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NEGRITUDE FEMININA
_ Rosane Costa
ENSAIO FOTOGRÁFICO É REFLEXÃO SOBRE NEGRITUDE NA ESCOLA
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Projeto em Escola Estadual de Dourados contribuiu para valorizar o empoderamento feminino e negro dentro das escolas.
“Sua pele é marrom, e os seus traços grossos, mas não é por isso que você não tem a sua beleza. Ser uma mulher negra é ter uma magia maravilhosa. Votre peau est brune et vos traits épais, mais ce n'est pas pour cela que vous n'avez pas votre beauté. Être une femme noire, c'est avoir
une magie merveilleuse”, Dieunika, do 8º ano A do Ensino Fundamental.
AEscola Floriano Viegas Machado, no município de Dourados, é onde Lidiane Cristina Lopes Garcia de Souza passou boa parte de sua vida. Foi lá que cursou o ensino médio, estagiou durante os quatro anos de graduação, feita inclusive com o Vale Universidade. Por fim, quando fez o processo seletivo para a docência, foi a primeira escola que lecionou e que hoje ministra as disciplinas de Geografia e Pesquisa e Autoria.
“Com essa oportunidade de retornar professora para uma escola onde já fui aluna e estagiária, voltei mais madura e com um pouco mais de conhecimento. Emicida em uma de suas músicas diz: “Nunca volte para sua quebrada de mão e mente vazia”. Então, eu já voltei pensando que precisava fazer alguma coisa”, explica. Assim, nasceu o projeto intitulado “Negritude Feminina entre os muros da escola”. Lidiane, que também é uma mulher negra, quis elaborar algo que trouxesse a reflexão da negritude para
dentro da escola e para seus alunos. “Eu comecei a alisar o meu cabelo com 15 anos quando consegui meu primeiro salário. Foi só na fase adulta que comecei a
passar pelo processo de transição, e a gostar dos meus lábios grossos. Antes disso, sofria bullying no período escolar e não conseguia olhar no espelho e ver os meus traços bonitos, não via ninguém naquela época com cabelo cacheado. Então, quis criar esse projeto dentro da escola em que eu estudei, como oportunidade de transformar a história de meninas como eu”,
expressa.
_ Rosane Costa Durante alguns dias, a professora convidou alunas negras, de todas as idades e tonalidades de pele para participar de um ensaio fotográfico que tinha como objetivo valorizar esse protagonismo negro e trazer essa reflexão social para a escola. As
meninas estavam livres para vestir como se sentissem melhor. Em um dia selecionado para isso, o grupo se reuniu e uma outra professora, Rosane Costa, que também é fotógrafa, fez as fotografias. “Eu conheci meninas muito empoderadas, com muito
conhecimento racial, maturidade e uma consciência racial maravilhosa. Olhava para elas e para os discursos delas e pensava que poderia ter vivido outro momento, se eu tivesse essas meninas como minhas colegas de turma na minha adolescência. Me inspiro muito nas minhas alunas”, exalta. A experiência trouxe um momento de reflexão e autoconhecimento, mas também de troca de ideias entre as próprias meninas. “Foi um momento de acolhimento. As meninas puderam se conhecer melhor. Enquanto uma tirava fotos, nós lanchamos. As
meninas compartilhavam suas histórias, como por exemplo de
que lado da família vinha o cabelo, o tom da pele, sempre elogiando umas às outras. E as outras meninas que não quiseram participar, também foram acolhidas. Nos tornamos um grupo dentro da escola, o projeto ficou marcado para todos. A negritude na escola se uniu”, ressalta.
“Sou negra na pele, na alma, na voz e na
“É mostrar a beleza negra de cada uma. A beleza do cabelo, da pele, dos detalhes, para mostrar a todos que a beleza negra deve ser mostrada, mostrar o poder que tem nessas adolescentes, como elas se
sentem bem do jeito que elas são”, Lara, 7º ano A do Ensino Fundamental II.
Sobre ter escolhido um ensaio fotográfico para essa ocasião, a
professora explicou como um registro pode contribuir com a autoestima. “A maioria das pessoas que tem uma relação um pouco conturbada consigo mesmo, com seus traços, também não consegue ficar muito à vontade na frente de câmeras. Então, achei muito importante isso delas, a partir do registro, se enxergarem como bonitas”, detalha. Ainda depois do ensaio, as meninas expressaram seus sentimentos a respeito do assunto, além de debaterem mais questões raciais. “Percebi uma maturidade muito grande dessas meninas em falar sobre questões raciais. Falamos sobre relacionamentos, sobre a solidão da mulher negra, muitas vieram com um discurso de aceitação e empoderamento. Sempre elogiando o volume, a curvatura do cabelo da outra, tudo isso ali naquele grupo de meninas de diferentes idades e até nacionalidades diferentes, como a haitiana Dieunika. Às vezes elas ainda não sabem expressar de maneira formal, como se identificam como pretas ou pardas
conforme o IBGE, mas elas têm o conhecimento”, exalta.
_ Rosane Costa