Gostaria que você estivesse aqui
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maio de 2021
COLABORADORES
FERNANDA GRABAUSKA
RAFAELA PECHANSKY
LAURA VIOLA HÜBNER
Editora-chefe
Publisher
Assistente
SOPHIA MAIA
CAROLINE CARDOSO
PAULA HENTGES
Assistente
Revisora
Designer
KALANY BALLARDIN
GABRIELA BASSO
RAONE ARAUJO
Designer
Designer
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Impressão Impressos Portão
Capa Kalany Ballardin
OLÁ, TAGGER Este mês nos é especialmente precioso: é uma honra poder trazer, pela primeira vez, uma obra brasileira na caixinha da TAG Inéditos. Era um desejo antigo dos taggers – que buscamos atender com maestria, apresentando uma obra que encapsula com uma magia ímpar o Brasil da década de 1980. Gostaria que você estivesse aqui não é apenas uma história de vidas que se entrelaçam, de afetos que vêm e vão, da epidemia de AIDS que assolou o mundo à época: é um livro que mergulha em um Rio de Janeiro fascinante. A Cidade Maravilhosa, afinal, é o microcosmo daquilo que somos como brasileiros, como nos diz em entrevista o autor Fernando Scheller. A repórter Débora Sander foi a fundo no tema musical. Ela conversa com o crítico Marcelo Costa, que explica e contextualiza o cenário do rock oitentista brasileiro, falando sobre os sons que unem e encantam os personagens do romance. Na edição deste mês, você também entende mais sobre a história e o tratamento da AIDS, que, apesar de controlável, continua a carregar um pesado estigma. Deixe-se levar pelas canções de amor e de protesto daquele tempo. Pense em todas as pessoas que perdemos lá, em todas as pessoas que estamos perdendo por aqui: pense que é nosso dever honrá-las sendo melhores. Que bom que temos a literatura para nos ajudar nessa tarefa tão difícil. Boa leitura!
Unboxing
MIMO Maio vem com livro em dobro! Além da leitura do mês, a TAG organizou uma coletânea de contos exclusiva para os associados. Em As partes de um corpo, você lê os escritos de autores badalados como Giovana Madalosso, Tati Bernadi e Jarid Arraes.
PROJETO GRÁFICO O autor do mês abre o jogo ao dizer que vê o Rio de Janeiro com olhos para lá de generosos. A missão da TAG para a artista Catarina Bessell, autora da colagem que agracia a capa de Gostaria que você estivesse aqui foi justamente essa: retratar o Rio de Janeiro vibrante, jovem, repleto de potencial que abraça os protagonistas da obra.
NO APP No nosso aplicativo, você pode conferir a agenda completa de eventos e os conteúdos complementares à experiência deste maio da literatura brasileira.
SUMÁRIO 5 O livro do mês
8 “O Rio de Janeiro é um microcosmo do que a gente é”
13 Brasil Rock 80
19 AIDS, de desconhecida a mal controlável
O livro do mês
SOBRE ALMAS PERDIDAS EM UM AQUÁRIO “Leva muito tempo tornarmo-nos jovens.” Pablo Picasso
DÉBORA SANDER
Entre a vontade de viver e a euforia das descobertas, há a conquista da liberdade. Entre a incompreensão da realidade e a inabilidade com as relações surge o medo do desconhecido. Nesse redemoinho de sensações, situa-se a juventude. Apesar de esperarmos certa estabilidade da vida adulta, tais paradoxos não apenas não se resolvem, como ainda ganham novas nuances: o repertório de experiências acumuladas traz um pouco mais de segurança, mas a vontade e o medo seguem (i)mobilizando nossas ações. Cada fase tem algo de imprevisível, dúbio, doloroso e encantador, assim como a vida no seu todo. Ao começar a leitura deste mês, em um primeiro momento você talvez pense que está prestes a mergulhar em uma história de amor juvenil. Mas, em seu segundo romance, o autor – o jornalista Fernando Scheller – não se limita a uma temática central nem a um único ponto de vista narrativo. Em comum com sua estreia no romance, o sucesso O amor segundo Buenos Aires (2016), há o amor e a cidade como personagens. Através das lentes de cinco protagonistas - Inácio, Baby, César, Selma e Rosalvo -, Gostaria que você estivesse aqui traz um panorama do que foi a movimentada década de 1980 no Rio de Janeiro. Você pode até se identificar mais com 7
um ou com outro personagem, mas aqui não se trata de escolher um favorito: acessando diferentes universos cotidianos e existenciais que coabitam a narrativa, somos convidados a refletir sobre as relações que cultivamos – amizades, paixões, vínculos familiares – e sobre como elas podem nos salvar de viver limitados às nossas próprias angústias. Da leveza do primeiro amor aos ressentimentos incuráveis da maturidade, esse é um livro sobre as batalhas que cinco pessoas de gerações e contextos sociais diferentes vivenciam ao longo de dez anos. Por essa amplitude temporal e narrativa, poderíamos dizer que Gostaria que você estivesse aqui fala de uma infinidade de assuntos: é um livro sobre amizade, sobre família e amores idealizados, sobre frustrações e enganos, sobre dores irresolvíveis e sobre não-ditos; mas também sobre um contexto maior que envolve o tempo-espaço da história. Entre 1980 e 1990, período em que se passa a narrativa, o Brasil estava em pleno processo de redemocratização após duas décadas de ditadura militar. O Rio de Janeiro foi palco de acontecimentos históricos relevantes naquela década, marcada por uma forte crise econômica e pela campanha das Diretas Já. O movimento agregou partidos políticos de oposição ao regime, além de lideranças sindicais, civis, artísticas, estudantis e jornalísticas. As movimentações política, cultural e intelectual se desenvolveram juntas e se retroalimentaram – a participação de artistas e a mobilização da imprensa foram elementos imprescindíveis para engajar a população na luta pelo voto direto e pela retomada da democracia. Apesar da rejeição da emenda constitucional que implementaria o voto direto, em 1984, o movimento Diretas Já foi um acontecimento-chave e marcou uma das maiores mobilizações sociais da história do país. Em 1985, Tancredo Neves tornou-se presidente via eleições indiretas, dando fim ao período militar, mas morreu antes de assumir o cargo. Assim, José Sarney tornou-se 8
o primeiro presidente civil depois de 20 anos de ditadura. Outros marcos históricos foram a aprovação da Constituição Federal de 1988 e a realização das eleições diretas em 1989, que levaram Fernando Collor à presidência da república. O âmbito social ficou marcado pela efervescência cultural, pela liberação sexual e pela epidemia da AIDS. Inácio e César, protagonistas do livro, acompanham esse cenário e participam da criação do Circo Voador, que surgiu como uma instalação temporária na Praia do Arpoador em 1982. Os contrastes sociais do Rio de Janeiro também aparecem em elementos importantes da história: nos anos 1980, houve um agravamento das desigualdades em consequência da crise econômica e do crescimento desenfreado da população urbana. A vida badalada dos jovens da Zona Sul se cruza e, a todo momento, faz um contraste com os problemas práticos e emocionais enfrentados por seus pais no contexto da privilegiada classe média carioca - cujas contradições são expostas nas perspectivas de Baby e Selma - e com a realidade um tanto mais dura dos moradores da comunidade da Rocinha, lugar onde Rosalvo se estabelece após deixar sua cidade natal em Minas Gerais. Questões de gênero e sexualidade também são abordadas sob os pontos de vista dos cinco protagonistas. Se no início do livro nos deparamos com as perspectivas entusiasmadas, ingênuas e românticas de Inácio, César e Baby, conforme viramos as páginas e os anos se passam, um tom mais realista assume a subjetividade dos personagens. A sensação é de acompanhar os processos de cada um deles – em suas incoerências, instabilidades, vulnerabilidades e coragens. Sem negar a dureza da existência, Gostaria que você estivesse aqui envolve, comove, mobiliza e faz refletir. Nos pega pela mão e nos conduz através das nossas dores e transformações, lembrando que, mesmo quando o chão desaba sob nossos pés, há um pôr-do-sol para assistir e alguém para compartilhar confortavelmente o silêncio.
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Entrevista
“O RIO DE JANEIRO É UM MICROCOSMO DO QUE A GENTE É”
FERNANDA GRABAUSKA
Fernando Scheller escreveu um livro tão, mas tão carioca que é de se pensar que ele seja nascido e criado nas praias do Rio de Janeiro, mas não é o caso: o jornalista, que lança pela TAG seu segundo romance, fez uma imersão profunda no Rio dos anos 1980 para contar as histórias de Gostaria que você estivesse aqui. O livro, diz ele, é “sobre tudo aquilo que a gente perdeu” com a epidemia de AIDS: pessoas que viveriam 70, 80 anos, que não puderam de escrever canções, dançar em festas, abraçar quem amavam mais uma vez. Leia trechos da entrevista: Como veio a ideia de contar essa história com tantas vozes? Fernando Scheller — Eu acho que é uma coisa que você vai ganhando com o tempo. Eu mergulhei mesmo quando eu fui escrever o livro. Acredito que você tem mesmo que saber já qual é o livro que você quer escrever. O meu processo de escrita é muito mais emocional do que cerebral. Eu não sou o escritor que fica pensando "essa frase tá maravilhosa", fico tentando entrar no fluxo de pensamento do personagem. No caso do Inácio, ele tem um fluxo de pensamento que vai evoluindo muito.
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Ele começa com um fluxo de pensamento meio raso em termos de autoanálise, mas vai evoluindo muito. O Inácio acaba sendo um grande fio condutor, essa pessoa que absorve o que ele aprende dos outros e que absorve a vida, porque ele não teve vida, ela começa com 16, 17 anos no livro. Não dá para ficar se autoanalisando tanto com 16 anos. A Selma eu já começo em um nível de autoanálise super alto e mantenho lá, porque ela começa em uma idade em que ela trabalha analisando literatura. E, no caso do Rosalvo, por exemplo, ele resgata toda a história dele e é muito determinado pela ação, por um objetivo. "Eu tenho de vingar a morte do meu filho, ou da minha filha, e no final é filha mesmo". Foi o personagem do Rosalvo que me impediu de escrever o livro em primeira pessoa, porque achei que eu poderia cair em artificialismos. Então, optei por uma terceira pessoa que é muito distinta em cada um. Qual é a sua relação com o Rio de Janeiro? Como foi esse mergulho na história da cidade?
Eu moro em São Paulo, sou paranaense, não sou do Rio de Janeiro nem nunca morei no Rio de Janeiro. Morei três meses quando fui para escrever o livro. Minha relação com o Rio de Janeiro é de encantamento, não de conhecimento. Eu também não vivi os anos 1980. Peguei um pouquinho do final; quando eu tinha 12 anos, acabaram os anos 1980. Mas os meus amigos sempre foram mais velhos do que eu, minhas irmãs são muito mais velhas que eu. Eu vi as pessoas vivendo, mas eu não vivi. Lembro que a primeira viagem de avião que eu fiz foi para o Rio de Janeiro, e aquilo me encantou. O Rio de Janeiro é uma confluência de história do Brasil no sentido mais profundo da palavra. O Rio de Janeiro é meio que um microcosmo do que a gente é, assim, sabe?
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A desigualdade, a beleza, o suingue, tudo o que nos resume está ali. Quando eu terminei O amor segundo Buenos Aires, também nunca morei lá. O mais engraçado é que, quando você não é do lugar, você tem um olhar mais generoso. Não sei se você sabe, o livro de Buenos Aires vai virar uma série da HBO, e eu ajudei a escrever a série com roteiristas argentinos que me disseram "mas eu não conheço esse lugar em Buenos Aires, eu nunca ouvi falar deste lugar". Então você realmente vai fundo mesmo e, às vezes, há coisas que acontecem por acaso e você tem de estar aberto a esse acaso ao mesmo tempo. Para mim foi muito gostoso descobrir o Rio de Janeiro e, agora, estar apresentando a minha versão dele. E este paralelo de escrever sobre cidades que você não necessariamente habitou, tanto em O amor segundo Buenos Aires como agora, em Gostaria que você estivesse aqui... Tem em vista um próximo destino literário?
Não estou pronto para revelar [o próximo destino]. Na verdade, é uma viagem que eu queria ter feito em 2020. É uma coisa no Oriente Médio. Eu queria muito ter ido, porque ainda estou com dúvidas neste caso. Estou pronto para escrever essa história porque eu acho que ela depende muito de uma pesquisa, de saber entender essas pessoas, mas preciso entrevistar algumas, e aí, o que eu faço? Jogo fora e escrevo o livro. E aí eu vejo se minha ideia de drama para em pé. Estou bem animado com ela, mas já conversei com algumas pessoas e falei: ó, a história é isso, isso e isso. E a pessoa falou: nossa, isso não está muito longe da realidade? Eu acho que
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não, porque a graça de você escrever ficção é você justamente imaginar outras realidades. Suspensão de descrença.
O autor Fernando Scheller Soraya Ursine
Exatamente. A autoficção é muito limitante. Em uma das edições da Flip, eu vi que a autoficção era vendida como a coisa mais genial do mundo. Eu acho a autoficção muito mais fácil do que uma ficção na qual você tem de realmente se colocar no lugar de outra pessoa, em uma outra cultura. Acho que somos muito intolerantes. O meu primeiro livro (a não ficção Paquistão, viagem à terra dos puros) foi muito interessante. Tinha várias coisas naquela cultura que eu, obviamente, não concordo. E continuo não concordando. Mas você tem de tentar entender aquilo dentro daquele contexto. Voltando aos personagens: houve algum que você gostou mais de escrever, que vai seguir no seu coração?
Eu acho que, quando estava escrevendo, foi a Selma. Ela é uma personagem feminina e eu acho que consegui escrever uma mulher crível. A Baby também é crível, também é uma personagem forte, mas talvez eu tenha vivido a vida da Baby de alguma forma, tenha passado por aquela juventude... A Selma era um desafio maior, e acho que, enquanto ela passava pela dor do filho, eu consegui sentir aquela dor com ela. Então, pela dificuldade, foi ela. Pelo resultado que eu sinto de quem já leu o livro, é o Rosalvo. Mas gosto deles igualmente. Acho que o César tem belos momentos, o Inácio eu gosto muito da evolução dele. Então acho que todos. Acho que isso é que vai ser especial, todo mundo vai ter alguém ali.
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Que mensagem você espera que este livro deixe a seus leitores na TAG?
Acho que a gente está vivendo um momento em que criticar é muito fácil. Olhar para o outro e apontar os defeitos quando todos nós somos cheios de defeitos. Eu sou cheio deles. Acho que ele [o livro] tem uma coisa de visão generosa. Eu brinco um pouco com como a vida foi e como a vida deveria ser, por exemplo, Rosalvo ou Inácio: o Inácio poderia, simplesmente, por uma convenção social, rechaçar o afeto do César, que ele sexualmente não correspondia, mas correspondia de muitas outras formas... Eu acho que muita gente já fez isso na vida. Vamos imaginar: se o Inácio tivesse feito isso, o quão menos incrível ele teria se tornado? Qual seria a reação mais comum de um pai naquela época, ao ter um filho ou uma filha transsexual? Seria rechaçar, seria não abraçar. E eu parto de um personagem que age como deveria ser. Eu aceito, eu mando você embora daqui porque eu acho que é melhor para você, porque aqui não dá, e eu não aceito que você tenha morrido por ser quem você é. O livro tem um pouco de realidade, mas também um pouco da vida como ela deveria ser, da vida ideal. Gostaria que as pessoas pensassem nisso. Será que, em uma relação ou outra, você não poderia ter sido um pouco mais evoluído, ter se aberto mais?
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DÉBORA SANDER
Entrevista
BRASIL ROCK 80
Entre acontecimentos políticos marcantes, dificuldades econômicas e uma epidemia global, a década de 1980 também ficou na memória pela sua relevância cultural. A retomada das liberdades da população durante o processo de redemocratização favoreceu o surgimento de um movimento essencial da nossa música: o rock nacional. Inácio e César, protagonistas que você vai conhecer na caixinha deste mês, têm nos discos de vinil um importante elo de amizade. Eles se envolvem nas primeiras atividades do Circo Voador, em sua temporada na Praia do Arpoador, e vão juntos à primeira edição do Rock in Rio, em 1985. Abaixo, contamos um pouco mais sobre esses dois eventos da história da música. E já que ela é um elemento tão presente no romance de Fernando Scheller, pedimos a ajuda do jornalista e crítico musical Marcelo Costa, editor do portal de cultura pop Scream & Yell, para entender melhor o que foram os anos 1980 para a música brasileira. Quais estilos predominavam na cena musical da década de 1980? E quais bandas e músicos eram os principais representantes desses estilos?
Para entender a década de 1980 no Brasil, a gente precisa entender os anos 1960 e 1970. A formação do rock nacional até ele se tornar o que a gente conhece hoje deriva totalmente da abertura política, das Diretas Já, do fim da ditadura militar e de um cenário de música popular brasileira, que era o estilo que dominava as rádios na década de 1970. Já havia rock brasileiro nos anos 1970 com Raul Seixas, Rita Lee e Secos e Molhados fazendo muito sucesso, mas eram coisas muito mais aleatórias, não eram movimentos. Quando a MPB foi obrigada a se calar com o exílio forçado do Gilberto Gil e do Caetano Veloso e o exílio voluntário do Chico Buarque, o Brasil perdeu 15
As Aventuras da Blitz 1 Blitz, 1982
Tempos Modernos Lulu Santos, 1982 16
esse viés combativo da música. Quando eles voltaram ao país, pararam de fazer músicas contra o Estado, porque sabiam que podiam morrer, e começaram a fazer músicas mais abstratas. Mesmo o Chico, que fazia músicas em que não era tão fácil de entender que ele estava falando sobre a ditadura, começa a procurar outras maneiras de falar. Isso fez com que houvesse uma falta de sincronia entre o que estava acontecendo no país - uma ditadura violenta, assassina, que censurava os artistas - e uma música que não falava mais sobre isso. Quando o rock nacional começou a surgir com força nos anos 1980, ele recuperou essa força textual da MPB setentista. Uma das primeiras coisas que o rock fez foi ocupar esse lugar de fala. Então, tivemos músicas que narravam um país que sofria uma ditadura: Que país é esse (Legião Urbana), Bichos escrotos (Titãs), Até quando esperar (Plebe Rude). Várias bandas vão formar esse cenário. Eu diria que houve um primeiro ato do rock nacional quando ele surgiu, nos anos 1980, principalmente no Rio de Janeiro, onde eram as sedes das gravadoras na época. Neste primeiro momento, ele era um rock praieiro: Blitz, Paralamas do Sucesso, Kid Abelha, Lulu Santos, o próprio Lobão no início, também. Era tudo música de festa: Corações psicodélicos (Lobão), Tesouros da juventude (Lulu Santos), Pintura Íntima (Kid Abelha). Seguindo também o padrão de Chopp e batata frita da Blitz, que deu em todo esse caldeirão que formou o Circo Voador. Só que, quando esse movimento começou a se tornar nacional, com as músicas tocando nas rádios e moleques de outros lugares do país formando suas bandas e gravando discos também, o discurso começou a mudar. Quando o rock chegou a São Paulo e a Brasília, principalmente, a gente começou a ter um discurso muito mais politizado. Quando chegou ao Sul do país com Engenheiros do Hawaii, por exemplo, o primeiro sucesso da banda foi Toda forma de poder, uma música que é muito forte e emblemática no texto, e que nunca teria sido autorizada dez anos antes. Na Bahia, a gente teve o Camisa de Vênus escrevendo músicas como
Barão Vermelho Barão Vermelho, 1982
Legião Urbana Legião Urbana, 1984
O adventista. Quando o movimento saiu do Rio, dessa alienação de praia, digamos assim, ele se tornou mais politizado. E aí o rock brasileiro ganhou força, porque as músicas começaram a falar dos problemas que estava todo mundo vendo: o governo militar, o assassinato de pessoas, a pobreza do país, a luta pelo direito ao voto. E tudo isso circundou os discos dessa cena que a gente não tem como dividir em um ato só. O primeiro ato do rock brasileiro nos anos 1980 é esse do rock carioca, em que as bandas importantes foram Blitz, Kid Abelha, Paralamas do Sucesso, Lobão, Barão Vermelho – também com um símbolo bastante hedonista: Por que a gente é assim, Bete balanço, Maior abandonado. É um discurso bastante ligado ao rock and roll tradicional. Essas bandas tocaram muito no Circo Voador e constituíram uma cena na Rádio Fluminense. Em 1984, a Legião Urbana lançou seu primeiro disco com o codinome Futuro da Nação e a música Geração Coca-Cola, que é extremamente emblemática. Nessa época também teve o Ira lançando o primeiro álbum, que falava de questões do exército. Então, a gente chegou na explosão do rock de Brasília, com Plebe Rude e Capital Inicial. Aí a coisa mudou de figura: a gente tinha bandas com um acento punk rock. Os Titãs conseguiram dar um turning point na carreira quando saíram do álbum Televisão para o Cabeça dinossauro. Eles saem do pop para o punk rock, questionando família, Igreja e política. Foi nesse momento que tivemos um segundo ato com um número maior de bandas mais representativas. O interessante é que, quando a gente chegou nesse segundo momento do rock, as bandas do primeiro ato se agregaram ao segundo ato. O Lulu Santos gravou músicas políticas, o Lobão também, o Paralamas lançou Selvagem, que é um disco com várias questões emblemáticas. Eu diria que o primeiro ato se deu em 1981-1982 e o segundo em 1985-1986. O terceiro ato já foi totalmente derivado desses dois primeiros, com bandas que nasceram influenciadas pelas bandas dos dois primeiros atos, enquanto essas eram influenciadas por gente de fora. 17
De que modo o Brasil absorveu as influências musicais estrangeiras e constituiu um rock com uma identidade própria?
Selvagem? Os Paralamas do Sucesso, 1986
Õ Blésq Blom Titãs, 1989
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Um ponto que marca muito essa geração é a falta de uma personalidade estética. Quase todo o rock nacional dos anos 1980 foi copiado de fora, de bandas da Inglaterra e dos Estados Unidos. O primeiro álbum do Legião Urbana tem uma sonoridade de U2; no segundo, eles copiaram The Smiths. Os dois primeiros discos dos Paralamas do Sucesso são The Police puro. Titãs era uma banda bastante new wave nos dois primeiros discos, e se tornou mais punk no terceiro e no quarto. Então, nesse primeiro momento, a gente não tinha muita personalidade: praticamente copiávamos as bandas gringas. Os Paralamas mudaram tudo isso quando pegaram elementos da Bahia e da África e colocaram no rock deles, no disco Selvagem. Os Titãs só mudaram isso no quinto disco, que teve a participação de repentistas nordestinos. O RPM lançou um disco compacto com o Milton Nascimento em 1987 e, no ano seguinte, gravou com Bezerra da Silva. Em um momento histórico de ditadura militar, com discursos extremamente nacionalistas, como o slogan “Brasil: ame-o ou deixe-o”, quando se pegava o rock, que era um elemento estrangeiro, como um escape para falar com a sociedade, essa também era uma forma de você combater e criticar o status quo da época. Além disso, é muito normal na arte que as primeiras obras tenham uma certa inocência de você apenas absorver uma influência e entregar. Não é tão pensado, tão elaborado. A originalidade começa a surgir conforme o repertório se esgota: aquele repertório inicial que você tocava na garagem, que geralmente rende os dois primeiros discos, acaba, então você precisa compor material novo. E aí você olha em volta e está tocando no mesmo festival que Caetano Veloso, que Milton Nascimento. Assim, as influências começam a surgir. Mas acho que isso foi muito mais bem filtrado e apresentado na geração seguinte, principalmente
com Picassos Falsos, que é uma banda carioca que une samba com Jimi Hendrix. Eu costumo falar que o rock nacional praticamente rompeu uma história que o brasileiro tinha com o samba, com o pagode, com o samba-canção, por tudo o que essa música simbolizou no final dos anos 1970, esse movimento de os artistas brasileiros se calarem e deixarem a ditadura passear o que é muito compreensível, porque todo mundo tinha medo de morrer. Isso fez com que o rock brasileiro fosse muito voraz e intenso, e a juventude dessa época surgiu não gostando muito de samba. Então, em um primeiro momento, os anos 1980 foram essa coisa de abraçar o rock como a música que permitia que a gente falasse tudo o que estava entalado na garganta – no sentido social, pessoal, não só contra o governo, mas também. Neste contexto de transição entre a ditadura militar e o retorno a um regime democrático, qual foi a relevância político-cultural do Circo Voador?
Metrô Linha 743 Raul Seixas, 1984
Sinal Fechado Paulinho da Viola, 1969
O Rio de Janeiro tem dois focos de disseminação do rock brasileiro como um todo: o Circo Voador e a Rádio Fluminense. O Circo Voador por ser um espaço físico. Nos anos 1970 não existia espaço para isso, as pessoas não podiam se reunir. A atmosfera era aquela que o Paulinho da Viola traz em Sinal fechado, que o Raul Seixas menciona em Metrô linha 743, de 1984, o Raul falava que dois homens juntos conversando podia ser muito arriscado. Quando você abre um lugar que reúne 500, mil ou duas mil pessoas, isso é extremamente político. Então o Circo Voador definitivamente tem uma posição central e política por abrir as portas. Uma das deliberações do AI-5 foi acabar com os diretórios acadêmicos e centros estudantis, então os alunos das universidades não podiam se reunir e buscar maneiras de ter uma voz, uma representatividade. Os militares já eliminaram, assim, um foco de resistência, que era o movimento estudantil, no qual nasce parte da revolução. Esses movimentos acabaram se encontrando escondidos e, eventualmente, se tornando grupos de guerrilha. 19
Circo Voador Cristina Paranaguá
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Quando o Circo Voador abriu esse espaço, também passou a abrigar todas essas pessoas, porque é um lugar que lida com palavra, manifestação, um lugar onde as pessoas podiam conversar livremente - lógico, tendo todo o histórico dos anos 1970, sabendo que poderia haver informantes ali, pessoas infiltradas, mas era, sim, um lugar extremamente importante e marcante nessa formação do que foi o rock nacional dos anos 1980. Já a Rádio Fluminense teve a função de tornar o sonho "real”. Entre Renato Russo, Cazuza, Titãs, nenhum deles pensava que a música ia ser uma profissão. Quem tocava profissionalmente eram os Rolling Stones, os Beatles. Eles tocavam no fundo do quintal. Quando a Rádio Fluminense começou a abrigar essa cena, mostrou que aquilo era possível. Essas bandas de rock nacional começaram a ver suas músicas tocando na rádio ao lado de Caetano e dos Beatles, baluartes que estavam há 20 anos na estrada. A partir do momento em que a coisa começou a circular entre a Rádio Fluminense e o Circo Voador, outras pessoas decidiram também montar bandas para tentar tocar nesses espaços. Essa função disseminadora é extremamente importante. Você está falando para uma juventude totalmente enquadrada em um regime militar: “se manifestem, mandem demos que a gente vai tocar suas músicas”. Com isso, além dos artistas em si, surgiram as carreiras paralelas - produtores, críticos de música, designers, fotógrafos. A gente precisa valorizar muito esses espaços que permitem que as ideias repercutam. Era ainda um momento de ditadura, uma abertura política. As coisas já estavam muito mais leves, mas a gente tinha todo o fantasma do que aconteceu durante a década de 1970 e não se sabia se aquela repressão mais dura poderia voltar a qualquer momento; era muito difícil tatear tudo isso. Nesse contexto, quem bota a cabecinha fora da caixa e monta espaços para as pessoas se manifestarem está cumprindo um papel vital para a construção de uma democracia.
Reportagem
AIDS, DE DESCONHECIDA A MAL CONTROLÁVEL Síndrome que traumatizou a geração de 1980 foi controlada com medicina e políticas públicas, mas ainda carrega estigmas
DÉBORA SANDER
O surgimento da AIDS foi um dos grandes traumas que marcaram a década de 1980 no Brasil e no mundo. César e Inácio, protagonistas de Gostaria que você estivesse aqui, fazem parte da geração que vivenciou esse cenário. Na época, tratava-se de uma doença totalmente desconhecida, que exigiu uma mobilização intensa da comunidade científica em termos de pesquisa e busca por soluções - testes, medicamentos e campanhas de prevenção. Nos primeiros anos, não se sabia sequer que a AIDS era causada por um vírus, o HIV. Não havia a testagem como conhecemos hoje, por isso, em geral, os pacientes só descobriam a presença do vírus quando começavam a apresentar infecções de repetição, depois de anos vivendo com HIV. Neste ponto, era tarde demais: a AIDS já havia se desenvolvido e debilitado o sistema imunológico de forma irreversível. Nessa época, predominava na imprensa brasileira e internacional o estereótipo preconceituoso da AIDS como “peste gay”. O estigma acelerou a disseminação do HIV, pois reforçou a ideia equivocada de que haveria grupos de risco e que pessoas que não fizessem parte desses grupos estariam livres de ser infectadas. O termo “grupos de risco” deixou de ser usado pouco tempo depois. Hoje, o risco de infecção por HIV é atribuido a determinados comportamentos, e não a grupos sociais. 21
Grande parte dos jovens dos anos 1980 carrega a memória de ter perdido amigos e ídolos durante a epidemia - Cazuza, Renato Russo e Freddie Mercury foram alguns dos artistas que faleceram em decorrência da AIDS. Conforme o relatório mais recente da UNAIDS, desde a descoberta do primeiro caso até o final de 2019 foram 75,7 milhões de pessoas infectadas pelo HIV e 32,7 milhões de mortes por doenças relacionadas à AIDS em todo o mundo. Hoje, há um tratamento eficiente para o HIV: o coquetel antirretroviral impede que o vírus se multiplique, reduz drasticamente o risco de transmissão e permite que as pessoas soropositivas levem uma vida longa e sem grandes prejuízos, da mesma forma que portadores de outras doenças crônicas como diabetes ou hipertensão. No Brasil, esse tratamento é oferecido de forma integralmente gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS) desde 1996. Atualmente, o programa brasileiro de tratamento ao HIV/AIDS é tido como o mais avançado do mundo pela comunidade científica internacional e pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Foram avanços muito significativos em um curto período. No entanto, embora a mortalidade pelo vírus no mundo tenha caído mais de 60% desde o pico, em 2004, os índices de infecção por HIV ainda são considerados altos, especialmente em regiões mais pobres. Entre 2010 e 2019, houve um aumento de 21% no número de infecções na América Latina. O cenário que temos hoje está distante do que foi o auge da epidemia, mas a persistência do forte estigma associado ao vírus acarreta muita desinformação e ainda é um dos principais fatores que impedem a superação efetiva desse problema.
HIV ≠ AIDS Um ponto essencial a se destacar sobre este assunto é a diferença entre o HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) e a AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida). O primeiro termo se refere ao vírus e o segundo, à doença causada pelo vírus. Ou seja: quem 22
tem AIDS tem HIV, mas quem tem HIV não necessariamente desenvolve a AIDS. O HIV é um vírus que afeta células específicas do sistema imunológico e se dissemina através de fluidos corporais. Pode ser transmitido via secreções sexuais, por compartilhamento de agulhas ou seringas no caso de usuários de drogas injetáveis, por transfusão de sangue contaminado ou de mãe para filho (durante a gravidez, no momento do parto ou pelo leite materno). Se o HIV não é tratado, o vírus se multiplica e destrói essas células do sistema imunológico, debilitando o organismo a ponto de impedir sua reação a infecções e doenças. Quando isso acontece, a infecção por HIV leva à AIDS. Uma pessoa pode viver com o vírus no seu corpo por vários anos sem ter qualquer sintoma. Por isso é tão importante a realização periódica de testes para detectar o HIV. Assim, se garante a descoberta do vírus e o início do tratamento antirretroviral o mais cedo possível. A AIDS é o estágio mais avançado da infecção pelo vírus e, atualmente, ela só se manifesta quando há ausência ou falha no tratamento. Se administrado da forma correta, o coquetel antirretroviral não permite o aparecimento da doença.
PREVENÇÃO O método mais disseminado, acessível e eficiente de prevenção ao HIV é o uso de preservativos nas relações sexuais - que protege também de outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) e de situações de gravidez indesejada. Outras formas de prevenção são a profilaxia pré-exposição (PrEP) e a profilaxia pós-exposição (PEP). Tanto a camisinha quanto a PrEP e a PEP são disponibilizadas gratuitamente pelo SUS. A PrEP é uma combinação de medicamentos para uso antes da exposição, indicada para pessoas que tenham maior probabilidade de contato com o vírus, como trabalhadores sexuais e parcerias sorodiferentes (quando apenas uma pessoa do casal é soropositiva). Já a PEP é um método de emergência que consiste no 23
uso de medicamentos antirretrovirais até 72 horas depois de a pessoa ter uma possível exposição ao HIV, como relação sexual sem preservativo, rompimento da camisinha, estupros e acidentes ocupacionais. Além disso, são meios de prevenção: a testagem regular para o HIV, também disponível gratuitamente pelo SUS; o pré-natal especializado para mães soropositivas, evitando a transmissão vertical do vírus; e o próprio tratamento de pessoas que já vivem com HIV, pois, com ele, é possível que o vírus atinja o estágio indetectável, quando a chance de transmissão é praticamente nula. Outro meio essencial de reduzir a disseminação do vírus é a informação, através do investimento em campanhas que estimulem a prevenção, a testagem e o tratamento, e da instrução a crianças e adolescentes sobre práticas de sexo seguro antes do início de suas vidas sexuais.
LINHA DO TEMPO – HISTÓRIA DA EPIDEMIA
1977/1978 Primeiros casos de infecção surgem nos Estados Unidos, Haiti e África Central, antes da classificação da doença.
1980 Primeiro caso no Brasil é registrado em São Paulo, ainda sem ter a doença classificada como AIDS.
1982 Confirmação do primeiro caso no Brasil Identificação da transmissão por transfusão sanguínea.
1983 Primeiros relatos de transmissão do vírus entre heterossexuais. Primeiro caso no mundo de infecção por HIV em criança. Primeiro caso de AIDS entre mulheres no Brasil.
1984 Estruturação do primeiro programa brasileiro de controle da AIDS pela Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. 24
1985 Agente causador da AIDS é denominado Human Immunodeficiency Virus (HIV). Primeiro caso de AIDS transmitida de mãe para filho no Brasil.
1986 Criação do Programa Nacional de DST e AIDS do Ministério da Saúde.
1987 Início da administração do AZT, medicamento utilizado em pacientes com câncer, para o tratamento da Aids. O AZT foi a primeira droga com atividade contra o vírus. 1º de dezembro é declarado o Dia Mundial de Luta Contra a Aids pela Assembleia Mundial de Saúde e pela ONU. Fundação da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA).
1988 Criação do SUS pela
novo paradigma de tratamento: a associação de drogas.
1996 Tratamento antirretroviral que combina três medicamentos começa a ser utilizado no Brasil. Lei nº 9.313 estabelece a distribuição gratuita de medicamentos aos portadores de HIV. Brasil registra expansão da epidemia entre mulheres e populações mais pobres.
1999 Redução de 50% nas mortes por HIV/AIDS. SUS começa a disponibilizar a Profilaxia Pós-Exposição (PEP).
2003 Programa Brasileiro de DST/AIDS recebe prêmio de US$ 1 milhão da Fundação Bill & Melinda Gates em reconhecimento às ações de prevenção e assistência no país.
Constituição Federal. Primeiro caso diagnosticado na população indígena brasileira.
2008 Início da fabricação do
1991 Ministério da Saúde dá
2014 Lei nº 12.984 prevê até
início à distribuição gratuita de antirretrovirais.
quatro anos de reclusão a quem praticar atos de discriminação contra portadores de HIV.
1993 AZT começa a ser produzido no Brasil.
1995 Estados Unidos aprovam nova classe de medicamentos antirretrovirais, os inibidores de protease. Com o lançamento das novas medicações, há um
teste rápido de HIV pela Fiocruz.
2017 SUS começa a disponibilizar a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) para quem tem mais chances de entrar em contato com o vírus.
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Próximo mês
VEM POR AÍ JUNHO Um acidente de ônibus faz a matriarca de uma família mudar sua perspectiva sobre a vida: será que ela foi a mãe que os filhos mereciam? Será que ela deveria ter sido mais aberta sobre os problemas e segredos que enfrentou durante o crescimento deles? Nesse romance único sobre amor e coragem, uma família se reinventa e ousa superar o passado para um futuro de felicidade. #família #segredos #infância #visibilidadebi
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“We’re just two lost souls Swimming in a fishbowl Year after year Running over the same old ground What have we found? The same old fears Wish you were here” – “Wish you were here”, Pink Floyd