Entrevista a Rodrigo Areias

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produtor Ă parte rodrigo areias



3x3D segmento Just in Time de Peter Greenaway

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TATIANA HENRIQUES

Como surgiu a paixão pelo Cinema? A Paixão pelo cinema existe desde sempre, não me lembro de quando se despoletou. Acho que o momento decisivo na minha vida é quando decidi viver de e para fazer filmes. Estudou Gestão e só depois mudou de curso para Som e Imagem. O que fez mudá-lo de ideias? Não foi uma questão de mudar de ideias, foi a consciência de que seria possível viver de algo que queria mesmo fazer. A minha decisão de ingressar no Curso de Som e Imagem prende-se com eu na época viver enquanto músico, e o meu interesse no carácter lato de um curso superior artístico em que a componente de literatura e filosofia faziam parte do currículo como cadeiras técnicas de som ou história do cinema. Aquilo que me fascinou foi essa diversidade e não ser um curso profissionalizante. Dessa mesma forma, ter feito dois anos de gestão foi algo de muito importante na minha vida e ainda me inscrevi numas cadeiras de direito como direitos de autor… É fundador da Periferia Filmes, a Associação Cinematográfica Olho de Vidro e a estrutura de produção Bando à Parte, certo? Como correm estes projectos?

Quer a Periferia Filmes, quer a Bando à Parte, são empresas produtoras de Cinema. A Periferia Filmes era uma empresa em Lisboa da qual eu detinha 50% das quotas, mas da qual não faço parte desde 2009. A Bando à Parte surge da cisão da Periferia e é uma empresa de produção de cinema em Guimarães, onde vivo. A Olho de Vidro é uma associação cultural sem fins lucrativos cuja sede é também em Guimarães. Estes dois projectos correm muito bem, quer na produção quer no apoio à produção de cinema, são projectos distintos mas que se complementam e cuja actividade é bastante intensa. Como correu o trabalho em Guimarães 2012 – Capital Europeia da Cultura e quais eram as suas principais funções? Enquanto vimaranense, que mudanças viu na sua cidade? O extenuante trabalho de Guimarães 2012 correu muito bem, o resultado está à vista, são mais de cinquenta filmes que têm percorrido festivais pelo mundo inteiro e cuja repercussão se faz sentir também na cidade. Nessa estrutura, a minha principal função era ser produtor de cinema, fui o responsável do programa de produção de cinema de Guimarães 2012 e contribui também enquanto assessor de programação. Enquanto Vimaranense, vi a minha cidade

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a mudar de um pólo de consumo e fruição cultural para um pólo de produção e isso é a grande diferença que terá que prevalecer, ou então nada disto fez sentido. Foi co-produtor de O Barão. Quais foram os principais desafios? O Barão era um projecto de uma vasta lista de filmes do Edgar Pêra que eu produzi na última década. O meu principal desafio foi conseguir que o filme se fizesse, arranjar um parceiro que tornasse o projecto viável. Neste caso foi a Cinemate que acabou por ser esse parceiro, que viabilizava a sua produção. Era um filme de estúdio filmado todo em supertechno crane, com custos que eram necessários ser suportados por outro tipo de estrutura. Mas depois foi conciliar tudo isto e as diferenças de comunicação que existiam entre o Edgar e o resto do mundo da produção… Estrada de Palha, a sua segunda longa-metragem, era um western alentejano e foi diferente e arrojado em vários aspectos. Porquê um western? Quais foram as principais dificuldades na realização do mesmo? É verdade que o filme teve um orçamento de uma curtametragem? O filme é um western, porque no fundo sempre quis fazer um western e porque me pareceu

adequado dada a época em que se desenrola a acção, e o seu contexto político. As dificuldades principais foram os constrangimentos orçamentais, dado que um filme de época tem mais dificuldade em disfarçar essas dificuldades, principalmente quando existem animais, armas de época, etc. A verdade é que recebemos um apoio à produção de uma curta metragem, mas que não foi na sua totalidade, ou seja, depois do corte orçamental por parte do ICA chegamos à conclusão que não conseguiríamos fazer uma curta metragem como nos havíamos proposto: em película, com as condições de produção que queríamos fazer. E então já que tínhamos de fazer concessões ao projecto original, então achei melhor partir radicalmente para fazer uma longa. Toda a equipa esteve de acordo, apesar de não ganharem mais com isso, pelo contrário, sabendo que iriam comer pior e dormir pior para além de receber menos… Disse numa entrevista que Estrada de Palha é “uma metáfora do Portugal moderno”. Pode falar-nos um pouco sobre isso? Acho que para quem viu o filme é fácil perceber, dado que o filme é baseado no Desobediência Civil de Henry David Thoreau, um texto com 150 anos, o contexto político

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estrada de palha

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desenvolvimento da sua carreira?

do filme é o do início do século XX pós-regicídio e pré-implantação da República e ainda assim é infelizmente bastante actual. A banda sonora de Estrada de Palha contou com a participação de Paulo Furtado e Rita Redshoes. Como correu esta parceria e como surgiu a ideia de um “filmeconcerto”? A minha relação com o Furtado é muito antiga, em bandas sonoras, ele fez o Tebas e o Golias, fiz inúmeros videoclipes para Wraygunn e Tigerman e esta escolha era portanto natural. Entretanto, o Paulo e a Rita haviam começado uma parceria em termos de bandas sonoras e então propuseram fazê-la juntos, o que correu muito bem, pois eles são bastante complementares.

Não posso dizer que tenha contribuído muito. O encontro entre produtores correu bem, mas nenhum dos meus colegas desse ano são pessoas com quem eu tenha trabalhado. Uns anos antes havia feito o programa do Eurodoc, que é algo muito mais intenso e alguns dos meus colegas desse programa ainda hoje são meus amigos e parceiros de múltiplas coproduções. Qual é o ambiente que se vive no certame?

A ideia de filme concerto vinha já desde o Tebas em que tentámos fazer uma tournée que fosse filme mais concerto, dado que o Furtado entrava no filme a actuar enquanto The Legendary Tigerman. Desta vez apercebemo-nos que dada a facilidade de transpôr para um espectáculo ao vivo a banda sonora que eles haviam composto, valia a pena fazer uma mistura de som sem a música e os efeitos sonoros que eles fazem ao longo do filme para que pudessem ser feitos ao vivo. Foi uma experiência extremamente positiva e correu muitíssimo bem essas apresentações do filme.

Vou a Cannes todos os anos desde 2003, e é claramente o local para desenvolvimento de projectos, de encontro com outros produtores e realizadores. É o local privilegiado para a internacionalização dos nossos projectos e participarmos noutros projectos. No fundo é uma feira, um mercado de compra e venda de filmes, de ideias, de sonhos.

Esteve presente no encontro “Producers on the move”, no Festival de Cannes, em 2009. Como correu este encontro e de que forma contribuiu para o METROPOLIS -rodrigo areias


De que se trata o projecto 3x3D, com três realizadores de renome, Jean Luc Godard, Peter Greenaway e Edgar Pêra? 3X3D é um filme composto de 3 partes diferentes de 3 autores diferentes, mas cuja obra é marcadamente experimental no sentido em que contribuíram sempre para a quebra de barreiras da linguagem cinematográfica. Neste caso, é a primeira vez que algum dos três experimenta filmar em 3D. E essa era a premissa original, era fazer um filme a partir de Guimarães e da memória e da História que questionasse o lugar do 3D no cinema. Foi algo que interessou aos três autores, que usaram formas muito diferentes para abordar estes temas.

o barão

3x3D esteve em Cannes., correspondeu às vossas expectativas? As nossas expectativas em relação ao filme estão alcançadas à partida. Conseguimos fazê-lo, estreou em Cannes, tem já vendas internacionais para vários territórios e múltiplos convites de festivais. O

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filme vai estrear em sala em vários países e isso é muito importante para o projecto de Guimarães 2012, aliás como aconteceu com Centro Histórico (de Aki Kaurismaki, Pedro Costa, Victor Erice e Manoel de Oliveira). É um filme absolutamente desformatado e que coloca o 3D numa nova perspectiva para o espectador, e isso é o mais interessante. Como vê o cinema português actualmente? O cinema português atravessa uma fase incrível de projecção internacional, em termos de presenças em festivais, em prémios e vendas internacionais, apesar do radicalismo da sua proposta. Tem sido extremamente gratificante fazer parte dessa onda, onde as pessoas olham as nossas propostas de cinema com curiosidade generalizada. A força actual do cinema Português reside no seu eclectismo, ao ser uma proposta plural e muito diversificada, ainda que fortemente enraizada na

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nossa cultura. Acho que é uma fase que abrandará ligeiramente face aos cortes de 100% aos apoios à produção, mas espero que seja recuperável. Foi um golpe extremamente duro esse corte pois cortou no seu auge essa projecção. É mais produtor ou realizador? Infelizmente sou muito mais produtor nos dias que correm… mas vou sempre conseguindo equilibrar as coisas… Que projectos tem na carteira para o futuro? Os que mais me interessam são os meus projectos como realizador, e neste momento estou a finalizar uma longa documental rodada em super 8mm, estou em préprodução de uma curta-metragem e de uma longa de ficção ainda para rodar este ano. E ao mesmo tempo começamos já a montagem de um documentário sobre os 30 anos dos Mão Morta, que durará cerca de meio ano. Na minha função de produtor, a lista é muito longa…

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3x3D segmento Cinesapiens de Edgar Pêra

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