Longo e claro rio
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fevereiro de 2021
COLABORADORES
FERNANDA GRABAUSKA
RAFAELA PECHANSKY
LAURA VIOLA HÜBNER
Editora-chefe
Publisher
Assistente
SOPHIA MAIA
CAROLINE CARDOSO
PAULA HENTGES
Assistente
Revisora
Designer
KALANY BALLARDIN
GABRIELA BASSO
Designer
Designer
Impressão Impressos Portão
Capa Angelo Bottino e Fernanda Mello
OLÁ, TAGGER Até onde vai o amor entre irmãs? No livro que você recebe, o amor da protagonista por sua irmã mais nova não enxerga barreiras: atravessa a distância, o medo, a crueldade da dependência química... e o perigo de um assassino à solta. E é sobre tudo isso que você vai ler nesta revista: falamos não só do amor entre irmãs, mas de como as relações entre mulheres têm sido tratadas na ficção contemporânea. Também falamos da dependência de opioides, epidemia que corrói os Estados Unidos há décadas. O livro que você recebe é todo de mulheres: Liz Moore escreveu a policial Mickey e sua irmã, Kacey. Parece simples, na verdade, mas ela inova naquilo que a gente não percebe: quantas detetives mulheres você já leu? Calma, apresentamos mais investigadoras para você (e brasileiras!). Esperamos que o curso desse Longo claro rio lhe inspire. Boa leitura!
SUMÁRIO 5 O livro indicado
8 Liz Moore: prática e método
10 Unboxing
12 Intrépidas detetives
15 De herói a vilão O caminho da dependência
19 O amor entre irmãs como mote
24 Próximo mês
O livro indicado
DESAFIANDO LIMITES Em Longo e claro rio, Liz Moore inova no gênero policial ao trazer algo aparentemente trivial: a perspectiva feminina
PRISCILA PACHECO
Recorte da capa de Longo e claro rio
A revista Time foi categórica: a pior epidemia de dependência da história dos Estados Unidos. A crise do uso de opioides que se alastrou pelo país e já tira a vida de 64 mil pessoas por ano (considerando apenas as overdoses) é a problemática central em Longo e claro rio, da escritora norte-americana Liz Moore, que a TAG Inéditos traz em primeira mão ao Brasil. Para escrever o livro, Moore mudou-se para Kensington, região periférica da cidade da Filadélfia, onde ambienta sua história. O bairro, que já foi uma área residencial próspera, passou por uma degradação gradual e hoje é uma das áreas com altas taxas na dependência de opioides. Em uma pesquisa que durou dez anos, a autora documentou pessoalmente o custo humano da dependência e as diversas facetas apresentadas por uma crise cada vez mais severa. 5
Bairro Kensington
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Longo e claro rio conta a história de Michaela e Kacey. As irmãs, filhas de um casal de usuários de drogas, cresceram em Kensington. Michaela tornou-se agente policial; já Kacey é dependente de heroína. Ao longo da história, acompanhamos a busca de Michaela pela irmã, que, de repente, não é mais vista no bairro. Em paralelo, a polícia atua para desvendar uma série de assassinatos de mulheres jovens que trabalhavam naquela área como profissionais do sexo. O romance joga com noções pré-concebidas de leis e moralidade: qual é supostamente o lado certo e como, na prática, tudo é muito mais diluído e confuso. Estão presentes questões de corrupção policial, sexismo e machismo no ambiente de trabalho da polícia, além dos efeitos da dependência química à luz da perspectiva de gênero, que faz com que muitas mulheres acabem se prostituindo para manter o vício, além dos bebês filhos de mães dependentes, que nascem com síndrome de abstinência neonatal. Embora a narrativa de Moore alcance um escopo mais amplo: o livro lançado em janeiro 2020 pela Riverhead Books, de Nova York, é classificado como policial – e, nesse sentido, traz uma nova vivacidade ao gênero, já que sua história vai além da corrida para desvendar um crime. Na figura de Michaela, sua protagonista, e apoiada por uma rede de outras personagens femininas, Moore se insere em um contexto de renovação das histórias policiais ao apresentar uma série de questões a partir da perspectiva das mulheres.
Em Longo e claro rio, a autora mostra que é possível – e desejável – romper com o automático de associar as narrativas policiais a personagens e conflitos em geral masculinos. Questões de gênero são inseridas de forma natural, adaptadas ao contexto e à história da protagonista. Michaela é policial, separada e cuida sozinha de um filho pequeno. Cuidados com as crianças, relações familiares e diferenças sociais e geográficas permeiam o dia a dia da protagonista e lançam luz a questões (algumas vezes pequenas, outras nem tanto) que ainda separam mulheres e homens em nossa sociedade. A história chama atenção para como a maior parte do apoio emocional recebido por homens e mulheres ao longo da vida, desde a infância, vem de outras mulheres. Aspecto evidente desde os cuidados com as crianças, que ainda recaem majoritariamente sobre as mulheres – algo que o romance de Moore retrata com exatidão.
SEM CAIR EM PIEGUICES OU ROMANTIZAR A MATERNIDADE, A AUTORA CONSTRÓI PERSONAGENS E HISTÓRIAS QUE REFLETEM DIFERENTES REALIDADES POSSÍVEIS DENTRO DE “SER MULHER” E “SER MÃE”. Um bom romance policial é aquele que desafia os limites do gênero e desperta sentimentos e reflexões inesperados. No caso de Longo e claro rio, essa máxima se realiza. Temos uma trama policial que mantém os leitores ávidos por seu desfecho e, ao mesmo tempo, uma forma diferente de incorporar questões de gênero, sexismo e feminismo na literatura, para além dos domínios acadêmicos, e aproximar temáticas essenciais como essas também das leitoras e leitores de ficção. 7
Perfil
LIZ MOORE: PRÁTICA E MÉTODO A autora de Longo e claro rio migrou da música para a escrita e se consolidou como dona de uma prosa sensível e delicada desde o primeiro lançamento
FERNANDA GRABAUSKA
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Uma infinidade de livros e de filmes já expôs a disciplina necessária para se tornar-se uma estrela da música. Horas e horas em frente às estantes de partitura. “A prática leva à perfeição”, diz o ditado. Mas tão necessária quanto a prática é o método, e é possível dizer que Liz Moore tem ambos de sobra. Antes de começar a escrever, a norte-americana incursionou pela música. Até 2007, quando fez sua estreia na ficção com The words of every song. A obra retrata uma gravadora fictícia e é inspirada parcialmente na experiência de Moore como musicista. À época, a revista de crítica literária Kirkus elogiou o livro: “é um romance notável, elegante, sábio e belamente construído”. Depois do sucesso do romance, Liz mudou seu foco para o estudo da escrita – prática e método, afinal –, tornando-se mestra em Ficção pela Hunter College e recebendo, em 2009, uma residência artística na Universidade da Pensilvânia. Foi aí que começou o mergulho da escritora na Filadélfia. Em 2012, Moore publicou o elogiado Heft (“Lindamente triste e heroicamente esperançoso”, diz uma crítica) e, em 2016, The unseen world, caracterizado como “ferozmente inteligente" pelo The New York Times. O que era uma trajetória de sucesso até então explodiu com o lançamento de Longo e claro rio em 2020. O romance que você recebe este mês já chegou às
A escritora Liz Moore com a cidade da Filadélfia ao fundo Maggie Casey
prateleiras das livrarias como best-seller. A relação das irmãs Mickey e Kacey e a relação desta última com o vício em heroína é inspirada no passado familiar de Liz Moore, a respeito do qual ela pouco revela. Por muitos anos, a escritora viveu próxima da comunidade de Kensington, onde se passa a maior parte do livro. Ela observou a comunidade de viciados que habita um viaduto e duas pontes próximas uma da outra. “Eu conheci todo o tipo de pessoa, com todo o tipo de passado. Muitos tinham carreiras de sucesso e viviam vidas normais”, disse ela ao The Guardian. Ela também ensinava escrita criativa em um abrigo de mulheres nas redondezas. “Era aberto a todos. Certamente muitas das frequentadoras tinham problemas com vício, mas, honestamente, quem está nas profundezas do vício não tem tempo para isso. Muitas estavam em recuperação, ou em um momento de recuperação, tentando dar jeito em algumas coisas”. Em saídas noturnas com um fotógrafo, ela também observou a rotina do local: os viciados, elétricos ou sonolentos, pelas ruas; os traficantes e seus coordenadores, prostitutas e seus clientes, os paramédicos procurando sinais de overdoses e as reuniões de Narcóticos Anônimos nas igrejas. Em 2017, 1,2 mil pessoas haviam morrido vítimas de overdose em Kensington. Tudo isso você enxerga de forma vívida na prosa metódica de Liz Moore em Longo e claro rio. 9
Unboxing
MIMO Neste mês, elaboramos um mimo para atenuar os momentos de tensão durante a leitura do romance: um difusor com fragrância de bambu. A planta asiática é repleta de significados — dentre eles: esperança, prosperidade, força e resiliência, características essenciais das protagonistas. Esperamos que a essência proporcione uma experiência sensorial que consiga acolher durante a leitura, e desejamos que o cheirinho do bambu fique registrado na sua mente como lembrança de um bom livro!
PROJETO GRÁFICO Os designers Angelo Bottino e Fernanda Mello desenvolveram todo o projeto gráfico, que foi pensado como forma de representar as nuances da cidade da Filadélfia. Ela, a maior do estado da Pensilvânia, é quase que um personagem em Longo e claro rio. As descrições de suas ruas e bairros oferecem uma verdadeira imersão a quem lê, e as cores utilizadas para compor as diversas versões da cidade no projeto buscam trazer a melancolia característica do ambiente, como a cantada e contada na música Streets of Philadelphia, de Bruce Springsteen.
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Ganhando terreno
INTRÉPIDAS DETETIVES Conheça outras autoras e protagonistas de livros policiais
PRISCILA PACHECO
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Um dos méritos de Longo e claro rio é colocar as mulheres em uma posição de destaque que vai além da ocupada pela protagonista. Liz Moore constrói uma rede de personagens femininas que tomam parte na história em diferentes momentos e funções. Da irmã a uma colega de trabalho, passando pela avó, a mãe e até mesmo a vizinha: cada uma retrata uma possibilidade distinta de “ser mulher”. São mulheres diferentes que, juntas, entoam uma história semelhante: as opressões variam, mas, em qualquer contexto, as mulheres enfrentam situações e dificuldades além das vividas pelos homens. Em Longo e claro rio, estão presentes questões como cuidados domésticos e familiares, maternidade, machismo no ambiente de trabalho, assédio, violência e prostituição. Tudo isso em uma narrativa policial que ilustra diferenças sociais, o dia a dia em uma área urbana periférica e as dificuldades particulares que essas condições impõem às mulheres. Nesse sentido, o livro integra um processo de renovação pelo qual o gênero policial tem passado. O escopo temático das tramas e crimes se ampliou como reflexo
das próprias mudanças sociais ao redor do mundo. Vemos narrativas mais abrangentes e complexas, com histórias que vão além das estruturas e elementos clássicos. É possível observar, ainda, uma maior diversidade em termos de contextos sociais e locais, conforme a origem dos autores, que utilizam as tramas para abordar diferentes violências e realidades geográficas e políticas. Um dos reflexos dessa renovação é a presença e participação crescentes das mulheres como autoras e protagonistas. No caso específico dos romances policiais, é interessante avaliar as formas pelas quais as detetives ou agentes policiais mulheres desafiam convenções tradicionais associadas ao gênero policial. Os romances policiais escritos por mulheres ajudam a romper com visões estereotípicas, dedicando especial atenção ao questionamento de comportamentos e valores machistas, autoritários e de objetificação das mulheres. A seguir, conheça os exemplos de três escritoras brasileiras que partem da realidade local para promover uma atualização da literatura policial também por aqui. Narrativas policiais brasileiras por escritoras brasileiras
Sonia Coutinho, falecida em 2013, é um dos principais nomes da literatura policial no Brasil. A escritora, que publicou seu primeiro conto em um suplemento coordenado por Glauber Rocha e dedicou o mestrado à análise de escritoras de romances policiais, trabalhava com protagonistas que lutam para romper com os papéis tradicionalmente atribuídos às mulheres, de mãe e dona de casa. Os seios de pandora (1998), um de seus livros mais conhecidos e vencedor do Prêmio Jabuti, traz os bastidores da notícia policial a partir da investigação de um assassinato por uma repórter, em uma história que alia investigações policial e jornalística e dialoga diretamente com tópicos feministas. Ana Teresa Jardim, que, além de escritora, também atuou como figurinista e professora universitária, é a 13
Os seios de pandora, No fio da noite e Fogo-fátuo Reprodução
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autora de No fio da noite (2001). Na história, passada na década de 1920, a figura da detetive é assumida por Nena, artista, prostituta e imigrante argentina que percorre as ruas do Rio de Janeiro tentando desvendar o assassinato de uma amiga e colega de profissão. A partir das incursões da protagonista pela cidade, a autora trabalha com a perspectiva das mulheres de renda mais baixa e as opressões sofridas por elas ao mesmo tempo em que chama atenção para questões de justiça social para grupos marginalizados. Patrícia Melo, embora não se considere uma autora policial, consolidou-se como nome associado ao gênero. Em Fogo-fátuo (2014), para citar apenas um exemplo entre suas obras, Patrícia constrói uma narrativa policial absolutamente brasileira, aliando elementos enraizados em nosso cotidiano, como injustiças sociais, violência, burocracia, sensacionalismo e especulação midiática. Por meio da protagonista Azucena, perita da Central de Homicídios de São Paulo, aborda também, como não poderia deixar de ser, o machismo no ambiente de trabalho da polícia. A personagem relata o incômodo com um olhar presente: o olhar do outro, de homens que se julgam superiores e colocam a capacidade das mulheres em dúvida.
De herói a vilão
O CAMINHO DA DEPENDÊNCIA Entenda a epidemia de opioides que assola os Estados Unidos e que marca as vidas de Mickey e Kacey
PRISCILA PACHECO
Os Estados Unidos vivem uma crise de saúde sem precedentes. O consumo crescente e recorrente dos opioides (medicamentos à base de ópio utilizados no tratamento de dores), assim como de suas variantes ilícitas, instaurou no país um quadro de dependência química de gravidade e proporções históricas. O contexto que costura a trama de Longo e claro rio é uma situação real e dramática que afeta milhares de pessoas. Os opioides abrangem um conjunto de drogas ilegais, como a heroína e o fentanil, produzido de forma ilícita, e substâncias analgésicas usadas em tratamentos médicos, como a oxicodona e a hidrocodona. Em 2018, foram mais de 67 mil mortes por overdose, segundo dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês). Dessas, 69,5% foram pelo uso de opioides. Entre as overdoses por opioides, 32% se deram pelo uso de medicamentos prescritos. 15
Ao longo das últimas décadas, impulsionado pela cultura de uso de medicamentos e pela facilidade de acesso, o uso dessas substâncias aumentou de forma vertiginosa. O quadro já é considerado epidêmico e afeta pessoas de diferentes classes, raças, gêneros e faixas etárias. Entenda como a crise começou, como está o cenário hoje e as estratégias adotadas pelo país para combater a epidemia. A gênese da epidemia
A crise atual tem origem nos anos 1990, quando a indústria farmacêutica convence a comunidade médica de que medicamentos à base de ópio não apresentavam riscos significativos de dependência. É quando a prescrição dos remédios começa a aumentar e, em paralelo, sobe também o número de overdoses. Foi a primeira onda. Desde 1999, as mortes por overdose com remédios prescritos quadruplicaram. No total, entre 1999 e 2018, 232 mil pessoas morreram de overdose envolvendo opioides com prescrição médica. Dados do Instituto Nacional sobre o Abuso de Drogas dos EUA mostram que quase 80% dos usuários de heroína afirmaram terem feito uso de opioides com prescrição antes de mudarem para as drogas ilícitas. A segunda onda da crise desponta em 2010, com o aumento do uso de heroína. A terceira onda, mais recente, data de 2013, quando é possível observar uma tendência de crescimento no uso de opioides sintéticos, em especial o fentanil. Considerando todas as variantes, lícitas e ilícitas, foram 450 mil mortes por overdose entre 1999 e 2018 (dados do CDC). Cenário atual e estratégias para superar a crise
Em 2018, os estados com as taxas mais altas de mortes em decorrência de overdose foram Virginia Ocidental (51,5 a cada 100 mil), Delaware (43,8 a cada 100 mil), Maryland (37,2 a cada 100 mil), Pensilvânia (36,1 a cada 16
100 mil), Ohio (35,9 a cada 100 mil) e New Hampshire (35,8 a cada 100 mil). A cidade de Huntington, na Virgínia Ocidental, já carregou o triste título de “capital da overdose”. A Filadélfia, onde se passa Longo e claro rio, registra o triplo de mortes por overdose do que por homicídios. Em 2017, das 1.217 overdoses registradas, 1.074 envolveram o uso de opioides. Opioides mais consumidos nos EUA: Naturais e semissintéticos
Sintéticos
Morfina
Metadona
Codeína
Fentanil
Hidrocodona
Similares ao fentanil
Heroína
Tramadol (tramal)
(uso e comercialização ilegais)
(Fonte: Centro de Controle e Prevenção de Doenças – CDC)
Apesar das curvas ascendentes nos índices de uso, dependência, na prescrição de medicamentos à base de ópio e no número de overdoses, a situação demorou a ser encarada com a gravidade que de fato representa. Agora, o país corre atrás para combater a crise apostando em uma estratégia abrangente. O Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS, na sigla em inglês) estabeleceu alguns eixos de ação prioritários: aumentar o acesso dos dependentes a tratamentos, promover o uso de drogas capazes de reverter as overdoses, trabalhar a conscientização da população a respeito do uso de opioides e investir em pesquisa tanto para aprofundar o conhecimento sobre a epidemia quanto para entender melhor os processos de dor e dependência das substâncias. Entre a comunidade médica, também têm sido feitas mudanças nas diretrizes para prescrição dos medicamentos à base de 17
ópio, na duração dos tratamentos e nas doses adequadas para cada caso. Em paralelo às ações de longo prazo, uma medida de caráter mais imediato chama a atenção: a instalação de “clínicas” para que os usuários possam injetar as drogas de forma segura. Nesses espaços, já presentes no Canadá e em alguns países da Europa, profissionais impedem que os dependentes tenham uma overdose ou transmitam doenças através das seringas. Nos Estados Unidos, a primeira clínica desse tipo foi anunciada em Seattle em 2017. Em 2018, a segunda foi anunciada na Filadélfia: uma organização sem fins lucrativos construiu a Safehouse, o primeiro espaço do tipo a ser de fato instalado. Um estudo conduzido na época indicou que um único espaço como esse poderia prevenir até 76 mortes por overdose por ano. A instalação foi considerada legal por um juiz federal em outubro de 2019, abrindo precedente para potenciais novos casos no futuro. Em 2018, legisladores estaduais na Califórnia aprovaram um projeto de lei para iniciar um programa piloto de três anos em São Francisco, e os estados de Colorado e Pensilvânia seguem pelo mesmo caminho. A medida, no entanto, ainda é controversa no país. Para alguns pacientes em recuperação, há uma alternativa semelhante: as clínicas de metadona. Nessas clínicas, já espalhadas pelo país em versões públicas e privadas, os usuários recebem a substância, um analgésico à base de ópio, como parte do tratamento. A abordagem é conhecida como “terapia de reposição”. O tratamento não é indicado para todos os casos, mas, naqueles em que se mostra adequado, reduz os sintomas de abstinência e a ameniza a necessidade física da droga sentida pelos pacientes, ajudando a pessoa estabelecer um dia a dia funcional. A cultura do uso de medicamentos e a facilidade de acesso contribuíram para a situação vista hoje. Reverter o cenário vai passar por um longo processo de mudança mentalidade social, mas também de enfrentar o poder e a posição ocupada pela indústria farmacêutica. 18
Relação examinada
O AMOR ENTRE IRMÃS COMO MOTE Longo claro rio vem na esteira de uma série de produções a respeito da relação entre mulheres
PRISCILA PACHECO
A relação entre as irmãs Michaela e Kacey é o fio condutor da narrativa em Longo e claro rio. O livro de Liz Moore é lançado na esteira de uma série de produções que abordam o relacionamento entre mulheres. De Lenu e Lila em Elena Ferrante a Fleabag, Mulherzinhas e até mesmo Frozen, observamos uma tendência de rompimento com a linguagem e os modelos utilizados até pouco tempo atrás, que costumavam retratar a relação entre mulheres quase invariavelmente em termos de rivalidade ou inimizade. Na prática, a complexidade dessas relações vai muito além da mera competição. Tanto manifestações de afeto, lealdade, apoio e cuidado quanto conflitos e diferenças podem atingir uma capilaridade muito mais ampla, que vem aos poucos sendo explorada na ficção. Na Série Napolitana, de Elena Ferrante, acompanhamos as vidas de Lila e Lenu da infância à velhice. Além de traçar um panorama da história de Nápoles e da própria Itália, os livros mostram como as mulheres convivem com a truculência e a violência masculinas desde cedo, tanto em casa como na rua. A autora esmiúça as particularidades da amizade feminina: os contrastes e antagonismos, mas também a lealdade e o companheirismo, os laços e o pacto de apoio que se firmam entre elas de forma quase implícita. A 19
humanidade das personagens desconstrói o imaginário da amizade perfeita para retratar uma amizade real. O livro deu origem a uma série da HBO. A quebra de uma visão ideal em prol do cotidiano e do imperfeito também aparece em Fleabag. Em uma mescla de humor e reflexões sobre a sexualidade feminina, a série foge da armadilha normativa de dizer como as coisas devem ser ou não para retratar relacionamentos e sentimentos mais próximos do real. A relação da protagonista com a irmã é um dos destaques nesse aspecto: duas mulheres que, a despeito de suas diferenças, encontram maneiras de apoiar uma a outra. A série, criada pela dramaturga e atriz britânica Phoebe Waller-Bridge, apresenta a irmandade e a amizade entre 20
mulheres a partir de cenas que mostram o feminismo imperfeito do dia a dia. Mas não são apenas os adultos que ganham com a possibilidade de narrativas diversificadas para as relações entre mulheres. Filmes como Frozen fazem isso também pelas crianças. Por meio da história das irmãs Elsa e Anna, a animação rompe com o padrão que colocava o casamento como ideal a ser atingido, questiona a união irrefletida com um príncipe nunca visto antes e eleva o amor e a relação entre as irmãs a uma posição de maior destaque em relação aos amores românticos. Produções como Frozen são fundamentais para que as crianças tenham contato com outras narrativas de afeto ainda na infância. O livro escrito por Louisa May Alcott, que em 2019 ganhou uma nova versão no cinema, opera de modo semelhante. Mulherzinhas acompanha quatro irmãs adolescentes no início de sua vida adulta. Apesar de se passar em uma época em que prevaleciam o conservadorismo e a moral cristã, muitos elementos indicam o pensamento de sua autora, feminista e sufragista que lutava pelos direitos das mulheres. Mais interessada em ensaios políticos, Alcott escreveu Mulherzinhas a convite de seu editor, que gostaria de publicar um livro para jovens mulheres. As quatro personagens foram pensadas, então, com o intuito de inspirar a formação das jovens que o lessem. Cada uma tem uma personalidade única e juntas vivem relacionamento próximo e autêntico, em uma escrita de profundidade dificilmente encontrada nas personagens femininas criadas por homens na mesma época. Esses são apenas alguns exemplos de histórias que aprofundam a narrativa do relacionamento entre mulheres. Uma vez que embasamos boa parte de nossas próprias histórias nos modelos fornecidos pela ficção, a construção de personagens que retratem mulheres, relacionamentos, conflitos e sentimentos reais não só propicia uma maior identificação por parte do público, como contribui para a concepção de novas narrativas e formas de representação para nossos afetos e relações. 21
UMA COMUNIDADE DE LEITORES O que acontece quando milhares de leitores se reúnem em um único lugar? Nós já conseguimos imaginar algumas das possibilidades!
O aplicativo da TAG é lugar de conversas e trocas sobre livros e literatura, além de ser uma ótima forma de se conectar com a nossa comunidade literária. Afinal, é onde você conhece os outros associados do clube. Espie o que tem acontecido por lá: Reutilização de caixinhas Recebeu sua caixinha do mês e não sabe o que fazer com ela? Ideias de reutilização não faltam no app! Milena Matos
Quando a caixinha da TAG vira a caixinha de presente do dia dos pais! Hehehe
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Vanessa M. Taconha
A funcionalidade que eu achei para a caixa da TAG, fica na pia do meu banheiro.
Viviane Spengler
Pessoal... compartilhando uma ideia! Com dó no coração de jogar fora a minha primeira caixinha, transformei ela em guarda máscaras, muito útil em tempos de pandemia... rs. A aba de fora fica perfeita para usar como divisória dentro da caixa.
Ranking de livros da TAG O associado Bruno Sales (conhecido no app como Brunno Bettencourt) atualiza mensalmente a lista de classificação dos livros enviados pela TAG Inéditos, da melhor até a pior nota. Este ranking foi um dos que inspirou nossa retrospectiva #RetroTAG, no final de 2020. Bruno Bettencourt
Vamos conferir os 31 livros?
Indicações de livro Se você já terminou a leitura da TAG do mês e precisa de ideias do que ler a seguir, converse sobre livros no Cafezinho. Vitoria Milliole
Oi, gente, boa noite! Vim pedir algumas indicações de livros muito bons, daqueles que você lê um capítulo e já quer o próximo, com enormes reviravoltas e revelações, sabe? Queria nos gêneros de terror, ficção científica, suspense e/ou fantasia.
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1º Todas as Cores do Céu (3044) - 4,8 2º Nascido do Crime (4746) - 4,7 3º Herdeiras do Mar (4308) - 4,7 4º Os Sete Maridos de Evelyn Hugo (4264) - 4,7 5º A Rede de Alice (3501) - 4,7 6º Fique Comigo (2862) - 4,5 7º O Sol Mais Brilhante (4201) - 4,4 8º A Vida Secreta dos Escritores (4034) - 4,4 9º Cartada Final (3528) - 4,4 10º Apenas Um Olhar (3362) - 4,4 11º Escola de Contos Eróticos Para Viúvas (4500) - 4,3 12º Querido Edward (4194) - 4,3 13º A Seca (2960) - 4,3 14º Uma Nova Chance Para Sr Doubler (2344) - 4,3 15º A Filha do Rei do Pântano (2365) - 4,2 16º A Vendedora de Livros (2093) - 4,2 17º A Boa Filha (2037) - 4,2 18º Minha Adorável Esposa (4917) - 4,1 19º A Única Mulher (2958) - 4,1 20º Uma Escada Para o Céu (2681) - 4,1 21º O Dia em que Selma Sonhou com o Ocapi (2597) - 4,1 22º As Sete Mortes de Evelyn Hardcastle (2512) - 4,1 23º A Retornada (3960) - 4,0 24º O Bom Filho (3565) - 4,0 25º Southernmost - Rumo ao Sul (2134) - 4,0 26º Um Casamento Americano (3777) - 3,9 27º O Carrossel Sombrio E outras Histórias (2921) - 3,7 28º Stalker (2221) - 3,7 29º Os Sonhadores (4477) - 3,5 30º Existo, Existo, Existo: Dezessete Tropeços na Morte (2061) - 3,5 31º O Quarto em Chamas (1578) - 3,5
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Próximo mês
NO PRÓXIMO MÊS Elas são melhores amigas desde que se lembram. Daquelas que se contam tudo, tudo mesmo. E é claro que as duas esperavam que seus filhos crescessem amigos também. Mas quando a filha de uma delas acusa o filho da outra de um crime inominável, nenhuma das duas mulheres tem onde se segurar: nada está a salvo – nem a amizade construída ao longo de décadas, nem a vida daquelas duas famílias. Em março, a TAG Inéditos brinda seus leitores com um thriller de roer as unhas, no qual ninguém é confiável e nada é o que parece.
“Este livro emotivo e provocador vai te deixar em dúvida até o final.” – Woman’s weekly “Um romance destacado que mistura personagens irresistíveis a um enredo cativante.” – Woman & home 24
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“Existir é isso, um sobressalto de alegria, uma pontada de dor, um prazer intenso, veias que pulsam sob a pele, não há mais nada de verdadeiro para contar.” – Elena Ferrante 26