Fora de Rede

Page 1

QUA

SALVADOR 16/5/2012

SEG PERSONA TER POP HOJE VISUAIS QUI CENA SEX FIM DE SEMANA SAB LETRAS DOM TELEVISÃO atarde.com.br/caderno2mais

MARIANA PAIVA

Eram sete da manhã quando o despertador tocou. Levantei para cumprir meu ritual de todos os dias: sentei em frente ao computador para ver os e-mails. Foi quando lembrei que não podia. Vinte quatro horas sem internet. Este foi o combinado: eu, ultraconectada à rede mundial de computadores, passaria um dia inteiro longe de tudo o que a internet poderia me oferecer. E em casa, o que certamente aumentaria bastante a tentação. A ideia foi inspirada no projeto do jornalista de tecnologia Paul Miller, que se lançou ao desafio de viver sem internet durante um ano inteiro. Ex-editor do portal Engadget e editor do The Verge, ele vai ter que ir pessoalmente à redação entregar textos, fotos e vídeos sobre a experiência. Minha primeira providência

Gentil

2

EDITORA-COORDENADORA: SIMONE RIBEIRO / DOISMAIS@GRUPOATARDE.COM.BR

TURISMO CULTURAL SEMANA NACIONAL DE MUSEUS REÚNE 150 INSTITUIÇÕES PAULISTAS. NO ACERVO, PEÇAS DO MUSEU DE ARTE SACRA (FOTO) 5

MÚSICA EDUARDO DUSSEK FAZ TEMPORADA DE HOJE A DOMINGO, NA CAIXA CULTURAL 3 Rubens Chiri / Divulgação

DIGITAL Às vésperas do Dia Mundial da Internet, repórter superconectada narra a experiência de passar um dia inteiro sem utilizar serviços da web. Especialistas falam sobre os cuidados com a privacidade e o sedentarismo

FORA DA REDE foi desativar a rede de dados do celular. Nenhuma notificação de Facebook, Skype ou e-mail chegaria até mim. De início até achei a novidade interessante. Quando acabei de arrumar a cama, entretanto, o tempo ficou como que sobrando. Aproveitei para responder a uma carta. Instantes depois, com o envelope na mão, constatei a impossibilidade de finalizar a tarefa: o endereço do destinatário se encontrava em meu e-mail, e eu simplesmente não podia aces-

sar. Deixei para depois. O telefone tocou e eu quase rendi graças a Deus porque o desafio não incluía telefone também, só internet. Era Joana, uma amiga, questionando minha ausência na internet. “Aconteceu alguma coisa?”, perguntou, alarmada. Brinquei e disse que estava na montanha que nem o homem superior de Nietszche em Assim Falou Zaratustra. Com a diferença evidente de que eu sairia da experiência de isolamento bastante estressada.

Descobri outras dificuldades práticas: a de não ter como fazer uma transferência bancária em casa, e a de escrever uma matéria sem procurar as fontes na rede mundial de computadores. O jeito era ligar para os conhecidos e perguntar a um por um quem sabia de pessoas desconectadas da internet. Pelo visto, a conexão é quase total: mesmo os mais ausentes das redes sociais tinham se rendido ao e-mail, nem que por exigência do mercado de trabalho.

Auxiliar de serviços gerais num escritório de advocacia, Maria Aparecida Bispo, 45 anos, conta que tem internet em casa, mas que não faz questão alguma. “Não faço uso nunca”, ela revela, categórica. Nada de e-mail, Facebook, Twitter. “Meu filho tem, mas eu não. Nunca me liguei nessas coisas, não fazem minha cabeça”. Já para o servidor público Lucas Vieira, 27, a razão da distância da internet é outra. “Tenho e-mail, mas evito as redes

sociais porque estou concentrado em estudar para concursos. É difícil estudar, trabalhar e ainda manter ativa uma rede social. Chega uma hora em que você termina sacrificando uma das coisas”, acredita ele. Lucas conta que assim que passar num concurso público vai ter Facebook. “As pessoas não me cobram tanto porque sabem que é por um objetivo a médio prazo, e eu já me acostumei. Inevitavelmente, vou ter de entrar numa rede social depois”.

Brasil está entre os países que mais usam internet no mundo THUANNE SILVA

Vivemos em um país que está entre os cinco mais conectados do mundo. Segundo pesquisas do Ibope NetRatings, divulgadas no final do ano passado, 75,9 milhões, de 194,9 milhões de brasileiros, são internautas. O número é significativo. O Brasil também têm presença forte nas redes sociais como o Facebook, segundo lugar em número de usuários, atrás dos EUA, segundo estatísticas do Socialbakers. Amanhã, dia 17 de maio, será comemorado o Dia Mundial da Internet, data instituída pela ONU em 2007. Entretanto, fica o questionamento: temos o que comemorar?

Reflexão

Talvez a resposta seja unânime entre os usuários. “Hoje o que está em jogo é uma forma de construção da imagem própria

“As pessoas deixam rastros. Temos que dar uma atenção ao anonimato e à privacidade” ANDRÉ LEMOS, professor da Ufba

muito forte, uma atualização constante dos seus percursos no dia a dia. Acho que isso é o que mais atrai as pessoas e explica o fenômeno das redes sociais”, conta André Lemos, professor doutor da Faculdade de Comunicação da Ufba. Para Nelson Pretto, professor e doutor da Faculdade de Educação da Ufba, a web tem dois aspectos positivos fundamentais: ela possibilita rapidez de reação dos usuários e a capacidade de produção de informações. Isso muda a relação do cidadão com a informação. “O poder do cidadão é fortalecido no sentido de que ele também pode produzir culturas e conhecimentos”, argumenta. Entretanto, Lemos destaca o cuidado que se deve ter com a privacidade. “As pessoas devem usar, mas com atenção, sabendo que tudo que elas fazem na web está ali, que a internet não esquece”, ressalva. Elídio Almeida, psicólogo e professor, pondera sobre a necessidade de estabelecer limites e conciliar o mundo online com o offline, a fim de evitar futuras patologias causadas pelo excesso, como sedentarismo e isolamento. “É preciso pensar sempre sobre as consequências do uso excessivo da internet no mundo offline, mas não ignorar que ela está intensamente presente em nossas vidas na atualidade”.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.