Santo Antônio e sua linha mestra

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE ARTES DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO

STEPHANIE RIBEIRO AZEVEDO

SANTO ANTÔNIO E SUA LINHA MESTRA: A AVENIDA SANTO ANTÔNIO NO TEMPO E NO ESPAÇO.

VITÓRIA 2012



STEPHANIE RIBEIRO AZEVEDO

SANTO ANTÔNIO E SUA LINHA MESTRA: A AVENIDA SANTO ANTÔNIO NO TEMPO E NO ESPAÇO.

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Arquitetura e Urbanismo do Centro de Artes da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito para obtenção do título de Arquiteta e Urbanista. Orientadora: Profª Clara Luiza Miranda Co-orientadora: Profª Martha Machado Campos Convidado: Anna Claudia Dias Peyneau

VITÓRIA 2012



FOLHA DE APROVAÇÃO STEPHANIE RIBEIRO AZEVEDO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO APROVADO EM __ /__ / ____ .

ATA DE AVALIAÇÃO DA BANCA

AVALIAÇÃO DA BANCA EXAMINADORA NOTA

DATA

ASSINATURA

NOTA

DATA

ASSINATURA

NOTA

DATA

ASSINATURA APROVADO COM NOTA FINAL



AGRADECIMENTOS Agradeço aos primeiros parceiros do processo como a Lilian e o Karlão Aos sempre presentes, a Sofia e a Paula As trocas de idéias sobre o caminho, a bagagem e o veículo com o Bruno, o Henrik e a Samira Àqueles que acompanharam indas e vindas, em passeios e derivas À família, primos, tios, e amigos com afetos, memória e disposição Aos que ouvi com paciência como o Arabelo, Laura, Vera, Cláudio, Penha, Kleber e aqueles que cruzei pelo caminho A Clara, a Martha, a Sônia pela luz sobre o meu olhar e a Anna por partilhar desse momento Especialmente ao meu pai, mãe e avós pela essência desse olhar sobre a casa, a rua e o mundo em que vivo... Obrigada pela crença!



Tal como o tempo social acaba engolindo o individual, a percepção coletiva abrange a pessoal, dela tira sua substância singular e a estereotipa num caminho sem volta. Só os artistas podem remontar a trajetória e recompor o contorno borrado das imagens, devolvendo-nos sua nitidez.1

Figura 1.1 A volta de Caratoíra a partir do morro do Alagoano por volta de 1960. Fonte: IJSN. 1

BOSI, Ecléa. O tempo vivo da memória : ensaios de psicologia social. São Paulo: Ateliê, 2004.


Para aproximar o leitor à ambiência da avenida, a cada capítulo temos os hiperlinks do mapa relacionados à numerais da mesma cor no texto. 0 Observador 0 Pontos citados 0 Morador


SUMÁRIO Apresentação

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Introdução

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Objetivos e métodos

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Inserção urbana de Santo Antônio

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Histórico

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Evolução urbana

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Memória e Vivência

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Imersões na trajetória e estória

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Cartografias e morfologias do lugar

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A estrada Santo Antônio e a expansão urbana

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Ruas que costuram

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Tipologias e trasnversalidades

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Análise Sequencial Análise morfológica segundo Phillipe Panerai

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Considerações Finais

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Anexos

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Roteiro de Entrevista

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Lista de Imagens

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Referências Bibliográficas

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APRESENTAÇÃO


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Figura 1.2. Baía oeste de Vitória, Santo Antônio e sua linha mestra. Fonte: Acervo Baía de Vitória.


INTRODUÇÃO Trata-se de um estudo empírico, com certa carga afetiva, e que se respalda nos elementos que compõem a cidade, na vivência-experiência pessoal e de outros/com outros, observando, analisando Santo Antônio e sua linha mestra como paisagem e morfologia urbana, mediante meios da teoria da arquitetura, da cidade, da geografia com recursos de textos, de fotografias, entre outros meios. Assim, dentre esses recursos estão a história oral de moradores, relatos, material publicado, registros fotográficos, cartografia, impressões de derivas e observações em vários momentos ao longo do estudo. A finalidade é registrar a condição morfológica e socioambiental da Avenida Santo Antônio na região de Santo Antônio em Vitória, Espírito Santo. Um dos motivos que me levou a este estudo envolve uma vivência daquele ambiente na minha primeira infância, além de relatos de familiares que vivem na região a cerca de quarenta anos, e que me estimularam a entender a dinâmica urbana daquela região no contexto da cidade de Vitória. Quando criança, morava na parte continental da cidade, em Jardim da Penha, e costumava ir ao bairro de Santo Antônio à casa de meus primos. A singularidade do percurso que fazíamos, a distância, e os meandros que percorríamos até lá me chamavam atenção. Ao tomar o ônibus perguntava pra mim mãe, “É só esse que podemos pegar, mãe?” e ela respondia “Sim, só o Estrelinha.”, nome do bairro onde ficava o ponto final. Depois de cruzar o centro da cidade (trecho que me era mais conhecido no meu cotidiano), entrar na Av. Santo Antônio era uma novidade. Mas não por causa da paisagem, talvez não tivesse altura para observá-la tanto pela janela. Mas as curvas que o carro fazia e o ambiente, diferente da praia, com a sensação do ‘contorno’ relacionado a um morro me instigavam. E ainda tinha a noção de que ao terminar essa experiência sinuosa, essa ambiência, era hora de descer. Os passeios com os primos eram singulares, para mim. O Sambódromo #1, o Parque Tancredão #2, o Santuário de Santo Antônio #3, e suas grandes escalas me chamavam atenção. Lugares de destaque ‘escondido’ por detrás daquele percurso. Nem um deslumbre, nem repulsa, mas a sensação de estar em um local próprio, me tomava, e talvez por isso guarde tantas lembranças.


Santo Antônio e sua linha mestra

Dos estudos feitos durante a faculdade, destaco dois que deram luz ao presente estudo. Primeiro, sobre o bairro da Praia do Suá2, com um histórico de consolidação cultural e urbana baseado na atividade pesqueira que perdura ainda nos dias atuais. Segundo, o bairro de São Benedito3, aglomerado urbano com ocupação marcada por intensa luta dos moradores que vigora até hoje na busca da população por mudar o quadro de precariedade física e marginalidade social em que o bairro se conformou. Notei nessas pesquisas uma forte relação da morfologia urbana e o processo de ocupação com a demanda sócio, econômica e cultural que orienta a apropriação desse espaço, além da configuração do próprio espaço físico natural. Outra abordagem de consolidação urbana interessante foi feito em Cartografias da Maré, sobre a favela da cidade do Rio de Janeiro. Paola Berenstein (2002, p.25) mostra que a ocupação do Timbau, uma das regiões apresentadas, foi dificultada pelos terrenos que eram pantanosos e irregulares e pelo controle exercido pelos militares, que se diziam donos do terreno, a ocupação resultou numa baixa densidade habitacional com grandes afastamentos entre as edificações e boa circulação. Desta forma se vê que a relação entre o sítio e o tipo de ocupação inicial são decisivos para a caracterização da morfologia e principalmente para o desenho das vias que estruturam o setor urbano. Para o estudo da região de Santo Antônio, o histórico é essencial, já que também existe o fato de ser considerado por muitas pessoas da região, o primeiro bairro de Vitória. Com base na declaração de Adelpho Monjardim em Vitória Física (1995, p.16), houve uma transferência da povoação da área continental sul, cidade de Vila Velha, para a ilha maior, no contexto da colonização portuguesa no Brasil em 1554. Sobretudo, batizada sob a invocação de Santo Antônio. Nas palavras de Serafim Derenzi (1995, p.25), a ilha, inicialmente batizada com o nome do santo, preserva esse nome na porção oeste da cidade, a região de Santo Antônio, aproximando nome e lugar aos primeiros vestígios da cidade de Vitória. Com o tempo a ocupação de Santo Antônio se inicia através das fazendas no século XVII. “Ao limiar do século XVII (...) 2 3

2009.

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Trabalho da disciplina Urbanismo 1, Praia do Suá, 2008/1. Projeto Habitação, Memória e Vivência em São Benedito. Célula EMAU,


Apresentação

os colonos plantam de Caratoíra a Santo Antônio. Da Capixaba até a Passagem abrem lavouras de mantimentos...” (DERENZI, 1995, p.61). A Av. Santo Antônio, antes estrada, exerce papel interlocutor, guia dessa ocupação a oeste do centro, já que a vila, até o século XX, se concentra entre a Capixaba (atual limite com Forte São João) e a Vila Rubim.

Figura 1.3. Cais do Hidroavião ao fim da Rua Dom Benedito. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. #1

Além disso, uma certa continuidade física e temporal na condição da avenida, tanto do seu estado físico e do seu conteúdo, quanto da sua utilização, e do que ela representa no imaginário das pessoas, é percebida ‘quase’ inalterada. Dos primeiros relatos4 até aos

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“Na direção oeste, deixando o centro, passando pelas áreas do Campinho, as ocupações sucediam-se rareadas, mas sempre margeando de um lado e do outro o caminho que levava à fazenda Santo Antônio. Este caminho não parecia mais que uma trilha de cavalo que tocava o Maciço Central, acompanhando uma de suas curvas de nível.” CAMPOS JÚNIOR, Carlos Teixeira de. O novo Arrabalde. Vitória: Prefeitura Municipal de Vitória, 1996.

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de hoje percebe-se uma recorrência das impressões dos moradores pautada na ambiência tortuosa; e há muito tempo se faz referência a esses lugares: o Clube Náutico Brasil #4, a Escola de Samba Novo Império #5, o Santo Antônio Futebol Clube #6, o Cais do Hidroavião #7, os cemitérios #8, a Igreja Matriz #9, o Santuário de Santo Antônio, o Sambão do Povo, a Prainha #10, e o Parque Tancredão como enumera Adriana Bravim (1998, p.13) no livro da história do Bairro Santo Antônio. Mesmo não estando todos os equipamentos citados dentro do bairro propriamente dito, todos pertencem a região de Santo Antônio, definida pela Prefeitura Municipal de Vitória como o extremo oeste da ilha, numa denominação que atende ao reconhecimento territorial da própria população. Somando-se estes, outros marcos que aparecem nesta pesquisa como a Escola Alvimar Silva #11 – antiga Obra Social São José, a curva do Rabaioli #12 e o Ponto Chic #13, percebe-se uma recorrência da posição dos espaços significativos do bairro na própria Av. Santo Antônio ou próximos a ela. Observa-se também que a citação desses marcos pelos moradores sempre carrega com eles ou uma menção histórica ou uma lembrança de fatos ocorridos naquele cenário. Conclui-se então, que essa recorrência de tais marcos em torno da avenida ajudam a ilustrar a trajetória dela no tempo e no espaço, e mais do que isso, sustentam a história de toda a região, uma vez que ao longo dela estão ‘amarradas’ as principais referências do local. Assim desenhamos a evolução da região por sua própria linha mestra, a Av. Santo Antônio. Contudo, nesse trabalho se mostra como a morfologia urbana e a ocupação humana dialogam na consolidação da Av. Santo Antônio como espaço urbano, registrando sua feição nos primeiros registros até na dinâmica da cidade atual.

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Apresentação

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 1.4. Fim da Av. Santo Ant么nio na interse莽茫o com a Av. Serafim Derenzi. #2

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Apresentação

OBJETIVOS E MÉTODOS “Todo relato é um relato de viagem.” diz Michel di Certeau sobre a prática do espaço no cotidiano (2005, p.200). Ele diz que todas as narrativas que lemos no nosso cotidiano, se referem a uma atribuição do espaço e produzem geografias de ações. As narrativas, desta forma, descrevem uma trajetória, relacionam tempo e espaço. “Em suma, o espaço é o lugar praticado. Assim, a rua geometricamente definida por um urbanismo é transformada em espaço pelos pedestres.” (CERTEAU, 2005, p.202) O movimento condiciona os espaços até então estáticos, uma pedra, uma árvore, uma casa, criam espaço para narração de uma história. A leitura desses lugares praticados, da apropriação humana, de seus anseios e de sua memória, remonta o espaço praticado que dá luz a um território existencial, constituição de realidades. (JACQUES, 2002, p.56)

Paola Berestein faz a leitura do espaço através do lugar, corpo e memória conferindo subjetividade ao estudo do território das favelas. Nesse sentido, vimos sobre a Av. Santo Antônio tratar as impressões obtidas desse lugar no contexto acadêmico, familiar e social. Esses traços da avenida levados ao estudo, são obtidos em momentos que compreendem o histórico, o presente, e o imaginário, e perpassam as impressões construídas por mim nos momentos de vivência do lugar. O estudo, portanto, visa uma construção da trajetória da avenida na comunidade e o contexto histórico, social e cultural em que se insere. Sob essa premissa estuda-se esse objeto de trabalho também confrontando aos conceitos de morfologia urbana e percepção ambiental. Visita-se a avenida desde o âmbito da memória, no resgate dos diversos cenários estabelecidos ao longo do tempo, pela apreensão do lugar, pela vivência e pelas experimentações, até o quesito acadêmico que embasa a análise urbana do lugar. Após a decisão de trabalhar com o bairro de Santo Antônio foi feita uma primeira visita com a finalidade de levantar indagações e questões sobre uma possível temática a tratar. Nessa primeira | 23


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visita, percebi a necessidade de conhecer a região que circundava a Av. Santo Antônio. E uma harmonia, pautada na linearidade, na escala espacial constante e na recorrência morfológica em vários trechos encobre uma interlocução, de fato, não harmônica, entre a ocupação humana e a relação montanha-mar suprimida pelos aterros, e a expansão desordenada da cidade na ilha. Uma visita ao passado também é feita através de entrevistas com os antigos moradores e atores da trajetória da região. Sob influência dessa história e com as impressões adquiridas do lugar fizemos algumas imersões nesse espaço. Passeios com carga afetiva com minha mãe Rosemar, passeio rico de informações com a Lilian, com um olhar apurado na perspectiva urbana e da subjetividade com a Clara e Samira, num momento de festa no carnaval com amigos, entre outros. Em cada momento se observava elementos da rua, próximos a ela e as formas de apropriação sobre ela. Assim, Philippe Panerai destaca um significado relativo na categorização dos elementos de uma paisagem (2006, p. 36). Trata

Figura 1.5. Curva do Rabaioli tomada pelo bloco de carnaval Fora de Hora. #3

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Apresentação

que a análise visual de um ambiente varia de acordo com as percepções de um analista. Ela tende a ser vigorosa quando feita por um iniciante, que tende a sublinhar o perigo, destacar elementos, ou enfatizar importância, digamos que, dando um ar fantástico ao seu objeto. De outra forma, quando praticada por um indivíduo distante da dinâmica do lugar, por aquele que até mesmo não se vale dos instrumentos mais específicos pra conhecer o objeto de estudo, acaba por se valer apenas de técnicas reducionistas, no sentido de reduzir particularidades. Essas condutas são provenientes do cotidiano contemporâneo, em que o objetivo se detém a categorizar os espaços urbanos para tratá-los em projetos rasos nessa alta velocidade cultivada pelo mundo moderno. Em contrapartida este estudo se propõe a realizar leituras próprias da Av. Santo Antônio sem a presunção em comparar, eleger, ou categorizar em definitivo o lugar estudado e seus moradores. Nesse sentido, essa pesquisa prima por uma análise da sua própria perspectiva de avenida, dentro do que ela se dispõe a ser. Do que alcança dentro da sua área de influência. Do perfil em que se configura. Dentro do contexto urbano e dos preceitos a que foi submetida. Do que ela tem de própria, e em que ela é múltipla. E busca-se ver qual é o intuito em ser o que é, e como ela se refaz, a cada interseção, a cada passo e a cada ano.

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 1.6. Vista da Pedreira e da Bas铆lica de Santo Ant么nio a partir da ba铆a. Fonte: SkyscraperCity #4

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Apresentação

INSERÇÃO URBANA DE SANTO ANTÔNIO O bairro Santo Antônio se limita a um segmento que vai da rua do Cais do Hidroavião #7, a Rua Dom Benedito, até a fronteira com o bairro Bela Vista ao norte, adentrando para o interior alguns quarteirões, para trás do cemitério público. Compreende o Morro do Pinto #14, a praça da Prainha, de onde se visualiza a Ilha da Pólvora #15 e a Basílica de Santo Antônio #3. No entanto, se entende como região administrativa de Santo Antônio uma porção maior entre a baía oeste e o Maciço Central. Esta região envolve bairros que vão desde a área central, na área do projeto Portal Sul de Vitória5- até o limite com a Grande São Pedro. O objeto de estudo, no entanto, se refere à Av. Santo Antônio e ao contexto urbano imediato: comunidades e bairros que a utilizam como acesso, circulação, conexão, e moradia ou local de permanência. Numa impressão que precede a análise morfológica, o início da avenida para quem está vindo do Centro, passando pela Vila Rubim em direção a Avenida Duarte Lemos #16, está no ponto em que esta se divide, para a esquerda no sentido para a rodoviária #17, e para a direita rumo a Caratoíra. A Av. Santo Antônio se inicia na Vila Rubim e Ilha do Príncipe, e a partir daí segue pelos bairros de Caratoíra, Mário Cyprestes, Ariovaldo Favalessa, até meados do bairro de Santo Antônio, e termina junto a escola Ludovico Pavoni #18, atrás da Basílica de Santo Antônio. Neste trabalho o entendimento do território de Santo Antônio se volta para um espaço vivenciado em torno de nós e marcos da região citados pelos seus habitantes. Esse território começa a ser identificado por marcos reincidentes na narrativa dos moradores 5

“O Projeto Portal Sul é uma iniciativa da Prefeitura de Vitória – ES que visa a requalificação urbanística da região de acesso à cidade pelo seu lado sul e está articulado a um programa mais amplo de reestruturação urbana da Capital intitulado Planejamento Interativo do Centro de Vitória. A área de projeto do Portal Sul está situada na região sul da ilha de Vitória, junto aos acessos principais da cidade definidos pela ponte Florentino Avidos e a ponte Carlos Castelo Branco, também chamada Segunda Ponte de Vitória, e estende-se do Mercado da Vila Rubim ao Sambão do Povo, nas imediações do bairro Santo Antônio e Mário Cyprestes.” Projeto Portal Sul – Etapa 3, DAUS Arquitetura, 2008.

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do bairro, como exemplo: o Santuário de Santo Antônio (até recentemente chamado), a Igreja Matriz, a Prainha, os cemitérios, o Santo Antônio Futebol Clube, o Cais do Hidroavião, o Sambão do Povo, o Parque Tancredão, a Escola de Samba Novo Império e o Clube Náutico Brasil (BRAVIN, 1998, p.13). A sequência mostrada pela Adriana Bravin citada acima, também relatada por muitos participantes da consolidação do bairro, mostram: os marcos da paisagem e da vida social do bairro; uma sequência física, geográfica que faz a trajetória da linha da Av. Santo Antônio; numa expansão dos limites entendidos como bairro Santo Antônio para além do recorte administrativo estabelecido pela Prefeitura. Além desses pontos, vê-se recorrente nas narrativas dos moradores referências ao antigo restaurante Mar e Terra #19, à curva do Rabaioli, ao Ponto Chic, à volta do Caratoíra #20, lugares que fazem parte de Caratoíra e Vila Rubim, mas que não deixam de ser citados, com mais ênfase pelos mais antigos, como parte do bairro de Santo Antônio. Cláudio6 diz que considerava Santo Antônio em sua juventude o trecho desde meados da Vila Rubim até um limite com a Grande São Pedro, onde é a garagem da viação Grande Vitória. Já para Karlos7, Santo Antônio se apresenta similar a formação política atual, limitada pelo rua do Cais do Hidroavião, no interior, por Caratoíra e se finda no início da Av. Serafim Derenzi. Estas distintas visões mostram uma alusão do nome do bairro à evolução urbana do local, e não somente a uma divisão política. Elas são formas variadas de apreensão do território de Santo Antônio, entretanto, a que este trabalho aborda, é marcada pelas imediações de sua avenida principal. A fim de evidenciar a situação sócio-econômica dessa área de estudo, apresento um quadro de dados da região administrativa de Santo Antônio, em paralelo à condição geral do município de Vitória. Estima-se, a partir do Censo de 2010, que a região tenha 6 Cláudio Mazzini, morador de Santo Antônio a 40 anos. Mora na Rua Dom Benedito, a que desce até o Cais do Hidroavião. #1 7 Karlos Rupf, morador de Santo Antônio a 25 anos. Mora no final da Av. Santo Antônio. #2

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Apresentação

Figura 1.7. Dados sócio-econômicos da região de Santo Antônio. Fonte: Vitória em dados, Prefeitura de Vitória - PMV.

uma porcentagem de cerca de 11% da população total do município. Ao analisar os equipamentos públicos que atendem a região, vemos uma proporção à quantidade de moradores, havendo um déficit em equipamentos de Meio Ambiente, Segurança urbana e Serviços. Vale mostrar que mesmo não atendendo toda a demanda pública, o único cemitério público de Vitória está nessa região. E com outros cinco cemitérios na região, que são parte significativa na história da formação do bairro, atendem a cidade de Vitória majoritariamente, havendo apenas outros deles na Grande Maruípe. A assistência social é outro fator de destaque nos números e no histórico da região. Como será tratado adiante, a Obra Pavoniana instalada em Santo Antônio em 1941, fomenta projetos sociais na região e em São Pedro desde aquela época. Hoje, muitos de seus projetos foram incorporados pela gestão municipal representando boa parte dos projetos sociais da cidade. Outra categoria de destaque é o Transporte, que conta com o número de linhas de ônibus municipais que percorrem a região em relação ao total de linhas da capital, que somam 28%, mostrando que a Av. Santo Antônio é um eixo viário importante de Vitória.

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Figura 1.8. Recorte do território de Santo Antônio sobre foto aérea da ilha de Vitória. Fonte: Google Earth.

Bairro Santo Antônio Bairro Mário Cyprestes Bairro Ariovaldo Favalessa Bairro Caratoíra Bairro Vila Rubim Bairro Ilha do Príncipe 30 |


Apresentação

| 31 Figura 1.9. A região oeste da baía de Vitória, a Avenida Santo Antônio com os bairros contíguos a ela destacados sobre foto aérea. Fonte: Sirges.


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Figura 1.10. Mapa de navegação da cidade de Vitória de 1936 ainda sem os principais aterros na baía. Fonte: Acervo Antenor Guimarães.

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Apresentação

HISTÓRICO

Figura 1.11. Vista da região do atual aterro da Comdusa a partir do morro do Alagoano na década de 1940. Fonte: IJSN. #5

No princípio o que nos levou a Santo Antônio foi o mar: A exploração do território espírito-santense começou pelo reconhecimento da baía, que se supunha foz de um rio. As ilhas menores foram doadas nos primeiros dias. (...) e a maior, batizada em 13 de junho sob a invocação de Santo Antônio. (DERENZI, 1995, p.25)

Já no início do século XX, o bonde refaz o caminho da vila fundacional até a estrada de Santo Antônio. Essa linha que conecta no tempo e no espaço. “Santo Antônio foi o primeiro bairro de Vitória”, diz Cláudio e outros vários moradores em suas declarações. Esse dito se vale do conto do descobrimento e da ocupação da ilha de Vitória.

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Figura 1.12. Fotograma da Baía de Vitória englobando a Ponte Florentino Avidos, Ilha do Príncipe, Vila Rubim e Santo Antônio. Nota-se a ocupação concentrada ao longo da avenida. Fonte: Arquivo Geral de Vitória.

À Duarte Lemos, que veio da Bahia com alguns colonos, doou Vasco Fernandes Coutinho a ilha de S. Antônio a 15 de junho de 1537 (...); para onde o donatário transferira a sede da povoação que criara, com o nome de Vila Nova, provavelmente em 1554 como elemento de segurança contra os ataques índigenas (MONJARDIM, 1995, p.16).

Ao fugir dos ataques indígenas, nas terras do continente, atual cidade de Vila Velha, os colonizadores se voltaram para a ilha de Santo Antônio, tendo a porção oeste da cidade guardado o nome Santo Antônio até hoje. Até o século XIX, a grande fazenda que abrangia a região de Santo Antônio estava fora dos limites da cidade. “Ao limiar do século XVII (...) os colonos plantam de Caratoíra a Santo Antônio. Da Capixaba até a Passagem abrem lavouras de mantimentos...” (DERENZI, 1995, p.61).

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Apresentação

A plantação para abastecimento da capital era premissa básica da região até o século XX quando se iniciaram alguns loteamentos: “A área ocupada fazia parte da Fazenda ‘Santo Antônio’ de propriedade do Estado, que foi loteada e vendida no Governo de Jerônimo Monteiro em 1910.” (Secretaria de Desenvolvimento da Cidade, s.d.) No entanto, a população residente à oeste do centro era vista como periférica e marginalizada. Campos Júnior cita a Cidade de Palha, região de casas simples, onde hoje é a Vila Rubim. Se se pode admitir já naquele tempo a existência de uma segregação do espaço por questões de renda da população, atribuímos que na Cidade de Palha estavam localizados os habitantes de baixa renda da Capital (CAMPOS JÚNIOR, 1996, p.126).

Figura 1.14 mmm

Figura 1.13-1.14. Entrada da Vila Rubim pela Avenida Duarte Lemos #6 e vista a partir da Ilha do Príncipe da década de 1920 #7. Fonte: Acervo Santa Casa de Misericórdia e Coordenadoria de Revitalização Urbana.

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Derenzi (1995, p.140) narra o fracasso na urbanização da Cidade de Palha no início da república, como medidas sanitaristas do governo. O projeto de loteamento da área, feito pela Companhia Brasileira Torrens não teve êxito. Derenzi alega que a concessionária não mostrou conhecimentos técnicos em projetar vias em área montanhosa “Vila Rubim tornou-se favela irrecuperável”, diz. É dado um fato que ajudou a denegrir a imagem da zona oeste da cidade. Seguindo para Av. Santo Antônio temos Caratoíra, bairro dividido em parte baixa e alta, que teve sua ocupação iniciada na década de vinte nos moldes de invasão. Em 1922, cerca de 50 famílias de operários ligados ao porto ocuparam um cemitério abandonado. “Os barracos foram rapidamente substituídos por casas de alvenaria e as famílias se integraram ao convívio da comunidade.” (Secretaria de Desenvolvimento da Cidade, s.d.) As ruas do bairro começaram a ser pavimentadas em 1962 e já com ruas calçadas, Caratoíra foi atraindo moradores de classe média. Essa ação governamental, nova medida sanitarista, conta também com a remoção e transferência de casas de prostituição que haviam ali para o bairro São Sebastião na Serra. A volta do Caratoíra tinha fama por essas “casas alegres” que animavam a região de Vitória. Com uma sequencia de três casas de entretenimento, nesse lugar as pessoas bebiam, jogavam cartas, dançavam e namoravam. (VILAÇA, 2006, p.49) O termo ‘alegre’ usado por Adilson Vilaça, demonstra a maneira como as mulheres eram vistas nesses estabelecimentos. Elas não eram forçadas a atender clientes, nem pelos frequentadores, nem pelas proprietárias da casa como o corriqueiro quadro da prostituição se apresenta. Essas casas tinham notório destaque na sociedade capixaba na época, e junto com o Mar e Terra, o Bar Santos entre outros agitavam a noite nessa região da cidade na década de 1960. Contígua a essa ocupação dada em Caratoíra, em 1947 a chegada de “uma caravana de pavonianos” movimenta a região de Santo Antônio. “A venda de parte da fazenda Santo Antônio aos padres pavonianos, no inicio de 1941, mudaria radicalmente o perfil periférico de Santo Antônio.” (BRAVIN, 1998, p. 9) Os padres incre-

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Apresentação

mentaram a vida cultural do bairro com a exibição de vídeos no salão da escola, organizaram grandes procissões, além disso, implementaram a assistência à população carente local no prédio das Obras Sociais São José.

Figura 1.16 ...

Figura 1.15-1.16. Ocupação de Santo Antônio. Cemitérios e vida social do bairro incrementada a partir da década de 1940. Fonte: IPHAN e Arquivo Geral de Vitória. #8

A Ordem Pavoniana no Brasil, ao instalar-se em Santo Antônio, adotou muitos projetos sociais voltados principalmente para as crianças. Tanto em Santo Antônio como no bairro de São Pedro, fomentaram atividades como o Lar da Menina, a clínica Mens Sana, escolas profissionalizantes, e junto com as atividades diretas da Igreja acreditam, como diz o Padre Renzo Flório, (BRAVIN, 1998, p.10) ter uma média de 2.500 crianças atendidas em trabalhos sociais ao ano. Isso firma a tradição de obra social que tem o bairro até hoje. A chegada da Obra Pavoniana na região foi fundamental na consolidação dessa comunidade no apoio a ações de desenvolvimento social. | 37


Santo Antônio e sua linha mestra

A região é incrementada a partir da década de 1940 também com a chegada do cais do Hidrovião. Ele funcionava como escoadouro de produtos agrícolas e transporte de passageiros com destino a Vitória, e ao interior do estado como a frequentada Guarapari. Em função disso, o bairro ganhou melhorias e novos moradores buscaram fixar residência ali tais como, migrantes nordestinos, gente do interior do estado, estivadores, funcionários públicos, enquanto os trabalhadores do mercado da Vila Rubim, construíram suas casas na parte baixa, próxima ao mangue. (DAUS Arquitetura, 2008, p.5) Carlos Lindenberg narra um sobrevoo a ilha de Vitória naquela época: Tínhamos uma deslumbrante visão da ilha, contornando o Farol da Barra, avistando em Fradinhos os curiosos olhos da pedra, passando ainda pelo imponente Penedo, percorrendo um imensa baía, com aparência de bem maior, porque muito mais larga do que a atual. Seguia-se, sobrevoando as cinco pontes, avistando ao largo o rio Santa Maria, o Lameirão, e, finalmente, amerissando no hidroporto de Santo Antônio, o único da época. Quando aquele avião da empresa Condor deslizava seus espaçosos e fartos esquis nas águas mansas daquele canal, tínhamos a sensação se estar enfrentando uma borrasca, de tantos solavancos que dava o avião, seguida de pingos de água enormes que subiam pelos vidros das janelas. (LINDENBERG, 2006, p.33) Figura 1.17. Cais do Hidroavião de 1939 fotografado em 1955. Fonte: IJSN.

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Os voos eram espetáculos para os moradores da região que iam à pracinha contemplar as manobras dos aviões e acompanhar o entra e sai dos passageiros, entre eles muitos artistas renomados para dar shows em Vitória. O local era um ponto de encontro na região, com o hidroavião, o cais das barcas que levava funcionários e visitantes ao hospital da Ilha da Pólvora, e de bonde, muitos saltavam em frente a Obra Social São José e seguiam pela Rua Dom Benedito até a beira-mar para usufruir e vivenciar esse cenário agitado.


Apresentação

Um recorte: Bondes e cemitérios na evolução da cidade.

“O primeiro cemitério do bairro, e da cidade, foi inaugurado em Santo Antônio em 1833.” (BRAVIN, 1998, p.13) Hoje são seis que somam no bairro, e tudo indica que a linha de bonde criada para lá em 1912 tenha tido o “virtuoso” papel de deslocar a maioria dos enterros para a região. “A presença dos cemitérios foi marcante para toda a vida social do bairro.” As aglomerações em torno do Dia dos Finados e das Festas de Santo Antônio movimentaram a atividade social do bairro até meados da década de 1960. (BRAVIN, 1998, p.14) Enquanto as festas de rua, assim como os clubes que fomentavam as festas, marcaram a apropriação dessa região pelos moradores, o uso da rua para o encontro, a troca, o namoro... No entanto “Os clubes que pulsavam decaíram [Náutico, Santo Antônio Futebol Clube, Caiçara], não tem mais representatividade na comunidade. E se tomou as festas como representação jovem.” (FARIA s.d.)

Figura 1.18 e 1.19. Carril mortuário de Santo Antônio e funeral no cemitério público. Fonte: Blog De olho na ilha e Arquivo Geral de Vitória. #9

Figura 1.19 ...

O transporte urbano, antes a tração animal, já contava com carris mortuários para Santo Antônio. “Eu vinha sentado no reboque, pois ali vinha o pessoal que pagava pouco, e vinham também outras pessoas no bagageiro, que trazia os cadáveres, os defuntos.” diz Máximo Costa no livro sobre o bairro (BRAVIN, 1998, p.13) | 39


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Luiz Guilherme Neves conta que os cobradores se dependuravam nos estribos e carregavam na outra mão o troco, moedas e notas, movimentando-se com dificuldades ao redor do bonde. Mais ainda, em dias de chuva, quando estiravam cortinas de lonas nas laterais que mal protegiam os passageiros. (PACHECO, 1998, p.54) “Ao sabor do vento, ele tintilhavam as moedas e gritava: ‘eis, eis, cobradooor’. Todos sacavam suas moedas de seus bolsos e pagavam a passagem.” (FARIA, s.d.) Willis de Faria narra a viagem com o repetitivo “plá, plá, plá”, ruído que se ouvia ao cruzar as emendas da linha do bonde. Fora os ruídos, um silêncio tomava conta da viagem e o vento contra os rostos das pessoas marcavam essa experiência. Para o desenvolvimento da cidade, Derenzi vê a eletrificação do bonde como uma medida precoce. Ao citar as linhas criadas, diz sobre a de Santo Antônio: “O serviço funerário ganhou carros elétricos, facilitando os enterramentos no cemitério municipal de Santo Antônio, só então inaugurado. (...) A supressão dos cemitérios da zona urbana fora tentada em 1885.” (1995, p.163) A cidade, em fins do século XIX, se resumia praticamente ao Centro, à Fonte Grande, a Caratoíra, a Santo Antônio, a Jucutuquara, e a pouquíssimas casas na Praia, diz Carlos Lindenberg em Escritos do Espírito Santo (2006, p.44). Jucutuquara acabava de receber estradas, aterros, teve seu “córrego” canalizado, então era considerada próspera. “Jucutuquara hoje é dos melhores bairros da capital.” diz Derenzi no contexto da época. (1995, p.155) As praias, no entanto, tinham difícil acesso. “Para chegar as praias passava-se por Jucutuquara, depois Maruípe.” (CAMPOS JÚNIOR, 1996, p.127) Para a expansão do transporte público por bondes elétrico na capital em 1911 se vê o interesse por Jucutuquara, bairro em ascensão na capital; pela Praia Comprida, que já tinha casas sofisticadas, além de um plano de urbanização – o Novo Arrabalde; e por Santo Antônio. A este se reserva um papel sanitarista da cidade ao receber maior parte de seus cemitérios. Vemos então uma intrínseca relação entre o bonde e os cemitérios, que de uma forma incumbe a região à essa função, mas também lhe dá a graça de receber essa singular experiência urbana.

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Apresentação

Figura 1.20 #10

Figura 1.21 #11

Figura 1.22 #12 Figura 1.23 #13 Figura 1.20-1.23. A estrada Santo Antônio no século XIX (14 e 16) e já com o bonde eletrificado no século XX (15 e 17). Fonte: Mensagem de Governo do Espírito Santo de 1910.

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Apresentação

EVOLUÇÃO URBANA A ocupação de Vitória inicialmente ocorreu na parte alta da cidade, entretanto, com o desenvolvimento econômico e consequentemente, o crescimento populacional, houve a necessidade de serem ocupadas as partes baixas. Esse foi o contexto em que o arquipélago de Vitória, marcado pela presença do mar e da montanha, teve parte de suas ilhas agregadas com aterros que partiram da ordem governamental desde o início do século XIX. A cidade foi crescendo, acumulando capital, a população aumentando, e junto a várias demandas sociais e econômicas, teve a necessidade de ampliar seu território. Desta forma, os aterros foram uma solução técnica primordial no desenvolvimento da capital, e trataram de englobar ilhas e abrir varias planícies. “Os aterros tiveram grande importância contribuindo para a expansão territorial e higienização da cidade.” (MARINATO, 2002-2003, p.5), a exemplo do Plano de Melhoramentos da Capital no governo de Jerônimo Monteiro. No entanto, a premissa dos aterros nem sempre vinha com um projeto integrado de infraestrutura, saneamento e urbanização. Podemos nos ater ao caso da Ilha do Príncipe, que por demanda portuária, devia receber a ampliação da entrada sul da cidade. Ligada a outros municípios, a região receberia investimentos e muito se veiculou a imagem de desenvolvimento do centro da capital, com ampliação dele para essa região. No início do século XX, vários projetos apontavam a Ilha do Príncipe e seu entorno como uma área nobre da cidade. Como pólo residencial-comercial de Vitória, esses projetos visavam prover acessibilidade ao porto de Vitória, com uma nova ponte de acesso ao continente (a ponte Florentino Avidos), urbanização, habitação, lazer e serviços.

Figura 1.24. Aterro da Comdusa de 1975. Nota-se que Av. Santo Antônio não é limite imediato do aterro, o que se vê pela presença de edificações antigas na margem oeste da avenida. Fonte: Fotograma sobre base Sirgas 2010.

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Nesse contexto, a região da Vila Rubim e Ilha do Príncipe recebeu ‘promessas’ de expansão8 que se desvencilharam em ações isoladas e espalhadas no tempo, e até hoje não respondem bem ao propósito promissor de qualificação da região. O que vemos hoje é uma área ampliada em 150.000 m2 do seu tamanho original, feitas em dois aterros sucessivos, em 1960 e 1975 (IJSN, 1979, mapa), que agregou a ilha do Príncipe à ilha de Vitória, aterrando cais de clubes de navegação – da antiga sede do Álvares Cabral #21, inclusive de um armazém de café – hoje centro cultural Carmélia de Souza #22, - que recebia em barcas suas sacas. Em 1980 foi realizado uma expansão do aterramento, com enrocamento e captação de esgotos no trecho que cobre desde a Ilha do Príncipe ao Morro do Pinto no bairro Santo Antônio, nas proximidades do antigo cais do hidroavião. (MARINATO, 2003, p.12) Em decorrência desse aterro, um bairro se configura nessa região, o Mário Cyprestes. Este bairro se configura como uma seção de um aglomerado residencial antigo, a margem da Av. Santo Antônio, seguida de uma ocupação residencial nova. Pela beira-mar é faceada por uma série de equipamentos públicos e privados de maior escala (como escolas, museus, galpões, casas de repouso, etc.) de aspecto ocioso em sua maior parte. Essa extensa área de aterro recebe ao fim um terminal rodoviário, duas pontes vindas de Cariacica (Florentino Avidos e Carlos Castelo Branco, a Segunda Ponte), um sambódromo e um complexo de lazer, o Tancredão, que recentemente passou por um processo de requalificação. Além de alguns equipamentos públicos entre amplas áreas verdes, até mesmo o edifício Shopping Vitória #23, edifício comercial da região. Estes equipamentos urbanos, contudo, estão dispostos isoladamente no espaço, cortados por uma rápida linha viá8 “O objetivo central dessas obras era de melhorar a acessibilidade e preparando Vitória para dar conta de uma cidade portuária, se inserindo ate no contexto mundial de navegação e comercio. Para tanto se previu aterros, desmonte de morros, urbanização para habitação em Ilha do Príncipe, zona comercial e até uma via de comunicação continua entre a Vila Rubim e o Forte São João. Nenhum projeto implantado além de isolados aterros. Ideal próximo às especulações em torno do Portal Sul no século XXI para mesma área. Nenhum dos dois implementados até os dias de hoje” MARINATO, C. (2002-2003). Aterros do Parque Moscoso e Ilha do Príncipe: Novas possibilidades de ocupação em Vitória. Vitória: PRPPG-UFES.

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Apresentação

ria de acesso as pontes (a Av. Nair Azevedo Silva #24) que só contribui para a desarticulação e o afastamento desses equipamentos. Um estudo mostra que 40% dessa área pública aterrada é utilizada como malha viária, padrão que contrasta fortemente com o aspecto irregular de ocupação com ruas tortuosas em grandes aclives e declives nos bairros do entorno. (DAUS Arquitetura, 2008, p.17) Esse perfil de espaço urbano contribui para uma descontinuidade do tecido, nessa fronteira entre o relevo original e o aterro à cota zero, traduzida numa impermeabilidade e difícil apropriação desse espaço. A Condição Metropolitana

A capital do Espírito Santo, inserida na região metropolitana de Vitória, abrange uma ilha e uma parte continental, limitando-se aos municípios da Serra, Cariacica, e Vila Velha da chamada Grande Vitória. Possui um centro histórico, firmado como centro administrativo e comercial, que hoje se articula com outros subcentros comerciais do território. Estes estão afastados entre si em trechos territoriais, formando manchas urbanas, e as vias arteriais que os ligam, servindo de base estrutural para o adensamento entre elas. Avenida Norte Sul, Avenida Serafim Derenzi, Avenida Carlos Lindemberg, BR-101 e Avenida Fernando Ferrari são exemplos delas. A estrutura viária da cidade claramente conecta esses subcentros, e articula o fluxo entre os grandes equipamentos da Grande Vitória. Os grandes projetos, ligados a hegemonia do capital industrial e corporativo, promovem o crescimento populacional e habitacional da cidade, ampliando o território construído. Desta forma a infraestrutura urbana é produzida para atender o crescimento em torno dos equipamentos industriais e infraestruturais, e para conectar a cidade com estes. O sistema Transcol de transporte público é implantando com esse mesmo fim. Os novos centros se instalam em torno dos nós viários e de ligação interurbana como o caso de Laranjeiras na Serra, Campo Grande em Cariacica e o Ibes em Vila Velha. Enquanto na capital os subcentros que se destacam são Centro de Vitória, Praia do Canto, Jardim da Penha, Jardim Camburi, Enseada do Suá e Maruípe. Entretanto, além dos projetos corporativos, e do sistema de transporte, criado na década de 1970 e pouco incrementado até hoje; há um déficit de projetos urbanos integrados que contem com mobilidade, infraestrutura, plano de uso e ocupação do solo, políticas públicas, reinserção do antigo na dinâmica urbana vigente, entre | 45


Santo Antônio e sua linha mestra

outros aspectos urbanos. No que concerne ao setor noroeste de Vitória, isso é ainda mais incipiente. Existem expressivos e recorrentes projetos de urbanização, renovação urbana, em áreas ditas promissoras da cidade, como os centros citados anteriormente, Enseada do Suá, Praia do Canto e Jardim da Penha. A exemplo da região noroeste, portanto, fica o Projeto Portal Sul, que após uma série de intervenções incompletas e deslocadas no tempo e no espaço, se volta para um projeto de regeneração urbana. Tal projeto visa um conjunto de proposições para intervenção urbana na região situada entre a Ponte Seca e a Rodoviária de Vitória, de modo a viabilizar parcerias público-privadas na implantação de um programa integrado de atividades e serviços, bem como a localização de empreendimentos âncoras de um processo de dinamização e renovação das condições urbanas desta área. Para além do discurso da sustentabilidade esse projeto aponta um suporte para a diversidade, o convívio e usufruto dos usuários, através da promoção de ações, eventos e espaços duráveis, e a sustentabilidade ambiental que abrange a dinâmica social, política e cultural que vigoram naquele espaço (DAUS Arquitetura, 2008, p.10).

Ponte Carlos Castelo Branco (Segunda Ponte)- BR-262 - Cariacica Ponte Florentino Avidos (Cinco Pontes)- Rodovia Carlos Lindenberg Vila Velha Av. Mal.Mascarenhas de Moraes (Beira-Mar) - Vitória Avenida Leitão da Silva - Vitória Ponte da Passagem - Avenida Fernando Ferrari - BR-101 - Serra Rodovia Serafim Derenzi - Avenida Maruípe - Vitória 46 |


Apresentação A Ap pre resseent ntaaçção ão

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| 4477 Figura 1.25. Esquema de vias que conectam a região de Santo Antônio com a Grande Vitória. Fonte: Google Earth.


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MEMÓRIA E VIVÊNCIA

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Memória M Me emó móri ria e vvi ria vivência ivê vênc ncia ncia ia

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IMERSÕES NA TRAJETÓRIA E ESTÓRIA Com você falando eu visualizei uma linha do tempo, né... Porque de tanto a tanto, ocorreram tais e tais situações e agora foi crescendo. Porque desde o bonde elétrico, só lembro do elétrico, não sei se houve lá atrás um puxado a burro. Eu lembro só do bondinho passando ali na volta do Caratoíra, indo até o final de Santo Antônio, o cemitério, e subindo... O bonde e as construções, ali na volta do Rabaioli, o posto que eu te falei que explodiu, que é ali na volta de Caratoíra, o Náutico Brasil. A zona de meretriz... Casa vermelha, casa azul, tinha as lâmpadas... E hoje a sede do Novo Império. Ali no Alvimar Silva, antiga escola São José que era do estado. Ali no final do Alvimar Silva ia lá no Alagoano. (...) E o alagoano que tem origem nos primeiros alagoanos que vieram e fizeram lá suas casas, sua escola de samba.1

Figura 2.1. Inauguração do cemitério público em 1912. No mesmo ano da inauguração da linha do bonde elétrico. Fonte: IPHAN. #1 1

Vera Lucia Azevedo em entrevista em janeiro de 2012. Ela foi moradora do bairro de Santa Tereza na década de 1960. #1

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Memória e vivência

Figura 2.3.

Figura 2.2-2.3. Rua Dom Benedito em 1940 e hoje. A trajetória no tempo intrínseco a um espaço quase inalterado. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. #2

Doreen Massey, confronta conceitos e visões em torno da discussão filosófica de tempo e espaço. Ela mostra que para Bergson, a mente é por definição orientada espacialmente. Essa primazia da espacialização na absorção do território vem de uma associação do espaço ao significado como determinantes para a representação (MASSEY, 2008, p.45). Para clarificar esse conceito partimos de um cenário, um instante, formando uma cena, um episódio urbano. A denotação física dos elementos, os aspectos físicos do ambiente são imediatamente atrelados à funcão e significado daquilo. No exemplo de uma rede rodoviária que se vê o tráfego adensado e comprimido, tendemos a definição imediata do seguinte fato urbano: o engarrafamento. Reduze-se e comprime-se este fato a tal representação. Essa atribuição do espaço à representação, firmado no século XIX por Bergson, desassociou o espaço em relação ao tempo, afastando o questionamento, a indagação e até a experimentação do episódio através do tempo, e de sua experimentação. (MASSEY, 2008, p.48) No caso do engarrafamento, é acompanhado até mesmo de uma repulsa em viver esse acontecimento, algo atrelado fortemente à fugacidade da contemporaneidade. | 51


Santo Antônio e sua linha mestra

Porém, como Doreen afirma, enquanto a mente é orientada espacialmente, tudo o que é criativo, expansivo e fértil não o é: Daí que o intelecto jamais pode nos auxiliar a alcançar o que é essencial, porque ele mata e fragmenta tudo o que ele toca (...) Temos de fugir da espacialização imposta pela mente para poder recuperar o contato com o cerne de viver verdadeiramente, que subsiste apenas na dimensão do tempo (MASSEY 2008, 48).

Num outro sentido Doreen mostra a temporalidade através da trajetória e da estória, sendo elas formas de enfatizar o processo de mudança em um fenômeno. Tendo esses termos matrizes essencialmente temporais, ela defende a espacialização deles (MASSEY, 2008, p.33). Dessa forma costura os termos de representação da vida humana com a vida urbana, e os enuncia como expressões fenomenológicas em seu caráter de mudança, movimento, fluxo... A interlocução entre essa prerrogativa social e ambiental, tratando a memória e a vivência do espaço, leva o estudo pra uma esfera do urbanismo amparada na apreensão de subjetividades. Busca-se o resgate da experiência para o entendimento do lugar praticado atrelando fato urbano à evolução do espaço, vida urbana à estória das pessoas, para apreender a produção desse espaço. A fisionomia amadurece, as arestas se arredondam, as retas se abrandam e o bairro acompanha o ritmo da respiração e da vida dos seus moradores. Suas histórias se misturam e nós começamos a enxergar nas ruas o que nunca víramos, mas nos contaram.” (BOSI, 2004, P.74)

Sob a ótica de Aldo Rossi, os estudos sobre a cidade se detêm nos problemas históricos e nos métodos de descrição dos fatos urbanos, nas relações entre os fatores locais e a construção dos fatos urbanos, e na identificação das forças reais que agem sobre as cidades. “Nesse ponto, deveríamos falar da ideia que temos desse edifício, da memória mais geral desse edifício enquanto produto da coletividade 52 |


Memória e vivência

Figura 2.5

e da relação que temos com a coletividade através dele” (ROSSI, 2001, p.16). Desta forma Rossi assume a leitura da cidade através de seus marcos urbanos, e ainda realça o sentido de coletividade e pertencimento que se vivencia através dessas obras. Assumimos as premissas de Rossi e Bosi para a apreensão da história oral como objeto de estudo do fato urbano, da dinâmica urbana e da correlação entre as práticas sociais e as representações da cidade. “Os monumentos, sinais da vontade coletiva, expressos através dos princípios da arquitetura, parecem colocar-se como elementos primários, pontos de referência da dinâmica urbana. Princípios e modificações do real constituem a estrutura da criação urbana” (ROSSI, 2001, p.4). Conversas, encontros, passeios, imersões pretendem levantar impressões, dados, histórias pessoais que somem no entendimento da trajetória da evolução da região. O exercício então se vale da observação dos espaços, da audição dos relatos e impressões de alguns atores do processo, desde moradores a praticantes do espaço, além da vivência do espaço junto com o outro, dentre eles colegas do percurso acadêmico. Somando-se à análise morfológica e da paisagem que se seguirá no último capítulo, busca-se remontar essa trajetória confrontando a percepção ao exercício acadêmico. A sequência física e temporal da análise constrói essa trajetória, marcam essa evolução, e guiam o entendimento desse percurso estudado, ao longo da Av. Santo Antônio. Portanto, neste capítulo, o recurso de hipertexto insere esta experiência como mosaico no entendimento do percurso, relacionando os espaços através de marcadores coloridos neste e no último capítulo.

Figura 2.6

Figura 2.4-2.6. Residência antiga no fim da avenida. Soleira do portão de entrada do cemitério. Basílica de Santo Antônio a partir da pracinha. #3 #4 #5

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Santo Antônio e sua linha mestra

hipertexto A

09 de setembro de 2010

O primeiro relato é feito sobre uma visita ao bairro Santo Antônio. Uma abordagem rápida com observação e diálogo junto com Lilian2 que já havia estudado a região. Numa primeira visita ao bairro Santo Antônio, descemos no ponto de ônibus do cemitério, e subimos a Av. Santo Antônio até a escola Ludovico Pavoni. Nessa rua mora a família de Karlos, citado no capítulo de inserção urbana, quem acompanhou e apresentou o bairro para a Lilian no seu processo de sua pesquisa. “Na casa laranja de esquina com o portão da escola tinha jacaré.(...) Os meninos da rua faziam dinheiro no Finados por lustrar as catacumbas.” Essas são algumas das estórias que me foram ditas sobre a infância por ali.

Figura 2.8nnn

Figura 2.7-2.8. Escola Ludovico Pavoni e a “casa do jacaré” ao fim da Av. Santo Antônio. Tomada antiga revela o Santuário de Santo Antônio em 1970. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. #6

Fomos procurar entender o novo termo Basílica dado ao Santuário de Santo Antônio. Além de seu imponente estilo arquitetônico, está “o fato de venerarmos a Santo Antônio que deu nome a esta Ilha Capital, antes mesmo de ter sido chamada de Vitória” (CAMILLATO, s.d.), diz o Padre Roberto Camillato num resgate do lugar como marco da ocupação da ilha e evolução da capital. De sua entrada, visualizamos a baixada com ruelas estreitas e bem adensada. Já se nota uma distinção com a parte antiga de Caratoíra, com uma 2 Lilian Dazzi estudou a região para a Pesquisa Permanências e mudanças na paisagem da Baía Noroeste de Vitória (ES), 2009-2010.

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Memória e vivência

tipologia de casa mais solta e tradicional. “Para lá tem conjuntinhos residenciais bem antigos”, diz Lilian. Caminhamos no sentido da prainha #1, um complexo de lazer construído sobre um areal aterrado e antiga ocupação de palafitas. Vimos as casas do Projeto Terra #2, o Mestre Álvaro no horizonte, um amplo espaço de lazer com uma academia popular bem vazia. No entanto já havia visto, numa noite de sábado, bastante movimento, animação e barraquinhas. De volta à região dos cemitérios vimos um CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) da prefeitura #3, um Lar de meninas #4, numa evidenciação do costume de obra social do bairro. Na pracinha #5 algumas pessoas, alguns carros e um movimentado velório na entrada principal do cemitério municipal #6.

Figura 2.10

Figura 2.11

Figura 2.9-2.11. Vista a partir da Basílica de Santo Antônio, sobre ocupação na baixada e vista para dois marcos naturais de Vitória, o Mochuara e o Mestre Álvaro. Por Clara Miranda. #7

Ao seguir para o morro do Pinto #7, uma surpresa. Esse morro tem casas nobres, grandes, espaçosas, com áreas de lazer, além de ser bastante asfaltado. Não o subimos, mas um misto do antigo e renovação se vê logo pela escadaria do morro #8. Encravado na pedra, uma capelinha com a imagem de Virgem Maria que parece estar ali há tempos. Há também uma casa de uns 40 anos com belas esquadrias, tendendo ao estilo modernista. Intuito de reforma e preservação se fazem nessa mesma casa, os azulejos antigos ficam, as esquadrias ficam. Muito do que é antigo permanece nessa rua.

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hipertexto

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Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 2.12.

Figura 2.13.

Figura 2.12-2.14. Santo Antônio Futebol Clube. Casa de 1924. Obra Social São José, atual escola Alvimar Silva.

Figura 2.14.

hipertexto

B

Ao final do percurso, – que mais parece um começo para mim – vemos a Escola Alvimar Silva, antiga obra social São José, a casa da minha tia Penha, e o Santo Antônio Futebol Clube. Este é o ponto em que eu sempre cheguei a Santo Antônio para ir às primas, ao samba, ao Tancredão... Por ali que eu circulava na minha infância. Esse quarteirão tem um tesouro: uma casa de 1924, linda, abandonada e íntima. O Futebol Clube pela primeira vez eu olhei, reparei. Os muros e grades não permitem uma conexão visual com essa singular edificação. Marquise movimentada, emblema grande no alto, oráculo, uma festa. Esses espaços despertam interesse de percorrer esses meios, entender a apropriação do lugar. Fim de linha e início de viagem de volta: Avenida Santo Antônio. 56 |


Memória e vivência

23 de setembro de 2010

Agora, percorrendo sozinha, o intuito é conhecer outros pontos do trajeto da Av. Santo Antônio, começando por Caratoíra. A intenção era entender o percurso de ida e volta ao bairro de Santo Antônio e começar a conhecer pessoas que vivenciam a região. No caminho, na linha 211 do ônibus municipal, um bom papo. Um motorista da linha viajava de carona, com os passageiros. A conversa entre os rodoviários era sobre o trânsito, as vias, daí tomei liberdade de me aproximar ao motorista Paulo3. “O que o senhor pensa da Av. Santo Antônio?” Quando questionado sobre a avenida e o que pensava sobre ela, declara que ela é boa, importante, mas é maltratada uma porque recebe muito fluxo. Considera a importância da avenida para o deslocamento na ilha de Vitória e ressalta a má infraestrutura. “O problema é que tem faixa única, com difícil ultrapassagem... Mas eu acho que devia haver ter mais quebra-molas.” Percebi o olhar diferenciado sobre o objeto esse estudo dependendo da relação que se estabelece no seu dia-a-dia com a avenida. Apesar do esperado mecanicismo com que o motorista conduziria seu trabalho, ele pode como cidadão entender a importância dessa avenida, através do olhar de um pedestre, de um morador, do passageiro quando se atenta para o improviso do cotidiano.

Figura 2.16mmmmmmmmm

Figura 2.17mmmmmmmmm

Figura 2.15-2.17. Tráfego intenso no Ponto Chic, nó viário entre seis ruas no bairro de Caratoíra. Fonte: Site Fabio Lube. #8 3 Paulo Rodriguez, motorista do transporte público municipal. Trabalha na linha 211, que percorre pelo litoral desde o bairro Jardim Camburi, na área continental norte, até o bairro Santo André, na baía noroeste.

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Desci na volta de Caratoíra #9, pois sempre a ouvi como referência, como “aquela praça agitada” ou “onde passam os ônibus”. Estava ali entre o movimentado Ponto Chic #10, a escola de samba Novo Império #11, o Morro do Alagoano #12 e do Quadro #13, e no fim da tarde o fluxo intenso de ônibus, de inúmeros caminhões, confrontavam com a cena de repouso dos visitantes e senhores que proseavam na pracinha. O Sr. Laércio me conta que gosta da região, que vive ali há bastante tempo e gosta de ver ali crescer. Dá aulas de percussão para as crianças na escola de samba e relembra o passado. “O estoque de café vinham buscar de balsa.” Caratoíra por Arabelo e Vera

Figura 2.19aaaaa Figura 2.18 e 2.19. Ângela Maria canta no Clube Náutico e Arabelo do Rosário recebe homenagem da equipe de remo do clube. Por Lourival Azevedo.

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A região de Caratoíra foi exemplarmente realçada pelos movimentos juvenis da região. O Clube Náutico #14 inaugurado na década de 1950, quando transferido para Caratoíra teve importante papel agregador das comunidades perimetrais de Vitória ao esporte e as atividades culturais. Antes a ida a clubes se restringiam ao Clube Vitória, Álvares Cabral, e considerados sofisticados, eram frequentados por uma população mais elitizada. Com a ida do clube Náutico


Memória e vivência

para Caratoíra, este se tornou acessível à uma população menos privilegiada que começou a usufruir desses serviços e entrar no circuito desportivo. Arabelo4 narra a importância da atividade do Náutico com agremiações juvenis, organização de competições e que levou Caratoíra a disputar títulos com os mais importantes clubes de Vitória, além de tradicionais festas que aconteciam como os bailes de carnaval, os shows de renomados artistas. A região, como o nome do clube não deixa mentir, era de baía, com a maré chegando próximo a Caratoíra. O Clube Náutico com sua equipe de remo e as barcas, que levavam as pessoas pra lá e pra cá. “A gente pegava o barco. Papai pegava a gente, botava dentro do barco e atravessava, pra ilha do Príncipe, pra Vila Rubim...” Continuando com a dinâmica social do lugar, Vera Lucia5 conta sobre sua morada no bairro de Santa Tereza a partir de 1963. Ali era um lugar onde a juventude se divertia. “Nós fazíamos bailes, quadrilhas, tardes dançantes. Dança da cadeira, dança da vassoura. Os primeiros namoros, os primeiros flertes. Saiu casamento dali.” Vera promovia as quadrilhas e marcava os passos em francês. Ela diz que esses encontros eram o pulso da juventude, com atividades saudáveis que afastavam, quitavam a relação da juventude com qualquer criminalidade “Isso não existia!”diz Vera. A pracinha de Caratoíra #9, não era como hoje. Não tinha bancos, mobiliário, era simplesmente área de passagem. “Ali, o quê que tinha ali? Tinha casa de prostituição, ali na esquina. Hoje o quê que tem ali? A igreja Deus é amor, a rádio capixaba.” Da mesma forma, Vera diz que a relação da comunidade era de respeito com as meretrizes das casas de prostituição como ela mesma chama. Havia um convívio de vizinhança e não de repulsa com as moças dali. A seguir, uma coletânea de fotos da família, conservadas por Lourival Azevedo desde a época em que moraram na região de Caratoíra, na década de 1960. No acervo percebe-se o interesse pelo registro das festas, de convívio social, além de um registro recorrente da paisagem. A paisagem é registrada em momentos variados, mostrando a evolução urbana, até mesmo da construção da casa. 4

Arabelo do Rosário em novembro de 2010. Ele foi presidente do Clube Náutico Brasil de 1968 a 1972. 5 Vera Lúcia Azevedo em janeiro de 2012. Ela foi moradora do bairro de Santa Tereza na década de 1960. #1

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Figura 2.20

Figura 2.21

Figura 2.22

Figura 2.23 #1

Figura 2.20-2.23. Barco da equipe de remo do Náutico. Festa de Carnaval e Quadrilha durante uma festa junina no clube. Família em frente a residência em Santa Tereza em construção.

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Memória e vivência

Figura 2.24 #9

Figura 2.25 #10

Figura 2.26 #1

Figura 2.27 #10

Figura 2.24-2.27. Vistas do bairro Santa Teresa para o Mochuara e para a baía de Vitória. As fotos 24 e 26 mostram, em épocas distintas o morro do Alagoano e a baía do mesmo ponto de observação. Abaixo a casa construída por Lourival.

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Santo SSa ant nto A An Antônio ntô ntô tônniio e sua sua lli su linha innhha ha m me mestra es

Alagoano por Natália

Converso com Natália6 que servia no bar em que entrei. De forma muito sucinta e clara ela tenta mostrar as relações que ela estabelece com o lugar, mas em suma possui um “convívio ruim” com a comunidade como ela mesmo diz. Julga a região com “pouca privacidade”, até diz que é tranquilo viver ali mas acha que há muitas brigas, desentendimentos na comunidade. Sobre quando ela chegou ali, há dez anos, diz que haviam menos mortes, alvoroço, e “era mais adequado”, “ foi virando tipo um terrorismo” com o tempo. Se indigna com a irresponsabilidade das meninas jovens grávidas. Sobre a avenida e o lugar em si, é um pouco cética. Não avalia o espaço, o caminhar, tornou-se comum o percurso na sua rotina. Diz que muitos vêm de longe passear e visitar, e procurar onde morar, mas não encontram. Quando peço uma palavra que define Santo Antônio diz que “a convivência é ruim”. A fala de Natália surpreende e mostra uma visão de uma jovem num local de conflito como ocorre nessa região. Santo Antônio por Kleber

Em entrevista com Kleber Frizzera7, secretário de desenvolvimento da cidade e ex-morador de Santo Antônio, ele apresenta o plano de mobilidade para a região. A quarta ponte, prevista pelo Projeto Portal Sul de Vitória, pretende conectar Vitória a Cariacica pela Rodovia Serafim Derenzi, em Bela Vista, bairro ao norte de Santo Antônio. O objetivo é tirar o tráfego do percurso contorno de Vitória-Segunda Ponte de dentro de Caratoíra. Hoje o problema maior está concentrado no Ponto Chic - em amarelo no mapa - onde confluem seis vias num mesmo nó viário com circulação de grandes ônibus e carretas. Nele passam as ruas Rua Ernesto Bassini e José Bittencourt - em vermelho no mapa - que recebem este tráfego intermunicipal.

Figura 2.28. Mapa tráfego contorno de Vitória-Segunda Ponte com destaque para Ponto Chic. Fonte: Sirgas 2000. 6

Natália Moreira tem 15 anos, trabalha em um bar com a mãe em Mário Cyprestes, e mora no morro do Alagoano desde a infância. #2 7 Kleber Frizzera é Secretário de Desenvolvimento da Cidade, Arquiteto e professor do departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFES.

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Memória e vivência

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hipertexto

Figura 2.29. Morro do Alagoano em dia nublado. #11

Ao passo que a obra deslocará esse tráfego denso e degradante, do interior de um bairro residencial, coube aí uma pergunta: Estaria tal projeto isolando mais o território de Santo Antônio da dinâmica da cidade? Kleber diz que na verdade o mantém como passagem para os moradores de Vitória, se detendo a demanda que a região suporta. Acresce que Santo Antônio tem um potencial fundiário que pode privilegiar habitação, pois possui infraestrutura e inserção urbana interessante para moradia, pela conectividade com Cariacica e Vila Velha. Além de já ter bons equipamentos públicos acessíveis, a área de aterro mantém lotes vazios em condição ótima para o uso, e devidamente regularizados, o que contribui para aquisição e desenvolvimento de projetos nesse sentido. | 63


Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 2.31 kkk

Figura 2.30-2.31. Foto do manguezal de Santo Antônio abaixo da pedra do Santuário. Tomada a partir da Fonte Grande mostrando o Morro do Alagoano, o Alto Caratoíra, e o Santuário (da esquerda para a direita). Fonte: Arquivo Geral de Vitória e IJSN.

1º de outubro de 2010

Relato de visita à avenida junto com Rosemar8 , minha mãe. Conversas, lembranças, família e muito da ambiência que havia ali nas imediações de sua casa. hipertexto

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Paramos na casa de minha tia Penha9 , ao lado do Santo Antônio Futebol Clube #15, e conversamos sobre sua moradia. Sua casa é antiga, mas foi em cima do mangue onde morou primeiro #16, no loteamento da Ordem Pavoaniana. “A gente comprava os lotes no mangue, construía a casa dentro do mangue, ...caçava caranguejo e pescava de dentro de casa.” A Av. Santo Antônio sobe até o elevado do Santuário #17, porque embaixo era tudo alagado. “A maré batia na pedra do Santuário.” O caminho até a Serafim Derenzi era feito pelos morros, que se diziam “as fazendas”. Quando ela chegou ali, só o alicerce do Santuário existia, e o bonde chegava até depois do cemitério. Fomos à antiga casa de minha mãe #3, ali perto, no alto da ladeira Dom Benedito onde morou na década de 1960-70. Ela mostra a vista de Porto de Santana “Era tudo mata”, “Meu pai daqui vigiava os filhos na maré”. Uma vez, avistou de longe um barquinho com três crianças no canal: “Eram seus três filhos tentando tirar água de um barco furado!” Como narra, tudo parecia próximo. A escala que 8 9

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Rosemar Ribeiro foi moradora de Santo Antônio na década de 1970. #3 Maria da Penha Storani, moradora de Santo Antônio a 50 anos. #4


Memória e vivência

define longe e perto se alterou com o desenvolvimento da cidade, a fluidez do tempo e do espaço, e a velocidade faz a percepção ambiental mudar. É o que se percebe na fala de Rosemar “As crianças aí passando, (...) ali é Porto de Santana.”, percepção do espaço que já não cabe com o adensamento do local que é hoje. Outro exemplo disso é de meu pai, Jorge, que na década de 1960, quando morava no bairro Santa Tereza, vinha até Santo Antônio, trazer trouxas de roupa para entregar a lavadeira onde hoje é a prainha #1. “Eu me lembro de trazer as trouxas de roupa na cabeça e ir me equilibrando nas tábuas, eram só palafitas” Nota-se que aí os bairros de Vitória e Cariacica estabelecem uma relação de vizinhança, pela troca de serviços morador – atravessador – lavadeira, numa proximidade através da baía que não se considera mais. Eu peço para que Rosemar descreva um ambiente naquela época, a esquina da ladeira Dom Benedito, onde era sua antiga casa, hoje com muros altos e sobrados. Ela diz que ali a rua era outra. As casas eram baixas e as árvores do terreno cobriam as ruas. “Essa casa aqui tinha o muro baixinho, era recuada” A tipologia de implantação das casas tinha interação maior do interior com exterior e formavam ambientes agradáveis. A vida das pessoas também tinha essa interação.

Figura 2.32 -2.33. Foto da Ladeira Dom Benedito e croqui feito a partir das descrições de Rosemar sobre como era na década de 1970. #12

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Nas próximas páginas está disposta na íntegra a entrevista com Cláudio Mazzini. Relativamente novo, e morador de Santo Antônio desde a década de 1960, ele tem um bom entendimento do bairro, e uma habilidade em discorrer sobre ele perpassando épocas, episódios e cenários. O fato que me traz a expor essa entrevista é que o Cláudio entende a dinâmica urbana em que está inserido o bairro, confrontando passado, presente e futuro, além de uma visão crítica para estabelecer os prós e os contra em viver ali sem deixar de mostrar o carinho e o apreço que tem pelo lugar. #5

Entrevista em 19 de fevereiro de 2011 Stephanie: Então pra começar, queria pedir pra você falar um pouco de Santo Antônio, você tava contando que nasceu aqui, cresceu aqui... Cláudio: Olha, minha família veio pra cá muito cedo, aqui nessa própria casa... Mas ela era diferente, tá modificada e tudo. Eu morei aqui de zero a onze anos. O que era... Foi o primeiro bairro de Vitória, algumas pessoas dizem que era conhecido como Vila Santo Antônio. O cemitério, por incrível que pareça, antigamente o caixão vinha até de barco,... parava aqui na escadinha e da escadinha o pessoal pegava e levava pro cemitério de Santo Antônio... O único meio de chegar aqui era através do bonde. Eu peguei bonde também na época. Uma das coisas mais incríveis do mundo, você saia de bonde... Minha mãe trabalhava lá na Praia do Canto, era professora de um colégio infantil, ele existe ainda, uma área muito boa... Todo mundo hoje tem o olho grande em cima daquela área ali. Não sei se funciona o colégio ainda, mas era bem na Praia do Canto mesmo... E a gente saia daqui, minha mãe levava a gente lá na Praia do Canto, e a gente ia de bonde. Daqui até na Praia do Canto... S: Você estudava nesse colégio? C: Estudava. Maisa: no Ludovico? C: Não, na Praia do Canto, o Ludovico ainda não existia... Uma coisa interessante do bairro é que as pessoas se conheciam, as famílias se conheciam... E aos domingos a gente ia pra igreja da matriz ali, assistia a missa das sete, e de repente ficava todo mundo em frente a igreja, conversando, as famílias dos bairros todos... Enquanto o santuário tava sendo construído. Não me lembro do esqueleto do santuário, eu lembro do santuário já na fase terminal dele,... piso, pintura, aquelas coisas todas. Eu lembro bem disso... Era como se fosse uma vila, as pessoas se conheciam mesmo! A minha rua aqui, coisa interessante,... os avós dos meus amigos eram meus avós, os meus avós eram avós dos meus amigos. Meu avô ajudava a tomar conta da molecada toda. A gente tomava banho de maré e meu avô saia daqui,

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Memória e vivência

botava a cadeira em frente da casa e ficava tomando conta da turma. Quem ultrapassasse uma linha imaginaria lá, se ultrapassasse o pau comia... Minha infância era isso, era uma infância boa. Aqui em frente era um campinho de futebol... S: Aqui em frente mesmo, na rua? C: É, em frente a minha casa era um campo de futebol... Tinha o Caiçara, que hoje é o Cais do Avião e dali pra lá era tudo mato, maré. Acho que foi em 68, 69 que começaram a aterrar esse negócio. Me lembro como se fosse hoje o dia! Nós tava sentado ali, chegou um pessoal. O cara veio assim, e fizeram uma rampinha pra subir no meio fio. Não entendemos o porquê daquilo, né... No dia seguinte começaram a chegar os caras nos caminhões, eles traziam as pedras que vinham praí, ...era do porto de Capuaba. Eles tavam arrebentando Capuaba lá, e trazendo as pedras pra cá, e jogando aqui pra fazer tipo um quebra-mar, né... Uma maré imensa! Era 24 horas por dia os caminhões chegando, botando pedra, jogando pedra... E o trator andando aí, vinha fazendo aquela coisa, chegava o caminhão de terra, vinha fazendo esse negócio... E era um campinho assim, estragou nosso campinho, né... A gente jogava bola de manhã, de tarde e de noite. Jogava bola, futebol, peão, ferrinho, bolinha de gude... S: Ferrinho, ...minha mãe fala demais do tal do ferrinho! C: Tinha essas épocas, né... E meu avô, na época todo mundo aqui, comprava peão pra garotada toda! As bolinhas de gude, pipa, todo mundo fazia! Eu me lembro que meus pais, meus tios, faziam pipa pra gente. Isso aqui era um movimento só... S: E do jeito que você tá falando, Cláudio, isso aqui era o campinho, e o mar chegava por aqui também, né? C: Até ali no Caiçara! S: Do lado de lá dele tinha mar... C: Tinha mar, era! S: Até 1969, você diz? C: Não, mais isso aí levou tempo, essa construção desse aterro aí levou tempo... Você quer ver, eu comecei a namorar com sua mãe [falando com Maisa] em 86 e já tava tudo aterrado aqui. E a gente perdia gente na maré aí, teve uma época que um colega meu foi nadar ali, também morreu, ...morreu dois! Isso em 69, 70. Perdia muito amigo aí... Essa maré ela é perigosa, né... S: Cláudio, quais aspectos você considera importante do bairro de Santo Antônio? C: A coisa mais importante do bairro de Santo Antônio é que apesar da gente tá no século XXI, ele conserva ainda essas propriedades que eu te falei, ...aquela coisa mais comunitária, todo mundo se

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conhece. Na época de torta [torta capixaba durante a Semana Santa], todo mundo fazia, a gente saia comendo torta na casa de todo mundo. Época de procissão, já não existe mais isso, ...mas na festa, acho que é Corpus Christi, a gente fazia tapete, todo mundo enfeitava a rua... Festa junina eram 30 dias de festa aqui! A gente fazia todo santo dia uma fogueira. E tinha os três, era Santo Antônio, São Pedro e São João. São Pedro era a última fogueira, né... Eram não sei quantas pessoas que faziam, era o seu Divaldo, falecido, que era o delegado aqui das paradas, ele fazia a maior fogueira! Ficava queimando uma semana aí... A gente fazia barraquinha, a comunidade aqui da rua fazia, fazia os doces, soltava muito balão... Naquela época comprava muito foguete, meu avô comprava, fazia os pacotinhos, descia o pessoal do morrão aqui... S: O morrão que você tá falando é o do Pinto? C: É, isso aí era uma turma só... S: E quando você fala desse povo que era mais junto assim, era do Pinto, daqui, e de mais onde? C: Essa região todinha, era praticamente quase toda grande Santo Antônio, ...até lá perto da garagem da Grande Vitória, a Viação Nordeste ltda. Depois que os bondes começaram a acabar, começaram os ônibus. Tudo era paralelepípedo, uma buracada só, e todo mundo se conhecia, e se mantêm isso ainda... A velha guarda se reúne, as pessoas ainda vão à igreja, conversam, as pessoas ainda param na porta da casa pra conversar, ainda tem uma ligação, tem tudo isso... O bairro guarda isso. S: É uma familiaridade, né... C: É, ...já não é mais aquela coisa toda... Era muito tranquilo aqui. S: Em quais aspectos você acha que o bairro poderia melhorar? C: O bairro tá esquecido. Tem os vereadores aqui do bairro, tem o Fábio Lube, tem o Lelo daqui que hoje é deputado federal, foi vice-governador...Mesmo tendo vice-governadores aqui ele parou no tempo, né... É um bairro que é pouco policiado, apesar que a violência existe em todo lugar, né... O tráfico, aquela coisa toda, ...mas não é um bairro muito violento em comparação aos outros. Os carros dormem de madrugada aqui na rua, não tem muito problema. Falta policiamento, saneamento básico, o problema da dengue, essas coisas o pessoal só aparece quando a gente chama. Tá muito esquecido pelas autoridades, só aparece aqui quando, por exemplo, no carnaval, ele fazem um movimento aí. Fora isso é o básico, é o cata-lixo e só. O policiamento é muito pouco, aquelas melhorias básicas, né... S: Já que você está falando sobre esses problemas, como você vê o grande crescimento daqui em volta, ...da população aumentar? C: Olha, eu fiquei 20 anos fora, ...e quando eu voltei eu me assustei da quantidade de gente que hoje tem Santo Antônio. Só que nós hoje estamos herdando problemas do passado, porque Vitória cresceu desordenadamente. A grande Santo Antônio, que abrange São Pedro, Inhanguetá, Palestina, aquilo tudo

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Memória e vivência

foi invadido. Na estrada do contorno na minha época a gente ia caçar passarinho, brincar naquele lugar lá, tinha que ir a pé, não passava nada... Tudo mangue e fazenda, não tinha nada. Até que um belo dia eles começaram a fazer um lixão, jogando o aterro... Todo o aterro sanitário passou a ser ali em São Pedro, e nessa leva jogando lixo, o pessoal mais pobre ia catar o lixo e começaram a invadir a área... Começaram a fazer palafita em cima do lixo, e foi tudo pro mangue, acabaram com o mangue... E isso hoje, essa população que, se eu não me engano é aquela população que veio aqui na época da CST, a Serra absorveu muito mais... Mas nós aqui absorvemos essa mão de obra que foi trabalhar na CST, e que também vem tentar com a CST, trabalhar aqui. É uma coisa horrorosa, inacreditável de se ver... Se tivesse umas fotos pra você ver na época da invasão, toda a grande Santo Antônio ali, a estrada do contorno, e isso aqui também... Isso aqui é tudo terreno de marinha, isso aqui tudo foi construído não planejado. O morro do Pinto não tinha esse monte de casa que tem hoje, e aonde podia botar casa, hoje não tem mais um espaço aí, não da pra construir mais nada... Uma coisa interessante, esse pessoal do morro desce todo mundo numa tarde de calor, porque o calor aí em cima é insuportável. Não tem uma árvore aqui! S: E se eu não me engano ele tá todo asfaltado né? C: Todo asfaltado. Imagina o bolsão de calor que aquilo ali não provoca né... asfalto, parede, telhado. Então, essa turma da velha guarda lá em cima, na primeira oportunidade desce pra pegar a fresca aqui ó, na beira da maré! Porque aquilo ali é insuportável... É isso, o crescimento desordenado, ...o tráfego aqui de carro, ...eles fizeram esse sambódromo aqui pra tirar um pouco do tráfego da Av. Santo Antônio. Porque é uma avenida que foi toda invadida no seu lado direito, e do outro lado era maré que foi aterrada, e que as pessoas levantaram prédio ali tudinho. Então, a avenida é aquilo ali desde que nasceu, estreita, sem acostamento. Quando o ônibus para no ponto de ônibus assim, você tem que esperar o ônibus partir pra prosseguir sua viagem, e não tem como você melhorar isso aqui. Eles tentam mas não tem. Agora a tendência é só piorar. S: Na época do bonde também, o bonde parava, aí era mão, e contramão... C: É, ...aquilo não era muito ruim porque tinha pouco, né... Aí começou a vir o ônibus, eles começaram a tirar o bonde... O ponto final do bonde era aqui no cemitério de Santo Antônio, as pessoas tinha que ir a pé. Quem morava ali mais pra trás, ali mais chegando na estrada do contorno, tinha que ir tudo a pé... S: Falando um pouco então da Av. Santo Antônio, no dia-a-dia como que vocês usam a avenida Santo Antônio? C: Muito raro eu andar, a gente mora aqui [perto do Cais do Hidroavião] então nossa saída é aqui por baixo, a avenida Dário Lourenço de Souza. Por aqui nós tamo ali no centro da cidade em dez minutos. Eu vou, ...faço 15, 20 minutos daqui a pé na cidade. Então eu quase não uso... S: A pé você vai por baixo? Você também Maisa?

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C: Vou por baixo, 15 minutos eu tô na cidade. M: Só vamos em cima quando aqui tá fechado... S: E vocês costumam ir na cidade a pé? C: Agora sim por causa desse trânsito caótico que tá Vitória. Compensa, ...por exemplo, eu pego o carro aqui, paro lá na Vila Rubim, na Av. Santo Antônio que é fácil estacionar, deixo o carro lá e vou pra cidade a pé. Tô fazendo isso... Quando eu não quero ir a pé, pego um ônibus aqui, muito bom, tem muitas linhas de ônibus... M: Ah, não acho que tem muita não! C: Tem... Se você quer ir pra cidade você pode pegar Aeroporto, Tabuazeiro, Ufes, você não fica 5 minutos. Se você quer ir pra UFES, Praia do Canto, espera mais um pouquinho, ...mas mesmo assim o bairro é bem servido de ônibus, eu acho. Você vai até pro IBES. S: É, Maisa... Mais comparando eu acho que tem até muito mesmo. Cláudio, comparando a Av. Santo Antônio e todo o entorno aqui da sua casa, comparando com quando você chegou aqui, o que você acha que é mais diferente? C: Primeiro impacto: triplicou a população do bairro. O movimento é muito mais intenso de carro. A velha guarda tá morrendo, e o pessoal novo que tá aqui, tô falando, da fase dos 30 até os 50, o pessoal ainda ficou... Mais o pessoal mais novo, está mais disperso... Por exemplo, meus filhos, eles não participam de Santo Antônio. Eu quando vou comprar um pão aqui levo 2 horas pra ir, 2 horas pra voltar, que eu vou conversando com todo mundo, vai parando, vai parando... S: Eu já ouvi dizer que a população de Santo Antônio até Vila Rubim, justamente dessa faixa que você falou, está saindo daqui... C: Com certeza, não participam de Santo Antônio... Nada, nada. É porque o bairro é carente em muita coisa, mas é o bairro bom pra se morar. Eu acho, eu gosto disso aqui demais. O pessoal fala “ah, bairro da penha” [referência à Jardim da Penha], não sei não. Eu gosto mais daqui. Quer dizer, eu nunca morei lá também, né... S: O que já me contaram, assim conversando com outras pessoas, foi do Santo Antônio Futebol Clube... C: Isso! Tinha o clube, meu avô era um dos sócios! Assim, um dia eu vi uma carteira, e ele era um dos fundadores, acho que o número 17! E a gente torcia, todo mundo aqui torcia pro bairro, pro time de Santo Antônio. E era um timaço! Se não me engano era um dos clubes com mais títulos no Brasil. Estadual, era o time Santo Antônio, um timaço. E alguns jogadores moravam aqui, a sede do clube era ali ó, no início da nossa rua... Lembro do goleiro, o Tom, Dalmo, aquela turma toda, e era uma paixão, né... Me lembro que o Santo Antônio ficou desativado por muito tempo. Aí uma vez voltou a ativa e veio jogar

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Memória e vivência

com o Flamengo aqui... Nossa, foi uma festa! Acabou, o Santo Antônio acabou. E tinha um time aqui de bairro também, João Nery, era um timaço também. Como o João Nery era do bairro, quando jogava era torcida, a galera toda, era uma festa! S: Você falou desse campinho do Santo Antônio, ...era onde? C: Olha eu acho que era pro lado do contorno, se eu não me engano. Quem pode te dizer isso é Vitalino. Tem o campo do Alagoano ali em cima, onde o pessoal, o João Nery jogava muito ali... E quando jogava era uma festa! Todo mundo se mobilizava pra ver o Santo Antônio jogar e o João Nery jogar. Era uma confraternização tremenda! S: Como você apresentaria o bairro de Santo Antônio pra uma pessoa que não conhece? C: É meio difícil, depende da idade da pessoa... Se a pessoa é um aposentado, eu diria pra ele que o lugar ideal pra ele morar é aqui. Teria facilidade de fazer a sociabilidade, teria companheiros que poderiam participar do dia-a-dia dele... Aqui você encontra todo mundo de manhã, de tarde e de noite. Tem o clube, nos fizemos na época o clube de pesca aqui. (...) Padaria fecha sete e meia, farmácia fecha, os botecos ficam abertos... Você vai em São Pedro, nove horas, dez horas, o comércio fica aberto. Então já digo que pra molecada aqui não é tão interessante. S: Se você pudesse definir Santo Antônio em uma palavra, qual seria? C: Nostalgia. Pra mim Santo Antônio é nostalgia. Stephanie, Cláudio e Maisa Mazzini em fevereiro de 2011.

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CARTOGRAFIAS E MORFOLOGIAS DO LUGAR

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Cartografias e morfologias do lugar

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Figura 3.1. Rodovia Serafim Derenzi na d茅cada de 1960. Fonte: Arquivo Geral de Vit贸ria.

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Cartografias e morfologias do lugar

A ESTRADA SANTO ANTÔNIO E A EXPANSÃO URBANA O cenário agitado e romântico da ilha dá-lhe singular beleza como não encontramos em outras partes, embora essa agitação que se transforma em montes e vales obrigue o homem a prodígios de técnica e de esforços para dar-lhe feição urbanística condizente com sua topografia.(MONJARDIM, 1995, p.23).

A configuração formal da Av. Santo Antônio tem no aspecto natural do relevo, condição decisiva pra essa concentração linear de usos e apropriação. A avenida é traçada sobre uma das curvas de nível mais baixas do morro, parte do maciço central da ilha, e está no limiar entre morros e alagados, sendo essa região uma das primeiras ocupações informais de Vitória. Uma das principais premissas da avenida é circundar a ilha e amparar o desenvolvimento do território habitado nesse contorno. Sendo essa antiga estrada um limiar original entre área rochosa e mangue, se dá uma ocupação inicial estreitada nela. #1 Nasceu a estrada do Contorno de feliz inspiração do prefeito Dr. Américo Poli Monjardim, para beneficio da capital e das vastas propriedades daquela zona. (...) A região está suprindo a cidade de verduras, legumes, leite, etc. A segunda [justificativa] foi o desenvolvimento de toda a região, cifrado nas construções que se estão erguendo à margem da estrada, partindo de ambas as extremidades (MONJARDIM, 1995, p.30).

A avenida do contorno, como mostra o texto, foi lançada na década de 1930 para benefício da capital, que usufruía das fazendas existentes ao longo dela. Além de ter sido impulsionada pelos aglomerados urbanos em suas extremidades, que já excediam os limites da vila. Neste ponto a geografia de ilha é enfatizada, tendo maciço

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como centro que induz o contorno do mesmo. A Av. Santo Antônio é o nome que se dá ao trecho que tem início na região sul da ilha, seguindo à oeste da área central de Vitória. A configuração de ilha que Vitória se apresenta, com morros centrais, alagados perimetrais, rodeada por um canal, orientou

Figura 3.2. Vista aérea da ilha de Vitória com a ilha do Príncipe já conectada por pontes sem aterros da baía em 1950. Fonte: Arquivo Geral de Vitória.

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Cartografias e morfologias do lugar

a ocupação da capital do Espírito Santo, centralizada na ilha de Vitória. De acordo com Clara Miranda “A mancha urbana atinge grande extensão do município de Vitória; exceto as áreas muito íngremes como o Maciço Central, os topos rochosos dos morros e as áreas conservadas como os mangues do Lameirão, além da área do Aeroporto, no continente.” (2003, p.7). Isso mostra uma ocupação guiada pela conformação natural do espaço, em que os acidentes geográficos definem a direção da expansão urbana. Além disso, embasam a projeção das vias arteriais, que articulam os nós, onde se estabelecem os centros e subcentros que impulsionam o crescimento da cidade. Mesmo com essa influência natural do sítio, a transformação desse espaço urbano é marcado por intervenções técnicas e desnaturação do ambiente com aterros de alagados, dragagem de canal e alguns desmontes de morros. Algumas dessas intervenções são feitas pelo poder público, outras são provocadas pela ocupação informal. No primeiro caso, o objetivo é o projeto de urbanização, enquanto o outro caso resulta da falta de um projeto ou planejamento que absorva as populações de baixa renda. Sobretudo intensificado durante a expansão territorial de Vitória na década de 1970, essas apropriações eram feitas, em suma, por imigrantes em busca de áreas desvalorizadas, em alagados e morros, para instalarem suas edificações. Temos a ocupação do território de Santo Antônio tipicamente resultante do movimento migratório. Esse fato é evidenciado pelo tecido urbano orgânico notadamente atrelado a irrigação dos acessos, num escoamento das vias pelos vales. Dá-se a Av. Santo Antônio a função agregadora desses fluxos, num escoamento e concentração dos serviços sobre ela, estabelecendo uma centralidade excêntrica à essas comunidades. Esse tipo de ocupação gera uma situação oposta ao que acontece nas cidades convencionais, pois nas favelas, na maioria dos casos, a periferia dos terrenos ocupados é mais valorizada, e antiga do que o centro geográfico. As favelas são acêntricas, ou melhor, excêntricas. A periferia, a linha que separa a favela da cidade formal, passa a funcionar simbolicamente como um ‘centro’, concentrando a maior parte do comércio e dos serviços (JACQUES 2002, p.55). | 77


Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 3.3. Cruzamento da ladeira Dom Benedito com a Av. Santo Ant么nio. #1

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Cartografias e morfologias do lugar

RUAS QUE COSTURAM As ruas estão na origem da cidade, são sua condição necessária. É muito difícil apagar seus rastros: que são sua geometria permanente (BUNDÓ; VENTÓS, 2000, p.17, tradução nossa).

Bundó e Ventós dizem que da rua se pode estudar a morfologia e sua interatividade com o tecido. Ela pode pertencer ao tecido urbano, ou ser uma peça isolada. Pode ser como um fio a mais de um novelo, ou a agulha que os enlaça. Ser dominante e mestra, apresentando-se solitária ou ser uma espinha dorsal de uma estrutura (2000, p.18). A Av. Santo Antônio tende a ser dominante sobre as demais de sua região, em porte, visibilidade, em fluxo. Porém a interação humana é maior em suas transversais e ramificações. Ela é dominante, porém não solitária, se articula com as demais. Abre o caminho rumo a oeste da cidade, embasa a formação de novos bairros, como ‘agulha’ – guia de desenvolvimento, e ‘espinha dorsal’ – infraestrutura. A grande maioria das atividades humanas na cidade estão ‘radicadas’, quer dizer tem domicílio fixo. Para poder existir e para poder ser viáveis, os lugares em que se produzem as atividades precisam estar conectados ao sistema geral de mobilidade. Ter acesso é a condição necessária paras as parcelas e lotes urbanos (BUNDÓ e VENTÓS, 2000, p.19, tradução nossa)

As práticas comerciais e institucionais ladeiam a Av. Santo Antônio por ela ser excêntrica e acessível. Assim como por ter infraestrutura básica, de transporte, mobiliário e pavimentação pública. Seus lotes imediatos somam mais fatores que favorecem a atividade comerciais e sociais. Mas esta atividade não se detem a essa centralidade, no caso, a essa centralidade perimetral da Av. Santo Antônio quando se observa o uso e ocupação nos bairros contíguos a ela. Com a evolução desses bairros e seu adensamento, surgem comércios informais e de menor escala dentro do bairro de Caratoíra por exemplo, como padaria, bares, até ponto de troca de objetos usados. Mas adiante, em | 79


Santo Antônio e sua linha mestra

Mário Cyprestes, a Rua Elvira Zílio #1 recebe seus moradores com cadeiras, mesas, comidas e brincadeiras nos finais de semana. Essas atividades surgem a partir da experimentação própria dos moradores, que vislumbram suas necessidades. Segundo Bundó e Ventós, as distintas funções de uma rua, se lhe é dominante o trânsito a pé ou se se enfatiza as soluções para o trânsito de veículos, tem peso decisivo no desenho das vias, do mobiliário urbano e na sua iluminação. Se a via é focada nas funções ligadas ao acesso público-privado e aos usos que a circundam ela terá um tom local e específico. No entanto, há casos de ruas que se originam no centro da cidade, atravessam bairros e se prolongam até se tornar rodovias e estradas. “Esse passeio exemplifica a completa transição da rua, ouvindo o coração da cidade, para servir as atividades principais, as ruas como acesso à via rápida arterial. É a transição das calçadas largas para as ruas rápidas e ruidosas onde quase ninguém anda a pé” (BUNDÓ e VENTÓS, 2000, p.20, tradução nossa). No caso da Av. Santo Antônio vê-se a transição ao longo de seu trajeto, e o peso de ambos aspectos da rua, seu tom local e geral, são dados dinâmicos e variáveis no tempo. Numa tarde na volta de Caratoíra, por exemplo, o circular das grandes carretas confrontam o descansar dos senhores e o desembarque de um cadeirante do ônibus municipal. Josep e Maria afirmam que muitas decisões podem afetar o equilíbrio da rua como os usos e densidades dos edifícios, a organização da seção transversal, e políticas gerais sobre atividades e mobilidade. Entre os elementos que podem diferenciar as ruas estão o movimento que ocorre nelas, o tráfego de veículos, o rebuliço humano... Até os elementos estáticos como as árvores, as vitrines e a infraestrutura... e, finalmente, os efeitos de luz e sombra, dependendo dos vazios e das dimensões dos elementos que ocorrem em cada rua (BUNDÓ e VENTÓS, 2000, p.22, tradução nossa).

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Cartografias e morfologias do lugar

Mobilidade

Derenzi narra a maneira que se desenvolveu a cidade de Vitória e mostra como a construção da cidade se deu a partir de caminhos contornando elementos naturais. “A cavalgadura não caminha em linha reta. Segue prudentemente a linha do menor esforço. (...) Assim se explicam os alinhamentos das velhas cidades brasileiras. Cresceram ao longo das trilhas batidas a casco de tropa.” (1995, p.112) Desta forma, as enseadas, as baías protegidas, as confluências de rios navegáveis atraíram a população e deram origem aos centros populacionais, haja vista o ditado popular que diz que “a vila nasce onde a tropa descansa”. As ruas, fisicamente delimitam, marcam com o mesmo caráter de um acidente geográfico, um morro ou um rio. Assim como eles delimitam regiões geográficas, consequentemente criam designações sociais. O traçado de uma via, especialmente numa zona construída, é uma questão importante, fundamentalmente para as mudanças na estrutura social que comporta (BUNDÓ e VENTÓS, 2000, p.41, tradução nossa)

O acidente geográfico limita regiões ocupadas por grupos de diferentes costumes e hábitos, desenha a diversidade cultural de um lugar, um continente. As ruas o fazem na cidade. Promovem a interface entre culturas, posturas, a ascensão e decréscimo social, pela liberdade do “ir e vir”. Até onde isso se faz verdadeiro? Até o momento em que o privado começa a prevalecer sobre o público, e se prioriza o exercício das relações público-privado pautada na privatização do espaço público em detrimento da qualificação e ampliação dos segmentos públicos e acessíveis da cidade.

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Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 3.4. Figura-fundo com destaque para edificações e vias na tipologia de implantação de Aterro em Mário Cyprestes, Malha quadricular e Pavoniana em Santo Antônio, Cumes e Vales em Caratoíra e na transição Morro-baixada ao longo da avenida. Desenho sobre base CAD. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Cartografias e morfologias do lugar

TIPOLOGIAS E TRANSVERSALIDADES “Existem algumas características básicas gerais desse processo espaço-temporal dinâmico (mais do que o próprio espaço, é a temporalidade que causa a diferença) das favelas, que são bem distintas do dispositivo tradicional da cidade formal, em grande parte projetada e construída por técnicos.” (JACQUES, 2002, p.51).

Paola nesse trecho se referencia ao processo construtivo de uma comunidade de formação espontânea, desde a tipologia urbana até o âmbito das edificações. A espontaneidade e efemeridade formal dos elementos mostra esse processo espaço-temporal dinâmico. No caso da avenida, ela permeia espaços variados de formação, e a interface da avenida com seu entorno ocupado é quase sempre superior, de domínio marcando essa ocupação no espaço. O trecho um pouco mais planejado, pela Obra Pavoniana, no bairro de Santo Antônio, apresenta uma tranversalidade mais enfática, dada na região do loteamento feito sobre o antigo manguezal. Já Mário Cyprestes, loteado junto ao processo de urbanização do aterro, se descola por vezes da evolução formal da avenida. Apresenta um trecho com lotes amplos e regulares distinto da área do morro do Alagoano com ocupação orgânica em que o aclive do morro dificulta esse parcelamento regular e amplo. A evolução urbana da região se diferencia a cada trecho de ocupação da avenida, como se pode observar no esquema gráfico ao lado. No trecho no bairro Santo Antônio, por exemplo, o histórico da apropriação da ordem religiosa domina a consolidação espacial. A diferenciação formal arquitetônica e a utilização do espaço seguem a lógica do espaço físico local e do contexto político, econômico, histórico a cada época de ocupação. Ladeando a avenida se vê uma apropriação rarefeita, a oeste, e muito adensada a leste, nos morros. Na verdade, é rarefeita quando se observa do nível da rua, porque muitas das edificações estão abaixo dela, tendo suas conexões tratados com escadas, rampas, nos lotes em que as ruelas e travessa não alcançam o nível de sua testada.

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Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 3.6-3vvvvv. Figura 3.5-3.6. Casa abaixo do muro de arrimo da avenida. Conexão visual com casa implantada abaixo do nível da rua. #2 #3

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Figura 3.7. #4

Figura 3.8. #5

Figura 3.9. #6

Figura 3.10. #7

Figura 3.7-3-10. Tipologias de ocupação na avenida Santo Antônio. Conexões estabelecidas entre a rua e a casa.


Cartografias e morfologias do lugar

Figura 3.11. Figura-fundo das principais interseções com a Av. Santo Antônio. Primeiro com a Rua José Bittencourt na volta de Caratoíra; segundo com a Rua Elvira Zílio na curva do Rabaioli: terceiro com a rua Soldado Manoel Furtado que precede a Serafim Derenzi.

A aparente homogeneidade desaparece ao se entrar no complexo, e essa diversidade espacial pode ser confirmada pela própria história do lugar e de suas diferentes comunidades, ao se observar de perto suas origens, seus processos de formação e de transformação, que vão se refletir nas diferentes formas arquitetônicas e urbanas resultantes (JACQUES, 2002, P.20).

Na Av. Santo Antônio a diversidade espacial varia com o tipo de via que a intercepta. Quando são vias de maior porte, como a própria Serafim Derenzi, ou se são simples travessas que adentram os bairros, a avenida naquele ponto se configura de diferente maneira. Nas áreas de maior ocupação, as interseções da via são mais movimentadas, como na curva do Rabaioli #2, na volta de Caratoíra #3, e é onde se vê uma área mais plana favorecendo essa ocupação. As interseções mais expressivas estão em áreas planas ou abrandamento do relevo. A interlocução entre a dinâmica da avenida e sua transversal apresenta uma proporcionalidade. Quanto mais larga essa transversal, mas se altera a morfologia daquele ponto, e mais o diversifica. A recorrência, por exemplo, de vielas e acessos às casas, não influencia na conformação geral da avenida, nem tanto na morfologia. Já as intercepções de vias maiores sempre implicam num desenho diferente, altera a morfologia das imediações da avenida. | 85


Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 3.12. #8

Figura 3.13. #6

Figura 3.14. #9

Figura 3.15. #2

Figura 3.12-3.15. Casas do início do século XX ao longo da Av. Santo Antônio.

O novo e o antigo

Ao longo da avenida percebemos algumas casas antigas e ruínas, com exemplos do início do século passado, datadas em relevo na fachada. As casas dessa época se encontram no pé do morro do Pinto #4, na rua que leva ao Cais do Hidroavião #5; e ao longo da avenida. Marcam a ocupação com referência no tempo e ajudam a delimitar a área do aterro que é da década de 1970. Vemos uma implantação do lote diferente em cada lado da rua, sendo as casas à oeste soltas no lote; e as à leste, adensada no morro. Veem-se alguns exemplos mais antigos do lado do morro, mas a maioria deles estão na margem da baixada. No morro a maioria são sobrados novos ou sofreram transformação em reformas. Figura 3.17-3.20. Conexões estabelecidas com a Av. Santo Antônio. Travessas, vielas, escadas e rampas. (página seguinte)

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Cartografias e morfologias do lugar

Figura 3.16. Ocupação no Morro do Alagoano. Escadas e casas escalando rochas. #10

Conexões

As conexões entre a via e os lotes, entre o público e o privado, são percebidas ao longo da via por quem faz o percurso transversal à ela, muitas vezes verticais, como de avenida/morro, avenida/ baixada. Elas acontecem dentro do lotes, com soluções do próprio morador, ou por vielas comuns, que são antigos caminhos que se configuram como vias. Por Maria Elaine Kohlsdorf “As conexões significam ‘portas’ de entrada e saída dos lugares ou de acesso entre suas partes” (1996, p.165). Assim temos as escadas, rampas, vielas como conectores e as mais numerosas transversais à Av. Santo Antônio. Sendo ela poucas vezes interceptada por vias maiores, os pedestres fazem esse percurso de travessia mais frequentemente a pé.

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Figura 3.17. #11

Figura 3.18. #12

Figura 3.19. #13

Figura 3.20. #14


Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 3.21.

Figura 3.22xxx

Figura 3.21-3.22. Representação do perfil das edificações na volta do Caratoíra e panorâmica do local. #15

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Cartografias e morfologias do lugar

Nesse recinto especialmente, é importante a análise das fachadas por ser uma praça pública de grande utilização e historicamente reconhecida. O perfil que circunda a volta do Caratoíra #3, além de uma composição de fachadas interessante, apresenta um coroamento em camadas. Acima das edificações do primeiro plano, há uma zona verde coroada com um assentamento orgânico no topo do morro. Esse conjunto mostra uma multiplicidade de tipos, épocas, sobrepõe estilos e enuncia a evolução do lugar. Maria Elaine Kohlsdorf trata as fachadas que circundam uma área pública em conjunto. Ela afirma porém, que cada fachada possui sua individualidade e a variabilidade de tipos ajuda na orientabilidade das pessoas naquele espaço (1996, p.155). Nesse conjunto da volta do Caratoíra #3, observa-se a variação da tipologia evidenciada simplesmente pela cobertura, como mostra o croqui ao lado. Com gabaritos bem variados, pode-se sugerir ainda o porte ou o tipo de uso, como residencial unifamiliar para a segunda, e comercial para a quarta edificação - da esquerda para a direita. Esses são alguns dos exemplos que se observa na Avenida Santo Antônio, e podemos com novos instrumentos de análise eleger vários outros. É importante o exercício da observação para absorver características próprias do lugar e ter uma coompreensão melhor do espaço. É por isso que o estudo da região restrito ao mapa não é suficiente. A percepção da área mais “formal” é comum em livros, uma história reconhecida. Já a cartografia da região de formação espontânea deve ser vivida, experimentada para se absorver. A percepção ambiental não é preestabelecida como nos espaços públicos de grande expressão, projetados. A apreensão da urbe orgânica muda a todo tempo, e a cada passo. Daí vemos uma nova avenida a cada trecho, a cada esquina, a cada edificação, a cada escada e a cada casa. Que a cada dia se faz nova. O labirinto-favela é muito mais complexo do que os labirintos planejados, pois não é fixo, acabado, está sempre se transformando. Nenhuma planta de favela é definitiva, só podem existir plantas momentâneas ou fotos aéreas, sempre feitas a posteriori (JACQUES, 2002, p.54).

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ANÁLISE SEQUENCIAL

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Anรกlise Sequencial

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ANÁLISE MORFOLÓGICA SEGUNDO PHILLIPE PANERAI Essa análise morfológica em sequência pretende amarrar as diversas circunstâncias mostradas nesse estudo através da uma metodologia de apreensão do território de Phillipe Panerai. Tendo essa linearidade da Av. Santo Antônio uma ênfase na apreensão da mesma, o percurso é orientador desse exercício. Para fazer uma análise sequencial de um percurso, se apresenta uma sequência de planos, representado num esquema gráfico ou foto, enquanto a passagem entre um e outro pode ser descrita, segundo Panerai (p.36, 2006). Entre um plano e outro pode haver uma relação contínua e gradual, ou uma sucessão de rupturas. Através dessa sequência de imagens da Av. Santo Antônio, se propõe um exercício que confronta paisagem sequencial/estática e paisagem em movimento/contemplativa. Percebemos que aquelas situações urbanas que estamos acostumados a classificar como pitorescas, o são em razão da acumulação de planos diferentes, com rupturas bastante fortes, numa distância relativamente curta, enquanto os efeitos monumentais resultam principalmente de sucessões bastante lentas (além das características de simetria, axialidade e demarcações próprias a cada época) (Panerai, 2006, p.40)

A estética do pitoresco evoca imperfeições e assimetrias em cenas repletas de detalhes curiosos e característicos que procuram remeter a uma natureza acolhedora e generosa. Panerai propõe retomar a prática da pesquisa in situ, identificar os elementos da paisagem e organizá-los em sequências. Associando a observação direta o croqui, a fotografia, o vídeo, o esquema e a análise cartográfica, se tem uma maneira de apreender a cidade. Não se trata apenas de uma valorização do visível, mas uma leitura feita de diferentes pontos de vista e na qual intervém o movimento do observador. “Hoje, esse movimento não pode ser dissociado dos meios de transportes rápidos que foram introduzidos nas grandes cidades, nem dos territórios engendrados por esses mesmos meios de transporte.” (PANERAI, 2006, p.42) 92 |


Análise Sequencial

Verbos de mudança de estado como surgir, mudar, tornar-se, são aplicados na narrativa para tratar a sequência de imagens como percurso, assim como outras palavras que denotam movimento e até mesmo noção do tempo percorrido entre elas. Entendendo as expressões base da descrição da paisagem nesse exercício, temos: inflexão, bastidores, afunilamento, escalonamento, ampliação, convidativo, emoldurado, campo visual, diálogo, transparência, opacidade, bastidor, além, recinto, entre outros termos de referência da paisagem urbana. Aqueles momentos em que a metodologia de Panerai não é suficiente, busca-se outros autores da morfologia e paisagem urbana como Gordon Cullen e Maria Elaine Korhlsdorf. O sentido de observação da paisagem escolhido para a análise é o sentido Sul-Norte, sendo o mesmo sentido de ocupação da região no início do século passado, saindo da área central rumo a oeste. A descrição de cada trecho começa por uma curva, e se encerra quando o percurso fica reto. Trechos retos descartam descrição, pela continuidade da paisagem que revelam. A ruptura e movimento dado pelos trechos curvos que são foco da análise nesse exercício. Nesses trechos, algumas panorâmicas paralelas a avenida são feitas para descrever aspectos da paisagem longitudinal a avenida. A marcação central da rua, é base para o dispare das fotos, e daí é feito o enquadramento delas. As inflexões para à direita geralmente se voltam para a região de morro, enquanto as inflexões à esquerda se voltam para a visão além mar, de Porto de Santana e o morro Mochuara em Cariacica.

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 4.1. #1

Figura 4.2.

Figura 4.3.

Figura 4.4.

Figura 4.5.

Figura 4.6.

Figura 4.1-4.6. Trecho Acesso. Bastidores e desvio para a Av. Santo Ant么nio. 94 |


Análise Sequencial

Trecho Acesso

A avenida Santo Antônio dá sequencia a Avenida Duarte Lemos, que liga a região central de Vitória aos bairros seguintes. Ela se inicia com cenário de bastidores, pela sobreposição dos elementos do primeiro plano sobre o edifício Shopping Vitória #1 ao fundo. A via, que faz uma acentuada inflexão a direita, num desvio do cenário mais destacado, traça um convite a Av. Santo Antônio. A visual mais convidativa é à esquerda, sentido para a rodoviária, por ter um aspecto ampliado, e pelas indicações na placa, como ponte Florentino Avidos, apontarem para ela. Uma questão curiosa é a indicação do Parque da Fonte Grande também para a direção do aterro, sugerindo o caminho pela beira-mar. Se indica preferência no caminho que percorre o Tancredão, o Sambão do Povo, grandes obras do governo, ao invés do caminho mais instintivo, pela avenida Santo Antônio, já ladeando o morro, desviando do seu uso tanto pela falta de infra-estrutura quanto por um desvio de uma marginalidade urbana. Já a direita, o elemento árvore abriga o espectador, direciona. Seguindo nela a arquitetura indica fechamento, e novas placas indicam a Av. Santo Antônio e se inicia um trecho reto e aberto. O desvio visto nesse trecho ocorre em relação a uma área expandida da cidade, sobre um aterro. Porém antes dele a vista ali era voltada para o mar, num cenário diferente do que temos hoje, e o único caminho possível para o oeste da cidade era a própria avenida.

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hipertexto

Figura 4.7. Trecho Acesso. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

N

1 1

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Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 4.8. #2

Figura 4.9.

Figura 4.10.

Figura 4.11.

Figura 4.12.

Figura 4.13.

Figura 4.8-4.1. Trecho Náutico. Clube Náutico e Morro do Alagoano. 96 |


Análise Sequencial

Trecho Náutico

Uma casa com aspecto antigo #3 supõe a idade da via naquele trecho, diferente do anterior. O trecho é de inflexão a direita, e o Clube Náutico #4 marca essa inflexão pela margem esquerda. A própria comunicação visual do clube é feita na fachada lateral do edifício, por ter mais destaque do que a fachada principal, nessa vista em escopo do edifício. Há um fechamento pela arquitetura do clube num escalonamento lateral, que enfatiza a inflexão, seguida de um trecho reto, com abertura do campo visual, com vista para o morro habitado ao fundo.

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Figura 4.14. Trecho Náutico. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 4.15. #3

Figura 4.16.

Figura 4.17.

Figura 4.18.

Figura 4.19.

Figura 4.20.

Figura 4.15-4.20. Trecho Carato铆ra. Abertura e conectividade. 98 |


Análise Sequencial

Trecho Caratoíra

A demarcação do eixo da via se abre num amplo cruzamento de vias na volta do Caratoíra #5 e uma abertura do campo de visão para uma larga praça arborizada, abrigada pelo morro do Alagoano #6. Essa abertura se dá uma vez que não são os elementos imediatos, do primeiro plano, que caracterizam essa paisagem, e sim o plano de fundo do morro e arborização. A arborização não avança sobre a via, compondo o cenário mas ao fundo. O gradil da quadra enfatiza esse cenário, pois é um bloco translúcido e mostra através dele. A inflexão da via, pelo lado esquerdo, segue num muro fechado, o da escola de samba Novo Império #7, e um muro vazado, que revela um lote vazio abaixo do nível da rua, com um edifício tipo armazém, o Teatro Carmélia #8. Aí se dá uma conexão visual que perpassa os três níveis transversais da avenida: baixada, rua, morro. Essa grande conversão de vias que se vê, dá vazão ao fluxo do Ponto Chic #9, nó viário interno a Caraatoíra, que conecta sete vias do bairro em uma única esquina. Uma delas, a Rua Ernesto Bassini, leva ao bairro Santo Antônio. Este então é um atalho para onde os caminhões foram deslocados para não circularem pela Av Santo Antônio ao seguir para a Serafim Derenzi.

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Figura 4.21. Panorâmica a partir da praça Antônio Marques para o lote do Teatro Carmélia. #4

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Santo Antônio e sua linha mestra

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Figura 4.22. Trecho Caratoíra. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Análise Sequencial

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Figura 4.23. Trecho Rádio Capixaba e Trecho Vista Cariacica (próxima página). Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Santo Antônio e sua linha mestra

Trecho Rádio Capixaba

Esse é o trecho que se inicia com uma concavidade vertical, com o início de uma ladeira em ascenção. Há um fechamento lateral direito com edificação mais altas #10. O morro aí não se evidencia tanto, se esconde atrás dessas edificações do primeiro plano. O campo visual se dá numa abertura ao final do trecho a céu aberto. Então esse deslocamento foi em sentido oposto ao morro, em direção para a baía. Figura 4.24. Trecho Rádio Capixaba. #5

Figura 4.25.

Figura 4.27. Panorâmica com vista para Cariacica e para avenida. Por Felipe Guasti. #6

Figura 4.29gggg

Figura 4.26.

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Figura 4.28-4.29. Vistas sobre a edificação em datas diferentes.


Análise Sequencial D

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Trecho Vista Cariacica

Esse trecho se inicia com certa frieza na deferência entre a rocha à direita #11, e o muro à esquerda #12. O trecho segue em ascensão, numa concavidade que enfatiza o céu aberto, e ao se aproximar da curva, um pouco da cidade de Cariacica, que está para além da baía, se revela.

Figura 4.30. Trecho Vista Cariacica. Visão e obstáculo. #7

No início dessa inflexão a direita, há uma garagem #13 no nível da rua que interrompe a visual de Cariacica. A construção dessa edificação foi feita ao longo do processo de análise, tendo registrado várias etapas dela. Esse registro mostra a consolidação da paisagem da Av. Santo Antônio com uma alternância de mirante natural para com obstáculos ou impedimentos, que se verifica em vários trechos. Ela conta com a omissão versus a revelação de elementos, composta tanto por itens imediatos a avenida, quanto por outros da cidade vizinha como o morro Mochuara e o bairro de Porto de Santana.

Figura 4.31.

Figura 4.32.

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Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 4.33. #8

Figura 4.34.

Figura 4.35.

Figura 4.36.

Figura 4.37.

Figura 4.38.

Figura 4.33-4.38. Trecho Mochuara, interação primeiro e segundo plano. 104 |


Análise Sequencial

Trecho Mochuara

No início dessa curva a imagem do Mochuara, morro de Cariacica, se mostra por trás de um muro baixo, que evidencia essa paisagem. Com a denominação de além dada por Gordon Cullen, vemos a perspectiva sobre esse morro como um realce tanto na paisagem edificada, quanto na panorâmica em mirante. O trecho finaliza com a margem direita em elevação alta e a esquerda baixa, até um vão que revela a vista abaixo.

D

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Figura 4.39. Panorâmica a partir de um vão no muro azul desse trecho. #9

Figura 4.40. Trecho Mochuara. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 4.41. #10

Figura 4.42.

Figura 4.43.

Figura 4.44.

Figura 4.45.

Figura 4.46.

Figura 4.41-4.46. Trecho Casa 1912 e o morro edificado. 106 |


Análise Sequencial

Trecho Casa 1912

Nesse trecho essa casa #14 é destaque. Em todo o percurso da avenida, ela é notada como mais antiga e realçada por estar isolada de outras edificações. Está inserida num cenário com fechamento lateral seguido de bastidores. Ele releva primeiro essa casinha num terreno arborizado, e depois o morro do Caratoíra #15 habitado ao fundo. A casa antiga em contraponto com o morro edificado provocam sensação de assimetria, e também uma descontinuidade temporal, de dois tempos da história num mesmo cenário.

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Figura 4.47. Casa com ‘1912’ em relevo ao centro e o proprietário orgulhoso. #11

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

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Análise Sequencial

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Figura 4.48. Trecho Casa 1912 e Trecho Rabaioli (próxima página). Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 4.50. Figura 4.49. Trecho Rabaioli. A curva do Rabaioli num recinto facetado. #12

Figura 4.51.

Figura 4.52.

Figura 4.54.

Figura 4.55.

110 |

Figura 4.50.

Figura 4.53.

Figura 4.56.


Análise Sequencial

Trecho Rabaioli

A curva do Rabaioli, nome de uma família que possui residência antiga #16 no local, dá a sensação de bastidores e de recinto exterior em seu percurso. O efeito bastidor começa no trecho anterior com a descoberta desse morro edificado, e se extende até esse ponto em que as edificações do primeiro plano revelam o morro. No meio do trecho, as edificações se equivalem em importância e em escala e tornam o ambiente um grande recinto. Por Cullen, no recinto se tem o sossego e a tranquilidade de sentir que o largo, a praceta, ou o pátio, tem escala humana (1971, p.27). Aí o alargamento da via e as paredes das edificações proporcionam uma praceta, recolhida, com ponto de ônibus, comércios, com banners e cores, que em conjunto dizem “Aqui as pessoas se encontram.” Depois da volta de Caratoíra é o local mais expressivo nesse aspecto.

Figura 4.54.

Figura 4.51.

Figura 4.57.

Figura 4.57.

Figura 4.55.

Figura 4.52.

Figura 4.58.

Figura 4.58.

C

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Figura 4.56.

Figura 4.53.

Figura 4.59.

Figura 4.59. | 111


Santo AntĂ´nio e sua linha mestra

Figura 4.60. Curva do Rabaioli vista para o morro do Alagoano. #13

Figura 4.62mm

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Figura 4.61-4.63. ComÊrcios e serviços na curva do Rabaioli. #14

Mesmo sem muito registro sobre esse ponto, a curva do Rabaioli se mostra ativa e acolhedora. Seus morros multifacetados colorem e abrigam esse recinto.

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Análise Sequencial

Contrapondo a essa complexidade do morro, a curva abraça a residência dos Rabaioli implantada numa antiga enseada, banhada pelo mar, e um dos trechos em que a ocupação ainda é esparsa. No plano de fundo se vê o mar na foto de 1940 encoberto por dezenas de edificações na foto atual.

Figura 4.64. Vista da casa dos Rabaioli e o mar na década de 1940. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. #16

Figura 4.65. Vista da casa dos Rabaioli e o mar nos dias de hoje. #16

Figura 4.66. Panorâmica da curva com a casa dos Rabaioli e o Mochuara. #16

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 4.67. #15

Figura 4.68.

Figura 4.69.

Figura 4.70.

Figura 4.71.

Figura 4.72. #16

Figura 4.73.

Figura 4.74.

Figura 4.67-4.76. Trecho Verde. Meandros da Av. Santo Ant么nio.

Figura 4.75.

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Figura 4.76.


Análise Sequencial

Trecho Verde

A curva do Rabaioli aponta novamente para Cariacica, e o cenário agora mostra uma assimetria lateral. À esquerda casas, e a direita árvores. Nesse ponto um pouco do morro do Mochuara se revela ao fundo novamente. Adiante a vegetaçao cobre a via, num emolduramento verde, e a avenida se volta para o morro de novo. Neste ponto a paisagem muda, porque a encosta do morro é menos adensada, com muita vegetação, o que trás um aspecto rural. Depois de uma nova inflexão à esquerda, se volta a direção para Cariacica, num novo trecho reto, poucas casas e ainda bastante vegetação. Aqui a relação paisagem natural e construída conversam de maneira que a arquitetura emoldura a natureza e a natureza emoldura o construído. Nessa panorâmica vemos uma linha limite entre construído e natural que distribui essas duas forças. Vemos uma distinção em cores e texturas, ativando uma interlocução desses elementos díspares. Na garagem #17 à esquerda, vemos ao fundo a paisagem pela janela, depois ela intermediada por um poste e, no muro verde #18, a paisagem se revela no portão de ferro.

C

hipertexto

Figura 4.77. A interlocução da paisagem construída e natural emolduram o Mochuara. #17

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18 Análise Sequencial

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Figura 4.78. Trecho Verde e Trecho Transição (próxima página). Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 4.79. #18

Figura 4.80.

Figura 4.81.

Figura 4.82.

Figura 4.83.

Figura 4.84. #19

Figura 4.85.

Figura 4.86.

Figura 4.79-4.88. Trecho Transição. Curva suave e mudança da paisagem.

Figura 4.87.

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Figura 4.88.


Análise Sequencial

Trecho Transição

Uma inflexão prolongada a direita leva até o início do bairro Santo Antônio. Sem muitas intervenções do segundo plano na paisagem, esse trecho é ladeado por edificações, muros, árvores, elementos imediatos a avenida. Aí não se percebe uma relação morro-baixada forte. Mas ao fundo se revela o Morro do Pinto #18, bem próximo e quase banhado pela baía, é ladeado pelo Cais do Hidroavião #19, pelo Santo Antônio Futebol Clube e pela prainha de Santo Antônio #20 ao norte. O morro localizado a esquerda da via, e a curva que se descreve para a direita, mostram uma inserção ao interior da ilha, diferente do caráter periférico que o percurso tinha até então. Um largo se abre em amplidão com um terreno baldio à esquerda, um verdadeiro “cemitério de alegóricos” #21. Aí fica a dispersão dos desfiles das escolas de samba onde acabam sendo descartadas várias alegorias, que desenham essa paisagem, se desmanchando e se renovando a cada ano.

B

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Figura 4.90mmm

Figura 4.89-4.90. O colorido do “cemitério de alegóricos” retomam os festejos em torno das chegadas e partidas no Cais do Hidroavião em 1930. Fonte: Arquivo Geral de Vitória.

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Santo Antônio e sua linha mestra

Figura 4.91. #20

Figura 4.92.

Figura 4.93.

Figura 4.94.

Figura 4.95.

Figura 4.96. #21

Figura 4.97.

Figura 4.98.

Figura 4.91-4.100. Trecho Cemitérios. Botecos e cemitérios na vizinhança.

Figura 4.99.

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Figura 4.100.


Análise Sequencial

Trecho Cemitérios

O Santo Antônio Futebol Clube #20 e a escola Alvimar Silva #22 marcam início do bairro de Santo Antônio junto a uma série de narrativas que são feitas sobre esse lugar. Numa intercessão entre a avenida Santo Antônio, e a rua Dom Benedito #23 que leva até o Cais do Hidroavião #19, o ponto faz a interlocução entre o trecho antigo e a área aterrada de Mário Cyprestes. A inflexão à direita revela ao fundo o morro da Fonte Grande com maior altitude, verde e nativo, começando um trecho reto. Mais adiante se vê uma deferência entre os elementos arquitetônicos da avenida, mais do que uma relação topográfica caracterizando o sítio. Há uma competição entre o supermercado #24 e o cemitério público #25 pelas cores e o marketing visual. Essa deferência ocorre mais uma vez entre os dois cemitérios, em que o da Boa Morte #26 apresenta gradis e adornos ainda mais antigos. Cessam os cemitérios, vem os botecos #27, a matriz da igreja católica #28, junto à edificações mais altas no fim da avenida.

B

hipertexto

Figura 4.102.

Figura 4.101-4.102. No sentido contrário a análise, a interseção com a Rua Dom Benedito. Fonte: Blog Fotos antigas de Vitória. #22

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N Santo Antônio e sua linha mestra

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19 24 20 23

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20 Figura 4.103. Trecho Cemitérios. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Análise Sequencial

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23

Figura 4.104. Trecho Fonte Grande. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória.

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Santo Ant么nio e sua linha mestra

Figura 4.105. #23

Figura 4.106.

Figura 4.107.

Figura 4.108.

Figura 4.109.

Figura 4.110.

Figura 4.105-110. Trecho Fonte Grande. Aclive at茅 a vista para a Fonte Grande. 124 |


Análise Sequencial

Trecho Fonte Grande

O trecho é marcado por um grande desvio, que é o cruzamento que leva a prainha #29 e a Rodovia Serafim Derenzi #30, esta que eu geral é confundida com a Av. Santo Antônio, mas que dá continuidade a ela no contorno da ilha. Nota-se um estrangulamento marcado pela concavidade da ladeira que se aproxima. Íngreme, o trecho é marcado pelo perfil das edificações, seus portões e acessos. O morro da Fonte Grande volta a aparecer, por detrás de um campo de futebol e o portão da escola Ludovico Pavoni #31. Alguns exemplares de casas mais antigas, a escola, a pedreira ao fundo e uma paleta de cores mais incrementada preparam um recinto acolhedor nesse final. A ladeira desce novamente e se encerra a avenida, tomando dois sentidos, para a basílica Santo Antônio #32 e para o interior do bairro.

A hipertexto

Figura 4.111. O final da Avenida Santo Antônio no ponto mais clamado por todos: o Santuário de Santo Antônio. Fonte: Site Olhares.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

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O estudo da linha físico-temporal Av. Santo Antônio deu subsídios para entendimento desse território como marco na paisagem, na história da cidade de Vitória, desde embrião a expansão da cidade, como mediadora nos percursos intermunicipais. Tendo proposto na metodologia um estudo híbrido que articula história, memória e percepção, vemos a interação no estudo dos padrões espaciais, da vida social além da vida espacial. Os padrões espaciais são percebidos através do estudo da morfologia e da paisagem enquanto a vida social e espacial é obtida pela história das pessoas e a relação delas com o espaço vivenciado. Nesse setor urbano imediatamente vemos uma organicidade formal e da apropriação sobre o espaço. Tal organicidade, porém, não foi determinante para um sentido de conexão e permeabilidade do tecido, como se percebe em favelas ou cidades coloniais brasileiras, em que a organicidade se estabelece com uma interatividade entre os espaços internos. Outro fator foi determinante, a dualidade morro-mar do espaço escoou para uma curva de nível mais baixa, na Av. Santo Antônio, o elemento articulador dos variados tecidos, com várias morfologias dadas por topografias distintas. Nesse território, esse escoamento dos fluxos para a linha Santo Antônio enfatiza a sua extensão e reduz suas transversalidades. “O caminho conduz de ponto a outros da cidade, dá acesso de um lado e de outro, dá acesso a terrenos, campos, lotes. No entanto o cruzamento, a parada obrigatória produz o comércio. Segue o sedentarismo. Nasce a cidade” (PANERAI, 2006, p.18). Em Santo Antônio percebemos que essas tais transversalidades, junto ao comércio, as travessas, as ruelas, não foram o suficiente para interrompê-la, fracioná-la. Percebemos que a irrigação por vielas e travessas ao longo da avenida não exerce de fato a irrigação rizomática, obtida pela permeabilidade sobre lógica do acúmulo estabelecida. A excentricidade, que possui a Av. Santo Antônio, concentrando comércios, serviços, e espaços públicos, orientada pelo movimento natural, acaba por inibir a articulação entre tecidos reduzindo a mobilidade à avenida. Mobilidade essa que consiste no movimento interno, entre tecidos, no trajeto menor, de acessibilidade dos moradores sobre o território, que é reduzido ao pedestre ou ao carro em lugares distintos. | 127


Com apenas quatro transversais viárias, como a Volta do Caratoíra, a curva do Rabaioli, a Rua do cais do Hidroavião (Rua Dom Benedito) e a que leva à Serafim Derenzi, a formação dos tecidos fica marcada com o padrão espacial curva de nível e sua topografia define morfologias distintas. A interação entre os tecidos só se faz nessas interseções, atrelado a um abrandamento do relevo, provocando esse ponto articulador entre os tecidos, e a mobilidade entre eles. Essa redução da mobilidade também traz uma disparidade com uma descontinuidade da vida espacial, e da interação social sobre esses espaços. Aí se forma uma ruptura de padrões espaciais que provocam também a ruptura da vida social e a vida espacial do território. Temos, então, um tecido descontínuo e plural, com trechos distintos em sua morfologia e apropriação do espaço, além de uma vida social variada. São eles os Cumes com grande adensamento de edificações; Vales com abertura de espaço para as vias; o Morro-baixada na transição marcada entre as margens da avenida; o Aterro no loteamento institucional de Mário Cyprestes; a Quadrícula na área plana em torno dos cemitérios e a Pavoniana com loteamento guiado pela ordem religiosa. “Não há nenhuma possibilidade de se alcançar as origens exatas de uma linha, mas se pode agarrar a ela, da mesma maneira que a gente se agarra a uma vontade.” (BATES,1996, p.7)

Na Av. Santo Antônio se pode agarrar para rever sua história, para conhecer a ilha virgem, a mata nativa e a maré dominante, para cruzar a baía de barco, para tomar o bonde para o sentido que a cidade cresce, para assistir a evolução da cidade de Vitória, para entender a expansão da vila central, para atravessar pontes, para conhecer Vitória crescendo para além mar. Assim como Bates diz, a imersão em seus limites físicos, ou ao princípio de sua existência, tão somente não nos leva a compreensão plena desse setor urbano. Mas sim o entendimento de sua vida social ao percorrer a trajetória e conhecer as estórias do morador, do operário, da meretriz; ver o percurso do bloco de carnaval, do modal, da procissão; ver as ações e movimentos feitos sobre lugar, estudar essa dinâmica que pode trazer o entendimento do território. 128 |


Como linha, a Av. Santo Antônio tem caráter essencial de limiar morro e mar. Essa relação com o ambiente é a mais íntima que o homem pode estabelecer com a terra. Aí se dá a relação primeira do homem com o espaço usando o mar para seu sustento, seu transporte. E nos morros de fazem as fazendas e as chácaras de plantio que abastecem de alimentos a vila. É nessa experiência do ambiente morro e mar que a comunidade se instala, e permanece no limite tênue entre essas práticas, ao longo da estrada Santo Antônio. Com o advento da cidade, da urbanização e sua expansão, com consequente segregação social e espacial, é em Santo Antônio que os migrantes e populares se instalam. Impulsionando a ocupação à oeste, que se prolonga até São Pedro em fins do século XX, a Av. Santo Antônio inicia o papel conector. Antes ponto final do bonde, ponto de aterrissagem do voo, ponto de estoque do café vindo do interior – até mesmo ponto final da vida, se vermos as sepulturas desta forma, a avenida passa a ser linha base da conexão da antiga com a “nova cidade” que se forma a oeste. A permanência dá lugar a passagem, e a relação íntima, menor, perde força para a interação instantânea com a paisagem, vista quadro a quadro através das janelas do veículo. Os dois fluxos, morro e mar e entre-cidades, de direções transversais, se formam sobre essa região, não como possibilidades únicas, mas como linhas de força marcadas sobre uma infinidade de percursos que se faz e se cria na extensão desse território. Após o aterro da região de Mário Cyprestes, se altera ainda mais essa dinâmica. Esmaece essa relação própria do lugar com o mar, quitando-a em alguns pontos, preservando-a em outros, e até deixando-a quase inalterada na Rua do Cais do Hidroavião, em que os barcos e os banhos de maré permanecem vívidos. Uma nova dinâmica, de fruição do equipamento público municipal, como a rodoviária, o Tancredão e o Sambão do Povo, se estabelece. Porém a interação deles com o contexto não se efetiva, é subutilizado, com adesão em momentos isolados, assim como a sua implantação esparsa ao longo desse território. A impressão a partir do estudo da cidade, da arquitetura e da paisagem que contempla esses elementos, aponta para uma ativação desse lugar a partir da sobreposição das dinâmicas de apropriação desse território e articulação entre os padrões espaciais e sociais | 129


percebidos. Provocar um perpasse entre o público de passagem e a população local é importante nessa interação. Trazer o público pendular para a apreciação da região de Santo Antônio como lazer, e apreciação desse sítio que deve ser recuperado e preservado a partir do interesse histórico, paisagístico e cultural do município e do estado. Promover um incremento populacional com um complexo de moradia e serviços no conjunto de lotes vagos de Mário Cyprestes. E prover a fruição pela população mais antiga de Santo Antônio, assim como a toda população da região, dos serviços e lazer dispostos nesse complexo, a fim de prover o pertencimento e a apropriação sobre esse espaço construído sobre o aterro. Podemos absorver da Avenida Santo Antônio e suas imediações que seus aspectos próprios, e a multiplicidade que se vê nela, confrontam uma mera recorrência de fatos e quadros, como sua linearidade pode sugerir. Uma apreensão acompanhada física e cognitivamente por essa dualidade morro-mar traz a tona um alicerce para recuperação, regeneração e intervenção sobre esse território da baía oeste de Vitória.

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ANEXOS

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ROTEIRO DE ENTREVISTA Apresentação

O estudo visa entender como se deu a ocupação da região de Santo Antônio, de imediato à avenida de mesmo nome; como se davam as práticas sócio-culturais; e qual a relação dessas práticas de ontem com as atuais, após a influência do aterro na região. Busca identificar uma relação sócio-ambiental das imediações da avenida e a maneira como ela se insere na dinâmica da região hoje, com o que herdou das atividades do passado. Pretende entender em que o aterro interferiu na formação da região e na apropriação dos núcleos de manifestações culturais já estabelecidos na região. Entrevista

Fale um pouco sobre o bairro de Santo Antônio. Quais aspectos você considera importantes no bairro? Quais aspectos você pensa que poderiam melhorar? Apresente Santo Antônio como se o fosse para uma pessoa que não o conhece. Agora conte como era quando esteve em Santo Antônio pela primeira vez. (É interessante contar uma história, um caso que aconteceu, ou descrever um lugar) O que você pensa sobre a avenida Santo Antônio? Como você a vê? Você a utiliza de que forma em seu dia-a-dia? No passado, você pensa que ela já foi diferente? Se pudesse definir o bairro de Santo Antônio em uma palavra, qual seria?

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LISTA DE IMAGENS

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Apresentação Figura 1.1. A volta de Caratoíra a partir do morro do Alagoano por volta de 1960. Fonte: Instituto Jones dos Santos Neves - IJSN acesso em julho de 2012 <http://legado.vitoria.es.gov.br/baiadevitoria/> .......................................................................p.10 Figura 1.2. Baía oeste de Vitória, Santo Antônio e sua linha mestra. Fonte: Acervo Baía de Vitória [Mesmo acesso do item 1.1] ......................................................................................................................................................................................................p.16 Figura 1.3. Cais do Hidroavião ao fim da Rua Dom Benedito. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] ...............................................................................................................................................................................................................p.19 Figura 1.4. Fim da Av. Santo Antônio na interseção com a Av. Serafim Derenzi. ....................................................................p.22 Figura 1.5. Curva do Rabaioli tomada pelo bloco de carnaval Fora de Hora. ............................................................................p.24 Figura 1.6. Vista da Pedreira e da Basílica de Santo Antônio a partir da baía. Fonte: SkyscraperCity, acesso em julho de 2012 <www.skyscrapercity.com> ........................................................................................................................................................p.26 Figura 1.7. Dados sócio-econômicos da região de Santo Antônio. Fonte: Vitória em dados, Prefeitura de Vitória – PMV acesso em julho de 2012. <http://legado.vitoria.es.gov.br/regionais/home.asp> ........................................................................p.29 Figura 1.8. Recorte do território de Santo Antônio sobre foto aérea da ilha de Vitória. Fonte: Google Earth, acesso em julho de 2012. <https://maps.google.com/> ........................................................................................................................................p.30 Figura 1.9. A região oeste da baía de Vitória, a Avenida Santo Antônio com os bairros contíguos a ela destacados sobre foto aérea. Fonte: Sirgas 2000. ..............................................................................................................................................................p.31 Figura 1.10. Mapa de navegação da cidade de Vitória de 1936 ainda sem os principais aterros na baía. Fonte: Acervo Antenor Guimarães. [Mesmo acesso do item 1.1] ..................................................................................................................................p.32 Figura 1.11. Vista da região do atual aterro da Comdusa a partir do morro do Alagoano na década de 1940. Fonte: IJSN. [Mesmo acesso do item 1.1] ...................................................................................................................................................................p.33 Figura 1.12. Fotograma da Baía de Vitória englobando a Ponte Florentino Avidos, Ilha do Príncipe, Vila Rubim e Santo Antônio. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] .....................................................................................p.34 Figura 1.13. Entrada da Vila Rubim pela Avenida Duarte Lemos na década de 1920. Fonte: Acervo Santa Casa de Misericórdia, Coordenadoria de Revitalização Urbana, Prefeitura Municipal de Vitória - PMV. ....................................................p.35 Figura 1.14. Vila Rubim vista a partir da Ilha do Príncipe da década de 1920. Fonte: Coordenadoria de Revitalização Urbana, PMV. ................................................................................................................................................................................................p.35 Figura 1.15. Ocupação de Santo Antônio. Cemitérios e vida social do bairro incrementada a partir da década de 1940. Fonte: IPHAN. [Mesmo acesso do item 1.1] ......................................................................................................................................p.37 Figura 1.16. Ocupação de Santo Antônio. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] ..........................p.37 Figura 1.17. Cais do Hidroavião de 1939 fotografado em 1955. Fonte: IJSN ..............................................................................p.38 Figura 1.18. Carril mortuário de Santo Antônio. Fonte: De olho na ilha, acesso em setembro de 2010, <http://deolhonailha-vix.blogspot.com.br> ...................................................................................................................................................................... p.39 Figura 1.19. Funeral no cemitério público. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] .........................p.39 | 135


Figura 1.20. A estrada Santo Antônio no século XIX. Fonte: Mensagem de Governo do Espírito Santo de 1910. ...........p.41 Figura 1.21. A estrada Santo Antônio já com o bonde eletrifica¬do no século XX. Fonte: Mensagem de Governo do Espírito Santo de 1910......................................................................................................................................................................................p.41 Figura 1.22. A estrada Santo Antônio no século XIX. Fonte: Mensagem de Governo do Espírito Santo de 1910. ...........p.41 Figura 1.23. A estrada Santo Antônio já com o bonde eletrificado no século XX. Fonte: Mensagem de Governo do Espírito Santo de 1910. .......................................................................................................................................................................................p.41 Figura 1.24. Aterro da Comdusa de 1975. Nota-se que Av. Santo Antônio não é limite imediato do aterro, o que se vê pela presença de edificações antigas na margem oeste da avenida. Fonte: Sirgas 2000. ..................................................................p.42 Figura 1.25. Esquema de vias que conectam a região de Santo Antônio com a Grande Vitória. Fonte: Google Earth. ....p.47 Memória e vivência Figura 2.1. Inauguração do cemitério público em 1912. No mesmo ano da inauguração da linha do bonde elétrico. Fonte: IPHAN. [Mesmo acesso do item 1.1] ...................................................................................................................................................p.50 Figura 2.2. Rua Dom Benedito em 1940 e hoje. A trajetória no tempo intrínseco a um espaço quase inalterado. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] ...................................................................................................................p.51 Figura 2.3. Rua Dom Benedito nos dias de hoje. ...............................................................................................................................p.51 Figura 2.4. Residência antiga no fim da avenida. ..............................................................................................................................p.53 Figura 2.5. Soleira do portão de entrada do cemitério. ....................................................................................................................p.53 Figura 2.6. Basílica de Santo Antônio a partir da pracinha. ...........................................................................................................p.53 Figura 2.7. Tomada antiga revela o Santuário de Santo Antônio em 1970. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] .................................................................................................................................................................................................p.54 Figura 2.8. Escola Ludovico Pavoni e a “casa do jacaré” ao fim da Av. Santo Antônio. ..........................................................p.54 Figura 2.9. Vista a partir da Basílica de Santo Antônio, sobre ocupação na baixada e vista para o Mochuara. Por Clara Miranda. .....................................................................................................................................................................................................p.55 Figura 2.10. Vista a partir da Basílica de Santo Antônio, sobre ocupação na baixada. [Mesmo autor do item 2.9] ..........p.55 Figura 2.11. Vista a partir da Basílica de Santo Antônio, sobre ocupação na baixada e vista para o Mestre Álvaro. [Mesmo autor do item 2.9] ......................................................................................................................................................................................p.55 Figura 2.12. Santo Antônio Futebol Clube. ........................................................................................................................................p.56 Figura 2.13. Casa de 1924. ......................................................................................................................................................................p.56 Figura 2.14. Obra Social São José, atual escola Alvimar Silva. .....................................................................................................p.56 Figura 2.15. Tráfego intenso no Ponto Chic, nó viário entre seis ruas no bairro de Caratoíra. Fonte: Site Fábio Lube, acesso em julho de 2012, <www.fabiolube.com.br/> .......................................................................................................................p.57 Figura 2.16. [Mesma descrição item 2.15] ..........................................................................................................................................p.57 Figura 2.17. [Mesma descrição item 2.15] ...........................................................................................................................................p.57 Figura 2.18. Ângela Maria canta no Clube Náutico. Por Lourival Azevedo...............................................................................p.58 136 |


Figura 2.19. Arabelo do Rosário recebe homenagem da equipe de remo do clube. [Mesmo autor do item 2.18] ..............p.58 Figura 2.20. Barco da equipe de remo do Náutico. [Mesmo autor do item 2.18] ......................................................................p.60 Figura 2.21. Festa de Carnaval no clube Náutico. [Mesmo autor do item 2.18] .........................................................................p.60 Figura 2.22. Quadrilha durante uma festa junina no clube. [Mesmo autor do item 2.18] .......................................................p.60 Figura 2.23. Família em frente a residência em Santa Tereza em construção. [Mesmo autor do item 2.18] .......................p.60 Figura 2.24. Vista do bairro Santa Teresa para o Mochuara. [Mesmo autor do item 2.18] .....................................................p.61 Figura 2.25. Vistas do bairro Santa Teresa para a baía de Vitória. [Mesmo autor do item 2.18] ............................................p.61 Figura 2.26. Casa construída por Lourival Azevedo. [Mesmo autor do item 2.18] ..................................................................p.61 Figura 2.27. Vistas do bairro Santa Teresa para a baía de Vitória. [Mesmo autor do item 2.18] ............................................p.61 Figura 2.28. Mapa tráfego contorno de Vitória-Segunda Ponte com destaque para o Ponto Chic. Fonte: Sirgas 2000. ..p.62 Figura 2.29. Morro do Alagoano em dia nublado. ............................................................................................................................p.63 Figura 2.30. Foto do manguezal de Santo Antônio abaixo da pedra do Santuário. Fonte: Arquivo Geral de Vitória [Mesmo acesso do item 1.1] ...................................................................................................................................................................p.64 Figura 2.31. Tomada a partir da Fonte Grande mostrando o Morro do Alagoano, o Alto Caratoíra, e o Santuário Fonte: IJSN [Mesmo acesso do item 1.1] ........................................................................................................................................................p.64 Figura 2.32. Foto da Ladeira Dom Benedito nos dias de hoje. ......................................................................................................p.65 Figura 2.33. Croqui feito a partir das descrições de Rosemar sobre como era a Ladeira Dom Benedito na década de 1970. ......................................................................................................................................................................................................................p.65 Cartografias e morfologias do lugar Figura 3.1. Rodovia Serafim Derenzi na década de 1960. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] ..... .......................................................................................................................................................................................................................p.74 Figura 3.2. Vista aérea da ilha de Vitória com a ilha do Príncipe já conectada por pontes sem aterros da baía em 1950. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] ......................................................................................................p.76 Figura 3.3. Cruzamento da ladeira Dom Benedito com a Av. Santo Antônio. ...........................................................................p.78 Figura 3.4. . Figura-fundo com destaque para edificações e vias na tipologia de implantação de Aterro em Mário Cyprestes, Malha quadricular e Pavoniana em Santo Antônio, Cumes e Vales em Caratoíra e na transição Morro-baixada ao longo da avenida. Desenho sobre base CAD. Fonte: GeoWEB Vitória. ........................................................................................................p.82

Figura 3.5. Casa abaixo do muro de arrimo da avenida. .................................................................................................................p.84 Figura 3.6. Conexão visual com casa implantada abaixo do nível da rua. ..................................................................................p.84 Figura 3.7-3.10. Tipologias de ocupação na avenida Santo Antônio. Conexões estabelecidas entre a rua e a casa. ..........p.84 Figura 3.11. Figura-fundo das principais interseções com a Av. Santo Antônio. Primeiro com a Rua José Bittencourt na volta de Caratoíra; segundo com a Rua Elvira Zílio na curva do Rabaioli: terceiro com a rua Soldado Manoel Furtado que precede a Serafim Derenzi. Desenho sobre base CAD. Fonte: [Mesma fonte item 3.4] ..................................................p.85 Figura 3.12-3.15. Casas do início do século XX ao longo da Av. Santo Antônio. ......................................................................p.86 | 137


Figura 3.16. Ocupação no Morro do Alagoano. Escadas e casas escalando rochas. .................................................................p.87 Figura 3.17-3.20. Conexões estabelecidas com a Av. Santo Antônio. Travessas, vielas, escadas e rampas. .........................p.87 Figura 3.21. Representação do perfil das edificações na volta do Caratoíra. ...............................................................................p.88 Figura 3.22. Panorâmica da volta do Caratoíra. .................................................................................................................................p.88

Análise Sequencial Figura 4.1-4.6. Trecho Acesso. Bastidores e desvio para a Av. Santo Antônio. ..........................................................................p.94 Figura 4.7. Trecho Acesso. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: GeoWEB Vitória, acesso em julho de 2012, <http://geoweb.vitoria.es.gov.br/geosite.asp> ....................................................................................................p.95 Figura 4.8-4.13. Trecho Náutico. Clube Náutico e Morro do Alagoano. ......................................................................................p.96 Figura 4.14. Trecho Náutico. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: [Mesma fonte item 4.7] .. .......................................................................................................................................................................................................................p.97 Figura 4.15-4.20. Trecho Caratoíra. Abertura e conectividade. .....................................................................................................p.98 Figura 4.21. Panorâmica a partir da praça Antônio Marques para o lote do Teatro Carmélia. ...............................................p.99 Figura 4.22. Trecho Caratoíra. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: [Mesma fonte item 4.7] .............................................................................................................................................................................................................p.100 Figura 4.23. Trecho Rádio Capixaba e Trecho Vista Cariacica. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: [Mesma fonte item 4.7] ..................................................................................................................................................p.101 Figura 4.24-4.26. Trecho Rádio Capixaba. .......................................................................................................................................p.102 Figura 4.27. Panorâmica com vista para Cariacica e para avenida. Por Felipe Guasti. ...........................................................p.102 Figura 4.28-4.29. Vistas sobre a edificação em datas diferentes. .................................................................................................p.102 Figura 4.30-4.32. Trecho Vista Cariacica. Visão e obstáculo. ......................................................................................................p.103 Figura 4.33-4.38. Trecho Mochuara. Interação primeiro e segundo plano. ...............................................................................p.104 Figura 4.39. Panorâmica a partir de um vão no muro azul desse trecho. ...................................................................................p.105 Figura 4.40. Trecho Mochuara. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: [Mesma fonte item 4.7] ..............................................................................................................................................................................................................p.105 Figura 4.41-4.46. Trecho Casa 1912 e o morro edificado. ..............................................................................................................p.106 Figura 4.47. Casa com ‘1912’ em relevo ao centro e o proprietário orgulhoso. .........................................................................p.107 Figura 4.48. Trecho Casa 1912. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: [Mesma fonte item 4.7] ..............................................................................................................................................................................................................p.109 Figura 4.49-4.59.Trecho Rabaioli. A curva do Rabaioli num recinto facetado. .........................................................................p.110 Figura 4.60. Curva do Rabaioli vista para o morro do Alagoano. ................................................................................................p.112 Figura 4.61-4.63. Comércios e serviços na curva do Rabaioli. .....................................................................................................p.112 Figura 4.64. Vista da casa dos Rabaioli e o mar na década de 1940. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] .....................................................................................................................................................................................................p.113 138 |


Figura 4.65. Vista da casa dos Rabaioli e o mar nos dias de hoje. ................................................................................................p.11 3 Figura 4.66. Panorâmica da curva com a casa dos Rabaioli e o Mochuara. ..............................................................................p.113 Figura 4.67-4.76. Trecho Verde. Meandros da Av. Santo Antônio. .............................................................................................p.114 Figura 4.77. A interlocução da paisagem construída e natural emolduram o Mochuara. ......................................................p.115 Figura 4.78. . Trecho Verde e Trecho Transição. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: [Mesma fonte item 4.7] ..........................................................................................................................................................................p.117 Figura 4.79-4.88. Trecho Transição. Curva suave e mudança da paisagem. .............................................................................p.118 Figura 4.89. O colorido do “cemitério de alegóricos” retomam os festejos em torno das chegadas e partidas no Cais do Hidroavião em 1930. Fonte: Arquivo Geral de Vitória. [Mesmo acesso do item 1.1] .............................................................p.119 Figura. 4.90. O “cemitério do alegóricos”. ........................................................................................................................................p.119 Figura 4.91-4.100. Trecho Cemitérios. Botecos e cemitérios na vizinhança. ...........................................................................p.120 Figura 4.101. No sentido contrário a análise, a interseção com a Rua Dom Benedito na década de 1970. Fonte: Blog Fotos antigas de Vitória, acesso em julho de 2012, <http://fotosantigasdevitoria.blogspot.com.br/> ............................................p.121 Figura 4.102. No sentido contrário a análise, a interseção com a Rua Dom Benedito nos dias de hoje. ............................p.121 Figura 4.103. Trecho Cemitérios. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: [Mesma fonte item 4.7] .............................................................................................................................................................................................................p.122 Figura 4.104. Trecho Fonte Grande. Pontos de observação e locais mencionados sobre foto aérea. Fonte: [Mesma fonte item 4.7] ...................................................................................................................................................................................................p.123 Figura 4.105-110. Trecho Fonte Grande. Aclive até a vista para a Fonte Grande. ...................................................................p.124 Figura 4.111. O final da Avenida Santo Antônio no ponto mais clamado por todos: o Santuário de Santo Antônio. Fonte: Site Olhares. ............................................................................................................................................................................................p.125 Observação: As figuras sem referência de fonte são produções da Autora (Stephanie Ribeiro Azevedo)

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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