TERRA LIVRE PARA A CRIAÇÃO DE UM COLECTIVO AÇORIANO DE ECOLOGIA SOCIAL
BOLETIM Nº 26 NOVEMBRO DE 2010
- Alice
Moderno (1867-1946) - uma singela homenagem
- Manifesto “Em Defesa do Animal” - Ética Libertária Interdependente - A agroenergia serve à vida ou ao capital? - O Ecologismo não tem nada a dizer sobre a greve geral?
Alice Moderno (1867-1946) - uma singela homenagem FERNANDO PEREIRA MORTO À BOMBA PELO ESTADO FRANCÊS HÁ 25 A “Lembra-te sempre que ao maltratares um animal vais ferir a tua própria dignidade” (Alice Moderno)
Alice Moderno, no início da segunda década do século passado, já pensava que uma árvore de pé poderia ter mais valor do que abatida. Vejamos o que
Hoje, 5 de Outubro de 2010, quando se
dizia a propósito:
comemoram 100 anos de implantação da República, aproveitamos o dia para
“Plantar árvores é não só amar a
prestar uma singela homenagem a
natureza. Mas ainda ser previdente
Alice Moderno.
quanto ao futuro, e generoso para com as gerações vindouras. Cortá-
Mas quem foi Alice Moderna para que
las ou arrancá-las a esmo, sem um
estejamos, aqui, a recordá-la?
motivo justo, é praticar um acto de selvajaria”(A Folha, 16/2/1913). “A árvore é confidente discreta dos namorados
e
a
desvelada
protectora dos pássaros – esses poetas do ar. A árvore é a maior riqueza da gleba, o maior tesouro dos campos e o maior encanto da paisagem!” (A Folha, 15/3/1914).
Como amiga dos animais, Alice Moderno Para além da sua actividade de jornalista,
escritora,
agricultora
e
comerciante, Alice Moderno foi uma mulher que pugnou pelos seus ideais republicanos e feministas, sendo uma defensora da natureza e amiga dos animais.
foi mais sobretudo uma mulher de acção. Com efeito, embora fundada em 1911, a Sociedade
Micaelense
Protectora
dos
Animais esteve quase inactiva até 1914, data em que Alice Moderno assumiu a sua presidência. Durante a presidência de Alice Moderno, foram criadas as condições para o funcionamento da SMPA, como a aquisição
Como
precursora
dos
actuais
movimentos de defesa do ambiente, de que muitos de nós somos membros,
de uma sede e de mobiliário e foram tomadas medidas conducentes a acabar com os maus tratos que eram alvo os animais
usados no transporte de cargas diversas,
A evolução da sociedade fez com que
nomeadamente
transportavam
quase desaparecessem os problemas
beterraba para a fábrica do açúcar, e para a
associados ao transporte de cargas.
educação dos mais novos através do envio
Hoje toda a nossa atenção deverá recair
de uma comunicação aos professores
sobretudo sobre o abandono de animais
“pedindo-lhes
mensalmente,
domésticos, o tratamento dado aos
façam uma prelecção aos seus alunos,
animais de produção e ao retrocesso
incutindo no espírito dos mesmos a
civilizacional que se está a assistir com
bondade para com os animais, que não é
a tentativa de introduzir touradas onde
mais do que um coeficiente da bondade
não são tradição e de agravar a tortura
universal”.
dos touros bravos, com a legalização da
os
que
para
que,
sorte de varas e touros de morte. Mas, Alice Moderno não se preocupava apenas com os animais de tiro, pois
Alice
Moderno,
uma das suas preocupações foi a
indiferente às touradas. Foi convidada e
criação de um posto veterinário para
assistiu contrariada a uma tourada, na
tratamento de todos os animais. A
ilha Terceira, e não ousou comunicar
propósito dizia ela:
aos
seus
também
amigos,
não
foi
considerando-os
“semi-espanhóis no capítulo de los “Caridade não é apenas a que se
toros”, o que pensava pois, escreveu
exerce de homem para homem: é a
ela, “não compreenderiam decerto a
que abrange todos os seres da
minha excessiva sentimentalidade”.
Criação, visto que a sua qualidade de inferiores não lhes tira o direito
Na sua carta XIX, referindo-se à
aos
tourada a que assistiu escreveu o
mesmos
piedade
e
prodigalizamos semelhantes”.
sentimentos de
justiça aos
de que
seguinte:
nossos “É ele [cavalo], não tenho pejo de o confessar, que absorve toda a minha simpatia e para o qual voam os meus melhores desejos. Pobre animal, ser incompleto, irmão nosso inferior, serviu o homem com toda a sua dedicação e com toda a sua lealdade,
consumindo em seu proveito todas
Ponta Delgada, 5 de Outubro de
as suas forças e toda a sua
2010
inteligência! (…) Agora, porém, no
Teófilo Braga
fim da vida, é posto à margem e alugado a preço ínfimo, para ir servir de alvo às pontas de uma fera,
I/FOTECA
da qual nem pode fugir, visto que
“ALICE MODER/O”
tem os olhos vendados!”
Este site tem por objectivo apoiar todos os amigos dos animais na sua luta por uma sociedade onde todos sejam
respeitados,
disponibilização “E esta fera [touro], pobre animal, também, foi arrancada ao sossego do seu
pasto,
para
ir
servir
de
de
através
da
documentação
diversa. É também uma homenagem à pioneira da defesa dos animais, nos Açores, Alice Moderno.
divertimento a uma multidão ociosa e cruel, em cujo número me incluo! (…) Entrará assim em várias toiradas, em que será barbaramente farpeada até que, enfurecida, ensanguentada, ludibriada,
injuriada,
procurará
vingar-se, arremessando-se sobre o adversário que a desafia e fere. Depois matreira,
de
reconhecida
tornada
velhaca
como pelo
convívio do homem, será mutilada”. Que o exemplo de Alice Moderno nos dê forças para os combates em que estamos envolvidos, por uma terra mais limpa, justa e pacífica.
https://sites.google.com/si te/infotecaalicemoderno/
Manifesto “Em Defesa do Animal” Desde 1930, em vários países do mundo,
Não estando de acordo com a política
o dia 4 de Outubro é dedicado aos
seguida actualmente para combater o
animais. Neste dia, são homenageados os
abandono que tem por principal pilar os
nossos amigos animais que, infelizmente,
abates, pois até hoje não tem resolvido
continuam,
ser
nada, consideramos necessário que a
desrespeitados por muitos humanos e
nível regional seja lançada uma campanha
nalguns casos por entidades públicas que
de esterilização com vista a adequar o
deveriam
número de animais de companhia ao
ainda
dar
o
hoje,
exemplo
a
à
restante
sociedade.
número efectivo de donos capazes de cuidar
deles
de
forma
responsável;
2- Promoção pública da tortura animal. Ao longo dos séculos da história dos Açores, a tauromaquia tem sofrido uma evolução no sentido da diminuição dos maus tratos aos touros, não constituindo qualquer tradição na maioria das nossas ilhas. Em 2009, contrariando a evolução que se Hoje, 4 de Outubro de 2010, o grupo de
assiste a nível internacional, onde aquela
pessoas individuais e colectivas manifesta
actividade é cada vez mais repudiada, e
a
as
ao arrepio dos ensinamentos da própria
seguintes problemas e situações de maus
história insular, um grupo de deputados
tratos
pretendeu legalizar a sorte de varas.
sua
preocupação
aos
animais
relativamente
ao
seguinte:
Gorada a sua intenção, a minoria de 1- Abate de animais domésticos. Todos os
industriais que aposta no incremento da
anos ultrapassa largamente um milhar o
tortura
número de animais de companhia (cães e
sobretudo
gatos) que são abandonados, acabando
conseguido promover algumas touradas à
na sua maioria por serem abatidos nos
corda com a colaboração sobretudo de
canis
autarquias e de comissões de festas de
municipais
ou
atropelados
nas
estradas. O esforço que é feito pelas associações de protecção dos animais, que se debatem com faltas de meios e de apoios públicos, acaba por ser inglório pois através dele só uma pequena parte dos animais abandonados consegue um novo lar.
animal, em
cariz religioso.
tenta São
ganhar Miguel,
adeptos tendo
Considerando que as touradas, qualquer
4- Cativeiro de animais não domésticos. A
que seja o seu tipo, em nada contribuem
criação de parques zoológicos nos séculos
para educar os cidadãos e as cidadãs para
passados
o respeito aos animais, para além de
mostrar ao público uma colecção de
causarem maus tratos aos mesmos e
animais exóticos que de outra maneira
porem em risco a vida das pessoas, não
nunca seriam vistos nem conhecidos. Na
podemos admitir a na sua realização
actualidade isto deixou de fazer qualquer
sejam
sentido.
usados
dinheiros
públicos;
respondia
Agora
ao
as
propósito
leis
de
exigem
obrigatoriamente aos parques a realização fauna
de programas de conservação, educação
selvagem. O cagarro é uma ave oceânica
ambiental e bem-estar animal. Como
que vem a terra apenas durante a época
consequência disto, nos Açores têm vindo
de reprodução. Este período decorre entre
a ser fechados núcleos zoológicos que
Março e Outubro, altura em que as crias já
incumpriam estas exigências. No entanto,
suficientemente
ainda
3-
Mortalidade
provocada
na
desenvolvidas
partem
continua
a
existir
um
núcleo
com os seus progenitores em direcção ao
zoológico na Vila da Povoação (São
mar,
Miguel).
dispersando-se
Atlântico
e
pelo
regressando
Oceano
apenas
no
próximo ano. Realizando-se a sua partida
Apesar do referido parque encontrar-se já
de noite, muitas crias são atraídas pelas
embargado pelas autoridades e apesar de
luzes
ser de titularidade pública, o recinto
das
nossas
vilas
e
cidades,
em
terra
ser
continua ainda hoje aberto ao público.
frequentemente atropeladas se não forem
Pelo manifesto desrespeito às leis e aos
ajudadas.
animais, consideramos que o parque deve
acabando
por
cair
e
ser imediatamente fechado e os animais Considerando
a
importância
que
o
conduzidos
a
umas
instalações
salvamento do maior número de cagarros
apropriadas que garantam o seu bem-
tem para a conservação da natureza e o
estar.
respeito
pelos
animais,
apelamos
à
participação de todos nas campanhas que
5- Modelos intensivos de produção animal.
ainda este mês serão postas em marcha
A exploração agrícola de animais constitui
pelas
historicamente
mais
diversas
entidades,
um
importante
sector
nomeadamente pelas organizações não
económico nas nossas ilhas. Se bem que
governamentais de ambiente.
os relatos de maus tratos a estes animais têm vindo a diminuir nas últimas décadas, evidenciando uma notável evolução da sociedade,
subsistem
ainda
bastantes
situações penosas. Para além disso, a introdução
de
técnicas
de
produção
intensiva tem vindo a piorar as condições
de vida de muitos deles, limitando a sua
homens,
vida ao reduzido espaço duma gaiola.
mesma natureza.
Tendo em conta a imagem de proximidade
Consideramos que o tratamento legal
à natureza que tanto caracteriza os Açores
dado aos animais deve fugir da visão
no exterior, consideramos que se deve
redutora que os converte em simples
reforçar o modelo tradicional de criação de
objectos. A nossa sociedade deve evoluir
animais, modelo que garante sempre a
para padrões éticos nos quais os animais
mais alta qualidade. Devem também ser
sejam respeitados em conformidade com a
criadas e publicitadas novas formas de
Declaração Universal dos Direitos dos
certificação nas explorações que valorizem
Animais.
como
partes
integrantes
da
devidamente ante o consumidor os seus níveis de qualidade ambiental, alimentar e
Açores, 4 de Outubro de 2010
de respeito pelo bem-estar animal. Subscritores colectivos: Grupo pelo Bem-Estar Animal, Amigos dos Açores – Associação Ecológica CADEP-CN
(Clube
dos
Amigos
e
Defensores do Património - Cultural e Natural de Santa Maria) APA - Associação Açoriana de Protecção dos Animais Amigos da Caldeira de Santo Cristo, Ilha 6- Falta de respeito com a vida animal.
de São Jorge
Numa sociedade em que tudo se compra e se vende, os animais são tratados muitas vezes
como
rebaixados objectos.
à Só
simples
mercadorias
categoria uns
e
de
simples
poucos
animais
Gê-Questa - Associação de Defesa do Ambiente CAES- Colectivo Açoriano de Ecologia Social
domésticos conseguem as vezes escapar a esta visão. Na realidade, como já foi demonstrado pela ciência há longos anos, os animais são os irmãos com os quais o homem
comparte
desrespeito também
para
a com
natureza. os
animais
o desrespeito para com
O é os
(Este manifesto foi assinado, também , por mais de 150 cidadãos a título individual)
Ética Libertária Interdependente práticas especistas costuma
ser
chamado de Veganismo (e a pessoa que Ecoveganismo – Bluwol 16 de maio de 2010
Dennis
Zagha
assume isto como uma forma de vida, de vegano ou vegana). Veganismo é algo como um princípio que pode ser
Apresentação
expresso
racionalmente
de
várias
Uma idéia é cada vez mais comum em
formas, como esta: achamos errado
nossa sociedade: a necessidade ética de
tratar um ser senciente de qualquer
se relacionar com os animais não
espécie como propriedade e, portanto,
humanos como indivíduos merecedores
tratá-lo do modo como nós, humanos,
de liberdade e respeito. Conviver com
achamos que devemos tratá-los, de
eles
acordo com nossos próprios interesses.
não
como
instrumentos
para
mercadorias as
ou
vontades
humanas, mas como seres merecedores do mesmo direito que nós a viver suas vidas de acordo com seus interesses. Estas reflexões éticas sobre nossas relações
com
animais
de
outras
espécies baseiam-se na idéia de que há um especismo em nossa mentalidade padrão. Ou seja: do mesmo modo que
Deste princípio, ou de algo com este
muitos são sexistas (crêem que o sexo
espírito, muitas conclusões e práticas
de um indivíduo o faz mais ou menos
diferentes podem derivar.
digno de respeito) ou racistas (crêem que a raça ou etnia de alguém o faz mais ou menos digno de respeito), nossa moralidade padrão crê que membros da espécie humana são, por definição, mais dignos de respeito do que membros de outras espécies.
Tenho a impressão
de que este
princípio vegano, ainda que possa ser expresso
assim,
organizado
racionalmente, não nasce já assim, racionalizado. Nasce mais no âmbito do sentir, do saber o que é o sofrimento, a tortura, o cárcere, a
O conjunto de ações cujo objetivo é
sensação
de
ser
explorado
e
(tentar) viver a vida rompendo com
escravizado e entender que outros
animais, que possuem em comum
de fuga, destruição de seus locais de
conosco a sensibilidade e consciência
residência, de busca por comida,
de seus mundos (são sencientes),
companhia e reprodução. Cabe criticar,
também não devem ser alvos de
portanto, ações que tratam o planeta
imposição
como
de
sofrimento,
tortura,
propriedade
exclusiva
dos
cárcere, exploração, escravização, etc.
humanos (de alguns humanos mais do
Deste reconhecimento, princípios vão
que dos outros).
sendo sempre retrabalhados pela razão, gerando novos sentimentos e novas racionalidades. E estes argumentos racionais, ao serem transmitidos para outras pessoas, só tornam-se novas práticas em cada indivíduo quando conseguem
tocar
e
modificar
sentimentos e sensibilidades. De qualquer maneira, a questão é que
A crítica a esta posição pode levar a
se
vegana
estiver
uma vontade de ruptura radical com as
pessoa,
muitas
próprias bases disto que chamamos de
atitudes diferentes poderão decorrer.
civilização . De qualquer forma, o que
Algumas atitudes são já mais notórias
pode ser feito já hoje? O que pode ser
socialmente – ao menos entre a
construído para o futuro?
a
mentalidade
presente
em
uma
população vegana e simpatizantes: as discussões e ações do direito animal, as discussões éticas na filosofia, a crítica à vivissecção, o vegetarianismo, a crítica ao uso de animais em circos, rodeios,
A
seguir,
possibilidades
aponto de
algumas
ampliação
da
mentalidade vegana. São discussões que às vezes são colocadas como periféricas às preocupações centrais do
etc.
Veganismo: a questão ecológica, a Porém, ainda podemos ir além e
questão da saúde humana e a questão
questionar outras práticas que tratam os
da exploração dos próprios humanos. A
outros animais como não dignos de
idéia é desconstruir as barreiras entre
valor
ética,
e
respeito,
causando-lhes
sofrimento, tortura, morte, necessidade
questão
economia
e
ambiental, política,
saúde, tentando
compreender o mundo e o Veganismo
Muito
de
Veganismo e as teorias sobre direitos
modo
interdependente
e
da
animais Trata-se, assim, de certa autocrítica ao Veganismo (o que não se trata de negáe
que
embasa
o
dos animais vem do fato de que os
ecossistêmico.
lo)
idéia
aos
modos
de
agir
dos
movimentos veganos.
são
seres
sencientes
e,
portanto, indivíduos merecedores de respeito individual. O Veganismo é assim uma quebra com a idéia de ecologia pautada apenas nas espécies e ecossistemas, onde o que importa é o número
de
indivíduos,
“sobrevivência”
da
a
espécie,
a
exploração controlada da natureza. Assim como não pensamos deste modo em relação aos humanos, não devemos pensar assim em relação aos outros animais. A questão principal não é se há ainda espécimes vivos de uma
Ecoveganismo
espécie ou se o número de seres mortos Um
caminho
de
importância
é
a
Veganismo
com
fundamental
aproximação as
em um ano está dentro dos parâmetros
do
legais para a manutenção da existência
discussões
da espécie. Cada indivíduo deve ser
ambientalistas (e suas implicações
respeitado como tal.
políticas, econômicas, culturais). É pensar o Veganismo não apenas como uma opção de consumo – o que apenas possui poder transformador até certo nível -, mas, principalmente, como a construção de outros modos de viver e se relacionar; a construção de outras culturas, de outras formas de estar inserido no todo, de fazer parte da natureza.
Respeitar
os
fundamental
ecossistemas quanto
é
tão
respeitar
os
indivíduos. A própria oposição entre os dois já é problemática. Não há respeito a um sem respeito ao outro, pois são a mesma coisa. Todos os indivíduos da natureza dependem, para sobrevivência própria,
das
inúmeras
relações
ecossistêmicas nas quais está inserido. A vida é um infinito conjunto de relações, que devem ser respeitadas
tanto quanto o direito de cada ser de
anticoncepcionais,
substâncias
viver em liberdade de acordo com seus
sintéticas, substâncias petroquímicas…
próprios interesses (mesmo que sejam
A lista poderia ser ainda muito mais
interesses da espécie toda). E mais: o
longa.
“todo”, a “natureza”, não é algo que exista em si, como um ser autônomo. É o resultado da união dos seres e fenômenos individuais. “Natureza” é
Estas coisas são tão violentas com os animais e com toda a vida quanto outras violências contra as quais o Veganismo já se opõe. Talvez pareça
uma abstração humana.
loucura querer ampliar a prática vegana neste momento, se pensarmos que nem o que já se propõe é ainda bem recebido socialmente, quanto mais romper com os próprios paradigmas desta civilização, cujo pilar é a crença que toda a natureza está aí apenas para servir aos interesses humanos e pode ser modificada tanto quanto quisermos É preciso pensar, então, naquilo que é,
para
certamente, altamente prejudicial – ou
interesses. Pode ser loucura, passos
melhor, destrutivo – aos ecossistemas e
maiores do que as pernas, mas também
toda vida que há neles. Exemplos
pode ser o oposto: só com um
muito comuns: exploração de matéria-
rompimento
prima em escala industrial; criação de
exemplo de que é possível viver de
substâncias
tóxicas,
forma melhor em outros modelos de
cancerígenas, poluentes; uma cultura
mundo é que mais pessoas perceberão
fundada na petroquímica; agrotóxicos;
que a vida pode ser muito mais digna
mega-máquinas
para
sintéticas,
agropecuárias;
agropecuária; pecuária; monocultura; alimentação
industrial;
medicação
industrial para doenças industriais; excreção de excrementos com toxinas, hormônios, medicamentos, resíduos de plásticos,
antidepressivos,
servir
todos,
melhor
mais
aos
profundo
nossos
e
independentemente
o
da
espécie. Não há grandes mudanças fáceis. Mas por
mais
complicadas
que
essas
mudanças radicais possam ser, creio serem menos complicadas e muito mais
dignas do que nossas inacabáveis
e espécies nativas inteiras mundo afora
jornadas de trabalho, circulação urbana,
e ainda gera pobreza e desigualdade.
contas, impostos, anos de educação
Será que nossa vida urbana, onde o
para o mercado, má alimentação,
máximo de opção que possuímos é
péssima saúde, nervosismo, angústia,
escolher
solidão, dificuldade de concentração,
queremos comprar abre espaço para
dificuldade
entre
uma real relação respeitosa com o resto
outras características deprimentes da
da natureza, inclusive com os outros
sociedade do trabalho e da distância em
animais?
de
convivência,
qual
produto
industrial
relação à produção e ao consumo de alimentos e moradia. de alimentos e moradia. É preciso radicalizar as transformações nas relações humanas com o resto da natureza. Ir além do veganismo de consumo: questionar o uso de produtos industrializados que utilizam grandes de
É importante que além de não consumir
da indústria
produtos advindos da exploração direta
petroquímica, de químicos sintéticos,
de animais, haja a preocupação também
de toxinas, etc. Estes podem até serem
com
feitos apenas de produtos vegetais e
ecossistêmicos de cada ato. Algo difícil
sintéticos e não serem responsáveis
de realizar neste modo de vida ao qual
pela morte de um animal específico,
fomos ensinados a viver, com estes
porém são responsáveis pela destruição
modelos de urbanidade, com nossa
de ecossistemas inteiros: de oceanos,
cultura
florestas, rios, atmosfera, etc. E, claro,
massificação. Mas necessário. O que
de um número incontável de animais.
fazer então? Outros mundos fazem-se
quantidades ingredientes
de
embalagens,
advindos
os
de
danos
ecológicos
consumo,
controle
necessários. Serão ainda possíveis? É preciso questionar também as fontes de
produtos
vegetais,
geralmente
grandes monoculturas com alto uso de agrotóxicos que destroem ecossistemas
e
e
A alimentação padrão da humanidade
Saúde vegana
urbanizada contemporânea depende de É muito comum nas reflexões da chamada ética animal entender que o Veganismo é uma questão ética que diz respeito apenas a nossa relação com outros animais, não com o como cuidamos de nosso próprio corpo. Mas será que há mesmo, do ponto de vista ecossistêmico, esta oposição? Respeitar outro ser independe do quanto você respeita a si mesmo? Respeitar a si mesmo independe de quanto você respeita outro ser? Há uma relação entre o que come e como percebe, pensa e vive o mundo?
ecológica – interna e externa; é a opção de como nos conectaremos nas cadeias Optar
envolve
consciência, pensamento, coragem, fé, aposta. Não é algo óbvio. Daí nossa necessária reflexão ética.
industrial, monoculturas, latifúndios, agrotóxicos,
gera
uma
quantidade
enorme de lixo industrial altamente poluente, empesteia os solos, águas e ares com produtos químicos, tóxicos, sintéticos, gera péssima saúde em pessoas
que
passam
a
usar
medicamentos que poluem ainda mais, gera
excrementos
humanos
contaminados indo para solos, águas e ares, expulsa os animais das áreas de plantio e extração de matéria prima, poluem os outros lugares, pois a
Alimentação saudável é uma questão
alimentares.
extração de matéria-prima em escala
poluição percorre por águas e ares todo o planeta, etc. Ou seja, a preocupação com o que comer é central nas preocupações
ecoveganas
acima
apontadas. Alimentação ética, para mim, vai além de conter ou não ingredientes
de
origem
animal.
É urgente que pensemos e coloquemos
tentativa de abandono de alimentos
em
industriais,
prática
formas
diferentes
de
processados,
refinados,
produzir e consumir nossa comida,
sintéticos, e verão por si mesmos o que
tanto quanto é urgente pensar no que
muda em vossos corpos e mentes. É
devemos ou não ingerir . Saber
uma
escolher entre o que é alimento e o que
indivíduos e, ao mesmo tempo, em
é apenas mastigável, saber como e por
nossa relação com todos os outros seres
quem nosso alimento é produzido. Não
que dividem o planeta conosco e
há como justificar que o alimento que
possuem
mantém a vida de um necessite destruir
vivendo,
a vida e a qualidade da vida de muitos.
locomovendo, se reproduzindo tanto
Precisamos de um padrão alimentar
quanto nós mesmos, em ambientes
que respeite ao máximo todas as
decentes, limpos e diversos.
mudança
o
incrível
direito se
para
de
os
continuar
alimentando,
se
formas de vida. Inclusive nós mesmos. Libertação
animal,
libertação
humana A libertação dos animais das amarras criadas para eles pelos humanos é tão importante quanto a libertação dos humanos de suas próprias amarras. Ambas
são
desnecessárias
injustiças,
violências
baseadas
em
Uma discussão, ainda no que se refere
preconceitos e discriminações onde
ao padrão alimentar, é a clara relação
membros de um grupo crêem que
entre o que se come e como se percebe
possuem o direito de subjugar os
o
e
membros de outro grupo: humano-
saúde.
animal, homem-mulher, heterossexual-
mundo.
vitalidade,
Entre
alimentação
concentração,
“Alimentos” que diminuem vitalidade,
homossexual,
energia e concentração são obstáculos à
pobre,
compreensão
africano, etc.
e
transformação
do
mundo em que vivemos. Ainda, geram doenças que tiram as pessoas de circulação ou a atrapalham. Proponho a
branco-negro,
burguês-proletário,
rico-
europeu-
A humanidade sente-se no direito de
Se o ser humano é também um animal
explorar os animais para seus próprios
com direito à liberdade, a exploração
fins e para gerar sua própria riqueza
de seu trabalho deve ser questionada
material, assim como os ricos e donos
pelos
dos meios de produção (burguesia)
libertação animal. O Veganismo torna-
sentem-se no direito de explorar os
se
pobres e proletários para seus próprios
social. Assim, as idéias trazidas pelo
fins e para gerar sua própria riqueza
veganismo se mostram de natureza
material. Ou seja, uma parte da
muito mais ampla. São partes de um
humanidade sente-se como elite social
processo de ruptura radical com uma
com direito de explorar o resto da
sociedade baseada na injustiça, na
espécie, assim como a espécie humana
propriedade,
sente-se como elite do planeta com o
É preciso, portanto, transformar os
direito de explorar o resto da natureza.
nomes
movimentos
político,
e
idéias
econômico,
na
“libertação
de
ecológico,
exploração.
animal”
e
“libertação humana” em reais práticas As preocupações com a exploração de
libertárias.
humanos e de suas forças de trabalho, de seus tempos de vida, de suas
Fonte:
dedicações para si mesmos e para
http://www.anda.jor.br/2010/05/16/am
aquilo que lhes interessam devem fazer
pliando-a-pratica-vegana-
parte das preocupações de um mundo
ecoveganismo/
baseado no respeito e na liberdade tanto quanto as preocupações com a exploração dos outros animais.
A agroenergia serve à vida ou ao capital? obedece a dois imperativos: 1), a curta
Leonardo Boff
longevidade do petróleo, cerca de 40 anos; No artigo anterior abordamos a energia
do gás, 60; e 200 para o carvão; 2) a
como
do
salvaguarda do meio ambiente e o controle
universo, especialmente, a Energia de
do aquecimento global que, descuidado,
Fundo que sustenta o cosmos e cada ser.
pode pôr em risco toda a civilização.
um dos
maiores enigmas
Agora concentramo-nos na agroenergia, a mais saudada nos dias atuais por causa da crescente exaustão da matriz energética fóssil. Ela é vista como uma espécie de Arca de Noé salvadora do atual sistema.
Mesmo assim, um substituto à energia fóssil não é ainda, a médio prazo, alcançável. A agroenergia representará em 2012 apenas 2% do consumo global e poderá chegar a 7% em 2030, supondo a
Naturalmente, a energia, pouco importa seu tipo, é imprescindível para tudo, particularmente é o motor da economia de mercado e serve para todas as civilizações.
utilização
do
agricultáveis
conjunto
da
Austrália,
das da
terras Nova
Zelândia, do Japão e da Coreia do Sul. Se fossem utilizadas todas as superfícies produtivas da Terra, elas alcançariam o
Quem quiser ter um apanhado bem fundado do tema numa perspectiva global, passando
pelos
países
produtores
e
analisando os principais agrocombustíveis e, em geral, a bioenergia, deve ler o livro, de François Houtart, A agroenergia: Solução para o clima ou saida da crise para o capital? (Voz es 2010). O autor,
equivalente ao petróleo que é um bilhão e 400 bilhões de barris/ dia. Ora, as demandas atuais se elevam a 3 bilhões e 500 milhões, tendendo a subir. Aqui emerge um impasse sistêmico. Tal fato obrigaria a pensar num outro modo de produção
e
de
consumo,
menos
energívoro.
sociólogo belga, muito conhecido em todo o Terceiro Mundo por ter criado em Louvain um centro tricontinental onde forma quadros da melhor qualidade, vindos do Grande Sul, para atuarem de forma tansformadora em seus respectivos países, entre eles muitos brasileiros. É um dos fundadores e animadores do Forum Social
Se houvesse sentido de futuro coletivo, compaixão
para
com
a
humanidade
sofredora, grande parte dela submetida à fome, à escassez de água potável e a todo tipo de enfermidade, e se predominasse o cuidado para com a Mãe Terra contra a qual movemos guerra total no solo, no subsolo, nos ares, nos rios e nos oceanos,
Mundial.
refletiríamos seriamente como encontrar A
utilização
de
energias
renováveis
um modo de habitar o planeta com mais
sinergia com os ritmos da natureza, com
custa da dominação da natureza e da
responsabilidade coletiva pela inclusão de
criação de perversas desigualdades sociais.
todos e com benevolência para com a
Hoje, ele está encostando nos limites da
comunidadede vida. Agora seria a grande
Terra, cujos recursos estão se extenuando.
ocasião. Mas nos falta sabedoria, e ainda
Está realizando a profecia de Marx,
acreditamos nas possibilidades ilusórias do
segundo a qual ele iria destruir as duas
desastroso sistema capitalista que nos
fontes de sua riqueza: a natureza e o
levou ao impasse atual.
trabalho.
Ora,
estamos
assistindo
exatamente ao cumprimento desta sinistra O
drama
que
envolve
as
energias
profecia.
alternativas reside no fato de que elas foram sequestradas pela lógica do capital.
A agroenergia não pode estar a serviço da
Este visa lucro crescente e nunca toma em
reanimação de um moribundo mas deve
consideração as externalidades que não
reforçar a vida que demanda outro tipo de
entram no cálculo econômico (como a
produção e de relação não destrutiva para
degradação da natureza, a poluição do ar, o
com a natureza. O tempo para isso é
aquecimento global, o crescimento da
urgente, para não chegarmos atrasados.
pobreza). Elas somente serão tomadas a sério quando forem tão negativas a ponto
Fonte: Jornal do Brasil
de prejudicarem as taxas de lucro do capital. Por isso, não nos enganemos com as empresas que alardeiam o caráter verde de sua produção. O verde vale desde que não afete os lucros nem diminua a capacidade de concorrência.
busca de energias alternativas limpas não intenciona forjar formas de salvar o gênero humano e suas capacidades vitais mas visa a preservar a sorte do sistema do capital sua
lógica
do
http://www.diarioliberdade.org/index.php? option=com_content&view=article&id=72 99:a-agroenergia-serve-a-vida-ou-aocapital&catid=100:outras-
Importa dizer com todas as palavras: a
com
Extraído de:
ganha-perde.
Ora, esse sistema, com flexibilidade e adaptação espantosas, é capaz de produzir ilimitados bens e serviços mas sempre à
vozes&Itemid=21
O Ecologismo não tem nada a dizer sobre a greve geral? (*) As duas centrais sindicais portuguesas, CGTP e UGT, convocaram para o próximo dia 24 de Novembro uma greve geral de protesto contra as medidas anti-sociais tomadas pelo governo nacional, com reflexos na Região Autónoma dos Açores que se traduzem no aumento das desigualdades sociais, em cortes nos apoios sociais, no roubo nos vencimentos de uma parte os funcionários públicos, na supressão de direitos laborais, no aumento do desemprego, etc. À crise económica e social que atravessamos está associada uma crise ambiental, que é resultado da utilização dos recursos acima dos limites da Terra, no desperdício dos recursos básicos quer materiais, quer energéticos, na contaminação do ar e da água, etc., de que serão sinais a perda da biodiversidade e as alterações climáticas. A crise económica, social e ambiental resulta do sistema económico vigente que está a exigir dos mais pobres e desfavorecidos mais sacrifícios a fim de satisfazer as exigências dos mercados. Para ultrapassarmos a situação actual, há a necessidade de se acabar com os discursos vazios de conteúdo e colocar o ambiental e o social com um peso que não seja inferior ao económico.
Assim, não podemos estar de acordo com a forma como os governantes e outros capatazes do sistema pretendem sair da crise. Não aceitamos um recuo a políticas laborais que nos fazem lembrar as do século XIX (precariedade no trabalho, batalhões de desempregados, trabalho mal remunerado, etc.). Repudiamos, também, politicas ambientais que menosprezem as questões ambientais e em que a prioridade é dada ao moledo económico vigente que serve apenas os interesses de uma minoria.
Embora não concordando com as políticas seguidas pelos governos e discordando das burocracias sindicais e dos aparelhos partidários, os movimentos ecologistas e de defesa do ambiente não podem ficar à margem desta problemática e da necessidade de mobilização em defesa de um outro modelo económico e de outras políticas. Por isso, manifesto o meu apoio à convocatória da Greve Geral. 8 de Outubro de 2010 T. B. (*) Baseado num texto de Ecologistas en Accion