é bem engraçado, mas a realidade é um pouco diferente. Felizmente não precisamos escolher entre a ordem e o progresso. Graças ao administrador, poderemos ter ambos. Segue a linha de Semler, mas é um pouco diferente. Nossa bandeira deveria conter a frase invertida: “Progresso e Ordem”. No sentido Progresso e depois Ordem. Depois da bagunça da criação, é necessário ter uma fase mais calma de consolidação. Todos os cientistas sabem disso. De tempos em tempos, até eles criam vergonha e arrumam o laboratório. Vocês mães já deram um basta nos seus filhos, ou arruma este quarto ou não sai no sábado. Progresso prim primei eiro ro,, ord ordem em depois faz mais sentido do ponto de vista operacional. Quem coloca a sociedade em ordem não são os economistas, os sociológos, os intelectuais, como nos querem fazer acreditar. Quem coloca ordem na bagunça são os administra dministrad dores ores, advogad gados, os, con conta tad dores, jornalistas, historia historiad dores e prof professores. essores. São eles que ajudam a consolidar os “progressos progressos” feitos pelos cientistas, empreendedores, criadores, engenheiros, sedimentando-os em leis, sistemas, procedimentos e lições para que o restante da sociedade possa imitá-los.
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Nossa missão neste caso é dupla. Ajudar aqueles que são progressistas a colocar suas ideias em prática, e depois colocar tudo em ordem e divulgar as inovações replicando-as em novas filiais ou empresas. Até os progressistas mais revolucionários precisam, periodicamente, de um governo mais conservador, para que as mudanças se tornem consagradas, sedimentadas e difundidas. Sem dúvida, quem gera o progresso são os criadores, os inovadores, as pequenas empresas e os pequenos empresários, os artistas que quebram paradigmas, os que destroem a “ordem” e a visão reinante, os que se arriscam e mostram o exemplo. A desordem dessa fase precisa de uma pausa para respirar e de membros da sociedade preocupados em consolidar as conquistas geradas. Nosso erro fundamental, portanto, foi inverter o processo. A ordem sucede ao progresso. Esta é a nossa missão.
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Administrando Pessoas Estranhas Administrar filhos e parentes é muito mais fácil
Observando o crescimento da renda no mundo, vemos um enorme ponto de inflexão em 1910, quando o crescimento se torna explosivo. A riqueza crescia lentamente desde 1980 com a industrialização, mas subitamente dá um salto quântico, que começa a resolver definitivamente o problema da pobreza no mundo. Veja o Gráfico abaixo, que mostra o tamanho médio de uma empresa metalúrgica, uma das poucas que temos dados de mais de 500 anos. Elaborei-a com os poucos dados que temos, portanto ela é bem imprecisa mas erros para mais ou para menos de 20% não afetam a conclusão.
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Agora, compare com o crescimento da Renda do Mundo no mesmo perĂodo.
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Em 2020, a renda média do mundo está estimada em US$ 20.000, por ano. Contra US$ 400, em 1800. O livro A Ri Riq queza das Nações ções, que propunha a divisão do trabalho, não surtiu o aumento de riqueza proposto. Ficamos com crescimento lento por mais 200 anos, embora melhor do que zero. Faltou algo muito importante, que Adam Smith não percebeu. As empresas da época de Adam Smith eram quase todas familiares. A divisão do trabalho era sempre entre irmãos, vizinhos ou gente do bairro. Predominava a Teoria da Gestão e seus “ca carg rgos os de confia confian nça ça”, que prevalecem até hoje na Gestão Governamental e Familiar. Só se encontrava gente de confiança entre familiares, e mesmo assim olhe lá para os genros, e as empresas familiares se mantiveram “médias e pequenas”. Colocar uma pessoa estranha para cuidar de uma parte vital da empresa, nem pensar. Com o surgimento da Administração Profissional, que começou em 1911, as empresas explodiram de tamanho. Correlação quase perfeita com o crescimento do PIB. Em vez de dar ordens e mandar em trabalhador por trabalhador, criamos cargos e funções. E mais importante é que passamos a contratar não mais parentes e amigos e sim pessoas “estranhas”, mas capazes de tocar independentemente aquela função. Funções não são mais dadas a familiares ou membros do mesmo partido político, mas para gerentes previamente treinados que não se conhecem, estranhos entre si.
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Isto permi permiti tiu, u, pe pela la prim primei eira ra vez na história, que em empresas presas com 10.000 fun funci cioná onári rios, os, com mais de 400 geren erentes tes e administra dministrad dores tra trabalha balharem rem em ha harm rmonia onia aapesa pesarr d dee nã não o se conh conhecerem ecerem. Administrar pessoas estranhas entre si se tornou uma ciência a parte, e ocupa uma parcela considerável da ciência da Administração, Recursos Humanos, Psicologia Industrial, Motivação, Liderança, Organização, Incentivos e Remuneração do Trabalho. É esta mudança de paradigma que permitiu economias de escala. Empresas puderam criar subsidiárias em outros países, sem ter que deslocar expatriados para comandar estas filiais, podendo contratar administradores locais, e expandir as tecnologias desenvolvidas na matriz. Não foi a “divisão do trabalho” de Adam Smith que revolucionou o mundo, foram as economias de escala quando descobrimos como pessoas estranhas entre si poderiam trabalhar com objetivos comuns e em harmonia. Nenhu enhuma ma tecn ecnoologia cria criada da no Br Brasil asil é adot otaada no rest stoo do mundo, po porrqu quee a maio maioria ria das nossas emp emprresas contin ntinua uam m familia miliarres qu quee dependem de cargos de confia fian nça, o qu quee imped impedee a expa pans nsãão pa parra outr outroos país paísees. Veja abaixo o estrago feito pela Lei do Economista 7988 de 1945, que determinou o fechamento de todas as Faculdades de Administração deste país, que durou 50 anos. A função do administrador é justamente esta. Permitir pessoas estranhas entre si trabalhar harmoniosamente, sem suspeitas, sem dossiês, sem arapongas, sem as intrigas familiares que sabemos existir em muitas pequenas empresas. A sua função, futuro administrador, é criar uma empresa onde pessoas estranhas possam produzir em harmonia, fiéis aos clientes
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e aos fornecedores e que saibam colocar de lado as suas diferenças em prol do bem comum. Por nã nãoo term ermoos da daddo a devida at aten ençção pa parra a Ciên Ciência cia da Administr traação, nã nãoo in inccluím uímoos pe pesssoas estr straanhas nhas,, ma mantivem ntivemoos a exclus usãão social, qu quee outr outroos país paísees aba aban ndona narram.
O gráfico acima mostra claramente o atraso da América Latina, fruto da Lei do Economista, 7988/45 que determinou o fechamento em 1946 de todas as Faculdades de Administração deste país, proibindo assim a formação de futuros professores de administração, pesquisas em administração, que comprometem o nosso ensino de Administração até hoje. Portanto, esta talvez seja a nossa maior missão. Ajudar pessoas estranhas entre si, trabalharem conjuntamente
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para um objetivo comum, em harmonia, com valores comuns compartilhados, semeando assim o respeito mútuo, paz no mundo e o aumento da produção.
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Administrando Pessoas Muito Estranhas E bota estranhas nisso.
Como vimos no capítulo anterior, uma das difíceis tarefas da Administração é criar um ambiente de trabalho onde pessoas de culturas diferentes, personalidades diferentes, níveis educacionais diferentes, irão trabalhar em relativa harmonia. Mas o problema hoje é ainda mais complicado do que isto. Eu tenho uma casa num condomínio perto da praia que tem um acesso exclusivo, um direito de passagem ao mar. Para que banhistas estranhos ao condomínio não entrem pela porta estreita, colocamos um aviso. “Proibido a Entrada de Pessoas Estranhas.”
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Meus dois filhos pequenos rolaram de rir quando viram aquele cartaz. “Quer dizer que o Paulinho (filho do vizinho) nunca mais poderá entrar?” Para eles, estranho era sinônimo de esquisito e não de pessoas desconhecidas. Hoje, fora das Empresas Familiares e Governos, cargos administrativos não são mais dados a familiares ou membros do mesmo partido, mas a gerentes treinados em administração, que nem se conhecem, estranhos entre si. Mas Administração vai muito além disto. Quanto se contrata 10.000 funcionários, não somente eles são desconhecidos entre si, mas entre eles há muitas pessoas estranhas, muito estranhas. No sentido que os meus filhos usaram. Usando a famosa curva normal, provavelmente temos numa destas empresas 400 pessoas muito, mais muito estranhas mesmo, que dificilmente seriam contratadas em empresas com Gestão familiar. São os Nerds, os Gênios, os perfeccionistas, e assim por diante. Não conheço nenhum escritório de Advocacia, Medicina ou
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Engenharia que já tenha contratado pessoas com tatuagem na testa, gravata cor de rosa, um ex-presidiário, por exemplo, algo muito comum em empresas com mais de 10.000 funcionários. As grandes empresas, por sua vez, têm Nerds no departamento de TI que poderiam encher um hospício, com todo respeito. Eles podem ser pessoas que jamais seriam contratadas como vendedores ou advogados, mas numa empresa moderna eles se encaixam sem muitos problemas. Seus departamentos de RH sabem que não existe este homem perfeito que os filósofos almejam. Muito do fracasso do socialismo reside no fato deles gastarem fortunas com cursos de ética, consciência social, teoria política, cidadania, no afã de criar toda uma população ética e perfeita, para assim poder eliminar a corrupção, a preguiça, etc. Administra dministrad dores acei ceitam tam as pessoas com como o elas sã são o, sa sabem bemos os que nã não o se muda uma pessoa com teorias, ensin ensino o de ci cida dadania dania ou doutrina outrinaçã ção o. O que podemos fazer é incentivar o que a pessoa tem de diferente e de bom num clima de harmonia. Criamos centenas de eventos corporativos para que todos possam se conhecer, e centenas de cursos de treinamento onde as qualidades possam ser aprimoradas e não os defeitos. Temos psicólogos nos nossos departamentos de RH que sabem os defeitos e as idiossincrasias de cada funcionário, os acompanhamos psicologicamente, e nunca despedimos os mais estranhos. Sempre damos uma segunda chance, mudamos o funcionário de departamento ou mudamos de função. Quem é o psicólogo que cuida de você na Universidade Pública? Isto mesmo, quem o Diretor da Faculdade, na aula de introdução ao curso, indicou como Terapeuta da Faculdade para que
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vocês pudessem discutir os N problemas que o ensino traz para um jovem moderno? Justamente numa fase da vida que você mais precisa? Quem numa Universidade Pública está encarregado de zelar pela sua carreira? Quem numa Universidade Pública encontra com você de tempos em tempos para avaliar como está seu desempenho, e que falhas precisam ser corrigidas? Obviamente elas não são administradas dentro dos preceitos da Ciência da Administração. Os últimos quatro Ministros de Educação do Brasil eram Economistas, isto mesmo, sem nenhum conhecimento de Pedagogia nem Administração. E ninguém entrou em greve por isto, a UNE nunca abriu a boca, os DCEs e Centro Acadêmicos idem. Faculdades no Brasil não são administradas por administradores, e sim por professores, sociólogos e cientistas políticos, que ainda acham que todo mundo pode se tornar perfeito. Administradores trabalham com o que se tem, não com uma utopia teórica inatingível. Portanto, vocês estudantes de Administração, lembrem-se que as pessoas muito estranhas deste país dependem de você. Vocês têm uma bela missão a cumprir.
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Administrando Com Desconfiança Ninguém é santo neste mundo
Infelizmente, por falta de uma cultura Administrativa, o Brasil nunca desenvolveu a meritocracia, que é um sistema de seleção e promoção das pessoas mais capazes e treinadas para as funções de comando que irão exercer na comunidade. Impera no Brasil o Nepotismo, o Paternalismo, o Favoritismo, em todas as esferas. Nas Universidades Públicas, onde deveria prevalecer o Concurso Público, é incrível o número de filhos de professores que também são professores públicos. Sem falar nas “Indicações”, onde os Gestores com um gesto de seu indicador apontam o amigo que irá ocupar um cargo importante, no governo ou nas empresas não meritocráticas. Em vez de Meritocracia, usamos um termo que é Cargo de Confiança. 63
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Isto ocorre a cada quatro anos, amplamente divulgado pelos jornais, quando presidentes e governadores precisam preencher centenas de “cargos de confiança” que compõem um governo. O número exato de cargos varia de Estado para Estado. Para o governo federal eu já ouvi estimativas que variavam de 2.000 a 20.000 cargos a ser preenchidos. O problema é que a maioria dos políticos não conhece um número suficiente de pessoas em quem realmente possa confiar. Por isso, as primeiras pessoas convidadas são normalmente amigos e parentes de irrestrita confiança. Mas logo o desespero é tal que até genros, normalmente vistos com certa suspeita na escala familiar, são convidados para participar da equipe de governo. Não vou citar nomes, mas vocês saberão de alguns. Não que amigos e parentes não possam ser pessoas competentes, mas a base de escolha é muito pequena para que a média seja qualificada. Imaginem criar uma seleção nacional de futebol dessa maneira, entre amigos e parentes. Você apostaria no seu sucesso? O mesmo ocorre com nossas equipes de governo. Você apostaria no sucesso de um governo assim constituído? Mas o número é limitado, e eu sei e você sabe que o governo acaba sendo lotado por pessoas de confiança de amigos, pessoas até desconhecidas do Presidente da República, o indicador-mor do Brasil. A primeira decepção de cada novo governo e a primeira crítica que a imprensa lhe faz ocorrem por ocasião do anúncio da equipe e dos parentes contratados. O pior é que a imprensa até insinua em alguns relatos, que par-
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entes foram contratados para que todos se tornem ricos, o que pelos salários atuais do setor público é praticamente impossível. Não, não é a ganância e vontade de ficar rico às nossas custas. Isto existe também sem dúvida, mas o grande problema é este meme que se infiltrou na cultura do Brasil que precisamos de fato ter cargos de confiança. Você, honestamente, vê outra alternativa? Pois há, é uma das missões do Administrador. O erro que a maioria dos políticos eleitos comete é desconhecer uma das leis básicas da administração: Tod odo o ca carg rgo o, se seja ja pú púb bli lico co,, se seja ja pri priva vad do, é d dee to total tal e iirrestri rrestrita ta desconfian esconfiança. ça.
Infelizmente todo colaborador, por mais amigo que seja, precisa ser tratado com certa dose de desconfiança. Os maiores desfalques em empresas familiares são cometidos por parentes, onde não escapam nem filhos, muito menos genros. Bons amigos então, nem se fala. De onde surgiu este mito de que amigo do peito e parente não roubam? Essa prática não é exclusiva de nossos políticos. A maioria de nossas empresas contrata diretores da mesma maneira, tanto que são chamadas de empresas “familiares”.
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A saída para esse dilema é outra. Em vez de contratar um amigo do peito, selecione o melhor e mais qualificado profissional possível para o cargo, independente de conhecê-lo ou não. Em seguida, cerque o contratado de controles gerenciais, fiscalização interna, auditoria externa, o que for necessário para manter o pessoal na linha. As multinacionais não trazem mais um presidente de confiança do exterior como faziam antigamente. Contratam brasileiros, sejam eles amigos dos acionistas ou não. Dois brasileiros, Alain Belda Fernandez e Henrique de Campos Meirelles, foram presidentes da matriz americana das multinacionais em que trabalhavam, o equivalente a contratar um americano para cuidar de nossa dívida interna. Infelizmente no Brasil, o melhor administrador financeiro do país tem poucas chances de ser Ministro da Fazenda, se já não for amigo do presidente bem antes de sua eleição. Carg rgo od dee confian confiança ça é sim simp plesm esmen ente te um con concei ceito to ana anacrôni crônico co,, al alggo d do o passa passad do pré-g pré-geren erencial, cial, da era d do o Gestor Gestor.. Num m mun und do com compe peti titi tiv vo, tod todos os os ca carg rgos, os, in inccluin uind do os d do o govern verno o, precisam ser d dee to total tal e iirrestri rrestrita ta com compe petên tência, cia, e nã não od dee confian confiança. ça. A rigor, num mundo globalizado, onde temos de dominar alguns segmentos da economia mundial, deveríamos estar contratando os melhores do mundo. Pelo menos algum dia vamos começar timidamente contratando os melhores brasileiros desde o início. PS – Se você, amigo ou parente de político, for convidado para um cargo de confiança nos próximos três meses sem ter pelo
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menos vinte anos de experiência na área, a nação encarecidamente implora: recuse delicadamente. Publicado na Revista Veja, Editora Abril, na edição 1560, nº 33, de 19 de agosto de 1998, página 22
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Administrar é Saber Delegar - II E ficar observando
Administração é possivelmente a única profissão onde o sonho é não ter poder. Administração é possivelmente a única profissão onde o sonho é delegar o poder de mando para outros. Administração é possivelmente a única profissão onde o sonho é não fazer nada, e não fazer tudo, centralizar tudo, mandar em tudo. Nosso sonho é perder poder, e saber delegar. Vocês já viram charges com um/a executivo/a reclinado na cadeira com os pés na mesa?
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Nenhuma outra profissão ousaria ser pego numa posição destas, seria considerado motivo para demissão na certa. Para o administrador e administradora isto é um momento de orgulho, de sucesso profissional. As coisas estão funcionando sem papai e mamãe tendo de controlar a rapaziada. Sucesso para um bom administrador é quando delegamos tudo, quando a empresa anda sozinha, quando não precisa mais da gente, quando nos tornamos dispensáveis. Compare essa atitude com a conhecida atitude de Fidel Castro, Hugo Chávez, Stalin onde o objetivo era controlar tudo. Administrar é conseguir criar um sistema autossustentável onde pessoas estranhas e desconhecidas conseguem trabalhar juntas em relativa harmonia, sem supervisão. Por isto delegamos. Por isto, você não encontra Ditador administrador, administrador centralizador de tudo, administrador que quer assinar tudo que precisa ser assinado numa empresa. Queremos uma empresa que mais dia menos dia não mais precisará de nós, por isto precisamos delegar e criar organizações autossustentáveis. Claro que nem sempre isto ocorre, sempre surgem imprevistos. Por isso, nossos pés não ficam muito tempo em cima da mesa,
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mas mostra uma atitude profissional de dar poder aos outros, e não acumular poder para si. Para mim é tão óbvio que uma sociedade livre só é possível em organizações descentralizadas onde todos participam das decisões. Por que então a nossa sociedade brasileira exclui a visão do administrador/a como faz há mais de 60 anos? Sua missão é mostrar o erro da sociedade, dos formadores de opinião, dos intelectuais, e mostrar que o administrador não será uma ameaça aos status quo deles, mas um complemento que deveria ser bem-vindo e não atacado.
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Será que o problema é este mesmo?
Um dos maiores choques de minha vida foi na noite anterior ao meu primeiro dia de pós-graduação em administração. Havia sido um dos quatro brasileiros escolhidos naquele ano, e todos nós acreditávamos, ingenuamente, que o difícil fora ter entrado em Harvard, e que o mestrado em si seria sopa. Ledo engano. Tínhamos de resolver naquela noite três estudos de caso de oitenta páginas cada um. O estudo de caso era uma novidade para mim.
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Lá não há aulas de inauguração, na qual o professor diz quem ele é e o que ensinará durante o ano, matando assim o primeiro dia de aula. Essas informações podem ser dadas antes. Aliás, a carta em que me avisaram que fora aceito como aluno veio acompanhada de dois livros para ser lidos antes do início das aulas. O primeiro caso a ser resolvido naquela noite era de marketing, em que a empresa gastava boas somas em propaganda, mas as vendas caíam ano após ano. Havia comentários detalhados de cada diretor da companhia, um culpando o outro, e o caso terminava com uma análise do presidente sobre a situação. O caso terminava ali, e ponto final. Foi quando percebi que estava faltando algo. Algo que nunca tinha me ocorrido nos dezoito anos de estudos no Brasil. Não havia nenhuma pergunta do professor a responder.
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O que nós teríamos de fazer com aquele amontoado de palavras? Eu, como meus outros colegas brasileiros, esperava perguntas do tipo “Deve o presidente mudar de agência de propaganda ou demitir seu diretor de marketing?” Afinal, estávamos todos acostumados com testes de vestibular e perguntas do tipo “Quem descobriu o Brasil?”. Harvard queria justamente o contrário. Queria que nós descobríssemos as perguntas que precisam ser respondidas ao longo da vida. Uma reviravolta e tanto. Eu estava acostumado a professores que insistiam em que decorássemos as perguntas que provavelmente iriam cair no vestibular. Adorei esse novo método de ensino, e quando voltei para dar aulas na Universidade de São Paulo, trinta anos atrás, acabei implantando o método de estudo de casos em minhas aulas. Para minha surpresa, a reação da classe foi a pior possível. “Professor, qual é a pergunta?”, perguntavam-me. E, quando eu respondia que essa era justamente a primeira pergunta a que teriam de responder, a revolta era geral: “Como vamos resolver uma questão que não foi sequer formulada?”. Tem emos os um ensin ensino o no Brasil volta tad do pa para ra pergun perguntas tas pron prontas tas e defini efinidas, das, por uma razã razão o mui uito to sim simp ples: é mais fá fácil cil pa para ra o al alun uno oe também pa para ra o prof professor essor.. O prof professor essor é visto com como o um sá sábi bio o, um in inte tellec ectual, tual, al alguém guém que tem so solluçã ução o pa para ra tud tudo o. E com o tem tempo po os al alun unos os aacredi creditam. tam. E os alunos, por comodismo, querem ter as perguntas feitas, como no vestibular. Nossos alunos estão sendo levados a uma falsa consciência, o
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mito de que todas as questões do mundo já foram formuladas e solucionadas. O objetivo das aulas passa a ser apresentá-las, e a obrigação dos alunos é repeti-las na prova final. Em seu primeiro dia de trabalho você vai descobrir que seu patrão não lhe perguntará quem descobriu o Brasil e não lhe pagará um salário por isso no fim do mês. Nem vai lhe pedir para resolver “4/2 = ?”. Em toda a minha vida profissional nunca encontrei um quadrado perfeito, muito menos uma divisão perfeita, os números da vida sempre terminam com longas casas decimais. Seu patrão vai querer saber de você quais são os problemas que precisam ser resolvidos em sua área. Bons administradores são aqueles que fazem as melhores perguntas, e não os que repetem suas melhores aulas. Uma famosa professora de filosofia me disse recentemente que não existem mais perguntas a ser feitas, depois de Aristóteles e Platão. Talvez por isso não encontramos solução para os inúmeros problemas brasileiros de hoje. O maior erro que se pode cometer na vida é procurar soluções certas para os problemas errados. Em minha experiência e na da maioria das pessoas que trabalham no dia-a-dia, uma vez definido qual é o verdadeiro problema, o que não é fácil, a solução não demora muito a ser encontrada. Se você pretende ser útil na vida, aprenda a fazer boas perguntas mais do que sair arrogantemente ditando respostas. Se você ainda é um estudante, lembre-se de que não são as respostas que são importantes na vida, são as perguntas.
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Se você é um engenheiro, advogado, economista, enfim, faça um MBA, vai enriquecer a sua forma de pensar. Editora Abril, Revista Veja, edição 1898, ano 38, nº 13, 30 de março de 2005, página 18
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Administrar é Ser Ágil na Ação e Decisão Não são os mais fortes que vencem, são os mais ágeis
Um dos grandes erros de alguns intelectuais no Brasil, foi disseminar entre a nova geração que capitalismo é a sobrevivência dos mais fortes. Essa é uma das razões porque a esquerda sempre atacou as empresas e seus administradores, achando que elas eram grandes devido ao seu poder monopolista ou oligopolista de extrair mais valia dos trabalhadores e da população. Administradores foram assim sistematicamente discriminados por professores e intelectuais, vilipendiados e até atacados por mais de 50 anos devido a este errôneo conceito da sobrevivência do mais forte, termo incorreto cunhado por Herbert Spengler, que não entendeu Darwin. Getúlio Vargas extinguiu as escolas de administração em 1946, com a lei 7988/45. 76
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Se fosse a sobrevivência dos mais fortes, os dinossauros estariam povoando o mundo até hoje. A sobrevivência não é do mais fortes, mas sim dos mais ágeis, aqueles que puderam se adaptar aos novos tempos. Isso nada tem a ver com força, pelo contrário. Apesar dos dinossauros serem supremos, não conseguiram se adaptar ao novo ambiente após a queda de um asteroide. Somos todos descendentes do camundongo, que de forte não tem absolutamente nada. O segredo da sobrevivência humana é a sua adaptabilidade, sua agilidade em se adaptar às mudanças que ocorrem. Infelizmente, a maioria dos professores nos ensina a ser precisos, acertar as respostas até a terceira casa decimal, a sermos absolutamente certos e não necessariamente ágeis. Como tornar um país ágil, que não vive acumulando problemas? O sucesso das nações depende da rapidez com que ela abandona ideias que funcionaram no passado, mas que agora precisam ser substituídas porque os tempos mudaram. Esse é também o grande erro da direita, achar que as ideias antigas precisam ser “conservadas”, outra ideologia que nunca aceitou a figura do administrador profissional. O mundo mudou, mas infelizmente ambas as ideologias de direita e de esquerda estão lerdas, lentas e inadequadas. Veja a lentidão da máquina do Estado e das empresas familiares. Minha insistência em valorizar a classe política dos administradores não é porque estes possuem boas ideias, mas porque administradores bem treinados são os únicos capazes de implantar as ideias dos outros na velocidade que precisamos. Por isso, empresas administradas por administradores profis-
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sionais são mais ágeis do que repartições públicas, empresas Estatais e empresas familiares. A função do administrador é justamente agilizar as decisões de todos os envolvidos na empresa. É criar sistemas onde os problemas são rapidamente identificados, diagnosticados, soluções alternativas encontradas, avaliadas, implantadas, reavaliadas e corrigidas, tudo isto rapidamente. A primordial função do administrador seja público ou privado é não permitir que problemas se acumulem e decisões sejam efetivamente tomadas. Esta é uma das nossas missões.
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Criando Laços de Confiança Como confiar em você ?
O Brasil está num estágio acelerado de desagregação social. Aumento da criminalidade, corrupção, assaltos, consumo de drogas, desquites, filhos sem um pai ou mãe presentes, queda na confiança de nossas instituições, especialmente de nossos políticos, pessimismo com relação ao futuro do país e da própria democracia. Clubes Esportivos lutam para manter seus associados, funcionários lutam para manter os seus empregos, famílias lutam para se manter unidas. Observando as manchetes dos últimos quatro anos, constatamos que quase 70% delas são no fundo a mesmíssima notícia. Numa leitura, obviamente mais ampla, todas noticiam Desagregação Social. Vejamos: Fuga para Dólar, CPI no Congresso, Greve da Polícia,
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Saques a Supermercados, Desquite da Prefeita, Confiança no Governo em Baixa, Candidato romperá com FMI. Esta desagregação social é fenômeno mundial, e não é de hoje. É fruto da destruição dos pequenos vilarejos onde existia calor humano. A urbanização fria e solitária e a televisão eliminaram a conversa familiar em volta da mesa, a transmissão de valores comunitários. Desde Getúlio, nossos governos deixaram de se preocupar com o fortalecimento de laços de confiança entre indivíduos, e se preocuparam em aumentar os laços com o indivíduo. Criaram a dependência perante o Estado, e não a interdependência da comunidade. Quem escolhe seu médico é o Ministro da Saúde, o professor do seu filho é o Ministro da Educação, o gestor do seu fundo de aposentadoria é o Ministro da Previdência. Quando se perde a confiança no Estado, como agora, perde-se confiança em tudo. Alguns acreditam que isto é a salvação, outros percebem que justamente estas funções do Estado inibem a criação de laços entre pais e filhos, médicos e clientes, professor e família, e assim por diante. Para piorar nosso tecido social, o Brasil teve sete desastrosos planos econômicos, que com exceção do Real, destruíram laços de confiança construídos lentamente ao longo dos anos entre inquilinos e senhorios, funcionários e patrões, clientes e fornecedores, credores e devedores, e no Plano Zélia Cardoso de Melo, todos contra todos. O resultado está aí. Numa pesquisa mundial, 50% dos americanos, 30% dos mexi-
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canos e 60% dos guatemaltecos afirmam que “confiam na maioria das pessoas”. O Brasil tem o mais baixo índice do mundo, somente 2% dos brasileiros confia na maioria das pessoas. Em 1995, nosso índice era um pouco maior, 10%, mas com FHC e seu governo Social-Democrata este índice despencou para 2%, e com tendência de queda. O Brasil é o retrato de Hobbes, homem contra homem necessitando urgentemente de um Estado que no mínimo ofereça proteção, justiça e polícia. Estreitar novamente os laços de confiança dos brasileiros é a tarefa número um, pois estamos a rigor a um passo da guerra civil, de todos suspeitando de todos. Na minha opinião, a verdadeira função do Estado deveria ser a de promover a cooperação entre os cidadãos. Em vez de leis que protejam o trabalhador, leis que permitam trabalhadores negociar em igualdade com seus patrões. Fiscalizar entidades beneficentes para assegurar que os nossos donativos são destinados para os caminhos prometidos, em vez de criar Ongs próprias como Comunidade Solidária. Supervisionar as empresas em Bolsa, em vez de usar a Bolsa para financiar estatais. Aqui apresento exemplos rápidos deste novo Estado, que não temos ainda: Milhares de brasileiros têm se engajado em restaurar os laços de amizade novamente entre brasileiros, destruídos ao longo destes anos pelo Estado. Estão se engajando em trabalho voluntário, incentivando a Responsabilidade Social das Empresas diante da falência da Responsabilidade Social do Estado.
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Estão pregando a solidariedade entre indivíduos em vez dos Socialismo Estatal entre estado e contribuinte. Mas temos ainda muito por fazer. Transformar nossos 2% em 100%, significa crescer nada menos do que 50 vezes, transformar o Brasil num país onde todos confiem na maioria das pessoas. Esta é a missão filosófica do Administrador. Criar laços de confiança entre milhares de pessoas estranhas, para que possam cooperar entre si em prol de um objetivo comum, seja um produto, uma ONG, um hospital, um clube esportivo. Administradores são os agregadores da sociedade, que lutam contra tantos membros da sociedade cujo objetivo é desagregar, conspirar, destruir a sociedade que temos.
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A Função Mais Difícil do Administrador Tem muitos não querem um Brasil bem administrado
Administradores e Engenheiros criam sistemas, procedimentos, regras, normas e rotinas para serem obedecidas. Esta obediência permite empresas atuarem em mais de um local, em mais de uma cidade e até em mais de um país. Basta replicar o sistema que deu certo na fábrica original. São estas regras e normas que dão escala, segurança, qualidade e tranquilidade para os funcionários e clientes. Empresas onde não há normas, não há procedimentos estudados, como em artesanato por exemplo, a produção é baixa e irregular. Embora seja o sonho de todos os intelectuais que aderem à chamada Economia Solidária, um dos grandes movimentos contra o administrador.
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Seu principal porta voz, professor de Economia Paul Singer, escreve: “Empresas solidárias não aceitam a mentira propagada por administradores de que meros trabalhadores não possam gerir empresas com eficiência.” É um movimento bem radical contra a missão do administrador, que para o professor Paul Singer é desnecessária, e que nós espalhamos mentiras por aí. Mas Paul Singer continua na sua propaganda de difamação da profissão de Administrador. “Administrar uma grande empresa no capitalismo está mais próximo da condução de uma guerra do que da solução de problemas ‘técnicos’.” Ele afirma, que somos violentos, que usamos a mesma violência utilizada em guerras, e assim por diante. E ele é professor Titular da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo, e foi professor de alunos que se tornaram Ministros e Presidentes do BNDES. Administração tem sido, infelizmente, duramente combatida pelo Marxismo, definidos como Taylorismo, o engenheiro que criou a ergonomia. Uma das funções do Administrador é determinar quando mudar ou suspender temporariamente os sistemas, procedimentos, regras, normas e rotinas. Regras são úteis mas são sempre generalizações, que podem gerar enormes injustiças. Este é o grande problema do nosso funcionalismo público. Devido a Constituição de 1988, e da criação e atuação do Ministério Público, todo funcionário é obrigado a seguir as regras, leiase leis. 84
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Abrir exceções às regras, papel primordial do Administrador, vira um crime. Por isto nossos governos estão inoperantes, engessados e tremendamente injustos. A função do administrador público não deveria ser a de impor as leis e as regras, mas determinar com autoridade quando estas regras deveriam ser desobedecidas nos casos em que seriam injustas. Por isto o Administrador precisa de um comportamento ético, uma história pessoal de probidade e respeito, porque será aquele que irá determinar quando as leis não devem ser aplicadas. Uma responsabilidade bem superior a de um juiz. Por isto a escolha, treinamento, acompanhamento da classe de Administrador precisa ser criteriosamente conduzido pela própria sociedade. E não perseguido até o ponto de termos por 50 anos proibição de se ensinar Administração, para poder favorecer a profissão do economista.
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Se Karl Marx Tivesse Estudado Administração Não imaginou empresas geridas por administradores profissionais
O objetivo de uma empresa da era pré-industrial não era maximizar o lucro, mas sim o controle da empresa pela família. Este foi um dos graves erros de diagnóstico de Karl Marx e dos marxistas em geral. No início da industrialização, a maioria das empresas eram controladas pelos engenheiros que inventaram as milhares de máquinas que irão compor a revolução industrial. Trinta anos depois eram controladas por seus filhos, a maioria incompetentes que não conseguiam chegar aos pés de seus pais. Frederick Engels era um caso típico, filho problemático de um empresário de Manchester, onde era um Diretor Estatutário.
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Ermen e Engels era uma empresa tipicamente familiar. Possuía até o nome das famílias na razão social. Uma empresa familiar em vez de maximizar o lucro, premissa básica da maioria das teorias política e econômica, o objetivo primordial é outro. O objetivo é maximizar não o lucro, mas o controle da empresa dentro da família. Preferem ter 100% de um lucro menor, do que 49% de um lucro três vezes maior e perder o controle de mando. Preferem ser menores, com lucro total menor, mas com controle acionário dentro da família. Do que ter lucros maiores, mas deter somente 20% das ações da empresa, e aí não poder indicar seus filhos para os cargos de Diretoria, como fez o pai de Frederick Engels. Maximizar o lucro portanto, NÃO é o objetivo principal destas empresas, e sim ter a empresa sob controle total. É um detalhe que muda tudo na análise marxista. Karl Marx achava que era contra o capitalismo, mas se não fosse seu grande mentor Engels, ele deveria ter sido contra a empresa familiar. Os excessos, abusos que ele via, eram devidos a estrutura famil-
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iar das empresas, e não ao capitalismo em si, no uso de máquinas para aumentar a produtividade do ser humano. Eu sou contra a empresa familiar em geral, como forma de administrar empresas grandes, ou capitalistas. Se vocês entenderam este ponto, agora podem entender o caso especial de Ermen e Engels. Cada sócio já estava no seu limite de 50%. Abrir o capital em 5% para comprar novas máquinas estava fora de cogitação. O sócio de 5% poderia passar a mandar, porque seria ele que faria a diferença do controle. Então Ermen e Engels tinham que sempre comprar novas máquinas com recursos internos, somente com recursos gerados internamente. Neste sentido, a preocupação era vender com enormes margens de lucro, que é bem diferente de lucro máximo. Algo que pessoas, como Marx, sem formação em Contabilidade e Administração não iriam entender. Karl Marx disseminou a ideia de que o aumento de produtividade proporcionado pelos engenheiros capitalistas que investiram capital na construção das revolucionárias máquinas industriais, deveria pertencer aos trabalhadores e não aos engenheiros. A chamada “mais valia”, ou aumento de valor da produção. A lógica de Karl Marx era muito simples. Trabalhador: “Eu produzia um metro de tecido por dia, com o tear manual, usando minha força de trabalho.” Engenheiro: “Isto mesmo, por isto eu te pago 1 guine por dia de trabalho.” Trabalhador: “Só que eu estou produzindo cinco metros de tecido por dia, e quero ganhar cinco vezes mais, afinal ‘só o trabalho acrescenta valor’.”
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Engenheiro: “E eu acrescento nenhum valor, você mesmo já percebeu que teve que despender muito menos esforço com a máquina que levei 10 anos para construir, tem agora os vendedores para vender cinco vezes mais, os custos de transporte para vender em mercados mais distantes, o marketing e a propaganda, a contabilidade, o crédito, temos mais pessoas para remunerar que não o trabalhador de fábrica.” Trabalhador: “Mentira, segundo Marx existem somente duas classes na sociedade, engenheiros e trabalhadores de chão de fábrica, não existem contadores, operadores logísticos, administradores, agências de propaganda, banqueiros, impostores com impostos cada vez maiores.” Engenheiro: “Hoje de fato não, mas a medida que as empresas ficarem maiores, necessitando mais mão de obra, os salários irão aumentar e os preços que vendemos os tecidos irão despencar, bem como estas minhas elevadas margens de lucro.” E foi o que aconteceu. Os salários quintuplicaram, só Henry Ford dobrou uma vez os salários já em 1914. Os preços despencaram, o Iphone custava em 1972 US$ 300.000,00 e fazia um décimo dos cálculos. E as margens de lucro caíram de 50% para 5%, mas que cobrado sobre milhares de peças, ainda dava um bom lucro. Marx queria que os trabalhadores de chão de fábrica ganhassem os US$ 300.000,00 para produzir o IBM 1320, o primeiro computador que eu operei na vida. Se tivesse conseguido, estaríamos até hoje com computadores que custariam US$ 300.000,00. A “mais valia” ou aumento de produção de Karl Marx, não ficou totalmente para os engenheiros inventores das máquinas, mas foi dividida entre os trabalhadores. Nem tudo de fato, entre os engenheiros e todas as classes profissionais necessárias para criar empre-
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sas grandes e produtivas, e em enormes reduções de preços, que no final até Karl Marx percebeu o que estava ocorrendo. E nas diminuições de preço, os trabalhadores chão de fábrica ganharam mais uma vez comprando mais com o mesmíssimo salário, benefício compartilhado pelos engenheiros, mas estes eram em menor número. As grandes empresas de hoje operam com margens de lucro ínfimas, tipo 1% até 5%, o que deveria ser o objetivo de todo trabalhador. Isto significa que ele não está muito longe de comprar o fruto de seu trabalho, que é o que os marxistas querem, e Marx achava que seria impossível ocorrer. Pagar somente 1% a 5% pelos equipamentos que aumentem a sua produtividade, pelo risco de abrir uma empresa, pelo trabalho de inventar um novo produto, tipo Camisas Polo, com marca e tudo, não me parece um exagero pelo benefício da comunidade em receber um produto pronto. Lembre-se que os demais 99% e 95% são custos que teriam que ser incorridos seja no socialismo seja no comunismo, não há como escapar. Karl Marx não percebeu que o problema do capitalismo não é o lucro máximo, mas as margens de lucro máximas devido ao objetivo de Ermen e Engels em manter o controle na família, ou na solução preconizada por Marx do capital ser controlado por um único partido, o seu. O problema de ineficiência, preços elevados, margens colossais, como é na Petrobras e Eletrobras, continuaria, e pior, o Partido no poder lutaria para nunca perder uma eleição, como as empresas familiares nunca querem perder o controle da companhia. Karl Marx em vez de lutar pela Democratização e Pulverização
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do Capital, bandeira ideológica defendida pela Ciência da Administração e implantada pelos administradores de empresas de Capital Aberto e Democrático, foi na direção oposta. Karl Marx forneceu o arcabouço teórico para manter o Controle Único da empresa, não na mão de uma família, mas na mão de um único partido. O que é muito pior. Em ambos os casos, a preocupação do Partido é igual à da família pré-industrial, que é não perder o controle do capital e de lutar contra nós administradores que queremos democratizar as empresas familiares e estatais, dando a cada trabalhador acionista o direito de voto, mesmo que tenha uma única ação.
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Part II
Postura Ética
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O Atributo Mais Importante do Administrador: Sua Ética Prometo Respeitar A Ética do Adminstrador
A maioria das profissões acha que Ética é cumprir as leis, não fazer nada de “errado”, não mentir, não corromper funcionários públicos, o “do no evil” da Google. Por isto a maioria nem estuda Ética, sob este ângulo ela é considerada até meio óbvia. Infelizmente, Administração é uma das poucas profissões que ensina ética profissional para os seus alunos. Harvard Business School nos Estados Unidos e Tsinghua na China ensinam logo no primeiro ano. A prim primei eira ra coisa que ensinam ensinamos os em Administra dministraçã ção o é que Éti Ética ca é tud tudo o que deci ecidim dimos os nã não o fazer fazer,, apesa pesarr de ser corre correto to,, legal e permiti mitid do. 93
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Parece estranha esta definição, por isto vou simplesmente dar um exemplo concreto de como a nossa ética funciona na prática. Estamos na crise de 2008, que por pouco não contaminou o Brasil. Mas quase perdemos tudo devido a três empresas brasileiras: VCP, Sadia e Aracruz, que sozinhas criaram uma enorme crise cambial. Estas três em empresas presas fizeram opera perações ções especula especulati tivas vas com câmbi bio o, e no mei eio o da crise in interna ternaci cional onal perd perderam eram en entre tre 6 bilh bilhões ões a 12 bilh bilhões. ões. Em 200 20044 teria si sid do 50% das n nossas ossas reservas in interna ternaci cionais. onais. Seus diretores financeiros apostaram praticamente a totalidade do seu patrimônio, e se não fosse a ajuda da Perdigão e do governo teriam quebrado. Posteriormente, descobrimos que nenhum dos três diretores “financeiros” era formado em Administração, muito menos em Administração Financeira. O diretor financeiro da Sadia era formado em Econ Economia omia pela PUC Bahia. O diretor financeiro da Aracruz era formado em Econ Economia omia pela PUC RIO. O diretor financeiro da VCP era formado em Econ Economia omia pela PUC SP. (Algo inclusive que todos os colunistas econômicos do Brasil abafaram.) Os três economistas especularam com câmbio, para obter um lucro extra tra. Maximizaram o lucro como reza o discurso único desta ciência. Avalia valiaram ram os riscos den entro tro dos al alggori oritm tmos os de sua ci ciên ência, cia, ga garanran-
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A Missão do Administrador
tiram ao Conse onselh lho o de Administra dministraçã ção o que os cál cálcul culos os mostra ostravam vam baix baixo o risco risco,, e fforam oram em fren frente te.. Nós, Administradores Financeiros, jamais teríamos aceito um cargo de Economista Chefe, por exemplo, já que não fomos adequadamente treinados. Por que economistas não podem fazer o mesmo? Veremos no próximo capítulo. Mas mais importante ainda, teríamos dito aos nossos Conselhos de Administração que especular com o câmbio não é o nosso “core core busin business” ess”.. Queremos maximizar o lucro, mas dentro de limites, dentro de nossas competências e dentro de nossos planos operacionais. Especular com câmbio para ter um “lucrinho extra” é algo que não fazemos. Não faz parte do “core business” que era Frango ou Celulose. Éti Ética ca é sa saber ber o q que ue nã não o fazer fazer,, aapesa pesarr d dee ser llegal. egal. Na Sadia porém, o diretor financeiro não disse “Senhores, nosso core business é frango”. Nem na VCP e Aracruz disseram aos seus Conselhos “Nosso negócio é celulose e não especular com câmbio”. Todos os Administradores Financeiros nas demais empresas foram enfáticos nesta questão, e safaram as suas empresas, com poucas exceções. “Aqui fazemos hedg hedgee camb mbial, ial, mas se suas famílias querem especula pecularr com ccââmb mbio io, que o façam na pessoa física e não na nossa jurídica.” Foi o que salvou o Brasil e milhares de empresas brasileiras com profissionais de uma enorme crise, os erros ficaram basicamente restritos a três grandes empresas. Pena que nestes 50 anos de profissão não tenhamos mostrado como o administrador tem salvo este país de uma série de enrascadas. Como estou fazendo aqui.
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Pudera, sequer temos um American Management Association, criada nos Estados Unidos em 1918. Espero que você leitor, nos próximos 50 anos, seja mais ativo em mostrar a nossa contribuição.
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A Primeira Regra Ética a Seguir Nunca aceitar um cargo para o qual não esteja preparado
Um dos princípios éticos que seguimos é “nunca aceitar um cargo para o qual não estejamos plenamente preparados”. A ética do “aprender fazendo e errando” não faz parte do nosso ideário. Acreditamos em treinamento continuado e preparo responsável. Os erros podem afetar outros seres humanos, nossos colegas e subordinados. Infelizmente no Brasil, engenheiros, médicos e economistas brasileiros têm se tornado manchete de jornais por aceitar cargos para os quais nunca foram preparados. Antonio Palocci, médico que se tornou Ministro da Fazenda no Governo Lula, candidamente confessa: trabalhar no governo é uma “experiência única que dá enorme valor depois para a gente, no mercado privado“. E para exemplificar, Palocci cita em seguida vários professores 97
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acadêmicos que nunca trabalharam antes na vida quando foram para o governo, e não vou repetir estes nomes aqui. Estão no Google, e que de fato ficaram ricos com o “val valor or” criado com a experiência no governo. Só que fomos nós contribuintes que pagamos caro pelo aprendizado desse pessoal. Outros países convocam administradores financeiros, formados e treinados, e com vasta experiência anterior para ocupar um cargo destes no governo, justamente o contrário. Isto se chama ética profissional. Eles trazem experiência ao governo, que normalmente é o último a adotar as técnicas de administração desenvolvidas pelas empresas. Uma tragédia da União Soviética é que com 70 anos de economia centralizada, não saiu uma única técnica de administração nova. Nenhum conceito novo que pudéssemos adotar nas empresas. Não conheço um guru, um livro de administração de sucesso escrito por um russo. Nada! Portanto, que “experiência única que dá enorme valor depois para a gente” é esta que acrescenta tanto dinheiro e valor para quem foi do governo? Não preciso responder. Nossa missão como administradores é justamente mostrar a jornalistas, colunistas e intelectuais de esquerda o erro que o governo brasileiro comete ao convidar professores acadêmicos, sem nenhum valor e experiência, que vão justamente para o governo pela “experiência única que finalmente dará valor às suas insignificantes carreiras“.
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A Missão do Administrador
E pelo jeito, a maioria dos engenheiros, sociólogos e advogados do Brasil, e especialmente jornalistas, aprovam e são a favor; basta ler abaixo os poucos comentários endossando o que eu estou propondo aqui. Quando recebi o convite para trabalhar no Governo Sarney consultei meus colegas professores da USP. Alguns me incentivaram, “você tem muito a contribuir“, “você entende do assunto, já está com tudo pronto“, “O Brasil precisa de pessoas como você”. Outros infelizmente repetiram 30 anos atrás exatamente o que vocês ouviram do Palocci. “Vai, você vai adquirir muita experiência“. Por isto, estamos atolados como nação e governo. Estamos treinando amadores a ter experiência, com um dos mais elevados custos de treinamento do mundo, e o único beneficiado é a carreira dos valorados. Aos engenheiros, médicos e economistas deste país aqui vai um pedido. Sejam profissionalmente éticos. Nunca aceitem um cargo para o qual vocês não estejam preparados. Nunca aceitem um cargo no governo se não foram duplamente preparados e testados para as suas funções. Governo não é o local para se adquirir experiência, para depois ser consultor do setor privado. Convite para trabalhar no governo é para usar as suas experiências e não adquirir experiência a custa do povo brasileiro. O povo brasileiro agradece.
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O Administrador é Íntegro
O futuro é para ser feito, não para ser previsto. Esta é a grande linha divisória que divide administradores de um lado, e os sociólogos, cientistas políticos e acadêmicos de outro. Muitos cientistas sociais e economistas acham que seu dever é tentar prever o futuro, e proteger a sociedade das coisas ruins que enxergam na nossa frente. Por isto a maioria de suas previsões são negativas e catastrofistas. Nenhuma sociedade precisa de uma classe que nos proteja das coisas boas que o futuro nos trará, somente das coisas ruins. Por isto vivem prevendo recessões, inflação, deficit, nada de positivo. Porque são catástrofes que os colocam em ação, criando políticas públicas de gastos públicos, políticas macro prudenciais, criam
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A Missão do Administrador
salvaguardas financeiras, alfandegárias, proteções como Bolsa Família e até novas sociedades possíveis. Como foi o marxismo de Karl Marx, que sugeriu uma mudança radical em toda a sociedade com o uso da violência, violência revolucionária, porque ele previu o mundo econômico não repleto de mais de 250 classes profissionais, como admitiu recentemente Cuba, mas que o mundo se reduziria para somente duas classes, os engenheiros que inventavam as máquinas industriais e os trabalhadores de chão de fábrica. Para nós administradores e engenheiros o futuro é feito e não previsto. E o futuro que queremos implantar é sempre bom, normalmente são as boas práticas que algumas empresas inovadoras já descobriram que funcionam. Para nós o futuro é para ser construído com suor e lágrimas e não destruído com ações revolucionárias e guerrilha. O máximo que cada um de nós pode fazer é ter uma vaga ideia do que poderá acontecer, podemos saber o jei jeitã tão o da coisa coisa, e nada mais. Minha vida é um bom exemplo. Meu Livro O Brasil Que Dá Certo, foi um best seller em 1984, porque foi praticamente o único que mostrou um Brasil positivo depois do Real. Praticamente, todos os economistas famosos previram que o Plano Real daria errado. Prof. Roberto Macedo, Professor Titular da Universidade de São Paulo, escreveu uma coluna no Estado de São Paulo me atacando pessoalmente, num argumento ad hominem, como sempre, dizendo o seguinte: “Li perplexo a entrevista A Crise Já Era, do meu colega de faculdade da USP, Stephen Kanitz”.
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O título de seu artigo catastrofista foi “A Crise Está Aí”, muito apropriado para um economista. “Stephen foi meu colega também em Harvard, ele na Faculdade de Administração e eu do Departamento de Economia.” “A metodologia das duas áreas é bem diferente e é tradicional uma rivalidade intelectual entres elas.” A Business School ficava do outro lado do Rio Charles, só que segundo Macedo “no outro lado do rio se pensa de forma errada”. Existe sim uma luta de classes neste país, mas é entre aqueles que acham que o futuro é científico e previsível e que o futuro traz surpresas que precisam ser bem calculadas e evitadas. É a luta de classes entre intelectuais que acham que sabem e o resto da população que acha que não sabe tanto, mas trabalha produzindo coisas todo dia, não ideias. “O professor Kanitz baseia as suas afirmações muito otimistas nas 1000 empresas que analisa na edição de Melhores e Maiores”, afirma Macedo. Insinuando que quem analisa as 50 variáveis que determinam o sucesso das 1000 maiores empresas deste país é incapaz de entender o Brasil tão bem como aqueles que analisam cinco variáveis, a dívida interna, o deficit público, taxa de investimento e ajuste fiscal, variáveis apontadas por Macedo no seu artigo. O ataque foi tão violento, que a direção do Estado de São Paulo me procurou se eu não queria escrever uma réplica. Disse que não. Ficaria feliz se eles simplesmente o demitissem do Conselho do Estado de São Paulo, se o Plano Real desse certo. Algo que não fizeram. A maioria dos intelectuais são movidos por prestígio, entrevistas na imprensa, plateias e programas de televisão.
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Aparecer em público ou simplesmente aparecer é a sua moeda de troca, a sua motivação. Aí, a questão que todo intelectual é forçado a enfrentar é: devo dizer o que eu penso, ou devo dizer o que a plateia quer ouvir. Se meu compromisso é com a integridade intelectual, a minha opção é a primeira. Digo o que penso mesmo que seja contra a corrente. E já sofri muito com isto, mas minha ética é esta, dizer o que tem de ser dito. De forma clara e inequívoca. Ao escrever O Brasil Que Dá Certo, estava colocando em risco a minha reputação. Se o Plano Real não desse certo, pelo menos até 2005, que era a data limite da minha previsão muito otimista, você não estaria lendo este livro. Escrever um único artigo “A Crise Já Era”, não compromete uma reputação, tanto é que Roberto Macedo continua colunista do Estado de São Paulo, apesar de ter contribuído justamente para o baixo nível de investimentos em 1994, tão necessário para o sucesso do Real. Devido às previsões pessimistas de Macedo e tantos outros, a demanda explodiu como previra. Os investimentos não, porque ninguém investe antes de uma catástrofe, e o Banco Central teve que elevar os juros para mais de 25% de juro real, para conter o consumo. Exatamente o que se ensina no outro lado do Rio Charles. Mas se seu compromisso é com a vaidade, a segunda opção é a que vence, você vai dizer o que os outros querem ouvir. Ser pobre e ao mesmo tempo desconhecido é a morte para todo intelectual.
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Woody Allen retrata magistralmente este personagem no filme Zelig. Zelig é uma pessoa tão amável, tão desejosa de agradar, que concorda com tudo o que a pessoa ao lado diz. Eu é que lia perplexo os artigos do economista Mario Henrique Simonsen, que ao longo de cinco anos apresentou cinco planos diferentes da Dívida Externa. Com isto ele permaneceu na mídia cinco anos mais do que eu. Eu apresentara logo no início o Plano de pagarmos Juros Reais e não Nominais, e nunca mudei meu raciocínio. Obviamente os jornalistas brasileiros perderam todo o interesse em mim, “seu discurso é sempre o mesmo, Kanitz”. Para quem tem integridade intelectual tem que ser assim, não outra saída do que a solução científica, do que a solução do momento. Zelig ao mudar de opinião constantemente acaba indo ao psiquiatra com um sério problema. Ao querer ser todo mundo, agradar todo mundo, especialmente jornalistas, ele acaba sendo ninguém. Sendo ninguém e não tendo opinião própria ele acaba esquecido. No Brasil, falar sempre a verdade é de fato complicado. Por isto não somos tão bem vistos como queríamos, mas temos que seguir em frente. Precisamos aprender a dizer a verdade com “ternura”, à moda latina, sem ofender, sem ir direto ao ponto, que é a moda dos anglo saxões. Não ter medo de dizer a verdade é 0 nosso primeiro passo como administrador. Um compromisso ético e tanto.
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O Administrador é Humilde
Viajei uma vez de classe executiva, e ao meu lado um senhor de terno, cara de executivo, lendo a Bíblia. Achei que fosse um destes “bispos” destas igrejas questionáveis viajando com todo o conforto do mundo, mas era na realidade um Vice Presidente de uma empresa subsidiária da Alcoa. Perguntei porque ele estava lendo a Bíblia. Sua reposta me surpreendeu. “Como Vice Presidente de uma grande empresa eu tenho muita influência e poder sobre a vida de milhares de pessoas. Se eu não tomar cuidado, este poder pode subir à minha cabeça, o que causaria muita infelicidade. Por isto, acho importante ir todo domingo à Igreja, para relembrar que existe uma pessoa mais poderosa e muito mais sábia do que eu.” Eu já ouvi muitas razões para se ir todo domingo à Igreja, mas esta era uma ideia totalmente nova.
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Stephen Kanitz
Achei uma razão muito interessante para ir até uma Igreja toda semana. Não para pedir perdão ou pedir ajuda. Mas como uma forma para que aqueles que comandam o poder tenham o bom senso de baixar a bola. Um momento para refletir todo domingo o limite da prepotência, fazer semanalmente um ato de humildade e ficar de joelhos como todos nós. A classe dominante de ontem ainda acreditava em Deus, e portanto era mais humilde. Mas infelizmente nestes últimos 50 anos a classe que comanda o Brasil foi substituída por outra classe que já não acredita em algo superior à história. Que não acredita que haja algo superior à ciência. Que não acredita que a ideologia pode não ser perfeita como acreditam. Uma classe dominante que não vai à Igreja mostrar humildade, nem jogar um balde de água fria de tempos em tempos na sua arrogância. Concordo plenamente com estes intelectuais que a Igreja não é lugar para pedir ajuda. Mas refletir nos nossos erros, e refletir um pouco de forma mais humilde não faz mal a ninguém. A nova classe dominante das universidades, da mídia, dos líderes dos movimentos sociais, dos políticos e da maioria dos intelectuais passaram a acreditar que não há ninguém superior a eles, que eles sabem tudo, que mudarão o mundo sem ter que prestar contas a mais ninguém. Os fins justificam os meios.
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A Missão do Administrador
Como eles sabem tudo, os fins justificam os meios, afinal eles são superiores. Os social democratas, como o PSDB, achavam que bastava colocar 100 intelectuais em postos chaves, as melhores cabeças deste país, e tudo ficaria resolvido. E não entendo porque o PSDB é tão popular entre meus amigos inteligentes e pensantes, mas cujas opiniões práticas e sensatas nunca são ouvidas. Mal sabe o PSDB, o PT e demais partidos, que hoje em dia não basta uma centena de intelectuais para administrar um país. O número mais próximo seria no mínimo os 12 milhões de membros da chamada classe média, que está sendo deliberadamente destruída pelos intelectuais, vide os vídeos de Marilena Chauí. Se você intelectual que não acredita em Deus, e por isto não quer ir para a Igreja uma vez por semana, pelo menos seja humilde como o Vice Presidente da Alcoa. Pense um pouquinho nos outros e nas consequências de seus atos. O sofrido povo do Brasil agradece.
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O Administrador e o "Poder"
O poder governamental sempre foi considerado afrodisíaco. Que o poder daria uma sensação humana que poucos têm o privilégio de desfrutar, mas de efeitos fantásticos sobre aqueles que o detêm. Frequentei por um ano os corredores do poder quando fui assessor do Ministro do Planejamento, e todos meus amigos querem saber como foi a experiência, como é de fato este tal de “pod poder er“. Honestamente, não sei de onde vem este mito orgásmico. Claro, um número enorme de pessoas que lhe tratam com reverência aumenta, o número de puxa-sacos explode, o telefone não para de tocar com pedidos de audiência. Mas alguém que quer realizar algo de bom e concreto volta absolutamente frustado.
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A Missão do Administrador
Quem está acostumado a realizar coisas na vida privada fica absolutamente estarrecido com a lentidão e inércia do governo. Ninguém lá é formado em administração, e assim nem começa a haver diálogo, ninguém entende o que é administrar a coisa pública. Infelizmente, nestes últimos 50 anos nunca tivemos um Presidente da República e ministros que tenham trabalhado numa das 500 maiores empresas privadas deste país. Executivos acostumados à pressão de gerenciar planos com rapidez e cumprir orçamentos de forma moderna. Profissionais que conhecessem a fundo as dezenas de disciplinas da administração, gerência de recursos humanos, controladoria, análise de sistemas, gerenciamento do crescimento, administração financeira, apuração contábil, estratégia e planejamento para disseminá-las aos seus subordinados. E, mais importante, com experiência de implantar aquilo que parece perfeito no papel. Nossos governos, de 1964 para cá, foram administrados por acadêmicos, teóricos, bons de fala e bons escritores de artigos em jornal. Quem conheceu no passado as grandes empresas como a Telebras ou a Matarazzo sabe como elas também eram paquidermes lentos e pesados. Quanto maior a empresa, pior é a sua capacidade de responder às demandas da sociedade. Agora imaginem o Governo. Um Governo que não contrata pessoas treinadas, que não sabe delegar, e portanto nem sabe como cobrar. Por isto não entendo porque o povo brasileiro, os comentaristas em blogs e os próprios blogueiros e Twitteiros não lutam para ter
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governos administrados por pessoas treinadas, em vez de sermos governados por amadores que estão aprendendo nos primeiros dois anos, em vez de cumprir boa parte dos planos nos primeiros 100 dias de governo. O poder é afrodisíaco para quem é incompetente. Eles só precisam decidir entre os dois assessores que está propondo a melhor ideia, e muitas vezes nem isto sabem fazer. Para quem é competente o poder é angustiante. Entreviste os poucos administradores que já trabalharam no governo. Pessoas como Antoninho Trevisan, Alcides Tápias ou o Furlan, e eles dirão como é frustante trabalhar no governo. Pergunte para algum deles se pensa algum dia em voltar ao “poder”. Jamais! Por outro lado, pessoas que veem o poder como forma de aparecer, que adoram ser bajuladas por puxa-sacos, que adoram os holofotes do cargo público, estes de fato acham o poder afrodisíaco e só pensam em voltar. Vários leitores me perguntam porque não vou para o governo, e esta é a razão. Poder é a capacidade de realizar, e não a capacidade de decidir o futuro de uma nação sem os conhecimentos necessários para tal. Isto, nós administradores consideramos ser um crime contra a humanidade. Um crime que lutaremos para evitar.
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O Administrador é Um Democrata
Administração é a Ciência que mais discute questões como democracia e eleições, algo que poucas pessoas sabem. Administração é a Ciência que mais experiências práticas realizou em termos de democracia e eleições. A Ciência Política se restringe a estudar as práticas criadas por 120 países, a grande maioria as mesmas. Mas em Administração pudemos fazer verdadeiras pesquisas em pequena escala. Já criamos centenas de milhares de formas diferentes de democracia nas empresas, mas só vou relatar um aspecto importante, o das eleições. A grande descoberta nesta área é que o grande problema da nossa democracia são as eleições diretas e as campanhas eleitorais.
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Quem é bom administrador de um país normalmente não é bom de voto, e quem é bom de voto não é bom administrador. Temos exemplos notórios como Jânio, Collor de Mello e o próprio FHC. Normalmente nas eleições para nossos governantes somos obrigados a optar entre dois candidatos carismáticos e com um belo discurso populista, mas sem experiência em administração de empresas muito menos governos. Ambos prometem milhares de coisas que são incapazes de executar ou partem para agressões mútuas, dossiês de última hora e uma imprensa imparcial. Nas empresas não temos campanhas sujas, marketing nem promessas eleitorais. Os candidatos não podem fazer promessas falsas aos acionistas, que por sinal sequer votam. Acionista não tem condições nem tempo para analisar detalhadamente os currículos de 6.000 deputados federais, por exemplo, para saber qual o melhor. Esta tarefa é delegada e feita por um Conselho de Administração. Votamos para termos um Conselho, que nos representa nesta questão. Composto por administradores velhos, maduros e já testados, eles é que irão escolher por nós o futuro presidente da empresa. Este conselho normalmente não escolhe candidatos formados em Sociologia ou Economia, e sim com experiência prática comprovada e formação profissional correta. Normalmente é um vice-presidente ou um dos diretores da empresa. Também não existem partidos políticos nas empresas que barganham votos por cargos.
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A Missão do Administrador
Tudo é decidido com base na competência dos candidatos. E eles não precisam ter carisma, somente capacidade de liderança. É isto mais ou menos o que acontece hoje na China, embora muitos considerem o regime de ditadura de esquerda. Não é. A escolha para presidente da China é feita por um Conselho de Administração de 400 membros. E os acionistas, fazem o quê? Primeiro, votamos no Conselho de Administração. Mas o mais importante é que temos o poder, sim, de derrubar o Presidente quando acharmos conveniente. E mais, todo Presidente escolhido pelo Conselho pode ser demitido de uma hora para a outra convocando-se uma Assembleia Extraordinária de Acionistas. Não é impeachment, é simplesmente mudança de opinião. Eu chamo isto de democracia negativa, temos direito de destituir quem não desempenhar a contento. A qualquer momento, algo curiosamente negado na maioria das “democracias”. Quando se descobre que o Presidente mentiu na sua campanha, que não é competente, na nossa democracia não há nada que se possa fazer. Isto é bem diferente do impeachment, onde o Presidente tem que ter cometido um crime bem definido. Existe uma outra arma que muitas vezes é usada, que é o takeover. Às vezes, o Presidente se mancomuna com o Conselho de Administração, e a empresa vai de mal a pior. Nestes casos, um grupo de investidores externos compra as
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ações da empresa a preço de banana e destitui o Conselho de Administração e toda a Diretoria. Algo que hoje não ocorre com países nem empresas estatais, porque o controle estatal é de 51% das ações com direito a voto. Em empresas administradas de forma responsável não existe ditador, enganador, incompetente, pelo menos não por muito tempo, respeitando sempre a vontade do acionista.
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O Administrador é Um Mediador de Conflitos
A maioria dos nossos intelectuais ainda acredita que o mundo é controlado por “empresários”, pelos “donos do poder”, por uma “classe dominante” preocupada exclusivamente em maximizar lucros e com seus próprios interesses. Este talvez seja o maior problema do administrador brasileiro. Nosso intelectuais e nossos jornalistas associam administradores como sendo parte desta “classe dominante que precisa ser eliminada”, junto com os empresários como reza o marxismo. Infelizmente Marx nunca conversou com um único administrador na época. Apesar de ser sobrinho de Lion Philips, o fundador da Philips. Mas hoje, 150 anos depois, é um insulto à inteligência, aos novos estudantes que aprendem marxismo nas escolas, e à de todos nós administradores formados deste país desconhecer a revolução
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bem sucedida que se concretizou no século XX no mundo inteiro. A Administração Socialmente Responsável. Fruto dessa revolução, iniciada pela Harvard Business School em 1912, administradores profissionais literalmente tomaram o poder das empresas, sem derramamento de sangue, sem guerrilhas e emboscadas, conseguindo a derrota definitiva dos empresários, o grande sonho de Karl Marx. Hoje nos Estados Unidos os “donos do capital” não administram as suas próprias empresas. Inclusive o termo Empresário continuadamente usado no Brasil é justamente este dono do capital que também administra a sua própria empresa. Enquanto marxistas querem destruir o empresário e o capital, nós Administradores Socialmente Responsáveis sem alarde fomos tomando o poder destes empresários, pulverizando seu capital, criando Fundos de Pensão de Trabalhadores que iam comprando lentamente as ações dos empresários, e dezenas de outras medidas não revolucionárias nos termos marxistas. Pelo contrário, criamos Fundações Filantrópicas para os herdeiros ricos destes empresários, dando um novo significado para a vida deles. Hoje nem temos mais capitalistas na definição de Karl Marx, o que temos são milhares e milhares de acionistas, a maioria minoritários, que não têm poder de mando nas suas empresas. Pequenos acionistas não podem pedir ao presidente da empresa para contratar um filho ou parente, pois sequer será recebido. Pequeno acionista não pode pedir para o Departamento de RH contratar sua amante ou moça bonita, para então abusar sexualmente como até hoje acreditam tantos intelectuais marxistas. Fica bem claro para mim, que é o marxismo brasileiro que
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impede o crescimento do movimento da Administração Socialmente Responsável, e quero deixar bem claro que não sou alguém de direita atacando Karl Marx, pelo contrário. Sou alguém de esquerda que quer implantar uma esquerda eficiente, responsável e social, que atenda os interesses dos Stakeholders da empresa, e não somente dos Stockholders visão da direita, dos Trabalhadores de Chão de Fábrica, visão da esquerda, ou do Estado, visão dos nacional-socialistas do Brasil. Voltei de Harvard determinado para implantar esta nova forma de pensar, uma das razões pela qual logo procurei a Revista Exame, e me tornei parte do conselho editorial. Mas minha maior dificuldade foi convencer os jornalistas petistas, o mais conhecido hoje sendo Rui Falcão, por 10 anos Secretário de Redação, que não queria ouvir nada que melhorasse o capitalismo, porque isto impediria a vinda do nacional-socialismo, a ideologia que reina hoje no Brasil, desde Getúlio Vargas. Slavoj Zizek que parece ter lido praticamente todos os livros do mundo, não leu Peter Drucker. A verdade é que ao longo do século XX, os empresários do mundo inteiro foram sendo lentamente substituídos por um grupo de revolucionários que, sem derramamento de sangue, tomaram o poder das empresas. Refiro-me aos novos protagonistas da história, os administradores profissionais, pessoas especialmente treinadas para conciliar os interesses conflitantes entre clientes, fornecedores, acionistas, trabalhadores, ecologistas, ONGs e governo. O acionista majoritário, o famoso “empresário”, deixou de ser o todo-poderoso, aquele gestor que administrava sua empresa em causa própria e de sua família, à custa dos demais, o chamado Stockholder.
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O novo tipo de empresa que administradores criaram é a empresa de “capital aberto” com milhares de acionistas que oferecem sua poupança como “capital social” para a sociedade. Essas empresas, listadas em bolsa, não têm dono, no sentido típico da palavra. O administrador socialmente responsável não tem o Stockholder como meta, mas sim o Stakeholder, todos os que têm interesse na perpetuação sustentável da empresa. Trabalhador, cliente, fornecedor e o acionista, nesta ordem. Esses revolucionários humanizaram as empresas, tornando-as socialmente responsáveis, valorizaram fornecedores, clientes e trabalhadores. O objetivo da empresa passou a ser servir à sociedade em geral, e não servir aos interesses de uma única família ou do Estado, a todo custo. Administradores não são de direita nem de esquerda, não defendem exclusivamente capitalistas ou somente os trabalhadores em detrimento dos demais Stakeholders. A preocupação é sempre defender o todo. Ao contrário do que acreditam acadêmicos e os intelectuais, administradores não maximizam lucros. Eles habilmente deixam os acionistas “satisfeitos”, com a famosa fórmula de “dividendos mínimos”, sistemáticos e crescentes, que aprendemos no primeiro ano da faculdade de administração. Clientes, governo, trabalhadores, acionistas e fornecedores, porém, têm interesses conflitantes, que precisam ser adequadamente resolvidos por um mediador, que é a função política e moderna do administrador. O administrador como político. Quando um desses grupos domina os demais, cessam a cooperação e o crescimento da empresa.
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Foi o que ocorreu com as estatais dominadas pelo Estado, como a Varig dominada pelos funcionários, e com muitas empresas familiares comandadas pelo grupo majoritário. Aí, uma das partes da equação sempre controlará a empresa pensando em seu próprio interesse, em detrimento das demais. A função do administrador é justamente manter esses grupos heterogêneos nos seus devidos lugares. Um administrador de empresas é antes de tudo um hábil político, um líder, um mediador e conciliador de conflitos. Ele sabe conciliar como ninguém as forças difusas e conflitantes que garantem o sucesso de uma empresa. São políticos que entendem de administração, ao contrário do que temos por aí. Em vez de torcer para que o próximo Congresso tenha deputados que possam eventualmente entender de administração, vamos eleger administradores que já entendam de política.
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Administradores ou Revolucionários ?
Por que alguém se tornaria guerrilheiro ou guerrilheira se sua intenção é melhorar o mundo? Por que alguém lutaria para mudar tudo que está aí causando uma enorme confusão, pelo menos inicial? Por que temos tantos acadêmicos, sociólogos, economistas, cientistas políticos que sonham com um mundo melhor, mas pregam o uso da violência, da luta armada, para chegar ao futuro que imaginam? E por que acabam a maioria no fim da vida frustados e malhumorados? Revolucionários normalmente são pessoas com reduzido conhecimento administrativo. Lidam mal com pessoas, são tímidos, têm dificuldade de controlar a sua raiva, são mandões por excelência.
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Como não sabem lidar bem com o presente, vivem mais num futuro utópico. Administradores raramente são revolucionários. Nenhum administrador famoso foi guerrilheiro na juventude, apesar de discordar de muita coisa e também querer melhorar o mundo. Administradores conseguem melhorias pequenas, mas constantemente. Conseguem rapidamente colocar o que acreditam em prática. De pequeno em pequeno resultado vão longe. Administradores acreditam que se o presente for corretamente administrado, o futuro se desenrolará melhor do que se imagina. A maioria das experiências utópicas que foram implantadas, sejam comunitárias ou políticas, fracassaram por má administração. Veja Cuba, Coreia do Norte, União Soviética e o governo Dilma. Pena que os movimentos de esquerda nunca perceberam isto, nunca se associaram com administradores, especialmente o socialmente responsáveis. Esta é uma tese complicada de provar num único artigo, mas vou dar um exemplo vindo da medicina. Os melhores cirurgiões são aqueles que fazem a mesmíssima cirurgia todo dia, com a mesmíssima equipe, uma repetição de dar dó. Mas devido a estas repetições, eles conhecem instintivamente os 450 procedimentos que precisam ser corretamente executados numa cirurgia de tórax, por exemplo. Não ficam nervosos ou preocupados com cada uma das etapas, sabem administrar a cirurgia perfeitamente.
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Isto permite que o cérebro pense em outras coisas. A cirurgia em questão tiram de letra. Uma das coisas em que eles pensam é justamente no futuro. Pensam no que pode dar errado na próxima etapa da cirurgia, se antecipam mentalmente. Percebem as diferenças particulares daquele paciente, e onde devem tomar mais cuidado do que o usual. Vou pedir já um cateter extra, neste caso poderei precisar dele numa emergência. Por isto acreditamos que com uma administração correta do presente, o futuro será positivo sem necessidade de revoluções. Quem está atolado com problemas no presente não tem tempo para pensar no futuro. Muito menos planejar o passo seguinte. Bons cozinheiros sabem disto, engenheiros idem. O problema do Brasil é que nossos partidos de esquerda e os que sobraram de direita, ouvem todo mundo, menos os administradores, e que muitos por ideologia odeiam. E as boas intenções dos revolucionários de esquerda viram esta bagunça que aí está. Como ocorreu na União Soviética, China, Cuba, Bolívia e Venezuela. E continuará por mais 20 anos. Até hoje a Rússia não desenvolveu escolas de Administração. Não existe um livro de administração escrito por um russo sobre como administrar enormes empresas, que foi a especialidade da Rússia de 1917 até 1980. Agora, eles teriam sido grandes consultores de megaempresas do Ocidente, mas administradores sequer existiam. Países que dão certo precisam de administradores que inovem constantemente, e não de revolucionários que reviram tudo e depois se estagnam para sempre.
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A Missão do Administrador
Contamos com você para convencer seus colegas revolucionários de que eles precisam de você.
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Existem Administradores de Esquerda
Em 500 anos de história nunca tivemos equipes de administradores elaborando programas de governo, muito menos os implantado. Quando elogiei uma declaração de Dilma Rousseff, em VEJA de 21 de março de 2007, usei a expressão “administradores de esquerda”, que intrigou muita gente. Principalmente aqueles que pensam que só existem administradores de direita. Achar que só existem administradores de direita no mundo é um preconceito e um insulto aos dois milhões de administradores deste país. Para começar, administração é uma ciência neutra, como a engenharia e a medicina.
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O que não impede que haja administradores de direita, de esquerda e de centro-esquerda, como de fato acontece. Em segundo lugar, há tempos existe no Brasil a carreira de administração pública, que de direita não tem nada. De fato, administradores de direita são encontrados em empresas controladas por empresários de direita. Mas a maioria dos administradores é de centro e centroesquerda, embora nem todos se definam assim. São aqueles que administram empresas “sem dono”, são aqueles que administram empresas de capital aberto e democrático, são os administradores socialmente responsáveis, que estão crescendo em número e poder. Foram eles que lutaram pela pulverização do capital, enfraquecendo assim o controlador capitalista, que foi a primeira ação da esquerda de fato vitoriosa. Foram os primeiros a criar fundos de aposentadoria para trabalhadores, que hoje controlam 40% do capital americano. Foram os primeiros a criar planos de saúde aos trabalhadores. Foram os precursores do movimento de responsabilidade social das empresas brasileiras. No 3° Congresso Internacional de Responsabilidade Social de 1998, havia somente três administradores representando o Brasil. Este que escreve, o administrador Oded Grajew, criador do Instituto Ethos de Responsabilidade Social, e Henrique Meirelles, mais um desses administradores (do Coppead, Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação em Administração de Empresas da Universidade Federal do Rio de Janeiro) Um dos grandes erros da Revolução Socialista de 1917 foi que ela eliminou, destituiu e expulsou todos os administradores da União Soviética.
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Dizimaram o segundo escalão da nação. Machiavel, lembre-se, recomendava eliminar somente o primeiro escalão. “Em meados de abril de 1918 os administradores haviam sido totalmente eliminados“, orgulha-se um historiador da revolução de 1917, já que eles eram considerados lacaios do capitalismo. Acabaram também com todos os gerentes, supervisores, chefes de seção, bem como contadores e auditores, considerados “espiões” do capitalismo. O restante fugiu a tempo. Os socialistas e os marxistas incentivaram a autogestão, porque segundo a doutrina os administradores não acrescentam valor algum à sociedade. Os trabalhadores autogestores imediatamente destruíram os sistemas de avaliação de desempenho, e a produção na União Soviética despencou logo em seguida. Foi esse erro que deu início à desorganização, ineficiência e corrupção que ainda persiste na Rússia. O erro foi esquecer que o socialismo precisa ser tão bem administrado quanto o capitalismo. Algo que muitos intelectuais brasileiros também esqueceram. Muitos nem sequer conhecem um único administrador. Nos Estados Unidos, a esquerda americana encabeçada por Harvard fazia justamente o contrário. Criava uma escola de administração em 1908 para formar e apoiar o “administrador socialmente responsável”. Incentivaram e deram prestígio àqueles que fariam oposição ao empresariado capitalista da época. Infelizmente, o Brasil seguiu a linha da esquerda soviética e não a da esquerda americana. Nossos intelectuais, em vez de apoiar, demonizam o admin-
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istrador nos seus textos, na mídia, nas novelas, retratando-os como fordistas, desumanos e “lacaios do capitalismo“. Movimentos sociais que alijam administradores do seu seio estão fadados ao fracasso. Por incrível que pareça, nunca tivemos equipes de administradores elaborando programas de governo, em 500 anos de história. A esquerda raramente coloca administradores de esquerda e centro-esquerda para ministros, para administrar este país. Algo que a esquerda brasileira, a mais moderna pelo menos, deveria seriamente repensar. Enfrentamos a oposição da direita, que não quer administradores profissionais e sim seus filhos tocando o capital social das suas empresas, e temos, por incrível que pareça, a esquerda brasileira que também não quer um país transparente e eficiente. Esta é a principal razão pela qual a Administração não é uma profissão devidamente valorizada, apesar de ser a profissão mais procurada pela nova geração. Escrevi este livro pensando em vocês, fornecendo argumentos para vocês conseguirem o que eu infelizmente não consegui. “Administradores de Esquerda”, acabou sendo meu último artigo na Veja. Nem permitiram despedir-me dos meus queridos leitores. A oposição da direita e da esquerda é dura e violenta. Preparem-se devidamente, mas o Brasil depende de vocês para mudar este preconceito idiota por parte de ambos.
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Administrar é Cuidar do Capital Social da Sociedade
Uma única inovação ocorrida no século XV teve enorme influência para o progresso, a inclusão social e a redução da pobreza. Foi a invenção do conceito de Capi pital tal Socia Social pelo frei Luca Pacioli, o criador da Contabilidade. Esse conceito perdura até hoje em todos os contratos sociais e nas demonstrações financeiras das empresas brasileiras. Antes de Luca Pacioli, um comerciante ou produtor que não pagasse suas dívidas poderia ter todos os bens pessoais, como casa, móveis e poupança, arrestados por um juiz ou credor. Ele perdia não somente a sua empresa, mas sua casa e todos os seus bens pessoais. Isto mesmo. Só um louco varrido abria uma empresa para gerar produção e emprego para os outros.
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Por isso na época, todo mundo produzia somente para si. Reinava o egoísmo total. Produzir para os outros como se faz atualmente, nem pensar. O conceito de Capital Social de Luca Pacioli mudou tudo isto. Permitiu que legisladores e advogados criassem o conceito de empresa de Responsabilidade Limitada. Depois desta inovação administrativa e contábil, se você montasse um negócio sua responsabilidade ou “desgraça” ficaria limitada ao Capital Social que tivesse colocado na empresa, e não abrangeria a totalidade dos seus bens pessoais, como antes. Funcionava mais ou menos assim. Você abria uma empresa com Capital Social de R$ 100.000,00. Isto é divulgado, e diz a todos seus futuros funcionários e fornecedores o seguinte: “Eu não sou um empresário perfeito, cometo erros como todos vocês. Vou cometer erros sim, e estou colocando estes R$ 100.000,00 como garantia dos meus possíveis erros. Se eu falir e não puder pagar a mercadoria ou os salários, eu me responsabilizo sim pelos meus erros, mas somente até R$ 100.000,00, nada mais. “Se vocês acharem que estes R$ 100.000,00 é pouco, não trabalhem para mim, não me vendam matéria prima. Mas se aceitarem, pago pelos meus erros, até R$ 100.000,00 e não reclamem depois se meu erro for maior, porque minha casa e meus bens pessoais não entram neste negócio que estou tentando montar.” Milhares de pessoas com competência administrativa e empreendedora começaram a abrir empresas muito mais tranquilos, e começaram a produzir para os outros e não somente para si. Passaram a produzir muito mais barato do que as pessoas individualmente e artesanalmente, passando a empregar trabalhadores até então desempregados.
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Desde então, o mundo não para de se desenvolver, com exceção da América Latina que ainda não entendeu o conceito. O Capital Social é o capital que os acionistas oferecem à sociedade para garantir que empregados e fornecedores recebam no final do mês. Diferentemente do que se ensina nos cursos de Marxismo, o capital não pertence aos acionistas, e sim à sociedade – daí o termo social. Os contadores e técnicos de contabilidade vão concordar comigo, pois eles colocam o Capital Social numa categoria chamada “nã “não o exi xigí gív vel”, justamente porque são dívidas que não podem ser “exigidas” pelos acionistas enquanto a companhia existir. O Capital Social que acionistas colocam nas empresas para garantir os outros pertence à sociedade e não aos capitalistas, enquanto empresa. Repito, o capital é Social. Pertence à sociedade e não aos acionistas. Estes somente têm o “direito” de reaver o capital se a empresa fechar. Se a empresa quebrar, o Capital Social vai para os Stakeholders não para os Stockholders. A ironia do Capitalismo, algo que os socialistas de estado e os marxistas nunca perceberam, é que como empresa rentável nunca fecha, o Capital do capitalismo nunca volta para os capitalistas. Duzentas mil famílias brasileiras compraram nos últimos anos ações da Gol, Dasa, Copasa, Porto Seguro, Rossi, Gafisa, OHL, Iochpe, Grendene, Natura, Cyrela, Cosan, UOL. Talvez não saibam, mas nunca mais verão a cor daquele dinheiro.
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Essas empresas jamais devolverão o dinheiro “investido”, porque ele agora faz parte do seu Capital Social. Essas famílias se juntaram a mais outros dois milhões de investidores altruístas que ofereceram sua suada poupança à sociedade brasileira, subscrevendo o capital social da Petrobras, Banco do Brasil, Vale, Telesp, Eletrobras, e assim por diante. Se precisarem deste dinheiro de volta, todos estes investidores não poderão procurar as empresas em que investiram. Elas jamais irão devolver o dinheiro investido. Isto mesmo, isto é Capitalismo Social minha gente. Estes investidores terão de torcer para que alguma alma caridosa ou tão altruísta como eles compre esses seus “direitos não exigíveis” no pregão da Bolsa de Valores de São Paulo. Terão de arrumar um outro “garantidor” para substituí-los, e exercer esta nobre função. Em troca de oferecer capital social à sociedade, você fará jus a uns míseros dividendos de 3% ao ano, e em 33 anos você terá seu dinheiro de volta. Isso se a empresa não quebrar ao longo do caminho. Aí seu “capital social”, ou o que sobrar dele, será distribuído aos trabalhadores e fornecedores e você não receberá absolutamente nada. A maioria dos intelectuais da América Latina ainda conclama seus alunos a lutar pela completa “destruição do capital” do mundo. Muitos cientistas políticos e sociólogos usam o termo Capital, sonegando o termo correto Capital Social, uma tentativa deliberada de confundir o leitor. A missão do administrador, entre tantas outras, é a de administrar bem o Capital Social a serviço da sociedade. Nada mais nobre do que isto.
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Part III
O Futuro
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Administração Tem Que Ser Divertida Legenda do Capitulo que aparece no aquibo
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Por 25 anos analisei as 1.000 maiores empresas do Brasil, e muitos professores de administração me perguntam como eu classificaria as companhias brasileiras com base nessa experiência. Daria um livro, mas resumindo em uma única página diria que existem cinco tipos de empresas no país. A empresa Tipo A é aquela na qual somente o dono se diverte. A empresa familiar por excelência. A empresa do Empresário. Tudo gira em torno dele, tudo é feito do jeito dele. Ele é o verdadeiro Deus de sua companhia e assim consegue implantar rapidamente sua visão do negócio.
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É o “empresário bem-sucedido” que aparece em capa de revistas, invariavelmente sozinho. É o dono da verdade, de tudo e de todos. Não preciso dizer que os demais integrantes dessas empresas não se divertem nem um pouco, não é esse o objetivo da empresa familiar. A empresa Tipo B é aquela em que somente os filhos do dono se divertem. O pai, com 75 anos, ainda a controla com mão-de-ferro, mas isso já não é tão fácil como antigamente. Ele está ficando gagá e nunca quis fazer a transição de uma empresa familiar para uma profissional, contratando administradores, e muito menos entregar a companhia aos filhos. Para manter-se no poder e deixar seus filhos já com 40 anos felizes, comprou-lhes iates e BMWs e deu-lhes cargos no conselho para fazer absolutamente nada. Não conseguindo salário compatível em nenhuma outra empresa por serem incompetentes, estes filhos se tornam resignados e se deleitam fazendo cruzeiros mundo afora. No fundo, são os únicos que se divertem. O empresário gagá já não. A empresa Tipo C é aquela onde ninguém mais se diverte. O pai finalmente morreu sem deixar uma equipe de administradores profissionais. E a empresa vai de mal a pior. Os filhos chamados às pressas do iate no Caribe começam a brigar entre si sobre as questões administrativas a serem tomadas. Óbvio, porque só entendem de iates e BMWs. E aí nossa elite empresarial não entende por que todos os empregados, trabalhadores e sindicalistas de empresas A, B e C
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são de esquerda e por que temos tantos intelectuais e professores de filosofia marxistas querendo acabar com tudo isso que está aí. A empresa Tipo D é aquela na qual todo mundo se diverte. Ela não tem um único dono, é uma associação coletiva de pequenos acionistas, a maioria formada de trabalhadores da própria empresa, fundos de pensão de trabalhadores, da classe média, de médicos e engenheiros, poupando para a aposentadoria, para não depender do salário dos filhos. São as empresas de capital democrático, em que não há ações sem direito a voto, onde todos votam, como essas companhias listadas no novo mercado transacionadas todo dia na Bovespa. São administradas por administradores testados, escolhidos pela sua competência no setor. Empresas tipo D são a concretização moderna do sonho de Karl Marx, nas quais trabalhadores e consumidores são acionistas diretos das empresas em que trabalham ou compram, detendo assim os meios de produção. O mundo marxista que quer os meios de produção estatizados na mão de brilhantes economistas, não é marxismo e sim fascismo. Normalmente, o presidente dessas empresas é um administrador profissional, funcionário demissível a qualquer momento, como todos os outros. Nada de cargo vitalício como nas empresas dos tipos A, B e C nem indicações por apadrinhamento político como nas empresas Tipo G, G de governo. O presidente dessas companhias é escolhido pela competência administrativa, e não pelo parentesco familiar ou loteamento político. Como esse administrador depende da cooperação de todos para
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manter-se no poder, a opinião geral é ouvida, todo mundo faz parte da solução, ele acredita no trabalho de equipe. As ideias de todos são desejadas e levadas a sério. Nessas empresas, o presidente não destrata nem desrespeita os subordinados, jamais berra em público, não é o dono da verdade, caso contrário não sobreviveria. São empresas preocupadas com o social, e não somente com o bolso do acionista controlador, que nessas empresas nem existe. O D é de Divertido, Diversificado e Democrático. São empresas como a Google, Apple, Twitter. São as empresas das listas “Melhores Companhias para Trabalhar no Brasil”, infelizmente muito raras devido à proliferação de empresas dos tipos A, B, C e G. Mas empresas Tipo D estão sendo criadas todo dia. Um outro mundo é possível, mais democrático, mais bem administrado, mais includente, mais socialmente responsável e muito mais divertido.
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A Importância de Uma Visão do Futuro
Nosso maior problema como prisioneiros de guerra“, diz Viktor Frankl no seu livro “O Significado da Vida”, “era não ter uma visão de futuro“. Ao contrário de presos comuns, não havia para um prisioneiro de guerra uma data certa para a liberdade. Isto gerava consequências trágicas. Muitos prisioneiros de guerra achavam que seriam libertados antes do Natal de 1944, porque as Forças Inglesas e Americanas já haviam desembarcado na Normândia. Mas o Natal passou e a guerra somente acabaria em Junho de 1945. Decepcionados e desiludidos, centenas de prisioneiros morreram logo depois do Natal, sem explicação, numa frequência duas vezes o estatisticamente normal.
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Sim Simp plesm esmen ente te desisti esistiram ram de vi viv ver por acha harem rem que nã não o tinham mais futuro futuro.. Erra Erraram ram por al alguns guns m meses. eses. Nos últimos 30 anos, nossos filhos têm sido bombardeados pelos nossos intelectuais, imprensa e professores universitários que nosso país não tem futuro. Nos inúmeros textos escritos por intelectuais para as comemorações dos 500 anos do Descobrimento em vez de olha lharm rmos os pa para ra um futuro a fazer fazer,, usaram a ocasião para mostrar que nem passado tínhamos. Intelectuais nos lembraram que somos um país de corruptos por termos sido colonizados por desterrados e criminosos, mas nunca revelam que nossas Universidades Públicas contratam mais professores de Sociologia e Política do que professores de Auditoria e Fiscalização. A USP tem um único professor de Auditoria, consequência da Lei do Economista de 1945, Lei 7988, que mandou fechar a partir de 1946 todas as escolas de Administração deste país. E no curso de Economia, recém-criado, não se ensina Auditoria nem Fiscalização. E de lá para cá perdemos a nossa Visã isão o de Futuro do administrador, do advogado, do engenheiro, do empresário, do empreendedor e passamos a ser dominados pela visão de futuro do Economista, o único entrevistado pela imprensa sobre esta questão. A Revista Veja, dos quatro colunistas fixos, três são economistas, Maílson da Nóbrega, Cláudio de Moura Castro e Gustavo Ioschpe, os dois últimos falando de Educação para o futuro. Para o economista, o futuro é para ser previsto e evitado quando for ruim. Aumenta-se os juros, reduz-se o câmbio, aumenta-se os gastos públicos dependendo do que se “vê” pela frente.
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Para o administrador, o advogado, o engenheiro, o empresário, o empreendedor, o futuro é para ser feito, com suor, lágrimas e trabalho, não simplesmente previsto com “modelos estatísticos”. O futuro é nosso para ser criado da forma que desejamos, não “esperado” num Deus que o dará pela bola de cristal. O Japão e a Alemanha do pós-guerra não pautaram sua reconstrução em previsões econométricas porque sequer tinham mais uma economia para ser prevista. Decidiram construi construirr seu novo futuro ao ponto que suplantaram seus vencedores, a Inglaterra e os Estados Unidos, tal o poder desta postura perante o futuro. Precisamos resgatar a visão de futuro dos engenheiros, dos carpinteiros, empreendedores, advogados e administradores e rejeitar de vez a visão niilista dos previsores do futuro, que preveem o futuro da volatilidade, do câmbio, do juro para poder especular, e das previsões de curto prazo que levam a nada. Ficamos tão preocupados com as marolas que esquecemos de ver as ilhas do horizonte. Administradores muitas vezes quebram a cara não conseguindo fazer o que pretendiam, nem sempre criam empresas de sucesso como gostariam. Mas a favor dos administradores, eles têm o mérito de ter pelo menos tentado. Tentado fazer, em vez de simplesmente tentado prever, sentados em cátedras acadêmicas com suas redomas de vidro. Única forma de devolver aos nossos filhos um sentido para suas vidas é mostrar que existe uma outra visão de mundo, de ação construtiva e não de especulação. A missão do administrador, e de muitas outras profissões, é fazer o futuro, como o queremos.
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Chegamos na Era do Administrador, Finalmente
Por que os Estados Unidos são o país mais bem-sucedido do mundo? Por que são um país que resolveu o problema da miséria e da estagnação econômica, ao contrário do Brasil? O segredo americano, que você jamais encontrará em nenhum livro de economia, é que os Estados Unidos são um país bem administrado, um país administrado por profissionais. Dezen Dezeno ove por cen cento to dos gra grad dua uad dos de uni univ versi ersida dad des am ameriericanas sã são o fforma ormad dos em aadministra dministraçã ção o.
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Administração é a profissão mais frequente, e portanto a que dá o tom ao resto da nação. Engenheiros fazem MBA, advogados fazem MBA, economistas como Michael Porter fazem MBA, o que os tornam pessoas que conseguem tirar projetos do papel. Como eles se encontram finalmente juntos numa sala de aula, criam empresas das mais variadas do que escritórios de advocacia, consultorias de economia e escritórios de engenharia. Infelizmente, o Brasil nunca foi bem administrado. Sempre fomos “administrados” por profissionais de outras áreas, desde nossas empresas até o governo. Até recentemente, tínhamos somente quatro cursos de pósgraduação em administração, um absurdo! De 1832 a 1964 a profissão mais frequente no Brasil era a de advogado, e foi essa a profissão que exerceu a maior influência no país.
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Tanto que nos deu a maioria de nossos presidentes até 1964. A revolução de 1964 acabou com a era do advogado e a legalidade. O Brasil já tem 2.300 cursos de administração, contra 350 em 1994. Estamos logo depois dos Estados Unidos e da Índia. Administração já é hoje a profissão mais frequente deste país, com 18% dos formandos. Antes, nossos gênios escolhiam medicina, direito e engenharia. Agora escolhem medicina, administração e direito, nessa ordem. Há dez anos tínhamos apenas 200.000 administradores, e só 5% das empresas contavam com um profissional para tocá-las. O resto era dirigido por “empresários” que aprendiam administração no tapa. Como o Sandoval do Panamericano e seu livro “Aprendendo Fazendo”. O custo de aprendizado quebrou o banco. Por isso, até hoje 50% das empresas brasileiras quebram nos dois 142
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primeiros anos e metade de nosso capital inicial vira pó. E por isto os juros são caros, a inadimplência é elevada. O que o aumento da participação dos administradores na gestão das empresas significará para o Brasil? Uma nova era que poderia ser muito promissora. Finalmente poderíamos ser administrados por profissionais, e não por amadores. Daqui para a frente, 75% das empresas poderia não quebrar nos primeiros quatro anos de vida, e nossos investimentos poderiam gerar empregos, e não falências. Temos hoje mais do que milhões de administradores formados, e se cada um empregar vinte pessoas haverá 40 milhões de empregos novos. Será o fim da exclusão social.
Administradores nunca foram ouvidos por políticos, e deputados nem concorriam a cargos públicos. A maioria dos nossos ministros e governantes aprendia admin-
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istração no próprio cargo, errando a um custo social imenso para a nação. Foi-se o tempo em que o mundo era simples e não havia necessidade de ter um curso de administração para ser um bom administrador. Não quero exagerar a importância dos administradores, mas somente lembrar que eles são o elo que faltava. Ordem não gera progresso, estabilidade econômica não gera crescimento de forma espontânea, sempre há a necessidade de um catalisador. Não será uma transição fácil, pois as classes dominantes não aceitam dividir o poder que tem. Administradores têm pouco espaço na imprensa para defender suas ideias e soluções. Em pleno século XXI, eu era um dos raros administradores com uma coluna na grande imprensa brasileira, a Veja, e mesmo assim mensal. Peter Drucker desde 1950 tinha uma coluna semanal em dezenas de jornais americanos, ele e mais trinta gurus da administração. Administradores têm outra forma de encarar o mundo. Eles lutam para criar a riqueza que ainda não temos. Economistas e intelectuais lutam para distribuir a pouca riqueza que conseguimos criar, o que só tem gerado mais impostos e mais pobreza. Se esses dois milhões de jovens administradores que vêm por aí ocuparem o espaço político que merecem, seremos finalmente um país bem administrado, com 500 anos de atraso. Desejo a todos coragem e boa sorte. Tem muita gente interessada num país mal administrado, onde é mais fácil corromper e ser corrompido.
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A Nova Sociedade Brasileira
Bernardo Sorj escreveu recentemente um excelente livro intitulado A Nova Sociedade Brasileira, que vale a pena ser lido.
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Ele mostra uma quebra de paradigma que está ocorrendo. Como Bernardo é sociólogo, prefiro que vocês leiam dele estas previsões. “A intelectualidade e os cientistas sociais ocuparam nos últimos 50 anos um lugar singular como formadores de projetos para o Estado nacional. Com a democratização esse grupo foi enormemente reduzido. Os antigos intelectuais ligados a projetos liderados pelo Estado, geralmente economistas, sociólogos, cientistas e antropólogos continuam a ocupar um lugar importante no debate político pois a sociedade
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brasileira apresenta problemas sociais de tal monta que continuam necessários.” Foram estes intelectuais, devo salientar, que financiaram os deficit públicos com emissão de moeda que iniciou nosso processo inflacionário. Depois cobriram estes deficit endividando o estado até a insolvência, e nestes últimos dez anos cobriram estes deficit sobrando a carga tributária para estes atuais 45%. Deficit públicos eram gerados porque estes intelectuais queriam acelerar o curso da história, nas quais eles eram os protagonistas infalíveis. Os deficit de hoje seriam cobertos com os superavit de amanhã, algo que não aconteceu. Neste 50 anos em vez de crescer mais rapidamente com estas políticas públicas, crescemos mais lentamente, poderíamos hoje ter uma renda per capita o dobro da que temos hoje. Some-se que nossa carga tributária retira a metade do que ganhamos, o que não ocorria 50 anos atrás antes que estes intelectuais dominaram o estado e temos o seguinte. Ou seja, poderíamos estar hoje com uma renda per capita praticamente quatro vezes maior, duas pelo crescimento que não ocorreu e praticamente o dobro se não existissem estes impostos em nome do social. Pergunta: Teríamos este nível de problemas sociais se a renda fosse quatro vezes maior? Estes números não ficarão escondidos da população para sempre, e quanto mais pessoas mostrarem os fatos reais, estes economistas, sociólogos e cientistas perderão cada vez mais o seu espaço público. No que Sorj parece concordar.
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“Se o antigo intelectual se vê cada vez mais marginalizado do palco da história, novas categorias de legisladores ocupam novos espaços. 1. Administradores de empresas, formados por cursos de administração que apropriaram do discurso e da clientela estudantil que anteriormente buscava as Ciências Sociais. 2. Dirigentes de movimentos sociais e ONGs. 3. Técnicos de grandes burocracias, desde promotores de globalização a defensores dos direitos das crianças.” Pela análise de Sorj, dá também para antever que esta mudança não será fácil, os intelectuais encastelados irão lutar com unhas e dentes para manter o poder. Vocês estão preparados, e dispostos a lutar pelo bem do Brasil? O Brasil espera que sim.
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O Administrador Como Um PolĂtico
Muita gente esclarecida neste paĂs, intelectuais e professores
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universitários, acredita que o mundo é controlado por empresários, donos do capital, oligarcas e arrogantes. Existem no mundo poucos empresários, definidos como administradores, que controlam suas empresas por serem donos do capital. Hoje quem manda nas empresas globais são administradores. Administradores profissionais treinados para conciliar os enormes conflitos que existem entre clientes, fornecedores, acionistas, trabalhadores, ecologistas e governo. O sucesso de uma empresa moderna depende da capacidade de seus administradores conciliar esta gama de interesses conflitantes, que os americanos chamam de “stakeholders“. Um trabalhador e um fornecedor também investem na empresa da mesma forma que um acionista, embora antigamente isto não fosse tão claro. Por isto a missão do administrador moderno é ser um político, ele tem de saber dosar e manter unido este grupo de interesses conflitantes. A grande crítica que se fazia ao capitalismo de 1890, é que os próprios capitalistas eram os administradores, como ocorre em muita empresa familiar brasileira. E aí fica difícil a conciliação. Um dos elos, os acionistas, sempre ganhava na disputa com os demais. Sempre que um dos participantes controla a empresa, este participante defende seus interesses em prejuízo dos demais. Veja o que ocorreu com a Varig, uma empresa não controlada pelos capitalistas, mas pelos empregados. Ou seja, quando um dos elos controla a empresa pensando somente nos seus interesses.
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O bom administrador tentará agradar a todos os elos de uma empresa e não somente o capitalista ou acionista. Foi justamente esta separação do capitalista e do administrador, antes unificados num único indivíduo arrogante, que permitiu reduzir os conflitos empresariais que os socialistas tanto detestam, e com razão. O administrador não defende o acionista em detrimento dos outros. A solução socialista, ao entregar a gerência da empresa a um dos “stakeholders” neste caso o Governo, acabou criando outro tipo de ditadura, a ditadura de esquerda, em detrimento do pluralismo democrático gerenciado pelo administrador. A presidente da Petrobras mudou o nome da empresa para Petrobrax sem antes submeter a decisão para a Assembleia de Acionistas, o que lhe teria dado respaldo contra as críticas dos políticos. A Petrobras nega até hoje o direito de voto para 75% de seus acionistas, para que o controle se mantenha na mão de poucos. O socialismo parece cada vez mais o antigo capitalismo, como previu George Orwell, na Revolução dos Bichos. A solução moderna “neoliberal” é nenhum grupo de interesse controlar a empresa e muito menos a gerência, que é entregue a administradores profissionais, que serão verdadeiros políticos na conciliação de interesses difusos. O problema escondido da Enron e da bolha da Internet é que a prática de dar “stock options” a administradores, estes começaram a pensar novamente como capitalistas, defendendo somente um dos interessados, neste caso eles. Juntaram novamente o gerente com o capitalista, o que provou um retrocesso.
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Administrador de empresas na minha opinião não podem participar do lucro nem ter ações da companhia, senão perde sua independência como conciliador de interesses. Que receba um bom salário, algo que não acontecia com o antigo capitalista gerente porque tinha o controle das ações. O administrador moderno não é mais o tecnocrata, orçamentista, controlador de resultados de antigamente, mas se aproxima mais do líder carismático, de fácil trato, com amplo trânsito político, socialmente responsável. O administrador moderno é hoje antes de mais nada um profundo conhecedor de política, e um dos problemas do Brasil é que nossos políticos não entendem nada de administração. E quando ouvem alguém, procuram economistas, que não entendem absolutamente nada de administração muito menos de crescimento das empresas, base de qualquer economia.
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Empresas Preparadas Para Servir
Rolim Amaro, da TAM, era um amigo que faz muita falta. Ele era o exemplo de um empresário intuitivo, observador, honesto, prova de que diploma não é condição necessária para ser presidente de empresa ou nação. Eu sempre brincava com ele que se tivesse feito faculdade, hoje ele seria diretor de uma das companhias de aviação concorrente em vez de ser dono da TAM. A característica do Rolim era que ele gostava de servir os outros. Marca do verdadeiro administrador. Toda a sua atitude neste sentido era autêntica, não era da boca para fora só para ganhar dinheiro. Tanto que ele foi um dos primeiros a apoiar os meus dois projetos sociais, o site voluntarios.com.br e o Prêmio Bem Eficiente. Quando eu apontei que os voluntários que usam nosso site são
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pessoas predispostas a servir o outro, Rolim imediatamente adotou como prática de seleção que o departamento de pessoal da TAM privilegiasse candidatos a emprego que tivessem sido voluntários quando jovem. O mundo empresarial de hoje é o mundo dos serviços. Daqui para a frente as empresas de sucesso serão as empresas que eu chamaria de “Preparadas Para Servir”. Como criar este tipo de empresa? Transformar empresas para servir o outro será nosso enorme desafio daqui para a frente, e administradores profissionais e socialmente responsáveis vão ter que promover uma mudança cultural de enormes proporções, por razões históricas. Herdamos uma cultura portuguesa greco-romana que via o servir o outro como servidão, um fardo, uma obrigação a ser evitada. Servir o outro era visto como uma penalidade, algo que devia ser evitado a todo custo. O segredo é ser servido, tanto que adotaram a escravidão sem remorso, e nunca servir. Esta mentalidade ficou ainda mais forte no Brasil com quase 400 anos de tradição escravocrata, quando importamos escravos para nos servir, e queremos que o Estado nos sirva de todos as nossas necessidades e obrigações. A maioria dos brasileiros, inclusive muitos intelectuais, querem ser servidos e não servir. Querem aposentadorias integrais, 13º. salário sem existir 13 meses de trabalho, querem serviços públicos em todas as áreas, querem ensino grátis, saúde grátis, transporte grátis, remédios grátis. Querem seus direitos, sem pensar nas obrigações.
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Por estas razões históricas, o Brasil ainda vive uma enorme resistência a servir os outros, ao contrário de outras civilizações como a chinesa, japonesa e americana, onde servir o outro não é tão mal visto assim. Se ensinarmos as pessoas que servir o outro não é degradante, pelo contrário, de que é um raro prazer, construiremos uma sociedade sólida e uma plataforma de exportação de serviços. Criaremos uma nação de cidadãos compromissados com o cliente e com o social.
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Capitalismo Beneficiente
Precisamos achar meios para aprimorar o capitalismo em vez de passarmos por uma revolução para substituí-lo. Mas como mudar o capitalismo como o conhecemos? De que forma? O capitalismo se provou muito competente para produzir bens e serviços que os consumidores querem. Se houver um desejo insatisfeito no mercado, algum empreendedor irá se mexer para provê-lo. O que o capitalismo não sabe fazer ainda é produzir bens e serviços que as pessoas precisam. Não há segredo em vender frangos barato entupindo-os com Deus sabe o quê ou vender morangos saborosos, com mil e um agrotóxicos. A indústria automobilística colocou airbags nos carros por determinação do governo americano, porque há dez anos o consumidor não queria.
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A Missão do Administrador
As TVs e os anunciantes se digladiam para mostrar o grotesco e o pornográfico, assuntos que o povo quer mas que não necessariamente precisa. Alguns administradores, porém, estão lentamente mudando esta situação. Steve Jobs da Apple, Larry Page da Google, Elon Musk da Tesla, estão produzindo e produziram produtos que eles achavam que o consumidor precisaria, ponto final. Gastam fortunas tentando criar coisas novas que nenhum consumidor sequer imaginaria. Estão tambem gastando tempo, recursos organizacionais e dinheiro em atividades beneficentes e filantrópicas simplesmente porque acreditam que as empresas precisam produzir também bens que a sociedade quer. Surge uma nova geração de administradores, os administradores socialmente responsáveis como Guilherme Leal, Fabio Barbosa, Sérgio Amoroso, Luís Norberto Pascoal, entre outros, que estão gastando mais do que 5% do seu tempo, lucro e recursos organizacionais para oferecer o que eles acreditam que a sociedade precisa. Fazem parte de uma nova geração de administradores e empresários que está transformando um capitalismo de resultados em um capitalismo de benefícios. Um outro grupo de empreendimento vai além, devota 100% de suas energias, dinheiro e organização para produzir o que a sociedade precisa. São as entidades beneficentes, que ao longo destes anos adquiriram competência e técnicas organizacionais que seriam de muita valia para as empresas.
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Quão mais fácil seria, por exemplo, para os Alcoólatras Anônimos vender pinga a seus associados, do que a abstinência? Quão mais fácil seria colocar um outdoor vendendo bebida com mulheres sensuais do que angariar fundos filantrópicos? Quão mais fácil seria para a Igreja Católica ceder às pressões de mudança, oferecendo o que os fiéis querem, do que se manter leal aos seus dogmas e insistir em oferecer o que ela acha que os fiéis precisam, custe o que custar? Conseguirão os empresários obter lucro ofertando o que o consumidor precisa? Conseguirão obter lucro vendendo frangos humanamente criados, sorvetes sem aditivos químicos e morangos sem agrotóxicos? Várias experiências mostram que sim. A Superbom, empresa dirigida pela Igreja Adventista consegue ser rentável apesar de produzir sucos dentro de processos naturalistas. Tornar o capitalismo mais responsável já não parece uma tarefa impossível e existem vários grupos agindo neste sentido sem ter que passar pelo traumático processo de derrubar o sistema vigente. Todo ano 50 entidades beneficentes receberam, merecidamente, o Prêmio Bem Eficiente pela sua competência, liderança e exemplo, provando que existem soluções para os problemas sociais. Essas e as demais entidades são a semente para um novo tipo de capitalismo voltado para suprir a sociedade com o que ela precisa e não necessariamente com o que ela quer. Existe missão mais nobre do que essa?
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Part IV
Problemas
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Você Não Entende Absolutamente Nada de Administração?
Você Não Entende Absolutamente Nada de Administração?
Muitos leitores acham que eu defendo uma “reserva de mercado” para administradores. Que defendo que somente administradores com formação e treinamento em Faculdades de Administração conceituadas, com no mínimo nota 9, deveriam administrar enormes empresas como Petrobras e outras com mais de 1.000 funcionários. Estes leitores defendem que qualquer um pode administrar uma Petrobras, por indicação política, sem um curso formal em administração, e que como nação nem deveríamos lutar para termos cursos de Administração de primeiro nível, e exigir dos que existem aprimoramento contínuo. 160
A Missão do Administrador
Minha opinião é outra. Não sou contra advogados, engenheiros, economistas e médicos serem presidentes de cias. de software, cias. elétricas, Petrobras ou hospitais. A única ressalva é que defendo que tenham pelo menos um MBA complementar em Administração. Ser Diretor e Presidente de uma empresa com 1.000 funcionários é muita responsabilidade para ser tratado de forma amadora. Vidas estão em jogo. Pior que desperdiçar recursos financeiros e ecológicos, devido à ineficiência, é desperdiçar vidas humanas mal utilizadas. Nos cursos de MBA, 90% dos alunos são de fato advogados, engenheiros, economistas e de todas as outras profissões, é onde a maioria das empresas tem seu nascedouro. O Mestrado de Administração é um dos cursos mais democrático e includente, e menos corporativista que existe. Eu sou fruto desta democracia, sou bacharel em Contabilidade com mestrado em Administração. Tenho dois pés em duas áreas diferentes do conhecimento humano. Estes dois pés são a chave da riqueza das nações. É a dupla, iniciativa e acabativa que já escrevi anteriormente. Esta dupla permite que a criatividade de engenheiros, advogados, economistas e médicos não fique somente na teoria, mas passe do papel para a prática. Não é por acaso que os países que têm o maior número de cursos de MBA cresce mais. A minha grande divergência com economistas, sociólogos e advogados que assumem postos no governo é que eles não conseguem implementar as políticas públicas necessárias para este país, porque não têm acabativa, não sabem os problemas administrativos que algumas ideias bem intencionadas geram.
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Nos demais mestrados como Advocacia, Engenharia e Economia, 90% dos alunos são da mesma profissão, criam endogenia e este corporativismo que está segurando este país. Pior, estes cursos não preparam seus alunos para os postos de liderança que alguns membros da profissão devem alcançar. Minha tese é que empresas públicas, que usam o dinheiro do povo, empresas de capital aberto que usam a poupança de milhares de acionistas, empresas com mais de 1.000 empregados, precisam sim de um administrador formalmente treinado para tal, com nota acima de 9. Hoje estes postos são ocupados com pessoas com nota ZERO, pessoas que não têm a menor ideia do que é administração. Empresas familiares, empreendedores que estão investindo seu próprio dinheiro e querem correr o risco da ignorância, cometendo dezenas de erros administrativos que poderiam ser evitados, e que tenham 20 a 30 funcionários, que façam o que quiserem mesmo sem diploma. Aprendam errando, quebrem nos primeiros cinco anos, para satisfazer a corrente de leitores que acham que administração não é importante. Querem argumentar que nossos cursos de Administração são ruins, são fracos, eu aceito a crítica. Reclamem da lei 7988 de 1945 que decretou o fechamento de todos os cursos de Administração do Brasil na época, e que ressurgiram de fato somente a partir de 1985, depois da ditadura militar. Enquanto os países do mundo estavam criando seus MBAs depois da segunda guerra, nós estávamos decretando o fechamento das poucas escolas de Administração que tínhamos, e ninguém na época reclamou. Agora, honestamente, quem não entende absolutamente nada
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de administração, nunca será um competente Presidente, Ministro ou Secretário, nem irá ser um competente pai ou mãe de uma família e vou dizer mais. Dificilmente será um bom funcionário, sem saber exatamente o porquê que está trabalhando, nem como funciona o sistema de produção de uma nação.
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Jornalista Precisa Ser Treinado, Administrador Não?
Segundo o STF, “qualquer um pode exercer a profissão de jornalista” frase bem conhecida de tantos administradores. Mas os jornalistas, ao contrário dos administradores, insurgiram. Beth Costa presidente da Federação Nacional dos Jornalistas, escreve: não é óbvio que precisamos de uma “regulamentação profissional que exija o mínimo de qualificação?” É exigir demais pedir o mínimo de qualificação, para um presidente da Petrobras, ser diretor financeiro da Aracruz, Sadia Concordia e VCP, empresas que estão agora com problemas, e foram administradas por vocês sabem quem? Vejam o estrago que fizeram nestas 4 empresas.
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A Missão do Administrador
Nenhum jornalista amador chegou perto de causar um prejuízo de 20 bilhões. Aos administradores só posso alertar que vocês não merecem o diploma que possuem, se manterem esta passividade. Aos jornalistas só peço que denunciem o corporativismo da Lei 7988/45, e defendam agora o mínim mínimo o de qualifi ualifica caçã ção o pa para ra a “a “administra dministraçã ção o” d deste este país.
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A Função do Gestor e a Função do Administrador
Gestor vem de Gesto, gesticular, apontar, aquele que dá as ordens e indica com um gesto do indicador o caminho a seguir. Administrar vem de Ministério, servir o outro, ajudar os outros a serem mais produtivos. Gestores são aqueles que usam o termo “empregados” e “empregadores”. Empregados para um Gestor são as pessoas contratadas para obedecer as ordens de quem os “empregam“. Administra dministrad dores usam o termo “funcionários“, pessoas contratadas para exercer uma certa fun funçã ção o e não obedecer ord ordens ens. A última coisa que queremos é dar ordens para 39 Ministros e 260 Secretários. Quem exerce uma fun funçã ção o obedece aos pa pad drões exigidos por aquela função, os ensinamentos e treinamento dado.
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A Missão do Administrador
Sem ter que ser ori orien enta tad dos continuadamente por gestores. (Orientado vem de Oriente, a direção que o Gestor aponta para seus empregados se dirigirem.) Isto permite uma organização mais enxuta, com menos Caciques e mais Índios. Justamente o contrário do mundo dos Gestores, que tem que ter muito mais Caciques para dar ordens constantes aos Índios. Quanto os funcionários exercerem corretamente a sua função, não precisam nem da “supervisão” de Administradores. Só entramos em cena quando algo dá errado e estes precisam de ajuda. Gestores usam também o termo “trabalhadores“. São pessoas que trabalham para os gestores em troca de uma remuneração. Administra dministrad dore ores usam o termo “colaboradores”. Estes não trabalham para nós, trabalham para a empresa. Seja fazer uma função como uma auditoria segundo os padrões estudados, ou manter o clima organizacional da Empresa. Desde a Ditadura Militar, tivemos uma preferência maior para os ditos Gestores do que os Administradores preparados para tal. Militarismo exige obediência às decisões que vêm do Comando Superior. Militar quer empregado, dirigido, soldado, que vá na direção apontada pelo indicador do General. “O inimigo está para lá.” Como a maioria dos nossos formadores de opinião não tem a menor ideia da diferença entre gestor e administra dministrad dor or, continuam com a visão Militar no mundo dos Gestores. Até o PT segue a visão da Ditadura Militar. Muitos manifestantes saíram pedindo melhor gestão pública, que é justamente o que não queremos.
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Dezenas de editoriais saíram pedindo uma melhoria na Gestão Pública, como se este estilo de administrar fosse justamente o que o Brasil precisa. Óbvio que não irá ocorrer e continuaremos na mesma. A missão de um jovem administrador é mostrar a grande diferença entre gestão e administração. Entre o amadorismo do século XVI e as modernas formas de pensar da administração do século XXI.
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A Lei do Mínimo Esforço
Acho cômico algumas ciências sociais gastarem horas e horas, livros e livros, achando que a ganân ganância cia é que faz o mundo girar. Acham que é a ganância e o lucro que motivam os seres humanos, que é a lei número um que rege o mundo, especialmente o mundo capitalista. A llei ei q que ue ggere ere o m mun und do é a Lei d do o Mínim Mínimo o Esf Esforço orço.. Especialmente no Brasil. Todo mundo quer no fundo fazer nada, ganhar sem trabalhar, ter um emprego público garantido e vitalício. Todo mundo quer seu Bolsa Família, todo mundo quer uma boquinha e uma benesse do Estado. Isto parece fazer parte da vida. Com o surgimento das civilizações aparecem inevitavelmente os parasitas sociais, membros da sociedade que vivem do trabalho dos outros. Por que não?
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Há várias formas de se fazer isto, desde roubar, corrupção, enganar e criar impostos policialescos de 40% da produção dos outros. Jared Diamond, no seu livro Guns, Germs and Steel, discute isto no capítulo Crescim rescimen ento to das Kl Kleeptocra tocracias. cias.
O crescimento de indivíduos e grupos da sociedade especializados em tirar dinheiro dos outros.
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O gran grand de peri periggo é este grupo se alastra alastrarr e toma tomarr con conta ta de uma ci civilizaçã vilização o ou país. Alguns fazem isto diretamente roubando, outros justificandose com argumentos religiosos, políticos, igualitários, ideológicos, idealistas, éticos e altruísticos. É interessante ler as inúmeras formas lógicas bem estruturadas e ensinadas para nos convencer a tirar dinheiro do nosso bolso e entregar a outrem sem obter nada em troca. Altruísmo, cidadania, é dando que se recebe, amor a Deus, a causa, solidariedade humana, etc, etc, etc. Pelos menos os ladrões, corruptos e salafrários assumem ser parasitas sociais descaradamente, sem aquela hipocrisia racional e científica que outros grupos usam para justificar a mesma coisa. É tirar dos ricos mesmo, meu chapa. Intelectuais são mais hipócritas, ensinam aos nossos filhos que a renda é distribuída e mal distribuída. Não é. Dinheiro é ganho com suor e lágrimas. Quem tem de ganhar dinheiro oferecendo bons serviços é o pipoqueiro da esquina da Faculdade de Filosofia, que sabe que o dinheiro não é distribuído, e sim ganho com suor e lágrimas. O professor de Filosofia de uma Universidade Pública, ganha sempre, faça sol faça chuva, mesmo com greve de ônibus, mesmo dando péssimas aulas. A renda destes professores é de fato distribuída, ou redistribuída pelo Estado, que nos retira via impostos independentemente do professor ter sido eficiente. Temos também os espertos, os sedutores, os enganadores, que usam vários artifícios para lhe devolver muito menos do que você pagou.
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E aí tem de tudo. Governo, empresários, empresas, repartições públicas, ONGs, igrejas, escolas, universidades, enfim. Não há valor humano mais valorizado pelos intelectuais e os poetas do que o altruísmo e a solidariedade. Impedir a proliferação de parasitas sociais tem sido uma preocupação constante de filósofos, religiosos e cientistas políticos de antigamente. Hoje, estão escondidos a sete chaves e são o maior perigo de toda civilização. Isto porq porque ue se o pa parasi rasitism tismo o social se pro prolif lifera erarr, ele ma mata tará rá a soci socieda edad de h hosped ospedei eira. ra. Sem Sempre pre terem teremos os pa parasi rasitas tas sociais em nosso mei eio o, é a lei do mínim imo o esf esforço orço q que ue resi resid de em ca cada da um d dee n nós. ós. Mas de acordo com alguns estudos sociais, se 17% da população sucumbir a este vírus, o restante dos 83% não conseguirá sustentar a si e os parasitas mamando nas nossas tetas. É o que parece estar acontecendo nos Estados Unidos e Europa. As religiões foram as primeiras tentativas em coibir o parasitismo. Não m mentir entirás ás,, nã nãoo rrouba oubarrás a pprroprieda riedadde alheia, nã nãoo mat mataarás ás,, nã nãoo eng engaana narrás ás,, nã nãoo ccoobiç içaarás a pprroprieda riedadde púb públic licaa n nem em ppriva rivada, da, nã nãoo us usaarás o nome de Deus no seu ma marrketing social, foram os prim rimeir eiroos ma man nda dam ment entoos. Em todas as religiões Deus é onisciente. Ele sabe que você está roubando. E Ele irá lhe punir mesmo que nós não o façamos.
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Pena que muitas religiões esqueceram a natureza de sua origem. O liberalismo inglês e americano também foi um movimento político contra o que eles viam como parasitas sociais. Foram os primeiros a lutar contra os reis e os lordes feudais. A lutar contra o conservadorismo europeu ao lado dos socialistas. O livre mercado e a livre concorrência eliminaram os tubarões dos lucros altos e os cartéis capitalistas. A globalização eliminou os monopólios nacionalistas e os mercados protegidos e novamente reduziu margens de lucros. E, os únicos a lutar contra os burocratas e tecnocratas do fascismo e do socialismo mundial. E estes, obviamente são os maiores inimigos do liberalismo e neoliberalismo. Se o neoliberalismo vingasse teria tirado sua boquinha. Administradores são constantes farejadores para reduzir custos desnecessários e de pessoas que pouco contribuem para o bem estar dos outros. Por isto, o patrão e o administrador são sempre odiados pelos parasitas e os corpos moles. A ciência da Administração criou sistemas com auditorias internas e externas, contabilidade de custos, controle e fiscalização, e o sistema de preços, tudo com o objetivo de reduzir o nefasto parasitismo social e a lei do mínimo esforço. Talvez seja por isto que o administrador tenha tantos inimigos, tantos grupos agindo contra o desenvolvimento da cultura de administração neste país. Uma missão a mais para você.
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Se Karl Marx Tivesse Estudado Administração
Na época de Karl Marx havia pouco capital e poucos capitalistas.
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Tanto que os marxistas criaram como seu símbolo a foice e o martelo, bens de capital que custam menos que R$ 10,00. Um tear mecânico custava na época em torno de R$ 1.000,00, só que aumentava a produtividade do tecelão em mais de dez vezes. Num primeiro momento, este aumento de produção não chegava a afetar o preço do tecido que ficava praticamente igual, nem do trabalhador. Os primeiros donos de teares passaram a ganhar nove vezes mais do que na produção manual. O lucro inicialmente se tornou colossal. Foi isto que Karl Marx viu, e infelizmente achou que era o normal e não um fenômeno sui generis. Do dia para a noite, o lucro que era de 10% sobre um tecido
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passou a ser de 50%, uma baba. O que permitiu a compra de mais teares. Pergunte a um Empresário ou Capitalista o que ele acha de fornecedores que embutem margens de lucro de 50%. Garanto que ele responderá “um bando de ladrões”. A mesma análise feita por Karl Marx. Como isto é possível? Karl Marx não entendia de Processos Dinâmicos. Não tinha à sua disposição um Excel. Não conseguiu ir além da sua análise da situação da época, não conseguia simular o futuro, como tudo isto iria terminar. Sem Excel e Matemática de Processos Dinâmicos, Marx achava que os capitalistas seriam cada vez mais ricos, e os trabalhadores cada vez mais pobres. Isto porque ele não reconhecia o valor dos engenheiros inventores das máquinas da revolução industrial, e dos administradores com suas novas técnicas gerenciais. Ele argumentava que o aumento de produtividade obtido pelas máquinas dos engenheiros e os processos dos administradores deveria reverter somente para os trabalhadores. Isto porque segundo ele, só o trabalho enobrece e acrescenta valor. Os fisiocratas anos antes também usaram argumento parecido, que só a agricultura acrescentava valor, e por isto o Estado deve protegê-lo. No caso de Marx, se um trabalhador trabalhava oito horas e produzia um metro de tecido, porque ele deveria continuar a receber as mesmas oito horas, se sua produtividade aumentara em 10 vezes? Portanto, ele queria que toda esta mais valia fosse para o trabalhador.
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Marx não era contra o lucro do engenheiro, algo que muitos Marxistas esqueceram, Marx admitia que o engenheiro recebesse o lucro sobre um metro de tecido, aquele antes do aumento de produtividade. E que recebesse a depreciação da máquina que ele inventou e as horas trabalhadas ao construí-la. Para um trabalhador sem escolaridade Marx tem uma lógica interna, todo mundo ganha, o que para o trabalhador parece justo. Infelizmente, os engenheiros parariam de inovar, como ocorreu em Cuba e na União Soviética. Você não tem nenhum produto em casa inventado na Rússia nem em Cuba. E os administradores deixariam de ser administradores, e você de fato não leu livros de administração vindos da Rússia nem de Cuba, apesar de mais de 10.000 serem escritos por ano. O que Karl Marx não entendeu? O mínimo de administração. As empresas reinvestem 90% dos seus lucros. Devolvem por assim dizer a mais valia de Marx de volta para a sociedade. Não para comprar iates, mas sim comprando mais e mais teares. Maior produtividade e mais teares começavam a saturar o mercado da época e os preços despencaram. Muito mais do que pela metade. No fundo, a chamada mais valia de Marx foi reduzindo. 30% acabou virando aumento de salários, 50% acabou virando redução de preços, e 20% ficou de fato para os engenheiros e administradores pelo seu esforço e inovação. Mas vejam o mais interessante. Trabalhadores são também consumidores, e no fundo 80% da “mais valia” nos anos seguintes foi para o trabalhador. Estas porcentagens variam de país para país, e de ano para ano. Na Coreia do Sul, um dos países capitalistas mais eficiente do
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mundo, todo ganho de produtividade se reverte imediatamente em redução de preço. Nem o trabalhador individual nem o capitalista se beneficiam da mais valia. A redução de preços gera mais consumo, e embora o trabalhador fique na mesma, mais trabalhadores arrumam emprego. O capitalista ganha no aumento de produção e não na expropriação da mais valia. Tudo sem violência, quer consumir, consuma, quer trabalhar, trabalhe, ninguém é obrigado a fazer nada. Na filosofia de Karl Marx, como engenheiros não concordaram com a Teoria que de fato não fazia sentido prático, só ideológico, a única forma de reduzir a “mais valia” era por uso da violência humana. Pela luta revolucionária, matando os engenheiros burgueses ou estatizando as suas máquinas, pelo uso da violência. Milhões de vidas foram sacrificadas, todos os administradores de Cuba e Rússia foram dizimados, todos os contadores e auditores, declarados espiões do capitalismo. Hoje, o lucro embutido num produto de R$ 100,00 que você compra, é por volta de R$ 2,00, dependendo do produto. Novela da Globo você nem paga o produto. Honestamente, você se incomoda em dar 2% do preço do produto para o empreendedor que criou o produto que não existia, que organizou toda a equipe de produção, que gerou todo o sistema administrativo, que paga bem seus funcionários dando creches, educação e fundos de pensão que deveriam ser função do Estado? Que arrisca um dia quebrar e perder tudo porque você não gosta do produto, que produz antecipadamente para que você sempre possa comprar aquilo que precisa?
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Eu não pegaria em armas para destruir este sistema, eu não seria uma guerrilheira como foi a economista Dilma, tudo isto para entregar empresas estatizadas a gestores de estatais que nem sempre são tão eficientes e comprometidos com o consumidor. Se aparecer um setor com 50% de lucro, hoje em dia a saída de um governador que sabe administrar um país é permitir mais concorrência entre as empresas, que irá reduzir a margem de lucros e os preços, em vez de dar poderes monopolísticos à Petrobras, à Vale, aos Correios, à Caixa, ao Banco do Brasil e assim por diante. Karl Marx nunca estudou administração, e não percebeu que capitalismo se combate com mais capitalismo, com mais “concorrência”, algo que não existe nas escolas de Marxismo, onde os professores têm monopólio, emprego vitalício, onde o melhor aluno jamais lhe substituiria como professor. Marxistas, Socialistas, Trotksistas, Maoistas, Stalinistas, Chavistas, Castristas, enfim, não perceberam que já em 1800, administradores estavam substituindo os barões capitalistas do passado e que os trabalhadores seriam proprietários das ações das empresas em que trabalhavam, via os Fundos de Pensão que nós administradores criamos. Metade das ações das 500 maiores empresas americanas estão hoje na mão de seus funcionários, e a outra metade nas mãos das viúvas dos antigos funcionários. Fomos nós administradores que implantamos a justiça que Marx tanto sonhou, e não os acadêmicos socialistas como Arrow, Joan Robinson, e Paul Sweezy. Karl Marx ensinou três gerações de acadêmicos a pregarem a estatização, os monopólios estatais.. Petrobras, Vale, Eletrobras, Sabesp vendem commodities até hoje.
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Se Karl Marx tivesse estudado administração, Rússia, Cuba, China, Índia e o Brasil não estariam tão atrasados como estão hoje.
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Part V
Conclus천es
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Por Um Brasil Bem Administrado
Estamos chegando ao final deste livro. Hora das conclusões e planos de ação. Uma das tragédias deste país é que nossas lideranças políticas não aceitam a participação de administradores profissionais no preenchimento dos cargos de confiança, quando seus partidos são eleitos. Existem hoje mais de 5.000 executivos competentes, ex-presidentes e ex-diretores das 1.000 maiores empresas brasileiras, que estão aposentados aos 60 anos de idade, mas com muita energia ainda para oferecer. São relativamente ricos, com filhos encaminhados, que gostariam de contribuir para o social, doando três a quatro anos de suas vidas para um cargo público. Sendo ricos, dificilmente
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aceitariam ser corrompidos para dar uma obra para um e não para um outro. Sendo aposentados, dificilmente ajudariam um Banco que poderia ser um empregador agradecido depois que deixarem de ser Ministro da Fazenda, Diretor do Banco Central, e assim por diante. Trariam experiência prática e não meramente teórica, que por definição nem experiência é. Tendo trabalhado efetivamente 40 anos, sabem melhor do que ninguém os problemas que travam nosso crescimento. Acreditem ou não, estes aposentados querem fama e não mais grana. Querem sair da aposentadoria, querem ser úteis novamente, querem fazer algo pelo país. Aceitam o salário baixo do serviço público, em troca dos holofotes que perderam. Prefiro vaidade com competência do que vaidade com incompetência, que é a situação em que estamos. Estes 5.000 não procuram o poder, não fazem o lobby que políticos fazem para obter um cargo para um filho ou amigo numa estatal, e por isto não são convidados. Estes 5.000, pelo contrário, acham que precisam ser convencidos a sair da aposentadoria, acham que estão nos fazendo um favor, o que é verdade, e por isto precisam ser procurados e seduzidos. Sempre defendi Henrique Meirelles, um dos primeiros nesta categoria, porque ele representava o início de um Brasil bem administrado, honesto e socialmente responsável. Infelizmente nossos políticos não querem executivos já realiza-
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dos, ricos suficientes para se preocupar com os outros e não com suas finanças pessoais, preferem Professores de Universidades. Nossos colunistas de jornais e revistas também não percebem tudo isto e não conclamam por administradores com cabelos brancos, que não permitiriam os problemas acumularem, em vez escolhermos sempre jovens de 30 anos, acadêmicos idealistas mas ingênuos, que vão para o Governo adquirir experiência. Ninguém elogiou a decisão de Meirelles de apoiar o PT, uma decisão difícil para um executivo de um banco internacional e um deputado do PSDB. Ele fez muito pelo Brasil, mas todos os formadores de opinião ou ficaram em cima do rumo, ou o atacaram brutalmente. Uma decisão não tão difícil, se você é um Administrador da Escola Socialmente Responsável a qual ele pertence, que sabe que servir os outros não é uma traição ideológica, mas sim uma obrigação moral. Meu último artigo na Veja foi um elogio direto a Meirelles, “A Administra dministrad dores de Esq Esquerda uerda“, que vocês já leram, um capítulo deste livro. Precisamos mais exemplos como este.
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A Lei 7988/45 Que Atrasou o Brasil
Poucos historiadores relatam nos livros de História uma lei que atrasou o Brasil em pelo menos 30 anos. Uma lei que explica porque somos um país atrasado, ineficiente, improdutivo, com baixo crescimento, corporativista, cheio de empresas familiares, corrupto e clientelista. A lei é a 7988 de 1945. Uma lei que decretou o fechamento dos cursos de administração e finanças deste país. (Só em 1994 os cursos começaram a proliferar novamente no Brasil.) Decretou o fechamento de todos os cursos, e todos os professores de administração deste país foram demitidos. Inacreditável que os livros de História nada comentem, e que você leitor nunca soube deste fato. Vou repetir: Todos os cursos de administração que con-
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seguimos criar desde 1931 foram fechados por lei, e os seus professores demitidos. Enquanto outros países estavam criando cursos de administração, especialmente após a segunda guerra mundial, nós criamos uma lei fechando os poucos cursos de administração que tínhamos. Art rt.. 9º Fic icaam extint xtintoos a pa partir rtir do ano escola larr de 1946 46,, o cu currso superio superiorr de administr ministraação e fina finan nças e o cu currso de atuá atuária, ria, de qu quee tr trat ataa o Decr ecret etoo nº 20 20.1 .158 58,, ddee 30 ddee julho ddee 119931 31.. Vou repetir, porque é difícil de acreditar. Art. 9º Ficam extintos a partir do ano escolar de 1946, o cu currso superio riorr de administr ministraação e fina finan nças e o cu currso de atuá atuária ria de que trata o Decreto nº 20.158, de 30 de julho de 1931. Alguém pode justificar esta afronta aos futuros administradores deste país, aos atuários e ao próprio futuro deste país? É um mistério como historiadores e economistas puderam ignorar um fato deste nas suas análises do porquê do atraso deste país. Obviamente não pode ser devido ao capitalismo, porque no capitalismo se incentiva o ensino e o preparo prévio antes de comandar empresas com 1.000 a 5.000 funcionários. Esta lei atrasou a criação de uma classe gerencial neste país, que até hoje está perdida e sem liderança. Temos que correr atrás do prejuízo. Será que nossa passagem para a era do administrador está seguindo o caminho certo? Os EUA começaram essa fase em 1850. Lá e em todos os outros países, surgiu, na época, uma enorme antipatia dos intelectuais com relação às escolas de Administração. Nas escolas americanas, os intelectuais eram geralmente de esquerda e os administradores
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eram vistos como pessoas de direita. Até porque as primeiras escolas eram, realmente, para formar gerentes de empresas privadas familiares, que a gente conhece tão bem no Brasil. Em 1910, entretanto, surgiu nos EUA algo que não aconteceu em lugar nenhum do mundo. A esquerda mais prática – que é a de Harvard, onde eu estudei – percebeu que o administrador ia ser uma força política muito forte, e as empresas familiares iriam ser substituídas pelas de capital aberto e democrático, onde o administrador seria a peça chave, no lugar do capitalista dono. Então, Harvard muda esse negativismo, pensando assim: “vamos alinhar esses administradores do nosso lado, o lado social e não do lado dos capitalistas. Vamos criar, então, o curso socialmente responsável”. No Brasil, a animosidade dos intelectuais contra os administradores é visível até hoje, mesmo depois da revogação da Lei 7988 de 1945, a lei que criou a profissão do Economista. Por exemplo, a Universidade de São Paulo expulsou o MBA de lá. E isso é até assustador, porque 10% do ICMS do Estado de São Paulo vai para as universidades públicas estaduais. Ou seja, nós temos os professores que, apesar de receberem 10% do imposto que é arrecadado pelas empresas, são contra o ensino de Administração. Conto com vocês.
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Quem Salvará o Capitalismo dos Capitalistas?
A ideia de Alan Greenspan e de muitos neoliberais de que o mercado se autorregula, não se concretizou. A ideia de que o Banco Central, o FED, do poder regulador de alguns economistas esclarecidos no comando da Economia, o SEC, a Sarbanes-Oxley, as leis e os regulamentos que já controlavam o capitalismo dos capitalistas há algum tempo, também não funcionaram. O problema do mundo é que o Capitalismo já estava sendo “salvo”, mas pelas pessoas erradas. Se não são os políticos, os acadêmicos, os intelectuais, os bispos, a religião, a ética, a filosofia que irão salvar o capitalismo dos capitalistas, quem será? Uma das grandes descobertas da Ciência da Administração foi que controlar o produto depois d dee prod produzi uzid do nã não o fun funci ciona ona.
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Testar produto por produto para saber se ele está dentro do 1% permitido de margem de segurança, dentro dos regulamentos, e punir os funcionários faltosos, não funciona. Mais ou menos, é este o modelo que se discute agora para salvar o capitalismo. Desde 1980 estudiosos em Administração perceberam que a solução era focar nos insumos e não no produto final. A teoria é simples. Os insumos e os processos sendo de qualidade, o produto também o será. Hoje nas empresas, nem testamos mais os produtos que saem de linha. Sequer ligamos o motor. Este é o caminho para resolver a crise do capitalismo. Avaliar, selecionar melhor os insumos bem como os processos, e não os resultados. Físicos e Economistas que nunca estudaram Ética nos Negócios, que nunca aprenderam Administração Creditícia, nunca poderiam ter sido promovidos aos cargos nos Bancos como foram. Estes jovens sequer tinham uma reputação a perder, algo que ocorre com Médicos e Administradores que pisam na bola. Quando estes acadêmicos erram, simplesmente voltam para suas escolas de Chicago e Yale, de onde nunca deveriam ter saído. O compromisso deles era exclusivamente com a Física e a Matemática, e com os bônus prometidos. Precisamos escolher corretamente os insumos. Uma lei ficha limpa precisa existir não somente para políticos, mas para administradores de empresas de capital aberto, especialmente bancos. E o primeiro item é saber se foi formado em Administração
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Stephen Kanitz
Bancária antes de entregar 1 bilhão para estes malucos administrarem. Por isto, tenho batido na mesma tecla há 34 anos desde quando escrevia na Revista Exame, a primeira revista de negócios do Brasil. “O único que poderá salvar o capitalismo dos capitalistas é o Administrador Socialmente Responsável, treinado, educado, conscientizado, selecionado, almejado e valorizado pela sociedade, para executar exatamente esta função.” Para quem não acompanha esta tese, Administradores Socialmente Responsáveis são aqueles que se preocupam com os Stakeholders, e não somente os Stockholders, inglês para capitalistas. Stakeholders são todos aqueles que têm um compromisso com as empresas, que vai desde os trabalhadores, fornecedores, colaboradores, que tal qual os capitalistas também “investem” na empresa. Para o desespero das escolas de Chicago, ficou evidenciado que Administradores Socialmente Responsáveis não maximizavam o lucro do acionista. Pecado mortal. De fato, damos aumentos aos funcionários para mantê-los fiéis, trocamos produtos defeituosos sem fazer perguntas ao cliente, mantemos os acionistas felizes com dividendos mínimos, mas crescentes. De fato não almejamos o lucro máximo, porque acreditamos que o lucro máximo não é autossustentável, tese que se confirmou com esta crise. Para minar este movimento da Administração, a Escola de Chicago inventou o “bônus”, o Stock Option, para alinhar novamente o administrador profissional com o capitalista e maximizar o lucro trimestral.
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A Missão do Administrador
Que deu no que deu. Não existe esta tal mão invisível do mercado pregada pelos economistas e os neoliberais. Nem tampouco existe esta mão visível do Estado que provou ser ágil e capaz de resolver a crise do capitalismo, mas somente depois que ela ocorreu. Quem pode salvar o capitalismo dos capitalistas é o movimento da Administração Socialmente Responsável, que prevaleceu até os anos 80. Se você é um jovem desiludido com o Capitalismo de Mercado e com o Capitalismo de Estado, não se preocupe, existe uma luz no final do túnel. Se você não acredita mais no poder do mercado regulador, nem nos regulamentos elaborados pelo Estado, existe uma solução. Se você sente que o mundo está à deriva, sem controle, um salve-se quem puder, existe uma salvação. Ela dependerá de um movimento que envolverá dois milhões de profissionais, que estejam dispostos a serem treinados, que estejam dispostos a seguir uma linha ética e de conduta socialmente responsável. Que estejam dispostos a seguir os valores compartilhados de uma profissão voltada não a defender os capitalistas, Wall Street e Washington, mas promover o bem-estar de todos que investem nas empresas em que colaboram. Isto já foi feito em outros países há mais de 100 anos. Agora só depende de você, Administrador Socialmente Responsável.
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A Missão do Administrador Brasileiro
A cada ano surgem dezenas e dezenas de modismos empresariais. Destes, um ou outro pega e vira coqueluche. “Reengenharia”, “zero-defects”, “organizações que aprendem”, etc… são alguns exemplos. Muitas dessas coqueluches são teorias simples, algumas até antigas com roupagem nova, moda feita especialmente para manter nós, consultores, em demanda e com clientela. Não somos os únicos a criar moda, diga-se de passagem. O problema com estas coqueluches não está no fato de serem modismos. O grande perigo está na sua natureza. Ao adotar coqueluches administrativas de países de Primeiro Mundo, estamos importando modelos que são soluções eficazes para os problemas do Primeiro Mundo.
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A Missão do Administrador
Nossos problemas são outros, e requerem outras soluções. Nós ainda não precisamos “reinventar a organização”, precisamos somente criá-la corretamente do início. Não precisamos fazer a “reengenharia” das nossas empresas, somente a engenharia. O Brasil não precisa ainda desmontar o que foi feito, como é o caso das empresas americanas, porque tudo ainda está por fazer, exceção feita a algumas grandes empresas de São Paulo, que de fato precisam se reinventar. Se olharmos, porém, as empresas de Santa Catarina, Minas Gerais, Paraná e Ceará, veremos que estão dando um banho de eficiência justamente porque não precisam se reinventar, não precisam de reengenharia. A era do administrador está ainda no seu nascimento e vamos dobrar o número de empresas existentes. Santo de casa não faz milagre, diz um ditado brasileiro, mas soluções de fora também não. Problemas brasileiros requerem soluções brasileiras. Esta afirmação gera enormes calafrios, porque embora seja relativamente óbvia, ela nos coloca cara a cara com a nossa pobreza criativa. De fato, falta talento criativo nesta área, uma das razões pela qual copiamos de pronto os modismos de fora. Porém, copiar não é a saída, embora muitos acreditam que é uma perda de tempo reinventar a roda se Peter Drucker, Michael Porter e Phillip Kotler já acharam a solução. Minha experiência profissional, aliás, mostra justamente o contrário. Quem reinventa a roda tem mais chances de achar uma inovação tecnológica do que aquele que simplesmente a copia.
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Stephen Kanitz
O PIB brasileiro nesta virada de milênio é similar ao PIB americano de 1920. Entre 1910 e 1920 a grande discussão acadêmica e empresarial nos Estados Unidos era como transformar estrutura familiar em estrutura profissional – a mesma discussão que vivem as grandes empresas de capital nacional. Em 1919 fundava-se nos Estados Unidos a Associação Nacional de Contadores de Custos, organização que até hoje não conseguimos criar no Brasil. Em 1920 os Estados Unidos possuíam 150 milhões de habitantes, praticamente a mesma população do Brasil nesta virada de século. As semelhanças entre o Brasil de hoje e os Estados Unidos de 1920 são enormes. Por isto, se vocês insistem em ler livros americanos de administração, comecem com os livros escritos em 1920. Como ninguém vai achar que estou falando sério e vão querer ler os autores de hoje, como Peter Drucker, comecem com os livros que ele escreveu em 1950. “Effective Management” falava da necessidade de introduzir contabilidade de custo, por exemplo, algo que muitas empresas até hoje não tem. O “Managing For Results”, escrito em 1953, contém uma dezena de técnicas de gerenciamento elementares que muitas pequenas e médias empresas brasileiras ainda não utilizam, como curvas ABC. Leiam também a literatura americana de administração de 1950, 1940 e 1930. Com certa dose de adaptação, a leitura será muito proveitosa. O ano de 1950 não precisa ser encarado como um atraso e retrocesso, e sim como fonte de inspiração.
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A Missão do Administrador
Esta ideia brasileira de pular etapas é uma bobagem intelectual. Podemos no máximo acelerar etapas, jamais pulá-las. E finalmente, não deixem de ler os poucos gurus de administração que temos no Brasil, especialmente aqueles que não ficam meramente na tradução de coqueluches do além-mar. Boa sorte.
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