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Mapa cedido pela EDIA
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Água, o elemento natural que completa o Alentejo Sara Pelicano
Dentro de pouco mais de duas décadas, poucos se recordarão da
planície dourada. Os extensos campos de cereais, áridos e pouco produtivos, serão passado e histórias dos mais velhos. Para preservar a memória, recorreremos apenas a fotografias. No baú, haverá uma recordação da frase escrita no pontão, construído em 1977, e que uniu durante anos as duas margens do rio Guadiana. Lia-se “Construam-me, porra!”. A expressão – característica dos alentejanos – foi escrita em 1994 por um grupo de militantes da Juventude Socialista de Beja. A construção da albufeira de Alqueva, que deu origem ao maior lago artificial da Europa, iniciou-se em 1998. Em 2002, as comportas da barragem foram encerradas e começou a encher. O Baixo Alentejo mudou para sempre. O dourado dos cereais, as terras quase ao abandono, o olival de verde claro e árvores com grandes compassos ficam na memória, juntamente com verões muito quentes e invernos frios e de muita geada. Hoje, percorrer as estradas dos concelhos de Beja, Ferreira do Alentejo, Moura, Serpa, Portel é sinónimo de paisagem com água, muitas (e novas) culturas... E novamente água. Esta é a palavra que revitalizou uma região. Ao olival e à vinha, vieram juntar-se outras culturas até então impensáveis para o Alentejo dourado: há frutos secos, hortícolas, frutos de caroço. Os cereais continuam por lá, com menos expressão, mas mais produtivos. Há milho, girassol, cevada, trigo. E aos poucos foram surgindo novas dinâmicas: empresas de rega e de factores de produção, centrais fruteiras, agro-indústria. E o clima mudou: os verões de 40 °C à sombra não se repetiram (com frequência) e as geadas são menos. Os filósofos da Grécia antiga defendiam que a Natureza era constituída por quatro elementos: terra (a matéria), fogo (a energia), ar (o conhecimento) e água (a vitalidade). Poder-se-á dizer que ao Alentejo faltava água e, com esta, a região fica completa. Tem gente com energia, conhecimento e vitalidade para tornar o Baixo Alentejo o motor da economia agrícola nacional. Locais visitados no perímetro de rega do Alqueva: 1
Ferreira do Alentejo
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Beja
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Serpa
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Alqueva
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Portel
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Regadio multiplica por dez a riqueza da terra
José Pedro Salema, presidente da Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas do Alqueva (EDIA), fala à Frutas, Legumes e Flores sobre os desafios para 2016, as possibilidades de redução do preço da água e a importância da captação de investimento estrangeiro. Rita Marques Costa e Sara Pelicano
As obras para irrigar 120.000 hectares deverão estar terminadas este ano. O que resta fazer do projecto inicio do Alqueva? Estamos a trabalhar arduamente para conseguir garantir que todas estas áreas, que ainda estão em obra, entrem ao serviço nesta campanha de rega. Este é o grande desafio para 2016. São 30.000 hectares a entrar em serviço. O desafio é que tudo entre em funcionamento e, até ao Verão, termos os 120.000 hectares a regar. Qual o apoio que a EDIA dá aos investidores da região? Este território é muito bem conhecido pela EDIA. Temos conhecimento de todo o cadastro da região e sabemos, em cada parcela, o que é que os proprietários ali fazem. Temos um programa de inquéritos sistemático, que abrange todos os beneficiários da zona, para garantir quais são as intenções de cada pessoa. Quando um investidor nos vem bater à porta e nos diz que está à procura de arrendar uma parcela de 30 hectares, nós cruzamos com as disponibilidades e identificamos as possibilidades. Depois, pomos as pessoas em contacto. 32
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Quantos investidores estrangeiros estão em Alqueva? Temos identificados 150 investidores estrangeiros, de uma dezena de nacionalidades. A grande maioria são espanhóis (96) e cerca de 50 de outras nacionalidades. Os espanhóis estão focados no olival. A amêndoa, que é a cultura da moda, também está a despertar muito interesse, fruto dos preços extraordinários que tem alcançado no mercado mundial. Outras nacionalidades incluem África do Sul, Alemanha, Dinamarca, Holanda, França, Marrocos. Cerca de 30.000 hectares são explorados por estrangeiros. Também têm um projecto novo, o Alqueva Exporta. Como é que isso surgiu? Há cerca de três anos, a EDIA estabeleceu uma política de promoção activa. Tentou voltar-se para fora, para os seus clientes, em vez de estar concentrada em si própria e na construção. Nessa estratégia, uma das componentes fundamentais é a presença em feiras. Como este trabalho custa muito dinheiro, apresentámos candidaturas e fizemos uma parceria com o Núcleo Empresarial Regional de Beja para promover o território de Alqueva. Fizemos uma primeira candidatura, que já acabou. Nesta segunda candidatura, focámo-nos no tema da exportação, da marca Alqueva Exporta. O que se pretende é mostrar que este território tem potencial para gerar exportações de um elevado valor acrescentado. Portanto, é um território óptimo para a produção agrícola, mas queremos também atrair o investimento para a agro-indústria, a transformação e para outras valências, até para o turismo. O site é aberto a todas as empresas da região, desde que tenham vocação exportadora.
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Quantos agricultores é que ainda produzem em sequeiro? Só posso falar no universo de áreas beneficiadas. O Alentejo tem quase dois milhões de hectares de superfície agrícola útil. Nós beneficiamos menos de 5%. Dentro do nosso universo, nós estamos com uma taxa de adesão na ordem dos 65%. Dois terços da área são regados e um terço não é. Porque é que um terço não rega? Há muitas propriedades que estão envolvidas em processos de acesso à terra, como as partilhas, que são coisas normalmente complicadas e que se arrastam por anos. Muitas vezes isso impede a tomada de decisão e a entrada de novos projectos nessas áreas. Existem zonas (que não são poucas) de pequena propriedade e a rentabilidade económica das culturas mais frequentes é muito difícil. Temos cerca de 20.000 hectares, em todo o nosso universo, com parcelas com menos de cinco hectares. São muitas parcelas muito pequenas. Se retirarmos da equação a pequena propriedade, a taxa de adesão sobe para 80%. O que é que se pode fazer para fixar mais agro-indústria? A agro-indústria ligada à produção de azeite e vinho é da melhor que se faz no Mundo. Até a restante estar cá é uma questão de tempo. O potencial produtivo está cá e a indústria quer estar próxima da produção. O que temos aqui é uma zona muito nova. A EDIA começou a vender água em 2010. Temos seis anos disto. É tudo muito novo. Este ano é que o projecto vai chegar aos 120.000 hectares, dez anos antes do planeado. O ministro da Agricultura já falou de um aumento de 40.000 hectares do perímetro de rega. Isso já está pensado? A expansão deste regadio a outras áreas é uma coisa que está a ser pensada pela EDIA há alguns anos. Há uns cinco anos, começámos a perceber que, com a ocupação e com o perfil de consumo que temos nas áreas que já são servidas, não vamos esgotar a nossa concessão de água. Sabemos que em cada hectare que transformamos de sequeiro para regadio multiplicamos por dez a riqueza. Estamos a fazer um projecto de execução de cinco zonas (temos identificadas 12) que somam 26.000 hectares. Podemos chegar aos 46.000 hectares. O que os nossos estudos prévios mostram é que fazer mais 46.000 hectares custa 152 milhões de euros. Se compararmos isto com os 2.500 milhões de euros que Alqueva custou, vemos que é completamente marginal. Com um investimento marginal, aumentamos em mais de 30% a área do projecto. Conseguimos gastar mais água, produzir mais riqueza na região e diluir custos fixos, fazendo com que cada metro cúbico seja mais barato para todos. Vieram a público notícias de um “buraco” financeiro de 24 milhões de euros nas contas da EDIA. Pode explicar? Os 24 milhões de euros correspondem ao valor das obras que 34
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estão em execução no ano de 2016 e que não têm financiamento comunitário. Não é propriamente um buraco nas contas. Foi a forma encontrada pelo Governo anterior de financiar as obras. Já sabíamos há dois anos que iriam ser despesa em 2016 e que não iriam ter financiamento comunitário. Esses 24 milhões de euros são 6% do investimento. Para estes 24 milhões de euros não há fundos comunitários, tem de ser o Estado português a entrar. O que é que levou à opção de deixar esses 6% de fora? Tem que ver com o quadro comunitário. O de 2007-2013 acabou em 31 de Dezembro de 2015. Poderíamos ter esperado e utilizar o próximo quadro comunitário, mas, inevitavelmente, iríamos atrasar muito as obras. A decisão tomada foi aproveitar todos os restos que existem no quadro que estava a acabar e fazer um esforço para garantir que conseguíamos fazer o máximo até 31 de Dezembro. Isto coloca em causa a execução desses projectos? Não, de todo. Para conseguir reduzir o custo da água, uma das possibilidades é alargar o perímetro de rega. Haverá outras hipóteses? O preço é estabelecido por decreto ministerial. O preço que foi estabelecido no despacho 9000/2010 foi suportado nas contas feitas pela EDIA. Neste momento, nós encomendámos um estudo a uma empresa independente, para perceber o que se podia fazer ao tarifário, com base nas informações que temos hoje e não nas de há seis anos. O que esse estudo mostra é que há dois vectores importantíssimos para tentar baixar o preço: um é a escala, portanto, a expansão; e outro é a energia. Eu defendo que não deve haver uma descida dos preços sem que haja uma conquista do lado dos custos, mas é uma decisão política. Na escala, é a expansão. Na energia, estamos a trabalhar com alguns agentes para perceber se é possível a introdução de energia fotovoltaica para baixar esta factura. Eu acredito que é possível fazer um projecto grande em Alqueva. Temos a infra-estrutura, temos o espaço, temos o Sol, temos o consumo energético.
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O que se cultiva em Alqueva? Olival, amêndoa, papoila, frutas. São muitas as culturas que hoje se criam no Baixo Alentejo, onde a água da albufeira de Alqueva permite regar. Rita Marques Costa e Sara Pelicano
Em jovem, teve a ousadia de escrever “Construam-me, porra!”
na parede do pontão que, desde 1977, unia as duas margens do rio Guadiana. Hoje, Aníbal Reis Costa, presidente da Câmara Municipal de Ferreira do Alentejo, utiliza palavras mais comedidas, mas continua a ser um fervoroso defensor das obras que mudaram para sempre a região. O presidente da autarquia conta que «o panorama se alterou substancialmente», desde a criação do perímetro de rega de Alqueva. A paisagem terá sido a alteração mais evidente para os que passam pelos terrenos outrora cobertos pelo dourado dos cereais. O “celeiro da nação” passou a ter muito mais potencialidades e, nos solos em que antes poucas plantas vingavam, hoje brotam oliveiras que parecem arbustos, alinhadas em filas perfeitas a perder de vista, videiras, árvores dos mais variados frutos de caroço, pequenos frutos, amêndoas, nozes, papoila, colza e muitas outras culturas. Há alguns anos, pensou-se que «as coisas não iam caminhar tão rapidamente», mas «houve capacidade de rentabilizar e promover ao máximo as potencialidades que começaram a existir a partir do momento em que foram construídos os primeiros canais de rega de Alqueva». «Haver água faz com que os investimentos possam ocorrer aqui com mais probabilidade», assegura Aníbal Reis Costa. Se, pelo contrário, «não houvesse água, teria sido o fim da agricultura nestes territórios».
ALQUEVA EM NÚMEROS
ALQUEVA EM IMAGENS
› O grande lago de Alqueva
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› Um campo de colza
› Pepe Ocaña, director-geral da Olivais do Sul
A água chegou e com ela um grande dinamismo, que faz Luís Vasconcellos e Souza considerar que «tudo o que de mais importante se passar na agricultura acontecerá no Alqueva». O presidente da Agromais – Entreposto Comercial Agrícola (entidade ribatejana criada em 1987 e que está a trabalhar e a implementar o seu modelo organizacional na região do Alqueva) comenta ainda que o Alqueva vai «motivar os investidores». Actualmente, os investidores presentes em Alqueva apostam em diferentes culturas, nomeadamente: Olival No perímetro de rega do Alqueva, em 2015, 54,4% da área estava ocupada com olival, segundo a Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas do Alqueva (EDIA). O paredão da barragem do Alqueva dista pouco mais de 30 quilómetros do lagar da Olivais do Sul. No início de Março, o lagar está em plena manutenção. Desmontam-se máquinas, limpa-se tudo ao pormenor e aguarda-se a próxima campanha. O balanço do ano de 2015/2016 foi positivo. O lagar trabalhou 26.000 toneladas (t) de azeitona (6.000 t de produção própria e as restantes compradas a agricultores locais), o que originou quatro milhões de litros de azeite.
A empresa tem duas herdades, que totalizam 610 hectares (ha) cultivados. Uma propriedade com 260 ha está em Portel e outra com 350 ha está localizada em Campo Maior. Ambas com regadio. O objectivo é aumentar a área de produção, sobretudo na zona de Alqueva, porque está mais próxima do lagar. A Olivais do Sul tem as variedades Arbequina – em super-intensivo (60%) –, Picual e Cobrançosa – em intensivo (40%). A produção agrícola foi o primeiro passo da empresa após a compra das terras em 2005. Seguiu-se a construção do lagar. A venda a granel para Espanha e Itália ainda representa a maior fatia da facturação, mas a empresa está apostada em aumentar as vendas de azeite engarrafado sob as marcas Olivais do Sul e Art&Soul, esta última mais voltada para exportação. O futuro passa por uma produção focada na sustentabilidade. Pepe Ocaña, director-geral, explica que estamos a avançar «de forma a tornar todo o processo ainda mais sustentável». Tendo em mente este objectivo, foi iniciado mais um projecto para optimizar a água de rega, com instalação de uma estação meteorológica e sondas de humidade e salinidade que cobre a área de Olival. Um trabalho que se junta aos já existentes, como o enrelvamento na entrelinha, o uso das folhas e ramos (após compostagem) no solo, a utilização das águas ruças para rega e o aproveitamento do caroço para aquecimento de todas as instalações. O preço da água e da electricidade são dois dos desafios apontados por Pepe Ocaña. «Este ano terminaram os descontos, estamos já nos 90%», diz o director-geral da Olivais do Sul. «Os preços apresentam-se como uma condicionante para a promoção e introdução de novas culturas no Alentejo», admite. A revisão dos preços, sublinha, «terá de passar por uma revisão das políticas em vigor», bem como os custos de electricidade, que «a barragem também produz», relembra Pepe Ocaña. A redução de matérias activas nos produtos fitossanitários é outro dos problemas apontados pelo nosso interlocutor. «Para algumas culturas, como o amendoal, esse vai ser um problema.» No concelho de Ferreira do Alentejo, o olival não era cultura tradicional e hoje é comum ver esta árvore plantada. Uma das empresas a produzir azeite é a Sovena, cuja área de olival na zona de influência directa do Alqueva é de 4.000 ha. Nestas parcelas, tem azeitona Arbequina, Arbosana e Koroneiki, dando origem ao azeite Oliveira da Serra. Nesta última campanha, a produção foi de 10.000 toneladas, «mas ainda estamos em crescimento», assegura Vasco Martins. «Se atingíssemos o patamar das 15.000 toneladas nos próximos cinco anos seria bom.» frutas, legumes e flores | Abril 2016
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O director-geral da Elaia, empresa do grupo dedicada à produção, sublinha que «a região vive uma efervescência positiva». «Vi muitas obras de regadio e o Alqueva está uma obra exemplar. Aprendemos com os outros e temos tecnologia que outros não tinham», comenta. A empresa tem terras próprias e arrendadas e emprega perto de 110 pessoas. Uma curta viagem de carro une a Herdade do Marmelo, onde se encontra parte do olival da Sovena e o lagar, a um outro projecto agrícola: a Herdade do Monte Novo e Figueirinha. Em São Brissos, num total de 350 ha, 170 ha são ocupados com oliveiras. Mas a área poderá diminuir ligeiramente, dando lugar a amendoal. Estas culturas juntam-se à vinha para vinho, papoila, milho e hortícolas. «A diversificação é importante», destaca Filipe Cameirinha, gestor da herdade familiar. O lagar, que também processa azeitona de outros produtores, transforma sete milhões de quilos de azeite. A marca é Azeite Monte Novo e Figueirinha e o “ouro líquido” representa 40% da facturação da empresa. A exportação já corresponde a 70% da comercialização. «No Alentejo, somos muito competitivos no olival, temos qualidade e produção», remata Filipe Cameirinha. Hortofrutícolas Morangos, frutos de caroço, cebola, alho, melão e melancia são alguns dos hortofrutícolas que já são regados com a água levada aos produtores pelas estruturas construídas pela EDIA. Relativamente à área, os dados de 2015 indicam que os hortícolas ocupam 4.000 hectares do perímetro de rega de Alqueva e os frutícolas crescem numa área de 1.000 hectares. Nos arredores de Beja, o jovem agricultor Hugo Condesso, juntamente com três sócios, produz morangos em hidroponia desde 2014. Dentro da estufa, com uma área de 5.000 metros quadrados, cada trabalhador apanha o fruto ao seu ritmo e numa posição ergonómica correcta, ou seja, sem ter de se dobrar para colher os pequenos frutos de um vermelho vivo. A altura das bancadas, construídas num sistema de hidroponia, pode ser ajustada conforme as necessidades da planta e de
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quem a colhe. A instalação da estufa, equipada com um sistema de aquecimento, foi a alternativa encontrada para proteger o fruto das amplitudes térmicas que se fazem sentir na região. «No Inverno temos muito frio, e no Verão temos muito calor», explica Hugo Condesso, sócio-gerente da Paxberry. O objectivo do produtor é fazer um produto «premium», já que «o produto bem feito tem sempre mercado». Os morangos da Paxberry estão disponíveis de Outubro a Junho. «Em Dezembro e Janeiro, o fruto tem um valor mais elevado no mercado», disse Hugo Condesso, por isso esta é a altura em que mais lhe interessa comercializar, porque os frutos produzidos em Espanha ainda não ocupam as prateleiras nacionais. Outro dos projectos inovadores potenciados pela disponibilidade de água em Alqueva é o da Fairfruit. O grupo multinacional, de origem suíça, está na região do Baixo Alentejo desde 2013. Através de uma parceria com a Biodamasco, a empresa comercializa alperces, nectarinas e pêssegos, cultivados perto de Beja em modo de produção biológico. Actualmente, a Fairfruit Portugal já tem plantado um pomar com 70 hectares e, «até ao final do ano, terá 130 hectares», conta João Serrano, responsável pela empresa. A médio prazo, a Fairfruit quer ter 400 hectares plantados, conseguindo uma produção entre 6.000 e 8.000 toneladas de frutos de caroço. A produção será exportada, essencialmente, para Alemanha, França, Suíça e Áustria, já que a venda no mercado interno, por enquanto, «não compensa em termos de preço». Em relação aos impedimentos que alguns produtores garantem que advêm do «elevado» preço da água, João Serrano declara que «não é barato, mas também não é caro comparado com outros países onde temos produção». Além de Portugal, o grupo produz em Espanha, Hungria e Áustria. Eugénio Tavares d’Almeida tem no Baixo Alentejo o centro das suas várias actividades. Em Serpa, administra o Museu do Relógio e, em 69 hectares regados com água de Alqueva, produz, entre outras culturas, cebola para fresco e brócolo para agro-indústria. Com o tiquetaque compassado dos relógios do museu como som de fundo, Eugénio, que já fazia agricultura na região antes da inauguração da barragem, conta que a disponibilização deste elemento veio alterar «radicalmente» a actividade. Na Herdade do Pinheiro, em Ferreira do Alentejo, Pedro Bicó apostou na diversidade de culturas. Alho e cebola são culturas que produziu no ano passado e «correu muito bem», pelo que este ano aumentou as áreas de produção. «De cebola comecei com seis hectares e vou fazer 21 este ano. E de alho dupliquei a área para quatro hectares.» Abóboras e brócolos «dão-se muito bem também aqui», comenta. Na herdade, tem ainda pimento para indústria, uma cultura que resulta bem se «cultivada e colhida cedo». Todos estes produtos são feitos em parceria com a Agromais.
Amêndoa Em Alqueva, nem sempre se vê a água responsável pela enorme transformação que a região tem sofrido. No entanto, ela está sempre lá. Seja nos grandes pivôs estacionados nas planícies, no verde a perder de vista ou em algumas das culturas que por lá se praticam, impensáveis sem este recurso. A amêndoa é mais uma das apostas dos agricultores, tornada possível pelo empreendimento. No total, entre as árvores que já › Hugo Condesso, sócio-gerente da Paxberry produzem e aquelas que foram plantadas nos primeiros meses de 2016, já existem 5.500 hectares de amendoal em Alqueva, de acordo com a EDIA. A cultura é ultrapassada apenas pelo olival e pelo milho. Filipe Cameirinha, gestor da Herdade do Monte Novo e Figueirinha, está a fazer uma «experiência» com 26 hectares de amendoal. A rentabilidade «muito boa» – os dados mais recentes, divulgados pelo Sistema de Informação de Mercados Agrícolas (SIMA), indicam que a amêndoa sem casca foi comprada, à saída
da estação, a nove euros por quilo –, o clima e a propensão dos solos para a cultura deram o mote a esta primeira tentativa. Numa exploração a alguns quilómetros de Beja, Daniel Montes tem 30 hectares de amendoeiras de variedades autoférteis, de floração tardia e casca semidura. Para o produtor, a instalação da unidade de transformação de amêndoa pela Migdalo é «importante». «É uma primeira fase de industrialização. Esperamos que sejam instaladas outras unidades não só de britar, mas também de transformar: fazer pó, laminar, tirar pele.» As empresas estrangeiras também não descartam a relevância desta cultura. Alguns investidores espanhóis, que já produzem olival em Alqueva, estão a apostar na amêndoa e a instalar áreas superiores a 1.000 hectares. Papoila A produção de papoila em Alqueva é promovida pela MacFarlan Smith, uma farmacêutica escocesa que se dedica à produção de morfina. A empresa incentivou agricultores a plantar papoila e construiu uma fábrica de transformação em Beja, para a transformação primária da planta. Eugénio Tavares d’Almeida produz papoila, que vende à MacFarlan Smith, e conta que é «uma das primeiras culturas em que temos 100% de partilha de risco». Ao contrário da maioria das outras, «em que não sabemos a quanto vamos vender», comenta o produtor. «A empresa paga uma quantia por hectare
para produzirmos e se atingirmos um determinado valor há um prémio de produção.» Esta foi a forma que a MacFarlan Smith encontrou para estimular a produção em Alqueva, um território «extremamente competitivo para a produção de morfina», avança Filipe Cameirinha, da Herdade de Monte Novo e Figueirinha, que este ano semeou 42 hectares da flor. Apesar do retorno financeiro que a papoila parece ter, Eugénio Tavares d’Almeida explica que, «em 2015/2016, a papoila foi condenada aqui em Portugal por questões legais», já que «o novo sistema de produção integrada não a contemplava». «Quem regulamentou a produção integrada contemplou a papoila como se fosse uma flor ornamental, não como se fosse uma cultura de extensivo», diz o produtor alentejano. Depois de ultrapassada a questão da produção integrada, existem outras barreiras. Já que a produção da papoila está dependente de uma autorização do Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, os agricultores estão dependentes dessa declaração para dar início aos trabalhos de cada campanha. Acontece que «o Infarmed peca por ser tardio», desabafa Eugénio Tavares d’Almeida. «No ano passado, foi semeada papoila em Fevereiro e em Março, quando é uma cultura de Outono/Inverno. Esquecem-se de que quando estão a atrasar esse processo, estão a condenar a cultura logo à nascença.» A solução passa por entendimento dos dois lados e uma aceleração dos processos burocráticos, de modo que valorizem os «sete milhões de euros que cá foram investidos» na cultura. Cereais O Alentejo foi outrora designado o celeiro da nação. Os campos de cereais não são cenário do passado, mas já não têm a pujança de há 40 anos. Hoje, a diversidade de culturas é uma realidade, mas ainda há girassóis a rodar ao ritmo solar,
› O milho, uma cultura ainda presente
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› A flor de amendoeira
campos de milho e cevada que fazem permanecer o dourado que pintava o Baixo Alentejo. O preço de comercialização do milho tem estado pouco convidativo, segundo alguns produtores. A este factor alia-se um preço de água para rega em crescendo. A receita pode resultar na redução, ou mesmo no abandono, desta cultura no Alentejo. Filipe Cameirinha, gestor da Herdade do Monte Novo e Figueirinha, tem milho e girassol. Enquanto o girassol é descrito como uma cultura interessante, quanto ao milho comenta que «terminado o período de descontos [do preço de água para regar], poderá não ser possível cultivar». O gestor agrícola comercializa o milho para a Opcer – Agrupamento de Produtores de Cereais. Em Ervidel, José Borges, com 45 hectares em regadio, faz milho, girassol e brócolos, estes últimos para a Agromais – Entreposto Comercial Agrícola, C.R.L.. «O milho está pouco interessante pelos preços que tem», comenta José Borges. Na última campanha, obteve uma produtividade de 16 toneladas/hectare nesta cultura e de 3 toneladas/hectare no girassol. José Borges mantém ainda uma área em sequeiro de 120 hectare, onde produz cereais: milho, trigo e cevada. As diferenças de produtividade são notórias. «No caso do girassol, tenho metade da produção por hectare», comenta.
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Fonte: EDIA
Milho e cevada são também cultivados por Eugénio Tavares d’Almeida. No total, tem 69 ha em regadio. O girassol faz para ser usado em biodiesel, a cevada dística servirá para malte e o trigo para massas. O milho foi deixado de parte. «O preço da água tem vindo a ser ajustado e chegámos a um momento em que o preço não é convidativo para a cultura ao preço que ela está hoje no mercado. O preço da água pode representar quase 25% da cultura do milho, tornando-a uma cultura de elevado risco financeiro», afirma Eugénio Tavares d’Almeida.
* A área de amendoal representa os amendoais que já existiam em 2015 e os que estão em instalação neste momento. Nas restantes culturas, os números correspondem a 2015, nomeadamente às áreas inscritas através do pedido de água à EDIA.
› Filipe Cameirinha no seu olival junto a Beja
A dois anos de atingir a totalidade do preço pago pela água, Pedro Bicó, da Herdade do Pinheiro, já faz contas e conclui que, «quando os valores chegarem aos 100%, há muita gente que não vai conseguir pagar». Dentro daquilo que produz, não tem dúvidas de que «hortícolas e milho serão os mais difíceis de produzir». Há cinco anos que a Agromais está a trabalhar na região e considera que o milho tem um «papel a desempenhar». E logo que os preços subam ligeiramente, «a área pode aumentar de um ano para o outro», comenta Luís Vasconcellos e Souza. O presidente da Agromais teme que este cenário não seja para breve e explica que o preço baixo do milho se deve «à crise económica, à saída da China do mercado e à necessidade de vender stocks». 44
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Medronho O pequeno fruto alaranjado espreita na estrada ao chegarmos ao Alqueva. É também nesta localidade que agora é possível conhecer mais sobre este fruto e a produção de aguardente. No Museu do Medronho, uma iniciativa privada, faz-se um périplo pela cultura que ainda é realizada em sequeiro e com apanha manual. «Temos 140 ha plantados e temos um projecto para plantar mais 35 ha. No total, queremos chegar aos 300 ha», explica Rafael Candeias, encarregado geral da Herdade Monte Santos e Rio Torto. O projecto começou há cinco anos com a plantação de 50 ha, que estão neste momento a 25% da sua capacidade produtiva. A escolha do medronho foi simples: «é uma árvore da região, que já nasce espontaneamente». Trata-se de uma planta brava que sobrevive bem em sequeiro e com a água da chuva. Rafael Candeias comenta que, até há poucos anos, ninguém olhava para o medronheiro que nascia espontaneamente na região, mas hoje «há muitos projectos a surgir em Portel e Reguengos de Monsaraz ligados ao medronho». Estes novos produtores irão comercializar o fruto em fresco ou vendê-lo para produção de aguardente e, neste caso, a Herdade de Monte Santos e Rio Torto irá receber esses frutos. O Museu do Medronho é também uma unidade de produção de aguardente de medronho, comercializada sob o nome Tirikeda. O processo de fabrico da empresa diferencia-se dos restantes porque o destilador é aquecido a vapor e não com o tradicional lume directo. Em 2014, tiveram a primeira produção – 5.000 litros – e, neste ano, já produziram 400 litros. «Vamos destilar todo o ano.» O fruto fica a fermentar três meses e para destilar 1.000 quilogramas de medronho são necessárias oito horas.
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Desenvolver a agro-indústria é «fundamental para o Alqueva»
› Amendoal (fotografia captada por drone)
Lagares e adegas são unidades industriais já enraizadas no Alentejo e satisfazem as necessidades dos produtores de azeite e vinho. As novas culturas a brotar em Alqueva necessitam de novas instalações fabris. E já há projectos a nascer. Rita Marques Costa e Sara Pelicano
«Construir uma unidade agro-industrial em terreno rústico é
uma operação brutal do ponto de vista de ordenamento do território», esclarece Aníbal Reis Costa, presidente da Câmara Municipal de Ferreira do Alentejo. É, contudo, uma parte essencial do desenvolvimento da região. «Do ponto de vista económico, é mais rentável e adequado» transformar os produtos onde são produzidos. Caso contrário, «há uma perda óbvia de valor económico», defende o dirigente. No sentido de fomentar a instalação de agro-indústria na região, a Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas de Alqueva (EDIA) tem uma parceria com a Aicep Global Parques, 46
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pelo que «temos identificados os perímetros industriais em todas as zonas que possam ter indústria», explica José Pedro Salema. O presidente da EDIA esclarece que sempre que são abordados por potenciais investidores, coloca-os em contacto com os gestores daqueles terrenos industriais. Um exemplo, frequentemente referido pelos agricultores, é a falta de indústria transformadora para a beterraba sacarina. Apesar das «condições fantásticas» para a produção do tubérculo, os produtores deixaram de produzi-lo porque «não há indústria», declara Filipe Cameirinha, gestor da Herdade do Monte Novo e Figueirinha. O produtor acredita, contudo, que será uma questão de tempo até uma unidade de transformação de beterraba sacarina se instalar na região. «Quando houver área [de produção], naturalmente haverá uma fábrica.» Aos poucos, algumas empresas começam a assumir o volante da instalação de unidades de agro-indústria disponíveis para receber o mesmo produto de vários produtores. A multinacional Fairfruit é um dos exemplos. João Serrano, responsável pela empresa em Portugal, avança que, quando o projecto para a instalação da central de embalamento de
fruta de caroço for submetido (a empresa acredita que será em Setembro), a construção da unidade arranca. O objectivo é «na próxima campanha de Abril/Maio podermos embalar aqui». «A criação da unidade de embalamento passa por deixar a riqueza aqui na zona», esclarece o responsável. A Fairfruit está disponível para trabalhar com outros produtores da região «que venham produzir para nós, com os nossos parâmetros de qualidade». A amêndoa é uma das culturas em grande crescimento na região. Também para este fruto haverá uma unidade industrial, nomeadamente para descasque de amêndoa, que será inaugurada em Julho. A iniciativa da empresa Migdalo resulta de um investimento de 1.800.000 euros (com o apoio de fundos comunitários). A família Sevinate Pinto, alentejana, tem propriedades no concelho de Ferreira do Alentejo e estudou o potencial do amendoal no território. Verificou-se o potencial da cultura, ao mesmo tempo que se formolou a questão: para onde escoar a produção? Vender a Espanha era uma possibilidade, mas não satisfazia os investidores. Era preciso criar valor nesta cadeia e, tanto quanto possível, escoar o produto no mercado nacional. Surge a ideia de criar uma unidade de descasque de amêndoa para venda do miolo em território português. Isto numa primeira fase, porque as instalações estão preparadas para avançar na cadeia de valor. A unidade da Migdalo poderá no futuro retirar a pele, laminar, fazer farinha de amêndoa, entre outras valias. «Vamos trabalhar amêndoa da nossa produção, mas de outros produtores também», explica António Sevinate Pinto, um dos administradores da Migdalo. «De produção própria já temos 60 hectares, mas queremos chegar aos 200 hectares. Na unidade de Ferreira de Alentejo, vamos começar os trabalhos com 500 toneladas.» As instalações estão preparadas para volumes maiores de trabalho. António Sevinate Pinto diz que poderão, na primeira fase, «trabalhar até 1.500 hectares de amendoal» e estima «uma produção média de 2.000 quilogramas de amêndoa com casca».
› Unidade de secagem de milho do Baixo Alentejo
› A azeitona a ser transportada para extracção do azeite, no lagar da Olivais do Sul
› Lagar da Herdade do Marmelo, Sovena
O projecto está pensado para a unidade industrial trabalhar quatro a cinco meses, mas com o crescimento da produção poderá chegar aos 10 meses. Quanto a postos de trabalho criados, António Sevinate Pinto explica: «nesta fase, na parte industrial, teremos o chefe de fábrica e assistente e quatro a seis postos na fábrica». A iniciativa vai além da indústria. A família é proprietária da empresa Agrobeja e prepara-se para dar apoio técnico a todos os que queiram investir no amendoal – e noutras culturas –, independentemente de venderem a produção, ou não, à Migdalo. Apoio é também um dos vocábulos utilizados pela Agromais – Entreposto Comercial Agrícola, C.R.L.. A empresa, originária do Ribatejo, quer exportar o seu modelo organizativo para outras regiões. O Alqueva é a primeira área onde o método de trabalho da Agromais está a ser aplicado. Dão apoio na produção das culturas – com aconselhamento técnico – e na comercialização. «Já há três anos que vendemos factores de produção no Alqueva. Nesta campanha, estas vendas já representaram 10% a 15% da nossa facturação», disse Luís Vasconcellos e Souza, presidente da Agromais. O investimento não se limita ao apoio à produção, a empresa é também ela produtora e co-promotora da maior unidade de secagem de milho do Baixo Alentejo, a PlusAlfundão. frutas, legumes e flores | Abril 2016
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Da gota-a-gota aos pivôs, um retrato da rega em Alqueva Nos invernos sem chuva, nada se cultivava nas terras alentejanas mais a Sul. Hoje, existe uma estrutura complexa montada que permite ter água para rega, sempre que o céu nada liberta. Gota-a-gota, pivôs e aspersão são algumas das práticas de rega de que os agricultores necessitam. Rita Marques Costa e Sara Pelicano
A construção do perímetro de rega de Alqueva serviu de íman a
muitas empresas especializadas em rega, sediadas em diferentes locais do País. A Irricampo, natural de Santarém, deslocou-se até Beja em 2002, «por acreditar que Alqueva seria uma realidade», conta o gerente, João Ferreira. O mesmo aconteceu com a Sulregas que, em 2000, construiu uma filial na capital do distrito do Baixo Alentejo, algo que «impulsionou muito o negócio», garante Nelson Barrambanas, director comercial da empresa. A Magos Irrigation Systems, sediada em Salvaterra de Magos, deslocou-se até Beja em 2015 para estar «presente no maior mercado de rega do País», conta António Gastão, gerente da Magos. Desde então, a empresa instalou sistemas de rega para culturas tão distintas como os pequenos frutos, a nogueira, a vinha, o olival, a amendoeira e a romã. O consumo sustentável e consciente deste recurso é uma preocupação sempre presente – quer nos agricultores, quer nas empresas fornecedoras do serviço – na hora de regar. Há 19 anos que a Irripax trabalha na região. A empresa nota o dinamismo impresso pelo perímetro de rega do Alqueva. «Normalmente, os clientes já têm uma ideia formada daquilo que querem para a sua cultura», diz Luís Brito, sócio-gerente da Irripax, sediada em Beja.
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Na maioria das situações, as parcelas dispõem de condições para a rega, bastando apenas adquirir o equipamento. No entanto, há casos em que é necessário bombear água porque tem falta de pressão. Os sistemas que mais se têm usado são pivôs, gota-a-gota e aspersão. Luís Brito fala ainda de um novo método: «Para um pomar de nogueiras, estou a desenvolver um sistema de rega de micro-aspersão, um conceito de aspersão localizada». Trata-se de uma irrigação sob a copa das árvores, gerando humidade. Esta técnica permitirá controlar «a humidade mais facilmente», bem como as pragas, já que «os produtos são aplicados por micro-pulverização». Regar com eficiência A preocupação com a utilização eficiente dos recursos também está presente para a maioria dos produtores. «Está a tentar gastar-se o mínimo de água possível e obter o máximo de produção», conta Luís Brito. Também o responsável da Irricampo nota «uma grande consciencialização» dos agricultores para esta matéria. «Todos já têm em mente que é indispensável não só adoptarem as boas práticas agrícolas, mas também equipamentos que utilizem tecnologia de última geração e, acima de tudo, bem dimensionados.» As tecnologias de informação são um elemento chave no apoio à decisão. “Quando? Quanto? Como regar?” são questões a que alguns sistemas tecnológicos ajudam a responder, como é o caso
da aplicação Irristrat, desenvolvida pela empresa portuguesa Hidrosoph, fundada em 2008. Equipamentos de monitorização obtêm, em tempo real, dados da cultura, da humidade do solo e dados meteorológicos. A aplicação processa os dados e a equipa de técnicos analisa os resultados e apoia, remota ou localmente, os agricultores na implementação dos objetivos da campanha. Na Irristrat, toda a informação fica disponível, possibilitando uma gestão eficiente da água. «O nosso serviço é personalizado, mediante os padrões de quantidade e qualidade que o agricultor pretende para a sua cultura», disse Sandra Pires. A directora técnica da Hidrosoph comentou ainda que «o objetivo é melhorar a produção. O uso eficiente de água pode não implicar poupança de água, mas significar uma melhor distribuição». Desde o primeiro dia que a empresa trabalha na região do Alentejo – com escritório em Évora –, mas a albufeira de Alqueva trouxe mais oportunidades. «Há inclusive novos investidores, por exemplo do Norte da Europa, com grande experiência de produção agrícola, mas pouca de rega» e a Hidrosoph actua como uma aliada nesta prática agrícola.
› A entrada da aplicação Irristrat
› Informação recolhida por sonda
› O tempo é outra das informações da aplicação
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A ovibeja tem «provocado as pessoas para serem actores» de mudança Entre 21 e 25 de Abril, decorre a 33.ª edição da Ovibeja. Manuel Castro e Brito*, presidente da Associação de Agricultores do Sul (ACOS), entidade organizadora da feira, falou sobre o crescimento do certame, do impacto do perímetro de rega de Alqueva e das novidades desta edição. Rita Marques Costa
Em três décadas de existência, o que mudou na ACOS e na Ovibeja? A Ovibeja tem acompanhado sempre os tempos. A ACOS foi uma associação criada quando entrámos na União Europeia (Comunidade Económica Europeia, na altura) e a sua criação também foi motivada por isso. Uma organização que se pretendia mais moderna, mais aberta para o exterior e para as realidades de uma Política Agrícola Comum que ia ser efectiva no nosso País. A partir daí, temos acompanhado todas as mudanças que tem havido na agricultura da região, também no desenvolvimento económico e social e, de há pouco tempo para cá, no desenvolvimento do regadio.
Virgem Extra. Surgiu na sequência do perímetro de rega do Alqueva? Actualmente, 60% da área de regadio está ocupada com olival. Neste momento, surgem a toda a hora novos lagares. O sector do azeite tem cada vez mais peso aqui na região e também na agricultura do País. Temos de fazer qualquer coisa por este sector. Em boa hora começámos com este concurso, que, neste momento, está no ranking dos 19 concursos mundiais. Note que há concursos dos Estados Unidos da América, de França, de Espanha. O concurso Mario Solinas (espanhol), que estava em primeiro lugar, este ano disputa a liderança com o concurso da Ovibeja, apoiado pelo Crédito Agrícola.
Como é que o regadio alterou a Ovibeja? É um novo paradigma. Do sequeiro para o regadio é uma revolução. Temos acompanhado essa revolução e temos, acima de tudo, provocado as pessoas para serem actores desta mudança. Isso tem acontecido com um brutal investimento da parte dos agricultores. Mudar uma exploração do sequeiro para o regadio é um grande investimento. Não só financeiro, mas também de procura de know-how [conhecimento] e de mentalidades das pessoas.
Notam maior interesse das empresas estrangeiras em expor na Ovibeja? Sim, porque onde há mercado as empresas não dormem. Há muita procura e nós tentamos dar resposta tanto através da Terra Fértil, como através do campo da feira, que é um espaço que temos ao ar livre, principalmente com maquinaria agrícola. O campo é um espaço com imensa procura e este ano teremos mais expositores, mais área e obviamente novidades em tudo o que é maquinaria agrícola e novas tecnologias.
Nesta edição da Ovibeja vão ter uma área dedicada à inovação e ao agro-negócio. Qual é o objectivo? É a continuação da exposição que iniciámos no ano passado, a Terra Fértil, que tem tido muita procura – teremos de duplicar a área. Envolve esta nova agricultura, moderna, que utiliza um factor de produção importantíssimo como a água. Temos empresas da região, estrangeiras, outras empresas que estão associadas a empresas internacionais. Tanto de hortícolas como frutícolas e um grande peso do sector do azeite.
Como é que se pode tornar a Ovibeja mais profissional? Eu diria que a Ovibeja é muito profissional. É a maior mostra de gado selecto do País. Estão aqui todas as associações de bovinos, ovinos, suínos. Temos aqui a agricultura representada de forma organizada. Temos também as secções de agricultura de grande precisão, que recorre às novas tecnologias da informática e dos satélites. O que não impede que a Ovibeja seja uma festa e mantenha a sua personalidade. É muito popular e querida das gentes do interior, do resto do País, como também dos nossos vizinhos da Andaluzia. Ainda mais, é uma feira da juventude. Foi a primeira que apresentou trabalhos à noite. A Ovibeja é uma feira que não fecha. Esta organização orgulha-se muito de ter uma vertente social importantíssima e ainda mais muito dedicada à juventude. É uma feira diferente, embora cada vez mais o seu modelo seja adaptado a todas as feiras do nosso País.
O que está exposto neste espaço? Temos eventos. Temos o business to business (B2B), onde as pessoas estão a discutir os seus negócios frente a frente. Iremos ter conversas. Algumas demonstrações, colóquios e mesas -redondas. De uma maneira mais pragmática e informal, um modelo que no ano passado já correu muito bem. Além disso, terão o 5.O Concurso Internacional de Azeite 50
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* Esta entrevista foi cedida no início de Março, tendo Manuel Castro e Brito falecido a 29 de Março.