Agrovida 04setembro2015

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Este suplemento faz parte integrante da Vida Económica número 1603, de 4 de setembro 2015, e não pode ser vendido separadamente. Suplemento editado na 1ª semana de cada mês.

EMPRESAS, ASSOCIAÇÕES E UNIVERSIDADES CONVERGEM

Setor agroalimentar quer reforma do Estado e gestão rigorosa dos fundos europeus

pág. IV e V

Editorial TERESA SILVEIRA teresasilveira@vidaeconomica.pt

Uma nova legislatura: 8,5 mil milhões para gerir Portugal está no arranque de um novo ciclo de apoios comunitários. Tem à sua frente para gestão direta o Portugal 2020 (21 mil milhões de euros), o PDR 2020 (8,1 mil milhões) e o MAR 2020 (392 milhões). E dispõe ainda do programa quadro Horizonte 2020, o principal instrumento para financiar a investigação e a inovação na Europa e que estará em vigor até 2020 com um orçamento global de 77 mil milhões de euros, aberto também às candidaturas das empresas do agroalimentar. Certo é que, só para a agricultura, o agroalimentar, o desenvolvimento rural e o mar (pescas, aquicultura, comercialização e transformação), o titular

da pasta do novo Ministério da Agricultura que sair das eleições legislativas de 4 de outubro vai ter sob a sua gestão direta cerca de 8,5 mil milhões de euros. Este é um momento de avaliação do trabalho feito e de novas opções políticas. E por isso a “Vida Económica” assumiu o compromisso de incluir neste suplemento “AgroVida” um trabalho de diagnóstico da última legislatura no setor. E até um exercício de ‘mea culpa’ dos secretários de Estado do Ministério de Assunção Cristas sobre o que correu menos bem nos quatro anos que passaram, a que, ainda assim, Manuel Pinto de Abreu (Mar) não acedeu. Ao mesmo tempo, quisemos trazer-lhe informação e opiniões de especialistas reconhecidos nesta área – das empresas, associações e universidades - sobre as prioridades que o novo Executivo deve assumir no arranque do novo ciclo político que aí vem e na gestão dos fundos comunitários ao dispor de Portugal. Os dados estão lançados. A escolha é de cada um.

Destaques

Preço do leite cai para a produção e para o consumidor

págs. II e III

O ‘mea culpa’ dos secretários de Estado da Agricultura e da Alimentação

pág. VI

PROMAR: “falta de motivação para o investimento e deficiente gestão do Programa”

pág. VIII


II

sexta-feira, 4 de setembro 2015

sexta-feira, 4 de setembro 2015

III

Preço do leite cai para a produção e para o consumidor

Produtores de leite, cooperativas e indústria de laticínios estão assustados e em estado de alerta, devido à volatilidade do mercado dos lácteos em Portugal e na Europa e à quebra dos preços praticados, desde a ordenha da vaca leiteira ao linear do supermercado. As causas são antigas e transversais a vários países, mas alguns desenvolvimentos recentes, como o embargo russo e as dificuldades de exportação para os mercados tradicionais, o aumento da produção, a quebra do consumo, o abrandamento do mercado mundial e a liberalização do mercado com o fim das quotas leiteiras na UE, estão a conduzir o setor, particularmente em Portugal, a um ponto sem retorno à vista. Na cadeia de valor há, porém, um elo mais fraco: a produção, com os pouco mais de 6000 agricultores que ainda persistem cada dia mais “revoltados e desiludidos”. Carlos Neves, presidente da APROLEP, põe o dedo na ferida: “os produtores de leite estão a perder dinheiro”.

leite produzido acima da média dos anos anteriores”, diz. Ora, com um custo de produção estimado “entre 30 e 35 cêntimos”, Carlos Neves garante: “os produtores estão a perder dinheiro, revoltados e desiludidos”. Também Fernando Cardoso, diretor-geral da FENALAC - Federação Nacional das Cooperativas de Leite e Laticínios, faz o mesmo diagnóstico. E adianta para a “Vida Económica” as causas do problema: “a conjuntura é muito difícil, conforme aconte-

Leite em pó e manteiga geram margens negativas Para lá da produção, a “Vida Económica” também foi ouvir a indústria, que começa por dizer que “a pressão sobre o preço do leite não é um fenómeno exclusivo português”. Assim afirma Paulo Costa Leite, diretor-geral da Associação Nacional dos Industriais de Laticínios (ANIL), que agrega, entre outras empresas lácteas, a Lactogal, líder no mercado ibérico de lei-

teresasilveira@vidaeconomica.pt

ce, de um forma genérica, em toda a UE”, começa por dizer. Realça a seguir que “um conjunto de desenvolvimentos recentes, como o embargo russo, o aumento da produção, a quebra do consumo, o abrandamento do mercado mundial e a desregulamentação política na UE (com destaque para o fim das quotas leiteiras) conduziram a este desfecho muito negativo”.

te líquido e a que preside Casimiro de Almeida, que assume, em representação desta, a presidência da ANIL. Paulo Costa Leite diz que, “por força do desequilíbrio da oferta motivado por factores já bastante aprofundados, agravados ainda pela redução do consumo, tem-se verificado em toda a Europa uma descida generalizada do preço do leite ao consumidor, sem precedentes nos últimos anos”, o

O responsável da ANIL assume que, “em Portugal, a situação é particularmente dramática, pois a acrescer a este esforço verifica-se idêntica (senão maior) pressão sobre os preços de leite ao consumidor, já por si historicamente mais baixos que na generalidade dos países europeus”. Nos últimos dias chegou-se a “preços nos lineares que rondam os 45 cêntimos por litro”. E não estamos a falar das chamadas marcas brancas ou da distribuição, mas de algumas das marcas de fabricante com mais notoriedade e com os preços historicamente mais altos no mercado, como a Agros, por exemplo. Em paralelo, diz Paulo Costa Leite à “Vida Económica”, “vai-se tomando conhecimento da consciencialização da distribuição europeia relativamente às consequências para a sustentabilidade do setor da manutenção desta situação, tendo vindo a ser noticiadas ações concretas por parte da distribuição, com contornos diversos, que vão desde a aceitação da subida do preço do leite até ao compromisso de aprovisionamento nacional das suas marcas de distribuidores”. Porém, “tal compromisso não tem sido assumido pela distribuição nacional”, diz o diretor-geral da ANIL. E

adianta que, “ainda recentemente”, em reunião convocada pela tutela e conjunta com a Associação Interprofissional do Leite e Laticínios (ALIP), a Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED) “deixou bem clara” a intenção das empresas de distribuição “de continuarem a reger -se pelas regras do mercado”. E as regras do mercado são as da oferta e da procura. E incluem a importação de leite e produtos lácteos se os preços compensarem, independentemente da origem geográfica do produto, sempre com o argumento de responderem ao interesse do consumidor. AF_REP_AGRODIESEL_MP_257X185.ai

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Importações de leite e produtos lácteos no primeiro semestre de 2015 TIPO DE BENS - Leite e nata, não concentrados nem adicionados de açúcar - Leite e nata, concentrados ou adicionados de açúcar - Leitelho, leite e nata coalhados, iogurte, kefir e outros leites e natas - Soro de leite - Manteiga - Queijos e requeijão FONTE: FENALAC a partir do INE.

JANEIRO A JUNHO 2015

JANEIRO A JUNHO 2014

JANEIRO A JUNHO 2015

K

JANEIRO A JUNHO 2014

G 37.337.321

G 40.818.514

Kg 61.224.779

Kg 69.711.871

G 17.012.349

G 21.882.800

Kg 8.630.985

Kg 11.040.922

G 79.630.745

G 75.588.766

Kg 67.698.668

Kg 62.855.924

G 14.301.468 G 13.430.913 G 75.872.595

G 11.761.917 G 15.606.172 G 77.560.135

Kg 6.206.791 Kg 4.485.951 Kg 22.404.295

Kg 5.207.626 Kg 4.684.870 Kg 21.381.695

São anualmente importados 100 milhões de litros de leite

Falamos da “importação de cerca de 500 milhões de litros de equivalente leite”, diz a ANIL.

Pressão sobre os preços do leite ao consumidor

TERESA SILVEIRA

Foi criada a PARCA - Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar, em 2012, que colocou à mesma mesa a discutir regularmente a produção, a indústria e a grande distribuição. Depois entrou em vigor em 2014 a nova regulamentação sobre as relações contratuais entre distribuidores e fornecedores agrícolas e industriais (diploma das práticas individuais restritivas de comércio – PIRC). E agora acaba de ser criado o Observatório da Cadeia de Valor, uma entidade que tem como objetivo garantir a transparência das cadeias de abastecimento agroalimentares e analisar a evolução do setor para colmatar a falta de conhecimento sobre a distribuição da margem de valor entre a produção, a indústria e a distribuição. Nada disto, contudo, tem sido suficiente para travar a pauperização dos produtores de leite nem para evitar, em Portugal e na Europa, os continuados ciclos de turbulência, agravados nos últimos meses com o fim das quotas leiteiras na União Europeia e a liberalização total do setor. Ouvido pela “Vida Económica”, Carlos Neves, presidente da APROLEP – Associação do Produtores de Leite de Portugal, faz um ponto de situação: “o preço médio [pago pela indústria à produção] está nos 28 cêntimos, mas há dezenas de produtores a receber 23 cêntimos ou menos e outros foram surpreendidos com uma redução de 10 cêntimos por litro de

que, reconhece, tem motivado “reações enérgicas da produção”. O diretor-geral da ANIL garante à “Vida Económica” que “a indústria tem vindo a canalizar grande parte do excesso do leite que recolhe para o fabrico de leite em pó magro e manteiga” – “em Portugal mais 80% e 17% respetivamente do que em 2014”, diz –, produtos estes “sem espaço no mercado de grande consumo” e que para os industriais “geram uma enorme margem negativa” nas contas de exploração. Fazem-no, no entanto, “assegurando a recolha integral do leite da produção, contrariamente ao que já ocorreu noutros países, nomeadamente na vizinha Espanha e nos Estados Unidos”.

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O diretor-geral da ANIL avança que “são anualmente importados cerca de 100 milhões de litros de leite para consumo, o que corresponde a cerca de 12% do leite laborado em Portugal”. No último mês de junho, diz Paulo Costa Leite, “o preço médio do leite meio-gordo importado rondou os 46 cêntimos por litro e, a manter-se a irredutibilidade da distribuição, não se perspetiva que esta constante pressão sobre a produção nacional venha a diminuir nos próximos meses”. O mesmo responsável fala na “igualmente dramática situação do setor da produção de queijo”. Os valores das importações, garante, “assumem aqui maiores proporções”. O país, diz, “produz cerca de 60 mil toneladas de queijo de vaca e importa anualmente (de todos os tipos de queijo), 45 mil toneladas adicionais”. Do queijo mais consumido em Portugal – flamengo – foram importadas em junho “cerca de duas mil toneladas a um preço 24/04/15

10:33

Assunção Cristas, ministra da Agricultura e Mar (MAM).

médio de 2,68 euros”, ou seja, “sensivelmente 40% abaixo do patamar do preço consentâneo com os custos de produção, que posiciona o seu preço de venda ao público abaixo dos valores de há 20 anos”.

Para o diretor-geral da ANIL, só nestes exemplos, falamos da “importação de cerca de 500 milhões de litros de equivalente leite, que se vêm juntar aos 80 milhões de litros adicionais que se estima venham a ser produzidos em 2015” e que equivale “a mais de 30% do total da produção nacional de 2014, que o país tem condições, nomeadamente capacidade instalada, para laborar integralmente”. Ante este cenário, os ministros da Agricultura de Portugal, Espanha, Itália e França vão levar à Comissão Europeia, para a reunião extraordinária de ministros agendada para 7 de setembro, segunda-feira, em Bruxelas, várias propostas. Uma tomada de posição conjunta que resulta de uma reunião entre Assunção Cristas, de Portugal (ver entrevista à “Vida Económica nas páginas 6-7 do jornal), e dos seus homólogos do Sul da Europa, havida na última semana, em Madrid, e para a qual esperam poder contar com o apoio dos países do Leste europeu e do Norte da Europa, os mais afetados pelo embargo da Rússia aos produtos agrícolas comunitários.


IV

sexta-feira, 4 de setembro 2015

sexta-feira, 4 de setembro 2015

V

Setor agroalimentar quer a reforma do Estado e gestão rigorosa dos fundos europeus

Portugal está no arranque de um novo ciclo de apoios comunitários – o Portugal 2020 (21 mil milhões de euros), o PDR 2020 (8,1 mil milhões), o MAR 2020 (392 milhões) e o Horizonte 2020 (77 mil milhões para a UE) – e também prestes a entrar numa nova legislatura, estando as eleições legislativas agendadas para 4 de outubro próximo. Ciente disso, a “Vida Económica” ouviu as representantes de empresas agrícolas e agroalimentares, do movimento associativo do setor e das entidades do sistema científico com maior preponderância na formação e investigação aplicada a esta área. Quisemos saber, em várias perspetivas, qual é a marca que o próximo Governo tem obrigatoriamente de deixar na agricultura e no agroalimentar nos próximos quatro anos. E há um sentimento unânime: o agroalimentar dá um contributo essencial para a economia, para as exportações e para o equilíbrio das contas nacionais. E não é possível retornar à agricultura do passado, desqualificada, sem rentabilidade nem competitividade e para proteger interesses instalados. É preciso fazer a reforma do Estado e articular procedimentos nos organismos do Ministério da Agricultura e Mar (MAM) e gerir com rigor e eficácia os recursos financeiros ao dispor de Portugal.

TERESA SILVEIRA

teresasilveira@vidaeconomica.pt

“Portugal tem que mudar o seu modelo de desenvolvimento económico. O crescimento da economia tem que assentar na produção de bens transa-

cionáveis para substituir importações e alargar as exportações, tendo como princípio e base o incremento do valor acrescentado, em detrimento do crescimento económico e tendo por motor o consumo interno”, diz José Martino, sócio-gerente da Espaço Visual. E este engenheiro agrónomo diz à “Vida Económica” que “a liderança política da nova legislatura tem a responsabilidade de o fazer mobilizando os empresários e todos aqueles que têm competências” como empreendedores. Mas mais. “O Governo tem que dar o exemplo e criar ‘moral’ para o que pede aos portugueses” e para que “os possa motivar”. Daí José Martino considerar que “a reforma do Estado tem que avançar e passar pela racionalização dos serviços e pela sua gestão mais eficiente e eficaz”. E a agricultura e o agroalimentar “têm que participar nesta estratégia”, de modo a tornar “mais eficaz a utilização dos fundos públicos disponíveis”. A marca do próximo Governo passa, pois, por, “tirando partido do novo ciclo de apoios comunitários, elevar a formação profissional a objetivo nacional, para formar pelo menos 50% dos seus agentes”. O seu timbre, diz, deverá ser “manter o que está a funcionar bem e fazer intervenções, o mais pontuais possível, em tudo aquilo que seja preciso melhorar”. A “cereja no topo do bolo”, acrescenta, será “uma gestão mais eficaz em todos os serviços do Ministério da Agricultura”, o que passa sobretudo pela “melhoria da gestão intermédia (exemplo, chefes de divisão e serviço, etc.) e uma mais eficaz cooperação entre serviços dos diversos ministérios no respeita a licenciamentos de atividades”. Os especialistas ouvidos pela “Vida

Económica” são, na verdade, coincidentes. Ondina Afonso, diretora executiva da Portugal Foods, não tem dúvidas: “a fileira está mais coesa, mais forte e necessita de medidas que suportem essa coesão, ao invés da dispersão. A agricultura, as pescas e o agroindustrial têm de ser vistos como ‘um todo’, composto por um conjunto de empresas que articulam entre si, enquanto fornecedores e clientes, numa ótica de valor acrescentado, devendo estar unidos, não só no negócio mas, também, na partilha de conhecimento, na inovação e na sustentabilidade”. Daí ser “da máxima importância” que as medidas políticas e de incentivo à fileira estejam “alinhadas” e “não criem mais a dispersão, isolando a agricultura e as pescas do agroindustrial”.

“Apoiar as empresas que criam valor” Para Ondina Afonso, o próximo Governo e o titular da pasta da Agricultura “terá de ser capaz de transpor a leitura tecnocrática da legislação europeia e construir um quadro adaptado à economia real portuguesa”, apoiando as “grandes empresas, nomeadamente as que criam valor”, porque estas, diz, “nos mercados externos, são PME perante os gigantes internacionais”. A diretora executiva da Portugal Foods está ainda segura de que é preciso “estar orientado numa perspetiva de ‘inovação social’, onde a competitividade do país assenta na valorização de recursos reais, como os ambientais, económicos, culturais e patrimoniais, sociais e de conhecimento e na integração das políticas setoriais e de todos os atores (políticos, decisores, empresários e ‘opinion-makers’”). Isto porque, diz,

“acabou o tempo do cada um por si, porque hoje os compromissos de Portugal com o mundo são muitos” e “não podemos desiludir os nossos parceiros comerciais”. Na mesma linha, António Fontainhas Fernandes, reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), defende que o próximo Governo deve “apostar na competitividade e internacionalização, não esquecendo o desenvolvimento rural e o combate à desertificação do interior”. E “deve focalizar a sua intervenção na inovação, tecnologia e empreendedorismo, privilegiando a transferência de conhecimento, que potencie a criação de valor acrescentado”. Para o académico, colocar o conhecimento e a inovação no topo das prioridades coletivas do setor é “uma ambição para o país, o que requer sinergias de esforços, envolvendo empresas, universidades, poderes públicos e a sociedade”.

“É expectável atingir equilíbrio agroalimentar em 2020” O reitor da UTAD faz notar que “o crescimento económico sustentado baseado no aumento das exportações e substituição das importações é um dos principais desafios de Portugal”. E lembra que o resultado alcançado em 2014 no setor agrário – 82% de autossuficiência em valor – se deve “à boa execução dos fundos comunitários”, por um lado, e a “uma nova classe empresarial empreendedora, com formação, de dimensão internacional, que apostou na qualidade, diferenciação e em práticas de sustentabilidade ambiental”, por outro. E é com base nisto que diz ser “expectável atingir a meta de equilíbrio agroalimentar em 2020”.

O que pensam as empresas, as associações e as universidades sobre o futuro Ministério da Agricultura?

Ainda assim, adverte Fontainhas Fernandes, “o comportamento da agricultura portuguesa dependerá de inúmeros fatores, macroeconómicos, ambientais, incluindo as alterações climáticas, e da evolução dos mercados e preços, em particular, da energia”. O cumprimento desta meta da autossuficiência em valor em 2020 dependerá, pois, “da eficácia das ações previstas nas áreas definidas no PDR 2020 no âmbito da promoção da inovação e conhecimento, do reforço da organização da produção, do apoio aos investimentos produtivos e da gestão eficiente dos recursos naturais”. Bastante mais efusivo é o presidente da Portugal Fresh, associação constituída em 2010, que agrega perto de 100 empresas de frutas, legumes e flores. Em declarações à “Vida Económica”, Manuel Évora começa por dizer que “os próximos anos serão determinantes para a afirmação da agricultura como pilar importante da economia em Portugal”. Daí a exigência com o próximo Ministério da Agricultura ser elevada. “O que se espera dos nossos governantes, sejam eles quais forem, na próxima legislatura é que possam colaborar na consolidação de uma estratégia de criação de uma agricultura moderna, onde os agricultores e as empresas agrícolas possam ser valorizadas pela modernidade dos seus investimentos”, diz Manuel Évora, de modo a que “não tenhamos que assistir ao retorno à agricultura do passado, sem rentabilidade, sem competitividade e, principalmente, sustentada para proteger poderes instalados”. “É tempo de os políticos deste país perceberem que só com governantes modernos que entendam as especifi-

cidades da agricultura e as tendências de consumo será possível que os investimentos inovadores e que sustentem a nossa diferenciação sejam a chave do sucesso”, reforça o presidente da Portugal Fresh, salientando “dois pilares”: o agroalimentar e a internacionalização e “em setores tão importantes como o vinho, o azeite, as frutas, legumes e flores, as carnes, as pescas, entre outros, para que não se desperdicem recursos em políticas generalistas”. No entanto, como constata Jorge Neves, diretor-geral da AGROMAIS, “a política agrícola nacional encontra-se, para o bem e para o mal, fortemente condicionada pela PAC e pelas decisões do Conselho e da Comissão Europeia”. E como estamos no início de um novo quadro comunitário, “as grandes linhas de orientação já se encontram definidas até 2020”. Ainda assim, diz, “a questão poder-se-á colocar em termos do que poderá ser a revisão intercalar da PAC e das propostas de cada Estado-membro para essa revisão intercalar”. E é aí que “entra a marca que o próximo Governo terá que deixar no setor”. Ora, diz Jorge Neves, “o setor agrícola e agroalimentar, como muitos outros, necessita de estabilidade e enquadramento político numa perspetiva de médio/longo prazo”, pois falamos de “expetativas de investidores, que influenciarão, necessariamente, as tomadas de decisão quanto a investimentos futuros”. Por isso deixa o repto: “não se pretende nenhuma fórmula mágica para a próxima legislatura”, mas, simplesmente, que se prossiga “uma política realista, que continue a ir ao encontro dos interesses do verdadeiro motor da agricultura: os empresários agrícolas e as suas organizações”.

“Concursos para os organismos do Ministério da Agricultura devem ser atribuídos pelo mérito” “Nesta legislatura existiu arte e engenho para trazer para o agroalimentar em Portugal uma estratégia de investimento e internacionalização expansionista em colaboração com as empresas”, o que é “de salientar e de aplaudir incondicionalmente”, afirma Manuel Évora, presidente da Portugal Fresh. Há, no entanto, sempre um “mas”. E no entender de Manuel Évora, há “situações gritantes que urge corrigir a bem da nação”. O gestor fala da “desarticulação dos organismos públicos”, entre as direções regionais de Agricultura e Pescas (DRAP), o Gabinete de Planeamento e Políticas (GPP), a Direção-Geral de Veterinária (DGAV), o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas (IFAP), o Inspeção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGMAOT) e até a Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica (ASAE), referindo que há “duplicação de tarefas e sobreposição de competências” que “geram custos adicionais e desnecessários”. Manuel Évora diz ser “comum haver auditorias e inspeções ao mesmo operador económico feitas por entidades diferentes, no mesmo dia e até na mesma hora, com resultados e medidas impostas diferentes”, o

que “mostra claramente a arbitrariedade de atuação das autoridades”. Depois, acrescenta o presidente da Portugal Fresh, há “situações em que as autoridades, por insegurança, por falta de conhecimento ou por falta de bom senso, tomam medidas drásticas que demonstram pouco respeito pela economia nacional, sem que dessas medidas se retire benefício para a segurança do consumidor”. E ainda refere ser “comum” que, “em muitos casos, os requisitos em matéria de licenciamentos sejam completamente exagerados face ao panorama europeu”, o que é “incompreensível”. Os empresários agrícolas que, reconhece Manuel Évora, “dependem de muitas decisões destes organismos públicos e de outros”, deixam um repto para a próxima legislatura: “que os concursos públicos para cargos de dirigentes superiores destes organismos possam ser atribuídos pelo mérito, pelo profissionalismo, pela isenção e pela exigida competência”. E “nunca mais pela simples e indesejada influência política, que serve os interesses de alguns e o protecionismo de outros tantos”. Para o presidente da Portugal Fresh, “já chega de promover os menos dotados só porque são da mesma cor. Portugal necessita dos melhores em cada lugar”.

Perspetivas sobre as Legislativas 2015

ANTÓNIO FONTAINHAS FERNANDES,

ANTÓNIO SILVESTRE FERREIRA,

CARLOS NEVES,

JORGE NEVES,

JOSÉ MARTINO,

MANUEL ÉVORA,

ONDINA AFONSO,

PAULO COSTA LEITE,

reitor da UTAD

CEO da Vale da Rosa

presidente da APROLEP

diretor-geral da AGROMAIS

sócio-gerente da ESPAÇO VISUAL

presidente da PORTUGAL FRESH

diretora executiva da PORTUGAL FOODS

diretor-geral da ANIL

“O próximo Governo deve apostar na competitividade e internacionalização, não esquecendo o desenvolvimento rural e o combate à desertificação. Deve focalizar na inovação, tecnologia e empreendedorismo, privilegiando a transferência de conhecimento, que potencie a criação de valor acrescentado. Colocar isto no topo das prioridades do setor é uma ambição para o país, que requer sinergias de esforços, envolvendo empresas, universidades, poderes públicos e a sociedade”.

“Portugal assiste a um novo ciclo de apoios comunitários. Urge hierarquizar prioridades e criar um diálogo concertado entre regiões com a finalidade de não duplicar respostas no mesmo espaço geográfico. Também é imprescindível investir mais no capital humano, na valorização das pessoas, na sua formação e qualificação e, assim, termos organizações mais competitivas e eficientes. Os jovens agricultores precisam de ser mais acompanhados e terem, nos primeiros anos, um tutor a quem possam recorrer”.

“Espero que a crise seja ultrapassada, mas a agricultura não volte a ser esquecida e que os que agora iniciam ou resistem à produção sejam mais defendidos dos abusos na cadeia de valor. O PDR 2020 incentiva à comercialização dos produtos agrícolas através de organizações de produtores, mas é preciso acompanhar e apoiar a gestão dessas OP, para que funcionem bem e consigam escoar, negociar e pagar os produtos agrícolas a bom preço, sem abusos de intermediários e distribuição”.

“O setor agrícola e agroalimentar, como outros, necessita de estabilidade e enquadramento político numa perspetiva de médio/longo prazo. Estamos a falar de expetativas de investidores, que influenciarão as tomadas de decisão quanto a investimentos futuros. Não se pretende nenhuma fórmula mágica para a próxima legislatura, mas, simplesmente, que se prossiga uma política realista, que continue a ir ao encontro dos interesses do verdadeiro motor da agricultura: os empresários agrícolas e as suas organizações.”

“Portugal tem que mudar o seu modelo de desenvolvimento económico. O crescimento da economia tem que assentar na produção de bens transacionáveis para substituir importações e aumentar as exportações, tendo como princípio e base o incremento do valor acrescentado, em detrimento do crescimento económico tendo por motor o consumo interno. A liderança política da nova legislatura tem a responsabilidade de o fazer, mobilizando os portugueses, em especial os empresários e todos os novos empreendedores”.

“Os próximos anos são determinantes para a afirmação da agricultura como um pilar importante da economia em Portugal. O que se espera dos governantes na próxima legislatura é que colaborem na consolidação de uma estratégia de criação de uma agricultura moderna, onde os agricultores e as empresas possam ser valorizadas pela modernidade dos investimentos. Esperamos que já não tenhamos que assistir ao retorno à agricultura sem rentabilidade, sem competitividade e, principalmente, sustentada para proteger poderes instalados”.

“Não é novidade que a fileira agroalimentar está mais forte e coesa e tem dado passos certos no crescimento da produção nacional e das exportações. A novidade estará na capacidade do novo ciclo político e dos apoios comunitários acompanharem o ritmo das empresas. São precisas medidas que suportem a coesão ao invés da dispersão. A agricultura, as pescas e o agroindustrial têm de ser vistos como ‘um todo’ e é da máxima importância que as medidas políticas e de incentivo à fileira não criem dispersão, isolando a agricultura e as pescas do agroindustrial”.

“É precisa uma efetiva condução dos trabalhos da PARCA no sentido de se caminhar para a autorregulação, dotando o setor com um código de boas práticas ajustado à realidade nacional; a tomada de medidas que conduzam a um reforço da notoriedade, reconhecimento e proteção da produção nacional, que possam combater o atual volume de importações e atenuar o défice comercial de produtos lácteos e uma coordenação eficaz do processo de internacionalização das empresas do agroalimentar, com uma mais próxima articulação com as suas organizações representativas”.


VI

sexta-feira, 4 de setembro 2015

O ‘mea culpa’ dos secretários de Estado da Agricultura e da Alimentação TERESA SILVEIRA teresasilveira@vidaeconomica.pt

Está a chegar ao fim o XIX Governo Constitucional e o Presidente da República convocou eleições legislativas para 4 de outubro, que darão lugar à formação de um novo Executivo. Ciente de que o Ministério da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território (MAMAOT), entretanto renomeado Ministério da Agricultura e Mar (MAM), foi das pastas mais pesadas e complexas na presente legislatura, a “Vida Económica” pediu aos três secretários de Estado do atual MAM que experimentassem voltar atrás. E que fizessem um ‘mea culpa’ do que correu mal e/ou das decisões porventura mal tomadas. Manuel Pinto de Abreu, secretário de Estado Mar, insistentemente contactado, não respondeu. José Diogo Albuquerque e Nuno Vieira e Brito aceitaram o desafio. Sem erros a assinalar e poucas decisões a corrigir, o sentimento é unânime: dever cumprido.

“Trabalhamos em mais de 80 novos países, abrimos mais de 209 produtos e negociamos mais de 270 certificados sanitários. Os números estão à vista: as exportações no agroalimentar em 2014 superaram os 6 mil milhões de euros”

“Foi um mandato pesado”, começa por dizer José Diogo Albuquerque, secretário de Estado da Agricultura, frisando que herdou “um fim de quadro comunitário cheio de problemas, um orçamento reduzido devido à presença da ‘Troika’ e um Programa de Assistência Financeira”. E “uma Reforma da PAC para fazer do princípio ao fim, com a montagem de um quadro comunitário todo novo”. “Há sempre coisas que se podiam ter feito de outra forma depois de vermos o resultado final”, diz Diogo Albuquerque, mas, “com os dados, o tempo e os meios que dispúnhamos, há poucas coisas que quisesse ter feito de outra maneira”. Assume, ainda assim, que “se pudesse recuar no tempo, talvez tivesse prolongado um pouco mais o regime de candidaturas em transição entre o PRODER e o PDR ou dado um pré-aviso do fecho”. No plano da comunicação, “gostaria de ter convencido mais a imprensa a passar mais boas notícias sobre o setor”, diz o secretário de Estado, seguro de que “houve uma mudança grande na imagem deste setor”, assim como “conquistas que fizemos no posicionamento, na gestão de fundos comunitários, na resolução de problemas antigos e na performance do setor que mereciam mais destaques”. Como o facto de Portugal ser “um dos poucos países a executar o PRODER em 100%, estarmos no pelotão da frente dos PDR aprovados, sermos um dos primeiros países a abrir medidas PDR, a estabilidade nas datas de pagamento dos apoios ou a resolução da Casa do Douro”, por exemplo. Quanto a conselhos Nuno Vieira e Brito, secretário de Estado da Alimentação e para o futuro, Diogo Investigação Agroalimentar. Albuquerque não tem

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dúvidas: “manter os objetivos” traçados até 2020, porque “o setor precisa dessa estabilidade. Apenas será necessário “ajustar e simplificar regras” e “melhorar a interface entre Administração e os agricultores”.

Aprofundar políticas, reduzir burocracias e estrangulamentos

(PDR2020, Portugal2020 ou Horizonte2020), refere Nuno Brito. Mas é na internacionalização que Nuno Brito mais insiste, lembrando que a estratégia prosseguida “focou-se na abertura de novos mercados, promovendo acordos fitossanitários, que permitem às empresas e produtores chegar onde ambicionam as suas próprias estratégias de internacionalização”. Foi um “esforço intenso”, garante, que “permitiu trabalhar em mais de 80 novos países, abrir mais de 209 produtos e/ou grupos de produtos e negociar mais de 270 certificados sanitários em todos os continentes”. Os números estão à vista: as exportações no agroalimentar em 2014 “superaram os seis mil milhões de euros, com um crescimento de 7,7% face a 2013”. As vendas para países terceiros totalizaram dois mil milhões, ou seja, mais 7% face a 2013, com o crescimento das exportações para o espaço comunitário a crescerem 8,3% face a 2013.

O secretário de Estado Nuno Vieira e Brito faz uma nota prévia – “o facto de ter iniciado funções em 31 janeiro de 2013”. E de a pasta da Alimentação e Investigação Agroalimentar ter significado “o reforço de novas políticas e estratégias no setor”. E “com três importantes áreas de intervenção: a alimentação e segurança alimentar, a investigação agroalimentar e a internacionalização/abertura de novos mercados”, o que “implicou muito esforço durante este tempo”. Mas, ao contrário do secretário de Estado da Agricultura, Nuno Brito não faz propriamente ‘mea culpa’. Prefere enumerar as competências que assumiu, entre elas a caça e a pesca e a fitossanidade florestal, frisando que se “estimularam centros de competência” em várias áreas, e que, por exemplo na investigação agroalimentar, deu-se “uma profunda reforma dos laboratórios do MAM, reduzindo, senão eliminando, a dependência laboratorial do estrangeiro”. E, “igualmente e pela primeira vez, foi iniciada uma Estratégia de Investigação do Agroalimentar, que considera eixos, promove a cooperação entre parceiros e é uma importante referência para os José Diogo Albuquerque, secretário Estado da Agricultura. apoios disponíveis”

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VIII

sexta-feira, 4 de setembro 2015

“Falta motivação para o investimento e houve deficiente gestão do PROMAR” O Programa de Desenvolvimento Rural 20072013 (PRODER) foi executado a 100% seis meses antes do fim do prazo de execução (31 de dezembro de 2015), mas as dúvidas adensamse quanto ao PROMAR (Programa Operacional do Mar 2007-2013). A sua taxa de execução permanece na casa dos 70% a escassos quatro meses do fim do ano, havendo risco sério de devolução de fundos a Bruxelas por falta de utilização. Manuel Pinto de Abreu, secretário de Estado do Mar, não aceitou o repto da “Vida Económica” para falar do que falhou, mas há quem tenha opiniões formadas sobre o assunto e não hesite em as expor. José Martino, engenheiro agrónomo e fundador da consultora Espaço Visual, não tem dúvidas: não se trabalhou com o necessário ‘overbooking’ (acima de 40%) e “houve deficiente gestão do Programa”. TERESA SILVEIRA teresasilveira@vidaeconomica.pt

A “Vida Económica” solicitou informação atualizada sobre a execução do PROMAR à Secretaria de Estado do Mar, tutelada por Manuel Pinto de Abreu, mas, até ao fecho da edição, não nos foram remetidos os dados. Assim como não foi aceite, por Manuel Pinto de Abreu, o desafio, formulado aos três secretários de Estado do Ministério da Agricultura e Mar (MAM), para que fizesse um ‘mea culpa’ do que correu mal durante a legislatura e/ou das decisões porventura mal tomadas. Em finais de abril, a Secretaria de Estado do Mar confirmou à “Vida Económica” que tinham sido pagos, até ao final de 2014, “mais de 211 milhões de euros”, a que correspondia um investimento global “superior a 300 milhões de euros”, estando o PROMAR com uma taxa de compromisso de 112,6%, mas com uma taxa de execução de apenas 69,1%. O que levou, à data, João Ferreira, eurodeputado do PCP membro da Comissão das Pescas do Parlamento Europeu, a constatar para a “Vida Económica”: “no que toca a suprimir capacidade e atividade produtiva, a

“Haverá 20 milhões de euros de ajudas perdidos na gestão do N+2 relativo ao ano de 2012 ou 2013 e na coordenação entre a Autoridade de Gestão do PROMAR e as direções regionais de Agricultura e Pescas” execução [do Programa] é máxima; no que toca a desenvolver capacidade produtiva, a execução é, no mínimo, sofrível”. O futuro, disse na altura João Ferreira, é incerto, pois “o PROMAR dificilmente será executado a 100%”. O eurodeputado fez, aliás, para a “Vida Económica” uma “leitura mais fina” das taxas de execução dos diferentes eixos do PROMAR, que, diz, “revela uma realidade ainda mais preocupante”. João Ferreira fala na “cessação temporária da atividade da pesca, que tem taxas de realização de 100%”, mas já “em domínios como a Assistência Técnica, as Medidas de Interesse Geral (onde se enquadram ações coletivas, proteção de fauna e flora aquáticas, portos de pesca, locais de desembarque e de abrigo) e a Aquacultura e Transformação, as taxas de realização andam perto dos 50%”.

MAR 2020: 392 milhões para a economia do mar O novo pacote financeiro MAR 2020 prevê para Portugal mais de 392 milhões de euros de fundos europeus para as pescas e a economia do mar, ou seja, mais 15% que o PROMAR e o quinto valor mais elevado entre todos os países da UE. Só para a ajuda direta ao investimento, a verba disponível passa dos 246 milhões do PROMAR para 283,5 milhões no atual programa. A “Vida Económica” questionou o engenheiro agrónomo José Martino sobre o que falhou com a execução do PROMAR e o porquê de uma adesão mais tímida por parte das empresas a este pacote de apoios. A resposta é clara: “O PROMAR falhou na sua execução integral porque é necessário trabalhar com ‘overbooking’ acima de 40%, sobretudo em setores em que é difícil e há falta de motivação para o investimento, restrição no acesso ao crédito

por ser atividade de risco e empresas sem adequada estrutura económico-financeira e sem apoio da garantia mútua em largo período temporal de funcionamento do Programa”. Por outro lado, diz o fundador da Espaço Visual, “houve deficiente gestão do Programa, seja ao nível da análise do perfil dos promotores, da respetiva capacidade técnica e financeira para executar os compromissos (fase de candidatura), seja na gestão (longos períodos temporais sem candidaturas) e na limpeza da carteira de candidaturas (dar prazo para executar, refazer ou desistir), seja ainda na gestão de pagamentos”. José Martino refere dados que apontam que “20 milhões de euros de ajudas estejam perdidos na gestão do N+2 relativo ao ano de 2012 ou 2013 e na coordenação entre a Autoridade de Gestão do PROMAR e as direções regionais de Agricultura e Pescas”. Ora, diz este especialista, é “muito tempo para aprovar candidaturas”.

Processo de nova fábrica demorou 10 anos

setor das conservas” – e que “terá que ver não só com as dificuldades de financiamento bancário mas, também, com a enorme burocracia em todo o atribulado processo, passando pelo licenciamento, que as empresas de conservas conseguiram ultrapassar e, em alguns casos, ao fim de muito tempo decorrido e perdido”. Castro e Melo dá um exemplo: “o processo de uma das novas fábricas demorou cerca de 10 anos, desde o seu início até ao início da laboração, sendo que a construção demorou apenas cerca de ano e meio”. Ou seja, “foram cerca de oito anos e meio de burocracia”. Daí que o diretor-geral da ANICP só formule um desejo para a indústria conserveira: “que o próximo QCA MAR 2020 continue a apoiar os investimentos nesta indústria, tendo em vista a sua permanente atualização e o aumento de competitividade da mesma”, dada a sua “vertente fortemente exportadora, exposta a uma muito feroz concorrência internacional”. Ta m b é m José Martino deixa um repto para a gestão do MAR 2020:

é preciso “alocar orçamento, monitorizar aprovações, contratações, pagamentos, prazos de execução dos investimentos, limpar a carteira de candidaturas, acompanhar os proponentes com candidaturas que podem indiciar atrasos na execução, se necessário motivar nestas visitas para cumprir prazos, reformular, desistir”. Além de que é preciso “coerência das políticas e nas questões dos licenciamentos”. E ainda “comunicação política, para dar importância a esta atividade económica, motivar os proponentes a apresentar projectos e a geri-los bem dentro dos prazos contratuais”. Recorde-se que, no Estudo de Avaliação Ex-Ante e de Avaliação Ambiental Estratégica do Programa Operacional (PO) do Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP) para o período de programação 20142020, publicado em abril, são feitos vários alertas. Sugerem-se melhorias em diversas medidas, nomeadamente as destinadas a “reforçar as preocupações ambientais e de sustentabilidade da pesca, em especial com a biodiversidade e recursos naturais (incluindo os recursos da pesca), as alterações climáticas (eficiência energética e redução de emissões) e a qualidade do ambiente”. Além da necessidade de “assegurar uma adesão dinâmica ao programa por parte dos beneficiários”.

Igualmente contactado pela “Vida Económica”, Castro e Melo, diretor-geral da Associação Nacional dos Industriais de Conservas de Peixe (ANICP), garante que “a indústria de conservas executou todos os projetos que lhe foram aprovados, tendo utilizado da melhor forma os fundos estruturais disponibilizados”. E dá um exemplo-chave: “em plena crise construíram-se três novas fábricas de conservas de raiz”, além de “investimentos consideráveis nas fábricas já existentes, com o objetivo, sempre presente, da modernização deste subsetor”. Destaca, porém, o que terá falhado no que respeita aos projetos não executados no setor da Manuel Pinto de Abreu, secretário de Estado do Mar. pesca – “que não no sub-

Ficha Técnica: Edição e coordenação: Teresa Silveira | Email: teresasilveira@vidaeconomica.pt | Paginação: Célia César e Flávia Leitão | Periodicidade: Mensal


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