Tavola Magazine 2º ediçao

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REVISTA DE CIÊNCIAS HUMANAS ANO 2 N. 2 MAIO, 2015

MAGAZINE O BRASIL

O RETORNO

DE LUZIA

BIPOLAR

Um poema épico sobre a ‘primeira brasileira’ da História

por Fábio Zuccolotto

por Marcos Angelini

A MAGIA DO

GOL CONTRA por Caio Garrido

FIGURAS DA

RESISTÊNCIA

PORQUE OS CARROS SÃO TÃO

FASCINANTES Entrevista com Paulo Sandler por Caio Garrido

por Maria Angela Santa Cruz

+ Poemas | Osvaldo Felix

Contos | Lucas Arantes

Música | Antonio Loureiro


SUMÁRIo

03

Brasil Bipolar

08

Paulo Cesar Sandler e a fascinauão por carros por Caio Garrido

13

O Retorno de Luzia - Um poema épico sobre a ‘primeira brasileira’ da História

14

A Terceira Margem do Rio: Um diálogo entre Poesia (Sonho) e Prosa (Vigília)

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Fábio Zuccolotto

por Marcos Angelini

Ana Raquel Ribeiro Figuras da resistência, o homo sacer brasileiro contemporâneo e a construuão do comum Maria Angela Santa Cruz Crise de identidade do brasileiro - A magia do gol contra Caio Garrido

26

Pensando as telenovelas: um olhar psicanalítico

28

Cinema: Algo de Antonioni em Praia do Futuro

Alessandro Alves

José Geraldo Couto

30

Entrevista: Novas “vozes” da música brasileira - Antonio Loureiro

32

Conto: Quando vários pontos se encostam

por Caio Garrido

Lucas Arantes

34

Poemas

36

Agenda

Osvaldo Felix


EDIToRIAL

É nas nuances que a vida se anuncia. Sem term s de c mpr miss u separaçã . N s detalhes e fissuras d s fat s, é nde p dem s buscar as rigens para pensar quem s m s e desc brir caminh s diante d que se apresenta. Diante da liberdade de representaçã , naquil que nã f i imp st , pr põe-se que é d singular, d que é p ssível simb lizar c m identidade, e que nã é p ssível neg ciar. A 2º edição da Tavola Magazine vem tratar justamente diss : Daquil que nã é p ssível neg ciar. o que é da história pess al e que é da história de um país. C m seus enred s se c nfundem e, às vezes, se perdem? A (verdadeira) história nã é matéria para transaçã ; P dem s dizer que a identidade brasileira passa p r uma pr funda crise, esperand n vas recapitulações? os desmand s da atual p lítica brasileira, s radicalism s ide lógic s exp st s antes e pós-eleições, as últimas manifestações, a C pa d Mund , an de 2014 – que marca cinquenta an s d g lpe civil-militar de 1964 –, a finalizaçã d relatóri da C missã da Verdade, e utr s ac nteciment s c rrid s ultimamente, n s causaram f rtes impressões, deixand -n s pr fundas marcas. Tais questões f ram m tivad ras para muit s d s c nteúd s presentes nesta ediçã . Mas que parece premeditad , nã f i cas para a ediçã da revista. o Inc nsciente determin u t m, e alguns d s text s que f ram se rganizand a l ng d temp nã tinham a pr p sta nem c m pan de fund tema “Brasil”, se pr jetand entã uma linha tênue, que a s p uc s se t rn u visível, n s permitind n meá-l s c m fazend parte de uma unidade. As temáticas atravessam a história d país, sua riqueza cultural e a infinda linha de n ssa memória do futuro, para parafrasear o psicanalista Bion. Bion, que f i uma das principais inspirações para Paulo Cesar Sandler – um grande psicanalista brasileir –, inspir u também a primeira matéria desta ediçã . Nela, Paul , c m sua alma gener sa, fala um p uc s bre sua história e sua paixã p r carr s, n s m strand as rigens desta fascinaçã pra ele e para as pessoas em geral. Tem s também imprescindível artig de espírit literári – se é que p dem s den miná-l assim – de Fábio Zuccolotto, que versa s bre esse Brasil bipartid que se anuncia. D literári a psicanalític , a história c ntinua se delineand , em p ema de Marcos Angelini, sobre a “primeira brasileira” que se tem n tícia. C m Ana Raquel, b m cald de n ssa cultura vem à t na, c m pinceladas psicanalíticas que passeiam p r Guimarães R sa, Caetan e Milt n Nasciment . Já a psicanalista Maria Angela Santa Cruz, traz um imp rtante artig s bre questões acesas da ditadura, c m as ress nâncias que ainda h je persistem, ainda que de f rma disfarçada n s h mens ign rad s na nossa sociedade, os atuais homines sacri brasileir s, vidas matáveis. Um exempl , segund a psicanalista, é a dem nizaçã e criminalizaçã d s j vens de periferia, c l cad s c m s n v s inimig s s ciais, que faz existir ainda um particular estad de exceçã para grande parte da p pulaçã brasileira, principalmente negra. Além destes, também temos notas, ensaios e entrevistas sobre cinema, telenovela e música brasileira atuais, com José Geraldo Couto, Alessandro Alves e Antonio Loureiro, respectivamente. Para fechar, p emas de Osvaldo Felix e conto de Lucas Arantes. Certamente, que nã falta aqui é paixã . Essa é a marca que desejam s deixar. Uma boa leitura a todos. Tavola Magazine Editor Geral: Caio Garrido Jornalista Responsável: Marcos Angelini - MTB 21.329 Diagramação: Vanúcia Santos (asedicoes.com) Revisão realizada pelos autores Arte final capa: Vanúcia Santos Fotografia da capa: Leonardo Rodrigues - C rdenad r d Departament de F t grafia d Núcle Tavola. Fotógrafo, com formação em Publicidade e Propaganda. Professor Universitári na UNIP. Mestrand na área de Educaçã .

Contatos: Tel.: (16) 3623-5786 Rua Visconde de Abaeté, 210 Jd. Sumaré - Ribeirão Preto - SP tav lamagazine@nucle tav la.c m.br

Tavola MAGAZINE é uma publicação do Núcleo Tavola Instituto de Formauão e Pesquisa em Psicanálise, Psicologia e Ciências Humanas LTDA. Rua Visc nde de Abaeté, 210, Jd. Sumaré CEP 14025-050 | Ribeirã Pret – SP –Tel.: (16) 3623-5786 e Núcleo Tavola | Espauo São Paulo de Psicanálise Vila Madalena | Sã Paul – SP – email: tavolasp@nucleotavola.com.br CNPJ: 12.947.921/0001-45 | Luis Henrique Milan N vaes (diret r geral)

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ESTUDoS SoCIAIS E PoL TICoS

BRASIL BIPOLAR por Fábio Zuccolotto

“Sua graça, toda, é Diodato de quê?” – indaguei. - ´Diodato Nariz, por alcunha...´ – ele disse; disse, de brancura. Conheci como eu nunca tinha dado tento d’atenção naqueles homens, cuja valia. Assim que eles eram, de batismo: e o Pantaleão, Salústio João, João Tatu e O-Bispo. Naquela hora, era que eu punha tino.” (João Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas)

Fábio Zuccolotto é cientista social, psicanalista em f rmaçã e c rdenad r d Dept . de Estud s S ciais e P lític s d Núcle Tav la.

T

rinta anos após o movimento Diretas Já, parte dos brasileiros se reencontrou nas avenidas e nã f i pel s uníss n s carnaval e futeb l. As manifestações de 2013 rec l caram a s ciedade brasileira diante d espelh , exibind e esgarçand feridas jamais cicatrizadas n tecid s cial. A efeméride junina, p r sua gênese nas pautas d M viment Passe Livre, lev u às ruas segment s distint s de n ssa s ciedade, unid s, a princípi , pela repressã desmedida a s que manifestavam p r uma causa tã cara a t d s s que saem de casa diariamente n s centr s urban s. As diferenças nã tardaram a aparecer quand utras demandas e discurs s vieram à t na em cartazes, grit s e agressões. os p sici nament s ide lógic s nã só reapareceram na agenda de tant s, c m se apr fundaram, transb rdand um radicalism que caiu na c rrente sanguínea d país e culmin u, nã c incidentemente, na metástase durante as eleições de 2014. o dur embate n pleit presidencial e a sua reverberaçã se sustentam em narrativas que decantam, de um espess cald s ci cultural, a experiência brasileira em d is c rp s de chã , u precipitad s. Amb s c mp st s de ingredientes artificiais, realçad s em n tas sintéticas de ec n micism e marketing, mas, também, c m ar mas f rtes e temper s da terra, c lhid s de n ssa história. Este artig é uma tentativa de pr p r uma reflexã s bre esse intrincad m ment naci nal.

Raiz As raízes deste territóri em f rma de crucifix nã seriam r bustas, c m as que vem s h je, nã f sse a capilaridade desigual entre s s l s que pisavam índi s e aqueles drenad s p r jesuítas e bandeirantes. Embalada pel Atlântic , ap rt u na Terra de Vera Cruz a n ssa p rçã da pólv ra e, nã se surpreenda, da cruz. Inquisid res de cas, bater de pés, idi f nes e, dep is, senzalas, ag gôs e tamb res. Incendiári s aprisi nad res d s que vibravam p r si. Passad s alguns sécul s, a grandil quente história d fad c meçaria a preencher as almas lusitanas de além-mar que acumulavam pau-brasil, ur e lament . Gêner musical caracterizad p r v zes p tentes e agud s perfurantes, c m ch r d s penitentes que beijam o trágico destino das lanças. Com as lamúrias empavonadas dos amantes abandonados, dos impéri s decadentes que rem em s pr s de glória sem largarem s aç ites. F ram sécul s de escravidã , iluminada, apenas, pela f gueira de pilhas e pilhas d que nã se c nseguia pilhar deste chã . T rrentes de sangue vermelh , c m de t d s nós, verteram das peles nã brancas, c m a da mai ria de nós, transb rdand as margens d Ipiranga. I Hiato ao homo economicus Uma das conseqüências da escravidão e da hipertrofia da lavoura latifundiária na estrutura de nossa economia colonial foi a ausência, praticamente, de qualquer esforço sério de cooperação nas demais atividades produtoras, ao oposto do que sucedia em outros países, inclusive nos da América espanhola. 1 (Sérgio Buarque de Holanda, 1936)

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o impéri p rtuguês transf rm u-se em impéri brasileir para que este, p r sua vez, se t rnasse uma república de mini-impéri s particulares e instituições viciadas. A independência ec u tal qual a memória d pastel de Belém na latrina de lusa p rcelana branca. Jesus! Durante sécul s ela plan u c m uma ave de rapina s bre capitanias hereditárias. Dizem que f i abatida à flecha lá pelas bandas da Serra da Cantareira e enterrada n Pic d Jaraguá, c m um espantalh v ad r. Em 1922, alguns lokis pr t antr p fágic s reuniram-se às margens d Teatr Municipal de Sã Paul . Tentaram fundir estéticas eur peias às percepções da experiência tupiniquim para que, enfim, uma identidade naci nal multic l rida n s libertasse da aquarela. Independência e m rte! L uvável, p rém, que fizeram f i inaugurar a infeliz tradiçã reservada a s vanguardistas d velh este. A de serem minad s p r p der s s agentes da santa inquisiçã da m ral e d s b ns c stumes - enfad nh s herdeir s de sesmarias, palacetes, cartóri s e c ncessões públicas. Em última instância, da parte de alguns, de buscarem, nã a ruptura, mas rec nheciment n brilhante verniz de esquelet s amarelad s. Quant a s m dernistas, fiquem s c m fresc r integral de Plíni Salgad . Anauê, L bã ! Nã , Arnald , nã vire b l r! Vam s v ltar pra Cantareira? Eu v u. Arnald ? onde está v cê? Sint muit , amig , desisti. Nã v u. V u para leste, c m Harry Haller: Quando não encontro nem um nem outro e respiro a morna mediocridade dos dias chamados bons, sinto-me tão dolorido e miserável em minha alma infantil, que atiro a enferrujada lira do agradecimento à cara satisfeita do sonolento deus, preferindo sentir em mim uma verdadeira dor infernal do que essa saudável temperatura de um quarto aquecido.2

Cercanias da Modernidade “A história de todas as sociedades que existiram até hoje tem sido a história da luta de classes”. Assim, Marx e Engels abrem capitul primeir de O Manifesto Comunista3, em 1848. Tal assertiva deve ser lida c m t d relativism hist ri gráfic que lhe cabe. A prudência em c mpreender que existiram e ainda existem s ciedades sem classes, à revelia d marxism rt d x , deve-se a fat de que a influência p sitivista se s brepunha massivamente à nascente etn grafia e sua ínfima repercussã n s mei s acadêmic s da ép ca, atribuind um caráter p sitiv , certeir e universal a s estud s s ciais. Ressalva feita, nã p dem s negar à afirmaçã sua precisã quant às s ciedades capitalistas, bem c m fat de que dela deriv u uma gama de interpretações que rev luci n u a M dernidade. Um arcab uç teóric que desnud u as estruturas da dominação no capitalismo e apontou a c mplexa malha da superestrutura – a ide l gia, Estad , as leis e as instituições. E, se nele há a primazia d capital econômico, nã devem s n s esquecer, para relembrar B urdieu4, de que este está em permanente dinâmica c m utr s capitais e seus respectivos campos simbólicos, c m p r exempl , religi s e cultural. P rtant , permanente pr cess de construção e desconstrução das representações d indivídu – gr ss m d , n ções, ideias e imagens riundas d inc nsciente que c nstituem sua subjetividade – é f rtemente influenciado pelo posicionamento do seu capital econômico no campo da economia, mas nã se reduz s mente a ele, uma vez que ele está embebid em utr s tant s campos simbólicos. Conforme escrito acima, os campos simbólicos se entrelaçam e estão em permanente dinâmica uns com os outros. Um campo simbólico é um espaç s cial c m disp sições e especificidades que influenciam e sã influenciadas p r indivídu s e instituições que c mpartilham. T d s que c mpõem estã submetid s a uma hierarquizaçã de p der, em disputa, que s p sici na naquele campo segundo seus capitais e habitus. Em uma t sca analogia, o capital religioso do Papa, no campo da religiosidade, seria ‘equivalente’ a capital econômico de Wall Street, no campo econômico. Em suma, nã existe c mparaçã p ssível, uma vez que a b lsa de Manhattan e as ações de Ge rge S r s influenciam e sã influenciadas pel Vatican , a bíblia e as falas de Francisc . Daí a imp rtância de tais categ rias analíticas. o habitus é uma espécie de ‘mediad r’ entre as representações subjetivas e as práticas objetivas. Segundo Maria Setton, ele é “um conjunto de esquemas de percepção, apropriação e ação que é experimentado e posto em prática, tendo em vista que as conjunturas de um campo o estimulam”5. C ntrariand s ciól g francês B urdieu, que entende que nenhum campo tem a primazia, faç abaix uma síntese, talvez simplista demais, de seus c nceit s c m a ideia central da te ria de Marx. Um indivídu que p ssui um determinad capital econômico c mpartilha, diariamente, diversos campos simbólicos c m indivídu s detent res de mai r u men r capital econômico, p rém, ainda assim, nas s ciedades capitalistas, a incidência d campo econômico nas estruturas de d minaçã é prep nderante. D minaçã esta que, independentemente d campo, se dá pela c açã u pel discurs , p r vezes inc nsciente, utras tantas c nsciente, que estabelece um d míni c nsentid pel s d minad s à medida que estes naturalizam s campos simbólicos d s d minad res, em uma dinâmica que B urdieu cham u de violência simbólica. Eis p der daqueles que alcançam milhões de pess as atribuind significad s e estabelecend narrativas, s b a pálida n çã da neutralidade, c m verdades inc ntestes. Amém. Plim–plim.

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Assim, o conceito de classe social abarca a noção da subjetividade. A luta de classes, portanto, apesar de ser bastante objetiva e primordial no campo econômico, é bem mais ampla d que supõem matreiramente alguns articulistas defensores do status quo, uma vez que ela é travada em divers s campos. Para além de rasteiras distinções entre p bres e ric s u n rdestin s e sulistas, a apr ximaçã u afastament entre indivídu s, grup s e instituições está sujeit a mai r u men r grau de identificaçã entre s seus habitus e suas representações. P r iss , na dita ‘ piniã pública’ da mídia, nã estranhe um aparente c nsens fav rável à p lítica ec n mia pró mercad financeir , u, p r exempl , a massificaçã da idi tia cunhada recentemente: ‘esquerda caviar’. Ainda que, destes que a pr palam, muit s nã tenham lid um text sequer de esquerda, nem c mid caviar, eles c nstituem diversos campos com setores conservadores da elite e deles representam e naturalizam grande parte dos discursos, os incorporando em seus habitus. Também, nã estranhe c rintianos milionários cumprimentando-se uns a s utr s, sem nenhuma carga de ir nia, c m a expressã “é nóis, man ”.

Melancolia 6 N tr n falta rei. Na cruz falta messias. Quem n s guiará à terra pr metida? Quem falará p r deus? Quem pregará? Quem será pregad ? Getúli , Ge rge S r s, Gl b , General Médici, General Motors, Gugu, Pelé e Marighella. Qual ‘ism ’ amparará a mai ria? P r que, na TV, ‘p pulism ’ é term pej rativ e nada se fala s bre ‘mercadism ’, ‘rentism ’ e elitism ? O petróleo é nosso. o lucr é deles. Alv rada de 24 de ag st . 1954. Na antessala ainda ressoavam as bravatas desferidas pelo j rnalista Carl s Lacerda c ntra a c rrupçã e mar de lama do governo, em solo para poucos convidados e muitos microfones. Ali ao lado, em uma câmara para milhões de órfã s, uvia-se s primeir s ac rdes d cant d cisne: EXTRA. Matou-se Vargas. O presidente cumpriu a palavra: “Só morto sairei do Catete”. Às 8:30 hs. da manhã de hoje o maior líder popular que o povo brasileiro já conheceu encerrou de modo dramático sua grande vida. A mensagem que Vargas deixou pouco antes de desfechar contra o peito o tiro fatal: «À sanha dos meus inimigos deixo o legado de minha morte. Levo o pesar de não ter podido fazer pelos humildes tudo aquilo que eu desejava.”7 Impéri vai, impéri vem. Nã é s bre ser eternamente autóctone, mas sobreviver com dignidade, ou, minimamente, sobreviver. C ng , Saig n, Brasil. N c raçã das trevas o apocalipse redime.


C m c rp am rtecid adentr -me. N acelerad fus beatnik a cena pendurada na parede. A sagrada família envelheceu e nã tem um t stã . Pergunt -me quand c l carã a manjedoura à venda n eBay. A ayahuasca acab u. E ag ra, J sé? Bem vind a desert d pei te. Iníci de 1964, Guerra Fria. Na batida da b ssa, J ã G ulart, c m ampl ap i p pular, anunciava: Os contrastes mais agudos que a sociedade brasileira apresenta, na fase atual do seu desenvolvimento, são de natureza estrutural, e, em virtude deles, a imensa maioria da nossa população é sacrificada (...) Optei pelo combate aos privilégios e pela iniciativa das reformas de base, por força das quais se realizará a substituição de estruturas e instituições inadequadas à tranqüila continuidade do nosso progresso e à instauração de uma convivência democrática plena e efetiva.8 Tranquil . Quatr meses dep is ele vivia exilad n Uruguai. Jang tinha 70% da p pulação ao seu lado.9 Iss nã bast u, em face da defesa da ‘s berania’ brasileira c ntra perig que vinha d Tiamat riental. A ínfima min ria, p rtant , era a p rçã que cabia à família brasileira representada na TFP10. Em n me de um anarquista-hippie (Jesus?), ajudaram a blindar rein de deus c m tradiçã , pr priedade, t rtura e fel! A elite naci nal que s nhava c m Paris já havia entendid , há muit temp , que charme da Cidade Luz nã era a luz da liberdade, igualdade e fraternidade, senã a exclusividade d salt Luís XV. P uc imp rtava desequilibrar-se a pis tear algumas raízes. Trágica seria uma queda fatal da sacada da Bastilha, u melh r, d alpendre da Casa-grande11. II Hiato ao homo economicus Observamos aqui muito bem a ligação do imperialismo com o nosso velho sistema colonial fundado na exportação de produtos primários, pois é dessa exportação que provém os recursos com que o imperialismo conta para realizar os lucros que são a razão de ser de sua existência. Considerada do ponto de vista geral do imperialismo, a economia brasileira se engrena no sistema dele como fornecedor de produtos primários, cuja venda nos mercados internacionais proporciona os lucros dos trustes que dominam aquele sistema.12

(Cai Prad Jr., 1945)

P r mais de vinte an s um entã p stulante a n v impéri tabel u c m n ssas ligarquias e seu braç armad , ciente de quais mã s eram calejadas de trabalh e quais assim estavam de fustigar aspirantes a libertad res da América. C nstruíram até uma Esc la das Américas para ensinar militares de t d c ntinente a expandirem a dem cracia c ntra subversiv discurs de igualdade. Ali, s bedientes alun s aprendiam técnicas m dernas que já haviam suplantad s defasad s tr nc e pel urinh . As veias rasgadas da América Latina c nheceram pau-de-arara, a cadeira d dragã , entre utr s. Chaga interminável. Ist parece nã ter fim. o p v nã reage. Fica quiet , cada um n seu cant , tentand tirar vantagem d s utr s a invés de ir pr testar lá n Paláci d Catete. Cacete, ag ra já existe Brasília! Fizeram n mei d nada, n desert . Garç m, cadê pei te? Péssim atendiment daqui, nã acha? Culpa d Luci C sta, aquele m dernista. D Niemeyer, c munista safad . Garç m! Este país é uma merda. o brasileir é uma merda. Maestr , t que um fad . Nã , nã . My Way. A versã de Sinatra. Melh r, um ch r acelerado. Brasileirinho, de Waldir Azeved . V u para alpendre.

ao cargo deveriam vir de campos ideológicos mais próxim s d s ansei s p pulares. Apenas mascaradas, a s lh s em ch que, as bases do poder nacional poderiam seguir sem muitos terremotos em um território democrático e recentemente crucificad . o PT e PSDB nasceram c m partid s de esquerda. o primeir , trabalhista, f i fundad em 1980, na base perária d ABC paulista. o utr , s cialdem crata, fundad durante a C nstituinte de 1988, c mpunha a centr -esquerda. Sem jamais terem c gitad qualquer ruptura de ordem revolucionária, seguiram pelas vias das instituições, tentand ref rmá-las p r dentr . Evidentemente, em um pervers pr cesso de violência simbólica, aceitaram o jogo da superestrutura enraizada n Brasil C lônia.

N

ascid em família de militares, em 1931, n Ri de Janeir , Fernand Henrique Card s sucedeu Itamar Franc , send eleit , em grande medida, pela popularidade do Plano Real, qual ajud u a c nceber. Egress d PMDB e um dos fundadores do PSDB, o prestigiado s ciól g tinha uma sólida carreira acadêmica quand entr u n campo da p lítica instituci nal. Fez parte de um heter gêne grup que, em p siçã à cepalina13 Teoria do Desenvolvimento, desenvolveu, sem ironia, a Teoria da Dependência n iníci d s an s 60. III Hiato ao homo economicus Tais circunstâncias serviram de base para a interpretação da dependência associada, cujo trabalho fundador é o ensaio de Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto publicado no Chile em 1969, ‘Dependência e Desenvolvimento na América Latina’. (...) A dependência associada pode ser resumida – com todos os riscos implícitos em um resumo – em uma idéia simples: já que os países latino-americanos não contam com uma burguesia nacional, não lhes resta alternativa senão se associarem ao sistema dominante e aproveitarem as frestas que ele oferece em proveito de seu desenvolvimento.14 (Luiz C. Bresser-Pereira, 2010)

Mania 6 Brasil: país d futur .

Bipartido A partir da década de 80, bl c s viétic c meç u a esfacelar e a Guerra Fria a c ngelar. os EUA agigantavam-se na rdem mundial que nascia. os regimes militares da AL nã tinham mais serventia. Enquant mund se familiarizava c m sua primeira superp tência, as p líticas da rt d xia ne liberal já estavam adiantadas n centr d capitalism . o Estad , em t d s s sentidos, não encontrava mais sentido. Um Brasil recém saíd d s an s de chumb elegeu, c m ap i substancial d s grup s de c municaçã , ligarca Fernand C ll r. Deu n que deu: impeachment e a sensaçã de que aventureir s d Atlântic e herdeir s de sesmarias nã c nseguiriam mais c mandar a naçã d carg máxim da República. Restavam ‘apenas’ legislativ e instâncias d judiciári . Àquela altura deve ter parecid evidente às f rças hegemônicas que s p stulantes

Apesar de pedir para que esquecêssem s tud que havia escrit , seu g vern praticou a teoria da submissão associada, indo c ntra princípi s cialdem crata e desenv lvimentista de muit s quadr s de seu partid . Implement u p líticas de ch que ne liberal, conforme regia o centro do capitalismo, privatizand estatais e acelerand a abertura ec nômica iniciada p r C ll r. Ações que pouco alteraram a concentração de renda, geraram desempreg e n s deixaram à mercê das p líticas d Fund M netári Internaci nal.

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ilh de lavrad res sertanej s, nascid em 1945, em Caetés, p pular Lula, metalúrgic , líder sindical e um d s fundad res d PT,

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após m derar discurs e jurar parcimônia em uma carta aos brasileiros para o sistema financeir , cheg u lá. Habilid s articulad r, costurou um governo com uma enorme base que abarcava desde m viment s s ciais até set res c nservad res, tend c m fiel da balança fisi lógic PMDB. Beneficiad pela alta das commodities, puxada pel cresciment da China, cri u e ampli u pr gramas s ciais c m seu antecess r jamais s nh u. Sustentad por poderosas alianças com oligarcas da estirpe de Sarney, c nseguiu desenv lver uma p lítica ec nômica nã rt d xa que, além de p sici nar país c m uma das grandes ec n mias d mundo, afagando empresários e bancos, promoveu a ascensã s cial de milhões de brasileir s. C m a amplitude desta c alizã e país atingind níveis históric s de desenv lviment e melh rias s ciais, PSDB viu a sua s brevivência p lítica na c ncentraçã d discurs à direita d g vern . Afin u-se c m set res ainda mais c nservad res d que aqueles da base aliada e se resumiu a entoar o canto do lig póli midiátic , c m um p rta-v z d mercad quand este desejava ext rquir mais d Estad . Desempenh u, durante an s, um pífi papel enquant p siçã . Até chegarem s primeir s sinais da crise de 2008, n fim d cicl ec nômic virtu s a partir da queda d val r das matérias primas para exp rtaçã .

É a economia, estúpido! 15 Fotografe, agora, a paisagem de uma sociedade de c nsum hipermidiatizada, s b f rte influência d campo simbólico de uma elite ec nômica transnaci nal que c manda s rumos da alta tecnologia, megaconglomerados empresariais, entretenimento e informação, além, claro, de deter as rédeas do touro de Wall Street. Pegue sua capa, já que n s últimos sete anos esta paisagem vive sob a mai r t rmenta pela qual já pass u. Imagine o Brasil, no meio deste temporal, após descobrir as maiores reservas de petróleo do mundo em décadas, estreitando os laços da América Latina e ajudand a pintar um n v quadr ge p lític c m s BRICS16. Digamos que nã é um cenári que agrade a império, instrumento dos interesses supracitados. N ssa história m stra c m s set res da elite nacional sempre se mostraram favoráveis ao chic te e c ntrári s a s interesses p pulares. As manifestações de 2013 f ram alv de uma forte guinada de abordagem por parte da mídia, após a desmedida repressã da PM, que acab u p r enc rpar s pr test s n s dias subsequentes. N iníci , ela criminalizava s ‘baderneir s’ que tinham uma pauta específica, para, dep is, percebend p rtuno momento, fomentar a profusão de pautas genéricas n s ‘manifestantes’ que emergiam de uma s ciedade que jamais lid u c m suas c ntradições. o Gigante. Nas ruas, a rev lta

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contra os gargalos estruturais de um modelo de crescimento alicerçado em séculos de desigualdade f i a expressã máxima de uma p lítica de c alizã de classes que chegava a seu limite: lulismo17. Enquant divers s set res pr gressistas atinham–se às pautas mais específicas, a expl sã da indignaçã difusa da mai ria s b símb l s naci nalistas, l nge de mirar as estruturas d p der, t rn u–se um larg campo para a vazã e a mimetizaçã de representações mantenedoras destas mesmas estruturas. A imagem refletida n espelh f i a de um país que se vê a s pedaç s, em pilhas que nã f rmam um t d . N primeir m ment , nenhum partid us u tentar se apr priar das manifestações, assustados com a fúria popular. Contudo, o campo político engl ba muit mais agentes d que os partidos. Findad s s grandes pr test s, clima de instabilidade f mentad pass u a ser rec nstruído na narrativa midiática, em uma missão suicida em defesa da elite nacional e pela promoção da pauta d mercad financeir nas eleições que se apr ximavam. A velha mídia brasileira de Lacerda, que estupra a imparcialidade fingind nã ser pr tag nista na s ciedade d espetácul . o país à beira d ap calipse ec nômic e a ‘c rrupçã escandal sa’, que pela primeira vez vem à t na c m prisões de p lític s e empresári s, exp nd perig samente a estrutura, passaram a ser s mantras diári s para angariar e unificar d is flanc s c nservad res da classe média, grande estrela das manifestações, c m uma só f rça p lítica c ntrária a g vern federal que nã mais sustenta a c alizã das classes. o primeir , de rigem católica, inc nf rmad c m achatament de seu capital econômico e, fundamentalmente, o social; espremid entre a ‘senzala’ que pass u a dividir espaç s c m ele e a eterna falta de perspectivas de ser parte da elite. o segund , flanc c mp st p r parte expressiva d s que ascenderam na última década, muit mais próxim da ética pr testante e sua simbiose catártica com um capitalismo crescente18, temend perder que c nquist u. P r iss , bastante suscetível à narrativa d ap calipse. Amb s, embalad s pel cant da sereia, f ram a f rça m triz da óbvia e necessária pauta p r melh rias n s serviç s públic s que, parad xalmente, carregava altas d ses de l uv r à merit cracia e à reduçã d papel d Estad . Discurs s que, nã p r c incidência, se aninhavam c nf rtavelmente na candidatura p sici nista, mais afeita a mercad . Críticas à Rede Gl b e à mídia em geral surgiram a s m ntes, alguns chamando-as de comunistas. A bipolaridade beirando um surto psicótico. Em um país s b f rte abal identitári , s marqueteir s perceberam que caminh p ssível às candidaturas nã p deria ign rar que vinha c rrend desde an anteri r. A palavra ‘mudança’ f i t m da carnificina. Diante de um clima de suspensã histórica, as três campanhas maj ritárias tentaram atribuir suas esc ras narcísicas a s eleit res, ferecend cada qual uma imagem d Brasil que sustentasse quem f m s, s m s e devem s ser c m s ciedade. Um sentid de país, disputad c m intensidade e agressividade, que só enc ntraria futur desejad em suas pr p stas p uc debatidas. Marina: esg tament d bipartidarism e a mudança na c nstruçã d n v . Aéci : a c nstruçã de um presente caótic e a p siçã c m a rdem necessária à mudança. Dilma: a transf rmaçã feita n passad , a c nstruçã de um presente melh r e a segurança para mais mudanças. N segund turn , s precipitad s d cald brasileir ficaram ainda mais definid s em t rn de discurs s ide lógic s carregad s de Guerra Fria. Indíci s de que, n fund , abal que vivem s é mais intens , é tã pess al que é na rdem mundial. Em t rn de Aéci , a elite merit crática, capitalism que quebr u, s banc s, a ética, a pureza, s ne liberais rt d x s, mérit , a mídia, mercad , Miami, um f rtíssim antipetism nutrid de elitism (inclusa a extrema direita naci nalista) e Sã Paul . Em t rn de Dilma, s p bres assistid s, c munism , b livarianism , Estad , s heter d x s inc mpetentes, s bl gs suj s, s m viment s s ciais, Cuba, Fidel, Chávez, Stálin e a regiã N rdeste. D is representantes de pr jet s de naçã que se diferenciam, basicamente, quant à imp rtância que atribuem à arena pública enquant espaç d s embates e das transf rmações. Entretant , s b f rte influência da atual c njuntura ge p lítica, símb l s aglutinad res de representações variadas e m bilizadas, c nsciente u inc nscientemente, pel acirrament da luta de classes. os atrit s e rupturas de relaci nament s em inúmer s campos da vida cotidiana de tant s alastraram s graves sint mas de um m del de capitalism mórbid em um país que precisa se c nfr ntar c m questões basais.

Tento e Tino Apuradas as urnas, a eleiçã ainda nã acab u. Escrev esse text n iníci de dezembr de 2014 e mar c ntinua bastante agitad . As instituições estã send irresp nsavelmente tensi nadas p r algumas f rças p líticas derr tadas, s b f rtes críticas de utr s set res p sici nistas, verdadeiramente dem cratas. o Planalt está tentand neutralizar g lpe que se avizinha via impeachment. Aparentemente, está send bem sucedid , principalmente dep is de ter anunciad , para iníci d próxim mandat , um h mem d mercad financeir para a Fazenda e a ruralista Kátia Abreu para a Agricultura, agradand à estrutura e dando um tapa na cara de sua base progressista.


Mund af ra, nesse cassin viciad , a banca sempre vence, enquant s índi s, quil mb las, ribeirinh s e tantas utras min rias que s madas sã mai ria, sempre perdem. E assim será enquant imp rtantes alicerces nã f rem dem lid s, interna e externamente. Neste m ment de abertura nas p ssibilidades ge estratégicas, quand centr d capitalismo também patina, o Brasil pode se consolidar como um importante agente internacional na pr p siçã de n vas perspectivas humanistas, questi nad ras e de ações n sistema gl bal. Entretant , para tal, as p rções d s l tupiniquim a serem pisadas pel s seus demandam uma capilaridade justa, para que futur seja presente n planti de n vas sementes e raízes. Urgem as n ções e práticas de alteridade e pluralidade, para que, de n ssas experiências particulares, c nstruam s uma identidade naci nal partilhada p r muit s e nã sequestrada p r p uc s. Uma identidade que passe p r espaç s públic s, pela p litizaçã d c tidian , pel pressup st d dever de n s rec nhecerm s em n ssa própria história. Hiato final ao homo economicus A história da distribuição da riqueza jamais deixou de ser profundamente política, o que impede sua restrição aos mecanismos puramente econômicos. (...) A história da desigualdade é moldada pela forma como os atores políticos, sociais e econômicos enxergam o que é justo e o que não é, assim como pela influência relativa de cada um desses atores e pelas escolhas coletivas que disso decorrem.19 (Th mas Piketty, 2013) NOTAS (Endn tes) 1 HoLANDA, Sérgi Buarque. Raízes do Brasil. 26. ed. Sã Paul : C mpanhia das Letras, 1995. p. 57. 2 HESSE, Hermann. O lobo da estepe. Iv Barr s (trad.). Ri de Janeir : Rec rd, 1995. p. 30. (C l. Mestres da Literatura Contemporânea) 3 MARX, Karl.; ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. 9. ed. Petróp lis, RJ: V zes, 1999. 4 BoURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. Sérgi Micelli ( rg.), vári s tradut res. 6. ed. SP: Perspectiva, 2007. (C l. Estud s) 5 SETToN, Maria das Graças. J. A teoria do habitus em Pierre Bourdieu: uma leitura contemporânea in Revista Brasileira de Educauão.Sã Paul , v. 20, p.63, mai /ag . 2002. 6 “A melancolia se manifesta com tristeza profunda, limitação da vida ativa e profusão de auto-recriminações ou autocensuras e uma invasão sufocante de culpabilidade, segundo a psicanálise. Em contrapartida, a mania se destaca pela exaltação do humor, com tonalidade de alegria excessiva e incontrolada. Há também uma aceleração do curso do pensamento e desestruturação do discurso, o que levou Freud a compará-la com as formas sociais de exaltações festivas, com as liberações das inibições, com a abolição do controle superegóico, e do incremento das transgressões da vida social. Se na melancolia temos uma aniquilação da vida social, na mania temos uma transgressão da mesma. Em ambas as formas clínicas, observa-se disfunção da culpa e da responsabilidade. Portanto, há sempre falta de regulação da culpa e da responsabilidade, no que tange à perda da sintonia, e modulação excessiva do humor, ora para mais, ora para menos com relação ao objeto”. CAMPoS, Sérgi de. Considerações acerca do transtorno afetivo bipolar in Almanaque online. nº 3, jul - dez, 2008. IPSM-MG < http://www.institut psicanalise-mg.c m.br/>. Acess em: 16/12/2014. 7 Jornal Última Hora, Ri de Janeir , 24/08/1954. Disp nível em: < http://c pacabana.c m/rua-t neler / >. Acess em 08/12/ 2014. 8 Mensagem ao Congresso Nacional - Remetida pelo presidente da república na abertura da sessão legislativa de 1964. Disp nível em: <www.institut j a g ulart. rg.br/c nteud .php?id=68>. Acess em 08/12/2014. 9 Fonte: <www2.camara.leg.br/camaran ticias/n ticias/PoLITICA/464707-JANGo-TINHA-70-DE-APRoVACAo-AS-VESPERAS-Do-GoLPE-DE-64,-APoNTA-PESQUISA.html>. Acess em 06/12/2014. 10 Tradiuão Família e Propriedade. organizaçã civil de católic s ultrac nservad res que particip u ativamente d G lpe de 64, rganizand a “Marcha da Família c m Deus pela Liberdade”. Atualmente chamada de S ciedade Brasileira de Defesa da Tradiçã , Família e Pr priedade, f i fundada p r Plíni C rrêa de oliveira que “Provinha, pois, de duas notáveis estirpes brasileiras. De um lado, os Corrêa de Oliveira, senhores de Engenho em Pernambuco (...) De outro lado, sua mãe, Dª Lucília, pertencia à tradicional classe dos paulistas de “quatrocentos anos” – isto é, provenientes dos fundadores ou primeiros moradores da cidade de São Paulo – e contava entre seus ascendentes vários bandeirantes famosos”. <http://www.tfp. rg.br/> . Acess em 10/12/2014. 11 FREYRE, Gilbert . Casa-grande & senzala: f rmaçã da família brasileira s b regime da ec n mia patriarcal. 48ª ed. SP: Gl bal, 2003. 12 PRADo Jr, Cai . História econômica do Brasil, SP: Brasilienese, 1945. Versã digitalizada. Disp nível em: <www. mem riasdaresistencia. rg.br/cpjr_hist riaec n micad brasil.pdf >. pg. 249. 13 CEPAL - C missã Ec nômica para a América Latina e Caribe, criada em 1948. É “uma das cinco comissões econômicas regionais das Nações Unidas (ONU). Foi criada para monitorar as políticas direcionadas à promoção do desenvolvimento econômico da região latino-americana, assessorar as ações encaminhadas para sua promoção e contribuir para reforçar as relações econômicas dos países da área, tanto entre si como com as demais nações do mundo”. <http://www.cepal. rg>. Acess em 12/12/2014. 14 BRESSER-PEREIRA, Luiz Carl s. As três interpretações de dependência in PERSPECTIVAS: Revista de Ciências Sociais. SP: UNESP. v. 38, p. 17-48, jul/dez., 2010. 15 “É a ec n mia, estúpid !» - sl gan criad pel marqueteir James Carville para a campanha de Bill Clint n, na c rrida presidencial d s EUA, em 1992. 16 Acrônim d grup ec nômic e p lític c mp st p r: Brasil, Rússia, ndia, China e África d Sul. 17 SINGER, André. Os sentidos do lulismo: ref rma gradual e pact c nservad r. 1ª ed. SP: C mpanhia das Letras, 2012. 18 WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. SP: Ed. Pi neira, 1998. 19 PIKETTY, Th mas. O Capital no Século XXI. Mônica B. de B lle (trad.). Ediçã Digital. Ri de Janeir : Intrínseca, 2014. p.28.

Poema - Fábio Zuccolotto. Tirinha - J ã da Silva - net destr v canh ta. blogspot.com.br

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MATÉRIA

PAULo CESAR SANDLER E A FASCINAçoO POR CARROS por Caio Garrido

Carros têm c rp , cheir , traseira ( ), curvas, pers nalidade, charme. Carr s fazem parte de n ss itinerári níric . Muit s dizem que eles p dem até sentir, vibrar junt à pers nalidade d d n . Se existe alguém que entende de s nh s, é apaix nad p r carr s, e tem muit a falar s bre a rigem desta fascinaçã – que ac mpanha a espécie humana desde a criaçã da r da – é psicanalista Paulo Sandler. Paul , c nhecid p r ser um d s mai res exp entes da psicanálise n Brasil, além de ter escrit divers s livr s de psicanálise aqui e n exteri r e traduzid imp rtantes bras daquele que c nsidera um dos mais importantes psicanalistas e teóricos da disciplina – Wilfred Ruprecht Bion – também já escreveu divers s livr s s bre aut móveis, entre eles P rsche e opala. A Revista Tavola Magazine conversou com Sandler para tentar resp nder a uma básica questã que muit s já se fizeram um dia: P rque s carr s sã tã fascinantes?

o

an era 1962. o até entã c -pil t Paul Sandler – h je um pr eminente analista – recebe avis de seu pai: “H je v cê vai dirigir”. Nunca havia se aventurad a fazê-l . Nem imaginava que seria daquela f rma. Na Rua Cubatã , uma das mais m vimentadas da ép ca em Sã Paul , lugar c nfus e replet de ônibus, nã era pr priamente um d s melh res lugares para tal enfrentament . Seu pai explicava, e Paul nã discutia. Tinha que se virar. Saiu mei a s tranc s, mas f i; nã precisava receber nenhuma br nca, já que era alg que desejava e muit fazer. Assim c m f i quand aprendeu a nadar, nde seu pai simplesmente o jogou na piscina, Paulo estava então no mar de carros. Sempre dotado de uma entrega c mpleta, Paul nã fugia a desafi . Mas para falar deste e utr s desafi s, é precis primeir p sici nar-n s em utr s lugares estratégic s. P is f i através de seu núcle familiar, entre utr s, que ele estabeleceu seus mais primev s c ntat s c m mund d s aut móveis e d s s nh s que ali se faziam nascer.

Em se

tratand de um psicanalista, Paul busca traçar iníci desse c ntat pel que chama de relações bjetais, que n cas eram pai e um prim -irmã . Paul Sandler tinha seus três an s de idade na ép ca que marca c m iníci de sua paixã p r aut móveis, n qual essa trindade h lística fazia preenchê-l de s nh s e fantasias, primeir s m viment s em direçã a pensament e a açã , à aut n mia em relaçã a própri desej . Seu pai e seu prim f ram aqueles que puxaram carr das influências, e Paul s tratava c m se f ssem seus íd l s, principalmente em relaçã a prim , que na ép ca c ntava c m seis an s a mais d que ele. Ele sempre queria saber quais eram s n mes, s c mand s e detalhes d s carr s, e seu prim R nald lhe ensinava. Basicamente a paixã ac nteceu em funçã deles, mas também através da influência de utras pess as, c m , p r exempl , um m t rneir de b nde.

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o m t rista de b nde se chamava Francisco. Após o bonde passar em frente sua casa, os m t rneir s paravam e ficavam c nversand . Entã Francisc dava um alô e s lh s de Paul brilhavam. C m era fantástic ser m t rneir de b nde! E de carr , de m t , bicicleta... P is nã era só aut móvel que fascinava, eram t das aquelas engenh cas: vel cípede, carrinh de r limã, bicicleta, carrinh s de madeira. Muito tempo depois, com 10 anos de idade, “c nheceu” alguns psicanalistas da S ciedade Brasileira de Psicanálise, que c nviviam em sua casa, c m R bert Azeved (todos esses analistas eram amigos de seu pai, médico e também psicanalista dessa primeira geração, fundadores da Sociedade). Paul entã ia à casa de R bert , p r ter ficad amig d s filh s dele, e eles tinham alguns carrinh s c m s quais ficavam brincand . H je, R bert faz a seguinte bservaçã : «V cê escreve e m nta seus livr s e c nferências c m v cê dispunha s carrinh s em fila, muit bem rganizad s”. Iss tud diz muit s bre nde e c m se inici u sua paixã . Mas se existe alguma


motivação mais profunda, esta seria sua incessante curi sidade, que já se aventava n s primeir s an s de vida, quand , p r exempl , desmontou um relógio dos pais e uma mola se soltou pegando em seu rosto ainda miúdo. Aquil nã era pra mexer; Havia um pr ibid , um perig env lvid ali. Ver c m aquelas coisas funcionavam era ver como funcionava mund , que talvez p ssa tê-l levad p steri rmente a desc brir de que maneiras diversas a mente pode funcionar. Paul tinha seu pai c m inspiraçã , que assim c m ele, mexia e ad rava ver c m funci navam s carr s e t das as engenh cas. Seu pai foi um dos primeiros motoristas a ter um V lkswagen, rar , “esquisit ” pra ép ca, muit diferente d s carr s existentes. Paul c nsiderava e c nsidera pai um pi neir . Ele experimentava c isas que ninguém ainda havia experimentad . Mas f i adiante n que pai fazia. Assim c m interesse em mexer c m madeira. Quando Paulo era criança, os seus móveis f ram feit s p r seu pai e seu avô; Enquant me fala iss , a meu red r está t da uma c nstelaçã de artefat s que c mpõem sua clínica e história. Me apresenta uma estatueta que seu pai fez. ”Ele ach u esse pedacinh de madeira n chã e esculpiu nele”, diz Paul . A estatueta aparenta um h mem c m uma mulher a lad , num andar simbiótico. Tudo está disposto numa curiosa mistura bem articulada de um rústic c m sutileza e claridade. Sua camisa quadriculada e lhar discreto por trás dos leves óculos disfarçam a qualidade e inteligência de seu pensament . Reflit entã : Seu estad mental de tranquilidade, ac lhiment e alma amena que se pr jeta sem precisar de gesticulações excessivas u falas ininterruptas é reflex de seu ambiente? ou seu ambiente é c nsequência deste estad ? Nã sei a resp sta, mas p deria sugerir que se algum psicanalista falasse sobre isso, teria a ver com algo como tempo e espaço mental, necessários para a contemplação e o pensar. Ge rge Harris n, em um d cumentári afinadamente dirigid p r Martin Sc rsese – Living in the material world – diz que acha que as grandes pess as p dem pr jetar sua grandeza sem precisar dem nstrá-la. A magia vem de dentro. Paulo não citou George, mas se apoia em grandes mestres da arte, c m Shakespeare, G ethe, e Freud evidentemente. Paul desc briu s bre as bras desses exp entes d pensament através de seu pai, que ensinava um p uc de tud que sabia s bre eles. E Paul f i se apr fundand . Na psicanálise e na medicina, curi samente, pai nã aparentava desejar que Paul seguisse. Mas quand entr u na faculdade de Medicina, seu pai dava pulos. Ali percebeu que pai realmente queria que ele entrasse.

Muito antes da psicanálise e da me-

dicina, a escrita e a paixã p r aut móveis tomaram um rumo comum.

A partir d s 13 c meç u a escrever s bre aut móveis para a F lha de S. Paul . A s 17 tinha uma c luna semanal; era mais n v cr nista de aut móveis. Teve até uma certa n t riedade na ép ca. As pess as achavam que ele era um adult , escreviam cartas, querend saber quem estava p r trás daqueles text s. A escrita, c m tantas c isas que apareceram em sua vida, parece ter vind p r acas , mas Paul era um peixe pr nt a cair n mar quand uma p rtunidade se m strava. Estava passand pela rua, quand um c lega vei falar c m ele, que sabia que g stava de escrever e disse: “V cê que g sta de ler e escrever, tem um pess al que tá precisand ...” Quand viu, estava ac mpanhand um repórter e um f tógraf da F lha, e semanas dep is escrevend para J rnal. Paul entã acab u assistind de camar te a final da infância e c meç da ad lescência da indústria aut m bilística naci nal. Ia a s lançament s, salões de aut móveis, e às fábricas. Sua vida e caminh pareciam t mar cada vez mais f rma. C m um pensament em busca do pensador.

“Pensar é trabalh

mais difícil que existe; pr vavelmente essa é a razã pela qual tã p uc s se aventuram a fazê-l .” Esta frase p deria ser atribuída a Bi n, um d s mais vig r s s defens res d pensar. Mas nã é cas aqui. o aut r dela, Henry F rd, f i um d s n mes mais pr eminentes da história d aut móvel. Bi n talvez tenha sid principal precurs r d pensament de Paul na psicanálise. Para Paul Sandler p deria ter sid Bi n quem fal u iss . Segund Sandler, “quand uma c isa é verdade, muitas pess as vã chegar a ela – u p ucas pess as – mas sempre haverá suficiente pra alguém saber. Iss que é pensament sem pensad r; Iss que Henry F rd fal u, f i ele, mas p deria ser qualquer um.” Diz ainda: “os pensament s estã ali; o pensad r é um p rta-v z d pensament .” Mas n cas de Henry F rd as intenções a dizer iss pareciam utras. C m n cas de Henry e tant s utr s, carr f i um m t r para muitas utras finalidades. Carr s rev luci naram a s ciedade. Henry rev luci n u a indústria e esperava que c mérci rev luci nasse mund . o m d c m Henry F rd falava s bre pensar parece perverter sentid que teria para Bi n e Paul . Paul diz que existem gravações e d cumentações extensas s bre a vida de Henry, e que ele falava iss muit n sentid de se sentir superi r a s utr s. Diz ainda: “E um cientista, c m Bi n, falaria iss num sentid pedagógic , de que ‘p ucas pess as pensam’ a ‘quem sabe as pess as c meçam a pensar’, mas nã pra dizer que quem pensa é melh r que quem nã pensa. Henry F rd era um h mem muit aut ritári . Na ép ca que seu filh , s vended res e c nsumid res queriam que pintasse s carr s c m utras c res, Henry, p r ec n mia de mercad , falava: ‘o cliente p de ter carr da c r que quiser, c ntant que seja pret ’. È uma frase aut ritária, de dupl víncul . Henry tratava s funci nári s mal. E cheg u a ser também um simpatizante d nazism , entre utras c isas.” Discurs um p uc c ntraditóri de Henry F rd. Discurs vind de alguém que esperava tant que carr e c mérci rev luci nassem mund .

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“Pode-se dizer que o carro era um pensamento sem pensador, até que surgiram os pensadores que pensaram ele. Deram uma forma pra ele. Paulo Sandler

o primeir aut móvel

imp rtad para Brasil f i Sant s Dum nt quem tr uxe. Já primeir acidente de trânsit que se tem n tícia aqui nas terrinhas baixas, f i em 1897, quand p eta olav Bilac c lidiu c m uma árv re. A perda de c ntr le de seu aut móvel Serpollet talvez anunciasse assim de primeira, que de secundári p deria se esperar a partir da existência d s carr s. P is um p eta sabe val r de uma árv re, de uma pedra.

Sandler diz achar que não há nada específico que um psicanalista possa falar sobre carros, vendo isso como campos distintos, diversos, da vida e do conhecimento, mas nos fala o quanto de problemas psiquiátricos estão envolvidos nessa paixão humana, sem perder de vista o quão secundário ao carro essas questões e problemas são.

Para adentrar a camp das paixões humanas, Paul Sandler me fala de uma ép ca muit p litizada de um Brasil em que era p ssível se sentir culpa p r um g st in fensiv à primeira vista – a turma d ‘p liticamente c rret ’ já existia nestes temp s. P is diziam que g star de carr s era um g st burguês. Paul , também p litizad , que quase f i pres p r c nta de m viment s estudantis, se sentiu em c nflit p r um temp . Até que percebeu terren c nflitante desenhad pel s líderes mundiais. (o quant cada um nã tem dentr de si inúmeras inc erências e c ntradições?) Paul entã diz: “os líderes c munistas e t d s s líderes dit s dem crátic s eram apaix nad s p r aut móveis. Ditad res que se diziam s cialistas também. Na lista estã Brejnev, Fidel Castr , Stálin. Stálin tinha uma fabrica de aut móveis só pra ele; Fidel Castr tinha carr s, lanchas, e ainda se fazia f t grafar num jipe american . Aí se via quant ele g stava.” Apesar de achar que nã há nada específic que um psicanalista p ssa falar s bre carr s, vend iss c m camp s distint s, divers s, da vida e d c nheciment , Sandler n s fala quant de pr blemas psiquiátric s que estã env lvid s nessa paixã , sem perder de vista quã secundári a carr essas c isas sã . Ligad s a s ideais de exclusividade, p der, status, atençã , Paul diz: “Sã pr blemas da linha paran ide, de nip tência, de nisciência, p is ser human c m aut móvel acha que c nsegue andar a 120 km/h, c isa que s zinh ele nã c nsegue. Entã dá margem à pess a utilizar aquil que seria útil, para um fim ‘tóxic ’, ligad a s núcle s esquiz paran ides, e daí vind s abus s, a vi lência, a expansã de avidez, a inveja. Tud iss seria uma c isa secundária. P rque nã é só aut móvel que tem iss . Iss ac nteceu pela primeira vez c m relógi , uma engenh ca mecânica que ainda era p r c rda. Quem tinha melh r relógi se sentia melh r. outra necessidade que ser human tem é a de superaçã , que aut móvel dá, mas iss , n vamente, nã é específic d aut móvel. o aut móvel p de ser usad c m arma, pra se matar, matar s utr s. (Inclusive, legalmente é c nsiderad c m arma) Uma estatística nã muit divulgada: Na 2º guerra mundial, n Stalinism , e n Nazism , em t rn de 25 an s, mataram cerca de 85 a 90 milhões de pess as. Iss nunca tinha ac ntecid . Tanta gente m rrer em tã p uc temp . Um rec rde d séc. XX. Dep is de terminada a 2º guerra mundial, n s 50 an s dep is, m rreram u f ram inutilizadas mais pess as p r acidente de aut móvel d que nessas duas hecat mbes.”

Mas que será

entã que carr tem de tã maravilh s ? E será que carr tem um apel diferente para s h mens, mais d que para as mulheres? Segundo Paulo, “numa época era uma coisa mais masculina. Mas os tempos estão mudando um p uc : C meçaram a ter mulheres c m pil t de c mpetiçã ; em geral é a mulher que diz qual vai ser carr a ser c mprad dentr de uma família, entre utras c isas. Mas tem certas atividades que as mulheres, p r alguma razã , ainda nã se n tabilizaram muit . Emb ra elas entraram em algumas atividades anteriormente mais masculinas, como piloto de competição, maestr , u c mp sit r de música sinfônica, nã tem nenhuma Shakespeare feminina, G ethe feminina, u uma Picassa. Evidente também que tem s aut res e artistas mulheres excelentes, que fizeram muitas c isas, mas s mai res até m ment f ram h mens. As mulheres vem se n tabilizand mais, em esp rtes límpic s p r exempl . Mas a mulher já tem um diferencial: Ela pr cria. A necessidade de criar nã é men r na mulher u mai r n h mem. A necessidade

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é a mesma. É que a mulher já cria. Ela cria uma criança. Entã ela nã precisaria criar c isas, se interessar p r engenh cas mecânicas. Já h mem fica tentand criar essas utras c isas.” C m bjet de desej , nã só s h mens lham para s carr s c m se lhassem para uma mulher, mas as mulheres também lham para s carr s c m se lhassem para s h mens, segund Paul . Em uma certa ép ca era popular a denominação maria-gasolina, diz ele. E c mpleta: “E h mem, p r exempl , disfarça a velhice c m aut móvel, c m dinheir . Aí está tud misturad , carr , dinheir , prestígi .”

“Uma necessidade natural.” Está aí que estávam s tant

buscand … o simples e natural. N rmalmente é de onde ascendem todas as respostas. Quand Paul chega a p nt nde fatalmente vam s descer, fica mais clar p rquê de tanta libid investida niss , p rquê de tanta fascinaçã humana p r carr s.

“As coisas que abriram as fronteiras no mundo não foram os cavalos, mas a bicicleta. Não depender mais da tração animal.” Segundo Paulo, o mundo inteiro é fascinad : “P uca gente nã é. V cê vê a quantidade de aut móveis h je, c m as cidades e as estradas l tadas de carr s. A impressã que se tem é que esse tip de ‘gering nça’, vam s dizer assim, atende a uma necessidade natural. Muitas c isas artificiais, inclusive automóvel, atendem a uma necessidade natural. Necessidade p r quê? P r que sã c isas que ser human precisa fazer e nã c nsegue fazer s zinh . Entã a gente mistura arte c m fíci ; Artifíci na n ssa língua parece palavrão. Mas se respeitássemos a etimologia, veríam s que Artifíci é arte + fíci . É fazer determinadas c isas c m certa arte. Estender u dar a ser human c isas que ele precisa: M bilidade, l c m çã . As c isas que abriram as fronteiras no mundo não foram os caval s, mas a bicicleta. Nã depender mais da tração animal. Que começou com a bicicleta. Que é alg que também sempre me fascinou muito. É a coisa da roda, de poder acelerar um pouco.” Estendend essa ideia de artifíci , e pensando na diferença entre arte e artesanato, Paulo não considera os carros como objetos de arte. Acredita que sã bjet s de artesanat . Ele diz: “Existem até alguns aut móveis que estã exp st s n MAM (Museu de Arte M derna) de N va Y rk. Fazem parte da exp siçã permanente alguns d s carr s que sã mais p pulares em term s de beleza aqui para Brasil, c m P rsche e Karmann-


-Ghia. Mas n cas dessas exp sições de arte, ach que já está mei misturad , nã se p de dizer que é arte.”

“A pessoa pode transcender

através da arte. A arte transcende. A arte ou o símbolo comunica alguma coisa que não é ela mesma. Transcende à ela. E não acho que o automóvel faz isso.

Diz que é artesanat , “p is tem alguma c isa riginal em alguns desenh s, desenh s que fazem bem à vista, nde bel lá está. N artesanat também tem bel . (Est u usand bel n sentid da Estética, c nceit da Fil s fia) Que c njuga c isas que agradam a mai ria d s seres human s. Talvez p r iss s museus de aut móveis h je sã mais visitad s d que s museus de arte.” E a arte desestabiliza, nã agrada t d mund . Para Paul , s aut móveis até têm

isso, mas não alcançam a sublimidade. Segundo ele, a arte alcança a sublimidade. Diz ainda: “Estes bjet s de arquitetura, engenharia, de design, nde a f rma segue a funçã , aí nã chega a ser sublime. E s carr s sã pr duzid s em série; iss estraga até a f rma que própri designer deu. Quand vai pr duzir em série, s engenheir s esculhambam bjet , pr jet . Sã s engenheir s que vã dar f rma para aquil . Já na arte, as pess as c stumam ficar muit em ci nadas. P de ser uma bra de arte, uma música, s fisticada u nã , e as pess as c meçam a ch rar; Relembram alguma c isa dela, da infância, da vida, que sã c isas que a engenharia nã faz. A pess a p de transcender através da arte. A arte transcende. A arte u símb l c munica alguma c isa que nã é ela mesma. Transcende à ela. E nã ach que aut móvel faz iss . Ele p de ser útil, p de dar prazer, p de ser desafiad r para v cê p der c ntr lar, mas nã há nenhuma sublimidade. Nem bestialidade. P rque também a arte transmite alguma c isa bestial para a pess a perceber. o aut móvel só é bestial quand serve pra matar as pessoas.” Eu acrescentaria que ele p de ser bestial quand mata f rmas de arte ( u artesanat ) antigas. Paulo é um grande apreciador dos carros antigos. Prefere-os. Diz que eles eram muit mais bem feit s e acabad s: “P r exempl : certas c isas de industrializaçã pi raram aut móvel. Vidr s pan râmic s f ram ab lid s. Neste cas pr gress foi um retrocesso.” E diz ainda que “ g st é p der c ntr lar carr . N s aut móveis antig s, p de-se dizer que p de ter um cert c ntr le s bre ele. E tem cas s, que vã dizer que v cê veste carr . (dit s aut móveis esp rtiv s) C m se carr f sse uma r upa e que v cê p de c ntr lar um p uc melh r… Nã sei se tem a ver c m a pers nalidade da pess a. A pess a se adapta a que carr p de dar.” Paul pôde se adaptar muit bem a que vida pôde lhe dar. Paul pôde dirigir sua vida.

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O RETORNO DE LUZIA UM PoEMA ÉPICo SoBRE A ‘PRIMEIRA BRASILEIRA’ DA HISTÓRIA por Marcos Angelini

A

partir de um enf que mais centrad em bras de Alencar, Machad , Aluísi Azeved e Drumm nd, resvaland pel s primórdi s de n ssa Literatura, numa mençã a Caminha, Nóbrega e Anchieta, nasceu (pretens ) p ema “o Ret rn de Luzia”. De f rma livre, mas sem ab lir algumas rimas que lhe deram, a meu sentir, um ritm épic (mais pretens ainda), tentei fazer de Luzia uma pers nagem viageira pelas bras d s referid s mestres. Súplice, revisita alguns pass s de n ssa c l nizaçã , aventuras, b nança, am res e ódi s. Em rep rtagem datada de 25 de ag st de 1999, publicada pela revista Veja, Luzia f i dada c m send a primeira brasileira: a rec nstituiçã de um crâni de mulher de 11 mil e quinhent s an s, mais antig da América, rev luci n u as te rias s bre a cupaçã d c ntinente. Arqueól g s descrevem Luzia c m uma mulher baixa, de c mpleiçã física m desta, cuja figura, ainda j vem, remanescente de um p v extint , que cup u a América há milhares de an s e que acab u dizimad talvez p r guerra u catástr fe natural, perambulava pela regiã d cerrad mineir . Em síntese, esta é Luzia e seu p ema segue abaix .

O RETORNO DE LUZIA Eu nasci há mais de 10 mil an s. Carreg , Senh r, a geneal gia d Planeta: fui negra, da fria Cítia, grega, r mana talvez. Já fui Iracema. Vivi da caça e da pesca, já perc rri as fl restas, fui livre, escrava, liberta. Curvei-me a deuses, reis, princípi s e principad s. Já morri de muitas mortes, já vivi muitas vidas. Fui, Senh r, capitã da armada d s ingleses, a Cruz na terra fincada d Deus d s p rtugueses. Fui sangue que j rr u mil m rtes. H je s u Luzia, fizeram-me Luzia, desc briram-me Luzia. Luzia só. Senh r, c m s h mens sã tard s: pinçaram-me das cavernas, contaram-me como a Cristo os ossos, os anos, os séculos. E, durante esse temp , eu vi Caminha seguir per mar de l ng até t par sinais de terra, lançar o prumo e amainar as naus. ouvi Evangelh que saiu d s templ s e entrou virgem nas selvas. Pus-me de j elh s naquela terra chã e mui frem sa. Vi Nóbrega dar a r upa trazida a genti , repartind -lha até ficarem iguais n c rp . Senh r, c m s h mens sã tard s: eles também tinham alma! Vi nascer Piratininga, escrever nas areias grande piahy. Provei do acaju, da mangaba, do araçá e do ombu. Senh r, c l nizada a terra, j gadas t das as sementes, vi Zumbi nas n ites m rtas – negra libertaçã . Senti cheir : cheir c letiv d s c rtiç s, o prazer gr ss da alma brasileira em Rita. Maldita! Bendita! A m ral em Piedade: Saudade!

Marcos Angelini é o jornalista responsável da Tavola Magazine. “Se dep is de eu m rrer, quiserem escrever a minha bi grafia, Nã há nada mais simples. Tem só duas datas - a da minha nascença e a da minha m rte. Entre uma e utra t d s s dias sã meus.” (F. Pessoa)

o pr fess r Marc s Angelini nasceu em Sã Paul a s 07 de junh de 1945. Dedic u 32 an s a magistéri do ensino médio e superior. É jornalista pela Fundação Cásper Líber . H je, c rdena, juntamente c m seu irmão, o espaço Substratum em Ribeirão Preto, local de cursos e palestras sobre assuntos atuais, focando a imp rtância d aut c nheciment c m element fundamental para a transf rmaçã d ser human .

Senh r, vi rasgad de lad a lad ventre-livre de Bert leza, s rte diversa da Chica – estranha liberdade... A casa era a da rua de Matacavalos. o mês n vembr , an ... era de 1857. os lh s eram de Capitu. Reacenderam a chama d ciúme; tornaram um certo Bento em Casmurro. Eu vi, Senh r, saltar d gêni d s Machad s traid res, traíd s, frac , amante e s enam rad s: tragic média humana de t d s s meus sécul s. E lá, nas plagas de Pernambuc , vivi amar d açúcar: a humildade vexada, os coronéis insistentes, pobres, ricos, dementes. Vi Vit rin Quix te querer viv um f g m rt . C m s h mens sã tard s: há l bis mens ainda! Carreg , Senh r, sentiment d mund : do negro, do romano, do grego, d escrav , d índi , num c raçã mai r que mund . Muit mai r, nde cabem, sim, as d res, s h mens. o mundo caduco, o mundo presente, o mundo futuro. S u, Senh r, a Luzia de t d s s am res, de Rita, Capitu e Bert leza. Venh , Senh r, emergida d escur das cavernas, revelar, em verso, a grandeza das c nquistas de C l mb , de Cabral, e a beleza de um país incrustada na Grandeza d Univers .

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PSICANÁLISE

LITERATURA &

A TERCEIRA MARGEM Do RIo: UM DIÁLOGO ENTRE POESIA (SONHO) E PROSA (VIGÍLIA)1 p r Ana Raquel Ribeir *

Resumo: o diál g entre p esia (s nh ) e pr sa (vigília) nas bras h mônimas A terceira margem do rio, permitiu evidenciar s mecanism s desl cament , c ndensaçã e figurabilidade entre as palavras de Caetan Vel s e de J ã Guimarães R sa. Nesse sentid , a ideia de uma terceira margem n ri que encerra indizível, presente em ambas as bras, permite pensar a palavra c m representaçã de c isa, a palavra em sua materialidade que flexibiliza a relaçã entre significante e significad (água da palavra). Mas é metaf ricamente na relaçã c m pai que se encerram as raízes d t da cadeia ass ciativa. Sã s desej s inc nscientes, submers s n ri , que regem s perad res e que criam s meandr s da rede de ass ciações ra c nvergentes e ra c ntraditórias denunciando a presença escondida, disfarçada da (i)lógica do desejo inconsciente. Palavras-chave: psicanálise, p esia, pr sa, s nh

*Artigo publicado originalmente no “Boletim Formação em Psicanálise” - Institut Sedes Sapientiae - An XIX – V l. 19 – Nº 01 • Janeir /Dezembr 2011

The third shore of the river: a dialogue between poetry (dream) and prose (vigil)

NOTA: 1. Versã revista e ampliada d trabalh apresentad na XX J rnada d Departament F rmaçã em Psicanálise d Institut Sedes Sapientiae em 2009.

Abstract: The dialogue between poetry (dream) and prose (vigil), in the homophonous works A Terceira margem do rio, shows the mechanisms of displacement, condensation and figurability between the words of Caetano Veloso and João Guimarães Rosa. The idea of a third shore of the river that contains the unspeakable, found in both works, allows one to think the thing-wordÿthe word in its materiality that turns looser the relation between referent and meaning (water of the word). But it is metaphorically in the relation with the father that the roots of the associative chain are found. Unconscious desires, inside the river, conduct the operations and create the texture of the web of associations, sometimes converging sometimes conflicting, and which denounce the hidden, disguised presence of the (il)logic of the unconscious desire. Keywords: psychoanalysis, poetry, prose, dream

Um convite... Car leit r, permita-me fazer um c nvite: Uma pausa para um devanei , um mergulh nas águas (des)c nhecidas da Terceira Margem do Rio... Se essa nã f r uma h ra c nveniente, v lte mais tarde, mas, p r fav r, nã pr ssiga sem antes se dar temp de experimentar as águas de Caetan e Milt n. E, se ag ra f r um b m m ment , ac m de-se naquele recant mais ac nchegante e uça (mesm ) essa música. Use temp que lhe parecer necessári . Apr veite para dar tant s mergulh s quant f r cas até deixar-se m lhar pelas intrigantes palavras desse bscur ri . Dep is, e apenas dep is, de um bel mergulh na música, sugir um mergulh n c nt h mônim de Guimarães R sa. Só entã estarem s pr nt s para c meçar a brincadeira... Esper p r v cê aqui. (...) A terceira margem do rio - Caetano Veloso e Milton Nascimento oc de pau que diz: Eu s u madeira, beira B a, dá vau, tristriz Risca certeira Meio a meio o rio ri Silencioso, sério N ss pai nã diz, diz: Risca terceira

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Ana Raquel Ribeiro é graduada em Psic l gia pela PUC/SP e psicanalista, pel Institut Sedes Sapientiae, nde c rdena um d s grup s de Ac mpanhament Clínic (AC) d curs de F rmaçã em Psicanálise. organiz u livr “P r uma psicanálise viva” de aut ria de H mer Vett razz Filh . Atende em seu c nsultóri particular e na Clinica Psicológica da PUC e coordena a rede de atendimento psic terapêutic ‘C m Tat ’ d Institut Fazend História.


Água da palavra Água calada, pura Água da palavra Água de rosa dura Proa da palavra Dur silênci , n ss pai Margem da palavra Entre as escuras duas Margens da palavra Clareira, luz madura Rosa da palavra Pur silênci , n ss pai Meio a meio o rio ri Por entre as árvores da vida o ri riu, ri Por sob a risca da canoa o ri vil, vi o que ninguém jamais lvida ouvi, uvi, uvi A v z das águas Asa da palavra Asa parada agora Casa da palavra onde silênci m ra Brasa da palavra A h ra clara, n ss pai H ra da palavra Quand nã se diz nada Fora da palavra Quand mais dentr afl ra Tora da palavra Rio, pau enorme, nosso pai

Mas, afinal p r que esse c nvite? P r que deixar-se levar pel s meandr s de um p ema/ cançã num devanei ? P r que entregar-se a essa escuta? Na f rmaçã de um analista, busca-se incessantemente desenvolver uma escuta capaz de r mper a c ncretude d discurs . Faz-se analista aquele que c nsegue se apr ximar de seu paciente naquil que ele nã sabe que diz a falar, quand a palavra transcende significad mais explícit e se apresenta numa rede de p ssibilidades de significaçã . Nesse sentid , fazer psicanalític apr xima-se d fazer p étic , artístic , que se permite brincar c m as palavras. N entant , c ntradit riamente, quais sã s espaç s criativ s em que psicanalistas em f rmaçã ( u nã ) se permitem estar? onde está lugar da brincadeira c m as palavras que permite exercíci da escuta? Em mei a univers teóric auster que em ldura, f rmata e enquadra, a brincadeira c m a palavra parece p r vezes acuada, já que tão pouco “séria”... Na linguagem p pular, “p eta” e “s nhad r” sã , às vezes, tratad s c m sinônim s. Trata-se de uma anal gia que c nsidera que amb s utilizam a palavra c m “c isa”. Regid s pel significante, s nh ign ra e p ema flexibiliza as relações entre significante e significad . Tant na p esia, quant n s nh , a palavra se materializa na sua c rp -

riedade: s ma e sema. A palavra é sign e c rp - é iss que n s ensinam s tr cadilh s, e é p r iss que s p emas esc ndem um univers quase infinit de significad s que permitem, além de um deleite particular, um exercíci de ampliaçã de escuta. É c nhecida a imp rtância capital d significante em t da e qualquer f rmaçã d Inc nsciente: chistes, s nh s u sint mas. Regid pel pr cess primári , ambígu e caótic , Inc nsciente pressi na Eu para manifestar-se, seja n pequen espaç de um chiste que escapa, num p ema dem radamente gestad e sentid , u n s s nh s. T d s s cas s encerram a manifestação do desejo inconsciente. Muito antes de Freud, segundo Meneses (2002, p.21), o filós f greg Aristóteles já articulava a imaginaçã a desej : “...a fantasia, quand se m ve, nã se m ve sem desej ”. Freud (1900/1996) c nc rda c m filós f a pr p r que: “... durante s nh Inc nsciente nã p de ferecer nada mais que a f rça pulsi nante para um cumprimento de desejo”. o desej , c mpreendid c m m la pr puls ra de t d m viment psíquic , repr duz a cada m ment da vida de vigília u n s n s registr s arcaic s de vivências de satisfaçã geradas a partir de tensões de necessidades atendidas. o desej é, p rtant , a m çã pulsi nal n aparelh psíquic que arranca a carga da tensã de necessidade na busca da vivência de satisfaçã . o investiment energétic d traç da vivência de satisfaçã fica tã intens que resulta numa identidade perceptiva alucinatória. Tal identidade de percepção passa a constituir o objeto d desej , que a ser repr duzid em s nh , u em qualquer utra f rmaçã d inc nsciente, c nsiste n que fic u c nhecid c m a realizaçã d desej . Nesse sentid , tant s nh c m a p esia peram sens rialmente. A elab raçã nírica se apr xima, p rtant , d pr cess de elab raçã artística - ambas enraizadas nas descargas pulsi nais regidas pel desej . Para Meneses (2002, p.16) “p esia e s nh mergulham numa lógica da ambiguidade, abrigand a c ntradiçã , aci nand insuspeitas f rças psíquicas. Quand s nha, t d h mem é p eta: utiliza s recurs s da figurabilidade, a imagem sensível; estabelece anal gias que nã se impõem à primeira vista”. Meneses (2002, p.20) ap nta ainda que diz Ric eur acerca de t d latente que exige ser manifestad : “ nde quer que um h mem s nhe, pr fetize u p etize, utr se ergue para interpretar” - que n s traz de v lta à pr p sta desse trabalh . A Terceira Margem do Rio é um poema particularmente interessante para nosso convite ao devanei / exercíci de escuta/ interpretaçã . Iss p rque nã se trata apenas de um poema maravilh samente c ncebid , mas que preserva suas raízes na pr sa. Caetan cri u a cançã (p ema) a partir d c nt h mônim de Guimarães R sa, A terceira margem do rio, criando um diál g entre p esia e pr sa anál g à relaçã estabelecida entre s nh e a vida de vigília. A pr sa de R sa parece rdenar, preencher as lacunas deixadas pel p ema de Caetan . Mas p deríam s pensar invers . A cançã criada p r Caetan é a c ndensaçã p ética d c nt de Guimarães R sa, c m se c nt pudesse ser pensad c m um event da vida de vigília que carrega de energia algum element inc nsciente e se transf rma num rest diurn , matéria-prima n bre para a c nstruçã p ética d s nh , n cas , a cançã , tã mais livre na palavra c m “representaçã de c isa”, definida p r Laplanche & P ntalis (2004, p.450). Iss permite que a cançã sirva nã apenas de base para a livre ass ciaçã daquele que a escuta – que já seria válid – mas para escutar p ema à luz d c nt , de f rma anál ga à escuta de um s nh à luz das ass ciações d analisand . Em utras palavras, sup nh aqui nesse exercíci metafóric , que a pers nagem que narra em primeira pess a c nt é aquele que “s nha” a cançã , de nde surge a anal gia entre s nh e a vida de vigília, bem c m evidências d s efeit s da f rça d desej inc nsciente. Em p siçã a esse sup st “trabalh d s nh ”, presente “trabalh de análise”, tenta resgatar n c nt , evidências de c m a palavra f i transf rmada. o presente trabalh estabelece, p rtant , um diál g entre p esia (s nh ) e pr sa (vigília) nas duas bras, pr curand evidenciar a presença d s mecanism s de desl cament , c ndensaçã e figurabilidade n p ema (cançã de Caetan Vel s ), a partir d que é narrad n c nt de Guimarães R sa. A seguir, c mpartilh a experiência desse meu mergulh ...

Compartilhando meu mergulho na “Terceira Margem do Rio” ouç a música A terceira margem do rio, de Caetan Vel s , e s u t mada p r ela. Nã c nsig explicar que se passa. Simplesmente me invade a cadência ritmada desse ri -silênci , dens sentiment d pai que se faz presente na ausência, na palavra que cala. Pens em c m me fisga a cançã e c m nã c nsig parar de uvi-la... Dezenas de vezes até que a repetiçã permita ac m dar cada s m e palavra em mim. Sint c m se quase pudesse t car mergulh da música e da p esia n inc nsciente. Mergulh rápid , invasiv , sem permissã prévia. Nã há nada a fazer, a nã ser sentir que alg f i pinçad das entranhas e emergiu das pr fundezas. Tal qual Caetano canta sobre o rio, água da palavra. Da narrativa a cançã repr duz efeit enigmátic da palavra que silencia. De fat , sem c nt , a cançã parece c dificada c m um s nh . Também fica preservad n p ema

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estil característic da pr sa r siana, seus ne l gism s, aliterações, rimas, lirism e mel dia quase musical. o ritm scilante entre aceleraçã e distensã d p ema se assemelha a pr cess de c nstruçã d s nh , em seus movimentos sucessivos de regressão e progressã n aparelh psíquic . A aceleração e distensão também aparecem no poema como recurso para deslocament e c ndensaçã de element s d text de Guimarães. Em seu text , R sa (2005, p.77) c nta que pai enc menda uma can a feita de uma madeira b a, rija, que dure “na água p r uns vinte u trinta an s”. N s vers s iniciais d p ema (“ c de pau que diz / eu s u madeira beira/ b a, dá vau, tristriz/ risca certeira”), Caetano estabelece uma aceleração que emparelha “madeira beira”, cultand não apenas “madeira boa”, como “beira boa” - as duas duplas que anunciam sentid de can a a “ c de pau”. Iss p rque “ c de pau” é “madeira boa” para a canoa, e é a “beira b a” que abre passagem, “dá vau”, para a can a fazer na água uma risca suave (tristriz) e precisa (certeira). Particularmente ne l gism “tristriz” dá um t m de s nh à cançã . Há alg cult nesse curi s term que remete à figurabilidade e à c ndensaçã características d trabalh d s nh . N primeir cas , há em “tristriz” a sonoridade da canoa resvalando na água. A própria musicalidade d significante permite o deslocamento do efeito sonoro de repetição de “tristriz” n s demais pares: “mei a mei ”, “rio ri” e “silencioso sério”, como se o som da palavra fosse, nesses casos, o elo entre significantes distint s, t d s eles ap ntand para as margens d ri que esc ndem a “terceira margem” silenciosamente presente. Dessa forma, repr duz a imagem, narrada n c nt , d pai f rtalecid na sua ausência, p r an s a fi visível (sentad na can a n ri ), p rém inatingível para filh . Em relaçã à c ndensaçã , enquant “tris” c ndensa “três” e “ris” (de risca) ev cand , p rtant , a “risca terceira”, “triz” sugere limiar de “p r um triz”. Essa c ndensaçã expressa o sentimento, presente no conto, do pai que aband na a família para viver/ m rrer na can a - a vida p r um triz, expressa n risc na água. É também a água que denuncia a ausência/presença d pai. A água é lugar de uma fala que cala, e p ema marca iss na p siçã (“n ss pai nã diz, diz”) que se anuncia entre as margens d ri (“risca terceira”). ou seja, o pai se cala, mas a risca terceira da can a, sinal d seu aband n , é quem denuncia (“n ss pai nã diz, diz risca terceira”). Há um mistéri na imagem imóvel d pai na can a. P r trás d silênci e da seriedade do pai esconde-se um riso vil. Por deslocament , a imagem d pai “séri ” vista pel filh , aparece na cançã / s nh c m um ri que ri um ris l calizad n seu mei (“mei a mei ri ri”/ “P r s b a risca da can a/ ri vil vi”), u seja, ris está naquele que fica n meio do rio, em “sé-rio”, no pai. A conden-

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saçã que apr xima ris da seriedade d pai sugere efeit sádic exercid p r ele s bre a família que s fre as c nsequências d aband n vigiad . Em utr trech , há a expressã da figurabilidade d s nh - a criaçã de uma identidade perceptiva, tã vívida n psiquism que p de ser sentida: “ uvi uvi” a inaudível “v z das águas”. Ainda pela figurabilidade, “ uvi uvi” sugere uma percepçã visual e auditiva simultânea: “ uvi u vi”. A figurabilidade é mecanism que permite que a regressã se dê temp ralmente (d presente para passad , que a mesm temp rec nfigura passad ). A representar s pensament s em imagens, p ema/s nh substitui a cena infantil que demanda uma expressã , p r uma cena recente, vívida e vivida n presente d s nh . A cena infantil que nã p de ser esquecida tamp uc revivida, p de, n entant , reaparecer em s nh . É assim que “ que ninguém jamais lvida” permite pensar n registr inc nsciente que nunca se perde, e que justamente pela figurabilidade p de ser revivid n psiquism alucinat riamente (“ ri vil, vi”). N c nt , R sa (2005, p.80) explicita c m a imagem d pai na can a nã p deria jamais ser esquecida: “Nã , de n ss pai nã se p dia ter esqueciment ; e, se, p r um p uc , a gente fazia que esquecia, era só para se despertar de novo, de repente, com a memória, no passo de outros sobressaltos”. Mas é p ssível pensar, s b a ótica d pai, que utr s registr s inesquecíveis emergem das águas. Lançar-se a ri aparece c m um desl cament da temática da l ucura presente n c nt . A terceira margem é invisível, inaudível e desc nhecid . o pai, a ir à pr cura da terceira margem d ri , busca desc nhecid dentr de si mesm , a palavra que falta. Palavra essa que a água nã diz (“água da palavra / água calada pura / água da palavra / água de r sa dura”), que está presente c m ausência (“dur silênci ”), mas que a mesm temp detém a p ssibilidade de revelaçã (“pur silênci ”/ “entre as escuras duas / margens da palavra / clareira luz madura”). Nesse sentid , bserva-se a s bredeterminaçã e, mais uma vez, a c ndensaçã . N p ema (s nh ) e n c nt (rest diurn ) a água-palavra é lugar da ausência d pai, mas também da revelaçã n sentid de n meaçã : “r sa da palavra”, nde a letra da cançã explicita, mais uma vez, a relaçã fluida entre significante e significad . A “r sa da palavra” é tant a fl r, símb l d p tencial da fertilidade, l cal da fecundaçã para a geraçã d frut , quant n me de R sa, aut r da palavra. Assim, r sa c ndensa a r sa e R sa, bem c m a relaçã p esia e pr sa, aqui pensada n diál g s nh /rest diurn e pr cess primári /pr cesso secundário. A revelaçã da água/palavra se dá na transf rmaçã da m bilidade (a palavra que escapa) em im bilidade (“asa da palavra/asa parada”), seguida da incandescência e lumin sidade (“brasa da palavra/a h ra clara”), própria da revelaçã . A “casa da palavra” é “ nde silênci m ra”. A revelaçã se dá, p rtant , n nã dit , naquil que subjaz a at d pai de nã dizer. “T ra da palavra” remete a pai, numa referência fálica à funçã de interdiçã que aparece às avessas a “t rar” a palavra, destruí-la n silênci . É a “pr a da palavra”, que t ma a frente, que anuncia, penetra e c rta a água, mas faz para silênci , numa denúncia da ausência da interdiçã . É a ausência d pai, é a palavra que v a e escapa. A “t ra” fálica “da palavra” (“ri pau en rme n ss pai”) parece c l car n s nh /cançã a realizaçã d desej d filh , p r ass ciaçã a c nt /rest diurn . Iss p rque, n c nt há element , men s explícit na cançã , d desej d filh (e da mulher d pai) pel ret rn d pai. Desej de que esse pai ausente pudesse estar falicamente p tente e cumprind sua funçã de interdiçã , tã necessária a filh e à esp sa. C ntraditória e simultaneamente, a cançã /s nh também permite pensar num desej inc nsciente d filh de que pai permanecesse l nge, na can a, para que ele própri pudesse se t rnar p tente e fálic n lugar d pai. Numa relaçã especular, a “risca terceira” é também a “risca certeira”, c m se a risca que inscreve a saída d pai na can a f sse um tir certeir que abre caminh para terceir , para filh . N c nt aparece c nflit e a culpa d filh , p ssivelmente ass ciad s a tal desej . R sa (2005, p.81) fala c m a vida da pers nagem t rna-se reclusa e sem sentid , a nã ser pel desej bstinad de entender s m tiv s da ausência d pai: “S u h mem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta culpa? Se meu pai, sempre fazend ausência: e ri -ri -ri , rio-pondo perpétuo.” É também n c nt que resgatam s c nflit edípic d desej de t mar lugar d pai e d h rr r quand tal p ssibilidade se apresenta c ncretamente. Nas palavras de R sa (2005, p.81): E falei, que me urgia, jurad e declarad , tive que ref rçar a v z: — “Pai, senh r está velh , já fez seu tant ... Ag ra, senh r vem, nã carece mais... o senh r vem, e eu, ag ra mesm , quand que seja, a ambas v ntades, eu t m seu lugar, d senh r, na can a!...” E, assim dizend , meu c raçã bateu n c mpass d mais cert . Ele me escut u. Fic u em pé. Manej u rem n’água, pr ava para cá, c nc rdad . E eu tremi, pr fund , de repente: p rque, antes, ele tinha levantad braç e feit um saudar de gest — primeir , dep is de tamanh s an s dec rrid s! E eu nã p dia... P r pav r, arrepiad s s cabel s, c rri, fugi, me tirei de lá, num pr cediment desatinad . P rquant que ele me pareceu vir: da parte de além. E est u pedind , pedind , pedind um perdã . S fri grave fri d s med s, ad eci. Sei que ninguém s ube mais dele. S u h mem, dep is desse


faliment ? S u que nã f i, que vai ficar calad . Sei que ag ra é tarde, e tem abreviar c m a vida, n s ras s d mund . Mas, entã , a men s, que, n artig da m rte, peguem em mim, e me dep sitem também numa can inha de nada, nessa água que nã para, de l ngas beiras: e, eu, ri abaix , ri a f ra, ri a dentr — ri .

A p ssibilidade de cupar lugar d pai, que gera h rr r a filh , termina p r fazer filh t mar lugar d pai, mergulhad dentr d ri , de nde t d desej parte e para nde tud retoma. Deix ri , mergulh brincadeira de palavras e ac rd d p ema/s nh c m a incerteza de quem s nh u. Se nã há um s nh n p ema de Caetan , tamp uc há um inc nsciente s nhad r n c nt de R sa, quiçá um s nh s nhad a quatr , Caetan , R sa, a pers nagem e eu... (...) Mas... Afinal, p r que nã ? P r que mesm nã ?

REFERwNCIAS FREUD, S. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Ri de Janeir : Imag , 1996. (1900). Interpretaçã d s S nh s (I), v.4., 776p. LAPLANCHE, J; PoNTALIS, J.B. Vocabulário da Psicanálise – Laplanche e Pontalis. Sã Paul : Martins F ntes, 2004, 552p. MENESES, A. B. As portas do sonho. Sã Paul : Ateliê Edit rial, 2002, 176p. RoSA, J. G. A terceira margem n ri . In: Primeiras Estórias. Ri de Janeir : Edit ra N va Fr nteira, 2005, p.77-82. VELoSo, C. A terceira margem n ri . Recuperad em 03 de març de 2010, de: http://letras.terra.c m.br/caetan -vel s /201521/

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DITADURA

FIGURAS DA RESISTwNCIA, O HOMO SACER BRASILEIRO CONTEMPORxNEO E A CONSTRUçoO DO COMUM Maria Angela Santa Cruz

Resumo Este artig ret ma, parcialmente, c ntext históric d g lpe de 1964 n Brasil, para ressaltar as interrupções de pr cess s dem cratizantes entã em curso e seus efeitos na destruição e na reconstrução de caminh s para país. P r mei da clínica c m ex-pres s p lític s e c m ad lescentes das periferias de São Paulo, procura evidenciar os efeitos tardios da ditadura em alguns dos componentes dos processos de pr duçã de subjetividade. A final, indica a c nstituição do comum c m uma direçã p ssível e desejável na produção de novos processos de subjetivação. Palavras-chave ditadura civil-militar; t rtura; clínica de ex-pres s p lític s; clínica da ad lescência; p líticas públicas; pr duçã d c mum. Maria Angela Santa Cruz é psicóloga, psicanalista, analista instituci nal, mestre em Psic l gia Clínica pela PUCSP. *Artig publicad riginalmente na Revista Percurs nº 52 an XXVI junh de 2014 - Institut Sedes Sapientiae

A meu pai

A

f rma mais c mum de se referir à ditadura n Brasil desencadeada pel g lpe militar de 1964 vinha send n meá-la c m uma ditadura militar. É intrigante, n entant que, passad s 50 an s d g lpe, quase t das as publicações, chamadas nas diferentes mídias, event s de análise e repúdi , referências s bre g lpe e s bre a ditadura têm incluíd significante civil na expressã até entã utilizada. o que se pass u nestes 50 an s que, só ag ra, p dem s c letivamente n mear a ditadura pel seu verdadeir n me – ditadura civil-militar? ou, c l cada de utra f rma a questã : que se pass u para que se excluísse, sistematicamente, da linguagem c mum a referência à ditadura brasileira c m uma ditadura desencadeada e mantida tant p r militares c m pela s ciedade civil? E quand se fala em s ciedade civil, d que exatamente estam s faland ? P rque g lpe f i exatamente c ntra a s ciedade civil, u, a men s c ntra a mai ria da p pulaçã que c meçava a entrever, n iníci d s an s 1960, a p ssibilidade de realizaçã de mudanças substantivas, estruturais nos modos de vida, de emprego, de uso da terra, de educaçã , c ntra um p v que era vist e se via c m subdesenv lvid . F i um m ment genétic na rganizaçã das p pulações rurais – as ligas camp nesas d n rdeste –, n s sindicat s de trabalhad res, na educaçã c m Paul Freire e sua genial pedag gia da vida e d desej – a Pedag gia d oprimid –, nas esc las experimentais, n s m viment s das c munidades eclesiais de base, n m viment estudantil. N C míci da Central d Brasil em 13 de març de 1964, entã presidente J ã G ulart afirma publicamente seu c mpr miss c m as ref rmas estruturais, as entã chamadas ref rmas de base – ref rma agrária, tributária, bancária, administrativa, universitária e eleit ral –, c m a m dificaçã d s padrões de pr duçã n camp , c m mudanças na c nstituiçã de 1946, afirma enfim c mpr miss c m a imensa mai ria da p pulaçã – à ép ca pred minantemente rural – que vivia em c ndições de miséria, pr p nd c m iss a ampliaçã da dem cratizaçã d s direit s. Essa C nstituiçã é antiquada, p rque legaliza uma estrutura s ci ec nômica já superada, injusta e desumana; p v quer que se amplie a dem cracia e que se p nha fim a s privilégi s de uma min ria; que a pr priedade da terra seja acessível a t d s; que a t d s seja facultad participar da vida p lítica através d v t , p dend v tar e ser v tad ; que se impeça a intervençã d p der ec nômic n s pleit s eleit rais e seja assegurada a representaçã de t das as c rrentes p líticas, sem quaisquer discriminações religi sas u ideológicas. T d s têm direit à liberdade de piniã e de manifestar também sem tem r seu pensament . É um princípi fundamental d s direit s d h mem, c ntid na Carta das Nações Unidas, e que tem s dever de assegurar a t d s s brasileir s. É apenas de lamentar que parcelas ainda p nderáveis que tiveram acess à instruçã superi r c ntinuem insensíveis, de lh s e uvid s fechad s à realidade naci nal1.

Mas f i exatamente, cada vez mais sabem s, uma min ria da s ciedade civil – a elite ec nômica brasileira – quem arquitet u g lpe, justamente p rque nã queria que seus privilégi s tivessem fim. C m diz Plíni de Arruda Sampai em entrevista a Flávi Tavares2, a própria Câmara de Deputad s era c mp sta em sua mai ria – 80% – “p r fazendeir s, u filh s de fazendeir s u genr s de fazendeir s”. N mesm d cumentári desvela-se man bra da CIA, através de um cover, Institut Brasileir de Açã Dem crática – IBAD –, que financiava campanhas de candidat s a deputad federal, estadual, g vernad res, grande imprensa, na rquestraçã da derrubada de J ã G ulart3. Articulada e sustentada pel s interesses d s EUA em manter-se c m hegemônic n lad cidental d gl b em temp s de Guerra Fria, p r um lado, e aliançada com as correntes majoritárias das Forças Armadas, multinacionais, grandes

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empresári s, latifundiári s e banqueir s brasileir s, extraiu da f rça multitudinária viva e pujante d iníci d s an s 1960 a c nfiguraçã destrutiva e m rtífera que vivem s durante l ng s 21 an s – n ss s an s de invern . Existia um senh r chamad Fidel Castr , que estava n p der em Cuba. E n Brasil, n iníci d s an s 60, existia muita c nfusã p lítica. E tínham s med de que essas c nfusões se espalhassem e virassem uma c isa contagiosa. Formou-se um grupo de empresários para poder, então, estruturar uma reação à implantaçã da república s cialista d seu Jango Goulart4.

Med d c ntági . o capitalism sempre s ube se apr priar da p tência d c ntági das multidões para utilizá-las em sua sustentaçã e expansã . Contagiantes são as primeiras páginas dos j rnais de 20 mar. 1964 (Folha de S. Paulo), que impuseram imagens impressi nantes da m bilizaçã de mei milhã de pess as reunidas na Praça da Sé, em São Paulo, momento final da Marcha da Família c m Deus, pela Liberdade. Reaçã rquestrada pelas f rças c nservad ras – deputad s, empresári s, suas mulheres, que repr duziam discurs d fantasma d c munism para as mulheres de seus empregad s – e f ram estas imagens pujantes publicadas pelo Almanaque Brasil, que entraram nas casas das famílias das classes médias brasileiras. Uma delas faz parte de meu acerv de memórias de infância/pré-ad lescência. Na capa d primeir númer pós-g lpe da Revista Seleções – a sucursal americana n s lares brasileir s p r décadas –, vibrava a f t da multidã da Marcha da Família. Seu cabeçalh dizia: Um povo que fez sua revolução. Nem G ebbels p deria imaginar um plan tão perfeito para conseguir a adesão maciça da população ao golpe, em pele de revoluçã . Enquant iss , enquant a marcha c ntra o fantasma do comunismo e em defesa dos val res cristã s, da família e da pr priedade seguia seu curso pré-programado, a operação Brother Sam5 aut rizava que a F rça Naval n rte-americana enviasse quatr navi s t rpedeiros, dois navios de escolta, uma frota de petr leir s american s e um p rta-aviões, a p rt de Sant s. Estes aguardavam sinal para entrar em açã , cas h uvesse reaçã d g vern , legalmente c nstituíd , a g lpe encabeçad pelas tr pas d General olympi M urã Filh em 31 de març de 1964, amanhecend dia 1 de abril de 19646. E aqui já p dem s pensar em um primeir efeito do golpe sobre a produção das subjetividades brasileiras: p v , mais uma vez na história d Brasil, f i feit de bjet de eng do, de manipulação, massa de manobra para a legitimação de um golpe contra si mesmo. Acabou aceitando e, de alguma forma legitimand , a men s n iníci , um regime que praticamente extinguiu as riquíssimas sendas abertas no campo da educação, da saúde, da

p litizaçã , d caldeirã s cial de pr duçã de uma lógica de cidadania que só v ltaria a cenári brasileir c m a chamada c nstituiçã cidadã de 1988 – 24 an s dep is. E que ac ntece c m um p v que é sistematicamente c l cad à margem de si mesm ? C m um p v para qual se f rja uma inc nsciência ativa de suas determinações p lític -existenciais, pr duzind uma v luntária servidã ? C m um p v para qual se c nstruíram n v s e “terríveis” inimig s, riund s de seu própri sei ?

“[...] a demonização e criminalização dos jovens de periferia os colocam como os novos inimigos sociais, alguns dos atuais homines sacri brasileiros, vidas matáveis

originári s de diferentes segment s e classes s ciais – trabalhad res rurais, perári s, estudantes, pr fissi nais, intelectuais, p lític s, artistas –, c mp nd uma diversidade de f rmas de encarnar a resistência à ditadura, esses c mbatentes f ram aprisi nad s nas categ rias de subversivos, ou terroristas, transformados no homo sacer7 brasileir . ou seja, pess as matáveis nã por uma decisão plebiscitária, coletiva, mas por uma construção ativa, insidiosa e sistemática feita habilmente pel s d n s da “b a c nsciência” ass ciad s à grande imprensa, a partir da D utrina de Segurança Naci nal, imp rtada d s EUA, e que previa a eliminaçã de qualquer um que pudesse causar c nflit s u dissidências em uma s ciedade que se pretendia harm nicamente funci nal dentr de um estad liberal, harm nia garantida p r fuzis e paus de arara8.

Figuras da resistência D s an s de 1990 até mead s d s an s 2000, tive a h nra de fazer parte da Equipe Clínic -Grupal d Grup T rtura Nunca Mais/RJ. Atendia em Sã Paul ex-pres s p lític s e familiares, atendiment s financiad s pela C munidade Eur peia e pela oNU, a partir de pr jet s elab rad s pel GTNM/RJ. os efeit s desse trabalh ainda h je estã presentes em minha prática clínica de cada dia. É sempre necessári lembrar quant a t rtura p de ser devastad ra na vida, n c rp , na “alma” de uma pess a. E, talvez, primeir at analític desenl uqueced r para aqueles que s breviveram à t rtura tenha sid p der ferecer um espaç -temp de escuta e cuidad , bancad p r uma ass ciaçã de rec nheciment internaci nal – primeir pass para a saída da clausura asfixiante da c ndiçã de s brevivente naquele m ment . Ter as c ndições s ci p líticas de fazer um rec nheciment c letiv explícit de seu val r c m c mbatente, através d pagament de um pr cess psicanalític , fazia entã efeit p st a desmentid d trauma ferenczian : ac lhiment d traumátic tem a p tência de perar iníci de uma inclusã necessária de um vivid da rdem d h rr r; nessa peraçã , desperta-se t da a f rça viva de se saber participante de um m viment de resistência a t talitarism 9. Dentre s percurs s analític s que pude ac mpanhar, g staria de ressaltar um pr cess subjetiv daqueles que s breviveram à t rtura. Saídas da casa d s h rr res, a vivência de aniquilament subjetiv fazia c m que essas pess as vagassem pel mund tal qual almas penadas – nem viv s, nem m rt s. Tal c ndiçã era ainda mais intensificada pel estranh pact de silênci que parecia haver, inclusive entre marid e mulher, entre pais e filh s, entre c mpanheir s, s bre a vi lência da experiência da t rtura. Junte-se a iss fat de que muit s que saíram viv s d s p rões da ditadura enc ntravam-se c m um pan rama des lad r: a n tícia de amig s e c mpanheir s m rt s pela repressã , partid s dizimad s, m viment de resistência paralisad . À medida que se c nseguia ret mar alguma c isa que pudesse se assemelhar a uma vida – trabalh , amizades, relações familiares, dificilmente lazer – a vivência n mundo dos homens comuns parecia ser ainda mais estranha. o que p deria haver de c mum entre um s brevivente da t rtura e a mai ria da p pulaçã brasileira que p uc a p uc ia se esquecendo de que vivia s b uma ditadura? A emergência de n v s m viment s de resistência a partir de mead s da década de 1970, ganhand f rça e expressã naci nais na década de 1980, certamente pr pici u uma mudança subjetiva e a p ssibilidade de c nstruçã de n v s territóri s, afetad s que f m s pel n v camp de f rças que se c mpunha. M ment genétic , a atualizaçã das f rças de resistência se fez em vári s camp s: m viment pela Anistia, m viment pela Ref rma Sanitária – que culmin u n SUS –, m viment pela Ref rma Psiquiátrica – que culmin u nas atuais P líticas de Saúde Mental antimanic miais, c ns lidadas em p líticas de Estad –, s m viment s sindicais – que resultaram na c nstruçã d PT. T d s estes engr ssaram e c nfluíram n m viment pelas eleições diretas – M viment das Diretas Já! – incluind uma pluralidade de at res s ciais e pr duzind n vas m dulações subjetivas. Ainda assim, ainda que um

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cert entusiasm tivesse c l rid h riz nte, a vivência psíquica de is lament e de um profundo desalento perdurava em muitos desses s breviventes. À ép ca c nstruí a imagem de uma b lha, c m se cada um tivesse sid enclausurad em um tip de b lha específic , c m c nt rn s e características próprias, mas t das estampand mesm certificad de fabricação: o poder soberano do regime de exceçã transf rmand a vida em vida nua – z é –, vida matável10, a bi p lítica radicalizada em tanat p lítica11. Corpo objeto da crueldade do mal, legitimado pela banalidade do mal12 – cumpriment de rdens13. A irrupçã d real da d r, sem intermediações, a máxima imp tência e desampar diss lvend s c nt rn s subjetiv s, pr duziu diferentes efeit s e estratégias de resistência psíquica para p der s breviver; a partir daí, n entanto, é como se a vida entrasse em um constante estad de t rp r níric , de pesadel . C m ret mar a vida viva? A vida de vigília c mpartilhada e c mpartilhável? R mper pact de silênci , transf rmar a culpa e a verg nha de ter s brevivid enquant tantos outros foram mortos ou “desaparecidos” f ram alguns d s desafi s que teceram s pr cess s das análises que pude ac mpanhar. Existe um irredutível desse traumátic vi lent , n entant , que s bra. Talvez seja imp ssível nã s brar. o que resta pr cessar? E c m se faria esse pr cessament ?

O homo sacer atual da “democracia” brasileira Ainda que a c nstituiçã de 1988, c nquista fundamental n pr cess de dem cratizaçã d Brasil, tenha vind para substituir a lógica dos privilégios, propondo outra lógica para a s ciedade brasileira – a lógica d s direit s –, passad s 50 an s d g lpe militar e 29 da reinstauração do regime democrático, sabemos quã distante estam s de um funci nament jurídic , p lític , ec nômic e s cial anc rad nas diretrizes d s direit s de cidadania. o estad de exceçã 14 c ntinua existind para grande parte da população brasileira, particularmente para a população jovem das periferias, principalmente negra. Segundo dad s d Mapa da vi lência15, as maiores taxas de h micídi sã enc ntradas na p pulaçã j vem e negra: de 2002 a 2012 há um cresciment de 32,4% de j vens negr s assassinad s, enquant a taxa de h micídi entre s j vens branc s cai 32,3%. Vi lência seletiva. Assim c m seletiva f i a vi lência sistemática praticada n s manicômi s. O Holocausto brasileiro denuncia16 a morte de pel men s 60 mil pess as a l ng d sécul XX n h spíci de Barbacena, gen cídi c metid pel Estad Brasileir de pess as internadas à f rça, c m u sem históric de transt rn s psiquiátric s – “epiléptic s, alc ólatras, h m ssexuais, pr stitutas, meninas

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grávidas pel s patrões, mulheres c nfinadas pel s marid s, m ças que haviam perdid a virgindade antes do casamento”17.

“Como tantos outros jovens das classes populares, busca

reconhecimento e valorização através da roupa e adereços de marca. [...] se diverte dando seus rolezinhos de moto. Pilotar uma moto provavelmente lhes traga uma sensação de potência, tão minada por sua condição de excluídos. Impotência e onipotência: gangorra subjetiva que os colocam em muitas situações limite.

Seletiva também c ntinua send a vi lência praticada nas prisões, nas unidades de internação de jovens infratores, com todo o know-how s bre t rturas herdad da ditadura civil-militar. Afinal, n ssa P lícia Militar, criada n s temp s da ditadura, c ntinua funci nand na lógica da D utrina da Segurança Naci nal, defendend Estad c ntra qualquer cidadã que seja identificad p r ela c m inimigo. o critéri de seleçã : a vi lência é c metida maj ritariamente c ntra a p pulaçã p bre, sem poder contratual, como diria Basaglia18. Mas talvez uma das f rmas de vi lência mais efetiva, p rque mais insidi sa, mais uma herança da ditadura civil-militar, vem send gen cídi sistemátic praticad c ntra pensament , prática exercida tant n s mei s de c municaçã de massa hegemônic s c m nas esc las públicas. o g lpe de 64 f i um dur g lpe também para um m viment p r uma educaçã pública, universal, de qualidade teórica, ética e p lítica. C mparad a muit s países latin -american s, n ss p v é um d s mais desp litizad s. ou seja, h uve, a partir d g lpe, um investiment ativ na manutençã de um padrã ínfim de esc larizaçã desp litizante de n ss p v , investiment este que ainda nã se reverteu nestes an s de dem cracia. Em Sã Paul , esse quadr é trágic . Carl s19 é um jovem da periferia de São Paulo, negro, que, assim c m muit s que chegam a serviç da Clínica d Sedes20, não sabe ler nem escrever a s 17 an s de idade, tend cursad a esc la regular, pública, durante t d s s an s de esc larizaçã . Espert , c nsegue driblar publicamente sua pr funda verg nha de ser analfabet . C m tant s utr s j vens, principalmente das classes p pulares, busca rec nheciment e val rizaçã através da r upa e adereç s de marca. C m tant s utr s j vens, se diverte dando seus rolezinhos de moto em seu bairro. Prática comum entre os jovens da periferia, pilotar uma m t pr vavelmente lhes traga uma sensaçã de p tência, tã minada p r sua c ndiçã de excluíd s d s direit s básic s de cidadania. Imp tência e nip tência: gang rra subjetiva que c l ca em muitas situações limite, material de trabalh em seu pr cess terapêutic em grupo de adolescentes. Mas Carlos tem vontade de aprender. Carlos tem vontade de sair de sua c ndiçã enverg nhada e d l r samente dependente. Dep is de uma articulaçã c m recurs s intern s e extern s à Clínica, na perspectiva da Clínica Ampliada, Carl s pôde c nquistar a c mpetência para a leitura. Mas sua trajetória ad lescente, assim c m de tant s utr s, f i marcada p r d is episódi s de vi lência p licial: em ab rdagem na rua, f i barbaramente espancad pel s p liciais. S breviveu p r milagre. Na segunda vez, c nduzid a uma unidade da Fundação Casa, foi aconselhado pelo staff jurídic de plantã a admitir sup st delit que teria c metid – quebrar vidr de um carr – c m argument de que assim ele p deria ser liberad n mesm dia; cas c ntrári , teria que passar 15 dias na Fundaçã até que juiz desse um parecer. Saiu s b LA – Liberdade Assistida – que vem send usada p r p liciais c m senha para a c ntinuidade da teia perversa de vi lência em que tant s j vens acabam enredad s. C m mais uma estratégia clínica, na perspectiva da Clínica ampliada, c nseguim s um enc ntr c m uma defens ra pública, que c nfirm u essas práticas jurídic -p liciais c ntra s j vens de periferia. Mas nem mesm ela, já tristemente habituada c m essa trama da vi lência, pôde dar um encaminhament mais alentad r para a situaçã . Desampar civil alimentando o desamparo subjetivo. E a s ciedade diante desse quadr pervers ? Luiz, também negr , utr j vem atendid pel NURAAJ21, desenh u a p siçã em que a s ciedade c l ca s j vens de periferia: n cant superi r direit de uma f lha, desenha um tribunal nomeado como os bons; n cant inferi r esquerd , desenha uma sepultura; n centr da f lha, desenha a si mesm de chifres, arma na cintura, ded médi em riste; entre ele e os bons, um traço indicando 20 km de distância. Esta vem send uma c nstruçã s cial de décadas: a dem nizaçã e criminalizaçã dos jovens de periferia os colocam como os novos inimigos sociais, alguns dos atuais homines sacri brasileir s, vidas matáveis. Afinal, c m disse sem nenhum pud r uma mulher de classe média alta, em uma situaçã s cial c tidiana, em 2013, à ép ca da sup sta segunda nda de ataques d PCC em Sã Paul : “Dizem que para cada p licial m rt , a p lícia mata 10 bandidos. Devia matar 20!”


Como parecem ser matáveis também, em lento processo de dessubjetivação e reconstrução de subjetividades assujeitadas, desp tencializadas, idi tizadas, as vidas de tant s que Estad , desde a ditadura, c nfin u n s manicômi s – p der s beran em suas diferentes formas. Apesar do vigoros m viment pela Ref rma Psiquiátrica, em curs desde mead s da década de 1970, que c nseguiu fechar manicômi s e pr p r c m p lítica pública de saúde mental uma rede de serviços substitutiva, de base territorial, ainda neste an de 2014 esta utra f rma de vi lência seletiva c ntinua determinand s destin s de tant s sujeit s e de suas famílias. João22, um dentre cinc filh s de uma família de baixa renda, sem diagnóstic , f i internad n H spital Vera Cruz de S r caba a s 14 an s de idade, em 1981, ainda n s an s da ditadura. Vítima de err s médic s sucessiv s desde quand era bebê, J ã ficara c m sequelas m t ras, p ssivelmente c gnitivas, e mais resistente à bediência. Em busca de um tratament para seu filh , a mãe de J ã interna nesse H spital, p r rientaçã d staff da entã FEBEM23, onde fora procurar ajuda. Em t d temp em que fic u internad – 33 an s! – sua família visitava e insistia em trazê-l de v lta. A t d s esses pedid s, quand conseguiam falar com o médico responsável – únic pr fissi nal c m p der de lhe dar alta – recebiam a mesma resp sta: que melh r lugar para ele era n h spital, nde teria tratament , e que ele nã teria c ndiçã de c nvívi familiar. Tratament ? Medicaçã de c ntençã , quand ficava agitado. Perdendo pr gressivamente a saúde, s dentes, hábit s de higiene pess al, p uc de lucidez que talvez tivesse, J ã m rre n h spital, de causas nã esclarecidas, a s 47 an s de idade, em janeir de 201424! Com tanto tempo internad – praticamente t da sua vida – nã teve temp de se beneficiar da recente intervenção feita pelo Ministério da Saúde neste que, c m tant s utr s h spitais quase inexpugnáveis da região de Sorocaba, continuam alimentand a chamada “indústria da l ucura”25. o que rest u para a família? A im bilidade e a imp tência da culpa privatizada. Exceçã feita a um de seus membros, de outra geraçã , que c m a persistência e bstinaçã d s resistentes enfrentou esse lento “assassinato legalizad ” c m as armas pr ibidas e c ibidas pela ditadura: pensament , acess à inf rmaçã e à cultura, e a fala. Carl s, Luiz e J ã . Diferentes casos de razões públicas pr dut ras de s friment s privados, parafraseando Jurandir Freire Costa26. C nfigurações subjetivas nã diretamente herdeiras d s efeit s da ditadura, mas herdeiras d que a ditadura n s leg u: adiament , a m r sidade e as dificuldades p líticas, ec nômicas, s ciais, culturais, subjetivas, da c nstruçã de um país que garanta s direit s de cidadania básicos para seu povo, através de instituições dem cráticas. C m afirma Plíni

de Arruda Sampai em sua entrevista para imperdível d cumentári “o dia que dur u 21 an s”: “o país, n s an s 60, t ma c nsciência da necessidade de dar um pass , um pass na direçã da dem cracia e da naçã ” (transcriçã livre). A truculência d impediment desse pass , feita pela ditadura, adi u exercíci de n ss caminhar autôn m .

“nossa Polícia Militar, criada nos tempos da ditadura, continua

funcionando na lógica da Doutrina da Segurança Nacional, defendendo o Estado contra qualquer cidadão que seja identificado por ela como inimigo. O critério de seleção: a violência é cometida majoritariamente contra a população pobre, sem poder contratual, como diria Basaglia.

Mas engana-se quem pensa que s efeit s da ditadura civil-militar m delaram apenas as subjetividades d s dit s excluíd s, u d s chamad s inimigos d Estad de ntem – s subversiv s, s terr ristas – u de h je – s j vens das periferias, s chamad s delinquentes ou, mais recentemente, vândalos pela mídia. Na prática clínica, seja de c nsultóri , seja na clínica dita instituci nal, há um fenômen rec rrente que se presentifica a cada recepçã de pais que buscam psic terapia para seus filh s – crianças u ad lescentes: a frequência c m que deparam s nã c m um pedid de ajuda para um p ssível s friment psíquic , subjetiv , mas c m um pedid de conserto, de normalização e c nsequente ret mada d c ntr le da vida d s filh s pel s pais u resp nsáveis. Certamente este nã é um fenômen exclusivamente brasileir . Afinal, F ucault há temp s indic u c m as s ciedades cidentais m dernas peram através de um regime específic de p der – p der disciplinar e bi p der – em que é a própria vida que entr u nas equações d p der. Nesse n v regime, articulad s s b a designaçã de bi p lítica, t das as chamadas ciências da vida e as ciências humanas sã c nv cadas a serem instrument s de n rmalizaçã s cial. o fenômen da medicalizaçã s cial – a reduçã de questões c mplexas a um pr blema médic – nessa perspectiva, nã é n v . Vem c nstruind n vas e mais eficientes estratégias de c ntr le na c nfiguraçã c ntemp rânea da s ciedade c m S ciedade de C ntr le, estratégia de p der que seria, segund Deleuze27, a intensificaçã das estratégias das s ciedades disciplinares. A Psic l gia e a Psicanálise nã sã exceçã . A nós é, frequentemente, endereçado um pedido de adaptação, coerente com nosso mandato social de guardiães da ordem28. E é aqui que se c l ca vig r samente em questã n ssas pções clínic -étic -p líticas. A quem resp ndem s? A que resp ndem s? Para que resp ndem s quê? E que há de c mum também, nesses pedid s, é lugar cupad p r essas crianças e ad lescentes, principalmente d sex masculin , na dinâmica familiar, principalmente na ec n mia desejante materna: filh -fal , na melh r tradiçã freudiana. Junte-se a iss , e talvez parte d mesm tip de c nfiguraçã edipiana, a desaut rizaçã d pai, sua desval rizaçã , seu enfraqueciment pela figura materna e terem s aí um quadr bastante c mum e pre cupante: mulheres-mães tiranas, pais imp tentes, filh s agitad s c m estratégia de lidar c m a angústia que lhes s bra, sem referências de identificaçã c nfiáveis. Ainda que esta c nfiguraçã atravesse as diferentes classes s ciais, sua presentificaçã nas famílias de classe média alta é particularmente perturbad ra. N ssa hipótese é que, uma vez desinvestid espaç públic , espaç em que habitam as questões d c mum – questões de cidadania, de m bilidade urbana, da educação pública, da vida das crianças e dos jovens, da saúde pública, da cidade, da pr duçã desejante c mum – restringind -se e c nfinand as vidas a um m d de viver individualista e is lad , enclausura-se a vida de tal f rma que s bram p uc s bjet s de investiment libidinal n h riz nte d vivível. Freud também já n s indicara esse caminh da pulsi nalidade humana: a pulsã é c ntingente, e vai fazer c nexões a depender d s bjet s fertad s p r esta u aquela cultura, u, spin sianamente faland , a depender das afecções dos encontros de corpos. outr tip de b lha. Desta vez c m certificad de fabricaçã d s mur s d c nd míni u d sh pping center. Há p uc mund . Falta mund , tant para s ad lescentes c m para suas famílias. Um ad lescente de um de n ss s grup s terapêutic s, de classe média, perguntava curi s a seu c lega de grup , de classe p pular: “o que é uma van?” De uma p siçã quase inversa na cart grafia da cidade, uma ad lescente de utr grup dizia c m a cidade aparecia diferente a depender da p siçã desde a qual se a lhava: através d s vidr s d carr era uma cidade, através d s vidr s d ônibus era utra. Mas, para abrir-se para c mum, deixar-se afetar pel c mum, deixar-se c ntagiar e assim partilhar da p tência c nstituinte da multidã 29, há que se r mper c m a lógica tã arraigada em n ssa s ciedade brasileira que é a lógica das pess as, d s medalhões, d “v cê sabe c m quem está faland ?”30.

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E este p de ser um d s vári s aprendizad s p ssíveis c m a experiência d s m viment s de junh de 2013. Ac mpanhand Pelbart em seu belíssim artig na Folha de S. Paulo de 19 jul. 201331, Peter argutamente entendeu que só uma resp sta c m a de odisseu p de n s tirar a t d s da caverna d cícl pe, da b lha. À pergunta s bre a identidade de uma integrante d M viment Passe Livre, esta teria resp ndid : “An ta aí, eu s u ninguém”. Resp sta que c nfirma, segund Pelbart, “a imp rtância de uma certa dessubjetivaçã para exercíci c ntemp râne da p lítica”, na esteira da afirmaçã de Agamben de que “ s p deres nã sabem que fazer c m a singularidade qualquer”. E para fantasma d c munism , aquele mesm que atras u em 21 an s a c nstruçã d s caminh s deste país, as palavras de Peter Pál Pelbart p dem servir c m búss la e c m intervençã : T rnar cada vez mais c mum que é c mum – utr ra chamaram iss de c munism . Um c munism d desej . A expressã s a h je c m um atentad a pud r. Mas é a expr priaçã d c mum pel s mecanism s de p der que ataca e depaupera capilarmente aquil que é a f nte e a matéria mesma d c ntemp râne – a vida (em) c mum32.

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NOTAS: 1 Presidente J ã G ulart, discurs n C míci da Central d Brasil em 13 mar. 1964. 2 C. Tavares, O dia que durou 21 anos - Documentário 3 C. Tavares, op. Cit. 4 Peter V s, d c nsulad d s EUA – fragment d depoimento para o Documentário Cidadão Boilensen. A citaçã f i extraída de sin pse de Flávia Santana. 5 C. Tavares, op. Cit. 6 C. Tavares, op. Cit. 7 Na esteira das pesquisas e f rmulações de F ucault s bre as tecnologias de poder nas sociedades disciplinares m dernas, sintetizadas n c nceit de bi p lítica, Gi rgi Agamben resgata c nceit de h m sacer d direit r man arcaic : vida matável e nã sacrificável. N livr o p der s beran e a vida nua I, p. 196, Agamben pr blematiza de m d a fazer emergir sua rigem histórica c m p nt de incidência d p der s beran , c m vida nua, z é, afirmand que a vida já fizera sua entrada n p lític a partir mesmo do surgimento do poder soberano, em seu caráter de exceçã . Dessa f rma, além de assumir a tese f ucaultina s bre a entrada d bi s nas equações d p der – que inauguraria p der disciplinar c m característic das s ciedades cidentais m dernas – Agamben reafirma as teses f ucaultinas da c existência d p der s beran e d p der disciplinar na m dernidade. N entant , radicaliza tais teses, afirmand que estad de exceçã , e c m ele p der s beran , d s quais camp de c ncentraçã seria paradigma, estariam em uma íntima s lidariedade c m a dem cracia (p. 17). o cas brasileir faz chegar a par xism a c existência das fórmulas f ucaultianas – Fazer viver u deixar m rrer (s ciedades disciplinares) e Fazer m rrer u deixar viver (s ciedades de s berania), c m verem s a seguir. “H mem sacr é, p rtant , aquele que p v julg u p r um delit ; e nã é lícit sacrificá-l , mas quem mata nã será c ndenad p r h micídi ; na verdade, na primeira lei tribunícia se adverte que ‘se alguém matar aquele que p r plebiscit é sacr , nã será c ndenad h micida’. Diss advém que um h mem malvad u impur c stuma ser chamad sacr .” (p. 186). 8 Para um melh r entendiment desta D utrina, c nsultar Bl g d Emir, disp nível em: <http://www.cartamai r. c m.br/?/Bl g/ Bl g-d -Emir/o-g lpe-n -Brasil-e-a-d utrina-de-seguranca-naci nal/2/27107>. 9 Nesse sentid , pr jet Clínicas d Testemunh , d Ministéri da Justiça, já tem a seu fav r fat de ser Estad brasileir quem faz um rec nheciment públic da vi lência perpetrada pel própri Estad c ntra seus cidadã s guerreir s, s filh s que nã f gem à luta. Através da pr p sta de criação de espaços coletivos de circulação e de elaboração de um traumátic pr duzid p r f rças de rdem p lítica, faz-se um investiment ativ e um rec nheciment de um s friment que nã p de ser vivid privadamente. 10 G. Agamben, op. cit. 11 G. Agamben, op. cit. 12 H. Arendt apud J. F. C sta, “Psiquiatria bur crática: duas u três c isas que sei dela”, in Clínica d S cial – Ensai s. 13 Em declaraçã prestada à C missã Naci nal da Verdade, tal c m Eichman, Paul Malhães se rgulha em dizer: “Ach que cumpri meu dever”. E, ainda, em resp sta à pergunta d entrevistad r J sé Carl s Dias s bre númer de pess as que teria matad , Paul Malhães resp nde: “Tantas quantas f ram necessárias”. 14 G. Agamben, Estad de excepción. 15 J. J. waiselfisz, o mapa da vi lência 2014: os j vens do Brasil. 16 D. Arbex, o h l caust brasileir . 17 D. Arbex, p. cit. 18 F. Basaglia, As instituições negadas. 19 os n mes sã fictíci s. 20 Clínica Psic lógica d Institut Sedes Sapientiae. 21 nuraaj – Núcle de Referência em Atençã à Ad lescência e à Juventude da Clínica Psic lógica d Institut Sedes Sapientiae. Instituíd c m Núcle de Referência a partir de 2011, mas existind c m Pr jet de Atençã à Ad lescência e à Juventude desde 2004, estes 10 an s de trabalh clínic -instituci nal vêm send um temp fértil de criaçã , de experimentaçã e de intervençã n camp da ad lescência e da juventude, na perspectiva da clínica ampliada. 22 N me fictíci . 23 Fundaçã Estadual d Bem Estar d Men r. 24 A. Cardeal, “A v z de uma experiência: um cas de família”. 25 G. M ncau. “Indústria da l ucura impede avanç s”. Para uma melh r c mpreensã desse pr cess de privatizaçã d s h spitais psiquiátric s, que t rn u a l ucura um negóci lucrativ para s d n s de h spital, pr cess que teve seu ap geu n perí d da ditadura civil-militar, c nsultar P. Amarante, L uc s pela vida – A trajetória da Ref rma Psiquiátrica n Brasil. 26 J. F. C sta, Razões públicas, em ções privadas. 27 G. Deleuze, C nversações. 28 C. M. B. C imbra, Guardiães da ordem – uma viagem pelas práticas psi no Brasil do “Milagre”. 29 A. Negri, o P der C nstituinte – ensai s bre as alternativas da modernidade. 30 R. da Matta, Carnavais, malandr s e heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro. 31 P. P. Pelbart. “An ta aí: eu s u ninguém”. 32 P. P. Pelbart, op. cit.


CRISE DE IDENTIDADE ENSAIo

Do BRASILEIRo A MAGIA DO GOL CONTRA por Caio Garrido

história é repleta de exemplos de indivíduos e comunida“desAobcecados pelos mitos da própria etnia, da própria origem,

do próprio país, da própria identidade cultural: ideias fixas que obstam a evolução de indivíduos e comunidades e geram linguagens e simbolismos imunizados em relação ao outro. Há nostalgias mítico-regressivas que negam o outro, seu direito a viver. Todavia nessa regressão, nesse fechamento, nessa nostalgia de uma raiz imaginária, sempre há uma possibilidade de abertura, de reconhecimento do outro, de liberdade.

– Mauro Maldonato em “Passagens de tempo”.

Caio Garrido é editor geral da Revista Tavola Magazine. É psicanalista, e c rdenad r d Dept . de Literatura d Núcle Tav la. Tem três livr s publicad s; Um r mance: “Pena que f i ontem” (2010); e d is de p emas: “P emas aut -escrit s em estad de S nambul visã ” (2011) e “parapeit ” (2013, Ed. Patuá).

T

odos com os corpos besuntados de verde amarelo, loiras e louros com um arsenal de badulaques, avivand rixas, xingand seus representantes, agitand as mã s c m seus ingress s de ur e rigem duvid sa, a ritm das batucadas imaginárias e v zes em c r : “c m muit rgulh c m muit am r”. E astral lá nas alturas das grandezas em que n s projetamos. Fragmentos esparsos de um todo em crise. N camp , um infantil Brasil de pijamas, envelhecid p r um vazi de identidade. N primeir j g , g l c ntra. Um primeir g l irrepresentável, num j g que deveria ser inesquecível. Um prenúnci daquil que já c rresp ndia a n ss grit bege. Entre grit s e discurs s c nfus s, p deríam s perguntar: Existe uma crise de identidade n brasileir ? o quant esp rte e mais precisamente futeb l p dem deflagrar uma crise dessa espécie? Se lharm s para s últim s ac nteciment s c rrid s n país, desde as manifestações de junh de 2013 até a C pa d Mund de futeb l de 2014, irem s perceber algumas nuances que p dem n s fazer refletir. A rganizaçã d n ss futeb l é um espelh , um micr c sm d que é a rganizaçã p lítica e de planejament d país c m um t d . Em relaçã à C pa, a partir d respectiv e substancial fracass da seleçã d Brasil, muit se fal u que futeb l era apenas um j g , para minimizar e negar s efeit s da frustraçã da perda. Mas a partir dessa situaçã p dem s n s perguntar: o futeb l, quand dimensi nad p r um fenômen gl bal c m a C pa, p de ser c nsiderad apenas um j g ? Evidentemente que nã é apenas um j g . P dem s sim é c nsiderá-l história de uma naçã e de sua relaçã c m utr , e d c mp rtament da s ciedade em relaçã às suas dores e lutas. Paul Lins, aut r d r mance “Cidade de Deus”, em certa feita, faland s bre as favelas brasileiras e a respectiva indústria d crime e tráfic , que desde ced env lvem as crianças, afirm u s bre que acha necessári para mudar as perspectivas de vida: Arte e Cultura. Pode soar aparentemente banal ou não tão original tal resposta frente a uma realidade tão press ra, mas na verdade a afirmaçã n s traz alg sui generis; P is as resp stas n rmalmente p deriam ser utras: Educaçã , saúde... Arte e Cultura têm a ver c m m d c m n s identificam s, c m estabelecem s n ssas c nexões c m utr e c nstruím s a l ng d temp t da uma cadeia de investiment s de desej , linguagem, representações e sublimações da realidade. o futeb l sempre pôde ser c nsiderad tant um representante fidedign de n ssa cultura, como em certos momentos arte. A f rma c m futeb l trabalh u e desenv lveu determinad s aspect s de n ssa cultura na história, p de ser vist n prim r s trabalh de David Az ubel, psicanalista e escrit r já falecid , que escreveu um livr chamad “o Futeb l c m Linguagem – da Mit l gia à Psicanálise”. Neste, ele disseca a questã da transf rmaçã d prec nceit racial nesse esp rte a l ng d temp , desde seu iníci , quand nã eram aceit s negr s j gand futeb l – p is era c nsiderad um esp rte de elite – até m ment em que s negr s c nquistaram seu merecid espaç pra reinarem h je abs lut s.

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Através deste e utr s cas s, David m stra quant futeb l f i um fat r rganizad r para nossa cultura e identidade. o futeb l brasileir , desde entã , nunca perdeu seu estatut de referência em relaçã a mund , até s event s c rrid s na última C pa. A seleçã teve raça, mas c m p uquíssimas das características c m que mund sempre n s identific u. Uma derr cada acachapante sel u destin final da seleçã n t rnei , e deix u uma marca pr funda em n ss narcisism . Além desse e muit s utr s fat res, event f i marcad desde seu planejament e execuçã p r c ntradições e pr blemas de t d s s tip s, c m s val res superfaturad s na c nstruçã e ref rma de estádi s, a falta de zel c m n ss patrimôni históric cultural – estes mesm s estádi s, que deixaram de ter sua tã c nhecida identidade –, a ameaça de manifestações, e utr s. Durante a C pa, utras questões e c ntradições vieram à t na; S u aquele que xinga, agride, u aquele que permite a existência d meu rival? Sint -me identificad àquele que r uba, mas faz? Àquele que brinca, dribla, u que sabe marcar adversári ? Sint -me identificad àquele que arr ga uma imp rtância que nã tem? Que é só camisa, é só mística? S m s seres d futeb l, da magia, d drible, impr visaçã , u seres da falta de planejament e trabalh que se disfarçam n velh “jeitinh ”, na malandragem? Devem s n s espelhar n m d de ser e de trabalh d s eur peus u naquil que às vezes n s esquecem s – n ss lad sul-american ? Querem s ser cópia u tem s alg de riginal? o brasileir é sempre ser alegre, festiv , que aceita tud ? onde n ssa cultura precisa reagir para ferecer mais p rtunidades às pess as de n ssa s ciedade, para enriquecer a f rma de expressar-n s? Parece-me que tais questões sã riundas de um riginári distante, de questões reatualizadas de um temp em que n ssa cultura era baseada n desej de n ss s c l nizad res, e d s c nflit s daí gerad s. Miriam Chnaiderman, que escreveu um belíssim artig s bre a Psicanálise brasileira, em determinad m ment diz que exótic n rteia a c ncepçã de cultura naci nal. Diz ainda: “Caetan Vel s , em Verdade Tr pical, defende que nã há p r que temer ex tism ; de fat , há c queir s em n ssas praias; de fat , a mestiçagem n s caracteriza. o terrível é serm s reduzid s a iss .” Ainda n mesm artig , Miriam cita octávi de S uza, psicanalista que vem se dedicand a esses temas: “Para octávi , a rec rrência a uma identidade naci nal seria uma estratégia para lidar c m a ut pia c l nizad ra, e a pr duçã cultural brasileira teria uma tendência a ref rçar a identidade naci nal, que p de ser explicad p r um desenraiza-ment riginal, tant d h mem american em relaçã à tradiçã eur peia, quant d própri eur peu e seus descendentes”; Segund Miriam Chnaiderman, octávi S uza quer analisar pes desta herança inevitável que carregam s: fard da gênese naci nal enquant Éden. Diz ainda: “o que busca pr var é que a fantasia de um Brasil paradisíac teria levad à c nstruçã de uma identidade brasileira c m s traç s de ex tism (sensualidade, alegria, jeitinh brasileir ).” o que está em pauta atualmente é um pr fund questi nament s bre quem s m s e para nde querem s ir. Querem s ser reduzid s a ex tism e mestiçagem que n s caracteriza? ou devem s ir além? Que relaçã devem s ter c m n ssa p lítica? Preferim s individualism a trabalh em equipe? A tr c de quê querem s n s esc nder, e manter n ssa nip tência

mística em t rn d “país d futeb l”? Fugir d trabalh , necessári para se transf rmar qualquer realidade? Para Maur Mald nat , psiquiatra e filós f italian , “a história é repleta de exempl s de indivídu s e c munidades bcecad s pelos mitos da própria etnia, da própria origem, d própri país, da própria identidade cultural: ideias fixas que bstam a ev luçã de indivídu s e c munidades e geram linguagens e simb lism s imunizad s em relaçã a utr ”. Segund ele, “há n stalgias mític -regressivas que negam utr , seu direit a viver, e que, t davia, nessa regressã , nesse fechament , nessa n stalgia de uma raiz imaginária, sempre há uma p ssibilidade de abertura, de rec nheciment d utr , de liberdade.” De ac rd c m que diz a psicanalista Betty Milan em uma de suas c lunas na F lha de S. Paul : Será que a impr visaçã vale mais que planejament ? “P r saberm s improvisar ou por sermos viciados na improvisaçã ?” o us pervers de n ssa capacidade u possibilidade de improvisação pode determinar os nossos destinos negativamente. Sérgio Buarque de H landa em seu seminal livr

Dica de Livro: RA ZES Do BRASIL Aut r: Sergi Buarque de H landa

Nunca será demasiado reafirmar que Raízes do Brasil inscreve-se como uma das verdadeiras obras fundadoras da moderna historiografia e ciências sociais brasileiras. Tanto no método de análise quanto no estilo da escrita, tanto na sensibilidade para a escolha dos temas quanto na erudição exposta de forma concisa, revela-se o historiador da cultura e ensaísta crítico com talentos evidentes de grande escritor. A incapacidade secular de separarmos vida pública e vida privada, entre outros temas desta obra, ajuda a entender muito de seu atual interesse. E as novas gerações de historiadores continuam encontrando, nela, uma fonte inspiradora de inesgotável vitalidade. Todas essas qualidades reunidas fizeram deste livro, com razão, no dizer de Antonio Candido, “um clássico de nascença”.

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“Raízes d Brasil”, fala s bre a influência que as nações ibéricas tiveram na c nstruçã de n ssa identidade: “Uma digna ci sidade sempre pareceu mais excelente, e até mais n bilitante, a um b m p rtuguês, u a um espanh l, d que a luta insana pel pã de cada dia. o que amb s admiram c m ideal é uma vida de grande senh r, exclusiva de qualquer esf rç , de qualquer pre cupaçã . […] Também se c mpreende que a carência dessa m ral d trabalh se ajustasse bem a uma reduzida capacidade de rganizaçã s cial. […] P dem s dizer que de lá n s vei a f rma atual de n ssa cultura; rest f i matéria que se sujeit u mal u bem a essa forma.” Parece que pra ev luirm s, n ss sens de identidade também deve ev luir, para que n ssa cultura nã permaneça estanque, p dend abarcar qualidades, exempl s e características de utr s sem perderm s a essência da n ssa. Neste p nt , cabe destacar quant s indígenas se m straram mais ev luíd s d que s seres dit s urban s e civilizad s, muitas vezes nã tend med de inc rp rar aspect s de utras culturas sem perder características fundamentais da sua própria cultura. os recentes ac nteciment s, manifestações, e desmand s na p lítica brasileira, p r exempl , m stram um chamament para alg que nã é mais p ssível de ser ign rad . A indignaçã e insatisfaçã nã sã c m s p lític s u dirigentes, mas c m nós mesm s.

REFERwNCIAS: Az ubel Net , David. O Futebol como Linguagem – da Mitologia à Psicanálise. Funpec, Chnaiderman, Miriam. Existe uma psicanálise brasileira? Revista Percurs nº 20 – 1/1998 H landa, Sérgi Buarque de. Raízes do Brasil. Lins, Paul . (C municaçã oral durante Feira d Livr de Ribeirã Pret , 2014) Maldonato, Mauro. Passagens de tempo. Milan, Betty. A Copa e o mito do salvador. J rnal F lha de S.Paul , junh , 2014. S uza, octávi de. Fantasia de Brasil, as identificauões na busca de identidade nacional, S.P., Escuta, 1994.

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PSICANÁLISE

PENSANDo AS TELENoVELAS:

Alessandro Alves é psicanalista pel Núcle Tav la - Ribeirã Pret . Filós f , bacharel em Fil s fia c m especializaçã em Fil s fia da Educaçã , e graduand em Letras. C rdenad r d Departament de Fil s fia d Tav la.

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UM OLHAR PSICANALÍTICO por Alessandro Alves

P

ensar em televisã , l g n s remete à teledramaturgia, p pularmente c nhecida c m ‘n vela’, tã difundida e assistida diariamente p r milhões de pess as em t d Brasil. o fenômen cultural das telen velas p de ser pensad s b p nt de vista da psicanálise, p is perscruta um caminh incrível n imaginári das pess as – e imaginári é alg abs lutamente imp rtante para a c nstituiçã d “eu”. Elas (as telen velas) tem p der de estabelecer padrões de c mp rtament , ditar m das e m dism s, e influencia diretamente n psiquism , p is trabalha também camp narcísic e d desej de maneira abs lutamente singular, conseguindo estabelecer laços afetivos entre o telespectador e os personagens das tramas, devid a fat de que dramas pess ais e c nflit s vivenciad s sã experimentad s temp t d s b a vivência de um “ utr ” que aparentemente nã passa pel “eu” d sujeit , mas inc nscientemente é identificad a esse “eu”, p r trazer à t na questões vivenciadas pel indivídu em sua experiência em ci nal real. Para c rr b rar iss , basta n s determ s em vári s exempl s de at res que na vida real sã amad s u diad s, e p r vezes até agredid s, em razã de representarem determinad pers nagem. Em última instância, estam s faland de pr cess s de identificaçã , e este é apenas um vértice pel qual p dem s pensar as telen velas à luz da psicanálise. As telenovelas são uma forma de narrativa, e como “todas as narrativas tem o poder de nos apresentar mund em que vivem s de uma maneira mais u men s rganizada, mais u men s transparente – c isa, que na realidade, mund nã é –, iss permite que n s identifiquem s imaginariamente c m s sentiment s d s pers nagens da ficçã . Nesse sentid , uma ideia fictícia da nossa realidade social, transforma-se facilmente em uma visão mitológica, pois o poder da imagem é mai r que da narrativa em palavras; p r iss a telen vela passa a ser um disp sitiv mit lógic e também ide lógic .” (Maria Rita Kehl) S b essa afirmaçã , p deríam s n s deter em aspect s imp rtantes, e nã men s relevantes, s bretud , a questã mit lógica e ide lógica ligada à ideia fictícia de n ssa realidade, que tem um f rte impact s cial, mas p r ra, n ss interesse está v ltad para aspect da identificaçã e suas c nsequências para indivídu . Pensand a n ssa teledramaturgia, e visand buscar que de atrativ ela tem a ferecer, p dem s afirmar que t da telen vela pr cura fazer uma espécie de rec rte da s ciedade brasileira, usand fórmulas e c nflit s p larizad s e sempre repetitiv s, que é ver ssímil a que ac ntece n c tidian das pess as, c m am r versus ódi , herói versus bandid , etc. o que ac ntece é que essa descriçã s cial nã enfrenta na pr fundidade s pr blemas s ciais, até mesm p rque nã tem essa finalidade, p is em última instância, c mercialmente, a finalidade de t da pr duçã teledramatúrgica é entreter e nã c nduzir a reflexões s ciais, ainda que as mesmas p ssam br tar da representaçã da realidade ali traduzida ficci nalmente; elas apresentam sim, uma s ciedade mais palatável, nde s c nflit s s ciais se traduzem em c nflit s sentimentais, r mantizand de cert m d s friment individual e c letiv . É na esteira dessa apresentaçã da realidade que esse gêner faz tant sucess em mei à p pulaçã , s bretud , entre a camada mais simples, apesar de que, em term s de audiência, t das as classes s ciais gozam, pois todos identificam-se narcisicamente c m este u aquele pers nagem. Fala-se muit que as n velas trazem às pess as a p ssibilidade de discutir a própria vida, à luz da identificaçã c m s pers nagens e situações da trama. o sens c mum p de querer c nsiderar essa discussã , dand a ela um efeit terapêutic , p is assim c m em uma análise (psicanalítica), há um discurs frente à vida e s bre a vida. Nada mais errône , p is discurs analític nã bedece a uma prévia representabilidade d s sign s linguístic s d s quais ele se serve, nem de uma raci nalidade cartesiana; ele é da rdem d Inc nsciente, p rtant , nã há c m imprimir um caráter terapêutic a uma representaçã d que vivem s, e é s mente iss que uma telen vela faz, que nã a exime de n s implicar psiquicamente s b alguns aspect s, de m d que psiquicamente, as n velas p dem desempenhar duas funções n psiquism das pess as: elab raçã e alienaçã . o que iss quer dizer? Quer dizer que a retratar dramas individuais de maneira ficci nal, as narrativas ajudam a t rnar s friment pess al mais sup rtável, p rque t rna men s s litári (elab raçã ). Nesse


sentid , t da e qualquer narrativa tem p der de aplacar a angústia. A questã é que entender s friment a partir da ficçã também é uma f rma de alienaçã d sujeit , p rque este transfere para pers nagem identificad na trama, uma p ssibilidade de resp sta para aquil que é vivenciad pel indivídu em sua vida real; nada mais alienante. As n velas ainda influenciam de maneira abissal m d de vida das pess as, p is trabalha t d um camp ligad a desej , que faz c m que sujeit , pela via da identificaçã c m s pers nagens, passe a querer ter que s mesm s têm, u ainda, e de m d mais grave, a ser que eles sã , p dend pr duzir, inclusive, efeit s pat lógic s. Nesse sentid , as pess as passam a trabalhar psiquicamente na direçã de tentarem preencher um cert “burac narcísic ”. Percebam c m um simples entreteniment p de mexer c m as estruturas d eu. Nã p dem s c nceber eu sem imaginári , já n s dizia Lacan, p is este é de suma imp rtância para indivídu . A c mpreensã de que ser human é c nstituíd pela falta e é esse sujeit faltante que faz desejar e estar m tivad para viver, é c ndiçã sine qua non para uma b a f rmaçã psíquica. Entender a lógica de um desej que é c ntemplad brevemente e que é unicamente da ordem do imaginário, como o é no caso das telenovelas, onde através da identificaçã c m algum pers nagem telespectad r passa a ter uma vivência fictícia e prazer sa p r alguns instantes e a t ma c m verdadeira, é uma questã a ser resp ndida. Para dar uma resp sta a esta questã , precisam s c ntemplar alguns aspect s históric s da teledramaturgia brasileira, e é b m que saibam s c m esse gêner , tã p pular n Brasil, se s lidific u e cupa h je, lugar de uma das teledramaturgias de melh r qualidade em t d mund . Em 21 de dezembr de 2014, a teledramaturgia brasileira c mplet u 63 an s, a c ntar c m a n vela “Sua Vida Me Pertence”, de Walter F ster, transmitida pela extinta TV Tupi de Sã Paul , inaugurada em 1950, de pr priedade d Sr. Assis Chateaubriand. Esta n vela fic u n ar de 21 de dezembr de 1951 a 15 de fevereir de 1952, c ntand c m apenas 20 capítul s de duraçã de apr ximadamente 15 minut s. Naquela ép ca, nã havia ainda víde tape, de m d que a n vela f i exibida a viv duas vezes p r semana. Apenas em 1963 que tivem s uma n vela diária chamada “2-5499 ocupad ”, de Dulce Santucci, transmitida pela TV Excelsi r. Este fenômen cultural que é a telen vela, só teve seu primeir grande sucess de audiência em 1964, c m a n vela “o Direit de Nascer”, exibida pela TV Tupi. F i a partir desta pr duçã , e graças à audiência, que se inaugur u n Brasil a pr duçã sistemática de n velas, que ainda h je, faz c m que milhares de pess as parem suas atividades e reclinem-se em suas p ltr nas para ac mpanhar as tramas ali escritas e dramatizadas. A s p uc s s enred s f ram se p pularizand , linguajar f i se apr ximand da grande massa, e histórias d c tidian de um trabalhad r em sua luta diária pel própri sustent , e pers nagens ric s e glam ur s s vivend na stentaçã , f ram se mescland a histórias de am r. Essa f i a fórmula, que ainda h je persiste, salv algum tema n v u inusitad . A primeira n vela que deu essa guinada f i “Bet R ckfeller”, de Bráuli Pedr s , exibida pela TV Tupi entre 1968 e 1969; tratava da realidade brasileira, c m uma linguagem mais c l quial. Este breve percurs históric já n s indica que há sempre uma intenci nalidade na pr duçã de uma n vela, que visa sempre a audiência, e esta só é adquirida quand atinge que as pess as desejam, e a l ng d s an s, f i iss que aut res, escrit res e diret res se esf rçaram em desc brir. Perc rrend um p uc desta história, p dem s n s perguntar: que leva uma pess a ac mpanhar assiduamente várias n velas, reservand um temp de sua vida, se de algum m d , s enred s sã quase ritualístic s, se repetem apenas c m r upagens diferentes? Para se chegar a essa resp sta, precisam s antes, resp nder a uma questã primária: o que é uma n vela? De m d geral, p dem s dizer que uma n vela é um pr dut capaz de atingir imaginári c letiv de um p v e f mentar uma cadeia de representações. Ela é a certeza de uma ilusã bem c nstruída, capaz de f mentar, dentr dessa relaçã imaginária, uma entrega d espectad r, de m d a pr duzir efeit s, inclusive sentimentais, c m s pers nagens que ele se identific u na trama. P dem s dizer que telespectad r se aliena a pers nagem que mais atrai, send a causa de sua alienaçã uma identificaçã bem definida. Um aspect que deve ser levad em c nsideraçã n t cante a desej e a narcisism que as n velas implicam n sujeit , é que a pr m ver um espelhament pela via da identificaçã c m determinad s pers nagens, telespectad r passa a apr priar-se p r vezes, de uma mai r percepçã de sua c ndiçã de excluíd , p is apel a c nsum e a m d de vida da ficçã , é inc mpatível c m a realidade c tidiana, p is se f ssem exatamente iguais a que as pess as experimentam em seu dia a dia, nã causariam a demanda da falta, e esta nã incitaria desej , de m d a nã se t rnar atrativa. S b este aspect , uma n vela faz sucess p rque pr m ve a falta de alg em alguém que já vive s b a égide de uma ausência in minável. Do ponto de vista social, e vale citar, esta medida de se pensar o sujeito pelo seu poder de c mpra, imp ssibilita n vas f rmas de s ciabilizaçã , de c nstruções s lidárias, e pr m vem sentiment s de inferi ridade. Tud iss p st a alguém c m um Eg frágil, p r exempl , p de trazer sérias c nsequências, inclus aument da angústia, testand temp t d a capacidade que indivídu tem de t lerar as frustrações imp stas pela nã realizaçã de seus desej s. As n velas n s implicam psiquicamente, p rque sempre trazem temas ligad s às lembranças, às rec rdações, à sexualidade e a questões afetivas, dand ensej à ativaçã das dimensões d

sujeit , que quand ativadas, atualizam-se e pr m vem as identificações. Elas alimentam imaginári de uma vida que nã c rresp nde àquela vivida pel telespectad r, nde s friment é p r vezes da rdem d insup rtável. Percebem s, p rtant , que mais que um entretenimento, uma telenovela, pelo poder imagétic e das identificações que ela pr m ve, afeta diretamente t da uma massa, que de alguma maneira, busca refúgi na ficçã para vivenciar aquil que g staria de ter sid , de ser; u de repudiar, via pr jeçã , aquil que ab minam em si, que explica as relações de am r e ódi que s pers nagens causam n s telespectadores. Uma novela nunca é só uma novela para quem assiste, nã s b p nt de vista psíquic . Nada que n s atravessa é tã in cente e in fensivo, sempre somos implicados de alguma f rma, e é c m esse lhar que um analista bserva t d e qualquer fenômen , seja cultural, s cial, p lític u religi s . S m s seres de implicaçã . o que fazer c m iss ? Implicar-n s. REFERwNCIAS LACAN, J. (1998) Escrit s in: “O estágio do espelho como formador da funuão do eu”. Tradução Vera Ribeir , Ri de Janeir : J rge Zahar, 1998 ZIMERMAN, D. Fundamentos Psicanalíticos: teoria, técnica e clínica – uma abordagem didática. Porto Alegre: Artmed, 1999 KAUFMANN, Pierre. Dicionário Enciclopédico de Psicanálise – O Legado de Freud e Lacan. Rio de Janeir : J rge Zahar, 1996

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CINEMA

SoBRE o ATUAL CINEMA BRASILEIRo ALGO DE ANTONIONI EM PRAIA DO FUTURO Por José Geraldo Couto

José Geraldo Couto é crític de cinema, j rnalista e tradutor. Trabalh u durante mais de vinte an s na Folha de S. Paulo e três na revista Set. Publicou, entre outros livros, André Breton (Brasiliense), Brasil: Anos 60 (Ática) e Futebol brasileiro hoje (Publif lha). Participou com artigos e ensaios dos livros O cinema dos anos 80 (Brasiliense), Folha conta 100 anos de cinema (Imag ) e Os filmes que sonhamos (Lume), entre outros. * Texto autorizado para publicauão por José Geraldo Couto, e publicado originalmente no blog do IMS (Instituto Moreira Salles). - http://www.blogdoims. com.br/ http:// utraspalavras.net/p sts/alg -de-ant ni ni-em-praia-d -futur /

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Tensão entre potência e vulnerabilidade, perambulação angustiada dos personagens e uso do espaço físico como elemento dramático tornam filme de Karim Aïnouz indispensável

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uant melh r filme, quant “mais cinemat gráfic ” ele f r, mais vã será a tentativa de reduzi-l a uma sin pse. Tentar traduzir em palavras um Blow-up ou um Terra em transe é c m pretender repr duzir c m uma caneta Bic uma tela de Le nard , u dar c nta de uma sinf nia de Beeth ven cantar land sua mel dia. Pois bem. Praia do futuro, de Karim Aïn uz, é um desses filmes cuj entrech serve apenas c m esb ç , c m planta (n sentid arquitetônic ) a partir da qual se ergue sua sutil c nstruçã . Nessa história em três at s de um salva-vidas de F rtaleza (Wagner M ura) que vai a Berlim atrás de seu amante alemã (Clemens Schick), que enche a tela e impregna s sentid s d


espectad r sã as sensações c ntraditórias de is lament e busca de c ntat , de p tência e vulnerabilidade, afeto e incomunicabilidade.

Deslocamento e mergulho Num sentid ainda mais essencial, quase gráfic , filme p de ser vist c m a c njugaçã de d is m viment s: um h riz ntal, de desl cament ge gráfic , e utr vertical, de mergulh interi r. Já na primeira sequência, emp lgante e sem palavras, essas duas c rdenadas espaciais e dramáticas aparecem c m f rça: d is amig s atravessam de m t uma extensã de dunas, dep is mergulham n mar e um deles se af ga, apesar da tentativa desesperada de salvamento. É desse vazi , dessa lacuna – literal, já que c rp d m t queir m rt nã é enc ntrad – que se rigina t d m viment d pr tag nista. É s b sign da ausência e da inc mpletude que se dará a sua trajetória. Em vári s m ment s se expressa lindamente essa qualidade um tant espectral d pers nagem: quand ele caminha s zinh p r um des lad parque berlinense, de árv res sem f lhas; quand c nversa c m uma atendente de bar, sem que um c mpreenda utr ; quand entra numa sala de aula vazia e tenta decifrar que está escrit num quadr , s b a br nca inc mpreensível de um vigia. Duas imagens f rtíssimas e c ntrastantes ficam impregnadas na retina e, a meu ver, balizam f rmalmente filme: vertigin s aquári vertical em que pr tag nista é reenc ntrad pel irmã (Jesuíta Barb sa) em Berlim; e a “praia sem mar” que se estende a perder de vista na név a, h riz ntalidade pura em que s irmã s desgarrad s finalmente se rec nciliam.

Arquitetura em movimento Rotular Praia do futuro de “filme gay”, além de emp brecer seu alcance, também dist rce seu sentid , p is, apesar de prevalecerem nele de m d franc e c raj s as relações h m eróticas, víncul fundamental ali nã é entre salva-vidas D nat e seu nam rad alemã , mas sim entre Donato e o irmão caçula. Aquaman e Speed Racer, apelid s que eles dã um a utr , inspirad s n s desenh s animad s, nã deixam de ser uma f rma de sintetizar as duas linhas mestras d filme – desl cament e mergulh , a busca de c ntat e a intr specçã , h riz nte e as pr fundezas. Há em Praia do futuro algo do Antonioni de A aventura e de O passageiro, Profissão: repórter (atençã : ist nã é uma c mparaçã , só uma referência), nã tant pela perambulaçã angustiada d s pers nagens, mas principalmente pela c nfiguraçã d espaç físic c m element dramátic . Nessa arquitetura em m viment nã há um únic enquadrament fr ux , desnecessári u meramente rnamental. o ambiente nã é mer cenári nde se desenr la drama: ele é o drama. A isso damos o nome de cinema.

Trecho do filme Praia do Futuro– (de irmão para outro irmão): “De Aquaman pra Speed Racer: Te escrevo pra dizer que eu não morri. Eu só voltei pra casa. Aqui, nessa cidade subaquática, tudo pra mim faz mais sentido. Eu não preciso me esconder no mar pra me sentir em paz. Nem preciso mergulhar pra me sentir livre. E sempre que me perguntam como era aí, do lado de fora… eu conto de um menino que acha que não tem coragem… mas é o cabra mais corajoso que eu já vi. Magricela, quando todo mundo é forte. Voz fina quando todo mundo é macho. Pés pequenos, quando todo mundo é firme. Conto do menino e digo que ele é o meu irmão. Que ele sou eu, no dia que eu tiver coragem… de aceitar o quanto que eu tenho medo das coisas. Porque tem dois tipos de medo e de coragem, Speed. O meu, é de quem finge que nada é perigoso. O seu é de quem sabe que tudo é perigoso nesse mar imenso.”

Tel: 15- 3329-3130 Cel: 15- 99773-0130 E-mail: atendimento@marquesinformatica.com

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M SICA

NoVAS “VoZES” DA M SICA BRASILEIRA - ANTONIO LOUREIRO por Caio Garrido

onde estã as v zes, músic s e artistas que estariam traçand s caminh s daquil que seria a música c ntemp rânea brasileira? F i tentand resp nder a essa pergunta que buscam s c nhecer um p uc da trajetória d c mp sit r e multi-instrumentista Antonio Loureiro. Passeand entre a cançã e a música instrumental, L ureir é um d s exempl s mais vivazes e bem vind s da música brasileira atual. Inspirad p r sua herança musical, vinda d s c nt rn s regi nais d s m ntes de Minas e utras cercanias, L ureir inspira seus uvintes c m seu talent e habilidade a serviç da música, p tencializand a música instrumental e nã a deixand estéril. C m d is disc s s l já lançad s, L ureir traz em sua caixa de s n ridades t da a mistura que caracteriza: s acent s regi nais, a influência d jazz c ntemp râne , da cultura p pular brasileira, entre utr s. Neles, apresenta um esmer n cuidad c m a pr duçã e c m s detalhes, em cada n ta e timbre, p tencializand as harm nias em suas c ntiguidades. Seu últim álbum s l tem sugestiv n me “Só”, que traz diversas participações especiais, c m a de Siba, Tatiana Parra, Frederic Heli d r e utr s grandes parceir s, que sempre deixam bem ac mpanhad . - Antonio, nos fale um pouco sobre sua história na música. Minas Gerais influenciou sua música? E o Clube da Esquina? Cresci e vivi até s 24 an s em Bel H riz nte. Meu pai é clarinetista pr fess r da UFMG e minha mãe music terapeuta também pr fess ra na mesma esc la. T cava pian muit bem quand pequen mas desisti p rque ganhei uma bateria. E f i através desse instrument que c mecei meu caminh na música. Ad rava Michael Jacks n. ouvi muit r ck de t d tip . G stava d Sepultura, S undgarden, Nirvana e várias utras d r ck e d metal feit na ép ca. Ad rava Yes, Genesis, Pink Fl yd, Hendrix, p r causa d meu pai e d s amig s mais velh s... Ali eu percebi que existia uma c nexã c m vári s utr s aspect s musicais que nã s mente r ck. Que esses gêni s da música tinham influência de muita c isa. Dep is de um cert temp a música eletrônica me marc u também. Ia muit às festas e g stava de fazer essa música n c mputad r. C nvivi c m muitas p ssibilidades musicais sem prec nceit e curtind muit a infância, ad lescência e juventude. Sempre tive muit s amig s bem mais velh s d que eu. Uma pess a que me apresent u muita música f i Pedr Trig , grande baixista, amig mais antig que tenh . T cam s junt s em banda de r ck e até h je dividim s palc s em vários sons diferentes. Sempre tive alguma noção de como era viver de música e da real necessidade de se estudar música. E ad rava estudar muit meu instrument . T car bem! E nesse perí d , entre 12 e 17 an s de idade, participei de vári s festivais de música, fazend aulas de instrument e vivend experiências de banda sinfônica, big band, grup s de percussã e c isas d tip (Em Tatuí, Camp s d J rdã , Diamantina, our Pret , Curitiba; t das essas cidades que sediavam s festivais). Em mei a iss tud eu t cava, tant nas bandas c ver de r ck, quant na n ite c m músic s da cena instrumental. C mecei a t car alguma c isa de jazz e b ssa n va instrumental c m 11 an s de idade c m Paulã Lacerda, falecid amig tr mb nista pr fess r da UFMG e p r iss muit amig da família e d meu pai. Eu ia ver meu pr fess r t car muit !! E ele, dep is de ver que eu adquiri ali uma certa experiência na bateria, me b tava pra dar uma “canja”. A partir de um m ment , t da vez que eu ia ver ele eu dava essa canja que na verdade era uma super mega esc la pra mim. Esse mestre f i Limã . F i ele quem me inseriu na cena da música instrumental de BH. Eu substituía muit em um cert perí d . Quand eu tinha de 14 a 16 an s de idade ach ...

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Iss me fez t car c m a mai ria d s músic s da música instrumental de Bel H riz nte. Só quand entrei na universidade que c mecei a conviver e tocar com um pessoal mais perto da minha idade e que fazia “ utr s s ns”: Rafael Martini, Krist ff Silva, Felipe J sé e Frederic Heli d r ; que marcaram essa ép ca. Quand me perguntam s bre Clube da Esquina eu sempre dig que c mecei a uvir mesm e c nhecer mais, nã só Clube, mas tud que c nheç de música brasileira, mais tarde, a partir d s 16. A mesm temp eu estava sempre t cand esses s ns na n ite. Em BH é comum ver um grupo instrumental tocando versões d Milt n, d T ninh H rta. Mas nã c nhecia desde pequen . Fui entender a imp rtância de Elis, Milt n, Gil, Caetan e essas figuras t das da MPB mais tarde. Entendi mais ainda quand ac mpanhei T ninh H rta e percebi a imp rtância dele na história da música brasileira. o jeit dele fazer música me inspira muito. É livre, é canção, mas não é... Nã imp rta...

“No mercado não funciona assim; Se você ouve o que o mercado te vende, na rádio, TV, tudo aquilo é 50 vezes mais “fácil, extremamente fácil”, justamente pra entrar no seu cérebro e não sair nunca mais! Eu não estou a fim de invadir o cérebro de ninguém... Deus me livre!” - Como você vê hoje a música brasileira? Porque é tão difícil, compositores e artistas como você alcantarem uma melhor notoriedade, tão diferente da época dos festivais nos anos 60, em que num mesmo período de tempo surgiam artistas de real qualidade da MPB para o grande público? Como você acha que se posiciona neste cenário hoje? Basta v cê c mparar s festivais de televisã dessa ép ca e s de h je. A mesm temp eu nã v u p r esse caminh da c mparaçã de épocas pra se pensar estética, produção musical e formas de consumo de arte e cultura. São muit s s fat res que fizeram e fazem a diversidade e qualidade caírem n s grandes mei s de c municaçã . Além de fazerm s parte da era da imagem... Tud é imagem! Nã s u a melh r pess a pra esclarecer s bre as mutações d mercad f n gráfic , mas eu entend que se transf rm u muit e ach que tem cada vez mais dinheir env lvid . E ach muit difícil equilibrar a sensibilidade e f rça para a arte, c m a técnica e talent para se fazer dinheir . ou seja, a meu ver, quant mais dinheir env lvid , men s arte, p is bjetiv final é lucr e nã enriqueciment cultural de um públic , de um p v . H je tem muita c isa b a send feita n Brasil. Nã se p de

dizer c ntrári . Nã s u e nunca serei velh reclamã que c l ca a música independente e a pr duçã atual n fracass , n lix . o Brasil é en rme e nã dá c nta d tant de c isa send feita. Fat . Tem s entã que c ntinuar fazend alg que acreditam s: mexer c m a sensibilidade das pess as, independente da n t riedade u públic que iss traga para artista. Faç c m am r para públic , mas c nquistá-l nã é meu bjetiv . Meu bjetiv é passar uma mensagem, um sentiment , uma ideia, um m ment , mexer c m c rp , a dança, um c nheciment , uma reflexã , uma sensaçã (b a u ruim); Trabalhar sens rial e imprimir alg na memória. E é a partir daí que vai se f rmar públic que vai uvir que faç . Nã me imp rtand se sã milhões u dezenas de pess as. N mercad nã funci na assim; Se v cê uve que mercad te vende, na rádi , TV, tud aquil é 50 vezes mais “fácil, extremamente fácil”, justamente pra entrar n seu cérebr e nã sair nunca mais! Eu nã est u a fim de invadir cérebr de ninguém... Deus me livre! Música b a, bem feita, genial, c m grandes artistas, surge h je assim c m surgiam antigamente. Só nã estã na TV, rádi , u j rnal, a t da h ra. Quem está na grande mídia, paga para estar ali e precisa dela para m vimentar um negóci . Mas existe a internet e na internet tem espaç pra t d s... Ainda... A gente tem que trabalhar c m que tem e se encaixar e abrir s espaç s p ssíveis, c m a f rça e as p ssibilidades que tem s. - Você cometou na bateria e na percussão, certo? Você transcendeu a bateria tocando outros instrumentos? O tocar outros instrumentos te deu a possibilidade de olhar e tocar a bateria e percussão de outro modo? Como você se enxerga como músico? Sim. A bateria tem suas características técnicas e suas linguagens. Lev iss para s utr s instrument s que t c . Tenh mais experiência, técnica e intimidade c m a bateria. Mas t car outros instrumentos e aprender vários outros, me ajuda na produção musical, nos arranjos, na c mp siçã e na c municaçã c m s músic s que trabalh . - Grande parte de seu CD “Só” foi gravado por você tocando todos os instrumentos. Como é encarar o processo de produtão e gravatão desta forma? É uma utra f rma apenas. É mais fácil p r um lad , p rque eu simplesmente grav uma ideia que já f i f rmada n arranj e tir um s m que já está prec ncebid . organiz tud em bl c s e mais bl c s de an taçã e esb ç s de arranj . P r utr lad é difícil, p is nã tem um pr dut r escutand e dizend se está b m u ruim aquele take gravad . Entã leva mais temp para amadurecer a ideia e uvir distanciad d ambiente de intérprete. Trabalhar dessa f rma exige que v cê separe bem trabalh que v cê faz c m intérprete d trabalh de pr dut r d disc . o inseparável é justamente que dá resultad desse trabalh .

“... quanto mais dinheiro envolvido, menos arte, pois o objetivo final é o lucro e não o enriquecimento cultural de um público, um povo. Hoje tem muita coisa boa sendo feita no Brasil. Não se pode dizer o contrário. O Brasil é enorme e não dá conta do tanto de coisa sendo feita. Temos então que continuar fazendo algo que acreditamos: mexer com a sensibilidade das pessoas, independente da notoriedade ou público que isso traga para o artista. Faço com amor para o público, mas conquistá-lo não é meu objetivo.” - Você canta, toca, compõe, e passeia entre a música instrumental e a cantão. Quais as dificuldades que encontrou nesse processo? Mais natural imp ssível. G st d instrumental e da cançã , assim c m g st d d ce e d salgad . Às vezes d ce antes, às vezes misturad ... Assim c m g st da pintura e d cinema. Enfim, g st da mistura (em d ses diferentes), das características em separad , d clássic , d c ntemp râne . Tud inspira. Nã tenh as características de um especialista. S u men s f cad . Dispers e feliz p r iss . ----Entrevista a ser publicada p steri rmente também n bl g Música Contemporânea – http://music c ntemp rane .bl gsp t.c m.br/ Para ac mpanhar a música “Luz da Terra” d disc “Só”, acesse: https://www.y utube.c m/watch?v=lkJg-BSM0-8

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CoNToS

T

QUANDo VÁRIoS PoNToS SE ENCOSTAM Lucas Arantes

d s f rtes suficiente se atreveram a sentar n perímetr de quatr cadeiras em t rn dela, a c zinheira da casa. Eram também s suficientemente espert s para analisar as lembranças da história dessa c zinha, c m uma ajudante implantada para equilibrar que tombasse um pouco, nos bastidores. Quant temp restaria para que perdesse vig r? Cada c ntinuidade era vista c m alívi para se seguir em paz, antes que t d s eles se f ssem. Seus braç s nã só rec lhiam s j rnais, c m aguavam s frut s de alpendre e revezavam velas de 7 dias guardadas n p rã . Mas p r c nta de t d s s c rp s c m seus múltipl s p nt s de vistas & referências, que assistiam a temp entre eles passar, parecia que sua viagem era a mais avançada – mesm utr s quedand durante caminh . Quand enc stavam, s mesm s p nt s regavam-se p r rituais de saudações na esperança de um futur mai r, interpretand sinais d passad só ag ra, saudand , temer samente, que temp faz p r nã deixar nada viv estancar & permanecer parad . o temp dela, pel que viam, parecia viver em seguidas n ites de núpcias. E era c m presentes, vivid s junt s, que marcavam l ng temp uns d s utr s & criava experiências futuras c m resultad s bem dep is. Entã , assim, faziam c m suas f rmas. E c m a dama se prepara bem para estes dias de enc ntr quand temp de t d s estava válido. o alm ç era servid em diferentes escalas de parentes, que tinham um p nt de c nvergência para ac mpanhar destin d enigma que s traziam até ali – c m t da a ceia após um an a s vent s de trabalh & insistentes plantações. Eram it s que cabiam além dela e primeir que se sent u a mesa. Em seguida: t d s aband nam televis r, pedaç s de j rnais, alguma andança, telef ne u assunto paralelo ao foco da inauguração da grande távola forrada de tecido e plástico. “Famílias que se alimentam unidas tentam permanecer unidas”, beirava resum planand pela c nfiança de se servir c midas & agradeciment s. Uma faixa da etapa era queimada quand a primeira entrada de saladas já estava s bre a mesa e a h nra d únic h mem velh d terren murad c m pedras (satisfeit p r suas brigações e desiludid c m a real mudança de alguma delas) se m vesse dentr de um c rp deixand para trás rest de um brinde particular diári em um c p c m gel derretend a s poucos. Seguia pela frente, com passos de soldado, não para a ponta da mesa, mas a sua direita, deixand clar para quem quer ver verdadeiramente quem guiava naquil tud . Terminava, assim, p r ap star restante das fichas em sua ideia de futur – mesm já estand nele. Era entã precis um v luntári para retirar c p sem c nfiar que um pedaç de papel impedisse d gel virar uma mancha na mini bancada de madeira, servida também para ap i de prat individual quand se p de c mer em grup ac mpanhand televis r. Era para quem se rgulha de p ssuir um teatr a fund de casa, que servia também c m vigia em estádi s de futebol. Entre passadas de prat s e far fas, equipes diferentes de uma mesma família, unidas para celebrar desej antig de saudar que se perde, arriscava dizer que, p r sinal, neste enc ntr de natal, fazem s mais aniversári s pelas urgências c mem rativas d que batidas f rçadas de ritm s lent s. S nhavam c m b las de água levitand em jardins, sem querer declarar que é sempre temp que faz c m que se percam uns d s utr s além de nós. Pensava em nã estar ali que nã era muit de alm ç , um pesquisad r de h ras vagas u c merciante para seguir viagens, mas vivia-se em grupos e esforçavam-se para não partir. o natal. Dispersaram-se t d s c m seus presentes, distrações & agradeciment s. Antes de deixar que era n v t mar pel s bastid res de cada um deles, havia espaç de desc berta e de us d s utensíli s. Era neste temp que diál g para um n v ac ntecia. E era após este pequen laps da realidade que de alguma f rma p deria se n mear que chamaram de natal.

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Lucas Arantes é escritor e jornalista formado na Universidade de Ribeirão Preto. É membro fundador do Espaç A C isa e da Cia de Teatr A C isa. C ncluiu, em 2009, o curso de Formação em Psicanálise no Núcle Tav la, mas nã exerce a pr fissã . É aut r d Livr “S nid s, D cument s Inúteis, P emas na Mesa P sta u Clã d Urs da Fl resta” (2007, Ed. Deriva), d r mance “o outr Estranh ” (2009, Ed. Deriva), e do drama “Suspensão” (2009), encenado pela Trupe Acima d Bem e d Mal. Escreveu diversas peças de teatr que se t rnaram espetácul s encenados em Ribeirão Preto, São Paulo e outras cidades. Entre elas, está “Edifíci L nd n” (2012, Ed. C ruja), tragédia que retrata de f rma ficci nal um fam s h micídi c rrid n Brasil em març de 2008 ( chamad “cas Isabela”). o espetácul e livr estão proibidos de circular desde março de 2013, após uma açã judicial que grup e aut r já rec rreram e aguardam resp sta judicial. o c nt “Quand vári s pontos se encostam”, presente na edição desta revista, integra o livro “Menos”, ainda inédito.


É precis ir para falar s bre s que estiveram. A senh ra sempre s ube pular de an após an esfregand a eficiência que um pedaç de terra equipad trivialmente p de pr p rci nar de aliment a uns & utr s. S brevivia de j rnais, d bradas de páginas & n velas, empilhand , papel & tinta, riscand t d espaç em branc , em palavras & cruzadas. C m tantas tardes, chás & t rradas, a cada n va j rnada mental, a cada melh ria & desc berta, é beliscad impuls da c zinha a lad d s que s bram pel s cant s de cada dia, nas tardes quentes da semana. P dia-se ler, c mer, beber, ficar ali. Gest s tã necessári s para entrar n temp c m privilégi de c nhecer a história & funci nament de um grande b nsai diári . De outros natais foram sendo feitos. Foram-se partindo aos poucos, com seus defeitos. outr s f ram faltand . Além do cansaço. Até que disse que sempre p deria: – Vive-se de duas maneiras, p de acreditar: u c m quem arquiteta r mances, u c m alguém que só vive de ir a teatr s. Esc lha sempre quand p ssível. Nã há rec meç para s que nem c meçaram. E vir u-se para cuspir seus car ç s de uvas na mã , antes de me entregar alguns deles e decretar: – Guarde sempre n natal alguns p nt s próxim s que se enc stam. E ria pela tarde segura & vi lenta.

Luís Henrique do Amaral e Silva

PATRÍCIA LOUREIRO

Psicanalista CRP 71289

Psicól ga/ Psicanalista. Crp: 67/196

Atende adolescentes e adultos

Especialista em Psic terapia Psicanalítica pela USP. Atendimento de adolescentes e adultos.

(faz também o trabalho de acompanhamento terapêutico (AT) )

Rua Massacá, 348, Alto de Pinheiros, São Paulo Telefone: (11) 99115-8647 E-mail: luishas@hotmail.com

Endereç : Rua Sã Vicente de Paula, 95. Santa Cecília. (Próxim a metrô Marechal De d r ) Telef ne: 3822-4573 E-mail: patricial ureir 5@h tmail.c m

OTÁVIO D’ELIA Psicanalista e Psicólogo CRP 44591-1

atende adolescentes e adultos Rua Santo Amaro, 71, 17º andar, cj.17-B -Bela Vista Telefones: 11 3455-9775 / Celular: 11 99249-7452

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PoEMAS

QUASE POESIA osvald Felix

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ARTE

Era de Er s Errar Err Terra Tantas almas toscas Prazer privand desej s Terra Reta dos corpos Sopro Pr eza pr cura Viragens

A pedra, minério estéril, Sem vida e sem nerv exp st , De textura tã c ncreta Que intern e extern se igualam. Sem encanto e sem medida Sempre concisa e concreta Cede, ao apelo do tempo E a j g hábil das mã s: Pedra aprimora-se em corpo. A pedra forjada em pedra Pela mã d ser human Perde a sisudez primária: Reta, angular ou lascada, o que era apenas imprópri Ganha f rma e precisã . Seja casa ou seja estátua ( u seja um mínim bjet ) Uma pétrea s lidez Ganha graça feminina. Medra em seu interior o segred d s pr dígi s. o que eram perdas e pedras Aprim ra-se em silênci . Seja casa ou seja estátua ( u seja um mínim bjet ) o perfil purificad D minéri trabalhad Tem nítid c nt rn De quem sabe c nt rnar. Seja casa ou seja estátua (ou seja um mínim bjet ) o minéri trabalhad Recobre-se de mais vida. A vida mina no corpo E na f rma já c nclusa Todo o dentro e todo o fora Numa perfeita permuta Revelam vontade própria. o sentid entã irr mpe: E que antes só era estéril Ultrapassa própri h mem.

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3 Vive à pr cura d que nã tem n me; Vive à pr cura d que nã tem f rma; E s bre branc papel desta vida Deixa cair que nunca n s s bra. A justa medida d que pr cura Limita-se c m a imagem da fl r. Nã a uma fl r de c mum jardim, Mas à pelágica, distante fl r. Pr cura n s espelh s as imagens Que migram d reflex à f rma arisca; Imagens que nã findam, p rque a língua Nã lhes sabe a c rreta f rma física. Deseja sem saber que deseja, P rque n me cert nã tem um c rp : Tem a f me que sempre n s c ns me; F me que migra da imagem a c rp . Vive à pr cura d c rp , da f rma Que nã existe mas insiste; f rma vaga que t da língua a c nt rná-la precisa viva imagem que a def rma.

4 Paixão A n ssa ideia fixa é uma c rrenteza que carrega c nsig sua própria natureza. A n ssa ideia fixa vive para si mesma: ergue c m arquitet a extensã da certeza. A n ssa ideia fixa fixa na vertical t da a nudez d pânic , que é sua carne vital. A n ssa ideia fixa c rta c m uma faca; e na avidez da carne imprime que (n s) falta. A n ssa ideia fixa nunca se desespera: c ns me em seu silênci temp que m dela. A n ssa ideia fixa é vivaz pr fetiza: gera em seu próprio ventre filh que precisa. A n ssa ideia fixa, quand se realiza, rompe o próprio cordão parindo a eterna sina. A n ssa ideia fixa semeia sem cessar n chã de n ssa carne os grãos do começar A n ssa ideia fixa tece tal como parcas invisível c rdã : a vida e que n s falta. A n ssa ideia fixa a desfazer s nós ( s nós que n s uniam) irmana sangue e pó.


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AUSwNCIA

CARNE VIVA

A ausência nã cede a apel s. Nela, tud que se gasta Nã se finda, mas se afina: o seu fíci é a falha.

Todo corpo no (teu) corpo nã c mp rta anat mia: é antes um despertar – Corte na justa medida.

A falha tece seu fi Trabalhand rig r d aç Para m ldá-l em rem rs : o prazer já nasce gast . Nua e c ntínua a falta É a feminina fome Que consome sem medida o n me d que desc bre.

Come o nome e a pura forma, Ingere que se recusa E gera em seu ventre f rte A f rça que n s culta. Uma f rça em que se sente Afiar na carne viva o precis fi da vida: Fi de med e de delícia. Uma f rça que se expressa Incôm da e c m alarde: Tal fl r invertida e anônima Que h mem transf rma em arte.

Dele não escorre sangue, Nem se p dem ver s ss s: Vê-se uma matéria ausente – que na vida é incôm d . o teu c rp é alma densa, que em pele e nerv se adensa: vibra pesad silênci – fome interior das perdas. Todo corpo no (teu) corpo tateia a gasta matéria: p lida ag nia íntima – textura adversa da ausência

7 Intersectão o mutism e silênci (dois irmãos inimigos) Insistem em ficar Lad a lad c mig . o silênci vem antes: Traz a sua grandeza Em f rma de prelúdi Para que eu rec nheça o quant errei em mim. Mas é vago o meu ser (tão amplo em seu limite) E, nele, que está pert Perde fi e a pr eza. o silênci se enreda Pelas tramas do sim Tecendo sua meta. Constrói uma passagem Unind ânsia e angústia – (faz p nte s bre abism s) Desc nhecend cust . Súbito, então, descubro Minhas pequenas glórias Mas a glória se cala o mutism a dev ra. o mutism dispensa os caminh s estreit s: Prefere p nt fix D s caminh s rasteir s. Parado, resguardado, Entreg -me a que é ásper Vibra dentro de mim o med que me cala

Osvaldo Felix é D ut r em Estud s Literári s pela UNESP e pr fess r

de literatura. os p emas aqui presentes fazem parte de seu livr de estreia chamad “Quase P esia”, a ser lançad em breve.

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