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A Nova Era do Paul do Boquilobo
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O Paul do Boquilobo, primeira Reserva da Biosfera reconhecida em Portugal pela Unesco em 1981, entra num novo ciclo da sua história, chamando a população a participar nas decisões de gestão do território. O novo zonamento da Reserva abrange agora 5.900 hectares, inclui uma área agrícola considerável e traz novas oportunidades para o desenvolvimento sustentável da economia da região. A Unesco pronuncia-se em Fevereiro sobre a manutenção do estatuto. Nélia Silva geral@comunicland.pt
| «É de facto um modelo
inovador» Mário Antunes, presidente da ONGATEJO, entidade que assume a presidência do novo órgão de gestão da Reserva da Biosfera do Paul do Boquilobo, fala sobre os novos desafios e oportunidades inerentes à chancela de qualidade da Unesco. Foi entregue no final de Setembro à Unesco o dossier que visa manter o estatuto de Reserva da Biosfera no Paul do Boquilobo. Porque foi necessária esta diligência?
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A exigência resulta de uma decisão do Conselho Internacional de Coordenação do Programa Man and Biosphere (MaB), da Unesco, que alterou o conceito de Reserva da Biosfera, posteriormente ao reconhecimento do Paul do Boquilobo como Reserva em 1981. A Unesco entendeu alargar as competências das Reservas da Biosfera para além da conservação da natureza, incluindo a diversificação de atividades, a monitorização e sensibilização ambiental e a investigação, ou seja, optou por integrar o Homem e sua atividade no território, em sentido lato. Em 2013 a Unesco convidou o Paul do Boquilobo a adaptar-se às novas exigências como condição para manter o estatuto. Fez três recomendações ao órgão de gestão anterior – o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF)- : chamar
os agentes locais a participar ativamente na definição da estratégia da Reserva; criar um novo modelo de gestão conjunto que incluísse esses mesmos agentes e alargar o território da Reserva, de modo a incluir o Homem e as atividades económicas. Em 2014 a ONGATEJO, o ICNF e a Câmara Municipal da Golegã assinaram o protocolo do novo modelo de gestão, que inclui um Conselho de Gestão e um Conselho Alargado (órgão consultivo), e estabelece um novo zonamento da Reserva. Iniciamos de imediato a operacionalização do novo modelo e já estamos a desenvolver atividades no terreno. O novo modelo de gestão da Reserva é inovador. Inclui além do Conselho Executivo, órgão consultivo onde têm assento mais de 52 entidades. Quais os principais
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desafios e mais-valias esperados na implementação deste modelo? É de facto um modelo inovador por várias razões: pela primeira vez uma entidade privada preside ao órgão de gestão da Reserva da Biosfera por outro lado envolve a participação ativa dos agentes locais na estratégia da Reserva, ajudando à conservação da natureza e à dinamização do território. O grande desafio reside em fazer com que a Reserva da Biosfera do Paul do Boquilobo incorpore na região as mais-valias inerentes a esta chancela de qualidade, criando novas oportunidades de negócio, contribuindo para diversificar as atividades e para o reconhecimento público da sustentabilidade deste território. A ambição é tornar a Reserva num dos territórios mais qualificados, atrativos e produtivos da região. Há meios para o fazer? Na área atual da Reserva – 5.900 hectares – a atividade agrícola é predominante e trata-se de uma agricultura de ponta, do ponto de vista tecnológico, da produção e da rentabilidade, mas também muito evoluída na preservação dos recursos naturais, através de boas práticas agrícolas, que visam a sustentabilidade ambiental e social. O passo seguinte é promover em Portugal e no Mundo o património natural e cultural da região. Para chegar lá traçamos três linhas de ação: melhorar as condições naturais do território (criar percursos pedestres, eliminar focos de poluição de cursos de água); investir na comunicação da Reserva (através de um site e uma newsletter mensal, já implementados; e da participação em redes nacionais e internacionais) e persistir no trabalho de sensibilização dos agentes locais e da população para a utilização sustentável dos recursos hídricos e do solo. Os agricultores da região já praticam uma agricultura sustentável, em linha com as exigências da qualificação da Reserva? Na área agrícola integrada no novo zonamento da Reserva cerca de 70% já se encontra certificada por protocolos voluntários que têm por base as Boas Práticas Agrícolas (GlobalGAP, Produção Integrada, gestão de recursos hídricos através de avaliação e certificação de sistemas de rega, sondas de monitorização da água no solo para acon-
selhamento na gestão da rega, sistema de certificação de pulverizadores, todos serviços prestados pela Agrotejo e Agromais), o que permite um enorme reconhecimento do território do ponto de vista da sustentabilidade. Queremos que 100% da área tenha estas certificações e em 2016 vamos instituir um Selo de Qualidade da Reserva da Biosfera do Paul do Boquilobo. Em que consiste o Selo de Qualidade da Reserva da Biosfera do Paul do Boquilobo? Trata-se de criar um referencial de qualidade, transversal a todas as atividades económicas e específico por atividade, que esta-
Não e nem sequer há exigências adicionais às que resultam da legislação em vigor a nível nacional. Esta chancela de qualidade da Unesco não impõe qualquer nova regra ou condicionante. Qual será o papel dos agricultores no modelo de gestão participativo da Reserva? A Agrotejo esteve na génese da ONGATEJO, uma ONG da área do ambiente, porque um conjunto de agricultores estava preocupado com a sustentabilidade da atividade agrícola e com a preservação dos recursos naturais. Indiretamente a Agrotejo e a Agromais são impulsionadores deste projeto, porque
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«Na área atual da Reserva pratica-se uma agricultura de ponta muito evoluída na preservação dos recursos naturais», Mário Antunes, presidente da ONGAtejo.
belece um conjunto de normas ambientais, de gestão de resíduos e de promoção da Reserva. Este selo de qualidade vai permitir diferenciar dentro da Reserva os agentes que cumprem as melhores práticas na sua atividade, o que lhes trará mais-valias económicas, incentivando outros agentes a replicar as boas práticas. Resulta da Reserva da Biosfera algum tipo de limitação à produção agrícola no seu território?
foram elas a incentivar e a liderar a implementação deste novo modelo de gestão. As funções da Reserva são também alargadas à componente da investigação. Como vai ser colocada em prática? Estão integradas no Conselho Consultivo da Reserva a Escola Superior Agrária de Santarém, o Instituto Politécnico de Tomar, a Universidade de Coimbra e a Universidade de Lisboa. Cada uma delas está a desenvolver estudos que visam o conhe-
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cimento e a valorização do território da Reserva. Estão em curso, por exemplo, estudos sobre a monitorização da qualidade da água e sobre a gastronomia típica da área da Reserva. A sensibilização é o passo seguinte a desenvolver tendo por base estes estudos. Numa outra componente já fazemos ações de sensibilização com as escolas do ensino básico e secundário e principalmente junto dos agricultores.
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«Em 2016 vamos criar um Selo de Qualidade da Reserva da Biosfera do Paul do Boquilobo»
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Quais as conclusões do estudo do Instituto Politécnico de Tomar sobre a qualidade dos recursos hídricos da Reserva? A qualidade da água é uma questão de extrema importância. Existem alguns problemas de poluição no rio Almonda, que estamos a monitorizar semanalmente. Um dos focos mais problemáticos está resolvido com a ETAR de Riachos e acreditamos que outros focos de poluição provenientes de empresas privadas serão resolvidos a curto prazo.
ALGUNS Desenhos de um total de 160 apresentados pelos alunos das escolas básicas e secundárias da Golegã e Torres Novas no âmbito da criação do logótipo da Reserva da Biosfera do Paul do Boquilobo.
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A valorização do património cultural da região é outras das atribuições da Reserva… As localidades integradas na área da Reserva - Pombalinho, Azinhaga, Golegã, Riachos e Boquilobo - são aglomerados populacionais típicos, com tradições a preservar e que têm enorme potencial para atrair turistas. Semanalmente já temos uma grande afluência, até porque passa por aqui um dos Caminhos de Santiago (rota de peregrinação para Santiago de Compostela, na Galiza). Se o novo limite da Reserva for aceite, como esperamos, será também ele um reconhecimento do potencial endógeno destas localidades pela Unesco, que poderão beneficiar desta chancela no seu desenvolvimento socio-económico. 28
«Esta chancela de qualidade da Unesco não impõe qualquer nova regra ou condicionaNTE aos agricultores» Está estimado o impacto socio-económico da manutenção do estatuto de Reserva da Biosfera no Paul do Boquilobo? Ainda não, mas aderimos à Rede Portuguesa de Reservas da Biosfera, onde está representada a Universidade de Coimbra, que vai fazer essa avaliação para todas as Reservas da Biosfera a nível nacional. Ainda assim podemos afirmar com toda a certeza que a manutenção do estatuto de Reserva vai trazer um acréscimo de
Caraterização do novo zonamento da Reserva proposto à Unesco Indicador Área Total (ha) Zona Conservação (ha) Zona Tampão (ha) Zona Transição (ha) Atividades Económicas População Residente (hab.) Aglomerados Populacionais Concelhos abrangidos Freguesias abrangidas
atual
proposta
554 188 366 0 1 0 0 1 1
5896 813 1031 4052 8 8400 6 2 5
oportunidades e sustentabilidade a longo prazo para a região. O anterior Governo adotou o Compromisso para o Crescimento Verde, que visa promover a internalização da biodiversidade e o capital natural que ela suporta na estratégia de crescimento e desenvolvimento económico para o país. A Reserva do Paul do Boquilobo pode servir como um exemplo nestas matérias? Acreditamos que sim, porque as estratégias do Compromisso para o Crescimento Verde, têm por base muitas das ações que já estamos a desenvolver na Reserva, nomeadamente, a diversificação de culturas; o aumento do valor acrescentado bruto para as atividades ligadas à natureza é também um dos nossos objetivos, razão pela qual aderimos à marca Natural.pt, (somos a sua entidade local de gestão), e queremos que outros agentes da região adiram. Uma maior sustentabilidade das atividades económicas traduz-se num acréscimo de valor para os produtos.
Novos limites e zonamento do Paul do Boquilobo Reserva da Biosfera
O novo zonamento teve por base as condições naturais do território, o Homem e as suas atividades económicas. É composto por três zonas: Zona de Conservação (coincide com a atual Reserva Natural do Paul do Boquilobo); Zona Tampão (áreas húmidas, alagáveis pelas cheias do Rio Almonda) e Zona de Transição (zonas agrícolas e áreas habitacionais).
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A garça representa também o rio e riachos que correm no território da Reserva. As quatro cores que a circundam remetem para as 4 funções principais da Reserva – conservação da natureza, diversificação de atividades, sensibilização ambiental e investigação, e também representam as localidades incluídas no seu novo território : Pombalinho, Azinhaga, Golegã, Riachos e Boquilobo.