TERRA LIVRE PARA A CRIAÇÃO DE UM COLECTIVO AÇORIANO DE ECOLOGIA SOCIAL
BOLETIM Nº 61
SETEMBRO DE 2013
Vila Franca do Campo e a conservação da Natureza
Touradas e golpe de calor
Nossa Senhora do Bom Despacho
DORST, DUBOS E DUMONT
Vila Franca do Campo e a conservação da natureza
Parece que longe vão os tempos em que as
serviços”. Esta fase foi marcada pela entrada
associações ditas ambientalistas estavam no
do Partido Socialista para o governo, em
seu auge, quer em termos de ações no terreno,
1996, a qual teve implicações positivas e
quer no que se refere à sua presença na
negativas.
comunicação social, tanto divulgando as atividades
que
iam
realizando
como
denunciando situações anómalas.
De positivo, destacou-se a colaboração entre as associações e a secretaria que tutelava o ambiente,
tendo-se
institucionalizado
o
financiamento público a todas as associações, o que criou condições para que estas crescessem em termos de implantação ou mantivessem as suas sedes abertas, como aconteceu com a Quercus.
A outra face, diria que negativa, foi a lenta transformação de algumas associações, que mantinham um perfil de intervenção mais Hoje, ao contrário do que seria de esperar por todos os que acreditavam que, com o decurso do tempo, a democracia seria cada vez mais participada e os cidadãos seriam mais ativos
político, em prestadoras de serviços, de que é exemplo a associação Amigos dos Açores, sobretudo com a gestão das Ecotecas de Ponta Delgada e da Ribeira Grande.
quer individualmente quer organizados em associações, cooperativas, etc., assiste-se a um definhar das mais diversas instituições que se vão mantendo graças à abnegação de muito poucos.
Há três anos escrevia que o movimento ambientalista nos Açores encontrava-se na fase da “instrumentalização e da prestação de Terra Livre nº 61 ◊Setembro de 2013
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Outro aspeto negativo para as associações foi
A associação “Os Montanheiros”, fundada em
o esvaziamento de algumas delas, com a saída
1963, na ilha Terceira, tinha como objetivos
de alguns dirigentes que foram ocupar os mais
iniciais a realização de atividades de ar livre e
diversos cargos quer no governo quer na
depois, durante muitos anos, a exploração de
Assembleia Legislativa Regional.
cavidades vulcânicas.
O Centro de Jovens Naturalistas de Santa Maria (CJN), cuja atividade foi mais intensa nas décadas de 70 e 80 do século passado, tinha, entre outros, como objetivos principais “iniciar os jovens nas coleções ou preparações com elementos diversos da História Natural”.
Foi sim o NPEPVS/Delegação dos Açores, que esteve em atividade em São Miguel, de Infelizmente hoje, esta fase mantém-se e o
1982 a 1984, o verdadeiro herdeiro dos
esvaziamento parece que não foi estancado,
movimentos naturalistas surgidos no século
assistindo-se à quase inatividade de grande
XIX que se preocupavam com a evolução da
parte das associações e as que se mantêm
civilização
ativas têm as suas atividades reduzidas à
preservar a natureza selvagem.
componente
recreativa
ou
à
e
pretendiam
essencialmente
vertente
desportiva.
Ao contrário do que por vezes se escreve, não foi o Centro de Jovens Naturalistas de Santa Maria nem a associação os Montanheiros as primeiras
associações
dedicadas
à
conservação da natureza nos Açores, mas sim o NPEPVS-DA-Núcleo Português de Estudos e Proteção da Vida Selvagem/Delegação dos Açores.
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O NPEPVS/Delegação dos Açores que tinha,
natureza, continham artigos contra o uso da
de acordo com os seus estatutos, como
energia nuclear e sobre problemas ligados à
objetivo prioritário a proteção da natureza, em
vida em meios urbanos.
especial da fauna e da flora, teve a sua sede localizada na rua Padre Manuel José Pires, localizada na freguesia de São Pedro, pertencente ao concelho de Vila Franca do Campo.
Tendo como principais dinamizadores e fundadores o francês Gerald le Grand e o vilafranquense Duarte Soares Furtado, que dirigia o boletim, colaboraram naquele, entre outros, Para a concretização daquele objetivo o
os seguintes naturais de vila Franca do
NPEPVS-DA conseguiu organizar, na sua
Campo: António Frias Martins, na altura Prof.
sede, um centro de documentação com
Auxiliar Convidado da Universidade dos
diversas publicações e filmes sobre a vida de
Açores, Maria Furtado, da então Divisão de
aves e lançou duas campanhas, uma em
Ambiente da SRES e Teófilo Braga, que para
defesa das aves marinhas e outra para
além de ser membro do NPEPVS-DA,
proteção das aves de rapina. Da mesma
também havia sido um dos fundadores do
associação, destaca-se a edição de dois
Grupo Luta Ecológica, com sede na ilha
números (Primavera de 1983 e Inverno de 1984)
do
“Priôlo
-
Boletim
para
Terceira.
a
Conservação da Natureza nos Açores”, onde para além dos temas ligados à conservação da
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, nº 2871, 14 de Agosto de 2013, p.15)
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Touradas e Golpe de calor
A energia térmica presente no organismo de
Se a região for húmida (Açores), a perda de
um animal homeotérmico (de temperatura
calor
constante), como o bovino, é na sua maior
proporcionando um elevado stress calórico.
parte gerada pelos processos metabólicos (da contracção muscular no exercício físico e outros) e o resto é procedente do meio ambiente, por meio da radiação (solar e outras).
por
evaporação
será
prejudicada,
A perda de calor latente por evaporação através das glândulas sudoríparas é um dos mecanismos de adaptação ao stress calórico em bovinos, ovinos, equinos, caprinos e bubalinos (família a que pertencem os búfalos). Quando um animal é submetido a altas temperaturas, ocorre um aumento da circulação
sanguínea
para
a
epiderme,
proporcionando uma quantidade adicional para as glândulas sudoríparas e estimulando a sua acção (transpiração). Quando a temperatura ambiente sobe acima de 29°C, a via de perda de calor mais eficiente será por evaporação (transpiração e respiração) sendo responsável, por exemplo, em bovinos a 85% das perdas de calor. Esse tipo de perda é dependente da humidade
A evaporação respiratória tem sido apontada como o principal mecanismo de termólise (para evitar o sobre aquecimento e manter a temperatura do corpo constante). Para perder calor por evaporação respiratória, o animal aumenta a sua frequência respiratória.
relativa do ar. O mecanismo físico de termólise (para evitar o sobre aquecimento e manter a temperatura do corpo constante) considerado mais eficaz é por evaporação. Porém, em ambientes muito húmidos, a evaporação pode tornar-se muito lenta ou nula.
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de gaiolas ao sol, sem água, antes e depois de
DESIDRATAÇÃO
correrem e ficarem extenuados e aquecidos num
vasto
arraial
de
provocações
e
movimento.
Desidratação é a falta de água no organismo causada por falta de ingestão de líquidos ou perdas
exageradas
(transpiração,
sem
respiração,
reposição diarreias,
Isto já levou a muitas mortes, que são escondidas pelos aficcionados.
insolação). O transporte de nutrientes e a remoção de resíduos dos órgãos do corpo são feitos pelo
É mais uma etapa do sofrimento a que os animais estão sujeitos na tauromaquia.
sangue (essencialmente constituído por água)
Achamos que isto deve ser investigado e
dentro dos vasos sanguíneos. A diminuição de
divulgado.
volume diminui o transporte, provoca queda
Vasco Reis
da pressão sanguínea levando a um quadro de choque (falta de sangue em todos os órgãos) . Se houver perdas acentuadas (diarreia) piora a situação
pela
perda
de
sais
minerais
(electrólitos). Isto provoca um forte transtorno do estado geral, acompanhado de grande sofrimento, que pode levar à morte. O mesmo se aplica ao gado bravo, antes e depois das touradas, inclusivé nas touradas à corda, onde desidratados ficam horas dentro Terra Livre nº 61 ◊Setembro de 2013
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Nossa Senhora do Bom Despacho despachou
Associar festas religiosas a touradas era um
O que foi possível apurar, não sabemos se por
mau costume que até há alguns anos só
interferência da Padroeira ou não é que houve,
acontecia na ilha Terceira. Contudo, nos
na tourada realizada a 27 de Julho de 2013,
últimos anos esta barbaridade tem acontecido
um ferido que segundo alguns foi colhido e
em Santa Maria nomeadamente por ocasião
veio parar para o hospital de S. Miguel, em
das festas de Nossa Senhora do Bom
perigo de vida, com fraturas no rosto.
Despacho. Não sabendo a identidade exata da pessoa, também nos informaram que terá sido um micaelense que estava em Santa Maria ao serviço da empresa Tecnovia.
Ao
vitimado,
desejamos
voluntariamente
rápidas
melhoras
ou e
não,
que
a
experiência lhe sirva de lição e ao touro que tenha regressado ao sossego das pastagens e que o deixem em paz.
Já não estranhamos que a notícia não tenha saído em nenhum órgão de comunicação social apesar de já não haver censura em Portugal. Ou ainda há? António Cagarro * *descendente de marienses Tal ocorre com a conivência das entidades religiosas e com o apoio da Câmara Municipal de Vila do Porto. Quanto dinheiro do culto ou do erário público é desviado para o fomento da deseducação, é o que não conseguimos apurar. Terra Livre nº 61 ◊Setembro de 2013
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Jean Dorst, René Dubos e René Dumont
Cientistas da Biologia escreveram livros de
Em algumas ocasiões, no âmbito do M.E.P. e
tonalidade ameaçadora.
das edições «Frente Ecológica», esse tematabu da agroquímica e do agrobusiness foi abordado, já que era e tem continuado a ser um dos que a indústria mais tem silenciado, a pretexto do objetivo humanitário de «matar a fome mundial».
Como
René
Dumont,
entre
outros,
desmascarou, não só não se mata a fome com uma agricultura autodestrutiva, como cada Pertencem a Jean Dorst, por exemplo, «Antes que a Natureza Morra» e «A Natureza Desnaturada», títulos de dois livros seus. Alegando a famosa
neutralidade que a
ciência tem de manter, davam apenas argumentos
«científicos»
aos
que
preconizavam a luta política. Depois, lavavam daí as suas mãos de cientistas neutrais. Como
vez mais se contribui para a fazer alastrar.
Ribeiro Telles, quando o deixam, tem sido uma das vozes a denunciar esta hipocrisia.
Fonte: http://ecologiaemdialogo.blogspot.pt/2010/11/ rene-dumont-rene-dubos.html
se ciência e cientistas não tivessem sido o principal contributo à crise ambiental.
Militantes da ecologia como René Dumont vieram da Sociologia da Fome Mundial e das evidentes preocupações que a agricultura química intensiva (adubos e pesticidas) começava a suscitar, apesar das enormes pressões sobre a opinião pública da própria F.A.O., departamento das Nações Unidas, onde se destacou o cientista Norman Borlaug, «prémio Nobel». Terra Livre nº 61 ◊Setembro de 2013
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