"Clara da Luz do Mar" - TAG Curadoria Nov/2021

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Clara da Luz do Mar

PREFÁCIO



Neste mês da Consciência Negra, chega às suas mãos um livro dotado de magia e lirismo, ao longo do qual conheceremos um mosaico de trajetórias marcadas pela precariedade política e social haitiana, mas também pela força e pela resistência dos personagens. Logo nas primeiras páginas de Clara da Luz do Mar, descobrimos que Ville Rose, local onde se passa a trama, “era o lar de cerca de onze mil pessoas, cinco por cento delas abastadas ou financeiramente confortáveis. Os outros habitantes eram pobres, alguns miseráveis”. Com uma prosa potente e, ao mesmo tempo, sensível, Edwidge Danticat nos situa nesse vilarejo em que se cruzam tragédias, sonhos e esperanças, a começar pela história da personagem que dá título ao livro. Claire é uma menina de sete anos, órfã de mãe, que desaparece quando seu pai, almejando um futuro melhor para ela, decide entregá-la à vendedora de tecidos da comunidade. A trama reflete parte da própria biografia de Danticat, que, durante a infância no Haiti, viu seus pais deixarem o país em busca de oportunidades. Anos mais tarde, ela mesma vivenciaria a diáspora ao migrar para os Estados Unidos, onde se encontra até os dias de hoje. A escrita, aliás, é para Danticat uma forma de manter-se conectada com as suas origens. Experiências como as relatadas no livro ou vividas pela família da escritora não são casos isolados na literatura e na história haitiana. Como você poderá ler neste prefácio, a colonização, a escravização e as ditaduras que oprimiram seus habitantes, a consequente instabilidade política e a violência entre gangues locais, além dos diversos terremotos que atingem seu território, deixam feridas que demoram a cicatrizar — e fazem com que tantos indivíduos, assim como a nossa autora deste mês, sejam levados a guardar o Haiti na memória e na imaginação. Boa leitura!


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novembro de 2021

QUEM FAZ

RAFAELA PECHANSKY

JÚLIA CORRÊA

LAURA VIOLA HÜBNER

Publisher

Editora

Assistente

LUÍSA SANTINI JANUÁRIO

ANTÔNIO AUGUSTO

LIZIANE KUGLAND

Assistente

Revisor

Revisora

PAULA HENTGES

LAÍS FONSECA

GABRIELA BASSO

PÂMELA MAIDANA

Designer

Designer

Estagiária de Design

Estagiária de Editorial

Impressão Gráfica Ipsis Diagramação Ana Clara Miranda Capa Giulia Fagundes Revisão sensível desta edição Etiene Martins


SUMÁRIO prefácio

5 A prosa potente de Edwidge Danticat

9 Diáspora caracteriza literatura haitiana

12 Entrevista: "Haiti não teve nenhum descanso do imperialismo"



O livro indicado

A PROSA POTENTE DE EDWIDGE DANTICAT Em sua obra, a escritora haitiana-americana aborda o desejo de pertencimento, os sonhos e a esperança de sujeitos deslocados

JÚLIA DIAS

Capa do livro Clara da Luz do Mar Giulia Fagundes

Clara da Luz do Mar é um convite irresistível de Edwidge Danticat para histórias e memórias de encontros e desencontros, a partir do Atlântico negro, sob três perspectivas que se entrecruzam e resultam na magnitude dessa obra: a personagem Claire, a cidade de Ville Rose e o mar. Publicado pela primeira vez no ano de 2013, esse romance nos conduz a narrativas de uma pequena vila de pescadores situada no Haiti, e mostra como as vidas de seus habitantes estão entrelaçadas — ainda que esses laços não sejam tão demarcados. São histórias que vislumbram amor, perdas, identidades, migração, exílio, em um espaço diversificado. São histórias de corpos negros em movimento, por anos e em um dia. São histórias em que sobretudo as mulheres negras forjam suas existências. Danticat mescla elementos realistas e simbólicos, deixando tênue a linha entre a ficção e a realidade. E o Haiti, tão presente na obra, tem suas tradições, crenças, língua e referências culturais retratadas pelas lentes da escritora e de suas personagens, que rompem estigmas e esteriótipos, mesmo que não se refiram diretamente a fatos históricos. Nas primeiras páginas, conhecemos Claire Limyè Lanmè Faustin no dia de seu aniversário de sete anos, e 5


nos deparamos com um fato que mobiliza todos os habitantes da pequena cidade na busca por Caleb, um marinheiro desaparecido: a grande onda que atingiu Ville Rose. Esse episódio, seguido da fuga de Claire, encadeará uma sucessão de acontecimentos e lembranças do passado, que fortalecerão elos moldados entre os personagens e despertarão dores, conflitos, segredos e afetos. “[E]la desejava que a água salgada fosse o corpo de sua mãe, as ondas, as batidas do coração de sua mãe, o sol, o túnel que a guiou para fora no dia em que sua mãe morreu.” Para Claire, fugir e ir em busca das memórias da mãe, Claire Narcis, que morreu logo após o parto, configura-se como um possível encontro com a própria identidade. Ademais, a menina depara-se com a intenção do pai de que ela seja criada por outra pessoa, Madame Gaëlle, uma comerciante de tecidos. Isso descortina a relação entre a filha e o pai, Nozias, um pescador que sonha com melhores condições de vida para ambos. “O que ele mais queria para sua filha era o seguinte: ausência de crueldade, sensação de segurança, mas também amor. Benevolência e solidariedade também, mas amor acima de tudo.” No entanto, a narrativa vai além das vivências, encontros e desencontros que perpassam Claire e Nozias. Numa série de flashbacks, presentes nos oito capítulos divididos em duas partes, Danticat apresenta outras vidas impactadas por incertezas e instabilidades, além das muitas violências que atingem as pessoas e o espaço concomitantemente, marcas que também são causa e efeito de um sistema colonial. Madame Gaëlle, Caleb, Josephine, Flore Voltaire, Max Filho, bem como Cité Pendue, por exemplo, personificam memórias e violências individuais e coletivas, dramas, problemas sociais e econômicos do Haiti, considerando tanto os movimentos diaspóricos quanto a ótica daqueles que permanecem na terra natal. Segundo o escritor martinicano Édouard Glissant, a história caribenha também é contada pela paisagem, e o Caribe é o mar que descentra; ele é metáfora da complexidade espaço temporal da região. E, desse modo, há conexão entre pessoas e ambiente. Enquanto personagem nessa obra, o mar também carrega ambivalências. No vai e vem das narrativas de diferentes pessoas, sob distintas 6


A autora, Edwidge Danticat Library of Congress

perspectivas de tempo-espaço, ele simboliza presença e ausência, tragédias e recomeços, vida e morte. “As pessoas gostam de dizer sobre o mar que lanmè pa kenbe kras, o mar não esconde sujeira. Não guarda segredos. O mar era ao mesmo tempo hostil e dócil, o ápice do trapaceiro. Era tão grande quanto era pequeno, desde que você pudesse reivindicar uma porção dele para si.” Ville Rose é uma cidade habitada por cerca de onze mil pessoas, marcada por desigualdades sociais e situada a “pouco mais de trinta quilômetros ao sul da capital e apertada entre um trecho das águas mais imprevisíveis do mar do Caribe e uma cadeia de montanhas erodidas do Haiti”. Essa cidadezinha em forma de flor conecta-se a Cité Pendeu, “uma extensão carente e perigosa de Ville Rose”. Assim como o mar, esses espaços interligam passado e presente, violências históricas, migrações forçadas, sobrevivência. “Ele percebeu pela maneira como o mar ao lado da estrada tinha passado de azul-esverdeado para marrom e para preto-acinzentado. As ruas ficaram mais estreitas, erguendo-se numa fileira de encostas de colinas abarrotadas de casas de cimento 7


e de blocos de concreto, barracos de zinco e feiras livres cheias de mulheres de aparência exausta.” Portanto, as representações da natureza, dos espaços e das personagens em meio a imagens-signos tornam rica a forma como Danticat mapeia vínculos e perdas e, assim, (re) encontramos o Haiti por meio de uma estrutura e de uma linguagem que refletem a conexão entre os territórios e os corpos, principalmente os de mulheres haitianas. Neles estão a afetividade, o desejo de pertencimento, os sonhos, a esperança de sujeitos deslocados, mas conectados em uma comunidade fragmentada. “Os olhos de Claire pareceram se acender, do jeito que acontece com os olhos das crianças quando elas estão famintas de uma história.” A literatura é uma das ferramentas para expressar memórias e (re) contar histórias. A premiada escritora Edwidge Danticat, nascida em Porto Príncipe, no Haiti, que vive nos Estados Unidos desde os doze anos de idade, delineia o seu fazer literário enquanto mulher negra na diáspora haitiana. Contudo, ainda que Danticat, como ficcionista, aborde e se comprometa com a história de seu país natal, ela expressa o fato de subjetividades não caberem em reducionismos. E salienta: “Escrevo romances, e não ensaios antropológicos ou sociológicos”. Clara da Luz do Mar contempla a riqueza do protagonismo, das complexidades e das experiências de vidas de pessoas negras, e, sob essas perspectivas, as memórias são basilares. Por isso, é destaque entre os pontos fortes do estilo da prosa de Danticat sua capacidade de assimilar a individualidade e a coletividade, o pessoal e o político, identidades nacionais e culturais, e a combinação desses aspectos, bem como o cotidiano e os sonhos das personagens, que são múltiplas e se conectam na obra. É preciso fôlego para adentrar nesse romance que impacta e emociona! E que a grandeza da escrita de Danticat nos inspire a novas descobertas comoventes.

Erramos! Na edição de agosto, o texto Outras experiências literárias pós-colonialistas, de autoria de Luiz Maurício Azevedo, foi publicado por engano com a assinatura de Paula Sperb. 8


Para ir além

DIÁSPORA CARACTERIZA LITERATURA HAITIANA Embora não seja o tema principal de Clara da Luz do Mar, é praticamente impossível escapar de alguma forma do tema ao se tratar sobre a sociedade haitiana

PAULA SPERB

O deslocamento de milhares de haitianos para outras partes do mundo é motivado especialmente por condições econômicas. A falta de mobilidade social no país, somada à crise política e às consequências de desastres naturais, leva os haitianos a buscar melhores condições de vida. Familiares se dispõem a migrar como forma de colaborar com o sustento dos que ficam. No Haiti, a economia capitalista é alimentada pela agricultura, “bicos” e comércio, sobretudo por meio de trocas de mercadorias. Por isso, o dinheiro enviado pelos membros das famílias que migram é fundamental. A temática da diáspora na literatura haitiana é, portanto, uma constante nas letras do país caribenho. O assunto aparece muito antes de episódios dramáticos como o terremoto de 2010, que deixou mais de 200 mil mortos e estimulou ainda mais a diáspora. O escritor Jacques Roumain (1907-1944) é um exemplo. Seu romance Senhores do orvalho é considerado o fundador da literatura moderna do Haiti. “É interessante porque o romance é sobre a vida comunitária, mas, ainda assim, fala sobre 9


Ilustrações: rawpixel.com Freepik 10

diáspora. O protagonista retorna ao Haiti após anos fora do país e encontra seu vilarejo em situação de seca. Ele tem um projeto de conseguir água, mas o vilarejo é dividido. Apesar da divisão, ele tenta unir as pessoas em torno da água. Tem essa coisa muito bonita, de união e esperança, mas a diáspora já está ali”, explica Lívia Santos de Souza, professora do Mestrado em Literatura Comparada da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). A professora coordena um projeto de extensão aberto à comunidade, que promove a leitura de escritores haitianos, o Clube do Livro – Leia Haiti. “De maneira geral, as pessoas estão com interesse maior em literatura escrita por pessoas negras, ao se darem conta de quão embranquecidas são as literaturas. Nesse contexto, o Haiti chama atenção porque tem uma produção muito rica”, diz Souza. Edwidge Danticat — no Haiti, o nome dela se pronuncia como algo próximo de “Eduige Danticá” — também trata da diáspora nas suas obras. Em Adeus, Haiti, já publicada no Brasil, ela conta a própria história: seus pais migraram para os Estados Unidos quando ela tinha quatro anos. Danticat migrou para morar com os pais quase uma década depois, aos 12 anos. Desse modo, ela tanto escreve sobre a diáspora como é uma escritora diaspórica, produzindo sua literatura nos Estados Unidos. Em Clara da Luz do Mar, um livro poético em que o quebra-cabeça da história de vida das personagens é montado capítulo a capítulo, a diáspora também está presente. Embora não seja o tema principal, é praticamente impossível escapar de alguma forma do assunto ao tratar sobre a sociedade haitiana. Em certa passagem, o personagem Max Pai, diretor da escola de Claire, reflete sobre o fenômeno da diáspora da geração do seu filho, recém-chegado dos Estados Unidos. “Havia algo de trágico em uma geração cujas esperanças tinham sido criadas e depois arruinadas repetidas vezes. Será que tinha sido envenenada pela decepção? Seus líderes e exemplos — inclusive ele próprio — tinham feito tantas promessas que, por algum motivo, não tinham sido capazes de cumprir”, revela o narrador sobre as inquietações do homem. Na obra, outra questão que afeta o Haiti também é abordada: as gangues. Danticat consegue criar a atmosfera de medo que circunda


os bairros onde as gangues assumiram o papel do Estado. Há um caso fútil de assassinato por uma gangue, com a consequente impunidade e corrupção da Polícia e Judiciário. A morte é uma constante na obra. De acordo com a professora da UNILA, essa é uma característica da literatura haitiana em geral. No romance Clara da Luz do Mar, o nascimento da garota coincide com a morte da própria mãe, no parto. Nos primeiros anos de vida, ela será tratada pela comunidade como se a sua mãe a acompanhasse em espírito. A mãe de Claire, aliás, trabalhava na funerária da cidade, uma das poucas mulheres com trabalho formal no vilarejo. Ela enfrentava, porém, discriminação por trabalhar com mortos. Nozias, o pai de Claire, relembra o momento em que soube que seria pai, ao visitar sua mulher no trabalho. “Como pode contar a alguém que está grávida em uma funerária?”, conta o narrador sobre a situação. Isso porque a morte tem significados diferentes na cultura haitiana. “Na literatura do Haiti, os personagens dificilmente morrem como ocorre em um contexto ocidental, onde se morre e acabou. Eles continuam participando das histórias, continuam transitando. Culturalmente, os haitianos lidam com a morte de outra forma”, diz Souza. Outro traço distintivo da literatura haitiana é o uso do crioulo haitiano, a língua do país. Segundo Souza, existem muitos “crioulos” pelo mundo, já que se trata de um nome genérico dado a línguas que se formam com o contato linguístico entre a língua do colonizador e a do colonizado. Porém, escritores diaspóricos costumam escrever na sua língua de chegada, como Danticat, que escreve em inglês, a língua em que foi escolarizada. A autora, entretanto, usa expressões em crioulo ao longo de Clara da Luz do Mar. “Muitas vezes há uma crítica infundada aos autores que escrevem na língua de chegada. É infundada porque as pessoas podem ter mais de uma língua. A ideia de uma língua materna única é recente na história. É uma cobrança curiosa para escrever em uma língua que são obrigados a esquecer e que muitas vezes até são punidos por usá-la, pensando na escolarização nos Estados Unidos para quem migra falando crioulo haitiano e até mesmo espanhol”, analisa Souza. 11


Entrevista

“HAITI NÃO TEVE NENHUM DESCANSO DO IMPERIALISMO” O Haiti foi o primeiro país da América Latina a conquistar sua independência. A Revolução Haitiana (1791-1804), motivo de orgulho para seus habitantes, libertou o Haiti da França. Porém, a república negra mais antiga do mundo viu-se diante de uma dívida milionária para que a França reconhecesse sua independência. A dívida só foi totalmente quitada mais de cem anos depois, impactando a economia e a política do Haiti até os dias de hoje. “O país não teve nenhum descanso do imperialismo euro-americano, que muito contribuiu para aprofundar as crises políticas e econômicas”, explica Handerson Joseph, professor do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional (UFRJ), Handerson nasceu em Porto Príncipe, capital do Haiti. Desde 2005, ele é naturalizado brasileiro. Recentemente, o Haiti teve sua crise política agravada pelo assassinato do presidente Jovenel Moïse em julho deste ano. Em agosto, um novo terremoto deixou mais de mil mortos no país. A seguir, Handerson Joseph fala sobre esses temas em entrevista à TAG. 12


Como a escravização dos negros haitianos no passado impacta atualmente o Haiti? A escravização, por si só, é brutal e desumana. Evidentemente, esse processo deixa sequelas não só no país mas principalmente na psique das pessoas, no seu modo de ser e de estar no mundo. Algumas das maiores sequelas hoje são a alienação e o neocolonialismo. Depois da independência até os dias atuais, o país convive e enfrenta um processo de neocolonização. O país não teve nenhum descanso do imperialismo euro-americano, que muito contribuiu para aprofundar as crises políticas e econômicas. Colonizado pela França, o Haiti foi o primeiro país da América Latina a conquistar sua independência. O que esse processo representa para o país? A independência do Haiti colocou o país numa dupla situação. Por um lado, o país se tornou um referencial a ser seguido, em prol da liberdade e da dignidade humana. Por outro lado, causou um grande temor de que poderia — e pode — iluminar outros povos para acabar com os projetos neocoloniais que países mantinham — e ainda mantêm — em várias partes do planeta. Hoje, uma boa parte da população convive com o orgulho de ser descendente de Toussaint Louverture e Jean-Jacques Dessalines — os principais líderes da Revolução Haitiana —, mas também com a persistência neocolonial através das interferências da comunidade internacional na paisagem haitiana e na soberania nacional. Sobre a política contemporânea, figuras como Jovenel Moïse e François Duvalier influenciaram as dificuldades enfrentadas pelos haitianos? A era dos Duvalier estabeleceu um dos regimes ditatoriais mais sangrentos da América Latina. François Duvalier, apelidado “Papa Doc”, foi eleito presidente em 1957, organizando o Tonton Macoute, uma força armada sob seu controle com o objetivo de reprimir a oposição e a população. O apoio estadunidense a esse regime só cessou em 1961. A nova Constituição, que entrou em vigor em 1964, autorizava a presidência vitalícia de Duvalier. Quando “Papa Doc” morreu, em 1971, foi substituído por seu filho 13


O professor Handerson Joseph Arquivo pessoal

Jean-Claude Duvalier, então com 20 anos, que recebeu o apelido de “Baby Doc” por manter as táticas repressivas de seu pai. O filho levou o país a uma decadência maior. Por sua vez, o governo de Moïse — o presidente assassinado em julho de 2021 — também era marcado pelo autoritarismo, pelas práticas antidemocráticas e pela militarização do aparelho estatal. Neste ano de 2021, ele tentou mudar a Constituição para permanecer no poder. Em menos de cinco anos, contribuiu para a destruição de várias instituições estatais, principalmente o Poder Legislativo e o Judiciário. De que modo o assassinato de Moïse pode agravar a crise haitiana? O assassinato de Moïse pode causar ainda mais instabilidade política e insegurança na sociedade haitiana. Se as forças de segurança pública não garantiram a vida e a integridade física do presidente, que é o chefe de Estado,

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pode-se imaginar a situação da sociedade civil. Isso transmite uma sensação de impotência e uma mensagem de abandono à população, que nesses últimos anos já convivia com a violência nas ruas da capital, principalmente pelos constantes conflitos entre alguns grupos armados que literalmente governam algumas regiões de Porto Príncipe. Como a política internacional afeta a situação vivida pelo país? Desde as eleições de 2016, o Core Group, que inclui Estados Unidos e França entre os integrantes, apoiou Jovenel Moïse. Mesmo com esse apoio, ele foi eleito com menos de 600 mil votos num universo de uma população estimada em 11 milhões de habitantes. A maioria da população resistiu contra seu governo. Pessoas de diferentes classes sociais, gerações e credos se manifestavam indignadamente nas ruas contra a corrupção, a impunidade, a inflação, e em prol da democracia. No entanto, a comunidade internacional enxergava em Moïse um chefe de Estado ideal e desejado, pois suas políticas estavam em consonância com o liberalismo norte-americano e seu posicionamento internacional estava alinhado a esse modelo político-econômico. A comunidade internacional precisa reavaliar sua atuação no país. Deve prevalecer a priorização da população, não os interesses ideológicos e políticos internacionais neoliberais. O Core Group deve respeitar as decisões políticas da população haitiana, assim como as produções locais, principalmente as agrícolas. Os desastres naturais, como os terremotos, agravam as crises sociais do Haiti? O Haiti faz parte do Caribe, cuja região sofre constantemente pelos desastres naturais, como tempestades e ciclones. Porém, nesses últimos anos, os desastres políticos, jurídicos e econômicos parecem ter sido piores do que os naturais.

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Atenção! Para começar a leitura da segunda parte da revista, vire-a de cabeça para baixo e feche-a. Comece a ler a partir da contracapa.

Ilustração do mês Ana Maria Sena vive em Brasília e é formada em Artes Visuais pela UnB. Trabalha com ilustrações e artes conceituais para filmes e séries animadas. Já colaborou com publicações como a revista Superinteressante e o livro Sinto o que sinto e a incrível história de Asta e Jaser, escrito por Lázaro Ramos. @__namaria A pedido da TAG, Ana Maria interpretou uma passagem do livro do mês: "Agora com os pés firmes embaixo de si, Nozias correu na direção da água e chamou o nome de Claire.” 16




POSFÁCIO Clara da Luz do Mar



Um atributo comum a grandes escritores é a capacidade de mostrar a seus leitores que certos comportamentos humanos têm raízes mais profundas e envolvem questões mais complexas do que se poderia imaginar à primeira vista. No caso do livro que você recebe este mês, sua autora, Edwidge Danticat, expõe uma série de feridas relacionadas, por exemplo, à vulnerabilidade de crianças que têm de lidar com o abandono. Órfã de mãe, Claire convive com um pai que tenta entregá-la, repetidas vezes, à fabricante de tecidos do vilarejo. Mas, como bem ressalta a escritora Luciany Aparecida em texto crítico presente neste posfácio, Danticat “humaniza o que pode resultar devastador”. A negligência parental não é apresentada em tom acusatório, mas como um tema complexo, derivado da própria configuração histórica e social do Haiti. Esse aspecto sensível da narrativa parece ter sido a principal motivação de Kalaf Epalanga, curador desta edição, ao indicar o romance da autora haitiana. Segundo ele, a obra traz personagens “tão pobres e difíceis quanto suspeitávamos, mas ao mesmo tempo mais profundos e cativantes do que sabíamos”. Nas páginas a seguir, você confere a justificativa completa dada por nosso curador para a escolha desse livro, assim como uma apresentação de sua própria trajetória — nascido em Angola, Epalanga é uma figura que transpõe fronteiras artísticas e geográficas. Boa leitura!


"ELA AO MESMO TEMPO TINHA FOME PELA VIDA E MORRIA DE MEDO DELA." Edwidge Danticat


SUMÁRIO posfácio

4 Kalaf Epalanga: um artista sem fronteiras

8 Imersão literária

11 Danticat expõe o desamparo original

16 Unboxing

17 Próximo mês


O curador do mês

UM ARTISTA SEM FRONTEIRAS Conheça a trajetória de Kalaf Epalanga e saiba o que o motivou a indicar a obra que você recebe este mês

Se a diáspora é um tema que, em maior ou menor grau, ganha evidência no livro Clara da Luz do Mar, pode-se dizer que está presente também na trajetória do nosso curador deste mês, responsável por indicar o livro de Edwidge Danticat. Nascido em 1978, na cidade angolana de Benguela, o músico e escritor Kalaf Epalanga mudou-se para Lisboa aos 17 anos de idade, buscando escapar da guerra civil de seu país. Em entrevista ao jornal português Público, ele afirmou que seu objetivo ao ir para Portugal era dedicar-se aos estudos, mas a descoberta da poesia, assim como da forma como os rappers do país conferiam tratamento à língua portuguesa, acabou sendo um ponto de virada para ele. Estimulado por aquela atmosfera, Epalanga conta que foi descobrindo o seu lugar dentro daquele movimento e toda uma forma de se inserir na música e na literatura. “Lisboa foi o palco dessa descoberta”, relata à publicação. Conforme também contou à edição brasileira do jornal El País, antes disso, porém, a escrita já lhe acompanhava de forma mais ou menos inconsciente: “Lembro 4


O curador, Kalaf Epalanga Lousyauber

de fazer aquelas redações de escola e caprichar um pouco mais do que o normal, mas nunca achei que seguiria carreira. Sempre tive uma família de bons conversadores e, quando se é bom orador, a tendência é você conseguir construir frases bonitas, criar efeitos, dar impacto”. Epalanga é membro da banda Buraka Som Sistema — fundada em 2005 e em hiato desde 2016 —, que foi um dos grupos responsáveis pela popularização do gênero kuduro, originário de Angola, nas paradas internacionais. No livro Também os brancos sabem dançar: um romance musical, lançado no Brasil em 2018 pela Todavia, o artista afirma: “O kuduro mostrou-me o mundo, com ele e por ele visitei lugares que nunca imaginaria.” A obra, no entanto, tem como mote um episódio em que a vontade de levar o ritmo para outros territórios esbarrou em um empecilho: a caminho de uma apresentação em Oslo, ele foi detido na fronteira entre a Suécia e a Noruega por estar com o passaporte vencido. “Se a Europa me ensinou alguma coisa foi a de que não existe nada mais assustador do que um africano a atravessar-lhe as fronteiras”, narra ele no livro, ao longo do qual costura esse acontecimento com memórias pessoais e referências musicais. Antes disso, Epalanga já havia lançado outros dois livros: Estórias para meninos de cor, em 2011, e O angolano que comprou Lisboa (por metade do preço), em 2014. Ambos apresentam coletâneas de crônicas a cuja escrita ele se dedicou ao longo dos anos, paralelamente à atividade musical. São textos publicados em veículos como o jornal Público e o portal Rede Angola. Em 2019, o artista foi um dos convidados da 17ª edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Em diferentes entrevistas dadas à imprensa brasileira na época, ele afirmou que nomes como Nelson 5


Kalaf Epalanga Francisco Gomes

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Rodrigues, Rubem Braga, Carlos Drummond de Andrade e Ruy Castro estão entre as referências de sua atividade como cronista. Mas certamente a admiração pela cultura brasileira se estende a outras áreas. Em Também os brancos sabem dançar, por exemplo, ele narra o encontro com um DJ que se mostrou surpreso com um comentário seu sobre música brasileira: “O mundo conhecia sobretudo a bossa nova e o samba, não propriamente o funk. Fiz questão de explicar-lhe a afinidade que existe entre os países que têm o português como língua oficial. O baile funk não só nos era familiar como também podíamos identificar alguns dos seus intérpretes e, claro, entender o conteúdo das letras”.


Neste mais recente intercâmbio com o Brasil, em que temos a honra de tê-lo como curador da TAG, Epalanga indica aos nossos associados a obra de uma autora que, assim como ele, passou pela experiência da diáspora — no caso, deslocando-se do Haiti para o Estados Unidos. “Conheci Edwidge Danticat através dos seus contos, uma arte que domina de forma exemplar, mas os seus romances carregam a mesma prosa doce e lírica que nos cativa logo na primeira página”, relata o artista. Em sua visão, a protagonista de Clara da Luz do Mar é a “personificação da interconexão da vida e da morte, da esperança e do desespero”. Ambientados na cidade fictícia de Ville Rose, os personagens da trama são, segundo ele, “tão pobres e difíceis quanto suspeitávamos, mas ao mesmo tempo mais profundos e cativantes do que sabíamos”.

Kalaf Epalanga Matthew Pandolfe 7


Estante

IMERSÃO LITERÁRIA Quer conhecer mais autores de origem haitiana? Confira a seguir outros importantes nomes da literatura do país

Marie Vieux-Chauvet (1916-1973) Com a trilogia Amour, colère et folie, foi uma das responsáveis por introduzir o romance moderno no Haiti. Raça e gênero são alguns dos temas mais abordados em sua produção, que inclui ainda títulos como Fille d’Haïti e La danse sur le volcan.

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René Depestre (1926) Forçado a deixar o Haiti nos anos 1940, Depestre estudou literatura e ciência política na Sorbonne, em Paris. Era admirado por autores como Jorge Amado e Pablo Neruda. Estabelecido em Cuba, denunciou a falta de liberdade de expressão no país e fugiu para a França nos anos 1970. Ao longo de sua trajetória, recebeu diversos prêmios, entre os quais o Renaudot por seu romance Hadriana dans tous mes rêves.

Marie-Célie Agnant (1953) Nascida em Porto Príncipe, a escritora e tradutora estabeleceu-se no Canadá nos anos 1970. Parte de sua obra é dedicada precisamente ao tema da identidade e da diáspora. Escreve tanto no crioulo haitiano quanto em francês, inglês e espanhol. Le livre d’Emma e L’oranger magique (infantil) são alguns dos títulos que compõem sua produção.

Ilustrações: pch.vector Freepik

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Dany Laferrière (1953) O jornalista, escritor e roteirista migrou para o Canadá aos 23 anos para escapar do regime ditatorial de Baby Doc. Autor de obras como País sem chapéu e Como fazer amor com um negro sem se cansar, costuma incorporar em suas criações referências autobiográficas e elementos do imaginário cultural haitiano. Desde 2013, é membro da Academia Francesa.

Yanick Lahens (1953) Após formar-se na França, Lahens voltou ao Haiti no fim dos anos 1970 e passou a lecionar literatura em Porto Príncipe, sua cidade natal. Com Bain de lune, de 2014, venceu o Prix Femina, premiação conhecida por contar com um júri exclusivamente feminino. Sua trajetória é marcada ainda pela idealização de projetos voltados ao combate ao analfabetismo e a reflexões sobre o passado escravagista haitiano.

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Crítica

DANTICAT EXPÕE O DESAMPARO ORIGINAL O que a escritora haitiana faz em Clara da Luz do Mar é humanizar o que pode resultar devastador

LUCIANY APARECIDA

Existe delicadeza na dor? Edwidge Danticat, em Clara da Luz do Mar, mostra que sim. Nesse livro, a delicadeza está no narrar, e a dor, na origem — isto é, na relação filial de pertença. A palavra delicadeza traz um campo semântico do que é frágil, quebradiço, ou seja, algo que exige cuidado, como um bebê ou a condução da narrativa de uma história. Já a palavra dor exprime uma sensação de tormenta e inquietação, como um parto e/ou a projeção da realização de um sonho. O que a escritora haitiana faz em Clara da Luz do Mar é humanizar o que pode resultar devastador: a ação de narrar histórias de dor. Clara da Luz do Mar é um livro brilhante na construção da estrutura da narrativa, no desenvolver do enredo, no formato da apresentação dos personagens, no cuidado e na firmeza com os quais encaminha a voz narrativa que sustenta o tempo da história. Por exemplo, o fio do enredo parte do desaparecimento da personagem Claire Limyè Lanmè Faustin, criança de sete anos, órfã de mãe, cujo pai lhe entregará para uma terceira pessoa criá-la. É nesse momento de fuga da criança que a história começa, com 11


A autora, Edwidge Danticat Library of Congress

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um tempo narrativo baseado na tensão entre o partir e o desaparecer. Claire tem sete anos, e o livro, dividido em duas partes, soma oito espetaculares seções, como se uma fosse o ponto zero e as sete seguintes fossem aproximações ao que quiçá poderá vir a ser uma projeção de vida futura da personagem. O sorriso de uma mãe no parto ao ver seu bebê ou o choro de uma criança ao nascer podem ser imagens da delicadeza. Mas e se a mãe não sorrir? E se a mãe morre nessa cena de nascimento, mesmo antes de ver a filha? O choro dessa filha passa a ser uma imagem de desamparo. Danticat apresenta Claire como essa bebê órfã de mãe e também quase órfã de pai, visto que Nozias, ao ver-se nessa situação quase de parentalidade forçada, decide entregar a filha — situação que lhe desperta um emaranhado de sentimentos: “[...] eram coisas que ele pensava em fazer com ela porque não tinha como fazê-las contra si próprio”. O pai, que parece desorientado, expõe ainda mais a criança a um desamparo original, à falta de um adulto de


referência que lhe possa garantir segurança. É um desamparo que gera nela o sentimento de culpa e o esforço de apresentar sempre um comportamento exemplar, como se ela fosse um ponto de erro e, com isso, precisasse “se esforçar muito para não incomodar”. Esses sentimentos são intensificados, aliás, pela repetição de descuidadas narrativas familiares: “A maneira como ele contava a história sempre fazia com que ela se sentisse como alguém que tinha aparecido em algum lugar sem ter sido convidada, como se não devesse ter chegado, como se a morte da mãe fosse sua culpa”. Danticat expõe a dor com delicadeza para que melhor possamos “segurar” esse livro, esse enredo, essa criança. O cuidado vai da estrutura da narrativa à escolha das palavras, empregadas em histórias de desaparecimento e morte causados por fatores naturais e assassinatos. A escolha das palavras amplia a exposição dos acontecimentos em uma dimensão sensorial que se mostra tão devastadora como o próprio acontecimento. Isso é perceptível, por exemplo, na descrição inicial do livro, quando um pescador é arrastado com seu barco por ondas gigantes: “Primeiro ouviu um rugido baixo, como se fosse um trovão distante, depois viu um paredão de água se erguer das profundezas do oceano, uma língua verde-azulada gigantesca que parecia tentar lamber o céu rosado”. Trata-se de um trecho que funda, nas primeiras linhas do romance, um campo de verossimilhança no enredo, posto que instaura os temas da morte, do desaparecimento e de um possível afogamento — “sugestões-acontecimentos” que estarão de ponta a ponta no romance. A entrega de pistas sobre episódios que virão é algo frequente na narrativa de Danticat. Mesmo antes da fuga de Claire, por exemplo, a possibilidade de desaparecimento da criança já havia sido sugerida: “Ao se afastar de Albert Vincent, Nozias percebeu que tinha perdido Claire de vista”. Nesse momento, porém, o pai a reencontra: “Ele nem tinha certeza de quanto tempo tinha se passado desde a última vez que a tinha visto. Mas, ao se aproximar de seu barraco, ele a avistou”. Além de gerar tal efeito narrativo, esse acontecimento acaba por revelar a negligência parental. 13


A negligência é a marca da relação de parentalidade em vários personagens, em diferentes momentos do enredo, e pode ser observada na cena em que efetivamente Claire desaparece e o pai decide que ficará em casa esperando, pois supõe que ela voltará. O comportamento dele expõe seu descompromisso de responsabilidade para com a criança e um sentimento ambíguo de alívio por não ter que, ao longo daquelas (supostas) próximas horas, dar conta da filha. Esses sentimentos, no entanto, não são apresentados no livro em face de um tom acusatório, mas em pontos de tensão e crise: “O que ele mais queria para sua filha era o seguinte: ausência de crueldade, sensação de segurança, mas também amor. Benevolência e solidariedade também, mas amor acima de tudo”. Os anseios do pai vão desde o desejo de fazer calar a filha, jogando-a ao mar quando era bebê, até o desejo de segurança e amor. Contraditórias, essas emoções podem ser lidas como representativas do que ele queria para si mesmo. Em outro momento da trama, uma mãe que vivia uma gestação de risco engole um anfíbio morto: “Dois tipos de animais estavam dentro dela em perigo: sua filha Rose e agora aquela perereca. Elas que brigassem para ver quem venceria”. Essa tensão nas relações parentais é um ponto constante no romance, aparecendo em complexos e diferentes contextos. Outro exemplo é a experiência de Max Pai e Max Filho, por meio da qual acompanhamos o desnudar de tensões familiares mascaradas por estruturas patriarcais — nesse caso, sugeridas até mesmo pela escolha que a autora faz dos nomes dos personagens, com a manutenção da substantivação “pai” e “filho”. A delicadeza da escrita de Danticat está em cada detalhe. Sua literatura é minuciosa e profunda. É riquíssima nesse livro, portanto, a discussão sobre sentimentos de desamparo ativados ainda na infância pela ação dos adultos, aqueles que deveriam ser responsáveis por garantir a segurança das crianças, mas que, nessa narrativa, são desencadeadores de feridas originárias. Longe de um tom acusatório, no entanto, os pais não aparecem no romance como carrascos, mas como humanos. São sujeitos sociais que reagem com crueldade a questões do mundo, como tragédias naturais, corrupção, 14


A autora, Edwidge Danticat Library of Congress

amor, miséria, violência, sonhos, machismo, racismo — temas desenvolvidos não em polos estanques, mas encadeados numa fascinante estrutura narrativa, que resulta em uma história viva, doída e encantadora. Clara da Luz do Mar não é um livro simples, como não é simples a vida. Mas o que é seguro supor — e escrever sobre segurança aqui é importante, pois o que o livro mais expõe são relações de insegurança causadas pelo desamparo original — é que a esperança, o salva-vidas, reside na narrativa. Clara da Luz do Mar nos aponta com docilidade que o aparecer, o voltar, o seguir são uma questão de perspectiva do contar.

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Unboxing

PROJETO GRÁFICO Quem assina o projeto gráfico do mês é a designer Giulia Fagundes. A ilustração retrata o que a artista imaginou como Ville Rose, cidade fictícia na qual a trama se desenvolve, e foi feita especialmente para essa obra. O mar, a casa e o barco sem pescador são alguns dos elementos que remetem à ausência e à força silenciosa dessa narrativa. Além de despertar certa melancolia, as tonalidades escolhidas podem indicar tanto que o dia está começando quanto terminando, trazendo a ideia de ciclos.

MIMO

Além de ser o pedido favorito do tagger (livro em dobro!), o mimo do mês é o fechamento perfeito do kit de novembro, construído para homenagear a autoria negra. Uma outra história: textos contemporâneos reúne reflexões de grandes nomes da atualidade, como Itamar Vieira Junior, Alain Mabanckou e a própria autora do mês, Edwidge Danticat, em uma edição exclusiva e inédita. Ao final do livro, você encontra uma lista de verbetes sobre algumas das referências mencionadas nos textos. Boa leitura!

Na Estante do App, você encontra mais conteúdos, como vídeos e fotos, sobre o processo criativo do projeto gráfico e do mimo! Ainda não utiliza o App? Baixe no link https://bit.ly/AcessarAppTAG ou aponte a câmera do seu celular para o QR Code ao lado.

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Clarice Falcão Pedro Pinho

Próximo mês

VEM POR AÍ

Dezembro Para fechar 2021, teremos Clarice Falcão como curadora! Ela indica a história de duas amigas outrora inseparáveis que estão há muitos anos sem se falar. Madison se tornou a esposa rica de um político proeminente e é mãe de um menininho adorável, enquanto Lillian sofre pelo passado e parece completamente sem rumo na vida. Madison convida a amiga para ser uma espécie de governanta dos enteados, gêmeos excêntricos do primeiro casamento do marido. O detalhe é que as crianças, por quem Lillian desenvolve sentimentos maternais inéditos, têm um segredo que colocará a vida de todos em risco. Para quem gosta de: leituras leves, acontecimentos explosivos, histórias de amizade Janeiro Uma das nossas maiores musas, Alice Walker retorna ao clube – desta vez no papel de curadora. No primeiro livro de 2022, trazido em primeira mão pela TAG, teremos o livro de memórias de um dos maiores ensaístas estadunidenses da atualidade. Trata-se da jornada de uma busca desesperada pelo corpo ideal, pela aprovação da mãe perfeccionista e por encontrar o amor e a felicidade em uma sociedade marcada pelo racismo e pela cultura das aparências.

Alice Walker Divulgação

Para quem gosta de: memórias, histórias de amadurecimento, livros profundos e catárticos 17



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