novos-museus de arte na contemporâneidade contextos, processos e transformaçþes dos museus e sua arquitetura
novos-museus de arte na contemporaneidade:
contextos, processos e transformações dos museus e sua arquitetura
Fernanda Lins de Carli Silva
Trabalho de conclusão de curso de graduação a ser apresentado na Escola da Cidade Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (AEAUSP), como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo. orientadora: Fernanda Pitta vw dezembro, 2015
agradecimentos
A querida orientadora Fernanda Pitta, por todas as conversas e orientações sempre muitos pertinentes e proveitosas; pela disponibilidade e comprometimento no esclarecimento de qualquer dúvida; por reler infinitas vezes o mesmo texto, sempre atenta a pequenos detalhes e, assim, enriquecendo sempre a pesquisa e a formação das ideias; e, finalmente, pelo suporte até mesmo psicológico às angustias de alguns momentos. A Mariana Lins, pelo apoio, entusiasmo e paciência de sempre, em ajudar carinhosamente um trabalho que foge consideravelmente à sua área de atuação. A Celia Lins pelo apoio e atenção de sempre, pela paciência e pelo carinho infinito em todos os momentos, não só do trabalho, mas da vida toda. Aos amigos queridos Stefan Podgorski, Victor Panucci, Ricardo Justi, Rebeca Lopes e Helena Ribas pelas dicas, conversas e momentos de descontração trabalhando juntos, e também pela paciência em meus momentos monotemáticos. Aos professores e queridos Celso Longo e Daniel Trench, pelas agradáveis conversas e dicas de formatação gráfica do trabalho. Ao primo querido Rodrigo Lins pela ajuda urgencial na concepção gráfica; e a todos aqueles que, mesmo não citados específicamente, de alguma forma fizeram parte deste processo de encerramento acadêmico. E que com o companheirismo de sempre, fizeram deste trabalho um pouquinho mais completo e importante para mim. Obrigada a todos.
11 introdução
17 o novo cenário das artes e da cultura na contemporaneidade 23 período pop e seus desdobramentos 37 o boom dos espaços destinados à arte 42 a centralidade da cultura e da arte na economia contemporânea 50 uma nova conceituação para o museu de arte
59 os museus contemporâneos 65 o público e o programa 83 a escala e a implantação urbana 99 a arquitetura
119 conclusão
145 bibliografia
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introdução
Nos últimos cinquenta anos, arte e arquitetura vêm convergindo em pontos extremamente importantes para que possamos compreender algumas mudanças culturais da sociedade atual. Aqui, o objeto de interseção, e que é base da discussão é o museu contemporâneo de arte - entendido como contemporâneo tanto por sua arquitetura, quanto por seu conteúdo expositivo - que, na maioria das vezes, é acompanhado por um extenso acervo de arte moderna e contemporânea. Inseridos na cultura de massas (termo que virá a ser melhor explicado e desenvolvido ao logo do texto), a reconfiguração total dos espaços culturais, junto à carência de espaços públicos, tornou-se essencial, fazendo dos museus um campo arquitetônico de grande visibilidade e experimentação por parte dos arquitetos e das instituições. O trabalho aqui apresentado parte da apresentação de algumas transformações socioculturais ocorridas na segunda metade do século XX que fomentaram um grande momento de ‘revisão’ da arte, uma das vanguardas mundialmente mais conhecidas, a Pop Art. Utilizando dos questionamentos e embates levantados por Hal Foster a respeito da Pop, a discussão se desenvolve a partir de um panorama geral de tais discussões e a apresentação de alguns dos pontos mais importantes, e que influenciaram significativamente o cenário artístico de um modo geral.
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Na sequência, tendo, portanto, elencado uma série de novos embates e demandas, a discussão se desenvolve no que diz respeito aos efeitos dos novos paradigmas artísticos na própria noção de cultura. De que maneira o novo contexto artístico promove uma aproximação entre o espectador e a obra de arte, e assim transforma totalmente a relação entre ambos. A intenção é compreender o que motivou um grande aumento dos espaços culturais, principalmente, dos museus de arte, sejam elas novas construções ou a atualização dos existentes às novas premissas contemporâneas. Logicamente, tal aumento, foi gerado por diferentes motivos, como veremos, mas também foi causador de outras importantes transformações. A cultura passa a operar de maneira estratégica na economia e na política das cidades e países, e assim assume uma posição central, essencial, o que gera também a necessidade de compreender melhor tais processos. Para tanto a autora Otília Arantes auxiliará a discussão, trazendo as ideias-chaves para compreender histórica e criticamente os deslocamentos ocorridos. Feita a discussão semântica do novo cenário em que os museus estão inscritos inicia-se, então, uma leitura mais específica quanto às novas demandas sociais e culturais a que os museus contemporâneos precisam responder. É assim, portanto, que tanto a instituição do museu quanto a arquitetura que a materializa enquanto espaço físico, se transformam substancialmente, lidando de maneiras muito diversificadas com cada tipo de intenção. Diversas questões começam a aparecer de maneira muito forte na crítica e na produção desses novos-museus. Trata-se, agora, da articulação de uma arquitetura soberana, fruto da sociedade de consumo (na qual a economia da experiência tornou-se essencial) em conjunto com a concepção espaços públicos, na maioria das vezes, mais tímidos, porém com um poder estratégico insubstituível. Por vezes, como veremos mais adiante, a arquitetura dos museus se apresentou
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com formas e aparências muito distintas: ora por seu caráter escultórico, ora seu impacto urbanístico, ora por seus significados políticos, econômicos, etc. Os tipos de museus são muitos, e assim, consequentemente, condizem a diferentes realidades que traduzem diferentes direcionamentos e tipos de estratégias adotadas pelas esferas de mando. Na arquitetura, os museus de arte espelham sempre uma relação de proximidade ou afastamento com a história, numa oscilação constante entre tradição e modernidade. São marcos simbólicos na cidade, tanto por sua arquitetura, por sua inserção urbana, quanto por seu caráter histórico e simbólico. Atualmente, o projeto desses edifícios culturais tem significados muito mais abrangentes que não somente o das relações entre arte e arquitetura. A ideia de serem simples espaços de armazenamento e exibição de objetos é questionável, não corresponde à complexidade e aos desafios contemporâneos. Pode-se dizer que, portanto, nota-se uma ressignificação do termo “museu”, denunciando o quanto, hoje, os museus de arte são muito mais que um lugar de contemplação, envolvendo muitas questões e disciplinas que antes eram simplesmente tangentes, mas que atualmente operam inseridos e incisivamente na concepção e atualização dos museus de arte. Programa, escala, estética, implantação urbana, suas funções socioculturais e político-econômicas são alguns dos ‘ingredientes’ que orientam o que podemos entender como um novo raciocínio do que vem sendo chamado de novos-museus, modificando além da sua relação com arquitetura, arte, cidade, e também o próprio papel do arquiteto na produção contemporânea. Acreditando ser o maior exemplo da intersecção arte e arquitetura, os museus de arte são, hoje, o sonho de promoção imediata de muitos arquitetos, empresas, e mesmo governos. São eles detentores de um teor ideológico e simbólico que acompanha o discurso da administração da
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cultura, do qual muitos artistas e arquitetos são seduzidos pelo poder gerado por uma participação – ganhando, assim, grande visibilidade pública. Porém, nem de todo mal, tampouco único, é esse interesse. Existem também projetos com um valor urbano e social muito relevantes no contexto em que estão inseridos, que foram idealizados e concebidos por arquitetos comprometidos com a promoção de tais espaços dentro da sociedade contemporânea, e então, a questão de autopromoção e reconhecimento produtivo se torna quase secundária. Para tanto, este trabalho parte de uma discussão pautada pelas diferentes interpretações feitas desse fenômeno que refletem diferentes momentos do contexto histórico das últimas décadas. Alguns desses críticos e pensadores aqui adotados buscaram entender esse processo ora pela percepção das próprias mudanças no campo da arte, ora pela compreensão do novo estatuto dos museus como instrumentos de políticas econômicas e de valorização do capital, ou ainda pelos novos modos de projetar e fazer arquitetura, como para Otília Arantes, para quem o museu é: [...] um verdadeiro emblema das políticas de animação cultural promovidas pelos Estados do capitalismo central, em função dos quais mobilizam então o atual star-system da arquitetura internacional, no intuito de criar grandes monumentos que sirvam ao mesmo tempo como suporte e lugar de criação de cultura e reanimação da vida pública. Enquanto vão atendendo às demandas de bens de consumo não-materiais nas sociedades afluentes, também vão disseminando imagens mais persuasivas do que convincentes de uma identidade cultural e política da nação, e política porque cultural. (ARANTES, O., 1991, p.164)
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Depois da breve introdução, o texto que segue não se resumirá somente à investigação e descrição arquitetônica, mas principalmente à compreensão mínima da conjuntura total dos museus contemporâneos. As transformações e as consequências multidisciplinares que podem ser genericamente traduzidas pelo que vem sendo chamado de ’cultura de museus’. O embate teórico acerca dessa nova geração de espaços de cultura será aqui desenvolvido e suportado por alguns autores principais (Otília e Pedro Arantes, Dominique Poulot, Hal Foster, Rem Koolhaas, Josep Maria Montaner, James Cuno, Chin Tao-Wu, e outros) e alguns museus essenciais (o Beaubourg - Centro Cultural Georges Pompidou -, em Paris, o Guggenheim de Bilbao e o Museu Iberê Camargo, em Porto Alegre).
o novo cenรกrio das artes e da cultura na contemporaneidade
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Para além única e exclusivamente da disciplina aqui em pauta,
a discussão a seguir objetiva a melhor compreensão das transformações ocorridas nas últimas décadas nas diferentes áreas tangentes à arquitetura. Essenciais para a contextualização de uma produção artística totalmente diferente àquela anterior aos anos 80, transformações no contexto social, econômico e, assim, também, artístico serão aqui abordadas separadamente, demonstrando como as mesmas convergem em diferentes pontos resultando em uma complexa diversidade da produção contemporânea de museu de arte.
Nesta primeira etapa da dissertação, os subcapítulos seguintes
abordam duas temáticas essenciais para a construção do raciocínio que permitirá a discussão sobre o contexto em que se inscrevem as transformações que fomentaram a nova arquitetura dos museus do século XXI. No primeiro momento, a discussão parte da reflexão sugerida por Hal Foster, em O complexo arte-arquitetura (2011), no qual se promove a discussão sobre os novos paradigmas adotados pela arquitetura contemporânea, dita pós-moderna também. Parte-se, então, do apontamento da complexidade em que se inserem os questionamentos levantados pela vanguarda da Pop Art e suas fortes consequências em diferentes processos inerentes a produção e ao cenário artísticos, os quais aqui se tornaram ponto de partida. No lugar do estilo internacional de Walter Gropius, Le Corbusier e Mies van der Rohe, Foster descreve um suposto estilo global, tendência que deixou de tomar partido da teoria para se alimentar das artes visuais, com obras calçadas no efeito cenográfico dos materiais. Renzo Piano, Norman Foster e Richard Rogers são heróis improváveis dessa nova era. (MARTÍ et al., 2015)
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Hwwal Foster é o crítico e historiador de arte norte-americano que tem pensado o museu como objeto principal para a reflexão sobre a nova arquitetura da contemporaneidade. Para este autor, a arquitetura dos museus tem muitas vezes suplantado a atenção da própria arte que se dedicam a exibir: ‘Alguns desses edifícios são tão performáticos ou escultóricos que os próprios artistas devem se sentir os últimos a chegar à festa’ (MARTÍ et al., 2015).
Operando no registro do sistema de arte consumado pela Pop, os
museus, para Foster1, são signo de uma nova cultura, um novo tipo de relação da arte com a vida cotidiana e com as imagens comuns do dia a dia da vida contemporânea, numa sociedade de base consumista, na qual quase nada escapa a tal nova pré-condição. Nesse novo cenário artístico em que as imagens tomam precedência, o consumismo também se torna elemento preponderante, alterando não somente os diferentes campos das artes, mas vindo, também, a desenvolver mudanças extremamente importantes no modo de ver o mundo contemporâneo, com o estabelecimento de uma nova relação entre vida, arte e cultura. Nesse contexto, novos questionamentos e posicionamentos quanto às inovações tecnológicas e ideológicas da atualidade fomentam o desenvolvimento de uma arquitetura de museus de arte cada vez mais complexa e questionada.
Na sequência dessa primeira abordagem, o capítulo seguinte,
destinado à discussão sobre o grande aumento de investimentos e construções de edifícios culturais - no qual inclui principalmente os museus, sobretudo, de arte. Muito consequente da discussão proposta por Otília Arantes2, a temática principal que a autora defende e que aqui então será seguida é quanto a contextualização da cultura como um dos novos pilares principais da economia contemporânea, alvo de investimentos e especulação que causam conflitos e novo parâmetros para diferentes as esferas
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envolvidas.
Seguindo a argumentação de Arantes, propõe-se a discussão so-
bre de que maneira a arte é inserida no contexto do mercado e na produção de bens de consumo, rapidamente, onde assume cada vez mais seu papel de produto, abandonando pouco a pouco sua característica de manifestação autônoma. Operando na base da indústria cultural, a arte - principalmente aquela contida no interior dos museus - agora tem de atender a pré-requisitos e aos desejos do mercado e dos consumidores e, assim, inibindo e congelando a tão aclamada liberdade de expressão. Tornaram-se, cultura e arte, políticas econômicas e estratégias públicas e privadas - das grandes marcas - mascaradas de uma certa preocupação de preservação do bem cultural, mas que na verdade ilustram perfeitamente a maneira como a sociedade contemporânea e o consumismo agregaram um novo valor político às mesmas.
Propõe-se aqui, portanto, sob dois aspectos diferentes, a reflexão
sobre de quais maneiras as modificações socioculturais da contemporaneidade atingiram os museus de arte; quais foram as transformações que ocorreram em diferentes contextos e disciplinas, e que apontam para uma produção atual que se coloca cada vez mais detentoras de uma complexidade e subjetividade dignas de diversas críticas e discussões que vêm se desenvolvendo nos últimos anos.
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período pop e seus desdobramentos
Quando falamos de pop, as primeiras imagens que nos vêm à mente são as das disciplinas de arte, moda e, também, música. Mas, como defende o crítico norte-americano Hal Foster, é indispensável discutir a forte influência que tal vanguarda teve, desde sempre, nos embates arquitetônicos da contemporaneidade. Como coloca Foster sobre a vertente artística que veio a ser mundialmente conhecida como Pop Art, “A superficialidade consumista dos signos e a serialidade dos objetos afetou a arquitetura e o urbanismo tanto quanto a pintura e a escultura“ (FOSTER, 2015, p.20). É no contexto da década de 60, na Europa, e em 80, na América do Norte, que a problematização da cultura de consumo foi colocada em pauta e veio por transformar totalmente as noções de cultura e arte. O surgimento da Pop Art foi em solo europeu, mais especificamente na Inglaterra - com o IG (Independent Group), de 1952 a 1956, formado por alguns dos principais nomes da Pop Art: Lawrence Alloway, Alison e Peter Smithson, Richard Hamilton, Reyner Banham, e outros mas rapidamente conquistou os artistas norte-americanos, onde e quando atingiu seu período de maturidade. Nos diferentes campos artísticos, propunham o enfrentamento direto da crise da arte do século XX, admitindo a massificação da cultura popular capitalista como nova matéria e essência das obras. Para isso, procurava-se analisar a produção industrial no contexto capitalista, cuja lógica de exploração e lucratividade transforma tudo
“Just what was it that made yesterday’s homes so different, so appealing?” Richard Hamilton, 1953
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que alcança em produto. A ideia de uma ‘estética das massas’, já colocada nos debates das vanguardas históricas do século XX, tornou-se o caminho para encontrar uma definição de cultura pop. “[...] uma arte produzida a partir de imagens conhecidas de todos, extraídas de histórias em quadrinho” (GOMBRICH, 1995, p.274) e de mercadorias de estantes de lojas e supermercados. Grant, em seu livro Tudo sobre arte, de 2011, descreve a pop como “a primeira tentativa séria de se enfrentar o problema do qual era o lugar do artista e de seu produto - a obra de arte única, assinada pelo autor – no moderno mundo do consumo e da comunicação de massa“ (GOMBRICH, 1995, p.487). Como argumenta Foster, a pop tratava do desenho das coisas descartáveis, do projeto pop de descrição do ambiente consumista e sua mentalidade. Isto já estava claro. A exigência da materialização a partir de uma negociação entre arte e vida, tornava cada vez mais complexas as relações de busca de sentido para os artistas contemporâneos. O tema eleva-se ao status de conteúdo pela atitude do artista em relação à sua obra. Podia também ser entendida como a principal reação à urgência de entender o mundo no qual os artistas estavam inseridos. Obra de arte, artista e público, são conceitos que passaram por uma grande transformação da noção moderna, ainda romântica, por assim dizer, que se tinha em relação à arte. Com os constantes esforços do espectador para fazer um julgamento estético apropriado ou para conseguir ao menos identificar-se com ela, tomando parte de uma sociedade desenvolvida, que aderiu a um avanço cultural, onde seus membros passam por “doloroso ritual iniciático” para se sentirem cultos. E mesmo com toda a iniciativa, ao ser confrontado com a dispersão dos locais de cultura, diversidade das obras apresentadas e o seu número sempre crescen-
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te, o número igualmente crescente de revista, jornais e publicidade, solicitado por cartazes, influenciado por vezes pelos críticos de arte e reunindo catálogos, o público está, no mínimo, desconcertado pela arte contemporânea. (CAUQUELIN, 2005, pp. 07-08) Para Anne Cauquelin3 - filósofa, artista e escritora de livros importantes sobre o assunto - a multiplicidade de obras e títulos acerca da arte geravam certa confusão sobre o que seria exatamente arte contemporânea. Segundo ela, existem duas rupturas principais sobre a terminologia do que se considerara obra de arte: uma sugerida por Marcel Duchamp4 (1887-1986) e a outra, intrínseca da pop, a da vertente Andy Warhol5 (1928-1987). A proposta de Duchamp, ao expor objetos já feitos, já disponíveis e geralmente utilizados na vida quotidiana, como a bicicleta ou o urinol batizado de fonte, o artista propõe a reflexão sobre o lugar de exposição, sendo ele o principal produtor das obras de arte. Ou seja, são valorizados os lugares de exposição (museus, galerias) como sendo o palco onde tudo o que é mostrado é considerado arte. São espaços tradicionalmente destinados à arte, sendo os mesmos os grandes protagonistas da definição do que é artístico ou não. Consequentemente, neste caso, o artista deixa de ser (na concepção “romântica”) o gênio-criador e passa a ocupar a função de apresentador de um objeto, no qual o real produtor da arte é então, de certa forma, o espaço que ela ocupa (CAUQUELIN, 2005). Warhol, por sua vez, como coloca Cauquelin, em parte de seus trabalhos, é responsável também por expor os objetos do cotidiano de maneira distinta à de Duchamp, não em sua materialidade, mas reproduzindo as imagens, frequentemente em serigrafia e fotografia, fazendo uso de imagens de objetos saturados pela publicidade e propaganda para criar a obra de arte. Passa-se a entender a arte como parte do modo de produ-
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ção voltado para o consumo. As transformações foram em todas as etapas, desde a concepção, produção, recepção e até a percepção da obra de arte. O consumismo então alterou totalmente o contexto e o entendimento das obras para além de seu aspecto, de sua aparência, mas principalmente a essência, sua natureza. Trata-se da constante incerteza, na qual confunde-se o que é produto, e o que não é. Na medida em que o capitalismo estabeleceu novas formas de produção, passou a ter efeitos até mesmo na própria concepção cultural. De modo mais geral, podemos resumir a ideia em um dos pensamentos do artista de maior prestígio dentro da corrente pop: Warhol defendia que a arte não podia evitar ser tratada como mercadoria da mesma forma que latas de sopa, barras de sabão e caixas de cereal, fato que o levou também a chamar seu próprio estúdio, onde idealizava e concebia suas obras, de A Fábrica. Assim então era a descrição que enfatizava a pop art para além de sua aparência industrial. O processo de concepção e execução era tão importante quanto a essência teórica e ideológica. Na Fábrica, o modo como seus assistentes ajudavam na impressão múltipla das imagens determinadas pelo artista, era descrito e efetuado semelhantemente à uma linha de produção fordista. Cada decisão de marcas, cores, e mesmo como introduzir alguns erros no processo serigráfico eram extremamente precisos, e também essenciais, a cada tiragem. Era a produção dos bens de consumo da cultura capitalista, levadas para dentro do cenário artístico, desenvolvendo um novo raciocínio de produção e mesmo idealização totalmente diferenciados daquele que vinha se produzindo até então, ao ponto de ter sido considerado o momento histórico de virada da relação arte e público, quando atingiu um novo nível de amplitude de espectadores e admiradores de arte. Sua total assimilação de imagens conhecidas por qualquer indivíduo gerou o que podemos chamar de um forte período de
“A Fonte” Marcel Duchamp, 1917
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divulgação e proliferação da arte, no que aos poucos foi abandonando e se afastando da noção de elitismo dentro da arte e assumindo o que veio a ser considerado, de certa forma, a democratização da mesma, trazendo signos de reconhecimento comum e pertencentes ao imaginário de, praticamente, toda a sociedade. Era tudo parte de uma “celebração às possibilidades eufóricas do consumismo, dos desenvolvimentos técnicos e midiáticos que registravam o rápido processo de mudança do mundo pós-guerra” (FOSTER, 2015). O ‘sonho americano’ era então no mesmo passo promessa e maldição, no qual os artistas eram falsamente tidos como ingênuos. Pareciam simplesmente aceitar, assumir e ainda disseminar esse sonho, mas na verdade podemos, então, entendê-los como aqueles que reconheceram cautelosamente que este sonho existia em lugar nenhum exceto no mito, ou em uma série brilhante de colagens, serigrafias, pinturas e esculturas. Para Foster, a pop art foi o único ‘lugar’ onde o sonho de fato podia existir naquele contexto. Revelava as contradições de uma ambiência que acreditava-se ser de progresso e de poder de consumo com um ideário inalcançável de felicidade sintética providenciada pelos bens materiais. Em termos gerais, além da própria essência individual de cada obra, a Pop influenciou diretamente a cultura e a sociedade, e tal influência explica muito de uma nova consciência artística pública e generalizada. Conforme McCarthy6: Sua popularidade em todas as instâncias, que foi tão imediata quanto duradoura, autorizou muitos novos indivíduos a levar a arte mais a sério. Aqui estava uma arte compreensível na superfície, mas também em profunda ressonância com aqueles observadores dispostos a contemplar cuidadosamente as imagens e os contextos selecionado pelos artistas. As imagens eram localizadas o bastante
“Latas de sopa Campbell” ou “32 latas de Sopa Campbell” Andy Warhol, 1962
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em seu tempo para que não se precisasse de uma formação clássica ou religiosa para reconhecer a iconografia. Em vez disso, uma disposição de reconsiderar imagens já conhecidas podia levar alguém a reconhecer a prevalência de antigos temas humanos, como desejo e transitoriedade, em um mundo marcado por seu ritmo rápido. Além do mais, a arte pop era produzida em um momento no qual mais universidades, galerias, e museus estavam abrindo suas portas aos públicos maiores que queriam acesso às artes. Involuntariamente, ela tornou-se a melhor propaganda que o mundo da arte poderia esperar, e a sua popularidade continua inabalada até o presente (McCARTHY, 2002, pp. 75-76) Não unicamente, a pop art tem sido alvo fácil de críticas que apontam para um processo de depreciação da arte, na qual perde-se o valor além do objeto-artístico, mas principalmente do artista como gênio-inventor-poético. Para Foster, entretanto, se permitimos que as obras permaneçam como a forma material das proposições teóricas, podemos de fato concluir que a sensibilidade da pop era mais interessante, e mesmo mais subversiva, do que se considerava possível. Por mais de uma geração, a pop recebeu status de mestria de museus e colecionadores. Foi por muitas vezes tida como a arte que se só assim se entendia a partir de sua implantação, exaltação, então, apreciação em salões de arte, galerias e museus. De maneira mais geral, para Foster, a premissa pop foi uma reconfiguração gradual do espaço cultural, consequência direta do capitalismo e da sociedade consumista em ascensão, nos quais a estrutura, a superfície e o símbolo são combinados de nova maneira, derivando a um novo espaço misto que persiste entre nós uma dimensão pop que permeia a arte e a arquitetura contemporânea ainda hoje. Em síntese, é a interpretação que o autor apresenta:
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A dialética da arte do pós-guerra, proponho aqui, produziu não só um deslocamento da ilusão pictórica para o espaço real, mas também a remodelação do espaço como ilusão no sentido amplo, com importantes ramificações também para a arquitetura. (FOSTER, 2015, p.12). Esse espaço da ilusão é assim chamado por ser muito marcado por uma subjetividade extrema, que ainda o mesmo autor trata como o lugar mais intrínseco de uma “subjetividade atordoada e sociabilidade atrofiada” (FOSTER, 2015, p.13), que atropela os sentidos do indivíduo com uma sequência de efeitos e apelos sensoriais que fazem daquele espaço uma verdadeira experiência. Nenhum tipo de arquitetura é arbitrário ou inocente, mas, ao contrário: se configura como um meio a viabilizar a legitimação, e reprodução, de um determinado ponto de vista, de uma certa ideologia que é central a uma determinada estrutura social. Uma das características mais marcantes da arquitetura sempre foi proporciona visibilidade e poder a alguém, a alguma entidade pública ou privada e/ou afim de inspirar medo ou admiração da população. Mais especificamente ao momento que aqui estamos tratando, a relação da arquitetura com as tais novas precondições artísticas eram cada vez mais estreitas, ao passo que uma disciplina interferia e transformava algo na outra, e assim vice-versa. A nova plasticidade que a arte assumia a partir da tecnologia se traduziu na arquitetura de diferentes formas, mas quase sempre era resultante em um grande ”celebração às tecnologias, como uma bagunça rica e visualmente selvagem, de tubulação e fiação, suspensões e passarelas” (FOSTER, 2015, p.13). Logicamente, a partir dessa breve descrição, podemos citar inúmeros edifícios conhecidos que fazem essa mesma alusão. Porém, aqui então, o que vale enfatizar é como tal estratégia tem por fim criar uma
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nova ambiência de fantasia, na qual mais importante que de fato expor e exaltar essas novas tecnologias, era imperativo explorar uma nova elaboração em novos modos de apropriação das mesmas, para diferentes fins. A incorporação do extraordinário mundo tecnológico tornou-se ferramenta indispensável para o novo contexto artístico que se criava visando gradativamente um sensório de distração, no qual a fantasia e o simbolismo eram os novos principais paradigmas da arquitetura contemporânea. Segundo uma das mais fortes correntes de pensamento crítico sobre o período e suas então consequências na arquitetura, Robert Venturi, Denise Scott Brown e Steven Izenour7 descrevem muito bem essa nova consciência de exploração dos meios de comunicação e as diferentes tecnologias advindas da produção industrial, como novas ferramentas e, mesmo, materiais construtivos de cidades modernas ou da requalificação de outras. Como o próprio nome sugere, o objeto de estudo para aprofundar tais ideias e demonstrá-las na sua forma mais real que se podia então conhecer até então, Aprendendo com Las Vegas é o principal ensaio onde arquitetura e urbanismo assumem as precondições pop em suas diferentes essências, mas sempre muito enfatizando o poder das tecnologias de comunicação no contexto do século XX. Publicado em 1972, o ensaio apresenta a cidade de Las Vegas como o maior exemplo de uma cidade americana onde às referências à comunicação e ao comércio são elementos conformadores de uma nova paisagem e, portanto, de uma nova dinâmica de vida urbana. Para Foster, esse ensaio: Pôde também concluir que só uma arquitetura cenográfica (isto é, que prioriza uma fachada de letreiros) poderia fazer conexões entre muitos elementos, bem distantes e vistos depressa. Desse modo, os Venturi traduziram importantes conceitos dessa ‘nova ordem es-
Centro Georges Pompidou ou Beaubourg R.Rogers e Renzo Piano, Paris, 1977
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pacial em cruas afirmações da paisagem automobilística brutal das grandes distancias e altas velocidades. Essa manobra naturalizou uma paisagem que era tudo menos natural; e mais: instrumentou um sensório de distração, instando os arquitetos a projetarem para ‘uma plateia cativa, um tanto temerosa, mas parcialmente desatenta, cuja visão é filtrada e dirigida para frente’. (FOSTER, 2015, pp.2526) Essa nova ordem simbólica da superfície e da tela foi o que preparou uma nova fase, que veio a ser chamada de pós-modernismo, no qual a rejeição pop do elitismo extremo deu lugar a uma estratégia pós-moderna de certo caráter manipulatório, populista, como defende Foster. As precondições da pop não foram abandonadas ou mesmo negadas, mas a estratégia principal pós-moderna era a utilização de uma forte ironia, de uma mistura singela de reverência e cinismo. A alusão a uma tradição arquitetônica misturada à inclusão da iconografia comercial serviu como um código de realce das fronteiras entre classes, dando a falsa impressão de quererem transpô-las. A inserção de estratégias pop dentro do movimento pós-moderno poderia parecer simplesmente um alicerce mais delicado dentro de uma vanguarda recente, mas na verdade, para Foster, foi fator decisivo para que o pós-modernismo viesse a se tornar uma vanguarda muito interessante, e útil, para a Direita. Uma das obras mais familiares desse período é o Centre Georges Pompidou8, cujo ao mesmo tempo faz alusão a diferentes e diversos signos pop, recupera uma essência popular. A obra foi de fato tão emblemática que marcou uma nova produção arquitetônica que para além da disciplina da arquitetura, e mesmo das artes, teve consequências importantes em uma nova cultura de espaços que conjugam de modo elaborado arte-arquitetura-cidade, que será melhor
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abordado e desenvolvido na sequência deste trabalho. Essa fórmula foi muito bem-sucedida não só para empresas, cidades e Estados, mas muito também para os museus, para qualquer entidade corporativa que queira se promover através de um marco, de uma arquitetura emblemática, mediante um ícone instantâneo de visibilidade global. Fato que reforça a ideia já descrita anteriormente, de que o mundo contemporâneo é ainda um mundo pop.
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o “boom” dos espaços destinados à arte
Conforme analisa Foster, após a série de transformações no campo das artes de meados da década de 60 a 80, o cenário crítico e artístico que articula tradição e inovação se modifica completa e amplamente. Uma nova ordem simbólica era assumida e transformava as noções de representação em, diversos sentidos. Na arte, primeiramente, as inovações provenientes da produção industrial e da cultura de massa foram fonte de inspiração para um novo raciocínio da produção artística, na qual a Pop Art foi palco principal de experimentações formais e novas construções de argumento crítico ao que se desenvolvia no momento. A linguagem tecnológica era explorada em todas as suas condições: como tecnologias produtivas, construtivas e também como elemento essencial lúdico, indispensável para o tão procurado e recorrido efeito de fantasia e experiência. Junto a este novo cenário, a relação público e obra transformou-se de tal maneira a colocar a arte em um novo patamar, agora como objeto de interesse e de acesso comparativamente mais facilitado que em relação a momentos anteriores, quando era área de interesse de uma parcela da população muito pequena, correspondente à elite. Assim, então, Foster observa que o efeito de massificação não diz respeito somente à natureza desta relação entre arte e público, mas a própria relação com a cultura. Se por muito tempo cultura foi uma noção um tanto seleta, a partir desse contexto passa a ser um termo que deixa muito pouco de fora. Ao
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mesmo tempo em que parcela da arte contemporânea se especializa ao extremo, outra parte busca uma amplitude e ainda uma relação mais direta com a cultura em geral e as diferentes instancias das esferas de poder. Fato esse que foi determinante para o aumento exponencial dos investimentos na proliferação de espaços destinados à cultura. “A produção cultural passou a fazer parte da produção de bens em geral: a pós-modernidade transformou o lugar da cultura, atribuindo-lhe uma importância e centralidade na vida econômica inéditas, contribuindo também para a sua crescente politização. “ (LIPOVETSKY; SERROY, 2010 apud MARQUES, 2013). Da mesma maneira que a arte não escapara do contexto da cultura de massas, da industrialização e do próprio ‘sucesso’ do capitalismo, a cultura tampouco conseguira seguir ao lado oposto de tal percurso que se traçava, quase, naturalmente. [...] creio que se deva partir de uma constatação, nada óbvia, de que vivemos hoje uma nova convergência, a saber, no atual estágio do capitalismo de imagem, a cultura – antes esfera autônoma e separada – tornou-se co-extensiva à sociedade; por seu lado, nesta mesma sociedade em que tudo é cultural, a economia irrompe não só como instancia determinante, mas como princípio de dissolução de todas as relações humanas no estritamente econômico. Em suma, a realidade, que é uma só, ora é vista como inteiramente cultural, ora como puramente econômica. [...] O triunfo da economia de mercado redundando numa brutal concentração e financeirização da riqueza, a ‘cultura’ tornou-se um grande negócio – da indústria cultural de massa (clássica) ao passo mais recente de intermediação cultural e correspondente consumo gentrificado (quando as próprias administrações das cidades lançam mão da cultura como pólo
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de sinalização para as elites de que se trata de um lugar seguro para morar e fazer negócios). (ARANTES, O., 2005, p.64) Arantes, como demonstra a citação anterior, segue uma linha de raciocínio na qual argumenta-se sobre a total transformação da produção artística como consequência das transformações culturais provenientes do estágio de capitalismo avançado que vivemos hoje. O que antes era considerado o espaço principal de liberdade expressiva, de questionamentos múltiplos e de registros individuais ou coletivo de uma determinada cultura – a produção artística em sua pura essência - tornara-se então um bem de consumo, atendendo a demandas específicas e enfraquecendo progressivamente esse seu caráter de lugar de manifestação livre. Logicamente tal liberdade não foi nunca abandonada, existindo sempre produções particulares de artistas que se comprometem a questionar criticamente tais tipos de produção, mas consideramos aqui um contexto geral do que ocorria internamente ao museu. A arte, e assim a cultura em geral, assumiam o novo posto de grande negócio, onde a autonomia artística se transformou em artigo de comércio. Trata-se de uma nova relação entre cultura e economia, como defende também a taiwanesa Chin-Tao Wu9, em que “o patrocínio empresarial e o envolvimento de grupos econômicos” acabam por definir até mesmo “o que é considerado artístico” (WU, 2006, p. 39). Wu, em “A privatização da Cultura: A intervenção corporativa nas artes desde os anos 80 “, desenvolve um estudo afim de revelar as estratégias e o modo como as grandes corporações fazem, a partir dos anos 1980, com que a arte se torne negócio. Aproximar logo e pintura, slogan e literatura, jingle e música clássica garante status às empresas, que assumem autoridade, e reforçam
“Dirty White Trash (with gulls)” Tim Noblel e Sue Webster, 1998
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a hegemonia cultural. Concentram poder em uma economia que parecia acima dos ditames financeiros [...]. Injetados por agências públicas de arte, os valores empresariais e o etos do mercado definem o que é artisticamente bom e o que é deplorável. (WU, 2006, p.10) Dessa forma, a cultura assume um papel inédito de centralidade na reprodução do mundo capitalista, um papel decisivo em políticas de arrecadação e movimentação constante de verba. “[...]ou seja, no triunfo da economia da riqueza, a cultura tornou-se um grande negócio – da indústria cultural de massa ao passo mais recente da intermediação cultural e correspondente ao consumo gentrificado (quando as próprias administrações das cidades lançam mão da cultura como pólo de sinalização para as elites de que se trata de um lugar seguro para morar e fazer negócios. ” (ARANTES, O., 2005, p. 3). É assim então que opera a chamada industrial cultural, resultante de todo esse processo de mutação do sistema de políticas públicas em paralelo com as mudanças no campo das artes. Essa, produtora de um novo raciocínio de cultura voltada para as massas, estabeleceu uma espécie de círculo vicioso, no qual a estratégia principal é definir qual tipo de arte será o consumido por esse enorme contingente de novos apreciadores. Em uma linha de raciocínio também seguida por Arantes e Wu, a base principal desse termo era acusar a mimetização da cultura em relação às políticas econômicas, em que tudo era fruto e/ou alvo de especulação, lucro, e assim objeto de múltiplos interesses de esferas de poder que antes não faziam parte do ambiente cultural e artístico. Para o crítico norte-americano Frederic Jameson10, a total inserção do capitalismo no processo produtivo artístico implica um novo estado de coisas “em livre flutuação” (1934), na qual a forma substitui o conteúdo e as características individuais dos ob-
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jetos são meras construções de marketing. É a denúncia da situação em que a cultura e a arte se colocam no contexto pós-industrial, transformando-se em ferramenta econômica, produzida para ser consumida, para vir a ser mercadoria e geração de lucro, não mais como manifestação de valores, questionamentos ou mesmo potencialidades ainda não exploradas poeticamente. A noção de cultura como instância libertária de expressão e registro de manifestações específicas sem atender à modelos pré-estabelecidos, torna-se cada vez mais algo questionável em tal produção, afiliada aos desejos insaciáveis de consumo da sociedade contemporânea. Logicamente, as posições são diversas, mas o fato é: tais alterações têm implicado também uma nova relação com o circuito cultural que, além de econômicas, por sua vez, estabelecem novas relações sociais.
a centralidade da cultura e da arte na economia contemporânea Colocada como nova centralidade, a produção cultural assume um novo valor nas sociedades contemporâneas. O museu, como parte integrante e de destaque neste circuito, tem passado por algumas sequências de alterações face a outros equipamentos culturais pertencentes às indústrias de, principalmente, entretenimento, turismo e, logicamente, cultura. A existência de um patrimônio a ser protegido, conservado e, portanto, divulgado foram as premissas originárias do museu, quando ele era quase exclusivamente a sua coleção. Seu sentido de espaço restrito de contemplação, ou destinado quase única e exclusivamente a preservar e expor grandes feitos da arte é deslocado, ao passo que o museu passa a ser um lugar de encontro e de troca. O novo caráter de sociabilidade traz consigo
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a responsabilidade de um novo tipo de espaço público, aberto, plural, democrático e multidisciplinar. Desta maneira, assistimos à criação de novos equipamentos e produtos que desafiam os limites até então preestabelecidos e que caminham no sentido de uma realidade cultural cada vez mais heterogênea. Sociedade e cultura, hoje, criaram laços tão estreitos quem os próprios museus têm desempenhado um papel importante na mediação destas relações multi e interdisciplinares. Na verdade, como pontuam autores como Montaner11 e Dominique Poulot12, entre outros, os museus de arte nunca foram neutros e desprovidos de carga política, simbólica e estética. Neles, sempre se veiculou uma ideia de arte, de cultura, de espectador e de relação entre público e privado, arte e comunidade. Diferentemente do que se esperava, os movimentos antimuseu, que marcaram a primeira metade do século XX, acabariam por confirmar que os museus sempre tentaram responder a uma utopia de lugar ideal para a arte e para as rupturas que os artistas queriam provocar. Como se, então, em um certo sentido, o museu fosse o palco da materialização criativa da imaginação, comunicada e partilhada. Esta tensão crítica contribuiu para a formulação, nos anos 60 e 70, de vias alternativas para a conceituação dos museus de arte contemporânea em que surgiram novos paradigmas para as grandes instituições públicas, baseadas na ideia de museu como fórum cultural, democrático e aberto à cidade, como coloca Dominique Poulot: Um “desejo de museu” multiforme parece animar as sociedades contemporâneas, nas quais cada fenômeno social parece suscetível de colecionismo. A ênfase atribuída a irredutível especificidade do “local” contribui, em particular, para multiplicar os museus que, supostamente, levam a ver o passado, tal como ele ocorreu, precisamente nesse espaço. Semelhantes abordagens das particulari-
Fila para ingressar no Museu do Louvre, Paris, sem data especĂfica
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dades das sociedades e culturas transformam o sentido museal: a superexposição comunicacional, apoiada nas novas tecnologias, é acompanhada, se necessário, por uma banalização dos desafios e do interesse do projeto. (POULOT, 2013, p.103) Hoje o, assim entendido, museu de arte é composto por fatores que vão muito além de sua coleção, cumprindo principalmente uma função aglutinadora de todas as atividades ali desenvolvidas e de naturezas bastante distintas entre si. Decisivos para essa grande proliferação de ambientes destinados à cultura, o desejo por parte das mais diversas instituições, sejam elas públicas ou privadas, são também um dos motivos pelo qual se entende que o fim do século XX e o início do XXI são um período marcado por uma total transformação da arte e de suas relações com a sociedade, a economia, a política e, também, logicamente, o urbanismo. Essa sequência de transformações foi o alicerce principal para um novo tipo de enfrentamento sobre de que maneira a arquitetura dos novos espaços culturais se colocou como ferramenta multidisciplinar estratégica na sociedade contemporânea. O público, então, passa a ser o elemento central no museu, em torno do qual se produz todo o discurso, fazendo do museu um dos principais locais de sociabilidade e convivência urbana, de encontro e troca, o que os fizeram, consequentemente, serem fortes alvos de alta especulação dos negócios e também de políticas públicas. O público é deslocado então de simples e unicamente visitantes contempladores ao verdadeiro termômetro dos museus, que além de indicativo do sucesso das estratégias ali adotadas torna-se também um objeto de estudo, que baliza as novas intervenções e renovações a serem feitas. Além de fato de sua total relevância para a manutenção de uma dinâmica das exposições e a própria rentabilidade das
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mesmas, o público é exponencialmente multiplicado a medida que outros programas ali surgem: restaurante, cafeteria, espaços de eventos e palestras, sala de espetáculo e, finalmente, a loja do museu. Nessa convergência entre lazer, cultura e educação, portanto, os museus são hoje ambientes que viabilizam manifestações e o fortalecimento de identidades; a percepção crítica e reflexiva da realidade - da produção contemporânea em diferentes campos do conhecimento -; e também potentes e importantes lugares de lazer e entretenimento nas cidades. Ainda que operando internamente no sistema do capitalismo de massas, o serviço mais importante dos museus é o serviço educativo. A educação não formal tem ganhado muita importância no panorama cultural e social. Além de fomentar o conhecimento, o respeito à livre expressão e manifestação, e a valorização da diversidade cultural, a educação potencializa o contato entre o público e os conteúdos culturais, “[...] privilegiando o desenvolvimento de experiências essenciais à aprendizagem, uma vez que conjugam os contextos: pessoal, social e físico, a trilogia que nos permite aprender e guardar memórias” (POULOT, 2013, p.64). Porém, sobretudo a “lojinha” veio com o objetivo - de muito sucesso, por assim dizer - de aumentar as potencialidades comerciais desse equipamento, causando um impacto muito especial na dinâmica do museu. Diferentemente dos outros novos programas, é na loja que aquilo que não está disponível para venda, a coleção, é transformado em pequenos souvenirs, satisfazendo o impulso comercial do público e a ilusão de “levar o museu para casa”. Mais uma vez a indústria cultural operando em diferentes esferas: naquela própria da instituição, que habilmente multiplica sua bilheteria a partir da aglomeração de outros programas culturais operantes no sistema do consumo e entretenimento; e também quanto a do “cliente”, que visa sempre sua autoafirmação a partir dos bens culturais
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que ali são por ele experienciados e adquiridos. Trata-se de um fenômeno, muito discutido pelo crítico e arquiteto holandês Rem Koolhaas13 (em 2002, no “The Harvard Design School Guide to Shopping), altamente popular e rentável que vem se desenvolvendo na contemporaneidade: o fenômeno shopping. No coração dos negócios, os museus se tornaram ferramenta essencial em novas gestões urbanas, sejam elas de fato políticas culturais, econômicas, sociais, ou mesmo verdadeiras estratégias políticas, de forma a ampliar cada vez mais seu campo de influência e visibilidade na sociedade contemporânea. Isso significa que, hoje, embora comprometidos com a preservação de bens culturais, são espaços de relação dos indivíduos e das comunidades com seu patrimônio, e circuitos de integração social. Desta forma, compreende-se que a multiplicação desses espaços na cidade não é somente uma indagação crítica ou mesmo projeto de proposta de conservação e exposição de bens culturais da sociedade, mas também estratégias complexas que interferem em diferentes esferas e interessas do poder público e privado. Ao mesmo tempo que esse investimento em ampliações de instituições de referência cresceu substancialmente, a multiplicação dos espaços museológicos é o sintoma mais forte da transformação política desses ambientes, que -de então instituições exclusivamente voltadas à arte e à cultura e passaram, sobretudo, a ser poderosos instrumentos de renovação simbólica e funcional das cidades. De acordo com o ICOM14 (International Council of Museums – Conselho Nacional de Museus): O museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu desenvolvimento, aberto ao público, visando também a pesquisa da produção material e imaterial do homem e de seu entorno, de modo a preservar, comunicar, expor e, assim,
Hall
Center
do
Centro
Georges
Pompidou, Paris, sem data especĂfica
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atingir também as instâncias de lazer e educação. (ICOM, 1974) Os museus estão no centro da economia dos serviços culturais, em uma clara posição de destaque, no qual representam atualmente – segundo dados do IBRAM15 em 2011 - 50 a 70% do PIB dos países mais desenvolvidos e um lugar crescente na maioria dos outros países. James Cuno16 (2011) - curador do Art Institute of Chicago e também historiador da arte – descreve alguns pontos centrais sobre como operam os museus dentro do sistema cultural atual, e que também não se ausenta na participação colaborativa do próprio sistema de políticas econômicas. A seguir da pergunta sugerida na citação a seguir, Cuno diz que cada instituição sabe exatamente qual é seu público, o perfil e os interesses, por mais diversos que esses sejam, traçar uma estratégia de atração de público se torna cada vez mais instigante e decisiva. No ano vindouro, aproximadamente duas milhões de pessoas virão ao Art Institute of Chicago. Acho isso surpreendente. A vida é dura e é provável que tenham trabalhado o dia todo, alimentado suas famílias e viajado ao centro da cidade de trem, ônibus ou carro. Provavelmente estão cansados, e ainda assim vieram ao museu. [...] O que os faz vir agora? Ou no fim de semana, quando cobramos a entrada, mas opções concorrentes permanecem gratuitas? Essa e todas as demais semanas, quase quarenta mil pessoas irão preterir outras oportunidades e responsabilidades para frequentar o museu. Por quê? (CUNO, 2011, pp.1-2) De acordo com o levantamento feito em abril de 2014 pelo The Art Newspaper17, o museu de arte mais visitado do mundo hoje, o Museu do Louvre em Paris, recebe em média 9 milhões de visitantes ao ano, seguido
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pelo British Museum em Londres, que recebe em média quase 7 milhões (The Art Newspaper, 2014). Segundo dados do ICOM, em 2014, o país com maior número total de visitantes é o Reino Unido; o com o maior número diferente de museus na lista são os Estados Unidos. Vários outros importantes museus no mundo, tais como o Museu do Palácio, em Pequim, que anualmente atrai 12 milhões de visitantes, não foram incluídos na lista divulgada pela revista, isso porque a lista registra apenas museus com alguma forma ou expressão de arte em exibição ao público, o que acaba por ignorar museus de História Natural ou de História Nacional, por exemplo. Ainda assim, tais números ilustram muito bem o cenário atual: o poder de movimentação de pessoas, e assim, de grandes investimentos, tanto públicos quanto privados, com sucesso garantido. É esta rede de atividades e de serviços que legitima hoje a existência dos museus. “O museu entra numa lógica de prestação de serviços que permite além de legitimar-se, tornar-se mais atrativo, fidelizar públicos e aumentar os valores de bilheteira“ (SCHUBERT, 2009 apud MARQUES, 2013).
uma nova conceituação para o museu A mudança de paradigma no conceito de museu - de arte -, na qual a museologia se coloca totalmente ligada à sociologia e política, ocorreu em simultaneidade com a globalização da cultura, de forma que teve múltiplas implicações em vários setores, desde a cultura à educação, passando pelo lazer, pela ocupação dos tempos livres e pela dinamização socioeconômica. A profunda renovação do mundo dos museus, muitos dos quais, na atualidade, são condicionados pela equação marketing-shopping-turismo e estatísticas, faz com que estes venham sendo obrigados à readequação dos
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seus espaços em função da indústria do entretenimento. Muito característico da argumentação de Otília Arantes, como visto anteriormente, os espaços de arte se colocam como uma ferramenta multidisciplinar de interesses, sejam esses de fato culturais, ou econômicos, políticos e também urbanísticos. Mas o fato de suma importância para entender essa ascensão do museu ao estágio de um dos principais polos de atração da sociedade, é a forma como ele opera em diferentes setores e causa impactos enormes nas cidades, sendo mais uma vez um dos principais objetos de movimentação e agitação do turismo cultural. Na cruzada para atrair o turista, os museus mais importantes contam com exposições temporárias, constantemente renováveis; pessoal treinado para atender diferentes segmentos de público (crianças, idosos, grupos, deficientes, etc.); ingressos promocionais; publicações impressas em vários idiomas; e divulgação das atividades por meio de campanhas publicitárias. Nesse contexto, os museus, além de espaço de exposição, curadoria, pesquisa e ação educativa, transformaram-se, eminentemente, numa atividade rentável, geradora de recursos, aplicados na sua própria manutenção. Mas muito mais, os museus passam a constituir, por si só, um pólo de atração, cujos dividendos são repartidos com diversos setores da indústria turística. (EIDELMAN; ROUSTAN; GOLDSTEIN, 2014, p.27) Londres, Paris e Nova York recebem grande número de turistas, nacionais e estrangeiros, em todas as épocas do ano. Ao mesmo tempo que possuem diversos ícones e obras arquitetônicas conhecidas mundialmente, parques, monumentos históricos, gastronomia e possibilidades de consu-
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mo diferenciado, uma visita a Londres está, quase sempre, associada ao British Museum; ao Museu do Louvre, no caso de Paris, e ao Metropolitan Museum, em Nova York. A organização institucional da cultura e do patrimônio difere de país para país e tende a refletir as diferenças administrativas, assim como as realidades sociais e políticas de cada um. A cultura tem ganho uma dimensão estratégica e os museus, não raramente promovem atividades turísticas que estão na base de economias locais e regionais. […] tem[-se] assistido bilhões investidos para transformar estes locais culturais em supermercados do objeto patrimonial. Certamente que os nossos museus precisavam de rejuvenescimento; mas permitiu-se que os mercadores entrassem no templo. Conservaram o seu público fiel de intelectuais, de quadros e de classe média que visitam pelo menos uma exposição por ano (…) e a frequência familiar aumentou ligeiramente passando de 19% a 25% no decorrer dos últimos dez anos; no entanto, globalmente, em lugar de passar de um não público a um público de proximidade, passou-se a um público de superfície, ou seja o dos turistas, os quais segundo o programa dos operadores “fazem o Louvre numa hora” visitando sobretudo a Samotrácia e a “Monalisa” e constituem 25% dos visitantes deste museu e mais de metade nos museus parisienses. (DESVALLÉES, 2003 apud POULOT, 2013, pp. 54-55) Hoje, os museus vêm traçando uma estratégia de combinação múltipla de interesses: seu objetivo social – de instituições que promovem preservação de patrimônio, investigação e educação– em conjunto com outro tipo de atividade de promoção, incentivo e investimento econômico para os próprios museus, mas também para a comunidade na qual se
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localizam. No entanto, não só ao turismo deve ser apontado o perigo de comercialização, mas também ao próprio mercado das artes, ao sistema de produção de bens de consumo no qual os museus estão totalmente inseridos, operando conjuntamente ao capitalismo e à cultura de consumo. Estes são argumentos otimistas do reflexo do turismo cultural sobre a cultura de uma região ou uma população específica que tem sua dinâmica alterada pelo turismo cultural. Porém tal processo é também gerador de diversas alterações não somente positivas. As comunidades desejam desenvolver o turismo, mas também proteger a sua privacidade, e preocupam-se com os efeitos que o turismo pode trazer. Para a implantação de tal dinâmica de maneira menos invasiva, as comunidades demandam que se estabeleçam as necessidades, os interesses e aspirações da comunidade local na fase de planejamento do projeto; também, que seja levado em consideração as sensibilidades culturais ou religiosas associadas ao uso e apresentação do local patrimonial; que identifiquem e consultem os líderes da comunidade local; apresente a perspectiva da comunidade local; analisem formas da população local ter um papel ativo na gestão e operação da atração turística; que procurem maximizar os benefícios para a comunidade local e reduzir (ou evitar) os impactos negativos na dinâmica urbana e social de tal região. Porém, sabe-se que nem tudo se cabe a um bom planejamento. As cidades têm uma dinâmica própria, e que as cidades contemporâneas são extremamente marcadas por limites geográficos quase que imaginários, mas que determinam uma grande segregação e disparidade entre localidades. Projetos com tamanho fluxo de pessoas exercem uma influência nada discreta em toda uma região, por vezes trazendo de fato sua renovação urbana, mas também podendo ser os grandes causadores de efeitos de gentrificação e discriminação de espaços que teoricamente são pertencen-
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tes à cidade, espaços verdadeiramente públicos que se tornam gradativamente lugares de ostentação de classes dominantes. Um exemplo famoso de tal fenômeno é o Centre Georges Pompidou (frequentemente chamado de Beaubourg), em Paris. A implantação do centro cultural modificou tão profundamente a natureza do bairro, que hoje, cerca de 40 anos depois, o quartier do Marais18 é conhecido mundialmente por seu caráter elitista, repleto de lojas caras e ateliers de arte que fazem da região também um dos lugares de maior especulação imobiliária da cidade. Os exemplos de museus que causaram esse mesmo efeito são diversos, e serão melhores desenvolvidos no capítulo a seguir, mas o fato importante é: o museu de arte hoje é, simultaneamente, uma tradição, um espetáculo, um lugar político e uma promoção social, arena para processos de ação sociocultural, especulação - financeira e simbólica -, experiências, e também alegoria ou metáfora para a explanação - criação e manutenção de outras dimensões de conhecimento. Ele se configura assim como complexidade, grandeza modelada por múltiplas dimensões. O museu se apresenta como um lugar de convivência que abre suas portas para que toda e qualquer categoria de público possa usufruir de um espaço não só de lazer, mas fundamentalmente de reflexão a respeito da memória histórica e de um simbolismo transcendente. (POULOT, 2013, p.37) O caráter de democratização proposto pelo museu, levando em consideração tanto seu conteúdo (parte expositiva e também a adição de outros programas que dê conta da complexidade do público) quanto pela não discriminação de seus visitantes, vão em oposição ao efeito que normalmente causam nas comunidades. Mas importante de ressalvar tam-
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bém, é o fato dos museus poderem vir a se tornar um atrativo de grande potencial, caso bem planejados. Acredita-se que a atividade turística desenvolvida de forma integrada com patrimônios material e imaterial pode, inclusive, servir de agente propagador e quem dinamiza culturas. Devem eles promover meios para salvaguardar e garantir a conservação, realce e apreciação dos monumentos e sítios que constituem uma parte privilegiada do patrimônio da humanidade. São instituições que deixaram de ser apenas depósitos de coisas antigas, mas que intentam fazer chegar sua mensagem ao público de uma forma dinâmica, assim como com o auxílio de recursos tecnológicos e de multimídia. Através deste processo de inovação o museu passou a ser complemento complexo e necessário do turismo, superando preconceitos de ambas as partes, mas se reafirmando constantemente como ferramenta poderosa de movimentação de verba e de investimentos público e privados. Dessa maneira, compreende-se a complexidade e multidisciplinaridade envolvida no processo de aumento exponencial de ambientes destinados à arte (sejam eles considerados museus, de fato, ou não). Explico. A quantificação exata dos museus espalhados pelo mundo é praticamente impossível de determinar, mesmo considerando diferentes instituições e metodologias que o proponham fazer. O ICOM (2005) estima, em escala mundial, que no ano de 2005, existiam entre 25 e 35 mil museus no mundo, quando tal indeterminação, já há dez anos atrás, apontava para um novo questionamento. A dificuldade sobre a quantificação precisa dos museus ao redor do mundo é muito atrelada, também, à grande diversificação dos tipos de instituições que se autodenominam museus, mas que a depender das considerações específicas de catalogação de cada tipo de organismo, essa denominação pode ser muito diversa entre instituições que fazem esse trabalho de catalogação.
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Ainda assim, o ponto principal de discussão aqui é para além da dificuldade de um padrão de catalogação, mas sim da própria diversidade de instituições que foram surgindo ao longo desse processo de valorização múltipla desses tais centros culturais, que ora se autodenominam museus ora não. Em complementação, após esse breve panorama do contexto histórico das modificações culturais que subsidiaram o novo cenário artístico ao qual estamos aqui analisando, o trabalho seguirá olhando para o processo de modificação interna dos museus. Quais foram os deslocamentos ocorridos internamente às instituições e como funcionam e se organizam os novos, e complexos, formatos de museus que acompanhamos hoje sendo objeto de muito sucesso e de muita crítica no campo das artes, arquitetura e diversas outras disciplinas que tangenciam a discussão.
os museus contempor창neos
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Como definido no documento oficial do ICOM - “Conceitos Chave de Museologia”, a arquitetura dos museus é definida como a arte de conceber e projetar o espaço cujo objetivo é abrigar as funções específicas de “exposição, de conservação preventiva e ativa, do estudo, da gestão e do acolhimento dos visitantes ” (DEVALLÉES; MEIRESSE, 2013, p.30). Esta pode ser colocada como uma definição tradicional, em acordo com os tipos de museus mais clássicos, que seguem ainda uma estrutura tradicional de museu. Porém é no contexto das modificações iniciadas no século XX, como discutidas anteriormente, e muito acentuadas a partir dos anos oitenta, que se insere a crítica mais recorrente acerca dos novos museus. Os museus têm suscitado debates em campos diversos, nem sempre mutuamente influenciáveis, mas com preocupações bastante semelhantes, como visto em capítulo anterior. Se a crítica do século XX foi dura nos questionamentos da museificação/mumificação do conhecimento, “a arquitetura navegou em outros mares, igualmente agitados” (ZEIN, 1991, p.74). Segundo o professor e crítico espanhol Josep Maria Montaner, o processo e as sequências de transformações culturais ocorridas na segunda metade do século XX foram essenciais para a ampliação do conceito de cultura à uma ordem material e simbólica. O museu, como o equipamento cultural que mais se insere nesse novo sistema da indústria cultural, passou por alterações múltiplas, ora de natureza programática, estratégica, ora de funcionamento e influência. O espaço museal, os serviços oferecidos e o próprio acervo foram ampliados, como consequência da nova e crescente demanda de um público cada vez mais numeroso e heterogêneo. O museu recebera a função de integrar os novos aspectos sociais, científicos e téc-
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nicos, objetivando converte-los em verdadeiros focos de transformação e influência social. Nesse novo contexto, transforma-se também o papel do arquiteto e o modo de projetar: A ideia de que antes uma profissão impunha, ou pelo menos julgava prever, o movimento das pessoas agora parece risível; ou pior: impensável. Em vez de desenho há cálculos: quanto mais errático for o caminho, quanto mais excêntricos forem os circuitos, quanto mais oculto estiver o projeto, e quanto mais eficaz for a exposição, mais inevitável é a transação. [...]O pós-modernismo acrescenta uma zona enrugada de ‘poché’ viral que fraciona e multiplica a interminável frente de exibição: um invólucro peristáltico, crucial para qualquer intercâmbio comercial. Os percursos lançam-se por rampas, tornam-se horizontais sem aviso prévio, intersectam-se, dobram-se para baixo e emergem de repente numa varanda vertiginosa sobre um grande vazio. (KOOLHAAS, 2010, pg.87-88) O museu e o seu projeto transformam-se numa grande máquina que funciona para atrair e manter pessoas no seu interior. Novamente, a construção e reafirmação do museu como negócio. É desta maneira que, no início dos anos dois mil, muitos são os museus em construção ou em inauguração no mundo todo. “Franquias de museus transnacionais são disputadas por cidades em diversos países, museus de âmbito internacional ampliam ou apresentam novas sedes, museus nacionais ou locais finalmente concretizam em arquitetura sua existência ” (SPERLING, 2012). Se inicia uma temporada de inaugurações infinitas de museus de todos os tipos. Ampliações, restauros, reformas, novas construções. Consequência natural foi a atualização da arquitetura do museu, de forma que ela pudesse
acompanhar o contexto contemporâneo heterogêneo, o movimento dinâmico constante da instituição como peça central do sistema da cultura de massa. Mas afinal, o que é um museu de arte hoje, como ele se conforma? Como se desenvolveu a nova arquitetura de museus e de que maneira ela se organiza? O museu, parte integrante desse circuito, tem passado por transformações diversas se colocando como o equipamento que convive com uma realidade cultural cada vez mais híbrida, na qual a arquitetura constitui a primeira peça, e essencial, da concepção de uma produção de estilos e intenções muito distintas. Problematizando e retomando brevemente as alterações museológicas podemos evidenciar os quatro discursos centrais com os quais a arquitetura dialoga e se insere como ferramenta de construção de um discurso: o programa, a escala, o público e obviamente a arquitetura. As maneiras de ‘fazer museus’ são extremamente diferenciadas em suas práticas, narrativas e maneiras de se definir e se mostrar. As diretrizes podem ser diversas, demonstrando diferentes preocupações e tipos de concepção. Diversidade dos programas internos ao museu; a escala - dos espaços internos, das hierarquias, e do próprio espaço do museu -; o público e os novos fluxos astronômicos; e, finalmente, a arquitetura - interna e externa - e a implantação urbana colocadas de maneiras muito singulares e marcantes. Estes são os temas a serem abordados mais profundamente nos subcapítulos a seguir. Sem pretender uma exaustiva classificação, sujeita a subjetividades infinitas e a possível não conclusão sobre o que é de fato a produção contemporânea dos museus, esta segunda parte - e final - do trabalho pretende organizar e demonstrar diferentes tipos de enfrentamento das tais problemáticas de maneiras diferentes, se ocupando de novos questionamentos e posicionamentos que fogem a algum certo tipo de catalogação.
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o público e o programa
Que a visita seja excepcional ou banal; que seja resultado de uma opção entre diferentes destinos de saída cultural; que adote a forma de uma leitura de estudos, de uma curiosidade pelo passeio, de uma aventura exótica; que seja respeitosa, crítica ou divertida; que se realize com amigos na hora do almoço, por ocasião de alguma atividade com o comitê da empresa, ou enquanto pais que acompanham um grupo de alunos da escola; que aconteça na própria região, durante uma viagem de negócios, ou nas férias no estrangeiro; que dure vinte minutos, duas horas ou o dia todo; em salas vazias ou no meio da multidão: o contínuo circunstâncias-desenvolvimento-efeitos da visita constitui um desafio para a construção de modelos. A visita ao museu é uma experiência total que se inscreve em um tempo social e em um espaço social particulares, mas variáveis. (EIDELMAN; ROUSTAN; GOLDSTEIN, 2014, p.37) Para a reflexão museológica atual, o conhecimento da população e do público frequentador é de extrema relevância para os diversos objetivos da instituição e também para uma reflexão sobre as variadas atividades exercidas no museu de arte, como instituição plural. Segundo Sylvie Octobre (2002 apud EIDELMAN; ROUSTAN; GOLDSTEIN, 2014,
Entrada MoMA, Nova Iorque, sem data especĂfica
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p.97), esse conhecimento serve ao museu de diversas maneiras: quer seja para justificar; quer seja para avaliar uma ação cultural (modificação da tarifa, horário, organização de uma exposição); de melhorar a gestão do fluxo de visitantes; de conhecer a estrutura do público para ajustar uma política cultural (por exemplo, de fidelização); de procurar entender o que freia a visita e as razões que baseiam a resistência cultural do não-público; de calibrar as operações para o público-alvo; de apreender o público potencial; ou prever a evolução da visitação. O novo contingente de visitantes dos museus de arte e o surgimento de públicos cada vez mais diversos são, ao mesmo tempo, o resultado e o objetivo dessas instituições hoje. Explico. A noção de uma diversidade de tipos de museus de arte não é estranho a ninguém. É difícil que algum indivíduo que tenha nascido nas últimas décadas nunca tenha visitado um museu na vida, fato esse que retoma às diversas defesas levantadas anteriormente por Otília Arantes e o papel que a cultura assumira desde a modernidade. Ainda assim, a discussão se vale aqui a entender mais profundamente os motivos principais - e internos a essas instituições - que fomentaram esse aumento absurdo do público frequentador dos museus de arte. Pesquisas estatísticas, barômetro19 da fama, pesquisas de público potencial, pesquisas sobre as representações mentais e as expectativas do público nas exposições, etc. fazem parte das ferramentas acionadas pelo museu para a compreensão do sucesso e do fracasso das atividades do museu. Tudo afim de compreender e articular o fenômeno a favor dos mesmos. Quais os motivos pelos quais algumas exposições atraem mais visitantes que outras? O que procuram os visitantes além das exposições? Quais os tipos de públicos que frequentam cada instituição? Em quais partes do museu o público gasta mais tempo? Quais gastam menos? E etc. O que e
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porquê? Inúmeros tipos de pesquisas são promovidos cada vez mais frequentemente, mas o que todas elas têm como denominador comum é o estudo do público. Os investimentos em discussões sobre quem são os frequentadores e sobre de quais maneiras podem as instituições se utilizar dos resultados das pesquisas para conciliar objetivos institucionais, econômicos, sociais e culturais, vêm sendo cada vez mais decisivo para a dinâmica dos museus. É essa articulação que dita se o museu deve reestruturar algo ou quais estratégias vêm dando certo - entendendo o “certo” como aquilo que movimenta um maior contingente de visitantes. Esta semana, e toda semana, cerca de quarenta mil pessoas vão abrir mão de outras oportunidades e responsabilidades para vir ao museu. Por quê?Nós dizemos que sabemos: por curiosidade; por educação, inspiração, entretenimento, distração, conforto, segurança, senso de comunidade; para ver coisas bonitas, coisas novas e diferentes; ter a sua visão do mundo ampliada, se sentir parte de algo importante - a história longa e rica da existência humana.20 (CUNO, 2011, p.2) Esse contingente enorme de pessoas vem convergindo fisicamente no espaço do museu por muitos e diferentes motivos, sejam eles realmente culturais, sociais, ou mesmo por motivos subjetivos, como descreve o autor do trecho acima. Cuno é curador do Art Institute of Chicago, e em tal posição é uma das figuras que compreende a importância sobre conhecer seu público. Os desejos e os porquês o enorme contingente de pessoas passam diariamente pelos museus de arte são extremamente variados, e é exatamente nesse ponto que se finda a responsabilidade maior da ins-
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tituição: atender às expectativas, sejam elas quais forem, dos diferentes públicos; compreender quais são as estratégias que atraem mais pessoas e quais programas e exposições fazem a dinâmica interna do museu ser muito alterada, tanto para uma maior circulação e atração e de pessoas, quanto repulsão. Enfim, Cuno afirma que em troca da fidelidade do público, a instituição tem seus fatores fixos de ‘retribuição’ – vejamos bem que na verdade não é uma simples troca de favores, mas sim uma estratégia de manutenção do público e assim da bilheteria -, sendo eles o oferecimento das coleções e exposições - muitas vezes exibidos com pequenos memoriais úteis e informativos -, acompanhados de áudio-guias e ou docentes/ educadores da própria instituição que vão explicar algo sobre os artistas produtores das obras em exposição; sobre a época em que foram feitas, seus temas, a sua importância na história da arte, e a sua autenticidade. Pode-se assim dizer que, esses ‘fatores fixo de retribuição’ - assim chamados anteriormente - são as coleções, as exposições, a reserva técnica e o núcleo educativo do museu. São o coração da instituição, uma constante desde o modelo tradicionalista de museus de arte ao mais inovador da contemporaneidade; é o invariável da instituição. Enquanto o púbico é o fator variável; que foge do controle da instituição e será sempre uma incógnita. Esta noção, do público como, acima de tudo, o alvo incontrolável e, praticamente, desconhecido se reflete muito nos desafios dos museus contemporâneos em diferentes tipos de questões e aspectos. Logicamente, junto à forte diversificação dos frequentadores dos espaços culturais e, principalmente, dos museus de arte, os desdobramentos de tal aumento de fluxo gerou novas temáticas a serem levantadas pelo museu: o comportamento e as expectativas do público se transformaram (e continuam constantemente), fazendo com que as instituições culturais hoje precisem conciliar os objetivos econômicos, sociais e culturais. É por
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isso que muitos estabelecimentos culturais vêm realizando cada vez mais estudos de público, procurando alguma ferramenta que auxilie a melhor compreensão das ansiedades das visitações contemporâneas. Como desenvolvimento dessa maior abertura e amplitude dos públicos do museu, alguns autores argumentam sobre um processo de democratização do espaço do museu, que acarretou transformações não somente internas ao museu, mas também quanto às ideologias de cada instituição. Em O lugar do público: Sobre o uso de estudos e pesquisas pelos museus, os autores desenvolvem uma leitura crítica sobre de que maneira as pesquisas de público: [...] se transformaram em uma filosofia de ação (“diversificar os públicos”, “colocar a cultura ao alcance de todos”, “expor a diversidade”...), bem como em uma estratégia de gestão. Isso pode ser constatado claramente quando se atenta para a opção por um tipo de mediação assumida e pelos funcionais de um programa (tarifas, horários, modos de acolhida, conforto e manutenção). Os estudos de público parecem orientar, alimentar e avaliar os contratos de objetivos, os programas e as operações... [...]esse sistema é obviamente um mercado - o mercado da demanda pública, especialmente. (EIDELMAN; ROUSTAN; GOLDSTEIN, 2014, pp.13-14) Muitas questões estão envolvidas, mas algo muito marcante é o que defende Pedro Arantes21, articulando que nesse sentido, ao passo que as necessidades e desejos de cada grupo de ‘usuário’ é respeitada pela instituição, o arquiteto, que até então era visto e posicionado quase como uma figura de atuação autônoma, passa a necessitar de informações sobre o público alvo da instituição e passa a atender a demandas antes colocadas
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como secundárias. Para Arantes, a suposta postura do arquiteto “formulador unilateral de soluções, própria ao modernismo” é abandonada ao passo que se torna “um cuidadoso observador das necessidades e desejos de cada grupo de usuários, procurando atendê-los e, ao mesmo tempo, caprichosamente surpreende-los” (ARANTES, P., 2010, p.48). A instituição é quem decide quais serão as conclusões retiradas das pesquisas de público; de que maneiras serão elas articuladas afim de alcançar os objetivos institucionais; como elas servirão de base para a construção de políticas estratégicas para a manutenção ou o melhoramento da dinâmica do museu em relação a seus visitantes. Contudo é o arquiteto a figura que equaciona a difícil operação entre o desejo da instituição; o desejo do público; e o ‘desejo’ do arquiteto. Pensando, portanto, como o público impactou a maneira de pensar o espaço do museu, o projeto de arquitetura se deparou com novas questões essenciais, que fazem parte dos fatores-chave da nova arquitetura contemporânea dos museus de arte. Um deles é, sem sombra de dúvida, o museu se colocando como grande agregador de outros subprogramas culturais, que atendam às mais variadas intenções de um público diverso. Como descreve esse processo, Montaner explica que: “A afluência maciça de visitantes implicou na necessidade de multiplicar os serviços do museu, com exposições temporárias e locais para consumo, e redundou no crescimento das áreas dedicadas à direção, à educação e à conservação. [...] eles realizaram uma completa transformação de sua concepção convencional. (MONTANER, 2003, p.8) Dessa forma percebe-se, portanto, que a incorporação de novos programas não originais à estrutura tradicional do museu de arte é algo inseparável do público e que impulsiona então chamado processo de democratização - também - dos usos do museu, fazendo-o deixar cada vez
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mais distante seu papel de lugar da contemplação, e passando a atender diferentes desejos e públicos variados. Em artigo para o Fórum Permanente22, Durval de Lara Filho23 fala sobre o museu na contemporaneidade e este afastamento do modelo de templo de objetos consagrados: “Se o museu não mais se dirige a especialistas, mas ao grande púbico, surge aí uma espécie de assimetria, pois o livre acesso físico ao museu não garante o acesso pleno às obras, visto como entendimento, compreensão e fruição” (LARA FILHO, 2012). Esse novo papel e posicionamento teve sua primeira grande realização com o Beaubourg, projeto de Renzo Piano e Richard Rogers, inaugurado em 1977 em Paris. O projeto foi escolhido a partir do concurso lançado pelo então presidente da França (1969-74) Georges Pompidou. O impacto sobre a população foi tremendo, tanto pelo desenho e decisões projetuais quanto pelos próprios arquitetos vencedores, ambos quase desconhecidos na época. “Em rigor, o único conteúdo do Beaubourg são as próprias massas, que o edifício trata como um conversor [...]” (BAUDRILLARD, 1991, p.84) A crítica de Baudrillard24 quanto ao início do que chama de “cultura de museus” descreve perfeitamente o processo de transformação do museu partindo e visando o novo fluxo dos museus, e que o projeto de Rogers e Piano deu início no contexto europeu. Ainda que possua espaço expositivo e um acervo permanente de arte, o Beaubourg não leva o status apenas de museu, mas sim de centro cultural, pois integra quatro departamentos: o Museu Nacional de Arte Moderna (MNAM), a Biblioteca Pública de Informação (BPI), o Centro de Criação Industrial (CCI) e o instituto de Pesquisa e Coordenação Acústica/ Musical (IRCAM), incluindo também salas de teatro, de música e cinema. Segundo os próprios arquitetos a ideia era “derrubar as barreiras entre as diversas disciplinas, criando um espaço interdisciplinar,
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aberto para o encontro de distintas esferas artísticas: a música, a literatura e a pintura”, contrariando a tipologia tradicional do museu de arte como máquina ou ferramenta de informação. Ao invés de fornecer um container de arte, nós propomos um edifício destinado à informação, diversão e cultura, uma espécie de rede que servisse de suporte às diversas atividades, uma máquina “para tudo”, que fosse mais que u edifício específico que comportasse uma biblioteca, um museu, etc. Queríamos mais [...] um instrumento audiovisual que uma obra de arquitetura. (PIANO; ROGERS, 1977 apud MEIRA, 2014, p.54) O projeto original, segundo os arquitetos, foi concebido com grande capacidade de adaptação e flexibilidade, o que pode ser expresso na composição de estruturas, que poderiam ser modificadas mediante novas necessidades. Do mesmo modo, paredes e divisórias poderiam ser montadas, de maneira a deslocar escritórios e outros espaços. Além disso, a localização das circulações e serviços na parte externa tornou a superfície dos pisos livre de elementos verticais internos e fixos. O objetivo do Centro Georges Pompidou é um mega-edifício icônico que congregue diferentes programas, inclusive o de espaço público - através do projeto da praça para o plateau Beaubourg - afim de atrair o maior público possível de visitantes e, assim, transcendendo o modelo tradicional de museu, marcando o início dos “novos museus” - que nascem a partir da década de 1980. É a transição entre a tradição e os grandes complexos culturais onde predomina a multifuncionalidade e o caráter icônico da arquitetura. Nesses edifícios, o que chama muita atenção, também, é a incorporação de serviços de consumo, como bares, restaurantes e lojas, tornando necessários amplos espaços ca-
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pazes de permitir a afluência massiva desse contingente infinito de visitantes, além de enfatizar o caráter monumental e cenográfico do prédio, como mais um - e importante - meio de atração do público. Dessa forma, partindo do Beaubourg e trazendo para o contexto geral dos novos museus e da contemporaneidade, observa-se que o museu de artes repensou - e continua repensando - seu papel de lugar de encontro e troca (para além de seu acervo, mas como um espaço de referência nas cidades) e a inclusão de novos programas que atraíssem e atraiam cada vez mais públicos. Mas ainda outras atividades reforçaram a profunda transformação dos museus. A adoção de exposições temporárias, a incorporação de efeitos sensoriais, o atendimento educativo etc. são hoje serviços de extrema importância para as instituições e que também garantem a manutenção desse público intenso e diverso. Estratégias de combinação desses novos programas; a implementação de novas tecnologias; de espaços neutros (que ampliem ainda mais a possibilidade de usos múltiplos); equipamentos e mobiliários urbanos próximos às entradas do museu; e muitos outros, são as maneiras possíveis e impossíveis que os museus utilizam hoje para atrair um número sempre crescente de visitantes; mas o que de fato tem se mostrado de extrema eficiência, são as exposições temporárias. A recente pesquisa do The Art Newspaper, a que fizemos alusão nas páginas anteriores, discute sobre a relação entre o público, as atividades e os programas dos museus de arte, revelando que em três dos maiores museus de arte do mundo - o Musée du Louvre, em Paris; a National Gallery, em Londres; e a National Gallery of Art, em Washington, DC: [..] o papel desempenhado pelas exposições temporárias nos números de visitação em nessas instituições. Exposições gratuitas clara-
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mente aumentam o número de visitantes, mas os museus devem procurar um equilíbrio entre os recursos gastos na manutenção de suas galerias permanentes e suas mostras temporárias, decisão complexa em tempos financeiramente difíceis. (The Art Newspaper, 2014) Com relação ao impacto de sua política de exposições, por exemplo, a pesquisa coloca que: [...] O Louvre lidera a lista de presenças museus com 9,3 milhões de visitantes. No ano passado, ele teve três exposições de grande volume de visitações, atraindo 781.821 (incluindo alguns números de 2012 e 2014). Um porta-voz do Louvre diz que as exposições são realizadas por uma série de razões: para ajudar no conhecimento geral dos visitantes e estudiosos sobre o assunto; para reunir obras de diferentes coleções; e para permitir que as pessoas vejam algo que venha também de outros museus. (The Art Newspaper, 2014) Nesta edição do periódico, todos os textos são voltados às diferentes problemáticas subsequente do público gigantesco desses grandes museus, e um deles se debruça no efeito das exposições temporárias no fluxo de visitantes. Além da incorporação de outros programas culturais, como visto anteriormente - e como ocorre na esmagadora maioria dos museus de arte contemporâneos - a associação de efeitos de fantasia em exposições e instalações temporárias promovem um novo tipo de relação entre o expectador-visitante, que modifica aquela associada ao museu tradicional, em que o público vai até o museu para ver, contemplar a obra de arte, intocável. Agora o público vai para ter múltiplas experiências, interagir com as obras, com o espaço e os diferentes serviços nele ofertados.
Museu do Louvre, Paris, sem data especĂfica
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Em Nova York, no ano de 2013, uma exposição temporária no MoMA (Museum of Modern Art) reteve pessoas de diversas partes do mundo por mais de quatro ou cinco horas, chegando por vezes a 9 horas de espera. O Rain Room - uma das principais obras do grupo rAndom International (um coletivo de arte interativa de Londres, fundado em 2002 por alunos formados pelo Royal College of Art- consiste em uma instalação em uma sala escura, com filetes de água caindo do teto em direção ao chão, e toda vez que um corpo humano era detectado abaixo de sua área de instalação o mecanismo era interrompido. Promovia a experiência humana inédita de controlar a chuva com o próprio corpo. Conhecido por sua abordagem distinta das práticas contemporâneas com utilização da tecnologia digital, projetos experimentais da rAndom Internacional ganham vida por meio da interação do público-obra-espaço. O trabalho convidava os visitantes a explorar os papéis que a ciência, a tecnologia, e a engenhosidade humana podem desempenhar na estabilização, ou alteração, do nosso ambiente. O trabalho era um incentivo à experiência do próprio visitante como artista, como produtor de arte, rompendo com seu posicionamento unicamente contemplativo e criando uma atmosfera íntima entre todos os agentes envolvidos, sejam eles a própria instalação, ou mesmo o espaço em que ela se encontra e os outros visitantes/agentes. [...] é a passagem da performance para a experiência, o que quer dizer, colocar em segundo plano o desempenho funcional e estrutural de um edifício para evidenciar suas qualidades emocionais e sensoriais. Fazendo um paralelo com o aforismo de Calvin Klein - “não importa o que eu visto, mas como sou visto” - para o caso da arquitetura, mais importante do que saber como o edifício foi projetado (e construído) são as sensações que ele proporciona. Segundo
“Rain Room” no MoMA, Nova Iorque, 2013
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a autora [Anna Klingmann], “o design experiencial significa criar uma arquitetura que as pessoas verdadeiramente desfrutem e não apenas se apropriem no plano intelectual”. Daí a importância de se criar ambiências, atmosferas, experiências sensoriais, de um espaço que se projeta para além do físico. . (ARANTES, P., 2010, p.48) A utilização de uma “tecnologia do fantástico” que articule uma “nova ordem simbólica da superfície da tela” - que na verdade diz respeito à utilização da tecnologia para a reprodução de efeitos visuais - são as características notadas por Foster para explicar o que vem ocorrendo com as articulações adotadas pela arquitetura contemporânea e a nova concepção de ferramentas que trabalhem o “sensório de distração” (Foster, 2015) de uma sociedade que vêm - rápida e constantemente - sendo conquistada por experiências sensitivas e arquiteturas que as remetam à algo inédito, nunca visto ou sentido antes. Logicamente, o autor critica este processo refletindo sobre como essas novas demandas, de certa forma, imitam a experiência do espaço, mesmo que seja uma das estratégias mais adotadas para a atração de novos públicos e a manutenção dos que ao mundo e à dinâmica de visitação já se ‘fidelizaram’ de alguma forma. Para reforçar tal impressão, Pedro Arantes defende que tanto para a arquitetura externa - monumental, tecnológica, e extremamente visual - os efeitos de fantasia e efeitos de apelo sensorial se refletem também no interior do museu como um novo paradigma: Os edifícios passam a ser projetados para atender primeiramente a estímulos elementares de prazer antes do que aspectos funcionais, técnicos ou urbanos. Ao contrário de um alargamento da experiência humana, podemos estar presenciando seu estreitamento e
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confinamento a dimensões quase exclusivamente sensoriais e, sobretudo, táteis. [...] é a transição da necessidade para o desejo - nesse caso, a arquitetura deve definitivamente livrar-se dos preceitos funcionalistas e racionalistas para procurar a satisfação emocional, o prazer momentâneo, a busca por identidades. (ARANTES, P., 2010, p.84) Todos esses fatores são muito bem articulados, diferentemente, por cada uma das instituições que tomam o grande volume de visitação como preceito principal. Como no Beaubourg, na Tate, no MoMA, na National Gallery, e muitos outros, uma arquitetura extraordinária (nos diferentes sentidos que o termo pode abarcar) junto a incorporação de diferentes programas culturais, exposições de artistas mundialmente reconhecidos, temas irreverentes, organização e exposição dos acervos de formas inovadoras, exposições temporárias e interativas, e a incorporação de tecnologias em instalações inéditas que promovem o estímulo dos sentidos dos visitantes e sua participação ativa com a obra e o museu são os novos paradigmas contemporâneos dos museus de arte. Esses fatores ganham ainda mais força quando associados harmonicamente à uma reestruturação do espaço interno e externo do museu, que atendam às novas condições físicas e simbólicas necessária para a manutenção do que os museus de arte contemporâneos significam na sociedade e na cidade contemporânea. É, então, sobre isso que os capítulos a seguir continuarão a tratar.
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a escala e a implantação urbana
Ao nos depararmos com um edifício gigantesco que pousa em meio a uma cidade, normalmente algumas questões já estão quase pré-programadas em nossa mente. Aquele gigante é: um importante órgão estatal ou algum departamento de uma grande empresa privada; ou é uma sede administrativa, ou um programa cultural, ou um centro comercial; ou é um edifício de fato importante ou é um edifício que congrega muitos programas; etc. A questão da escala na arquitetura contemporânea, em geral, é um assunto muito recorrente na crítica especializada, e como um dos autores de maior destaque nessa discussão está o arquiteto Rem Koolhaas. Ele descreve profunda e ironicamente a reflexão sobre o tamanho dos edifícios que vêm sendo construídos nas últimas décadas, pensando sobre sua contextualização - ou não - urbana, e suas diferentes consequências. Com a Grandeza, a distância entre o centro e o invólucro aumenta até o ponto em que a fachada não revela o que acontece no interior. A exigência humanista de ‘honestidade’ está condenada: as arquiteturas do interior e do exterior tornam-se projetos separados, uma confrontando-se com a instabilidade das necessidades programáticas e iconográficas, a outra - agente de desinformação - oferecendo à cidade a aparente estabilidade de um objeto. Onde a arquitetura revela a Grandeza assombra; a Grandeza transforma a cidade, que
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era uma soma de certezas e passa a ser uma acumulação de mistérios. O que vemos já não é o que nos mostraram. (KOOLHAAS, 2010, p.17) Segundo o holandês, a Grandeza é por si só um tema de extrema importância no contexto arquitetônico contemporâneo. Independe de um programa específico ou de uma moda. É filha, mais uma vez, dos avanços tecnológicos, da subjetividade e do simbolismo, quando na sociedade contemporânea acaba por promover, ao mesmo tempo, certa reprovação crítica, mas também um fenômeno de promoção do poder político ao que ali se anuncia. “Apenas através do tamanho esse edifício entra num domínio amoral, para lá do bem e do mal. O seu impacto é independente de sua qualidade ” (KOOLHAAS, 2010.p.17). Leveza, flexibilidade, aprimoramento tecnológico, eficiência, estética, entre outros, são valores adotados pela arquitetura pós-moderna e que, não por acaso, muitas empresas gostam de estar a eles associadas. O que está em jogo são estratégias políticas, na qual a arquitetura e o arquiteto sucumbiram ao papel de grandes articuladores ou mediadores, produzindo uma arquitetura do poder icônico, e se afastando gradualmente do pensamento modernista funcional. É o que vem sendo chamado - de maneiras diferentes- de uma arquitetura-simbólica-abstrata (FOSTER, 2015). Para o arquiteto francês Christian de Portzamparc25, existem apenas dois tipos de construções: o marco na paisagem e a clareira. O primeiro pode ser entendido como elemento identificador de lugares e orientador de percursos; um signo espacial que se diagramaticamente representado (a maneira mais recorrente de representação arquitetônica na modernidade,
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na qual aqui não cabe tal discussão, mas mantém a ressalva de sua devida complexidade) por uma ocupação vertical em meio a uma clareira. “Ao marco estaria normalmente destinado um local hierarquicamente privilegiado para que possa funcionar como tal, em uma relação de simbiose entre o elemento que marca e o espaço marcado” (SPERLING, 2012). O segundo, a clareira, diagramaticamente representada por um espaço horizontal com uma limitação vertical de sua extensão, é onde também a construção do espaço é no negativo, correspondente a vetores de forças centrípetas, que se dirigem ao vazio e nele tomam lugar; diferentemente do primeiro, o marco na paisagem, que corresponderia aos vetores de forças centrifugas, isto é, de fluxos, ações que se dirigem a ele e logo se dispersam. (PORTZAMPARC, 2010 apud SPERLING, 2012) Trazendo ao que é pertinente a este trabalho, a maneira como Portzamparc classifica esses dois tipos de arquitetura é também uma denúncia sobre a escala do que vem sendo produzido recentemente pela arquitetura em geral - e também pela arquitetura de museus. Ambos tipos descritos anteriormente são uma assinatura na paisagem, não importa qual ela seja. Se colocam sempre em papel de destaque, seja por serem uma inscrição em negativo na paisagem ou por se colocar de fato como um novo monumento. Ao caráter monumental desses edifícios, trabalham em conjunto outras questões de extrema importância, que, com grande minuciosidade, Pedro Arantes já enuncia na análise do projeto de um dos museus de arte mais atuais, o projeto da Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, assinado por Álvaro Siza26 - no sentido de sua concepção e construção, que acompanham fielmente as discussões aqui apontadas, que participam de maneira muito incisiva do cenário internacional, e no Brasil, também muito forte, porém, mais recente.
Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, Álvaro Siza, 2008
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O Museu Iberê Camargo, em Porto Alegre, projeto de Álvaro Siza, não deixa de estar inscrito na mesma lógica de produção de edifícios icônicos projetados pelo ‘star system’ para lançar internacionalmente cidades. A prefeitura doou um terreno público para O Fundação Iberê Camargo, patrocinada pelo maior empresário do estado, Jorge Gerdau Johannpeter, para construir um museu destinado a abrigar a obra do pintor gaúcho. O terreno, na beira do Guaíba, com vista magnífica sobre a cidade, está no seu vetor de maior valorização imobiliária. (ARANTES,P., 2010, p.66) O edifício consiste em uma plataforma retangular, que contém o estacionamento, sobre o qual Siza verticaliza um volume irregular de concreto branco, cor obtida pela mescla de concreto com pedras brancas do rio vizinho. Parte das circulações são rampas que se separam do corpo principal, marcando e dinamizando a fachada principal do edifício. Em seus quatro andares, abriga um museu com aproximadamente quatro mil obras do artista plástico gaúcho Iberê Camargo, além de disponibilizar e fornecer para a comunidade uma biblioteca, salas expositivas, café, auditório e outros espaços. Iniciado em 2001 e finalizado no fim de 2008, são mais de 8000m² de terreno e exatos 1350m² construídos. É um marco na paisagem da cidade e uma verdadeira referência internacional de arquitetura contemporânea. Mas para além das resoluções de projeto, o que se revela como de interesse na discussão a ser então desenvolvida é a importância do contexto em que o projeto é implantado. Como enuncia Pedro Arantes no trecho citado anteriormente, além, de fato, da importância cultural da construção de um museu de tal escala em um contexto urbano ainda pouco tocado por esse tipo de produção arquitetônica, o projeto da Fundação Iberê Camargo - não unicamente,
Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre, Álvaro Siza, 2008
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como se demonstrará a seguir - levanta diversas questões inerentes à discussão crítica e prática da arquitetura contemporânea: um dos arquitetos mais prestigiados na contemporaneidade projetando um monólito cultural a partir de patrocínio privado. Fatores esses que, como abordados ao longo da pesquisa já desenvolvida, são extremamente descritivos do cenário em que se inscreve tal produção. Porém o que aqui nos interessa entender é de quais maneiras essa arquitetura se inscreve num contexto urbano. Como ela lida com as especificidades do local de implantação e quais são suas consequências para a região em que interfere? De forma sutil, Siza faz pousar “um grande objeto de pedra branca num pequeno e estreito terreno com abrupto declive, às margens de um rio que parece mar. ” (FIGUEIRA, 2008 apud ARANTES, 2010, p.77). Encaixa-se numa depressão da encosta, respeitando a altura do paredão existente, e se abre para o Rio Guaíba, que é a grande estrela da paisagem de Porto Alegre. O museu permanece separado deste por uma avenida de alto fluxo que direciona os veículos para o centro de Porto Alegre, demarcando sua presença na paisagem a construção vale-se de um “indisfarçável expressionismo formal” (WISNIK, 2008 apud, ARANTES,P., 2010, p.65). Assim, a intervenção do arquiteto proporciona uma percepção de continuidade com o perfil da encosta, mesmo havendo um espaço que separa o construído do natural, e, ao mesmo tempo, o material – concreto armado branco – com sua expressão e cor, realça a contraposição entre o objeto e a vegetação existente ao fundo. Respeitando as pré-condições naturais e geográficas do sítio, o Fundação Iberê Camargo exerce papel de destaque não somente quanto a sua arquitetura, monólito branco em meio a paisagem, mas quanto à sua interferência social urbana, na qual provocou uma forte transformação do entorno. Ao redor, despontam grandes empreendimentos, como um novo
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shopping-center, um imenso condomínio multiuso no antigo Estaleiro Só, e um conjunto imobiliário patrocinado pelo clube Internacional - que também renovará seu estádio, o Beira-Rio, para a Copa de 2014. As favelas (ou vilas) da região estão sendo removidas, como no bairro do lado, o Cristal, onde fica o Jóquei Clube da cidade. O novo museu não pode ser compreendido fora desse contexto[...] (ARANTES, P., 2010, p.67) Como pronunciado pelo arquiteto durante a inauguração do FIC, “um museu pode revelar uma cidade para o mundo” (SIZA, 2008), sugerindo que Porto Alegre seria, por meio de sua obra, exibida ao mundo, e ali então inaugurada também uma nova fase cultural para o local. A implantação de uma obra icônica como essa - que movimenta uma grande quantidade visitantes e gera um novo movimento turístico local - têm como consequência (quase) natural uma série de transformações do entorno que transpõem as especificidades físicas do local, que na verdade podem ser entendidas como essencialmente econômicas e sociais. É, mais uma vez, uma das grandes questões da arquitetura, sobre seu poder de alteração não somente espacial, mas principalmente quanto a interferência do entorno. A valorização do entorno, a geração de uma alta especulação imobiliária e consequentemente um processo rápido de gentrificação (como é o caso também do Beaubourg, já mencionado anteriormente) é o que pode ser apontado como um dos mais fortes fenômenos urbanos da produção arquitetônica contemporânea. Em quase todas as críticas que propõem a discussão sobre o processo de gentrificação ocasionado pela implantação das grandes obras de arquitetura, o ponto em comum entre elas é o Museu Guggenheim de Bilbao, do um dos arquitetos de maior repercussão atualmente: Frank
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Gehry27. Antes mesmo de sua inauguração, em 1997, o museu já tinha se tornado assunto comum, chegando a ser também capa da revista do New York Times[Magazine], revelando a repercussão que obras deste porte podem causar social e urbanisticamente. Além da arquitetura monumental e escultórica, o Guggenheim de Bilbao explicitou o quanto a arquitetura não é inocente em suas interferências na cidade; como pode ela causar uma transformação total de toda uma região, podendo isto estar previsto ou não pelo projeto. Foi e ainda é alvo de infinitas críticas e pontos de vistas, mas o que se julga pertinente é quanto sua implantação urbana, o diálogo com a cidade e suas consequências quase desenfreadas. A ideia da elaboração do museu surgiu com o plano diretor para a reurbanização de Bilbao, que pretendia reabilitar as áreas degradadas da antiga zona portuária da cidade. Junto à escolha do local a sediar o museu – uma dessas áreas portuárias, degradadas – ocorreu o planejamento estratégico de revitalização das margens do rio, no qual a administração da cidade elaborou uma parceria com a Fundação Guggenheim para a construção do edifício, que pretendia funcionar como um pólo de atração e desenvolvimento econômico do local. O antigo bairro industrial tornou-se assim a nova centralidade, conectando diversos edifícios culturais – como o Museu de Belas Artes, a Casa da Ópera e a Universidade de Deusto – com órgãos governamentais e os novos centros de negócios e comércio propostos pela operação. Não podendo faltar também a clara articulação entre o museu com outros projetos de outros arquitetos renomados internacionalmente, como Santiago Calatrava28 – com a Ponte Uribitarte – Norman Foster29 com o sistema de metrô da cidade. Tudo que pudesse agir como ferramenta de reafirmação do poder icônico e simbólico da implantação de tal edifício naquele contexto. Como levantado pela pesquisa da taiwanesa Chin Tao-Wu, o
Guggenheim de Bilbao, Bilbao, Frank Gehry, 1997
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projeto correspondia a um investimento de recuperação urbana no valor de 1,5 bilhões de dólares, com uma série de estratégias culturais que envolviam principalmente o desejo de inserir Bilbao no circuito do turismo cultural internacional. Quem se aproxima do museu vindo do centro da cidade, pela escura rua de Ramón Rubial, se depara com um enorme volume metálico disforme e reluzente, interrompendo a linha do horizonte. [...]Cruzado a Avenida Abandoibarra Hiribidea, chega-se à praça de acesso às bilheterias, que exibe em um outdoor as exposições blockbusters do momento. No trajeto predominam volumes ortogonais, em pedra amarela e arenito, uma pequena concessão à cidade que o cerca, ao dialogar com suas formas, escalas e materiais. A entrada no museu se dá por meio de uma enorme escadaria, pois seu piso inferior está a baixo do nível da cidade, próximo à margem do rio Nérvion. Nessa baixada, ao longo do rio, nos cais Evaristo Churrusca e de La Campa de los Ingleses, ficavam galpões industriais e armazéns abandonados, que haviam sido desativados com a crise das indústrias metalúrgicas e dos estaleiros de região. Toda essa área passou então a fazer parte de um plano estratégico de revitalização das margens do rio – em um processo similar ao que ocorreu em Barcelona, com a transposição do velho porto e a abertura da cidade para o mar, favorecida pela renovação urbana motivada pelas Olimpíadas de 1992. (WU, 2006, p. 39) O projeto de Gehry traz à tona muitas das questões já então discutidas, porém serão as características do lado externo ao edifício que aqui mais interessam: a grandeza30 do edifício, associada à influência que
Guggenheim de Bilbao, Bilbao, Frank Gehry, 1997
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a mesma causa na cidade que a recebe. A crítica chegou a dizer que, após o Guggenheim de Bilbao, a arquitetura transformou-se completamente, sendo possível nomear esse processo de promoção internacional e atração de fluxos de capital - a partir de uma grande obra arquitetônica - de “efeito Bilbao”. Considerada fundamental para a cultura dos novos museus, a profusão deste ‘efeito’ foi mundial, e muito ilustrativa do cenário em que se inscrevem estas arquiteturas megalomaníacas, utilizadas como ferramenta de renovação urbana, promoção internacional de cidades, arrecadação de fundos e geradora de turismo cultural31. Porém outro legado do efeito Bilbao foi o marketing em torno do “starchitect32”, que promove o arquiteto à celebridade, propondo que “no atual mercado de ideias globalizado, o chamado starchitect tem meios para influenciar o mundo, além da arquitetura” (MORA, 2010). O projeto para Bilbao fez de Gehry um dos arquitetos mais famosos do mundo. Porém, não se tratava da divulgação da imagem de um museu ou um arquiteto que produzisse “uma cidade melhor e mais justa, mas de construir um lugar que fosse magnetizador de renda” (ARANTES, P., 2010, p. 17). Em resumo, como defende Otília Arantes à propósito dos dois últimos projetos citados, o Guggenheim de Bilbao foi, depois do Beaubourg, um dos museus contemporâneos de maior repercussão crítica e midiática. Não só, mas principalmente, por serem dois grandes monumentos da arquitetura contemporânea, mas também por serem extremamente enigmáticos pela maneira como lidam diretamente com as problemáticas contemporâneas, operando cada vez mais de maneira interdisciplinar nas cidades. Mesmo que em diferentes contextos, o que é colocado em pauta por ambos projetos é a forma como a arquitetura tem sido influenciada por diferentes esferas de poder, se colocando como ferramenta política econômica; como causadora de grande animação cultural e, muito importante, como dois
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marcos distintos sobre a maneira de pensar o museu, como campo quase específico da arquitetura. É, então, sobre isso que o próximo trecho do trabalho irá se debruçar. Do ponto de vista dos arquitetos, o edifício cultural e em particular o museu, passa a ser desejado como obra de livre imaginação (em oposição ao museu a serviço das obras, neutro, como queriam os modernos). Daí que “todos os arquitetos hoje desejem assinar o seu museu e “pretendam criar uma obra de arte total”. Otília tampouco deixa de reconhecer nos arquitetos uma categoria que se beneficia e legitima o afluxo substitutivo do cultural sobre o social. A obra de livre imaginação transita da arquitetura específica dos museus para qualquer tipo de edifício assinado por um novo gênero de arquiteto-estrela, um star system de autores e autoridades que passou a reinar “no mundo da arquitetura depois da desintegração do credo modernista”. (ARANTES, P., 2010, p.18)
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a arquitetura
Assim como visto anteriormente, a arquitetura dos museus foi assinalada por uma sequência - não exclusivamente no sentido temporal - de acontecimentos que transformaram totalmente a concepção dos museus contemporâneos. As novas condições da arquitetura pós-moderna surgem nas novas paisagens urbanas como grandes figurações, produzidas por tecnologias de ponta, que exploram e transpõem os desafios da técnica e dos materiais, quase sem limites ou restrições - inclusive orçamentárias. “Em sua “liberdade” inventiva, alimentam-se, nesta nova fase do capitalismo, de um paradoxo técnico-formal: quanto mais polimorfo, retorcido, desconstruído, material e instável por excelência -, maior seu sucesso de público e, portanto, seu valor como imagem publicitária” ARANTES, P., 2010, p.1). O museu contemporâneo, como desenvolvido nos capítulos anteriores, é dotado de novas características e valores que aliam conceitos subjetivos às materializações concretas. No desenvolver da discussão anterior estes novos conceitos foram já devidamente levantados e discutidos, levando a que, neste momento, seja muito oportuna a discussão quanto a própria arquitetura; sobre de quais maneiras ela administra e articula as novas precondições do museu de arte da atualidade. O forte caráter político; simbólico; a forte e decisiva incorporação das novas tecnologias, de diferentes maneiras; as inovações na forma arquitetônica e também na maneira de expor e de interagir com o público;
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os desafios estruturais consequentes de seu tamanho monumental; o poder de atração de um número inacreditável de visitantes; ou mais alguns motivos que poderiam aqui serem elencados e se prolongar infinitamente. O objetivo desta última etapa do trabalho é, portanto, compreender brevemente como é esta nova produção, quais são os projetos mais marcantes e quais são os pontos principais que fomentam tamanha popularidade do assunto. Um “desejo de museu” multiforme parece animar as sociedades contemporâneas, nas quais cada fenômeno social parece suscetível de colecionismo. A ênfase atribuída a irredutível especificidade do “local” contribui, em particular, para multiplicar os museus que, supostamente, levam a ver o passado, tal como ele ocorreu, precisamente nesse espaço. Semelhantes abordagens das particularidades das sociedades e culturas transformam o sentido museal: a superexposição comunicacional, apoiada as novas tecnologias, é acompanhada, se necessário, por uma banalização dos desafios e do interesse do projeto. Paralelamente, aparecem grandes estabelecimentos temáticos, incumbidos de expor conhecimentos gerais, mas que ilustram frequentemente outro aspecto de pós-modernismo, a saber, a transformação do discurso erudito e disciplinar no sentido do que Clifford Geertz qualificou como “gênero impreciso” (POULOT, 2013, p.103) A dificuldade de chegar em uma definição única sobre a arquitetura pós-moderna dos museus é algo extremamente recorrente em diversas publicações e entrevistas. Muito autores vêm arriscando uma tentativa de classificação dos museus concebidos e construídos nas últimas décadas, porém algo que se observa muito forte - e recorrentemente - é a incrível
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subjetividade e complexidade no fazê-lo. Cabe exclusivamente ao autor definir a que grupo um projeto pertence ou não, quando na esmagadora maioria das vezes, ao passo que um projeto se aproxima do outro, se distancia à mesma medida em outro aspecto. Por isso julga-se, aqui, muito mais pertinente que outra tentativa de catalogação, é a análise de museus alguns dos museus mais emblemáticos no fator arquitetura, e assim a demonstração da pluralidade de tal produção e produtores. Sobre o “gênero impreciso” - ou simplesmente a produção contemporânea -dois conceitos são potencialmente onipresentes nas discussões em torno desse novo cenário arquitetônico para os museus de arte: o paradoxo, e o instável. Nas palavras de Jean Galard33, para compreender onde estamos, e o que vem sendo produzido na atualidade, é preciso “conhecer o passado e desconstruir o hábito contemporâneo de ignorar a história” (GALARD, 2006 apud GROSSMANN; MARIOTTI, 2011, p.128). Segundo Galard, o paradoxo está, justamente, quanto as temporalidades dos dois principais fatores envolvidos nessa problemática do museu contemporâneos de arte: “ A arte contemporânea é relativamente nova para os museus ” (2006). Este fator de certa discordância do museu contemporâneo é de total relevância à medida que, para a imensa maioria do público, o museu se tornou um lugar de “pretensão em relação ao presente, e não mais de reconhecimento do passado”. Em outro exemplo, e agora outro autor, - ainda sobre a crítica dos espaços museais contemporâneos - Montaner argumenta sobre esse paradoxo como uma outra vertente crítica, na qual toma como base a recente utilização da tecnologia como a nova principal premissa arquitetônica: No final do século XX, quando as possibilidades tecnológicas aumentaram em um ritmo acelerado, pode parecer um paradoxo
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que a arquitetura se afaste da produção em série e tente se abrigar no campo não normalizado da obra de arte. O paradoxo é apenas aparente já que, em muitos casos, essas intervenções tão singulares sejam feitas utilizando tecnologias muito avançadas e sofisticadas. No entanto, em outros casos trata-se de uma reação à crescente tecnificação do mundo. De qualquer forma, existe uma posição arquitetônica que busca na obra de arte e nos seus componentes irracionais um modelo que a legitimize e que estruture seus processos de investigação formal. (MONTANER, 2003, p.216) Já a instabilidade é relacionada a certo simbolismo, como citado anteriormente, nesses novos museus. Uma arquitetura em constante ‘crise’, permeada por infinitas revisões, atualizações e transformações, podendo ser traduzida como a experiência do museu que é, hoje, simultaneamente o instrumento e a vitrine, uma verdadeira provocação da memória. Trata-se da instabilidade e da indefinição que faz parte da própria natureza do museu pós-moderno, quando a museografia das artes se torna cenário - instalação - na qual para cada exposição, em um ritmo frenético, o museu se renova completamente, se tornando palco para um espetáculo maior, onde permanece somente ao limite do próximo curador convidado - responsável pelo remanejamento do museu a favor da melhor estratégia de sedução do público (que como visto anteriormente, essencial em diferentes sentidos para a manutenção da dinâmica dos museus). Este fator de sedução – para a arquitetura – é muitas vezes confundido com o caráter tecnológico, o que não é nem somente verdade nem mentira. A incorporação das novas tecnologias e dos avanços digitais transformou a arquitetura contemporânea desde a sua maneira de ser idealizada - através de programas digitais extremamente avançados, que permitem
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formas e desenhos jamais possíveis de serem representados anteriormente -, até a própria utilização da tecnologia como construção, seja ela da engenharia, dos materiais, ou mesmo como aparato da fantasia, da experiência interna no museu. Os projetos dessas últimas décadas podem ser entendidos, de uma maneira geral, como composições de “tramas embaralhadas, geometrias não-euclidianas, pilares inclinados, curvas oblíquas, volumes irregulares, cascatas de formas aleatórias” (ARANTES, P., 2010, p.275) combinadas entre si dos jeitos mais irreverentes possíveis, nas quais denunciam a autonomia da forma nos projetos contemporâneos. As novas ferramentas tecnológicas possibilitando a transposição da simples intenção artística do arquiteto para a sua, de fato, materialização física. “A arquitetura pende para o escultórico e a imagem da obra acabada torna-se um evento midiático” (ARANTES, P., 2010, p.92). Trata-se da utilização das novas tecnologias alterando todas as instâncias do edifício: desde o seu desenho, totalmente amparado tecnologicamente, passando pela possibilidade de execução de maneira automatizada, pelos materiais de grande potencial construtivo e estrutural de maneiras extremamente tecnológicas, até a maneira como o seu interior se revela ao espectador, se colocando como um produto a ser consumido, uma experiência programada - como ocorre no projeto de Frank Gehry para o Guggenheim de Bilbao. Um bom exemplo de tal efeito é a fachada de Bilbao proposta por Gehry. Conforme o horário do dia e a luminosidade do céu, os reflexos adquirem tons e intensidades diferentes. As chapas que recobrem o museu são finas placas de uma liga a base de titânio, um metal nobre que, dada sua leveza e resistência mecânica e à corrosão, é utili-
“We stopped just here at the time�, Beaubourg, Ernesto Neto, 2002
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zado para fins industriais, médicos (como próteses) aeronáuticos e militares (na fabricação de turbinas e bombas, por exemplo). Pela primeira vez foi empregado em grande escala em um edifício, com o objetivo de deixá-lo com uma aparência suave e delicada, pois a folha de titânio fica levemente estufada como um tecido. Conforme a luminosidade e umidade do dia, o metal pode brilhar como ouro. Gehry assim explica seu toque de Midas: “em Bilbao chove muito e a liga de titânio, em contato com a água, fica com a cor dourada, é um milagre”. (ARANTES, P., 2010, p.7) No que diz respeito, mais uma vez, a dupla dos museus mais enigmáticos e comentados dessa produção pós-moderna, o Guggenheim de Bilbao é quase o oposto do Beaubourg no que diz respeito ao modo de apropriação das novas tecnologias. No Beaubourg, a estrutura está toda à mostra, como um grande Mecano: as tubulações das instalações elétricas e hidráulicas, ventilações, elevadores e escadas são vistos por quem está na rua. As Lajes internas ficam, assim, completamente livres de obstáculos e interferências e favorecem os mais diversos usos e possibilidades de organização espacial. A estética industrial é ao mesmo tempo expressiva e colorida, inspirada nos desenhos de ficção científica do Archigram e ou na imagem pop do Yellow Submarine, dos Beatles. O museu francês é, assim, ao mesmo tempo, um elogio e uma paródia high-tech, e certamente uma aula pública sobre o comportamento das estruturas e o funcionamento de um edifício complexo como aquele. Na obra de Gehry tudo isso permanece oculto, com exceção dos ele-
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vadores panorâmicos que adquirem uma teatralidade[...]. Apesar da alta tecnologia empregada na obra, ele não pretende extrair sua expressividade dos elementos estruturais high-tech, mas da imensa superfície reflexiva e dos volumes que a conformam e permitem luminosidades diferentes e mutantes. (ARANTES, P., 2010, pg.20) A discussão sobre a influência do fator tecnológico incorporado pela arquitetura das últimas décadas é tema de diversos autores importantes, porém são nos ensaios de Koolhaas que se disseminou mais fortemente a crítica em relação à “natureza artificial” perpetuada pela pós-modernidade. Segundo ele, essa arquitetura é característica pela forte similaridade formal entre programas muito distintos entre si: aeroportos, shoppings, lojas de departamentos e, também, museus; são todos detentores de uma série de elementos em comum - símbolos da tecnologia, e que transformaram substancialmente a arquitetura contemporânea. Esta, é descrita como “uma calma estranha: quanto mais calma, mais se aproxima do seu estado puro” (KOOLHAAS, 1995, pp. 1249-1250). Crucial para a nova aparência e dinâmica dessa arquitetura é a aplicação de meios mecânicos tecnológicos, como as escadas rolantes e o ar-condicionado. São estes os elementos que enfim possibilitaram a criação de espaços enormes conectados uns aos outros sem uma grande diferenciação de ambientes, sem que o visitante - que em todos os casos é também ‘cliente’ - tenha seu percurso interrompido. O fluxo é continuo. A escada rolante, diferentemente do elevador, não tem um número máximo de passageiros por viagem, não a enclausura, e permite uma visão geral do espaço que os circunda e consequentemente dos “produtos exposto para consumo” (KOOLHAAS, 2010). O fácil acesso a todos os níveis e a livre circulação entre todos os ambientes sem que
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realmente se perceba a transição, alteraram substancialmente a dinâmica desses edifícios, possibilitando assim também um aumento exponencial da capacidade de visitantes – algo extremamente importante. A escada rolante e o elevador permitiram subverter a coerência programática do edifício, ao dispor e articular diversos programas uns sobre os outros. O ar condicionado, em combinação com os outros meios mecânicos, permitiu edifícios e ambiente mais profundos, ao passo que controlam o clima interior e originam ambiente comerciais maiores, cada vez mais desconectados do mundo exterior. Assim, janelas puderam ser suprimidas e a luz natural deixou de ser uma premissa importante, sendo radicalmente substituída pela clausura, mais uma vez transformando completamente a noção de espaço de entretenimento, de sociabilidade, como lugar privado – que em alguns momentos imita as ‘liberdades’ dos espaços públicos, quando na verdade não passam de uma estratégia de manipulação dos visitantes, para que eles se sintam cada vez mais confortáveis em espaços como estes. Estes novos ambientes estéreis em relação à rua se tornaram de certa medida o novo cenário da cultura e do lazer, em muitos casos concorrendo com os próprios espaços público das cidades contemporâneas. Um ótimo exemplo de tal manipulação estratégica da arquitetura é o nível da rua do Beaubourg: Concebido como um cruzamento entre o British Museum e a Times Square atualizados para a era da informação, o Beaubourg logo se tornou popular (recebe hoje mais de 7 milhões de visitantes por ano); incrustado em uma ampla piazza, também era populista (Rogers o chama de “um centro do povo, uma universidade das ruas”). [...] não obstante sendo um dos poucos edifícios pop e high-tech proeminentes a ver a luza do dia, foi recebido como um manifesto.
Plateau Beaubour, Marais, Paris, sem data especĂfica
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[...] De certa maneira, os tubos e instalações funcionam como uma forma contemporânea de ornamento - conferem ao Beaubourg tanto o detalhe quanto a escala - e o movimento das pessoas na praça, entrando no piso térreo e subindo pela escada rolante, não só dá vida ao centro como também o conecta à cidade. (A firma favorita da imagística arquitetônica no RRP poderia muito bem ser “o ornamento da massa” dos ocupantes de seus edifícios - em circulação, em reuniões etc.) (FOSTER, 2015, pp.41 e 42) A “ampla piazza” é um grande espaço que funciona como uma ferramenta muito importante para o Beaubourg. Ela funciona, primeiramente, como um grande espaço livre, público, que acolhe os visitantes, que marca a malha urbana da cidade fazendo a transição entre arquiteturas extremamente diferentes (a haussmanniana, típica da cidade de Paris, e a high-tech do Beaubourg). Esse grande respiro enuncia a importância do que ali se passa, seja pela própria arquitetura ou seja pelo uso - por ser uma das mais importantes instituições de arte da França - revelando a escala de um edifício importante que não acompanha o restante da cidade, exceto pelo gabarito. A escala da praça é totalmente relacionada também quanto ao desejo, e necessidade, dos museus contemporâneos de funcionarem em concordância com a cultura de massas, como visto anteriormente. A Grandeza do próprio edifício se reflete na praça, que comporta e ao mesmo tempo convida um enorme contingente de visitantes, transformando tal possibilidade em uma estratégia de arrecadação de visitantes para o museu. Porém a grande esperteza está na transição entre a praça e o espaço interno do museu, o térreo. A transparência prometida pelo vidro convida o indivíduo na praça a conhecer o interior do edifício, repleto de letreiros luminosos que ao mesmo tempo que anunciam vários e diferentes usos
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que dificilmente estariam ligados ao nosso ideário de espaço museal, como cinema, salas de espetáculo, biblioteca, e etc.; também trabalham com o apelo visual tecnológico típico da contemporaneidade. De maneira geral, os dois projetos citados são dois dos grandes projetos que repensam totalmente a concepção tradicional do museu de arte; inovadores pela maneira como lidam com os novos desafios da contemporaneidade e as novas necessidades por ela impostas, tanto na disciplina da arquitetura quanto nos campos sociais, políticos e econômicos. O Beaubourg sinalizou o começo de uma corrente arquitetônica para os museus que marca a transformação da relação entre arquitetura e os novos sistemas de produção industrial, trazendo-os como uma das principais premissas dos novos museus. Já o Guggenheim de Bilbao marcou a produção arquitetônica de outra forma, por sua maneira de utilizar das novas tecnologias como ferramentas para a obtenção de uma escultura urbana, em uma escala e acabamentos ‘inacreditáveis’. Dois projetos que conseguiram traduzir as novas tecnologias em forma arquitetônica, aliando a nova noção de “símbolo no espaço antes de forma no espaço”, como reclamam os Venturi. Logicamente, ao fazer a crítica de algo, muitos fatores subjetivos, e até mesmo pessoais - como crenças e posicionamentos políticos -, são envolvidos. Ainda assim é clara a existência de alguns exemplos nos quais a crítica assume quase unanimidade sobre seus aspectos positivos e negativos. Desta forma, a escolha do último exemplo a aqui ser citado pode soar quase como um alerta à essa produção que, ao mesmo tempo que é ligeiramente recente, tem muitos embates e questionamento aos quais os arquitetos de hoje estão sendo obrigados a refletir sobre e repensar seu posicionamento. O caso do Museu das Confluências - Musée des Confluences - em Lyon, na França, é um bom exemplo do que pode também vir a ser o
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novo museu contemporâneo. Produto do segundo maior projeto urbanístico na cidade de Lyon, que vem sendo operado e construído desde os anos 2000, o Museu das Confluências é um marco simbólico e estratégico na cidade. Na extremidade sul da cidade, margeando a península onde convergem os dois principais rios da cidade, o Rhône e o Saône - de onde vem também o nome - a implantação da escultura de concreto e vidro não é inocente. Beirando também a principal rodovia pela qual acontece a principal ligação norte-sul da França (o eixo Paris-Marseille, que conecta toda a região central do país às principais regiões litorâneas ao sul), a implantação do Museu é um monumento que não passa despercebido a nenhum indivíduo que passe por Lyon. O edifício de 5mil metros quadrados projeto pela cooperativa de arquitetos austríacos Coop Himmenb(l)au foi concebido na intenção de “[...]conquistar espaços marginais ao transformar o museu no pioneiro de remanejamentos mais complexos e mais amplos para Lyon” (POULOT, 2013, p.124). Porém o que é de fato resultado de sua construção é um fato muito diferente da intenção política ‘bem-intencionada’ de chamariz para a urbanização de uma área ainda pouco ocupada e, até então, muito desvalorizada da cidade. Se localiza no mais novo bairro de Lyon, em Confluence, recentemente requalificado. Foram precisos dez anos, quase 300 milhões de euros e várias polémicas para terminar a obra. Só nos primeiros doze dias, o museu recebeu 56 mil visitantes. Positiva ou negativamente, causou grande impacto na cidade. Visto que se trata de um museu de “história da humanidade”, tratemos aqui do que de fato é pertinente a essa discussão: a arquitetura. Trata-se de uma grande escultura de concreto vidro, de formas na fachada que são difíceis de uma compreensão. Ora são planos ortogonais, inclinados, de concreto, ora vidro, ora retorcidos ensaiando curvas, mas que na ver-
Museu das ConfluĂŞncias, Lyon, Coop Himmenb(l)au, 2014
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dade denunciam a falta de uma unidade e o ‘desespero’ por um forte apelo formal, que salte - inevitavelmente - aos olhos de quem por ali passe, seja na escala do carro seja por VLT (o único transporte que liga o centro da cidade à região), ou mesmo na escala do pedestre. É o primeiro grande edifício que recepciona - ou encerra - a paisagem urbana de Lyon, e que ao mesmo tempo que, de fato, cumpra seu papel de marco, não se refere de maneira nenhuma à arquitetura local da cidade. Uma arquitetura, um monumento, que destoa de todo o entorno, que não faz referência nenhuma à cultura local. Não somente, ao passo que os espaços internos são o resultado das formas complexas da fachada, os espaços internos são espaços recortados, com espaços mortos, inaproveitáveis e que não acrescentam nenhum espaço útil de exposição ao edifício. Em total oposição, os espaços realmente expositivos são salas, repartidas, lado a outra, que promovem ao visitando um percurso fracionado, sem continuidade e de difícil compreensão. São salas de tamanho médio que funcionam como grandes diorâmas, como suporte de uma cenografia que reporte ao tema tratado em cada uma das salas, sem proporcionar algum benefício ou experiência resultante da arquitetura do museu como um todo. O tão importante fator experiência dos novos-museus, aqui, é proporcionado apenas pelos espaços que não são dedicados às exposições, como as grandes escadas rolantes que vencem um pé direito de 8 metros, sem pausa, do primeiro nível ao segundo. É também proporcionado pelo uso dos materiais, pelo vidro e pelas formas recortadas que de alguma maneira fazem alusão a uma ideia de tecnológico, futurista. O Museu das Confluências é um exemplo de como a ‘cartilha dos novos-museus’ pode também ser utilizada para fins não muito enriquecedores, nem como arquitetura, espaço e experiência, tampouco como exem-
Museu das ConfluĂŞncias, Lyon, Coop Himmenb(l)au, 2014
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plo de enfrentamento crítico. São os elementos característicos da produção arquitetônica contemporânea de museus elevados a seu nível máximo, abdicando de articulações cuidadosas e sutis e forçando a aplicação de todos eles, em plena simultaneidade. De maneira mais geral, sobre essas principais problemáticas com as quais a arquitetura pós-moderna dos museus vêm lidando, o crítico Montaner sintetiza: Os tetos e pisos devem alojar um novo universo mecânico nos seus espaços vazios. Mesmo as fachadas diretamente cristalinas, com fechamento de vidro com lâmina única, inerte e autônoma nos projetos de arranha-céus de Mies no final dos anos vinte, não passam de ser manifestos puramente formais. A lâmina da fachada teve que aumentar paulatinamente de espessura e complexidade para resistir ao vento, funcionar estruturalmente e potencializar o ambiente climático anterior. Cada opção tecnológica - tipo de estrutura, sistema de climatização, situação de sistemas mecânicos, materiais de fachada, etc.- condiciona a forma do edifício, a flexibilidade do espaço interior, a espessura das lajes, a transparência das fachadas.... Esse notório e transcendental papel que os avanços tecnológicos desempenham é cada vez mais presente. (MONTANER, 2003, p.126) São, de maneira geral, os equipamentos culturais mimetizando na arquitetura dos museus aquela característica dos shopping centers, parques temáticos, feiras de mercadorias, etc.; o que marca totalmente a inserção do espaço expositivo no contexto da cultura de consumo, do espetacular e do entretenimento de massas – recuperando os principais temas das trans-
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formações que foram discutidos anteriormente. As constantes e recentes metamorfoses da arquitetura dos museus se tornou alegoria de um processo muito maior, parte importante de novas articulações, ansiedades e necessidades. Como explica Otília Arantes, o museu contemporâneo, “por definição um recurso civilizatório, qualquer que seja a forma histórica na qual se apresente” foi convertido em um “pólo midiático de atração e valorização econômica” (ARANTES, O., 2005, p.64), nos diferentes significados que tal valor pode aqui assumir – como arrecadação, como requalificação urbana, como geradora de atração política, como marca de poder ou como promoção de valor midiático. “Todo produto deve ser simples, claro, definível em poucas frases. A obra é seu próprio logo, tão opaco e simplificado como uma embalagem” (ARANTES, O., 2005, p.64).
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conclusão
A discussão sobre o que deverá ser, de fato, o museu no século XXI é, ao mesmo tempo, muito recorrente e diversa nas opiniões e posicionamentos de quem a está discutindo. Como visto no desenvolver deste trabalho, muitos autores foram apresentados e seus diferentes posicionamentos discutidos. Partindo da leitura feita por Hal Foster, o enquadramento do Pop Art e seus desdobramentos para o campo das artes em um contexto geral, como vimos, veio por alterar totalmente além do cenário artístico, mas muito, também, a relação entra a arte e a vida cotidiana. A incorporação de imagens cotidianas de conhecimento comum gerou um efeito de reconhecimento e, naturalmente, uma forte aproximação do público com a arte em geral. Não obstantes, o papel do ‘espectador’ em relação a obra, também foi modificado a partir de tais novas relações, no qual o público se transformou em uma das peças principais da cartilha dos novos museus. Ele é o novo termômetro da arte, quem mede seu sucesso e a faz cada vez mais, também, se aproximar cada vez de uma condição de mercadoria e assim, portanto, inserir cada vez mais declaradamente a arte e a cultura em bens de consumo. Uma vez colocadas assim, ambas passam a operar na base da economia, o que por fim gera uma total transformação ideológica naqueles que mais as representam, conjuntamente: os museus de arte. Tendo elencado os principais fatores e agentes que suscitaram os “novos-museus”, a segunda parte do texto segue em direção à uma leitu-
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ra mais direcional aos principais elementos - ou problemáticas - com os quais esses museus lidam. Admitindo alguns exemplos principais, que permeiam os trechos compreendidos na segunda parte (o Beaubourg, o Guggenheim de Bilbao, a Fundação Iberê Camargo e o Museu das Confluências), o público, o programa, a escala, a implantação urbana e a arquitetura são tratados separadamente e exemplificados através da descrição dos casos selecionados. Mais que uma sequência de descrição de museus de arte que façam parte da produção pós-moderna, o desejo desta pesquisa é compreender quais foram os fatores e eventos que impulsionaram tamanha transformação não só da arquitetura desse tipo de programa, mas também a própria instituição de arte e a relação com a qual ela dialoga com o espaço do museu. Logicamente, as variações quanto a opiniões são muitas, porém o que aqui se deseja minimamente decifrar é a composição disso que, por mais que contemple formas muito diversas, vêm parecendo uma tendência, que é, então, o que vêm sendo chamado de “novos-museus” Logicamente, existiram e existem sempre aqueles que condenam ‘atualização’ dos museus, defendendo a preservação do museu enquanto instituição de preservação da memória, cultura e história; de outro lado também sempre haverá aqueles que compreendem as diversas transformações culturais dos museus e defendem que sejam elas as grandes geradoras dos novos formatos de museu de arte hoje. Acredito que cada vertente crítica deva ser considerada, visto os contextos dos diferentes autores e a que objetivam cada um deles, cada uma delas acrescenta algo positivo a essa discussão que têm se mostrado extremamente atual. A complexidade desta produção vem desde o próprio termo usado para denomina-la (novos-museus), o que pode ser entendido, como vimos, como a própria denúncia de certa fragilidade entre duas ideias de
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temporalidades diferentes - novo e museu. Mesmo que para a crítica seja um assunto que ainda não esteja nem perto de seu fim, o sucesso dos novos-museus modificou o contexto museal e cultural no mundo todo, tanto pela transformação da própria instituição, pela maneira como ela lida com as novas demandas contemporâneas; seja pelo sabido impacto que causam na sociedade atual - seja de fato cultural, social, político ou urbanístico. Acredito que, ainda assim, exista uma diferença muito subjetiva, mas que divida esta produção em dois: o museu no século XXI o museu do século XXI. Apesar da - aparente - sutil diferença, existe algo que os diferenciam substancialmente. O museu no século XXI é o contexto, o que segue o processo de transformações culturais ocorridas na segunda metade do século anterior. Aquele que discute as tais novas demandas da contemporaneidade, que se propõe a atender ou não a forte ansiedade de atualização - o grande vírus da atualidade - seja por meio unicamente de uma ‘revitalização’ - tanto da arquitetura quanto das novas demandas institucionais -, seja por meio da construção de fato de um novo modelo, uma nova sede que corresponda e atenda o fetiche cultural das massas. Já o museu do século XXI é aquele que é fruto da atualidade. Que aceita e acata às novas premissas, quase sem grandes questionamentos críticos, mas que simplesmente compreende que o público é outro e, desta forma, o museu também. Ele é uma composição daquilo que garante sua vitalidade: os investimentos econômicos, o público numeroso e diverso, a cultura de consumo, e o papel de ferramenta de políticas públicas e privadas. Sem dúvida isto não é uma tentativa de classificação, mas sim de compreensão de dois momentos diferentes dentro da mesma produção. É, mais uma vez, a arquitetura dialogando e articulando com outras esferas e disciplinas, assumindo um poder e importância monumentais, que - ar-
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risco dizer - que se reflete muito no próprio posicionamento do arquiteto na contemporaneidade. Ciente da influência que arquitetura exerce em uma cidade, em um tecido urbano e assim na vida das pessoas, o arquiteto passa a se colocar cada vez mais como um agente multidisciplinar, encarregado de uma responsabilidade astronômica. Existem, logicamente, diferentes posicionamentos: aquele que se entende como arquiteto-crítico, que compreende o valor não monetário de sua obra, mas sim o poder de interferência na vida e na dinâmica de uma cidade, como por exemplo Richard Rogers e Renzo Piano. Logicamente, nenhuma das obras dessa produção nega o fator forma, mas a diferença está muito ligada à maneira como ela é hierarquicamente considerada por cada um de seus autores. Explico: o outro tipo de posicionamento é do arquiteto que se entende como ícone, como um artista - grande escultor -, que tudo pode. Aquele que tudo o que toca, vira arte e, assim, um grande sucesso. Utilizando novamente os museus já citados, o que aqui mais se aproxima é Frank Gehry, com suas obras faraônicas e altamente artísticas do ponto de vista formal e estrutural. A arquitetura cumpre tão bem o papel artístico - de contemplação - do museu, que poderia ser em algum momento possível aniquilar os próprios conteúdos, as obras, determinando que aquele é, de fato, um museu dos espaços, de experiências fantásticas do vazio escultural. É impossível fugir do frenesi contemporâneo da imageabilidade, em que tudo se transforma em apelo visual, sensitivo. A nova arquitetura dos museus incorpora as novas tecnologias a favor de enfatizar a força de seu erotismo, da sedução. Por meio de uma fachada de materiais extremamente tecnológicos, por uma experiência interna que aguça os sentidos do visitante, ou por uma noção de espaço, escala e fluidez que só as novas tecnologias foram capazes de materializar. Mas diante de tudo isso, de tantos
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fatores subjetivos, de que forma os museus devem lidar com o equilíbrio entre a arquitetura (como geradora de um espaço) e a arte (como conteúdo e estratégia de sedução) considerando sua função pública? “Arte é uma forma de auto expressão sem absolutamente nenhuma responsabilidade com alguém ou algo. Arquitetura pode ser uma obra de arte, mas deve se responsabilizar pelas pessoas e seu contexto” (HILLMAN, 2013). Não proponho compreender a arte como algo que não possua objetivos, questionamentos e opiniões. Pelo contrário, é a sua liberdade - a auto expressão - que promove o que a arte tem de mais valor, a possibilidade de fazê-la como a materialização de uma crítica. Muitas vezes são concebidas como uma forma de crítica à algum evento, a algum problema social, ao governo, à movimentos em grande repercussão, etc. A arte é uma ferramenta poderosa, porém ter potencial crítico não é o mesmo que ter uma grande responsabilidade. Novamente, uma ressalva: não significa que a arte não tenha responsabilidades, mas o ponto aqui é quanto a arquitetura se colocando como arte, principalmente no contexto dos museus. Arquitetura, antes de ser uma arte, deve ter consciência das pessoas. Pouco vale explorar formas e criar estes arquitetônicos como arquitetura sem estar constantemente ciente da experiência e percepção das pessoas. Entretanto, é muito comum nestas experimentações formais, definir a arquitetura em função do desenho e da tectônica. (HILLMAN, 2013) De início, uma ressalva é importante: a intenção aqui não é (como em momento nenhum foi) criticar a arquitetura formal, que admite uma
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forte pretensão formal, escultórica. Mas sim propor uma discussão que alerte para o exercício da atenção quanto a uma medida que envolve mais do que meramente uma intenção plástica, mas sim a interferência na vida de pessoas, de responder ou propor alguma mudança a elas. Isso, o fator de responsabilidade, faz da arquitetura naturalmente menos expressiva e mais objetiva; o que não é, mais uma vez, uma defesa da arquitetura funcionalista, mas sim a discussão sobre o essencial cuidado quanto aos pesos de cada um dos fatores apresentado. A arquitetura pode ser descrita, acreditada, pensada, projetada e executada de diferentes maneiras. Deve ser uma boa experiência, agradável tanto ao corpo quanto aos olhos - apesar de sua extrema subjetividade -; responsável pelo dentro e fora do edifício. Mas deve, sempre, indispensavelmente, tratar do contexto, e da impossível separação de uma boa arquitetura a ele. Sua deformidade e instabilidade visual evidenciam plástica e tecnicamente a desmedida própria à acumulação capitalista, agravada pela dominância financeira. [...]A arquitetura na era digital financeira, que procura contraditoriamente negar seu peso e o peso de seu trabalho, e alcançar o mundo mágico da valorização imaterial é a antecipação, na forma tectônica, da própria ‘crise enquanto potência’. (ARANTES, P., 2010, p.285) Esta é uma arquitetura inflada - tanto pelo capital quanto pelo poder imaterial. Mas o que será feito dela, dos orçamentos e investimentos milionários na construção de museus que contemplam tecnologias de ponta - desde o modo como são projetados até os acabamentos mais imperceptíveis do canto de alguma escada escondida na parte administrativa?
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Argumenta-se muito sobre o possível fim do “tempo dos excessos”, assim descrito por Gehry, que diz evidente o encerramento desse ciclo após a crise global de 2008. “Acabou-se o desperdício e é preciso enfrentar esse desafio. Não sei se isso é bom ou é ruim, mas é o que há. É preciso poupar energia e dinheiro” (GEHRY, apud ARANTES, P., 2010, p.285). No entanto, ainda assim, é possível observar que mesmo em meio ao contexto de crise econômica, a dimensão espetacular já é uma marca quase irreversível da contemporaneidade. Porém, tanto para a arquitetura contemporânea quanto para os museus, como vimos, nessa então “cultura dos museus”, a inovação de cada um dos diferentes parâmetros que os compõem deixam uma noção infinita de variabilidade, o que deixa em aberta essa discussão por mais um tempo indeterminado, sem previsão de formas, acabamentos, e etc.
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notas
Hal Foster1 Hal Foster leciona arte e arquitetura na Universidade de Princeton e escreve regularmente para as revistas October (na qual também é coeditor), Artforum e The London Review of Books. É autor de O complexo arte-arquitetura (2011), O retorno do real (1996), Design and Crime (2002), Prosthetic Gods (2004), entre outros. Otília Arantes2 Otília Arantes é filósofa pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1961), mestre em Filosofia pela Universidade de São Paulo (1968), doutora em Filosofia - Université de Paris I (1972) e livre docente pela Universidade de São Paulo (1992). Ministrou cursos na PUC de São Paulo, na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e no Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, pelo qual se aposentou em 1993. Presidiu o Centro de Estudos de Arte Contemporânea (1979 a 1992). Tem experiência na área de Filosofia, com ênfase em Estética, atuando principalmente nos seguintes temas: modernidade, pós-modernidade, Mário Pedrosa, crítica de arte no Brasil, arte e política, arquitetura e urbanismo. Anne Cauquelin3 Importante referência no pensamento teórico sobre a arte contemporânea, Anne Cauquelin é filósofa, escritora e artista. Doutora e professora emérita da Universidade de Picardie, na França, publicou, entre outros, Teorias da arte (2005), Arte Contemporânea: uma introdução (2005), A invenção da paisagem (2007) e Frequentar os incorporais (2008), além dos romances Potamor e Les prisons de César. É, ainda, redatora-chefe da revista Revue d´esthétique. Marcel Duchamp4 Marcel Duchamp (1887 –1968) foi um pintor, escultor e poeta francês, cidadão dos Estados Unidos a partir de 1955, e inventor dos ready made. É um dos precursores da arte conceitual e introduziu a ideia de ready made como objeto de arte. [sobre A Fonte] Duchamp foi o responsável pelo conceito de ready made, que é o transporte de um elemento da vida cotidiana, a princípio não reconhecido como artístico, para o campo das artes. A princípio como uma brincadeira entre seus
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amigos, Duchamp passou a incorporar material de uso comum nas suas esculturas. Em vez de trabalhá-los artisticamente, ele simplesmente os considerava prontos e os exibia como obras de arte. Andy Warhol5 Andy Warhol, (1928 - 1987), foi um empresário, pintor e cineasta norte-americano, bem como uma figura maior da Pop Art. Formado em Design pela Universidade Carnegie Mellon, se instalou em Nova York onde começou trabalhando como ilustrador de revistas importantes, como Vogue, Harper’s Bazaar e The New Yorker, além de fazer anúncios publicitários e displays para vitrines de lojas. Foi quando começou, então, uma carreira de sucesso como artista gráfico, ganhando diversos prêmios como diretor de arte do Art Director’s Club e do The American Institute of Graphic Arts. Os anos 1960 marcam uma guinada na sua carreira de artista plástico e passa a se utilizar dos motivos e conceitos da publicidade em suas obras, com o uso de cores fortes e brilhantes e tintas acrílicas. Reinventa a pop art com a reprodução mecânica e seus múltiplos serigráficos são temas do cotidiano e artigos de consumo, como as reproduções das latas de sopas Campbell e a garrafa de Coca-Cola, além de rostos de figuras conhecidas como Marilyn Monroe, Liz Taylor, Michael Jackson, Elvis Presley, Pelé, Che Guevara, Brigitte Bardot e símbolos icônicos da história da arte, como Mona Lisa. Estes temas eram reproduzidos serialmente com variações de cores. Além das serigrafias Warhol também se utilizava de outras técnicas, como a colagem e o uso de materiais descartáveis, não usuais em obras de arte. David McCarthy6 David McCarthy alega em seu livro “Arte Pop” que “… no decorrer de uma década inteira, a arte pop foi um dos movimentos centrais na arte inglesa e norte-americana, firmando vários talentos, afetando diretamente o curso da arte posterior em todo o mundo e reconfigurando nosso entendimento da cultura do século XX…”. Um dos grandes idealizadores e responsáveis por esse movimento foi Andy Warhol. Robert Venturi, Denise Scott Brown e Steven Izenour7 Autores de Aprendendo com Las Vegas (2003) em um tom irônico, fazem críticas
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explícitas à arquitetura moderna, que consideram dogmática e utópica, e procuram aprender com a paisagem existente e a arquitetura comercial, “feia e banal” de Las Vegas. A edição inclui posfácio dos autores, que revisitam a cidade americana 25 anos depois do trabalho. Centre Georges Pompidou8 Em 1970, com base em um programa que vai atender aos objetivos do presidente Georges Pompidou e foi projetado pela equipe de Sébastien Loste, lança o concurso internacional de arquitectura. O júri, presidido por Jean Prouvé, selecionou o projeto proposto por Renzo Piano e Richard Rogers. Localizado em Les Halles (bairro medieval densamente), na cidade de Paris, esta área economicamente e socialmente deprimida, tinha a intenção de revitalizar a competição centro cultural. O Centro Pompidou ocupa pouco menos da metade de seu lote. A parte que sobra é uma enorme praça pública considerada parte do edifício como é feito as atividades do centro Chin-Tao Wu9 Chin-tao Wu é especialista em cultura e arte contemporânea e colaboradora da New Left Review. É pesquisadora-colaboradora na Universidade de Londres e pesquisadora no Instituto de Estudos Europeus e Americanos da Academia Sinica, em Taipei (Taiwan). [Aqui citada como autora do livro Privatização da Cultura,2006] Frederic Jameson10 Fredric Jameson (1934) é um crítico literário e teórico marxista, conhecido por sua análise da cultura contemporânea e da pós-modernidade. Entre seus livros mais importantes estão Pós-Modernidade: a lógica cultural do capitalismo tardio, O Inconsciente político e Marxismo e Forma. Atualmente Jameson trabalha na Duke University, em literatura comparada e romance. Montaner11 Josep Maria Montaner (1954) é arquiteto e catedrático da Escola de Técnica Superior d’Arquitectura de Barcelona (ETSAB-UPC) e diretor do Laboratório de Habitação do Século XXI. Colabora assiduamente nos jornais El País e La Vanguardia,
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e é autor de trinta livros, entre os quais: A modernidade superada; Arquitetura, arte e pensamento no século XX; Arquitetura e crítica; Sistemas arquitetônicos contemporâneos e muitos outro. Tem se destacado nos últimos anos no território da crítica arquitetônica. Seus escritos, veiculados por prestigiosas publicações europeias, não “esquecem” o continente latino-americano, onde desde o início da década de 90 tem realizado um importante trabalho de reflexão Dominique Poulot12 Poulot Dominique é um historiador francês especializado na história do património e museus. É professor universitário na Universidade Paris 1 Panthéon-Sorbonne. [Aqui citado como autor de Museu e Museologia, 2013] Rem Koolhaas13 Remment Lucas Koolhaas, mais conhecido como Rem Koolhaas, (1944) é um arquiteto e teórico da arquitetura neerlandês. É professor de arquitetura e desenho urbano na Universidade Harvard e hoje mundialmente conhecido por ser um dos sócio-fundadores, o mais conhecido, do escritório OMA. “Além de teórica, a razão de ser hoje em dia um dos mais respeitados arquitetos urbanos é por não ver limites entre estéticas, áreas e eras, entendendo que um bom projeto de vida cruza fronteiras próximas entre urbanismo, pintura e até literatura, uma vez que as possibilidades da arte, quando vinculadas ao urbanismo, passam pelo rigor da experimentação. No plano das estruturas, Koolhaas acredita que não haja fronteiras, sendo mais importante a estética final do que os meios que a interligam“ ICOM14 O International Council of Museums (ICOM - Conselho Internacional de Museus) é uma organização não-governamental internacional, sem fins lucrativos, que se dedica a elaborar políticas internacionais para os museus. O ICOM foi criado em 1946, mantém relações formais com a UNESCO e é membro do Conselho Econômico e Social da ONU. Sua sede é junto à UNESCO em Paris, possui mais de 27 000 membros de 150 países, 114 Comitês Nacionais e 30 Comitês Internacionais. Suas principais atividades são: Cooperação e intercâmbio profissional; Difusão de
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conhecimentos e aumento da participação do público em museus; Formação de pessoal; Prática e promoção de ética profissional; Atualização de padrões profissionais; Preservação do patrimônio mundial e combate ao tráfico de bens culturais. IBRAM15 O Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM) é uma autarquia federal, dotada de personalidade jurídica de direito público, com autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério da Cultura. Possui sede e foro em Brasília e conta com uma representação no Rio de Janeiro, podendo estabelecer escritórios ou dependências em outras unidades da federação. Foi criado a partir da Lei n.º 11.906, sancionada pelo ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva em 20 de janeiro de 2009, que desmembrou do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional a Diretoria de Museus e as Unidades Museológicas. O Instituto Brasileiro de Museus é o órgão responsável por desenvolver e aplicar a Política Nacional de Museus, bem como pela melhoria dos serviços do setor, tendo como objetivos, por exemplo, o aumento de visitação e arrecadação dos museus, o fomento de políticas de aquisição e preservação de acervos e a criação de ações integradas entre os museus brasileiros. O instituto também é responsável pela manutenção dos museus e casas históricas federais. James Cuno16 James Cuno Bash (1951) é um historiador de arte americano e curador, que atualmente atua como presidente e CEO da Fundação J. Paul Getty desde 2011. Cuno é o ex-diretor do Harvard Art Museums (1991-2002), o Instituto Courtauld (2003-04), e do Instituto de Arte de Chicago (2004-2011). Recebeu seu A.M. e Ph.D. em História da Arte pela Universidade de Harvard em 1980 e 1985; um mestrado em História da Arte da Universidade de Oregon, em 1978; e um B.A. em História pela Universidade de Willamette em 1973. Ele escreveu sua tese de doutorado sobre Charles Philipon e La Maison Aubert:. a negócios, política e pública de caricatura em Paris, 1820-1840. The Art Newspaper17 The Art Newspaper é um jornal mensal sobre as artes visuais com base em Londres, estabelecidas em 1983 e publicados pela Editora italiano Umberto Alleman-
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di. É publicada em formato de jornal, em vez de revista. Quartier do Marais18 O Marais é um bairro histórico, em Paris, França. Um bairro aristocrático de Paris, abriga muitos edifícios notáveis de importância histórica e arquitetônica. Ele se espalha através de partes do 3º e 4º arrondissements em Paris (na margem direita ou margem direita do Sena). Barômetro19 O barômetro é instrumento científico utilizado em meteorologia para medir a pressão atmosférica. Esta semana, e toda semana, cerca de quarenta mil pessoas vão abrir mão de outras oportunidades e responsabilidades para vir ao museu. Por quê? Nós dizemos que sabemos: por curiosidade; por educação, inspiração, entretenimento, distração, conforto, segurança, senso de comunidade; para ver coisas bonitas, coisas novas e diferentes; ter a sua visão do mundo ampliada, se sentir parte de algo importante - a história longa e rica da existência humana.20 [versão original] This week and every week, about forty thousand people will give up other opportunities and responsibilities to come to the museum. Why? We say we know: out of curiosity; for education, inspiration, entertainment, distraction, comfort, safety, sense of community; to see beautiful things, new and different things; have your outlook broadened, to feel part of something important - the long and rich history of human existence. Pedro Arantes21 É arquiteto e urbanista, doutor pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (2010), com pesquisa sobre as transformações na forma e nos processos produtivos na arquitetura na era da dominância financeira. Tem graduação (1999) e mestrado (2004) pela mesma faculdade. É autor de diversos artigos sobre arquitetura, política, tecnologia e cidades na contemporaneidade, e também do livro Arquitetura Nova (Editora 34, 2002). Desde 1999 é integrante
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do coletivo USINA, entidade sem fins lucrativos que presta assessoria técnica a movimentos populares na área de habitação popular e reforma urbana. É professor do Departamento de História da Arte, da Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (EFLCH) da UNIFESP, Campus de Guarulhos. Fórum Permanente22 Fórum Permanente é uma Associação Cultural que opera como uma plataforma para a ação e mediação cultural, nacional e internacionalmente, em diferentes níveis do sistema de arte contemporânea. Sua estrutura é baseada em uma rede de parcerias com diversos agentes atuantes nos campos das artes e da cultura, instituições de arte e agências culturais estrangeiras. Em operação desde 2003, as principais iniciativas do Fórum Permanente incluem a curadoria de eventos discursivos e dialógicos, a organização de oficinas sobre curadoria e outras formas de mediação crítica, a coordenação de pesquisas, a organização de publicações especializadas, a divulgação de eventos relacionados com arte contemporânea e instituições de arte, streaming on-line das atividades e publicação de relatos críticos sobre essas atividades. O website www.forumpermanente.org é uma interface cultural e, portanto, se constitui, de forma híbrida e simultânea, como uma ágora, um museu-laboratório, uma revista, um arquivo vivo. Desenvolve e hospeda projetos de pesquisa, debates e dossiers, bem como proporciona registros textuais e em vídeo de todas as atividades empreendidas pelo Fórum Permanente e seus parceiros no campo da arte e da cultura. O conteúdo do site é publicado sob uma licença livre, permitindo a sua reprodução para fins não comerciais. Durval de Lara Filho23 Durval de Lara Filho é designer, arquiteto e mestre pela ECA/USP. Baudrillard24 Considerado um dos principais teóricos da pós-modernidade e um dos autores que melhor diagnosticaram o mal-estar contemporâneo, Jean Baudrillard foi um dos fundadores da revista “Utopie”, além de ter publicado mais de 50 livros ao longo de sua vida. Estudou alemão na Sorbonne, tendo traduzido para o francês obras de Karl Marx
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e Bertolt Brecht. Lecionou sociologia na Universidade de Nanterre e sua tese de doutorado, “O sistema dos Objetos”, foi publicada em 1968. A obra era voltada para um estudo semiológico do consumo, assim como seus dois livros seguintes, “A Sociedade de Consumo” (1970) e “Por uma Crítica da Política Econômica do Signo” (1972). Outras de suas obras que merecem destaque são: “À Sombra das Maiorias Silenciosas” (1978), “Simulacros e Simulações” (1981), “América” (1986), “A Troca Impossível” (1999) e “O Lúdico e o Policial” (2000). Christian de Portzamparc25 Christian de Portzamparc (Casablanca, 5 de maio de 1944) é um arquiteto e urbanista francês. Graduou-se na École Nationale des Beaux Arts em Paris, em 1970 e desde então tem sido notado por seus projetos arrojados e seu toque artístico; seus projetos refletem uma sensibilidade com seus ambientes e a cidade é um princípio básico de seus trabalhos. Foi o vencedor do Prémio Pritzker de 1994. É responsável pelo projeto da Cidade das Artes, localizada na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. Álvaro Siza26 Álvaro Joaquim de Melo Siza, internacionalmente conhecido por Siza Vieira (1933), é o mais premiado arquiteto contemporâneo português. Foi o primeiro português a receber o Prémio Pritzker, o ‘nobel’ da arquitetura, que veio confirmar o valor que os portugueses já lhe conheciam. Frank Gehry27 Frank é um arquiteto canadense que ficou mundialmente conhecido por suas obras exuberantes, chamadas também de pós-modernas, principalmente após a construção do projeto, aqui citado, do Guggenheim de Bilbao. Santiago Calatrava28 Santiago Pevsner Calatrava Valls (1951) é um arquiteto e engenheiro espanhol cujo trabalho tem se tornado bastante popular nas últimas décadas. Licenciou-se em arquitetura em 1974, quando mudou-se para Zurique para estudar engenharia civil, licenciando-se em 1979 e doutorando-se em 1981.
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Norman Foster29 Norman Foster (1935) é um renomado arquiteto inglês, conhecido mundialmente pelo seu estilo ousado de desenhar prédios importantes, principalmente na Europa e na Ásia. Hoje, a Foster and Partners é conhecida mundialmente pelo estilo de arquitetura arrojada e por concretizar obras e restaurações dos prédios pertencentes aos órgãos do governo de diferentes países, utilizando sistemas inteligentes de projeto como, por exemplo, computadores. Com 80 anos de idade, Norman Foster já declarou que não pensa em se aposentar, sendo que ele representa 85% das ações da Foster and Partners com uma fortuna avaliada entre 300 e 500 milhões de libras esterlinas. Grandeza30 Conceito elabora por Rem Koolhas em seu ensaio crítico Bigness (ou em português traduzido por O problema da grandeza) Turismo cultural31 Turismo cultural é a atividade econômica relacionada com eventos e viagens organizadas e direcionadas para o conhecimento e lazer em elementos culturais, tais como: monumentos, complexos arquitetônicos ou símbolos de natureza histórica, além de eventos artísticos/culturais/religiosos, educativos, informativos ou de natureza acadêmica Starchitect32 É o termo inventado anonimamente para designar um grupo já conhecido de arquitetos-estrelas, que operam dentro de um círculo mundial bastante fechado nos próprios e se colocando por vezes como verdadeiras celebridades. Jean Galard33 Nascido em Aubiers (França - 1937), Jean Galard foi professor de Estética no Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (1968-71), diretor de diversos Centros Culturais Franceses em cidades como Casablanca (Marrocos), Niamey (Nigéria), Istambul (Turquia), Cidade do México e Amsterdã (Holanda), e criador e chefe do Serviço Cultural do Museu do Louvre (1987-2002). Publicou, no Brasil, A beleza do Gesto (1997) pela Edusp.
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Este livro foi impresso em Horley, em papel Polén 80g/m2, em dezembro de 2015, na gráfica Flávio Mota, em São Paulo.
bilhete entrada Centro Georges Pompidou [Centre Georges Pompidou ou “Beaubourg”, Paris, França]