Terra Livre 47

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TERRA LIVRE PARA A CRIAÇÃO DE UM COLECTIVO AÇORIANO DE ECOLOGIA SOCIAL

BOLETIM Nº 47

JULHO DE 2012

Tá fechado. Tou prós touros Economia verde versus economia solidária o Bosão verde açoriano

Lagoa (eutrofizada) das Furnas, Agosto de 2011


Tá Fechado. Tou Prós Touros que

ter

um

trabalho

devidamente

remunerado. Vivi vários anos na ilha Terceira, na década de oitenta do século passado, e no meu local de trabalho verifiquei que nos dias de tourada à corda, havia funcionários

que

andavam

com

a

“cabeça no ar” e que, ou não eram A notícia de que os residentes no

capazes de estar no trabalho um minuto

município

a mais, ou saiam mais cedo, não

espanhol

de

Guijo

de

Galisteo optaram por gastar 10 000

cumprindo

euros em touradas em vez de criarem

estabelecido.

o

horário

de

trabalho

empregos locais, apesar da taxa de desemprego ser da ordem dos 31%, publicada no jornal britânico The Guardian, no passado dia 4 de Junho, terá

apanhado

várias

pessoas

de

Ainda por estes dias, vi em montras de estabelecimentos comerciais a indicação de que estavam encerrados pois havia tourada nesta ou naquela localidade. Quando se diz que a tourada fomenta a

surpresa, o que não foi o meu caso.

economia,

mais

propriamente

o

Com efeito, tenho refletido muito sobre

comércio, o exemplo referido só mostra

a indústria do lazer e lido, também,

que beneficia algum em detrimento de

muito sobre a história da tauromaquia,

outro.

tanto a nível nacional como a nível da ilha Terceira, e já havia chegado à conclusão de que séculos de habituação e de deseducação fomentados pelos detentores do poder político, económico e religioso levaram à alienação dos cidadãos

que

preferem

viver

das

migalhas do Rendimento Social de Inserção,

das

Alimentar

ou

ajudas de

do

outra

Banco qualquer

Além disso, gostaria de saber como pode sobreviver a economia de uma região se se basear na venda de favas importadas da Cochinchina, amendoins da

China,

cerveja

do

continente

português, batatas de Espanha ou de outro país qualquer? Já agora, que bens são produzidos pelas touradas que possam ser exportados?

instituição de solidariedade social do 2


Os “afamados” vídeos com as marradas,

“Vi aqueles animais, vítimas da

que

de

ferocidade do delirante momento,

deseducação e de despromoção turística

espumando sangue pela boca e pelas

ou as garrafas de cerveja que são

ventas, arfando continuamente do

recolhidas e que voltam à origem para

cansaço, moídos de pancadas e de

serem recicladas?

mil torturas!

A situação que se vive hoje é reflexo

Quando o animal enfraquece, e que

do que se viveu no passado e prova que

todos podem impunemente espicaçá-

na questão do bem-estar animal ou dos

lo com os varapaus, ficando como o

direitos dos animais muito pouco se

leão da fábula, o entusiasmo sobe de

avançou, embora as touradas à corda

ponto, redobram as torturas, e estou

sejam menos violentas, porque os

certo

homens ditos “cultos” ou as chamadas

espetadores

“elites” não tiveram nem têm qualquer

alegria se porventura o vissem

interesse.

sucumbir”

são

um

bom

exemplo

Termino este texto, divulgando o que escreveu,

no

século

XIX,

que

os se

corações

dos

expandiriam

em

um

continental que visitou a ilha Terceira e que ficou horrorizado com o que viu, numa tourada à corda, no Pico da Urze.

“Em se falando em touros é um delírio, perdem-se interesses, largase o trabalho, vai para o prego algum objeto

Aqui ficam alguns extratos:

de

indispensável

uso

doméstico, porque o divertimento (?) tem uns certos acessórios, para cuja

“Imagine-se um boi preso pela

satisfação tudo é preterido”

cabeça por uma grossa e pesada corda, a cuja extremidade pegam

Mariano Soares

quatro valentes homens, que, na ocasião do animal ir esticando a

10 de Junho de 2012

corda, a puxam com tal violência que o

animal

cai,

algumas

vezes

embrulhado na corda pelos pés e mãos!”….

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Economia Verde versus Economia Solidária

O Documento Zero da ONU para a Rio+20

é

ainda

refém

do

velho

paradigma da dominação da natureza para extrair dela os maiores benefícios

apresenta ameaçador e nega um futuro de esperança. Num contexto destes, nãoavançar é retroceder e fechar as portas para o novo.

possíveis para os negócios e para o mercado. Através dele e nele o ser humano deve buscar os meios de sua vida e subsistência. A economia verde radicaliza esta tendência, pois como escreveu o diplomata e ecologista boliviano Pablo Solón “ela busca não apenas mercantilizar a madeira das florestas mas também sua capacidade de absorção de dióxido de carbono”. Tudo isso pode se transformar em bonos negociáveis

pelo mercado e pelos

bancos. Destarte o texto se revela definitivamente antropocêntrico como se tudo se destinasse ao uso exclusivo

Há outrossim um agravante: todo o

dos humanos e a Terra tivesse criado

texto gira ao redor da economia. Por

somente a eles e não a outros seres

mais que a pintemos de marron ou de

vivos

também

verde, ela guarda sempre sua lógica

condições

interna que seformula nesta pergunta:

ecológicas para a sua permanência neste

quanto posso ganhar no tempo mais

planeta.

curto,

que

sustentabilidade

exigem das

com

possível, Resumidamente:

“O

futuro

o investimento menor mantendo

forte

a

que

concorrência? Não sejamos ingênuos: o

queremos”, lema central do documento

negócio da economia vigente é o

da ONU, não é outra coisa que o

negócio. Ela não propõe uma nova

prolongamento do presente. Este se

relação para com a natureza, sentindo-se parte dela e responsável por sua vitalidade e integridade. Antes, move4


lhe uma guerra total, como denuncia o

produtores

e

consumodres

numa

filósofo da ecologia Michel Serres.

verdadeira democracia alimentar.

Nesta guerra nãopossuimos nenuma chance de vitória. Ela ignora nossos intentos. Segue seu curso mesmo sem a nossa presença. Tarefa da inteligência é decifrar o que ela nosquer dizer (pelos eventos extremos, pelos tsunamis etc), defender-nos de efeitos maléficos e colocar suas energias a nosso favor. Ela nos oferece informações mas não nos dita comportamentos. Estes devem se inventados por nós mesmos. Eles somente serão bons caso estiverem em conformidade com seus ritmos e ciclos. Como alternativa a esta economia de devastação, precisamos, se queremos ter futuro, opor-lhe outro paradigma de economia de preservação, conservação e sustentação de toda a vida. Precisamos produzir sim, mas a partir dos bens e serviços que a natureza nos oferece gratuitamente, respeitando o alcance e os

limites

de

cada

bioregião,

destribuindo com equidade os frutos alcançados, pensando nos direitos das gerações futuras e nos demais seres da comunidade de vida. Ela ganha corpo hoje através da economia biocentrada, solidária,

agroecológica,

familiar

e

orgânica. Nela cada comunidade busca garantir

sua

soberania

alimentar.

Produz o que consome, articulando

A

Rio

92

consagrou

antropocêntrico

e

o

conceito

reducionista

de

desenvolvimento sustentável, elaborado pelo relatório Brundland de 1987 da ONU. Ele se transformou num dogma professado pelos documentos oficiais, pelos Estados e empresas sem nunca ser submetido a uma crítica séria. Ele sequestrou a sustentabilidade só para seu campo e assim distorceu as relações para com a natureza. Os desastres que causava

nela,

eram

vistos

como

externalidades que não cabia considerar. Ocorre

que

estas

se

tornaram

ameaçadoras, capazes de destruir as 5


bases físico-químicas que sustentam a

de 5-15 de julho de1972 em Estocolmo

vida humana e grande parte da biosfera.

na Suécia sobre o Ambiente Humano, o foco central não era o desenvolvimento mas o cuidado e a responsabilidade coletiva por tudo o que nos cerca e que está

em

degradação,

acelerado

processo

afetando

a

todos

de e

especialmente aos países pobres. Era uma

perspectiva

humanística

e

generosa. Ela se perdeu com a cartilha fechada do desenvolvimento sustentável e agora com a economia verde. Texto de: Leonardo Boff (autor de “Sustentabilidade: o que é e o que não é”, Vozes 2012). Isso não é superado pela ecocomia

Fonte:

verde. Ela configura uma armadilha dos

http://leonardoboff.wordpress.com/2012

países ricos, especialmente da OCDE

/06/04/economia-verde-verus-

(Organização para a Cooperação e o

economia-solidaria/

Desenvolvimento

Econômico)

que

produziu o texto teórico do PNUMA Iniciativa da Economa Verde. Com isso, astutamente

descartam a discussão

sobre a sustentabilidade, a injustiça social e ecológica, o aquecimento global, o modelo econômico falido e mudança de olhar sobre o planeta que possa projetar um real futuro para a Humanidade

e

para

a

Terra.

Junto com a Rio+20 seria um ganho resgatar também a Estocolmo+40. Nesta primeira conferência mundial da ONU 6


O Bosão Verde Açoriano Se o dito cujo governo distribui algum do dinheiro de todos a alguns, através do PROENERGIA, encaminha muito mais para os grupos económicos que são os donos da empresa que produz e distribui eletricidade nos Açores.

Em

nome

dos

Açores

solidários,

apoiam-se com milhões de euros a tauromaquia que, como é sabido, é uma indústria verde sujo que tem como objetivo torturar e matar animais e ferir ou matar humanos estupidificados pela deseducação que receberam desde o O Governo Regional dos Açores é,

berço. A título de exemplo, fica

como todos sabemos, um fervoroso

registado que o mês de Junho, foi fértil

adepto do desenvolvimento sustentável,

em tortura animal que teve o seu auge

embora pareça não saber o significado

nas sanjoaninas, onde as touradas foram

do conceito, e um feroz apoiante da

apoiadas com uma verba de quase 300

economia verde, diga-se capitalismo

mil euros.

verde.

A provar o afirmado anteriormente, o governo

diz

apostar

nas

energias

renováveis, mesmo naquelas que de renováveis nada têm (para além dos disparates dos técnicos (?) da AMISM), como a produzida pela queima de lixos, pois segundo parece as doutas cabeças descobriram uma combustão verde, isto é sem emissão de dióxido de carbono.

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Uma descoberta recente, para nós nem

que, em entrevista ao Correio dos

por isso, foi a do “compadrio entre

Açores, defendeu a criação de um

investigação científica e a política”,

imposto “contra a poluição, contra a

como muito bem denunciou o Diretor

destruição do meio ambiente”.

do

Departamento

de

Biologia

da

Universidade dos Açores. Com efeito,

Com a referência ao meio ambiente

ao contrário do que recomenda a

está tudo dito, vamos proteger a metade

esmagadora

estudos,

do ambiente, aquela que não é acessível

segundo os quais transportar espécies

ao braço humano, e vamos carregar com

endémicas de umas ilhas para as outras

mais impostos quem já está a suportar a

poderá acabar com a sua variabilidade

crise causada pelo capitalismo e pelos

genética, alguns universitários bem

seus agentes que com incompetência

identificados com outras causas também

estão a governar o mundo.

maioria

dos

verdes, como a dos transgénicos, e o secretário

regional

que

tutela

José Sousa

o

ambiente acham que não.

Em Prol da Agricultura Biológica

Que interesses ocultos estarão por

Conhecer globalmente para agir localmente. Uma Região, nove ilhas. Cooperativamente, promovendo a produção, comercialização e o consumo de produtos biológicos.

detrás de tudo isto? Já temos um acelerador de partículas para estudar o

Contribuir para potenciar este desenvolvimento através da partilha de conhecimento no blog.

assunto! Promover a discussão informal numa plataforma de discussão via email. Dar a conhecer os produtores ativos em agricultura biológica nos Açores Saiba mais aqui: http://www.redeproacoresbio.blogspot.pt/

Mas, a grande descoberta, talvez mais importante que a “partícula de Deus”, foi a do economista Gualter Furtado 8


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