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O DESCOBRIMENTO Há 521 anos ouro em troca de apito. Hoje, suor e sangue por Bolsa Família
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Em tempos “normais”, grande parte do povo luta contra a fome. Nos dias de hoje, de pandemia, fila para respirar
Um olhar sobre a história do povo brasileiro – do trabalhador assalariado, do operário, enfim, dos menos afortunados – vemos, naturalmente que de forma caricata, que na essência pouco mudou dos tempos do descobrimento e da colonização, para os dias atuais. O que se deseja enfatizar é que o cerne da situação, a exploração, é praticamente a mesma: os ‘colonizadores’ que aqui chegavam devam aos habitantes – ao povo de então – apito e espelhinho. Em troca, levavam ouro e madeira. E os índios ainda ficavam satisfeitos, agradecidos e devendo favor.
Desde os tempos da antiga Vera Cruz, também chamada de Terra da Santa Cruz antes de se chegar ao nome Brasil (1512), vemos que a relação entre governantes e governados não mudou muito. Modernizou-se, ganhou novos contornos, adaptou-se ao século 21, mas o eixo continua o mesmo.
Nos nossos tempos, “novos” tempos, os governos dão cheque-cidadão, bolsa isso e bolsa aquilo –, enquanto os governados – em sua grande maioria trabalhadores – entregam, em troca, suor e sangue, tirados, dia após dia, ao longo da vida, de trabalho árduo e penoso. Os que estão empregados – a maioria para um salário de fome – se dão por satisfeitos quando o dinheiro dá para comprar a comida e, com sorte, vez por outra, um brinquedinho barato para os filhos.
Em resumo, este é o espelho do Brasil, que ao longo de mais de meio século cultiva uma desigualdade absurda e que não distribui com sua gente as riquezas naturais. Ao contrário, vem mantendo em diferentes épocas e ciclos o mesmo padrão: uma minoria cada vez mais rica à custa de uma imensa maioria cada vez mais pobre.
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Antes de tudo, quando se fala em ‘Descobrimento’, como ensinam os livros escolares, é necessário algumas ressalvas que mostram não estar absolutamente comprovado o que historicamente se apresenta como prova. Primeiro, porque o território onde chegou a esquadra de Pedro Álvares Cabral, além de habitado, sempre esteve onde está. Logo a “descoberta”, em conceito geográfico, é relativa. Segundo, como o comandante lusitano não nos deu identidade política, mas, bem diferente disso, conquistou terras para Portugal, sob essa ótica é para lá que se vê o episódio auspicioso, não aqui. Isso, para não citar que ‘descoberta de território’ remete a alguma coisa erma, inabitada e desocupada, quando, de fato, em 1.500, a ‘terra nova’ já contava com aproximadamente 5 milhões de índios. Assim, a chegada de Cabral nada tem de festivo com o “nosso” Brasil. Exploração contínua – Os índios, verdadeiros donos da terra, foram em grande parte escravizados e mortos. Há relatos de que até doenças europeias teriam sido propositalmente transmitidas para dizimar tribos. De início, a exploração de pau -brasil, ouro e pedras preciosas. Mais tarde, a cobrança tirânica de impostos abusivos. Quem não pagasse, ia para a forca ou era deportado para a África. Foram mais de 300 anos de exploração explícita em troca da ‘colonização’ que levava tudo e deixava uma ou outra benfeitoria. É o que a história trata como jugo português. De mais a mais, uma segunda versão – das várias de que se tem notícia – afirma que outro comandante português, Duarte Pacheco Pereira, foi quem primeiro chegara à terra tupiniquim, em 1498, nas vizinhanças dos hoje estados do Maranhão e Pará. Logo, à luz desses supostos fatos, Pacheco – e não Cabral – foi o descobridor. Afinal, descobrir é uma coisa, conquistar ou explorar, outra bem diferente.
Versões desencontradas - Não apenas a rota-Pacheco, mas muitas outras versões relativizam a história oficial (ou as histórias, por serem várias) e colocam em xeque o que se pode entender como fato. De toda sorte, a versão Duarte Pacheco faz todo sentido. Numa época em que Portugal e Espanha expandiam seus domínios, a descoberta de Pacheco (esta sim, por acaso), teria que ser guardada a sete chaves para não chegar ao conhecimento dos espanhóis. Residiria aí o motivo para que rapidamente D. Manuel reunisse uma esquadra tão impressionante, formada por 13 navios e 1.500 tripulantes – incluindo marinheiros, soldados, agentes comerciais, escrivães e membros de comunidades religiosas –, com ordens para que sem demora partisse de Lisboa sob o comando de Cabral. Além disso, o rei recebera informações de Vasco da Gama, que havia retornado a Portugal um ano antes, em 1499, de que teria avistado “terra firme” quando navegava para as Índias. Seria a costa brasileira. Por essa narrativa fica derrubada a tese do acaso: se D. Manuel já sabia, a frota de Cabral zarpou com a missão secreta e específica de vasculhar o Atlântico e chegar à ‘terra firme’ já descoberta por Pacheco e avistada por Vasco da Gama, para só depois, então, seguir para as Índias.
Pandemia expõe empobrecimento
O Brasil-Colônia foi de exploração em todos os sentidos e sobre isso não há controversa. A independência trouxe o império e com ele os privilégios das elites portuguesas já aqui instaladas em detrimento do brasileiro nato que seguiu pobre e quase escravizado pelos senhores de terra que formavam a aristocracia rural. A própria república levaria anos para mudar o status-quo e assim o Brasil foi recebendo, de década em década, o legado da pobreza de muitos e do enriquecimento de poucos. Talvez excetuando o período de Getúlio Vargas e, com boa vontade, o de Juscelino, o Brasil não conseguiu que os filhos da terra fértil e de dimensões continentais dela tirassem o proveito que lhe é de direito. Entra governo e sai governo, via de regra o que prevalece é a pobreza vista na absoluta falta de políticas públicas eficientes capazes de oferecer aos mais humildes razoável qualidade de vida. Ao contrário, o simples do povo não tem acesso à habitação, a salário digno ou a saúde de qualidade. Educação é um luxo e ter emprego – qualquer emprego – é quase uma sorte para os menos qualificados. Até mesmo o saneamento básico falta a uma fatia enorme da população e o transporte público é uma vergonha. Enfim, no geral, o serviços essenciais são um desastre. Por conta da pandemia, que expõe drasticamente o precário sistema hospitalar do País, o brasileiro tem que entrar na fila para esperar vaga em UTI que lhe permita respirar. É isso mesmo: fila para respirar. E a pobreza escancara sua face mais cruel com o “auxílio emergencial” insuficiente para que os que milhões de brasileiros classificados como ‘vulneráveis’ possam ter comida na mesa. Em resumo, nada há para comemorar no 22 de abril. A Covid no Brasil mata em proporção acima do suportável. A falta de coordenação e liderança do governo da União se junta à incompetência dos governos estaduais e municipais e suscitam as perguntas: deixando a esfera federal de lado, os municípios ricos do interior de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Minas, do Paraná e de outros estados não conseguem dinheiro para montar UTIs? Não têm como reunir fundos e comprar respiradores na quantidade necessária? Não é algo estranho que anunciem a instalação de 10 ou 20 leitos como se fossem centenas? Deve ser visto como normal que depois de um ano de pandemia, em estados abastados e em municípios igualmente abastados, haja fila de espera para respirar?