CNT T R A N S P O R T E
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CALAMIDADE DINHEIRO DO PAC PARA INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTE FICA APENAS NA PROMESSA
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MODAL AEROVIÁRIO
O país sofre com a falta de planejamento nos aeroportos e sem o entendimento dos diversos setores que controlam a aviação no país
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CUSTO BRASIL
Desatenção com o setor compromete alta do PIB e expansão da economia PÁGINA
MODAL FERROVIÁRIO As passagens de nível são um problema grave para as composições nas cidades
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MODAL AQUAVIÁRIO
Falta de investimento em hidrovias e de regulamentação para a cabotagem prejudicam o transporte de cargas
EDIÇÃO INFORMATIVA DO SISTEMA CNT CONSELHO EDITORIAL Almerindo Camilo Aristides França Neto Bernardino Rios Pim Etevaldo Dias Virgílio Coelho REDAÇÃO
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Os conceitos emitidos nos artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da CNT Transporte Atual
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ANO XIV | EDIÇÃO 153 ENTREVISTAS Flávio Benatti, presidente da NTC&Logística, critica a falta de planejamento da administração pública Página 8
Tributarista Raul Velloso avalia que o governo federal gasta pouco e mal os recursos financeiros Página 24
DESPOLUIR
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PROCREMA
Governo lança programa para recuperar rodovias, mas exemplos anteriores mostram que iniciativas semelhantes nunca deram certo
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E MAIS Humor
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Alexandre Garcia
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Ensaio fotográfico
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Radiografia da malha
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Roubo de carga
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História
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Seminário CNT
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Sest/Senat
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Conclusão
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Opinião
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Cartas
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CAPA PEDRO SILVEIRA/O TEMPO
Rodovias com condições inadequadas de tráfego levam os motoristas a realizar procedimentos que aumentam a poluição atmosférica e comprometem a qualidade de vida Página 28
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Em entrevista à Transporte Atual, o presidente da NTC&Logística fala sobre a em infra-estrutura e critica a demora das obras do Programa de Acelera
ENTREVISTA
FLÁVIO BENATTI
"O BRASIL PAROU NO TE POR
egundo o Plano CNT de Logística, o Brasil não precisa apenas de mais de R$ 223 bilhões em investimentos em infra-estrutura, precisa também de otimismo. Pelo menos é o que diz Flávio Benatti, presidente da NTC&Logística (Associação Nacional do Transporte de Carga e Logística). Em entrevista à revista CNT Transporte Atual, o dirigente afirma que falta planejamento e um olhar mais detalhado para o futuro. “Falta responsabilidade dos administradores públicos para com a sociedade”, disse Benatti. O atraso das obras do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) também ganhou críticas do executivo. “O Brasil não poderia ficar só no discurso como está hoje, ele de-
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RICARDO BALLARINE
veria se transformar num canteiro de obras.” A conversa aconteceu na sede da NTC em São Paulo. Do seu escritório a vista cai sobre a Dutra, a rodovia que liga a capital paulista ao Rio de Janeiro. Nesse trecho, na divisa com Guarulhos, o tráfego de caminhões é intenso, pois, além do movimento de veículos das cidades vizinhas, a Dutra também é o canal de ligação da Fernão Dias. Os veículos pesados que vêm dessas duas rodovias e querem ir para Santos precisam passar pela janela da NTC. O trânsito que gera uma longa fila de caminhões é duramente criticado por Benatti. A falta de estrutura para criar uma logística de fato é a causa desse pequeno caos urbano. “Sem um plano logístico
adequado, dificilmente nós vamos ter no Brasil uma intermodalidade”. Benatti falou também sobre a Copa do Mundo de 2014 e derrubou o mito do rodoviarismo brasileiro. “Estamos em último lugar em um estudo com 20 economias do mundo em matéria de rodoviarismo”. Leia a seguir a entrevista com o presidente da NTC.
porque não há infra-estrutura. É preciso construir uma oferta equilibrada dos modais. Hoje, só existe logística em alguns nichos, por exemplo, a Vale. Eu costumo dizer que a Vale não exporta minério, ela exporta logística. O minério é de baixo valor agregado e, se não tiver uma logística perfeita, não vai conseguir chegar ao mercado internacional.
A CNT preparou no ano passado o Plano de Logística que prevê mais de 500 obras e investimentos de R$ 223,8 bilhões. Qual a importância de um projeto desse porte? É fundamental para o país. Sem um plano logístico adequado, dificilmente nós vamos ter no Brasil uma intermodalidade. Tudo o que se fala hoje de intermodalidade é poesia
Nesse cenário, qual a importância do Plano CNT de Logística? A CNT tem tido papel fundamental nesse processo, é a grande responsável por documentos que mostram a realidade do transporte. As pesquisas dos modais mostram uma radiografia para nossas autoridades que provocam debate, como também o Plano
FOTOS MARCELLO LOBO
falta de investimento ção do Crescimento
MPO" de Logística. Por isso, nós somos otimistas. Sinto-me orgulhoso de fazer parte desse processo que mostra documentos ao governo para que ele se baseie e saiba o que deve ser feito. O Brasil é rico e essa situação não vai perdurar. Temos muitas possibilidades. Falta muito o que fazer e vamos trazer investimentos, mas com seriedade. E de onde tirar o dinheiro? Os R$ 223,8 bilhões necessários não virão apenas dos cofres públicos. Precisamos da iniciativa privada e, para isso, temos que ter credibilidade. Ano após ano, a Pesquisa Rodoviária CNT aponta que mais de 70% das estradas apresentam problemas. O que
o setor espera que possa mudar, ainda que minimamente, neste ano e em 2009? A Pesquisa Rodoviária já passou por oito anos de governo Fernando Henrique Cardoso e cinco anos de governo Lula. Até 1988, o governo federal mantinha as rodovias, inclusive com a construção de algumas novas estradas. Houve então uma estagnação com o término do Fundo Rodoviário. Sem investimentos, ano após ano ocorreu essa deteriorização que vemos hoje. Em 2002, tentou-se reverter esse quadro com a Cide (Con-
tribuição de Intervenção sobre Domínio Econômico), mas isso não ocorreu. Nós chegamos a essa situação e existe uma tendência de agravamento caso não sejam feitos investimento pesadíssimos. O que fazer para mudar esse quadro? O que precisa ser feito é o PAC ter seus projetos aprovados. Nós esperamos que neste ano haja uma aceleração nesse processo. Eu não acredito, por exemplo, que a Pesquisa Rodoviária 2008 deva apresentar grandes resultados po-
sitivos, mas, dando continuando a esse processo, nós poderemos ter em um futuro próximo uma melhoria. Quais as necessidades da malha rodoviária? Hoje não é suficiente apenas recuperar os 196 mil quilômetros de malha, é preciso também construir novas rodovias. Além disso, precisamos de investimento nos centros urbanos. Uma cidade como São Paulo, por exemplo, pára às vezes e eu não sei o que é pior, rodar onde não tem asfalto ou ficar parado no trânsito.
O setor aposta no PAC? Não é uma questão de apostar no PAC. Pelo menos o programa é alguma coisa que existe, que se discute. É preciso resolver as questões de licenças ambientais também. Sabemos que os recursos existem. É pelo menos uma luz no fim do túnel. O dinheiro existe, mas não é utilizado... Eu vejo com muita preocupação ter recursos de mais de R$ 10 bilhões e apenas 50% serem aplicados efetivamente. O Brasil não poderia ficar só no discurso como está hoje, ele deveria se transformar em um canteiro de obras. Temos visto muitos anúncios, mas é uma questão que precisa sair do papel, ter uma gestão mais ativa, mais vontade de fazer acontecer. Caso contrário, iremos ficar nos próximos anos nessa mesma situação, com recursos que não foram alocados enquanto o país vive com tanta necessidade de investimento. O PAC também prevê projetos para os centros urbanos que ainda estão no papel. Qual a avaliação do transportador? O setor vê com preocupa-
ção. Nós precisávamos que houvesse uma velocidade maior de aplicabilidade nas grandes metrópoles, como o metrô. O Ministério das Cidades precisaria se envolver nessa questão, buscar os recursos para a melhoria da mobilidade urbana nos grandes centros. Hoje, uma megalópole como São Paulo hoje sofre constantemente com congestionamentos diários acima de 150 km e, para resolver esse problema, é preciso haver investimento. Tudo isso é melhoria de produtividade e de qualidade de vida para o brasileiro.
Recentemente, foram anunciados projetos de construção do trem até o aeroporto de Cumbica e de expansão do metrô até Congonhas, obras que devem desafogar o trânsito e redistribuir o tráfego. Por que se demorou tanto para avançar nesses planos? Eu arriscaria dizer que essas obras de infra-estrutura do transporte são tão importantes quanto as de saneamento básico. O paulistano atualmente dever ter uma das piores qualidades de vida do mundo. Houve um desleixo muito grande das autoridades em não projetar o futuro.
Por que a demora em realizar projetos importantes? O que falta é a responsabilidade de administradores públicos para com a sociedade. Em países como os Estados Unidos as obras são feitas pensando no futuro. Em São Paulo são mais de 24 mil veículos que entram na cidade todo mês, o que nos faz questionar onde ficaria todo esse volume de trafego. Há a nescessidade de um planejamento futuro, mas é muito melhor você brigar pelas migalhas e se manter no poder do que ter o espírito público para fazer o investimento para o
"O Brasil não se interiorizou, somos alguma coisa só no litoral. Falta desenvolver tudo" bem-estar da sociedade atual e ções de arcar com uma Copa futura. O Brasil por questões do Mundo em 2014? menores parou no tempo. Sem ironia, isso dá voto. Política atrapalha? Para a Copa, o quer for necesA política atrapalha muito. sário vai acontecer, como Porque o espírito do homem aconteceu no Pan-Americano. público brasileiro tem nos le- Porque isso dá vitrine, o que vado a afirmar que, na reali- não dá é caminhão se acabandade, o poder é mais impor- do nas estradas e sendo taxatante do que o seu semelhan- do de vilão nos grandes cente. O espírito público está mui- tros. to arranhado. São muitas hisEm várias cidades estão tórias de corrupção e lamentavelmente tudo isso se refle- sendo tomadas medidas para restringir a circulação te na prática. de caminhões nos centros... Com esse nível de invesO prefeito de São Paulo, timento, o Brasil terá condi- por exemplo, resolveu dizer
que o caminhão é o grande vilão da cidade e a mídia comprou essa idéia. Você vê caminhões na (avenida) 23 de Maio? Na Rebouças? O prefeito tem que investir para o caminhão ter uma circulação melhor dentro do município, proibir o trafego no centro da cidade, acabar com a zona azul e os estacionamentos no centro e regulamentar as caçambas de obras. Mas isso dá trabalho, é mais fácil culpar o caminhão. Há também o projeto de ampliar o rodízio para os caminhões em São Paulo. Grande absurdo, pois 30% do comércio exterior brasileiro passa por dentro da cidade de São Paulo. Dados da revista “Veja” indicam que só 5% do trânsito é causado por caminhões. O que é preciso fazer é limitar o trafego na cidade. Em Nova York, o valor de uma vaga de estacionamento no centro é para quem tem poder aquisitivo alto, mas você não deixa de ver caminhões abastecendo lojas. Eles privilegiam a questão econômica. Já aqui, a vida de quem está a passeio é facilitada, mas deixar o carro em casa não é possível pela ausência do transporte coletivo.
É possível falar em apagão? De certa forma o apagão já existe. Os produtos de algumas regiões não são competitivos pela falta de condições de se fazer o transporte. Seriamos muito mais ricos em PIB se tivéssemos infra-estrutura. Com investimentos, esses produtos seriam imbatíveis, pois o custo de produção é menor. O fato de o país ter priorizado as rodovias não deveria ter gerado uma preocupação em mantê-las em situação adequada? É um mito essa prioridade. Não somos rodoviaristas. Estamos em último lugar em um estudo com 20 economias do mundo em matéria de rodoviarismo, segundo o livro lançado por Geraldo Vianna (expresidente da NTC), “O Mito do Rodoviarismo Brasileiro”. O Brasil é rodoviarista apenas dentro do Estado de São Paulo, pois por aqui passam 60% de tudo que se movimenta no país. Para nossas necessidades não temos nada, embora tenhamos mais rodovias que ferrovias. O Brasil não se inte rio ri zou, so mos al gu ma coisa só na faixa litorânea. Falta desenvolver tudo. ●
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"Vou falar e escrever à exaustão: é preciso que viajemos para fora do Brasil para que conheçamos rodovias verdadeiras" ALEXANDRE GARCIA
Cruzes na estrada
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rasília (Alô) – Recentemente, governo e oposição acordaram em amolecer a medida provisória que proibia a venda de bebida alcoólica às margens das estradas federais. A hipocrisia vigente usa o horroroso verbo “flexibilizar” para não admitir amolecimento ou recuo. Assim, flexibiliza-se a venda de bebida, como se flexibiliza a fidelidade partidária e se flexibilizam consciências nas conclusões de CPIs no Congresso. Enquanto se flexibiliza tudo, flexibiliza-se a vida nas ruas das cidades e nas rodovias brasileiras. A propósito, chamar certas picadas precariamente asfaltadas de “rodovias” também faz parte da hipocrisia da flexibilização. O governo promete rigor para o álcool ao volante. Com 40 anos de jornalismo, sei que esse “rigor” acaba flexibilizado. É apenas um rigor oral, como se fosse por força de expressão. Tem a mesma conseqüência dos cacoetes “com certeza” e “sem dúvida” que algumas pessoas usam a toda hora, embora não tenham certeza de nada e duvidem de tudo. Como assim, rigor para o álcool na estrada, se não há rigor sequer nas cidades, onde a fiscalização é mais fácil? Cada policial levaria no cinto um bafômetro, como um policial americano? Pode o bafômetro ser recusado pela nossa legislação burocrática que favorece o infrator? E se não for recusado pelo beberrão, mais adiante não pode o advogado contestar o resultado, pondo em dúvida a precisão do instrumento? Ah, sim, e se o motorista bêbado encontrou um policial com tempo para levá-lo ao IML, quanto tempo vai levar o processo? Ah, não vai mais para o Juizado Especial de Cestas Básicas? Então, vai demorar...
Esse é só um dos fatores que enterram vidas das cruzes cravadas às margens do asfalto brasileiro – o álcool e seu companheiro “rebite”. São causas que estão na cabine: cansaço, sono, distração, alta velocidade, falta de cinto... Fora dela está a falta de manutenção com as desculpas esfarrapadas de sempre: pneu careca faltou freio; quebrou a barra de direção. Ah, desde pequenino eu ouço isso e ainda não resolveram? E há outras causas que estão do lado de fora do veículo: embaixo dele, as estradas, e nos ângulos mortos de visão, os assaltos. Vou falar e escrever à exaustão: é preciso que viajemos para fora do Brasil para que conheçamos rodovias verdadeiras. Aqui, há umas poucas. A maioria, no entanto, perde para estradinhas de fazenda americana. Uma vergonha, sim, agüentarmos isso, com o tamanho dos impostos que pagamos. A verdadeira pista não sacode, não trepida, não fica alagada com chuva. Pelo menos é assim na pátria-mãe Portugal (cito esse exemplo para que não me acusem da arrogância de compará-la com uma estrada italiana, ou francesa – “autobahn” como modelo, nem pensar!). Podemos nos conformar com estradas lusas – e lisas, mil perdões! Por isso, nossas estradas estão aí, sinalizadas por cruzes, de causas variadas: acidentes, atropelamentos, assassinatos em assaltos. A Constituição diz que a segurança é direito e responsabilidade de todos. Pelo jeito, é só força de expressão. Assim como o direito de ir-evir. Flexibilizado entre mal-traçadas curvas, buracos e assaltantes.
ENSAIO
UM OLHAR PARA O ABS Pelo Brasil inteiro, cenas da falta de respeito ao cidad達o, ao trabalhador e a quem transporta
URDO a economia do país FOTOS ODAIR LEAL
BR–364 No meio da selva, entre Rio Branco e Tarauacá (AC), carros e caminhões (alto à direita) tentam driblar a lama e o descaso do governo
AMIGOS DE NOVA MONTE VERDE/DIVULGAÇÃO
BR–163 Aqui e ao lado, dificuldades e tragédia no percurso da rodovia ODAIR LEAL
BR–364 As obras não dão conta no trecho acreano da estrada CNT/DIVULGAÇÃO
BA–030 No sertão, os buracos são tomados pela areia
AMIGOS DE NOVA MONTE VERDE/DIVULGAÇÃO
AMIGOS DE NOVA MONTE VERDE/DIVULGAÇÃO
MATO GROSSO Só lama na BR–208 AMIGOS DE NOVA MONTE VERDE/DIVULGAÇÃO
BR–160 Barro puro em Mato Grosso (esta e abaixo) AMIGOS DE NOVA MONTE VERDE/DIVULGAÇÃO
BR–163 Estado lastimável em Cuiabá (MT)
AMIGOS DE NOVA MONTE VERDE/DIVULGAÇÃO
ODAIR LEAL
BR–364 Dois trechos de Rio Branco a Tarauacá (AC)
JAIR ARÚJO
BR–319 No Amazonas, difícil até para barco
DEISI REZENDE /AJB/FUTURA PRESS
FILAS Caos aéreo lota aeroportos
AGÊNCIA O GLOBO
PREFEITURA DE CUBATÃO/DIVULGAÇÃO
SEM VERBA
TRILHOS
Hidrovias sofrem com a falta de investimentos
Linha férrea em Cubatão (SP)
MARCELLO LOBO
MARCELLO LOBO
PERIGO
INVASÃO
Avião pousa em Congonhas em meio a prédios
Em Santos, o trilho se mistura ao trânsito
RADIOGRAFIA
CHEGA DE
OBA-OBA GOVERNO FAZ ALARDE DO PAC, MAS RECURSOS PARA INVESTIMENTOS NAS RODOVIAS ESTテグ SENDO LIBERADOS A CONTA-GOTAS
CNT/DIVULGAÇÃO
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POR
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EDSON CRUZ
ista estreita, mau planejamento geométrico da via e sinalização deficiente foram as causas apontadas pela Polícia Rodoviária Federal para a tragédia que resultou na morte de 27 pessoas em um duplo acidente em Santa Catarina. A tragédia na BR–282, em Descanso (a 680 km de Florianópolis), em outubro do ano passado, deixou outros 90 feridos. A Pesquisa Rodoviária CNT 2007 aponta que problemas semelhantes acontecem em 64.699 km (73,9%) dos 87.592 km de rodovias avaliadas. O estudo englobou toda a malha rodoviária federal pavimentada e trechos de rodovias estaduais e sob concessão. Os pesquisadores concluíram ainda que 54,5% dos trechos possuem pavimentos em estado regular, ruim ou péssimo. Outros 65,4% apresentam sinalizações com problemas, como falta de placas de limite de velocidade ou que se encontram, total ou parcialmente, encobertas por mato. Nos últimos dois anos, o Brasil investiu cerca de US$ 4 bilhões/ano para ampliar e recuperar as rodovias (veja quadro). De acordo com uma reportagem do jornal “Folha de S. Paulo”, com um padrão de transporte parecido, a China está gastando US$ 70 bilhões (orçamento previsto entre 2006 e 2008) para revitalizar a sua malha rodoviária. No Brasil, mais recursos poderiam ser injetados em rodovias pelo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), considerado por muitos especialistas como o grande motor do crescimento da economia brasileira para os próximos anos. Só que os recursos estão sendo disponibilizados em conta-gotas pelo governo federal. Segundo o Ministério dos Transportes, a Lei Orçamentária prevê investimentos de R$ 8,2 bilhões para 2008. A mesma lei estabelece R$ 7,3 bilhões de recursos em rodovias contempladas pelo PAC para este ano. Ain-
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ENTREVISTA: RAUL VELLOSO
“Faltam capacidade de planejamento e de execução do governo” tributarista e ex-secretário de assuntos econômicos da Secretaria de Planejamento da Presidência da República no governo Sarney, Raul Velloso, também diretor da ARD Consultores Associados e PhD em economia pela Universidade de Yale, nos EUA, diz que o Brasil investe pouco e executa mal os planos para melhoria e conservação de rodovias. Confira os principais trechos da entrevista que o es pe cia lis ta em fi nan ças púbicas concedeu para a revista Transporte Atual.
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TRANSPORTE ATUAL Por que os recursos da Cide não são destinados à manutenção de rodovias como prevê a Constituição? Raul Velloso - Poucos motoristas sabem que a Cide está vinculada à manutenção de rodovias. Além disso, deixar de investir em rodovias causa o mesmo impacto do que o atraso da folha de pagamento de aposentados, mas menos comoção social. Se houvesse uma reação dos segmentos afetados talvez o investimento fosse maior. No Brasil, não se vê greve de caminhoneiros por causa das condições das rodovias. Então, como não existe apelo, o governo prefere deixar o
dinheiro parado no caixa do Tesouro ou destiná-lo para outros setores. Isso é possível através de mecanismos criados como a DRU. Por que o Brasil investe tão pouco em rodovias? Não é prioridade no orçamento. Hoje, o grosso dos investimentos se encontra em pessoal, seguridade, assistência social e saúde. Os outros setores disputam as sobras. É claro que o investimento em transporte já foi maior. Qualquer comparação com outras épocas é difícil porque envolve muitos fatores. A moeda do Brasil mudou várias vezes, os Estados assumiram parte de trechos rodoviários e desone ra ram a União, as sim como diversas concessões fo ram rea li za das. Mui tos trechos rodoviários estão sob o domínio da iniciativa privada. Levando-se isso em conta, dá para dizer que, nos anos 70, o governo investia 2% do PIB em transportes, e a partir dos anos 90, a média passou a ser 0,2%. No ano passado, houve uma tênue recuperação e chegou a 0,22%. Acho até que a CNT, com as constantes pesquisas sobre a qualidade das rodovias, contribuiu para que esse orçamen to fos se au men ta do, mas ainda é pouco.
O ritmo da destinação dos recursos do PAC, que poderiam ser usados nas rodovias, ainda é lento. Por quê? Há uma evidente falta de capacidade de planejamento e de execução no governo. Nos últimos dez anos, o Brasil parou e investiu pouco em vários setores. Os gestores perderam um pouco a habilidade de administração. Sobraram recursos em caixa. Muito mais do que foi previsto no orçamento. A radiografia apresentada pela Pesquisa Rodoviária CNT 2007 mostra que a maior parte da malha rodoviária brasileira se encontra em péssimo, ruim ou em regular estado de conservação. Como o país depende excessivamente do transporte rodoviário, não seria o caso de incrementar os investimentos? Pesquisas como a da CNT mostram que há dois caminhos para o país equacionar o problema das rodovias: ou se continua como está ou o elimina de vez. Não dá para continuar investindo tão pouco. O valor atual mal dá para manter anualmente o nível das rodovias. O governo não tem como passar mais a responsabilidade para os Estados, porque eles não têm como e não querem assumir
esse ônus. A eliminação do problema viria com a correta destinação dos recursos do orçamento e com a eficiência na execução. Se o governo investisse maciçamente em obras nas rodovias, seria possível mensurar os ganhos? Com a melhoria das rodovias e extensão da malha, a rapidez do fluxo de veículos geraria aumento de cargas transportadas e iria baratear os custos dos fretes, manutenção dos veículos e os produtos para os consumidores finais. Se os recursos fossem realmente redirecionados para as rodovias, a economia brasileira cresceria espantosamente. O Brasil será a sede da Copa do Mundo de futebol em 2014. O senhor acredita que isso possa ajudar na revitalização das rodovias? Sin ce ra men te, não. Em termos de transportes, acredito na revitalização dos aeroportos, na otimização e recuperação de trechos viários dentro dos limites das cidades-sedes. Isso é mais visível aos olhos do mundo. As rodovias não influenciam tanto. Corre-se o risco até de os investimentos antes programados para as rodovias serem desviados para essas outras obras.
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ADRIANO LIMA/FUTURA PRESS
CENA COMUM Caminhão acidentado após passar por buracos em rodovia é fato corriqueiro
da segundo o ministério, das obras relacionadas pelo PAC, a pasta já realizou pagamento da ordem de R$ 5,09 bilhões desde janeiro de 2007, quando lançado o programa, em dados atualizados até março de 2008. Entretanto, números divulgados em janeiro deste ano, tendo como fonte o Ministério do Planejamento, demonstram que o pagamento efetivo foi de R$ 2,8 bilhões. A adequação de trechos rodoviários nas divisas de Paraíba e Pernambuco e Alagoas, um dos principais programas de infra-estrutura de transportes do PAC,
praticamente permanece estagnada. Das verbas prometidas foram liberadas apenas 2,4%. O professor Jorge Madeira Nogueira, PhD em economia e professor do Departamento de Economia da Unb (Universidade de Brasília), diz que o país perdeu um ano precioso em investimentos. “Foi um ano de oba-oba do governo. O PAC passou a ser vendido desde o início de 2007 e só começa a ser efetivado agora (em abril de 2008). Bom para o governo porque é ano eleitoral e péssimo em se tratando de crescimento econômico”, afirma o professor que credita o
“Costumo dizer aos meus alunos que o quadro das rodovias brasileiras é trágico” JORGE MADEIRA NOGUEIRA,
professor da UNB
atraso à lentidão do Executivo. “Ficou transparente a incompetência clássica do Executivo. Perdeu-se muito tempo com a CPMF e os investimentos prioritários, que estão sendo sucateados há quase 20 anos, sofreram um grande atraso.” Para o especialista, é urgente o investimento na recuperação da malha rodoviária. “Costumo dizer aos meus alunos que o quadro das rodovias brasileiras é trágico e horroroso. Estou passando para os meus filhos um país bem pior do que eu recebi do meu pai. A precariedade das rodovias faz com que o custo do transporte seja absurdamente elevado no Brasil e isso reflete diretamente no preço dos produtos.” Os investimentos são baixíssimos de acordo com o professor Jorge Nogueira. “Só para a efetiva recuperação da malha rodoviária seriam necessários R$ 13 bilhões por ano.” Outra fonte de recursos para a conservação de rodovias seria a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), criada em 2002. De acordo com a lei que criou o tributo, o dinheiro obtido pela Cide teria que ser destinado principalmente à infra-estrutura, além de ações de preservação do meio ambiente. Na prática, não é bem isso que acontece. De acordo com a ONG Contas Abertas, do total de recursos arre-
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cadados pela Cide, desde a sua implantação, só R$ 25 bilhões (um pouco mais da metade) foram gastos efetivamente em serviços de melhorias para o cidadão. O restante do dinheiro ficou parado no caixa do Tesouro ou foi usado na quitação de outras despesas. O Ministério dos Transportes informa que, em 2007, aplicou R$ 4,75 bilhões no modal rodoviário com recursos da Cide. Executivos da Contas Abertas dizem que para oficializar o desvio o governo usa o mecanismo da DRU (Desvinculação de Receitas da União), que permite a aplicação de até 20% da receita da Cide para bancar outros gastos que não os definidos na época de sua criação. Além disso, a Cide está com os dias contados. A proposta de reforma tributária elaborada pelo governo prevê o surgimento de um superimposto. O IVA (Imposto sobre Valor Adicionado) deve substituir a Cide, a Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social), o PIS e o Salário-Educação. Explicar a má conservação das rodovias brasileiras não é difícil. Primeiro, o país depende exageradamente do modal rodoviário. Estima-se que 60% da produção seja escoada através das estradas. No mesmo espaço, transitam diariamente 1,7 milhão de caminhões responsáveis pelo
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ORÇAMENTO FATIADO CONFIRA A PARCELA APLICADA EM OBRAS DO TOTAL PREVISTO
ANO 2003 2004 2005 2006 2007
DOTAÇÃO 3.091.957.985,00 3.603.381.574,00 6.565.282.216,00 6.198.310.066,00 10.878.169.185,00
INVESTIMENTO 1.096.800.000,00 1.509.100.000,00 4.117.300.000,00 3.544.300.000,00 4.533.900.000,00
PORCENTAGEM 35,5% 41,8% 62,7% 57,2% 41,7%
Fonte: Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
“As vítimas das rodovias têm em torno de 33 anos e poderiam ser efetivamente produtivas até 65 anos” JOSÉ ALEX SANT’ANNA, professor da Universidade Federal do ABC (SP)
transporte de carga e distribuição de produtos. De acordo com o CEL/UFRJ (Centro de Estudos em Logística da Universidade Federal do Rio de Janeiro) parte da frota trafega com sobrepeso e 90% das balanças brasileiras estão desativadas. O excesso de peso é um dos principais responsáveis pelo estado precário de muitas rodovias. O presidente do Sindicam (Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Estado de São Paulo), Norival de Almeida Silva, diz que os caminhoneiros querem mais seriedade. “Somos a favor de uma fiscalização efetiva, de punição aos caminhoneiros que trafegam com sobrepeso, mas também queremos transparência do governo na destinação das verbas para a conservação das rodovias”, diz Silva, que
SENHOR DA ESTRADA Os buracos
trabalhou mais de 30 anos como caminhoneiro. A SP–101 (Campinas-Monte Mor), a SP–304 (Luiz de Queirós), a SP–133 (Americana-Cosmópolis) e a SP–105 (Paulínia-Hortolândia) são alguns dos trechos em péssimo estado citados por Norival. “Se isso acontece em São Paulo, pode-se imaginar como se encontram as rodovias estaduais de outros Estados”, afirma o dirigente, que comanda uma entidade integrada por 198.528 caminhoneiros. Uma pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostra que os custos das tragédias nas estradas são altos. Na Operação Verão, entre os meses de dezembro de 2006 e março de 2007, o Brasil desperdiçou R$ 1,5 bilhão com a perda de produtividade, o atendimento médico de urgência, ocupação de lei-
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PARA ONDE VAI O DINHEIRO Modalidade 2003 Adequação 211 Manutenção da Malha 738 Recuperação das rodovias Construção e Pavimentação 104 Segurança pública 43 nas rodovias federais TOTAL 1.096
2004 326 1.011 9 112
2005 1.354 1.037 1.239 445
2006 1.229 913 916 448
2007 1.807 1.102 1.079 480
49
41,3
37
71
1.509
4.117
3.544
4.533
* Valores em milhões de reais
tomam conta do asfalto e chegam a ocupar mais da metade da pista
tos hospitalares e danos à propriedade pública e privada. A mesma pesquisa aponta que o Brasil perde R$ 24 bilhões anualmente com os acidentes em rodovias federais. Um acidente com morte custa ao Brasil cerca de R$ 500 mil. Um ferido tem o custo de R$ 100 mil e uma ocorrência sem vítima, R$ 20 mil. Participante do estudo do Ipea, doutor em engenharia de transporte e professor da Universidade Federal do ABC (SP), José Alex Sant’Anna diz que os prejuízos com as mortes nas rodovias são altíssimos. “As vítimas das rodovias têm em torno de 33 anos e poderiam ser efetivamente produtivas até 65 anos. Muitos dos mortos possuíam uma qualificação científica e profissional grande, o que aumenta ainda a perda de produtividade.”
Segundo o especialista, há problemas causadores de acidentes que poderiam ser resolvidos pelo governo com um pequeno investimento. “Se comparado ao prejuízo dos acidentes, o custo seria mínimo”. Ele cita como exemplo a instalação de defensas metálicas em curvas críticas, a adequação das placas de sinalização, a correção do raio das curvas com recapeamento adequado e o incremento na fiscalização. Várias tragédias poderiam ser evitadas. Em apenas um trecho de 100 quilômetros na BR–381, entre Belo Horizonte e João Monlevade, em Minas Gerais, 50 pessoas morreram, 898 ficaram feridas em 1.011 acidentes registrados pela Polícia Rodoviária Federal entre janeiro e julho do ano passado. Em muitos deles, a imprudência não foi a causa principal.
Fonte: Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
O BRASIL PERDE POR ANO
R$ 24 BI COM ACIDENTES NAS ESTRADAS FEDERAIS
Contou mais a falta de acostamento, enormes buracos nas pistas, falta de defensas em curvas perigosas, erosão e sinalização deficiente ou encoberta pelo mato. A má geometria da rodovia torna ainda a pista escorregadia em dias de chuva. A estrada já ganhou a alcunha de “rodovia da morte”. Na madrugada do dia 17 de janeiro de 2007, um ônibus da Viação Nossa Senhora da Penha, que transportava 27 passageiros para Belo Horizonte, tombou na pista no Km 350 e o acidente causou a morte de nove pessoas e feriu outras 20. Num trecho em descida, numa curva, o ônibus ficou desgovernado. Não havia defensa metálica e o ônibus só parou depois de 15 metros ao bater em uma árvore. Uma tragédia que talvez pudesse ● ser evitada a baixo custo.
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IRACEMA CHEQUER/ AG. A TARDE/FUTURA PRES
DESPOLUIR
AS CONSEQÜÊNCIAS
PARA O MEIO
AMBIENTE
ESTRADAS RUINS INDUZEM A PROCEDIMENTOS QUE AUMENTAM A POLUIÇÃO DO AR E COMPROMETEM A QUALIDADE DA VIDA POR
MARCELO FIUZA
motorista segue tranqüilamente por uma estrada pavimentada, em condições ideais de visibilidade e tempo. De longe, avista um buraco na estrada, reduz a velocidade, sinaliza e desvia do obstáculo. O procedimento é simples, rotineiro no dia-a-dia de quem trafega pelas rodovias brasileiras. Entretanto, esse pequeno desvio ganha ares de problema ambiental quando se pensa nas dimensões de um país como o Brasil, onde o transporte terrestre, muitas vezes, é a única opção para ir de um lugar a outro e a malha rodoviária é, notoriamente, malconservada. Quanto mais freadas e arrancadas, maior o consumo de combustível e, conse-
O
qüentemente, maior é a poluição do ar. Isso em situação ideal de visibilidade e tempo, pois, se as condições forem adversas e o buraco for inevitável, o problema se agrava com a eventual necessidade de troca de peças e descarte de pneus - itens que vão parar no meio ambiente se não tiverem o destino correto. Ou seja, estradas esburacadas são, sim, fator de poluição ambiental, conforme afirma a cientista Suzana Kahn Ribeiro, professora do Programa de Engenharia de Transportes da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e integrante do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) da ONU (Organização das Nações Unidas). “À medida que não
“Estrada malconservada faz com que o motorista acione os freios, SUZANA KAHN RIBEIRO, CIENTISTA
há uma velocidade mais constante, com menos paradas e acelerações, o consumo de combustível cresce e, queimando-se mais combustível, emite-se mais poluentes atmosféricos. Uma estrada malconservada faz com que o motorista tenha que acionar os freios várias vezes, reduzir e aumentar a velocidade de percurso, o que leva a um consumo maior”, diz a pesquisadora. Segundo a tese de doutorado “Quantificação dos Impactos Econômicos e Ambientais Decorrentes do Estado de Conservação das Rodovias Brasileiras”, defendida pela economista agroindustrial Daniela Bacchi Bartholomeu na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP, em novembro de 2006, estradas bem conservadas resultam em mais benefícios, tanto econômicos, como ambientais. A pesquisa realizada em São Paulo aponta que rodovias em bom estado permitem uma economia média de 4,8% no combustível e de 4,5% na emissão de gás carbônico, além da redução de 18,7% no gasto com a manutenção do caminhão. Por outro lado, estradas malconservadas implicam um gasto adicional de até R$ 34 para cada 100 km rodados, atesta o levantamento. Maior consumo, mais despesas com manutenção e, obviamente, menor lucro em todos os elos
da cadeia de transportes. Assim o diz o presidente da ABTC (Associação Brasileira dos Transportadores de Carga), Newton Gibson. “Buraco na estrada afeta o transporte em todos os sentidos, causa prejuízo com a manutenção do veículo, a perda com relação ao maior consumo de combustíveis e, automaticamente, no aumento da poluição”, diz o presidente da ABTC, que credita aos buracos nas estradas cerca de um quinto da manutenção dos veículos e a perda de até um terço de todo o faturamento dos associados. “Os problemas de manutenção dos veículos por causa de buracos nas estradas atingem mais de 20% dos custos dos afiliados com desgaste dos veículos e troca de peças. Além disso, se o motorista tem condição de fazer em três horas uma viagem, ele a faz com cinco horas em uma estrada em depreciação. Se contarmos o combustível, a manutenção, o tempo maior da viagem e o desgaste que o motorista tem, esse prejuízo chega a quase 30% de tudo.” Presidente de uma entidade que roda por todo o país, Gibson identifica algumas áreas em que as rodovias estão piores. “Fico preocupado com a região dos grandes produtores de grãos, onde deveríamos ter a melhor condição de trafegabilidade para termos também melhor condição de comer-
MAIS CONSUMO Para Suzana Kahn, integrante do IPCC, estrada
cialização desses produtos. Vejo que o problema maior é no Mato Grosso, onde a falta de infra-estrutura resulta em maior custo operacional”, diz o dirigente, que defende maior investimento do governo em infra-estrutura no setor de transportes e ainda melhoria da qualidade do combustível brasileiro. “Estamos preocupados com o problema da poluição, pois é algo que vai prejudicar todo mundo. E nós do setor de transporte temos que colaborar com medidas de proteção ambiental”, explica Gib-
son, citando a adesão da ABTC ao Programa Despoluir, da CNT, que adota, entre outras medidas, a conscientização dos trabalhadores do setor e a medição sistemática dos poluentes dos gases das descargas dos veículos das empresas associadas. Outra conseqüência da má conservação das estradas é o excessivo descarte de pneus precocemente abandonados em função de avarias. Problema que a Anip (Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos) tenta resolver,
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reduza e aumente a velocidade, o que aumenta o consumo”
COPPE/DIVULGAÇÃO
ruim é prejudicial ao meio ambiente
desde 1999, com o Programa Nacional de Coleta e Destinação de Pneus Inservíveis e, mais recentemente, em 2007, com a criação de uma entidade própria para essa função, a Reciclanip. “Sabemos que o pneu é feito para durar uma certa quantidade de quilômetros e que os dos caminhões são passíveis de passar por até duas reformas, mas um buraco na estrada pode rasgar o flanco e a lateral, provocar furos difíceis de serem recuperados. O pneu perde pressão e tem uma vida útil mais curta.
É o que chamamos de perda do pneu por acidente”, diz Renata Murad, gerente-geral da Reciclanip. Esse pneu imprestável, se não tiver o destino correto, torna-se um poluente ambiental dos mais incômodos. “O pneu inservível é um resíduo pós-consumo, não é tóxico, mas tem destinação difícil. Não pode ser colocado em um aterro porque ele não é comprimível, não pode ser compactado e aflora na superfície. É também um vetor da dengue, ou seja, um problema da área da saúde. E se torna tóxico se for queimado, gerando poluição no ar”, diz a executiva. Renata informa que a solução encontrada pela Reciclanip passa pela conscientização do vendedor e do usuá rio de que aque le pneu que não ser ve mais, seja por acidente causado por buracos, ou pelo fim de sua vida útil, deve ser entregue em um dos 283 postos de coleta mantidos pela instituição em 21 Estados e no Distrito Federal. “Já reciclamos mais de 780 mil toneladas de produtos, o equivalente a 156 milhões de pneus de carro. Foram 150 mil toneladas em 2007, ou 30 milhões de pneus”, diz a gerente da entidade, que tem orçamento de US$ 16 milhões para 2008. Segundo Renata, o conselho
para o motorista que tem, durante uma viagem, um pneu estourado após passar em um buraco é não abandoná-lo nas margens da pista. “Não deixe o velho pneu na estrada, deixe-o no borracheiro ou no reciclador”, afirma a gerente, que estima que entre 50% e 70% dos pneus consumidos no país chegam aos postos de coleta. “Meu circuito é formal, com empresas licenciadas. O que sobra não necessariamente está na natureza, as pessoas podem usar o pneu velho em muro de arrimo ou para fazer balanços, por exemplo.” Os pneus recolhidos são usados no co-processamento na indústria de cimento (84%), fabricação de pó de borracha para produção de asfalto (12%) e como matéria-prima para solados de sapatos e dutos fluviais. Cidades como São Paulo e Curitiba são exemplo na utilização do asfalto-borracha. Curitiba foi a primeira capital brasileira a utilizar o chamado asfalto ecológico em aproximadamente 7.000 km de suas ruas, no começo do ano. Já a capital paulista passou a usar o novo pavimento em fevereiro, inicialmente em 4 km de ruas. Em março, a Câmara Municipal de Belo Horizonte aprovou a Lei do Asfalto Ecológico, que prevê que a composição da massa asfáltica a ser utilizada na capital mineira pela pre-
feitura levará 15% de borracha proveniente de pneus inservíveis. Procurada pela reportagem, a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), através de seu diretor de relações institucionais, Ademar Cantero, enviou nota sobre o assunto: “Está claro que as más condições de parte da malha rodoviária impactam na vida útil dos veículos, na produtividade do transporte rodoviário, ou mesmo dos automóveis e comerciais leves. Há redução de sua vida útil, aumento de custos de manutenção, maior consumo de combustível e, em conseqüência, aumento da geração de emissões.” Em outro trecho, destaca que a indústria automobilística faz o que lhe compete, que é fabricar veículos dentro dos padrões de segurança, qualidade e níveis de emissões dentro das regulamentações para os produtos automotivos. E que o Brasil necessita de uma Inspeção Técnica Veicular Nacional eficiente como meio de manter a frota (da ordem de 25 milhões e composta de 40% a 50% de veículos com mais de dez anos) em condições adequadas de segurança de trânsito e de meio ambiente, ao mesmo tempo em que o país necessita de urgentes e pesados investimentos para a modernização de sua malha viária urba● na e rodoviária.
ALEX DE JESUS/O TEMPO
ROUBO
POR
CARMEN POMPEU
m buraco no meio do caminho. Velocidade reduzida. E pronto: o caminhão e a carga são roubados. Prejuízo direto para o país de R$ 710 milhões por ano, segundo levantamentos da NTC&Logística (Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística), feitos entre 2003 e 2006. Sem falar nos custos indiretos como o aumento do preço dos seguros, dos fretes e, conseqüentemente, dos produtos consumidos no Brasil inteiro. “Onde tem estrada ruim não há condições para tráfego em alta velocidade. E isso favorece a ação das quadrilhas especializadas em roubo de caminhões e carga. Em uma estrada esburacada, o motorista é obrigado a diminuir a velocidade. Em outras vezes, o pneu fura, ele pára para trocar e é nessas situações que os bandidos aproveitam para agir”, diz o presidente da Abcam (Associação Brasileira dos Caminhoneiros), José da Fonseca Lopes. Com um maior rigor dos órgãos policiais, a ação de quadrilhas especializadas em roubo de cargas vem diminuindo nos dois últimos anos na região Sudeste,
U
CARGAS
ESTRADAS RUINS E COM SINALIZAÇÃO DEFICIENTE REDUZEM A VELOCIDADE
que ainda é líder nacional com quase 90% das ocorrências. Mas a falta de conservação das estradas tem contribuído para uma migração dessas quadrilhas para o Nordeste, terceira região brasileira em número de roubos do tipo. A média de 17 ocorrências por dia registradas ano passado em São Paulo, por exemplo, apesar de ainda parecer assustadora, é tida como “padrão tolerável” pelo pre-
sidente da Abcam. “Antes era tão mais absurdo que um sujeito saía com uma carga de bobina de aço pesadíssima, era rendido e mantido no cativeiro enquanto os ladrões retiravam tranqüilamente o material e revendiam para grandes empresas sem acontecer nada com eles. Hoje, graças a uma maior articulação das polícias, muitas quadrilhas estão sendo desfeitas”, diz Lopes, que coman-
da uma entidade com 100 mil associados. No início deste ano, a polícia paulista prendeu uma quadrilha que possuía uma logística criminal que ia do roubo da carga à venda dos produtos. A vulnerabilidade do transporte como negócio era tão grande, segundo Lopes, que hoje apenas oito empresas oferecem seguros. “Ainda assim, é preciso obedecer a uma sé-
EM PERIGO
DOS CAMINHÕES, CAUSAM PREJUÍZO E EXPÕEM OS MOTORISTAS À AÇÃO DOS CRIMINOSOS rie de exigências, tais como: sistema de rastreamento, escolta armada e caminhoneiro com ficha criminal limpa.” De acordo com pesquisa feita pela NTC, o número de ocorrências vem aumentando no Nordeste. Em 2003, foram registrados 761 roubos a veículos de carga na região. Em 2004, 780. Em 2005, 825 e em 2006, 837 ocorrências. Para o presidente da Abcam, a má con-
servação das estradas na região ajuda na ação dos bandidos. “É claro que, se eu encontro mais dificuldade em um determinado local, vou procurar outro mais propício. E é isso que vem ocorrendo”, diz Lopes. “E onde tem estrada que não apresenta condição satisfatória de tráfego é mais fácil os bandidos agirem.” Uma rodovia esburacada gera, entre acidentes e assaltos, um
prejuízo de R$ 28 bilhões/ano, segundo estimativa do especialista em segurança no transporte rodoviário, coronel Paulo Roberto Souza. O valor contabiliza perda de cargas, de veículos, gastos com seguro, tratamento e reabilitação das vítimas. De acordo com Souza, as cargas mais visadas são eletroeletrônicos, medicamentos, alimentos, bebidas e produtos têxteis.
Segundo ele, há uma relação direta entre má conservação das estradas e assaltos. “A baixa velocidade deixa o caminhão mais vulnerável. Isso facilita ao bandido parar o veículo e apontar uma arma para o motorista.” As piores rodovias são, de acordo com Souza, as BRs–116 e 101, que cortam o país de Norte a Sul. “Os trechos mais problemáticos são, sem dúvida, perto de
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VALTERCI SANTOS/GAZETA DO POVO/FUTURA PRESS
À ESPERA Trânsito lento e paradas facilitam o trabalho das quadrilhas especializadas
“Onde tem estrada sem condição satisfatória de tráfego é mais fácil os bandidos agirem” JOSÉ DA FONSECA LOPES PRESIDENTE DA ABCAM
grandes cidades, pois é mais fácil empreender uma ação e fugir em regiões de grande concentração populacional”, disse Souza. Somente em São Paulo, ano passado, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública, foram registradas 6.192 ocorrências, o que dá uma média de 17 roubos por dia, resultando em um prejuízo de R$ 204,6 milhões/ano. A maioria dos crimes (85,03%) acontece na capital e na região metropolitana. A rodovia paulista recordista em roubos é a Presidente Dutra, que faz a ligação de São Paulo com o Rio de Janeiro, com 178 re-
gistros. Considerada a rodovia mais importante do Brasil, a Via Dutra atravessa uma das regiões mais ricas do país, o Vale do Paraíba, e também é a principal ligação entre as regiões Nordeste e Sul. Em seguida vem a Anhanguera (140), a SP–330, que faz parte do sistema BR–050, que liga Brasília a Santos. Ela é considerada um dos maiores corredores financeiros do país, pois interliga algumas das mais ricas regiões metropolitanas do Estado como São Paulo e Campinas e mais as regiões de Ribeirão Preto e São Carlos. Tem um tráfego pesado, principalmente, de caminhões.
A terceira rodovia mais visada pelos assaltantes de caminhões e cargas é a Régis Bittencourt (116), que liga São Paulo a Curitiba. Conhecida como “Rodovia da Morte”, sua topografia acidentada contribui para a ação dos assaltantes. Ela também é a estrada com o mais alto índice de acidentes com vítimas fatais de todo o Brasil. Além do prejuízo financeiro, há também o humano. De 1998 a 2006, segundo levantamento feito pela NTC, 204 pessoas (entre motoristas e ajudantes) morreram durante roubos de cargas praticados nas rodovias brasileiras. No Ceará, de acordo com o delegado Romério Almeida, titular da Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas, 80% dos carros roubados são recuperados. Os roubos e furtos a caminhões são raros. São registrados, em média, de três a quatro ocorrências por mês. Um dos menores índices do Brasil. A polícia tem duas explicações para a baixa ocorrência envolvendo caminhões: o combate aos receptadores e a prisão dos assaltantes. Para isso, tem contado com a ajuda da população. Foi graças a uma denúncia que a polícia localizou, em fevereiro deste ano, no pátio de uma igreja evangélica, em Fortaleza, 12 toneladas de tintas e solventes roubadas de um caminhoneiro na BR–116. O pastor da
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MOISÉS B. DIAS/FUTURA PRESS.
ÔNIBUS
Passageiros também são vítimas Não só caminhoneiros são vítimas de assaltantes nas estradas. Apesar de não haver, segundo a Abrati (Associação Brasilei ra das Em pre sas de Transporte Terrestre de Passageiros), uma estatística sobre o assunto, assaltos a ônibus de turis mo es tão cada vez mais freqüentes por conta da má conservação das ro dovias bra si lei ras. A maioria das ocorrências registradas pela Polícia Rodoviária Federal acontece nas estradas de Minas Ge rais, Es ta do que concentra a maior malha federal do país. Ainda segundo a PRF, outros Estados bastante visados pelos assaltantes são Pernambuco e Maranhão. Algumas empresas de ônibus adotaram medidas de segurança específicas. A Auto Viação 1001 oferece um seguro opcional, que varia de acordo com a quilometragem da viagem para extravio de bagagem de mão. A Transnorte, que atua no Sudeste e Nordeste, passou a fazer um fichamento do passageiro em linhas in-
termunicipais e nos trechos in te res ta duais. Os ônibus da empresa também não param para pegar passageiros na beira da estrada. No Ceará, um dos trechos mais visados pelos assaltantes fica entre o distrito de Dom Quintino e a cidade de Farias Brito. No início deste ano, um ônibus foi interceptado por quatro bandidos que roubaram pertences dos passageiros. Vítima de um desses assaltos, o promotor de Justiça Alcides Jorge Evangelista, da 4ª Vara do Júri de Fortaleza, lembra do ataque de bandidos ao ônibus no qual viajava com destino à cidade de Aurora, no sul do Ceará. Segundo ele, os bandidos dispararam tiros. Mantido como refém, ele teve que entregar seus objetos pessoais e dinheiro. Para enfren tar esse tipo de situação, a PRF aconselha aos passageiros nunca reagir. Também é preciso ficar atento ao tipo físico dos criminosos para uma eventual identificação. O número da PRF para denúncia em todo o país é o 911.
DE PASSAGEM Ônibus interestaduais também são alvo do crime
igreja disse que aceitou guardar a carga a pedido de um vizinho. Acabou indiciado por receptação de carga roubada. O motorista, que não quis se identificar temendo represália, lembra que havia sido rendido por três homens armados na estrada e levado para um matagal. Os assaltantes eram justamente os homens que ele havia contratado para descarregar o caminhão. A tecnologia tem sido uma aliada no combate ao crime. A Polícia Rodoviária Federal implantou uma rede que interliga todas as unidades de fiscalização, criando
um sistema de informação praticamente instantâneo. No site da corporação (www.prf.gov.br), as informações de crimes são repassadas para todas as viaturas e postos do Estado onde ocorreu o delito e também para Estados vizinhos. Segundo a PRF, essa ação permite um aumento da eficiência, já que as primeiras horas da ocorrência são cruciais para o sucesso da ação policial. Após a implantação progressiva do sistema, já no terceiro trimestre do ano passado, foram recuperados 820 veículos, somando-se a isso inúmeras prisões de criminosos. ●
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PROCREMA
MAIS UM TAPA-BURACO PROGRAMA RODOVIÁRIO FEDERAL NÃO PASSA DE NOVA EDIÇÃO DA VELHA OPERAÇÃO TAPA-BURACOS POR
Mi nis té rio dos Trans por tes, em conjunto com o Ministério do Planejamento, lançou, no início deste ano, o Procrema (Programa de Contratação, Restauração e Manutenção por Resultados de Ro dovias Fe de rais Pavi men ta das). O pro gra ma é mais uma tentativa para otimizar as condições estruturais e funcionais do pavimento da malha rodoviária e sucede ou tros já im plan ta dos, como o Tapa-Buraco, o PIR (Programa Integrado de Revi-
O
VANDA DEL GIORNO
talização) e as obras previstas no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Em sete anos, foram lançados pelo menos quatro programas que visavam recuperar ou reformar estradas federais. Pelos resultados verificados nas pesquisas rodoviá rias que a CNT di vul ga anualmente, nenhum desses programas funcionou efetivamente. Pelo contrário, nesse período, se houve melhora, ela é imperceptível às planilhas dos pesquisadores e aos motoristas que trafegam nos
milhares de quilômetros, seja a trabalho ou a passeio. Falta de manutenção, morosidade no processo de licitação e execução das obras e dinheiro mal aplicado são alguns dos motivos que levam especialistas a duvidar do sucesso do Procrema. A Aneor (Associação Nacional de Empresas de Obras Ro do viá rias), en ti da de que congrega as grandes empreiteiras que prestam esses serviços, embora avalie o programa como positivo, adverte que é preciso que sua exe-
DESCASO Trecho da
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DANIEL DE CERQUEIRA/O TEMPO
BR–153 em São José da Lagoa, distrito de Curvelo, em Minas Gerais, estava no PIR 4 de 2003 e consta novamente no Procrema deste ano
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BAHIA A BR–116 é outro exemplo de rodovia federal que já
cução seja feita com planejamen to ade qua do e me lhor ges tão dos re cur sos, que acabam não sendo utilizados in te gral men te ou são mal aplicados. Na opinião do presidente da Aneor, José Alberto Pereira Ribeiro, o Procrema tem diferenciais que o favorecem, como a realização dos trabalhos por empreitada com preço global e administração e execução do projeto executivo sob responsabilidade da empresa contratada. Mas Ribeiro alerta para o fato de que a manutenção deve ser continuada, ou então o risco de fracasso aumentará. “Os programas an-
teriores foram muito estanques e foi jogado muito dinheiro fora devido à falta de planejamento para manutenção. A proposta do Procrema é inteligente e tem mais responsabilidade no que diz respeito à conservação contínua”, diz. Mas, para ele, esses diferenciais, bem como os recursos provenientes do PAC, por si só, não garantem o sucesso. “Sem um planejamento adequado e uma melhor gestão dos recursos, o programa pode não alcançar os objetivos almejados. No ano passado, tivemos uma sobra de R$ 6 bilhões por falta de planejamento”, afirma.
DANIEL DE CERQUEIRA/O TEMPO
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JOAO LEUS/O TEMPO
esteve em programas da União, no caso o PIR 4, e que volta agora em 2008
DOS TRECHOS PREVISTOS PARA A PRIMEIRA FASE DO PROCREMA,
26 CONSTAVAM DO PIR 4
O Ministério dos Transportes está confiante de que esse programa trará uma evolução na concepção de manutenção das estradas sob gestão estatal no país. Mas a preocupação sobre o planejamento e o bom uso dos recursos têm suas razões. De acordo com as pesquisas rodoviárias da CNT, dos últimos anos, pode-se notar que a malha estatal não tem tido melhorias significativas. Para se ter uma idéia, em 2006, dos 71.447 km sob gestão dos Estados pesquisados, 20,8% tiveram avaliação geral péssima e 24,8%, ruim. Em 2006, dos 73.557 km estatais, 14% foram péssimos e 27,4%
BURACO Marginal de rodovias, como a 381, sofre sem manutenção
ruins. Já em 2007, de 76.756 km estatais, 12,4% foram péssimos e 25% ruins, o que mostra queda muito pequena na avaliação péssima até o aumento na avaliação ruim. A eficácia dos planos governamentais na manutenção das estradas fica sob um véu de dúvidas justamente porque se percebe que trechos que já fizeram parte de programas de recuperação serão contemplados pelo Procrema, como é o caso de algumas rodovias de Minas Gerais, Estado que tem 4.000 km de recuperação previstos na primeira etapa de licitação de projetos, publicada no início de março,
Mato Grosso, Santa Catarina e Bahia. Rodovias federais que já fizeram parte do PIR 4 tiveram avaliação no item estado geral entre regular e péssimo na Pesquisa Rodoviária CNT 2007. São os casos da BR–101, na Bahia, BR–365, em Minas, BR–163, em Mato Gros so e BR–470, em Santa Catarina. Dos 46 trechos previstos para a primeira fase do Procrema, 26 constavam do PIR 4. Ou seja, cinco anos depois, novas obras de recuperação serão licitadas, pois o programa anterior não deu certo. As obras de recuperação e restauração do Procrema estão previstas para ter início
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PROCREMA
Quarto programa do ministério Os programas de recuperação de estradas por parte do governo federal ti ve ram iní cio em 2001 com a criação do Creminha, primeiro projeto de con tra tos in te gra dos de obras e manutenção rodoviária. Nesse programa, foram contratados serviços para recuperação de 8.500 km em um ano. Em 2002, foram iniciados os primeiros contratos do Crema, com vi gên cia de cin co anos, que se caracterizavam prin ci pal men te por associar às obras de restauração as atividades de manutenção rotineira do sistema. Os contratos do Crema somavam 5.000 km da malha. Lan ça do em 2003 e considerado uma evolução do Creminha, o PIR 4 (Programa Integrado de Revita li za ção) con ta com o apoio do Banco Mundial e suas soluções de recupe-
ração são embasadas em ca tá lo gos de reso lu ção, em complemento ao definido em vistorias de campo. Os re cursos ini ciais para a recuperação de 48 rodovias federais foram da ordem de R$ 1,38 bilhão. Em 2006, foram definidos os conceitos para lançamento do Procrema que prevê a recuperação e manutenção de 7.000 km de rodovias por ano. “O Procrema é um aperfeiçoamen to dos an te rio res e avaliamos que os programas de recuperação são viáveis, principalmente em rodovias que têm uma integração estratégica. Mas, em alguns casos, o governo também realiza um estudo de viabilidade técnica e eco nô mi ca para a possibilidade de concessão a empresas privadas”, diz Miguel de Souza, diretor de Planejamento e Pesquisa do Dnit.
INCOMPETÊNCIA Listada
O programa pode não alcançar os objetivos por falta de planejamento e uma melhor gestão dos recursos
entre maio e junho de 2009. No início de março deste ano, foi lançado o edital para primeira etapa de licitação de projetos, que será concluída até meados de abril. As empresas terão de 120 a 180 dias para fazer os projetos. O processo de licitação para contratação das empresas que executarão as obras deve ter início em dezembro de 2008. Ribeiro, da Aneor, critica a morosidade do processo. Segundo ele, esses prazos, aliados à falta de planejamento de recursos no ano de 2007, cau sa rão uma au sên cia de projetos e execução de obras
RIBAMAR BOTELHO/FUTURA PRESS
no PIR 4 de 2003, a MT–163 não recebeu as melhorias necessárias e consta novamente no Procrema
en tre 2008 e mea dos de 2009. “Para 2008, o governo contratou apenas R$ 700 milhões para execução de obras de projetos que já estavam prontos, ou seja, muitos trechos já recuperados não rece berão manutenção nesse período e, quando iniciarmos as obras do Procrema, algumas rodovias já estarão neces si tan do de novos re pa ros”, diz o dirigente. O que diferencia o Procrema dos anteriores e traz algum otimismo quanto ao seu sucesso é, segundo Miguel de Souza, diretor de planejamento e pesquisa do Dnit (Depar-
tamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes), a extensão de trechos a serem recuperados, cerca de 7.000 km por ano. “Chegaremos a um total aproximado de 32 mil quilômetros recuperados, o que representa 60% dos 55 mil quilômetros da malha pavimentada do país. Os 40% restantes continuarão inseridos nos programas já existentes”, afirma. O Procrema também contempla a realização de obras não previstas nos programas anteriores, como implantação de terceira faixa, sinalização horizontal e vertical em todos os trechos, me-
“Para 2008, o governo contratou só R$ 700 mi para executar obras de projetos que já estavam prontos” JOSÉ ALBERTO PEREIRA RIBEIRO PRESIDENTE DA ANEOR
lhoria de pontes e realização de manutenção contínua. Os contratos terão vigência de cinco anos, mas as empresas devem executar as obras em 36 meses, garantindo sua manutenção nos dois anos restan tes. “O Pro cre ma prevê uma intervenção mais séria e permanente.” Na tentativa de reverter esse quadro e garantir que o Procrema tenha início sem carregar os problemas de programas anteriores, a Aneor apresentou para o corpo técnico da Casa Civil um programa de sustentabilidade das ações e gestão do setor rodoviário, denominado PIR 5. “É uma proposta que tem as mesmas bases do PIR 4, que descarta a obrigatoriedade do projeto básico e reduz cerca de quatro meses o início do processo licitatório das obras. Com isso, será possível iniciar obras de todos os níveis já neste ano, eliminando o vácuo de 2008”, diz Ribeiro. Para execução desse projeto, seriam necessários recursos de R$ 2 bilhões. Segundo Ribeiro, a intenção é evitar que nos próximos anos o quadro que se apresenta ● atualmente se repita.
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CUSTO BRASIL
SINTOMAS DE
APAGÃO FALTA DE INVESTIMENTOS EM INFRA-ESTRUTURA DEIXA LOGÍSTICA EM SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA
á anos se faz o alerta de apagão no setor de trans por te, dada a repetição de erros que se perpetua há quase três décadas. A previsão de caos é ventilada, freqüentemente, em gabinetes oficiais e es cri tó rios em pre sa riais. A ameaça foi mantida à espera do surgimento de algum milagre. Afinal, o governo federal e até a iniciativa privada faziam anúncios periódicos de investimentos na área e o antídoto
H
para a prevista crise setorial é exatamente o dinheiro aplicado na precária infra-estrutura – e em alguns pontos e regiões até então inexistentes. Apesar disso, as dúvidas e incertezas produzidas pelo setor público corroíam os mais otimistas. Nem os R$ 55,3 bilhões do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento), anunciados com entusiasmo pelo presidente Lula no início do ano passado, destinados à melhoria das rodovias, ferrovias,
hidrovias e todo o sistema aeroportuário, aplacaram o pessimismo de alguns. O primeiro balanço do Programa – ainda com data de 2007 – ao invés de gerar confiança tem produzido dúvidas quanto à execução das obras e sua conclusão, mesmo com o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, declarandose otimista com o andamento dos projetos e o cumprimento dos prazos. Os dados recentes sobre a aplicação dos recursos
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Rio Branco e Tarauacá (AC) mostra bem o descaso do governo federal com as rodovias brasileiras e a situação calamitosa que os motoristas enfrentam
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ALCIONE FERREIRA/DIÁRIO DE PERNAMBUCO/FUTURA PRESS
PROJETOS PREFERENCIAIS 1 - Ferroanel Norte de São Paulo 2 - Adequação rodoviária de acesso ao Porto de Santos 3 - Adequação ferroviária de acesso ao Porto de Santos 4 - Rodoanel de contorno de São Paulo 5 - Acesso Rodoviário exclusivo para o Porto de Sepetiba 6 - Acesso ao Porto de Sepetiba em bitola estreita 7 - BR–163 - Nova Mutum-Santarém (900 km) 8 - Hidrovia Tapajós - Teles Pires (1043 km) 9 - Adequação da hidrovia Madeira 10 - Novo Porto de Ubú 11 - Ferrovia Litorânea Sul (166 km) 12 - Ampliação do Porto Barra do Riacho 13 - Travessia Ferrovia de Belo Horizonte (12 km) 14 - Ferrovia Dores do Indaiá - Sete Lagoas, em Minas Gerais. (230 km) 15 - Ferrovia Patrocínio - Dores do Indaiá - Franklin Sampaio 16 - Reclusa de Tucuruí 17 - Canal de Santa Isabel (Araguaia) 18 - Reclusa de Lajeado (Tocantins) 19 - Corredeira Estretto-Marabá (Tocantins) 20 - Ferrovia Alto Araguaia - Catandra (830 km) 21 - Ferrovia Lajes - Oficina (200 km) 22 - Novo porto de Imbitu
ABANDONO Malha ferroviária depende das concessionárias
não são estimuladores. Segundo técnicos do Ministério dos Transportes, até março deste ano – quando o Orçamento da União foi efetivamente liberado para gasto – foi quitado 39% do volume de restos a pagar e empenhados 29% dos recursos previstos para investimentos em 2007. “A nossa estimativa é que o percentual de execução cresça nos próximos meses”, prevê Nascimento. Se a profecia do ministro se cumprir, o PAC tende a tornar menos amarga a expectativa do ano para o transporte. Caso
contrário, o Brasil corre enorme risco de ver boa parte de sua safra de grãos, de matérias-primas e de produtos manufaturados entupir silos e armazéns. “A economia brasileira deixaria de crescer mais 2 ou 2,5 pontos percentuais por causa da limitação da exportação provocada, principalmente, pelo ineficiência da logística transportadora”, acredita Gabriel Teixeira, professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. As ações para 2008 ainda são uma incógnita. De uma ini-
cial onda de boataria, o tema apagão passou a ser uma temida e irrefreável possibilidade. Apenas o PAC não suportaria o peso de anos e anos de ausência de uma política integrada de transporte e o abandono sistêmico da infra-estrutura. Uma análise simples e objetiva do caminhoneiro Lourenço Souza, do Paraná, reflete bem a preocupação quanto ao caos. “As estradas estão um lixo e não será da noite para o dia que teremos uma pista limpa para transportar mercadorias com eficiência. O
"A economia deixaria de crescer mais por causa da ineficiência da logística de transporte” GABRIEL TEIXEIRA, PROFESSOR DA PUC-MG
PRIORIDADES
País sofre com o excesso de promessas e a falta de ação Soluções surgem a todo momento de forma a eliminar o que os economistas chamam de “a tormenta do Brasil”. Como ranhura de um disco de vinil, as idéias, vindas especialmente do setor privado, recomendam investimentos e apontam os locais onde o dinheiro deve ser aplicado. Empresários, líderes classistas e consultores apresentam sistematicamente suas opiniões e pelas ações oficiais, muitos casos considerados prioritários, não coincidem com o setor público. Como exemplo, o Rodoanel Sul, em São Paulo. A obra sempre ficou no estaleiro da burocracia do Estado. Somente agora há a promessa de usar R$ 2 bilhões obtidos na recente privatização de rodovias paulistas para concluir a obra. Apenas mais uma promessa. Nada oficializado no papel. Afinal, são 12 longos e aflitivos anos de espera das transportadoras e caminhoneiros autônomos que sofrem com o acesso à capital paulistana, ao interior paulista e ao Porto de Santos. O Rodoanel é um pequeno exemplo entre quase 80 outros pontos (rodovias, ferrovias e hidrovias, portos e aeroportos) citados com minúcias de detalhes no Plano CNT de Logística. Somente com as intervenções propostas, o Brasil economizaria, por ano, mais de R$ 23 bilhões e, em apenas três anos, todo o dinheiro do PAC estaria de volta aos cofres públicos. Muitas das obras constam do pacote do plano, mas sequer foram iniciadas ou se tem pre-
visão de começo. Em meados de março o próprio presidente Lula endureceu o jogo com os ministros – inclusive o de Transportes – exigindo-lhes pressa e informações públicas sobre o andamento de cada obra. Nesta queda-de-braço entre órgãos governamentais e empresas/empresários, o Custo Brasil resiste bravamente. Para o economista mineiro Samir de Castro, autor de um estudo sobre sistema de tarifas no transporte de cargas, há muita ineficiência e incompetência nos setores público e privado para resolver o problema. “Justifica-se então a permanência por décadas de fatores que contribuem com o Custo Brasil. Não se reduz um centavo na indesejável planilha. Para piorar, o país ainda desce a ladeira na avaliação de competitividade. Por razões conhecidas, o quadro rodoviário dificulta o desenvolvimento do país.” Em recente artigo, o ex-ministro Eliezer Batista propõe um melhor equilíbrio entre os modais, assegurando que tal política de integração representaria enorme economia no frete e redução substancial do custo Brasil. Para Batista, sua opinião é a mesma de 30 anos atrás. Basicamente, ele entende que a queda nos custos invoca a adequação de infra-estrutura de transporte no mapa da produção. Isso vem ao encontro da solução para um dos maiores gargalos do setor: o escoamento agrícola. A expansão da fronteira agropecuária e os constantes recordes de colheita de grãos implicam em uma logística específica para que o país
possa aproveitar, integralmente, cada grão coletado. Na defesa pela integração entre o transporte rodoviário e outros modais, especialmente o ferroviário, Batista resume sua sugestão em uma frase definitiva: “A chave da logística é transformar a distância física em distância econômica”. Para o ex-ministro, a Vale é um exemplo da aplicação dessa regra, cujo modelo pode servir para políticas de logísticas a ser introduzidas no Brasil. “O agrobusiness, em ascensão freqüente, deveria se utilizar do modelo da Vale para reduzir seus custos de frete”, recomenda o ex-ministro de Minas e Energia. Sua análise se ampara em um absurdo que atesta a nocividade do Custo Brasil: transportar um produto de um ponto do Centro-Oeste para o litoral é muito mais caro que levá-lo, via rota marítima, até o mercado asiático. O economista e consultor Maurício Pimenta Lima, do Centro de Estudos em Logística, é outro defensor de investimento no modal ferroviário. “Uma pesquisa do CEI/Coppead, em 2004, já sinalizava para novos incentivos ao transporte férreo, objetivando um aumento no volume de cargas desse modal”. Na análise da pesquisa das duas instituições, Lima detectou uma dicotomia econômica interessante: “Os valores dos fretes rodoviários praticados no Brasil são bastante baixos. No entanto, a falta de infra-estrutura adequada, aliada a problemas de capacidade e disponibilidade, muitas vezes, inviabiliza o transporte
de cargas por outros modais freqüentemente mais adequados à distância e ao tipo de produto. Assim, o resultado é um frete alto para quem paga, mas baixo para quem recebe”. Há uma flagrante imobilidade do setor público em encontrar, apresentar e executar soluções para reduzir ou até mesmo eliminar o famigerado Custo Brasil. O consultor autônomo Fabrício Rodrigues Xavier lembra que a última iniciativa nesse sentido ocorreu no governo Collor de Mello, em 1988. A SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos) da administração trabalhou exaustivamente em cima de um modelo de infra-estrutura que considerasse o transporte, a telemática e a energia. Para Xavier, essa conjunção daria origem a um plano logístico integrado para todo o país, tornando eficiente e barato o transporte de mercadoria. Depois, nenhum outro governo se atreveu a tanto, o que comprometeu a política transportadora do país com conseqüências terríveis para diversos segmentos da economia. Um estudo da empresa Macrologística, do engenheiro Renato Pavan, remanescente da SAE naquele período, garante a redução do Custo Brasil em até R$ 22 bilhões/ano, caso o governo ou a iniciativa privada ordenassem investimentos em 70 projetos setoriais, divididos nas macrorregiões econômicas. Quase todos os projetos indicados por Pavan coincidem com o Plano da CNT e com as opções de investimento do PAC e de governos estaduais.
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negócio é torcer para que o gover no e os em pre sá rios, através do PAC, possam realmente acelerar as obras e evitar que o apagão exista”. O que Lourenço deseja é que o modal rodoviário receba, de imediato, investimentos que al can cem a cons tru ção de 6.876 quilômetros de rodovias, a duplicação de 3.214 quilômetros e a recuperação de 32 mil quilômetros de rodovias federais, além da instalação de dispositivos de segurança e de postos de pesagem. Tudo isso está contido na lista de prioridades do PAC. Para o Dnit, as obras exigem R$ 8 bilhões para aplicação somente este ano. O temor de todo o setor transportador é se o dinheiro será liberado, se haverá vontade política, se a burocracia será superada e se as empreiteiras cumprirão o prazo de conclusão das obras. “Se isso não ocorrer, teremos mais um ano de problemas no escoamento de mercadoria, prejuízos e irreversíveis danos à economia, com perdas na exportação de nossos produtos”, aponta estudo do Instituto de Matemática e Estatística da USP (Universidade de São Paulo). Amparados por outras pesquisas desenvolvidas por uni-
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MODAL HIDROVIÁRIO Projetos que somam R$ 964 milhões para
versidades e entidades ligadas ao setor, técnicos concordam com o alerta sobre o caos na logística transportadora, cujo agravamento irá emparedar a eco no mia bra si lei ra, exa ta men te no seu me lhor momento, em mais de três décadas. O alarme se centra no cha ma do Cus to Bra sil, cuja com po si ção en glo ba te mas tão recorrentes como sucateamento de estradas (fenômeno que se mantém há mais
de 30 anos ou por seis governos), desperdício, perdas de grãos, custo de fretes, quebra de equipamentos, segurança, falta de investimento ou aplicações inadequadas. Esses e outros fatores alimentam esse custo a ponto de lançar no ralo uma montanha de dinheiro. As cifras são de atormentar qualquer governante ou empresário: quase R$ 77 bilhões/ano ou 12,6% do PIB. A palavra Investimento é o
mantra recitado pelo setor de transporte. Sem dinheiro – ou com orçamentos limitados – ninguém vislumbra solução, a médio prazo, capaz de tirar o país da corrente imobilizadora do custo e da falta de competitividade, fatores que limitam o crescimento econômico. O PAC ainda é visto como “salvador da pátria” e é apresentado como um programa capaz de dar maior equilíbrio à matriz de transportes, através da di-
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GUILHERME FILHO/SECOM MT
DEISI REZENDE /AJB/FUTURA PRESS
melhorias de portos não saíram da mesa
“O negócio é torcer para que o governo acelere as obras e evite o apagão” LOURENÇO SOUZA, CAMINHONEIRO
CHÁ DE CADEIRA O caos aéreo ainda persiste e atrasa a vida dos passageiros
visão dos recursos já definidos pelo governo federal. Dos R$ 55,3 bilhões – dinheiro a ser gasto até 2010 – R$ 24,3 bilhões virão da iniciativa privada. Da partilha do bolo, o setor ferroviário terá R$ 7,8 bilhões, embora estudos feitos pela ANTF (Associação dos Transportadores Ferroviários) mostrem que o investimento deveria ser superior a R$ 11 bilhões. Com o programa, o governo federal sonha com 2.500
qui lô me tros de tri lhos até 2010. Tal dimensão irá ampliar a cobertura geográfica da infra-estrutura e alterar a forma de se transportar mercadoria. O sonho, porém, tende a ser um angustiante pesadelo se o PAC não incrementar diversas ações no âmbito do Dnit, tanto em rodovias e ferrovias, quanto em hidrovias e portos. O investimento em ferrovias, ano passado, foi de R$
1,6 bilhão, com o objetivo de construir 111 quilômetros de ferrovias em 2007 e chegar ao ano de 2010 com mais de 2.500 quilômetros de novas ferrovias prontas para operação. No modal hidroviário, em 2007, foram de R$ 964 milhões para incrementar melhorias em 12 portos, a construção de 67 portos fluviais e da eclusa de Tucuruí. Nada, porém, ainda saiu das mesas de projetos. ●
HISTÓRIA
AS RODOVI
MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES/DIVULGAÇÃO
TRANSPORTE BRASILEIRO ESTÁ INTIMAMENTE LIGADO AOS CICLOS DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
AS E O PAÍS
O INVESTIMENTO EM INFRA-ESTRUTURA CAIU DE
POR PEDRO
BLANK
presidente era Washington Luís e corria o ano de 1928 quando o Brasil deu um passo decisivo para eleger o sistema rodoviário como o seu principal meio de transporte. Naquele ano, o país inaugurou sua primeira rodovia pavimentada, a antiga RioPetrópolis, hoje chamada de Washington Luís. De lá para cá, são 80 anos que deixaram as rodovias no olho do furacão de um debate importante feito por transportadores, governo e especialistas: o investimento feito em estradas é suficiente? A história do transporte brasileiro personifica cada ciclo econômico do país. Em seu livro “Transporte no Brasil: A Opção Rodoviária”, a historiadora e pesquisadora Margarida Cintra pontua que o início da trajetória do transporte no país ocorre no período açucareiro, nos tempos de colônia, quando barcos e navios eram fundamentais para a chegada de escravos e para a exportação de açúcar para a Europa. Margarida, em seu livro, conta que o sistema foi sendo aperfeiçoado. Quando a Família Real portuguesa chegou ao Brasil, em 1808, ficou patente a urgência de uma estrada entre Vila
O
MUDANÇA A Constituição de 1988 desvinculou os recursos dos fundos federais específicos
Rica (atual Ouro Preto) e o Rio de Janeiro, que se tornaria o primeiro grande eixo para escoamento de mercadorias. Outro grande marco na história do transporte ocorreu na segunda metade do século 19, com as estradas de ferro ganhando vida e, assim, interligando o litoral às áreas centrais. “A alta produtividade e a lucratividade das novas lavouras – principalmente às ligadas ao café – exigiram a ocupação de terras distantes”, destaca Margarida. E foram as
rodovias, como ela lembra, que possibilitaram a aceleração da industrialização de São Paulo. O modal ferroviário, conforme explica Margarida, não teria sucesso no Brasil. Ela entende que o fracasso da maioria das ferrovias brasileiras começou quando as empresas ficaram impossibilitadas de saldar os juros dos empréstimos obtidos junto ao governo federal. Isso fez com que os equipamentos e as propriedades fossem parar nas mãos do Estado. “O avanço
do projeto de industrialização, a partir de 1930, a integração do mercado interno e a centralização estatal dos investimentos para o crescimento do país levaram ao abandono da prioridade para a ferrovia”, afirma. Para o professor de economia e administração da USP (Universidade de São Paulo), Flávio Saes, a Segunda Grande Guerra Mundial também contribuiu para o declínio das ferrovias no Brasil. “Grande parte das concessões privadas de ferrovias já vinha em
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2% DO PIB NOS ANOS 70 PARA 0,2% EM 2006 RODRIGO COCA/FUTURA PRESS
INTEGRAÇÃO
O fracasso da Transamazônica
para as rodovias, o que diminuiu a manutenção e a construção de novas vias
declínio antes da guerra. Esse processo se agravou com a impossibilidade de se substituir materiais desgastados durante o conflito mundial. Ao fim da guerra, houve planos de recuperação das ferrovias, mas a urgência de se ampliar o sistema de transporte, para uma economia que acelerava seu crescimento, em especial nos anos 50, exigia uma rede de transporte diferente. Não só do litoral para o interior, mas também ligando os Estados internamente. Junte a isso a melhoria
dos veículos de carga automotores (caminhões de maior porte) e temos uma ‘conspiração’ para a opção pela rodovia”, afirma Saes. Depois de tudo isso, em 1945, a Lei Joppert, nome do ministro da Viação e Obras Públicas na época, engenheiro Maurício Joppert, no gabinete interino do presidente José Linhares (outubro de 1945 a janeiro de 1946), fez nascer o FRN (Fundo Rodoviário Nacional), usado para a construção de rodovias. Mais dois fatores ao longo dos anos impulsio-
O governo militar brasileiro (1964-1985) tinha como meta a integração na cio nal, além de uma enorme demonstração de força, quando idealizou a Transamazônica. A rodovia fazia parte do Programa de Integração Nacional e sua construção foi iniciada pelo DNER (Departamento Nacional de Es tra das de Ro da gem), em 1970, durante o governo do general Emílio Garrastazu Médici, e durou qua tro anos. O pro je to previa a construção de 6.000 km de estrada para unir o litoral nordestino à fronteira com o Peru. Hoje, a Transamazônica tem 2.500 km, pouco mais de um quar to do previsto, porém, a estrada possui apenas 250 km pavimentados e oferece con di ções pre cá rias de trá fe go, prin ci pal men te nas épo cas de chu va. Para Car los Gui ma rães, professor e pesquisador
da Unicamp, com o fracasso do processo de integração, a estrada perdeu muito de sua importân cia. “So men te com mudanças no perfil econômico da região, por ela atendida, sera possível levar algum investimento em sua melhoria e eventual expansão, de forma semelhante ao que ocorre com a rodovia CuiabáSantarém”, afirma. Já o professor de história da engenharia João Pinto Furtado, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), afirma que, mesmo com poder de investimento, o distanciamento e a má gestão contribuíram para o abandono da obra. “Mesmo havendo capacidade de investimento do Estado, a rodovia foi abandonada mais por falta de manutenção que por má gestão. A floresta destruia mais rápido a estrada do que se podia fazer manutenção”, diz Furtado.
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UMA HISTÓRIA PELAS RODOVIAS Confira as principais vias construídas no Brasil • Caminho do Mar Ligação: São VicenteSão Paulo Idealização: 1560 Início da obra: 1661 Hoje, a estrada está fechada para tráfego • Estrada Normal da Serra da Estrela Ligação: Porto da Estrela no Rio de Janeiro - Petrópolis Início da obra: 1841 Extensão: 14 km • Estrada União e Indústria Ligação: Petrópolis Juiz de Fora Início da obra: 1856 Extensão: 144 km • São Paulo-Campinas (antecessora da Anhangüera) Ligação: São Paulo - Campinas Início da obra: 1916 Extensão: 32 km • Dutra Ligação: São Paulo Rio de Janeiro Idealização: 1724 Início da obra: 1928 Extensão: 508 km • Via Anchieta (SP) Ligação: São Paulo - Santos Início da obra: 1939 Extensão: 55,9 km • Anhanguera Ligação: São Paulo - Igarapava Início da obra: 1976 Tamanho: 427 km • Transamazônica Ligação: litoral nordestino, fronteira entre Brasil e Peru Início da obra: 1970 Tamanho: Previstos 6.000 km, possui 2.500 km e 250 km pavimentados
PRIVATIZADA Rodovia Fernão Dias passou por processo de licitação e será
naram para que o Brasil usasse as rodovias em seu processo de crescimento econômico no século 20. A criação da Petrobras, que passou a produzir asfalto em grande quantidade, e a implantação da indústria automobilística nacional em 1957. Segundo estudo desenvolvido pelo Cepa (Centro de Estudos e Pesquisas Aplicadas da USP), as rodovias brasileiras surgiram na década de 20 em programas de combate às secas no Nordeste do país. Em Minas Gerais, o então governador Juscelino Kubitschek, que ocupou o Palácio da Liberdade no período de 1951 até
1955, tinha como plano de governo o binômio energia e transporte. Por meio do FRN, de empréstimos internacionais e dinheiro do caixa do Estado, JK construiu 16 estradas-tronco – mais de 3.000 km – permitindo integrar as regiões de Minas e facilitando o acesso a outros Estados. JK cuidou também dos transportes aéreos, já que era um apaixonado pela aviação – ele chegou ao final de seu mandato com 75 campos de pouso para naves de pequeno e médio porte. Quando assumiu a Presidência, JK, além de construir uma nova capital, deu continuidade
às obras rodoviárias. Segundo o professor de engenharia da Unicamp (Universidade de Campinas) Carlos B. Guimarães, JK seguiu o processo iniciado com a Lei Joppert. “JK, dentro desse arcabouço legal – o FRN – simplesmente deu continuidade à expansão da malha rodoviária, o que já vinha acontecendo desde 1945”, afirma. O governo JK construiu 20 mil quilômetros de estradas e pavimentou 5.600 km de rodovias já existentes, abrindo caminhos para a nascente indústria automobilística nacional. O Brasil continuou sua expan-
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administrada pela iniciativa privada, que cobrará pedágio em sua extensão
O GOVERNO JK CONSTRUIU
20 MIL QUILÔMETROS DE ESTRADAS
são rodoviária de tal modo que chegou a 1980 com 47 mil quilômetros de estradas federais pavimentadas. Porém, a Constituição de 1988 desvinculou os recursos dos fundos federais específicos para as rodovias. Isso ocasionou uma diminuição significativa na manutenção e construção de estradas no Brasil. “Mesmo com os incentivos criados nos anos seguintes, como o selo-pedágio, em 1989, e o imposto do petróleo, em 1991, os recursos foram caindo gradativamente devido a sérias restrições fiscais impostas ao governo federal”, diz Guimarães. O fim do FRN reduziu o inves-
timento em infra-estrutura, de 2% do PIB aplicados na década de 70 a 0,2%, índice que permanece até 2007, quando houve um aumento ínfimo e passou para 0,22%. Paralelamente à perda de recursos, a pressão para a redução do tamanho do Estado e sua saída de áreas que havia ocupado a partir de 1930 também contribuíram para o abandono das rodovias e da infraestrutura do transporte em geral. “Nos anos 90 a privatização ganhou força no Brasil, em especial porque se retomou o fluxo de capitais externos para a América Latina. As privatizações serviram para fazer ‘caixa’ para o governo e, no caso das rodovias, transferir diretamente para o usuário o custo da manutenção e dos investimentos no sistema”, diz Saes. Com o atual estado das rodovias brasileiras, as privatizações, via concessões, podem diminuir o Custo Brasil. “Em tese, o pedágio aumentaria o custo, já que é um valor a mais que se soma na composição final do frete. Entretanto, quando se coloca a questão em termos de se ter uma rodovia em boas condições operacionais com pedágio ou uma rodovia em péssimas condições, mas sem pedágio, do ponto de vista do operador rodoviário, poderia haver um benefício final
com a diminuição dos custos operacionais. Com as rodovias em boas condições, mesmo pagando pedágio, pode-se ter diminuição do custo final. Dentro desse contexto, o pedágio poderia até diminuir o custo Brasil”, afirma Guimarães. Para o engenheiro da Unicamp, as privatizações somente solucionariam os problemas de rodovias com grande fluxo de veículos. “As novas concessões de estradas, como a Fernão Dias e a Regis Bittencourt, solucionam o problema dessas rodovias e de outras com o mesmo perfil de tráfego, mas não é uma solução para toda a malha rodoviária, já que ela, em sua grande extensão, não oferece atrativo econômico para a privatização devido aos seus atuais volumes de tráfego.” Ainda segundo Guimarães, os investimentos para solução do problema também não são pequenos. “A malha rodoviária federal compreende hoje uma extensão de 56 mil quilômetros pavimentados, dos quais 7.300 km concedidos à iniciativa privada e 48.700 administrados pelo Dnit. Segundo a Pesquisa Rodoviária CNT, 67,7% desses 56 mil quilômetros estão em estado crítico. Os custos para se restaurar essa parte da malha seriam de US$ 120 mil/km, o que daria um custo global da ordem de US$ 4,5 bilhões.” ●
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FERROVIAS
m um mesmo dia, em dezembro de 2007, o trem em que viajavam os ministros das Cidades, Márcio Fortes, e o da Secretaria Nacional de Portos, Pedro Brito, foi baleado duas vezes por traficantes da favela Jacarezinho, na zona norte do Rio. Ninguém ficou ferido, mas houve pânico. Os dois ministros e uma comitiva formada por dirigentes de entidades ferroviárias e jornalistas vistoriavam obras de remoção de favelas localizadas às margens da ferrovia. A invasão da faixa de domínio de ferrovias é um dos principais gargalos ferroviários existentes hoje no Brasil. De acordo com dados da ANTF (As so cia ção Na cio nal dos Transportadores Ferroviários), há hoje pelo menos 434 invasões, envolvendo 200 mil famílias, em trechos das malhas concedidas. Para o diretorexecutivo da ANTF, Rodrigo Vilaça, a realocação dessas comunidades irregulares é urgente. “O problema poderia ser solucionado com a efetivação do Convênio de Coopera ção Téc ni co-Ope ra cio nal”, diz o dirigente, que também
E
GARGALOS
ESQUECIDOS PASSAGENS DE NÍVEL E INVASÕES DE FAIXA DE DOMÍNIO NÃO SÃO CONTEMPLADAS PELO PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO POR EDSON
estava no trem atacado pelos traficantes. O convênio, firmado em maio de 2004, por meio dos ministérios das Cidades e dos Transportes, com a Caixa Econômica Federal e a RFFSA (Rede Ferroviária Federal), objetiva a alienação de imóveis não operacionais pertencentes à RFFSA. Os recursos arrecadados seriam usados em programas de regularização fundiária e provimento de habitação. A existência de 2.611 passagens de nível (cruzamentos de ferrovia com ruas, avenidas, es-
CRUZ
tradas ou caminhos), em estado crítico, é mais um gargalo ferroviário. No Brasil, há 12,4 mil passagens de nível ao longo de ferrovias, em média, uma a cada 2,3 km. As passagens provocam a redução da velocidade das composições. Em média, nas ferrovias brasileiras, os trens trafegam em uma velocidade de 32 km/h e nas passagens de nível as locomotivas reduzem a velocidade para 5 km/h. Essa redução compromete o desempenho das locomotivas e promovem um alto custo de manutenção, sem contar os
prejuízos decorrentes do aumento do tempo no percurso do transporte de carga. As concessionárias entendem que os administradores públicos são os principais responsáveis pela solução dos problemas. “As ferrovias chegaram primeiro, o ônus tem que ser assumido por quem veio depois”, afirma Vilaça. Para o dirigente, o governo federal precisa implementar um programa específico de obras nesses cruzamentos e priorizar as ações nas passagens mais críticas. Os recursos seriam
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FERNANDO VIVAS/ AG. A TARDE/ FUTURA
INVASÃO Pedestres atravessando trilhos, como em Salvador (BA), são cenas comuns pelo país
viabilizados através do Pronurb (Programa Nacional de Segurança Ferroviária em Áreas Urbanas), que permitiria o aumento da velocidade nesses locais. A remoção das famílias e as obras em passagens de nível aumentariam também a segurança de motoristas e moradores residentes às margens das rodovias. Como os trens precisam de uma maior distância para frenagem, a faixa de domínio tem que ser maior. Desde a privatização do sistema ferroviário brasileiro, há 11 anos, houve uma redução do número de acidentes. Em 1997, o índice de acidentes por milhão de trens quilômetros era de 75,5 e ficou em 14,4 em 2007. Houve uma redução de 80,9%. Uma das passagens de nível mais críticas apontadas pela Pesquisa Ferroviária da CNT se encontra em Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte. No centro da cidade, motoristas e pedestres são obrigados a esperar até 10 minutos antes de ultrapassar a passagem de nível localizada na avenida Pará de Minas. Moradores reclamam que não há cancelas, sirene, nem guarita com segurança. Além dos gargalos, a expansão da malha ferroviária é inevitável. O Brasil possui 28 mil quilômetros de trilhos, 10 mil a
CARÊNCIA
Faltam terminais integrados O Plano de Logística da CNT identificou como uma das principais carências do transporte ferroviário brasileiro a falta de terminais de integração. “Há um pouco mais de 400 terminais no Brasil. A maior parte foi construída depois que as concessionárias assumiram o gerenciamento das ferrovias há dez anos”, diz o gerente de Transportes Hidroviários e Marítimos da Secretaria de Infra-Estrutura de Santa Catarina, Sílvio dos Santos. De acordo com o gerente, o principal desafio do transporte multimodal é garantir a eficiência do sistema como um todo, adotando uma abordagem integrada. “Não se pode pensar em privilegiar um modal específico, mas, sim, garantir o máximo desempenho de cada um dos modais envolvidos.” A eficiência só é conseguida com planejamento detalhado na construção dos terminais de transbordo para que se evite improvisações que resultam na ineficiência do sistema. Para ele, um dos gargalos ferroviários do sul do país se constitui no pouco aproveitamento dos trens que fazem o percurso entre São Paulo e Rio Grande do Sul e apenas passam por Paraná e Santa Catarina. “Inúmeros produtos que poderiam ser escoados por trens hoje são transportados por caminhões. Dos 4,5 milhões de toneladas que passam por ferrovia por Santa Catarina, zero tonelada fica no Estado”, diz o gerente
de transportes. Maior pólo industrial de alimentos embutidos do país, a produção de Santa Catarina poderia ser transportada para o Sudeste e Centro-Oeste em contêineres frigorificados. “Os contêineres seriam importados, mas em pouco tempo os custos seriam compensados.” O diretor-executivo da ANTF, Rodrigo Vilaça, diz que a intermodalidade passou a ser mais freqüente a partir de 2003. “Os usuários começaram a enxergar a ferrovia como uma alternativa econômica de transporte”, diz Vilaça. Os produtos mais adequados para o transporte em ferrovia passaram a ser os de grande volume, baixo valor agregado e que transitem em um trecho entre 700 km e 1.500 km. Nos últimos quatro anos, a ANTF identificou um aumento do volume de transporte de minérios, produtos ligados ao agronegócio (complexos da soja e da cana-de-açúcar) e cargas conteineirizadas. Além de diminuir custos, o transporte ferroviário tem se transformado em um verdadeiro marketing de responsabilidade social. A Vale, por exemplo, tem utilizado, em fase experimental, dormentes de material alternativo reciclado, como plástico e borracha, em trechos entre Vitória e Belo Horizonte e na ferrovia de Carajás (PA), substituindo os antigos dormentes de madeira. Os novos são feitos em polietileno de alta densidade, fibra de vidro e até com pneus usados.
menos do que na época da funda ção da RFFSA, em 1958. Como não houve manutenção, muitos trechos foram desativados. Segundo estimativa da ANTF, seriam necessários pelo menos 55 mil quilômetros para atender à demanda de um país de grandes dimensões como o Brasil. Atualmente, as ferrovias respondem por apenas 26% da matriz de transporte brasileiro. Em países com faixa territorial semelhante, o transporte ferroviário atinge uma grande importância. O modal representa 43% do transporte de cargas e passageiros nos Estados Unidos, 46% no Canadá, 81% na Rússia e 43% na Austrália. A referência internacional é de 42%. A necessidade de expansão também é justificada pelo aumento da movimentação de cargas. As estatísticas da ANTF indicam que, em 2007, as ferrovias movimentaram 445,2 milhões de TU (toneladas úteis). “Atualmente, as ferrovias operam desde mercadorias refrigeradas até itens delicados, como vidro, por exemplo,” afirma o presidente do Conselho da ANTF, Júlio Fontana Neto. Para exterminar os gargalos e expandir a malha ferroviária brasileira, sem contar com a participação de empresas priva-
ABANDONO Falta de
das, seria necessário um investimento de R$ 11 bilhões. Entre 1997 e 2006, nos nove primeiros anos do sistema de concessão, o governo investiu apenas R$ 649 milhões em ferrovias. Entre 2002 e 2006, a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) arrecadou R$ 590 milhões. A arrecadação em tributos federais, estaduais e municipais, nessa década de atuação das concessionárias, atingiu R$ 3,7 bilhões, além de RS$ 2,6 bilhões pagos a título de concessão e arrendamento pelas 11 empresas que passaram a gerir o transporte ferroviário no Brasil. “Isso indica que o baixo
AS 13 OBRAS DO PAC FERNANDO VIVAS/AG. A TARDE/FUTURA PRESS
LOCAL São Paulo (SP) Barra Mansa (RJ) Araraquara (SP) Guarapuava (PR) São Francisco do Sul (SC) Joinville (SC) Rondonópolis (MT) Salgueiro (PE) Cachoeira (BA) Camaçari (BA) Juazeiro (BA) Palmas (TO) Anápolis (GO)
OBRA Tramo norte do Ferroanel Adequação do ramal Contorno e pátio ferroviário de Tutóia Variante ferroviária Contorno ferroviário Contorno ferroviário Trecho entre Alto Araguari e Rondonópolis da Ferronorte Ferrovia Nova Transnordestina Contorno ferroviário entre Cachoeira e São Félix Variante ferroviária entre Camaçari e Aratu Acesso ferroviário ao porto Trecho da ferrovia Norte-Sul entre Araguaia e Palmas Trecho da ferrovia Norte Sul entre Anápolis e Uruaçu
Fonte: ANTF
RAIO X DAS PASSAGENS DE NÍVEL Número total de PNs Número de PNs em pontos críticos Acidentes Velocidade média de trens nas PNs População média em torno das PNs
12.400 2.611 14,4 (*) 5 km/h 200 mil famílias (**)
* Por milhão de trens quilômetro em 2007 ** População que invade as faixas de domínio da malha ferroviária brasileira Fonte: ANTF (Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários)
investimentos da União compromete a manutenção de trechos ferroviários
investimento não está relacionado com a falta de receitas”, diz Rodrigo Vilaça. O PAC (Programa de aceleração do Crescimento) prevê a destinação de R$ 7,8 bilhões para as ferrovias até 2010, com obras prioritárias. “Mas a exterminação dos gargalos, como as passagens de nível e as invasões de faixa de domínio, não são contempladas pelo programa”, diz o diretor-executivo da ANTF. De acordo com Vilaça, o grande problema do PAC se refere à continuidade. “O melhor seria que fosse realizado um programa de Estado e não de governo. Não há nenhuma ga-
rantia que ele vai prosseguir ao término do governo Lula.” As 11 concessionárias das fer rovias bra si lei ras in je ta ram R$ 14,4 bilhões nos primeiros dez anos de atuação. O di nhei ro foi uti li za do na aquisição e recuperação de material rodante, em melhorias na via permanente, na introdução de novas tecnologias, na capacitação de pessoal e também em campanhas educativas de segurança. Em 2008, as empresas devem injetar mais R$ 2,5 bilhões. Para facilitar o investimento, Vilaça diz que é preciso o governo repensar os critérios
de concessão de crédito. “As empresas concessionárias não têm condições de oferecer garantias a empréstimos junto ao BNDES porque não são proprietárias de bens ativos. Elas operam o transporte ferroviário mediante contrato de arrendamento”, declara o dirigente. Já a redução da carga tributária viria com a instituição do Retrem, um imposto que tem como finalidade desonerar produtos e componentes importados a fim de garantir a continuidade dos investimentos do processo de expansão das ferrovias. Os impostos chegam a 54% em algumas situações,
como no caso dos trilhos, que têm que ser importados da China, Índia, Polônia e Áustria. A fabricação no Brasil é inviável em função da escala. As empresas concessionárias reivindicam ainda a reestruturação da PFF (Polícia Ferroviária Federal) para fazer o policiamento ostensivo à margem das ferrovias e a instituição de um Programa de Segurança Ferroviária que se responsabilizaria pela sinalização, construção de viadutos, pontes e contornos ferroviários. Medidas que ajudariam enormemente o Brasil a entrar de vez ● nos trilhos do progresso.
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AQUAVIÁRIO
POTENCIAL
SUBUTILIZADO BRASIL USA APENAS 15 MIL QUILÔMETROS DE RIOS PARA TRANSPORTE, METADE DELES NA REGIÃO DO AMAZONAS POR
om uma rede hidrográfica de 42 mil quilô me tros de ex ten são, dos quais 27 mil navegáveis, o Brasil subutiliza o potencial que naturalmente tem para o transporte aquaviário. Tanto que, desses 27 mil quilômetros de rios, apenas 15 mil, ou 55%, são efetivamente utilizados por barcos de transporte, metade deles na região do Amazonas, onde essa modalidade de deslocamento é tradição. O PAC (Programa de Acelera ção do Cres ci men to), via BNDES, prometeu até R$ 40 bi-
C
MARCELO FIUZA
lhões para infra-estrutura hidroviária. Entretanto, a realidade é outra quando o assunto é a liberação dos recursos. Em 2007, o Mi nis té rio dos Transportes investiu R$ 254,4 milhões em transportes hidroviários e trabalha com orçamento de R$ 366,5 milhões para 2008. Ou seja, valores muito aquém do que o próprio governo reconhece ser necessário investir no modal, ou mesmo o contabilizado, por exemplo, pelo Plano CNT de Logística. Em 2007, o estudo da CNT elencou 49 propostas para melhoria do transporte
hidroviário, com investimento mínimo de R$ 25,6 bilhões a médio prazo. E enquanto os recursos não são efetivamente liberados, um dos maiores potenciais para o transporte que o país tem fica praticamente abandonado e quem perde são a economia e o meio ambiente brasileiros. “Perder se perde mui to, porque a hidrovia é um modo de transporte com menor impacto ambiental e de menor custo que o terrestre”, afirma o professor titular em logística de transportes do Departamento de Engenharia Naval e
RIO ACRE
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FOTOS ODAIR LEAL
Bacia hidrográfica brasileira é desprezada pelos órgãos governamentais
Oceânica da Escola Politécnica da USP, Rui Botter, para quem é urgente que se pense em alternativas complementares, como um transporte multimodal que integre ferrovias, estradas e águas. “É uma coisa histórica. Em um quadro comparativo, com sistema integrado de hidrovias, pode-se ter uma redução de custo total de 35% do transporte. Há poucos casos em que a hidrovia vai ligar o centro produtor com o consumidor, então é necessário essa multimodalidade, e o transporte hidroviário tem o menor custo de todos. Sem contar a diminuição do im pac to am bien tal, bru tal mente menor nos rios do que nas estradas. Isso vale também para a segurança, melhor em relação às rodovias. Ou seja, não é o caso de competir entre transporte terrestre e hidroviário, mas criar um sistema complementar.” Segundo o professor, cabe ao governo tomar as rédeas do processo. “É necessário um pouco mais de ação do próprio governo. Esses planos de ação devem ser pen sa dos para 15, 20 anos. No Japão, o planejamento portuário é feito para daqui a 20, 40 anos. Nos Estados Unidos, vão construir um canal paralelo ao rio
Mississipi de mais de 600 km só para desafogar o tráfego do rio. E nós continuamos naquela lengalenga de a cada oito ou quatro anos mudarmos as diretrizes. Os planos de desenvolvimento têm que transcender os governos.” O professor da USP destaca como investimentos necessários obras nas hidrovias Paraná-Tietê, a do Prata (ParaguaiParaná), no sistema hidroviário do Rio Grande do Sul (rios Taquari e Jacuí e lagoa dos Patos), a do Araguaia (GO) e do Tocantins (PA), a do Tapajós (MS) e a do rio Madeira (RO). “Com algum custo adicional, até o rio São Francisco também pode ser utilizado no trans por te hi droviá rio”, diz Botter. Opinião semelhante tem o professor Índio Campos, titular da cadeira de economia da UFPA (Universidade Federal do Pará) e integrante do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos. Para Campos, o investimento na malha hidroviária brasileira seria opção acertada para o escoamento de grãos e minérios do Centro-Oeste brasileiro pelo Norte do país. “Perdemos por não termos uma malha de transportes multimodal capaz de escoar toda a produção de soja e outros produtos
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sem necessariamente precisar passar pelo Sul e Sudeste. Hoje, a soja sai por Paranaguá (PR) ou Santos (SP) e uma das alternativas era exportar pelos rios e hidroferrovias, fazendo chegar esses grãos ao Norte integrando as ferrovias Norte-Sul e Carajás. O dinamis mo se ria mui to maior. Quem efetivamente seria beneficiado seria o Centro-Oeste”, diz o estudioso. Nesse sentido, para o professor Campos, a obra mais importante seria na bacia dos rios Araguaia-Tocantins, para escoamento da produção pelos portos paraenses. Campos destaca especificamente a conclusão das eclusas da represa de Tucuruí. “Alguns pontos do rio Tocantins precisam ser drenados para que navios de maior calado possam passar pela região”, afirma o professor. Detalhe: projetada desde os anos 50, a eclusa de Tucuruí está na lista do PAC, com previsão de conclusão em 2010 e ao custo de R$ 548 milhões, mas o professor Campos é cético quanto à sua finalização. “Concluir essa eclusa é como o asfaltamento da rodovia Transamazônica. Há anos se discute o assunto, mas os recursos não são efetivamente liberados”, afirma o professor.
DESCASO Apesar do anúncio de verbas, setor convive com pouca liberação de recursos
“Com sistema integrado de hidrovias, pode-se ter uma redução de custo de 35% do transporte” RUI BOTTER, professor de logística de transporte
O professor da UFPA também aponta a necessidade de tais obras serem acompanhadas de planos de desenvolvimento econômico. “As eclusas nos rios só funcionariam se todos os outros pontos também estiverem prontos, não adianta ter calhas profundas se há corredeiras no rio. A hidrovia precisa estar efetivamente concluída, ou vamos ficar vendo passar barquinhos de pescador”, diz Campos. “É preciso investimento e que haja pressão política. Há grupos interessados em boas hidrovias, como os pecuaristas e os plantadores de soja, mas há cer tos se to res con tra,
como os mais preocupados com questões ecológicas e que acham que vai aumentar a degradação do cerrado brasileiro, um dos biomas menos protegidos do Brasil. Tudo isso faz com que se exija estudo de medidas para não agravarmos os problemas ecológicos da região.” Atento à questão ambiental, o diretor do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia e ex-reitor da UFPA, Marcos Ximenes, acredita que o investimento na malha hidroviária nacional é certeza de redução de custos de transporte. “A hidrovia do Tapajós (MT) é alternativa de escoa-
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CABOTAGEM
Falta de recursos e burocracia emperram setor Se no interior do país o transporte pelos rios pede atenção, o mesmo acontece no lado do Atlântico. Trafegando em um litoral com dimensões continentais, a navegação de cabotagem brasileira convive com legislação antiga, burocracia e portos com urgente necessidade de modernização. E, claro, faltam investimentos. A Secretaria Especial de Portos da Presidência da República aplicou, em 2007, R$ 650 milhões no setor, dos quais R$ 434,4 milhões vieram do PAC. A SEP prevê para 2008 investimentos da ordem de R$ 797 milhões. Cifras insuficientes para sanar os problemas da área, afirma Meton Soares, diretor da Fenavega (Federação Nacional das Empresas de Navegação Martítima, Fluvial, Lacustre e de Tráfego Portuário). “O problema é que o setor de hidrovias no Brasil foi completamente abandonado durante décadas, enquanto deveríamos ter a consciência de que seria uma fonte de transporte das mais baratas, como é nos EUA e na Europa. Não só nas hidrovias, como também na cabotagem e nos portos. Hoje, em vez de usarmos o sistema roll-onroll-off (no qual o caminhão despeja a carga dentro do barco), fazemos um ‘roll-on caboclo’, em que a barcaça
carrega o próprio caminhão. Perdemos milhões de reais assim. Esse dinheiro do PAC será muito bem-vindo, mas, se fizermos uma análise do que o Brasil precisa efetivamente de investimento para infra-estrutura do transporte hidroviário, esses milhões não significam muito”, diz Soares. Para o dirigente, o setor precisa de “urgente revisão na legislação”. “Devemos rever os agentes envolvidos. Hoje um armador é impedido de construir um terminal de cargas e modernizar os que existem. O setor elétrico deve ser cobrado para cumprir a legislação e não operar os reservatórios de água abaixo das cotas mínimas de navegação. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) tem de rever suas exigências para as barcaças”, diz. Sobre a cabotagem, Soares diz que o país não tem condições de operar corretamente no sistema “hub port seeder”, no qual um grande navio aporta e repassa sua carga para embarcações menores a distribuírem por outros portos. “Devemos incentivar esse sistema de conexão de carga de um porto para outro. Os portos brasileiros não estão preparados para receber os grandes navios inter-
nacionais, que carregam 12 mil, 15 mil contêineres. Só aqueles com até 5.000 contêineres”, afirma o executivo, que denuncia ainda a ausência do empresário brasileiro no setor de cabotagem, apesar de a legislação prever a bandeira nacional nos navios trafegando na costa. “O Brasil chegou a transportar 47% de sua carga em navios de bandeira nacional nos anos 70. Hoje se chegar a 2% é muito. Tem que haver maior participação do empresário nacional na privatização do sistema portuário brasileiro e a desburocratização da documentação”, defende Soares. É preciso vontade política para o Brasil voltar a ter uma marinha mercante forte”, afirma. Opinião semelhante tem o professor de logística de transportes Rui Botter, da USP. O que falta, no meu ponto de vista, é um pouco de desregulamentação para que tenhamos portos rápidos para a cabotagem. Os por tos não deve riam ser con si de ra dos adua nei ros para cabotagem, mas, sim, como balanças. “E hoje há todo um pro ce di men to como o da importação e exportação quando, na verdade, está se transportando mercadoria de um Estado para outro.”
mento de minério. É muito mais conveniente levar a soja do Mato Grosso pelos rios da Amazônia e descer pelo Atlântico do que transportá-la até os portos do Sudeste. Mas a eclusa de Tucuruí vem sendo postergada desde a década de 80 e isso tem causado problemas para a região. Já ouvimos várias vezes anúncios de que o governo fará esse investimento e ele não foi concluído”, afir ma Xi me nes, para quem qual quer in ter ven ção na Amazônia deve passar por um processo de discussão. “O mecanismo correto seria empreender na Amazônia com preocupação de sustentabilidade e que beneficie grande parte da população, diferentemente do que é feito hoje, o tradicional ‘pé na porta’, no qual o governo decide juntamente com os interesses de grandes empresas quais obras serão feitas. Precisamos mobilizar também a sociedade civil e os movimentos sociais para discutir o assunto e cobrar posições do governo em termos reais e operativos.” Pro cu ra do pela re por ta gem, o superintendente de navegação interior da Agência Nacional de Transportes Aquaviários, Alex Oliva, não aten● deu à solicitação.
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AVIAÇÃO
SEGURANÇA
PRECÁRIA ESPECIALISTAS APONTAM OS PROBLEMAS QUE RESULTARAM NA CRISE AÉREA DO PAÍS POR
EDSON CRUZ INSEGURANÇA
m ple na flo res ta amazônica, o Boeing737-800 da Gol, que fazia a rota ManausRio de Janeiro, no vôo 1907, es pa ti fou-se de pois de um choque contra um jatinho Legacy e matou 154 pessoas, em setembro de 2006. Menos de um ano depois, em julho de 2007, o Airbus A320 da TAM, que rea li zava o vôo 3054, chocou-se contra o prédio da sua própria companhia logo depois de pousar no aeroporto de Congonhas, em São Paulo. O pior acidente aeronáutico do Brasil matou 199 pes-
E
soas. As duas tragédias escancararam uma série de deficiências e puseram em xeque o sistema aeronáutico do país, até então considerado um dos mais eficazes do mundo pelo governo brasileiro. Pelo menos cinco problemas foram identificados imediatamente pelos especialistas, após a deflagração da crise aérea: os aeroportos são deficientes, faltam controladores aéreos, os recursos do setor são mal gerenciados, as comunicações por rádio falham e os radares têm zonas cegas. No caso dos controla-
dores de vôo, esses profissionais usa ram os aci den tes para iniciar uma greve branca (a Operação Tartaruga) para chamar atenção para o problema e, em conseqüência, decretaram o caos na aviação brasileira, o famigerado apagão aéreo. Os atrasos e cancelamentos de vôos e as filas nos aeroportos se tornaram constantes e intermináveis. Para melhorar a infra-estrutura aeroportuária, o Plano de Logística para o Brasil, proposto pela CNT, prevê a ampliação de 25 aeroportos e a construção de mais dois: um
em Londrina, no Paraná, e o terceiro de São Paulo. Seria necessário um investimento de R$ 7,9 bilhões, mais que o dobro dos R$ 3 bilhões propostos pelo PAC. Um bom começo poderia ser gastar menos em obras vistosas, como reformas milionárias em aeroportos, e bem mais no setor de tráfego aéreo, escondido dos olhos dos usuários, mas bem mais importante para a sua segurança. De acordo com os especialistas, a avaliação de aeroportos é feita em três itens: pátio de estacionamento, pista e
MARCELLO LOBO
Movimentação intensa do aeroporto de Congonhas, em São Paulo, preocupa moradores de bairros próximos, com medo de novos acidentes na região
terminal de passageiros. Pelo menos 9 dos 20 maiores aeroportos brasileiros, que concentram 90% dos vôos, têm problemas relativos a esses quesitos. Mesmo com todas as reformas motivadas pela tragédia envolvendo o avião da TAM em 2007, em Congonhas, o aeroporto de maior movimento do país até então, as derrapagens de aviões ainda são freqüentes e há pouco es pa ço para aco mo dar os passageiros nos terminais. Há anos o aeroporto funciona com um volume acima da sua capacidade. Recebe
600 vôos diários e cerca de 20 mi lhões de pas sa gei ros anualmente. Os mesmos especialistas dizem que o aeroporto poderia receber no máximo 12 milhões de passageiros. Uma alternativa seria a transferência de vôos para Cumbica ou Viracopos ou mudar a logística da malha, levando vôos para outros aeroportos que estão subutilizados, mas esses precisariam de profundas reformas. Um dos aeroportos que poderiam receber os vôos de Congonhas é o de Confins, localizado na região metropoli-
tana de Belo Horizonte. Técnicos da Infrae ro confir mam que o aeroporto está sendo pouco usado. Teria capacidade para atender a 5 milhões de passageiros anualmente, mas a média é de 3,5 milhões. Pelo menos 160 conexões com destino às regiões Norte e Centro-Oeste poderiam passar por Confins. Com um investimento de R$ 7 milhões, o aeroporto estaria adequado para receber esses vôos. O dinheiro seria usado na ampliação de áreas de embarque e estacionamento e na ampliação da pista dos atuais 3.000
metros que passariam a 3.600 metros. No Brasil, há 2.700 controladores, mas de acordo com a ABCT (Associação Brasileira de Controladores de Tráfego Aéreo) seriam necessários mais 800 para que o monitoramento fosse seguro. Os profissionais estão sobrecarregados e controlando mais aviões do que o estipulado no regulamento. Para complicar, as comunicações são falhas. No Cindacta 1 (Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo), que cobre a região Sudeste, nenhuma fre-
VERGONHA
Líder no ranking de atrasos Os aeroportos do país têm que melhorar muito até a Copa do Mundo de futebol em 2014, que deve ser rea li za da no Bra sil. Uma pesquisa da Infraero aponta que 73,5% dos turistas estrangeiros entram no território brasileiro por via aérea. Durante a Copa, 500 mil turistas (10% do que o país recebe anualmente) devem desembarcar em solo brasileiro em um período de 30 dias. De acordo com a empresa que ad mi nis tra os prin ci pais aeroportos do país, as 18 cidades pré-candidatas a sedes do torneio possuem aeroportos internacionais com capacidade para absorver o grande fluxo de turistas e atender à demanda. Os problemas maiores são outros. O que os turistas estrangeiros mais levam em conta ao definir o destino turístico é a pontualidade. Uma pesquisa da con cei tua da revis ta norte-americana “Forbes” indica que três aeroportos brasileiros estão entre os piores do mundo nesse quesito. O aeroporto de Brasília lidera o ranking dos pouco pontuais – em 2007, menos de 27% dos vôos saíram no horário previsto e o atraso foi em mé dia de 52 mi nu tos. Cumbica e Congonhas ficaram em terceiro e quarto lugares. Talvez de olho na Copa, desde o início de abril, a Anac passou a utilizar um
novo referencial para atrasos de vôos. Em lugar dos 60 minutos, referencial utilizado desde o ano passado, a tolerância máxima passou a ser 45 minutos. A partir deste mês, o referencial será novamente reduzido, agora para 30 minutos. Quanto aos investimentos nos aeroportos brasileiros, a expectativa é que se iniciem logo. “O Brasil tem sete anos para sanar seus problemas de infra-estrutura. O mais importante é otimizar esse tempo e planejar e iniciar as obras necessárias o quanto antes”, diz o presidente do Sinaenco (Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva), José Roberto Bernasconi. A entidade representa 12 mil empresas, responsáveis por movimentar 13% do PIB brasileiro. Em se tratando de Copa do Mundo, o Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, deve ser o primeiro a receber melhorias. A Infraero pretende usar R$ 100 milhões para a revitalização do terminal 1 e prevê reparos no sistema elétrico, pisos, climatização e banheiros. A verdade é que poucas vezes um país-sede teve tanto tempo para se preparar para uma Copa do Mundo. Nas últimas três décadas, a Fifa anunciou a sede da competição com seis anos de antecedência. O Brasil tem um ano a mais que pode significar muito, ou ser desperdiçado.
qüência funciona com 100% de clareza. É comum os rádios ficarem inoperantes por até 15 minutos. Ou seja, nesse intervalo, controladores e pilotos ficam incomunicáveis. Segundo dirigentes da ABCT, o governo brasileiro gastou US$ 1,4 bilhão apenas no Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia), mas ainda existem zonas em que não é possível detectar a presença de aviões no céu, as chamadas zonas cegas. O acidente com o Boeing da Gol aconteceu em uma dessas zonas. Os equipamentos também estão ultrapassados. Alguns deles têm mais de 20 anos de uso. “Além disso, faltam softwares modernos”, diz o presidente do Confea (Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia), Marcos Túlio de Mello. Para resolver os problemas de má comunicação e a questão das zonas cegas dos radares, as companhias aéreas estimam que seria preciso um investimento de US$ 50 milhões. O dinheiro serviria para consertar os equipamentos e mantê-los em funcionamento por um bom tempo. Uma solução que tem funcionado em países de grande extensão é o rádio via satélite, que acaba com as possíveis interferên-
TRANSTORNO Passageiros
cias e evita a instalação de antenas em locais de difícil acesso, como a floresta amazônica. Um ou tro pro ble ma foi anunciado pelos dirigentes da Anac (Agên cia Na cio nal de Aviação Civil) que, sem identificar os locais, apontou, no final de março, 175 aeroportos brasileiros com falhas de segurança e que podem ser interdi ta dos ou res trin gi dos nos próximos meses se não houver correções e ajustes. “Apesar disso, não há risco iminente de acidentes, mas é
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LEONARDO ROZARIO/AJB/FUTURA PRESS
são os maiores prejudicados com a crise aérea e o atraso nos vôos no país
necessária uma articulação política para alocar recursos ou até flexibilizar regras para não deixar regiões remotas sem transporte aéreo”, declara o diretor da Anac, Alexandre Barros. Os locais não foram identificados, mas a maior parte dos aeroportos é de pequeno porte. Apenas nove são geridos pela Infraero, que é responsável pela administração dos principais aeroportos do país. Os dirigentes da Infraero não comentaram esse levantamento realizado pela Anac.
“Os pro ble mas ocor re ram porque a administração não fez a ma nu ten ção devi da”, afirma Barros. Ele lembrou que o contingenciamento de verbas e a crise aérea afetaram vários convênios com o governo federal, mas considera que o sistema de investimento utiliza critérios que não priorizam a segurança. O levantamento da agência indicou que muitos dos ae ro por tos com pro ble mas de segurança não estavam incluídos na lista de prioridades dos Estados. As verbas
necessárias poderiam ser repassadas pelo Profaa (Programa Federal de Auxílio a Aeroportos), que teve um orçamento de R$ 100 milhões no ano passado através de parceria entre a Anac e os governos estaduais. “Gostaria de poder dizer que os critérios de destinação desses recursos não são políticos, mas não cabe à agência comentar isso”, diz o diretor da Anac. As falhas de segurança se dividem em problemas de segurança operacional (ligadas à operação de aeronaves, como as condições da pista) e de segurança contra ilícitos (ligadas à prevenção de crimes, como o uso de detectores de metal). Para o presidente do Confea, o caos aéreo era previsível porque faltou planejamento institucional capaz de prever a resolução desses problemas. “O governo afirma publicamente que há R$ 3 bilhões em recursos previstos no PAC destinados ao plano na cio nal de infra-es tru tu ra aeroportuária. A grande pergunta é se esses recursos serão canalizados para as obras de infra-estrutura necessárias e vão colaborar para o aten di men to aos usuá rios atuais, que são 118 milhões e
serão 158 milhões em 2010”, diz Túlio Mello. Especialistas afirmam que as taxas de embarque pagas pelos passageiros perfazem quase R$ 1 bilhão anualmente e também poderiam ser revertidas em investimentos de infraestrutura aeroportuária. Por determinação dos ministérios da Fazenda e do Planejamento, a maior parte desse dinheiro fica retida nos Fundos Aeronáutico e Aeroviário. Eles aumentam o superávit primário nas contas oficiais. Do R$ 1,9 bilhão acumulado no Fundo Aeronáutico em 2006, por exemplo, somente 17% foram efetivamente usados. Em um país de dimensões continentais como o Brasil, o transporte aéreo se tornou fundamental. Dos 118 milhões de passageiros transportados anualmente, pelo menos 70% deles viajam a negócios. O avião se tornou também um dos mo to res da eco no mia brasileira. Na mesma proporção dos passageiros, cresce o volume de cargas transportadas. As mercadorias incluem produtos de alto valor ou pere cí veis que po de riam ser roubadas se seguissem de caminhões ou ônibus pelas precárias rodovias brasileiras, ou perdidas. ●
GOUVÊA JÚNIOR
SEMINÁRIO
FALTA VERBA PLANO CNT DE LOGÍSTICA DISCUTE OBRAS PARA A REGIÃO NORTE região Norte está impossibilitada de crescer e assim atingir níveis superiores de desenvolvimento se não houver investimentos expressivos na infra-estrutura de transporte. Essa é a conclusão das autoridades que participaram, em Belém (PA), do Seminário Regional Norte do Plano CNT de Logística, em abril. Para o empresário Irani Bertolini, presidente da Federação das Empresas de Transportes de Cargas da Amazônia, a logística do transporte na região é “comprometida em sua eficiência por questões básicas, como estradas esburacadas, sem sinalização e acostamento, hidrovias sem eclusas e deficiências em portos e aeroportos”. Os transportadores de cargas e de passageiros, agricultores, pecuaristas, representan-
A
tes da indústria e do comércio crêem que nenhum plano de desenvolvimento possa ser viabilizado sem que antes sejam feitos investimentos significativos no setor. De acordo com o secretário de infra-estrutura de Roraima, Orlando Rodrigues Júnior, não se pode perder a “oportunidade oferecida pela CNT com suas propostas de projetos e de investimentos, de maneira que a região Norte possa sair do esquecimento e trilhar o caminho do desenvolvimento”. Para ele, as dificuldades da região, especialmente em Roraima, um Estado com grande potencial para produção de riquezas e exportação, somente serão remediadas com um sistema de transporte eficiente. O Seminário Regional Norte debateu as propostas do Plano CNT de Logística para a região. A socie-
dade organizada foi convidada a sugerir projetos para serem acrescentados ao plano. Segundo o presidente da Federação das Empresas de Transportes Rodoviários da Região Norte, Francisco Saldanha Bezerra, seriam necessários investimentos de cerca de R$ 223 bilhões para que a logística de transporte no Brasil possa ter um desempenho compatível com o crescimento de 5% ao ano. Segundo estudos da CNT, a região Norte precisa de R$ 35 bilhões para ter uma infra-estrutura de transporte capaz de atender às suas necessidades econômicas e sociais.
Entre as 89 acões propostas pelo Plano CNT de Logística para o Norte estão a ampliação de calado da hidrovia do rio Madeira, em Rondônia, intervenção na BR-364 com a construção de 447 km de rodovia entre Sena da Madureira e Tarauacá, no Acre, pavimentação
de 326 km da BR-156, no Amapá, construção de 785 km da Ferrovia Norte-Sul entre Talismã e Aguiarnópolis, no Tocantins, e recuperação do pavimento da BR-174, desde Rorainópolis (divisa com o Amazonas) até Pacaraíma (divisa com a Venezuela), totalizando cerca de 704 km, em Roraima. Já no Amazonas, o plano prevê a recuperação de 457 km da BR-174, ampliação de calado das hidrovias dos rios Solimões e Madeira e ampliação do Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, em Manaus. No Pará, o projeto inclui a ampliação do aeroporto de Santarém e a construção da eclusa de Tucuruí. O Seminário do Plano CNT de Logística começou em março, no Centro-Oeste. Em maio, o debate será levado para a região Nordeste, para depois seguir para o Sudeste e Sul. ●
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TRATAMENTO DE PRIMEIRA CAMINHONEIROS POSSUEM ATENDIMENTO MÉDICO PARA CUIDAREM DA SAÚDE, PREJUDICADA PELAS ESTRADAS RUINS POR
di fi cul da de enfren tada pelos motoristas, em virtude das péssimas condições das estradas, pode gerar inúmeros problemas de saúde como o estresse e os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (popularmen te co nhe ci dos como Dorts). Por horas a fio ao volante, não raro, enfrentam pato lo gias como hi per ten são, intoxicação alimentar e dermatoses (doenças da pele). Com o objetivo de minimizar as adversidades do caminhoneiro, o Sest/Senat implantou, em pon tos es tra té gi cos da
A
LETICIA SIMÕES
malha rodoviária, 58 Pates (Postos de Atendimento ao Trabalhador nas Estradas). No Ceará, às margens da BR–222, os caminhoneiros têm à disposição o Pate Sobral, onde, há dois anos, o clínico ge ral Vi cen te Lo pes Mon te Neto atende aos motoristas. Segundo o médico, eles se queixam, principalmente, dos Dorts e da gastrite, em virtude do tempo em que passam ao volante e à alimentação desregrada. Neto destaca que o sedentarismo, além da situação calamitosa das rodovias, contribui para a baixa qualidade de vida dos moto-
ris tas. “A re co men da ção é para que eles mudem os hábitos, o que é muito difícil.” O Pate Sobral está localizado nas instalações da Expresso Gua na ba ra (em pre sa de transporte de passageiros), a 220 km da capital Fortaleza. A estrutura permite ao motorista programar a manutenção do caminhão, ao mesmo tempo em que recebe atendimentos médico e odontológico. O gerente da unidade, Rodrigo Saburido, diz que cerca de 200 motoristas são atendidos por mês. “Os trabalhadores em transporte que mais nos procuram são, geralmente, do
sul do país. São profissionais autônomos que carregam frete para empresas prestadoras de serviço da indústria calçadista.” Em Picos, interior do Piauí, o res pon sá vel pelo aten di mento médico no Pate é o clínico Arimatéia de Sá. De acordo com ele, a quantidade de mo to ris tas que apre sen ta quadros de intoxicação alimentar, dermatoses e hipertensão é grande. “A pressão alta dos caminhoneiros, certamente, está ligada às más condições de alguns trechos das rodovias do Nordeste”. Para Sá, recomendar aos ca-
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mi nho nei ros di mi nui ção na jornada é uma “utopia”. “Se as con di ções das es tra das fossem satisfatórias, os motoristas teriam melhor condição de trabalho”. No Pate Sobral, de acordo com Ro dri go Sa bu ri do, os atendimentos odontológico e médico são os mais requisitados pelos motoristas. “Na unidade, são realizadas atividades de assistência médica, com atendimento ambulatorial, assistência odontológica em pronto atendimento, atividades recreativas e ações de de senvol vi men to profis sio nal.” Para ele, a localização do
posto favorece a freqüência dos motoristas. “Sobral é um grande entroncamento rodoviário, ponto de apoio aos trabalhadores que passam pela rodovia. Circula pela BR–222 uma média de 900 trabalhadores autônomos do transporte ao dia.” A BR–222 recebeu classificação regular e ruim na Pesquisa Rodoviária CNT 2007, em seus diversos trechos. Val mir Fer nan des é um desses motoristas que dependem da BR–222 para transportar sua carga. Há 16 anos atuando como caminhoneiro autônomo, ele transporta pro-
dutos alimentícios de Tianguá, interior do Ceará, para o Pará. Fernandes utiliza os serviços do Pate Sobral desde a inauguração, há dois anos. “É um serviço diferenciado para a categoria, que não encontra essa possibilidade em qualquer lugar. Foi a melhor solução para atender às necessidades dos caminhoneiros.” O motorista se diz satisfeito com o atendimento oferecido pelo posto. “O serviço é ótimo e sempre falo sobre o Pate com meus colegas caminhoneiros. Fico feliz em poder contar com o atendimento. É muito importante para os mo-
toristas.” No percurso até a unidade de Sobral, Fernandes enfrenta uma barreira comum para quem trafega pela região. “A BR–316 está intransitável. Na altura do município de Governador Newton Bello, no Maranhão, os buracos tomaram conta da estrada e o riacho que passa pelo local transbordou, levando a pista inteira.” A BR–316 faz parte da lista de estradas que devem receber verbas do Procrema (Programa de Contratação, Restauração e Manutenção por Resultados de Rodovias Federais Pavimentadas), mas antes, em 2003, quando o governo federal lançou o PIR 4 (Programa Integrado de Revitalização), também constou da relação de rodovias que passaram por obras de recuperação. Em cinco anos, pouca coisa mudou. O paranaense Alberto Brustolin está na estrada como caminhoneiro autônomo há 30 anos. Ele também critica a situação da malha rodoviária. “As estradas do Brasil estão precárias. Quando comecei eram muito boas, hoje não tem manutenção”. Atualmente, Brustolin transporta suas cargas pelo Nordeste e, segundo ele, a BR–101, que interliga as principais capitais da região, merece maior atenção
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RAUL PEREIRA/FUTURA PRESS
MELHORIAS Plano CNT de Logística recomenda obras de duplicação e pavimentação da BR–222
das autoridades. De acordo com o caminhoneiro, a má conservação da rodovia dificulta o trabalho dos motoristas. A BR–101 fez parte do PIR 4, mas não consta do Procrema deste ano. Já o Plano CNT de Logística lista obras de duplicação e pavimentação das BRs 101, 222 e 316. Para Alberto Brustolin, o que ameniza o cotidiano dos caminhoneiros que trafegam
na região é a presença dos Pates. “Utilizo esses serviços há dois anos. O atendimento é essencial para os motoristas que circulam pela região. A assistência médica oferecida é excelente.” Em Picos são atendidos, mensalmente, cerca de 160 motoristas. O posto está localizado em um dos maiores entroncamentos do Norte-Nordeste, às margens da BR–316,
a 300 km de Teresina. Jansen Vieira, gerente da unidade, diz que o Pate atende todos os perfis de motoristas: autônomos, motoristas dos transportes urbano rodoviário, interestadual e de cargas. O caminhoneiro autônomo, Antônio Francisco Nascimento, está na estrada desde 1976. Usuário do Pate Picos, Nascimento transporta madeira pela rota Nordeste. Para levar
o carregamento, ele utiliza a BR–230, também conhecida como Transamazônica, onde a situação da malha não favorece o tráfego. “Esse é o ponto mais crítico da malha por onde transporto a carga. A situação dessa rodovia é mesmo bastante precária.” A Transamazônica seria o acesso mais rápido de Picos ao norte do Pará, onde o caminhoneiro busca a carga de madeira. “Agora, tenho de desviar e gasto muito mais tempo indo pela Belém-Brasília.” Nas ci men to é aten di do pelo Pate Picos há cinco anos. “Considero muito importante que esse serviço se espalhe por outras rotas porque oferece uma assistência única aos caminhoneiros.” Para Rodrigo Saburido, gerente de So bral, as uni da des do Sest/Senat funcionam como pontos de apoio. “Os postos passam a ser um local onde os motoristas encontram refúgio até mesmo para uma boa conversa.” Jansen Vieira, gerente de Picos, acredita que as unidades mudaram o panorama dos motoristas. “Hoje, os caminhoneiros são mais assistidos e valorizados. Além disso, podemos realmente dizer que fazemos parte da vida desses profissionais que transportam as riquezas de nosso país.” ●
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CONCLUSÃO
O
CAOS NO LUGAR DA
ESTRUTURA
GOVERNO INSISTE EM PROGRAMAS QUE PRIMAM PELA FALTA DE PLANEJAMENTO EM DETRIMENTO DE PROPOSTAS QUE PODERIAM AJUDAR O BRASIL A CRESCER m país onde mais de 60% do transporte de carga é feito por rodovia perde R$ 24 bilhões anualmente por causa de acidentes que ocorrem em estradas. A crônica falta de planejamento impediu, por décadas, que o Brasil investisse em outros modais de transporte, o que sacrificou uma malha rodoviária obsoleta e ultrapas-
U
sada. Governos consecutivos ignoraram apelos reiterados de quem efetivamente usa a infraestrutura logística nacional: o transportador. O resultado é um prejuízo bilionário que acarreta problemas sociais e econômicos. Solução existe. Em setembro do ano passado, a CNT apresentou ao Brasil o Plano CNT de Logística, o mais
completo estudo jamais feito sobre a infra-estrutura do Brasil. Além de investigar a malha de transporte do país, o plano listou 502 projetos em todos os modais, num total de investimentos de R$ 223,8 bilhões, com uma proposta de rede ideal de infraestrutura que aumenta a integração dos sistemas de transporte, por meio de co-
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MT–208 A rodovia liga os municípios de Alta Floresta, Nova Monte Verde e Nova Bandeirantes
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nexões intermodais. Sua execução possibilitará maior desempenho e menores custos na movimentação de cargas e de passageiros no país. O transportador demonstra que é preciso investir pesadamente em infra-estrutura, privilegiando a multimodalidade. A série de reportagens desta edição especial da revista Transporte Atual mostrou as múltiplas causas dos problemas logísticos nacionais. É um retrato do Brasil, um recorte do caos que o transporte enfrenta, diariamente, em decorrência de uma infra-estrutura abandonada em todas as matrizes e modais. Esse caos que gera prejuízos em diversos setores da cadeia produtiva deixa, também, mais de 2.000 mortos e 30 mil feridos nas estradas e acarreta gargalos imensos de conseqüências desastrosas em todos os demais setores do transporte. A revista conversou com especialistas em transporte, economistas, empresários, caminhoneiros, dirigentes de classe e com representantes do governo federal para tentar dimensionar o tamanho do problema. Problema que começa na morosidade do governo em
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aplicar efetivamente os recursos necessários para a infraestrutura de transporte, como aponta Flávio Benatti, presidente da CNT&Logística. “O Brasil não poderia ficar só no discurso como está hoje, ele deveria se transformar em um canteiro de obras. Temos visto muitos anúncios, mas é uma questão que precisa sair do papel, ter uma gestão mais ativa, mais vontade de fazer acontecer. Caso contrário, iremos ficar nos próximos anos nessa mesma situação, com recursos que não foram alocados enquanto o país vive com tanta necessidade de investimento.” São problemas que podem ser solucionados, basta pôr em prática o Plano CNT de Logística. O investimento de R$ 223,8 bilhões não chega a ser um assombro numa economia do tamanho da brasileira. Países como China, Rússia e Índia, competidores diretos do Brasil no cenário internacional, priorizam investimentos em infraestrutura, chegando, em alguns casos, a destinar montantes que beiram a casa dos US$ 100 bilhões/ano para esse setor, ao passo que no Brasil, a média dos últimos cinco anos, foi de aproximadamente R$ 3,4
MATO GROSSO O Estado
O PLANO CNT DE LOGÍSTICA LISTA 502 PROJETOS E PREVÊ
R$ 223 BI EM RECURSOS
bilhões – ou US$ 2 bilhões – por ano, muito pouco frente às demandas de crescimento que o país reclama. Se o Brasil é a sede da Copa do Mundo de futebol de 2014, a China recebe a Olimpíada neste ano e para isso investiu US$ 70 bilhões em infra-estrutura do transporte, número que contempla apenas os orçamentos dos dois últimos anos. O presidente da CNT, Clésio Andrade, destaca que o Plano CNT de Logística visa integrar o Brasil. “Propomos a integração da ferrovia com a rodovia, com o setor aéreo e com os portos, tornando os setores da economia mais eficientes e criando as condições para que o país possa crescer”. O estudo identifica obras que, em curto, médio e longo prazos, possam adequar a infra-estrutura de transporte às deman-
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é um dos que mais sofre com o abandono, caso desta intransitável MT–208
das atuais e futuras de cargas e passageiros. O plano propõe intervenções e investimentos em todos os modais de transporte, dotando o Brasil da infra-estrutura de que precisa para crescer nos próximos 30 anos. O Plano CNT de Logística está organizado em nove eixos estruturantes e ligações complementares. Intermodalidade, conexão com os países da América Latina, acessibilidade aos pontos de exportação da economia brasileira e integração entre as zonas de produção e de consumo interno são itens que norteiam o estudo da CNT. Todas as propostas têm como objetivo oferecer maior nível de serviços aos operadores de transporte, aumentar a qualidade do transporte prestado aos usuários e diminuir a emissão de poluentes e custos.
Alheio à realidade, o governo federal retém verba para obras do PAC (Plano de Acelaração do Crescimento) e mantém o investimento em percentuais ínfimos. O Nordeste, por exemplo, recebeu, até março deste ano, apenas 2,4% da verba que lhe foi orçada. O Procrema (Programa de Contratação, Restauração e Manutenção por Resultados de Rodovias Federais Pavimentadas) é o quinto projeto lançado pela União com a promessa de resolver o caos rodoviário. Sucede o Crema (Contrato de Reabilitação e Manutenção de Rodovias) de 2001 e 2002, o Creminha de 2001 (o Crema com duração de dois anos em vez dos cinco originais), o Tapa-Buraco anual, o PIR 4 (Programa Integrado de Revitalização) de 2003, sem contar as obras previstas no PAC.
Programas que já demonstraram que não funcionam, mudam apenas o nome. Só como exemplo, 26 trechos que constavam do PIR de 2003 voltam à primeira lista de obras no Procrema de 2008. Falta um planejamento que dê consistência às obras e à manutenção, algo que o novo programa promete deixar de lado ao prever manutenção por apenas cinco anos, o mesmo período que separa PIR e Procrema. Especialistas ouvidos pela revista duvidam da eficácia do programa. Ou seja, é de se esperar que em 2013, às vésperas da Copa do Mundo de 2014, o Brasil enfrente os mesmos problemas de hoje, enquanto o governo prepara um novo programa de recuperação das estradas. O economista e tributarista Raul Velloso dá a chave para entender esse caos. Em entrevista disse: “Há uma evidente falta de capacidade de planejamento e execução no governo. Nos últimos dez anos, o Brasil parou e investiu pouco em vários setores. Os gestores perderam um pouco a habilidade de administração. Sobraram recursos em caixa”. Aos números. Em 2007, o orçamento do Ministério dos Transportes foi de R$ 10,8 bi-
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lhões, mas apenas R$ 5,6 bilhões foram efetivamente aplicados, sendo que R$ 2,3 bi foram usados para quitar “restos a pagar” do ano anterior. E a falta de planejamento é pior. Nos anos 70, o governo investia 2% do PIB em transportes, índice que caiu a partir dos anos 90 para 0,2%. Segundo Velloso, “no ano passado, houve uma tênue recuperação e o investimento chegou a 0,22% do PIB”. Em 2008, o Ministério dos Transportes tem em conta um orçamento de R$ 8,2 bilhões, sem contar os R$ 7,3 bilhões previstos para obras do PAC. Resta saber se o governo irá utilizar em sua totalidade a verba que alocou no orçamento aprovado pelo Congresso, algo que não acontece desde 2002. Além da sobra de orçamento, o governo conta também com o dinheiro da Cide (Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico), imposto embutido no preço dos combustíveis e que deveria ser aplicado na infra-estrutura do transporte e em meio ambiente. Criada no final de 2001, de acordo com a ONG Contas Abertas, do total de recursos arrecadados pela Cide, desde a sua implantação só R$ 25 bilhões dos R$ 43 bilhões arrecadados foram
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FÁBIO VALONGO/AJB/ FUTURA PRESS
ENTRAVE Passagens de nível, além de serem um perigo à vida, reduzem a velocidade dos trens
gastos efetivamente no objetivo de criação do tributo. A precária infra-estrutura também gera problemas para o meio ambiente. Uma pesquisa aponta que uma rodovia em bom estado faz com que o veículo tenha uma economia média de 4,8% no consumo de com bustí vel e emi ta 4,5% menos gás carbônico. Reduz também em 18,7% o gasto com manutenção em um caminhão. Como 73,9% da malha rodoviária possue algum tipo de deficiência, segundo a Pesquisa Rodoviária CNT 2007, o país contribui com o efeito estufa em sua quase totalidade de estradas. “À medida em que não há velocidade constante, com menos paradas e acelerações, o consumo de combustível cres-
ce e, queimando-se mais combustível, emite-se mais poluentes atmosféricos. Uma estrada malconservada leva a um consumo maior”, diz a cientista Suzana Kahn Ribeiro, professora do Programa de Engenharia de Transportes da UFRJ e integrante do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) da ONU. E aumenta o prejuízo no bolso dos caminhoneiros autônomos. Uma estrada ruim faz com que o dono do veículo tenha um gasto adicional de R$ 34 para cada 100 km rodados. Uma viagem de três horas se transforma em uma de cinco horas e o frete aumenta em 30%. O resultado é que essa cadeia de prejuízos acaba chegando inevitavelmente à mesa do consumidor.
AGRONEGÓCIO PERDE
R$ 1 BI POR ANO POR CAUSA DAS ESTRADAS ESBURACADAS
A conta não pára. Rodovia ruim é a deixa para bandidos tomarem conta do espaço. Segundo o coronel Paulo Roberto Souza, assessor de segurança do Setcesp (Sindicato das Empresas de Transportes de Carga do Estado de São Paulo), uma estrada malconservada pode gerar prejuízos de até R$ 28 bilhões por ano, entre assaltos e acidentes. O Brasil optou pelo modal rodoviário no início do século 20. Circunstâncias históricas, como esclarece a pesquisadora Margarida Cintra, traçam o destino do transporte brasileiro ao longo do tempo, dado que é negado pelo atual momento histórico. Com recordes de safra, alta do PIB, aumento do crédito, maior poder de compra do brasileiro e distanciamento das crises internacionais, o país esquece do dever de casa e não investe, o que eleva o custo Brasil. Com esta edição especial, a revista Transporte Atual pretende lançar luz sobre um problema que afeta a nação há décadas. E que ainda persiste em pleno século 21, em um país que pretende e tem condições de entrar no chamado Primeiro Mundo, bastando para isso gastar bem o dinheiro de que já dispõe. ●
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"Transportadores presenciam o descaso com a área de transporte, cujo contínuo progresso é crucial para desenvolvimento sustentável" CLÉSIO ANDRADE
OPINIÃO
Uma questão de siglas ou de Brasil? ortos inadequados para exportar e receber mercadorias, incapacidade governamental para solucionar uma greve de auditores fiscais da Receita Federal que mostrou que pode quase paralisar o processo aduaneiro, causando grandes prejuízos a muitas transportadoras e caminhoneiros autônomos. Além de três quartos das rodovias do país com algum tipo de problema de sinalização, pavimento ou de engenharia. Esse quadro quase chega a levar o transportador brasileiro ao desânimo, a não querer acreditar mais. É lamentável que em um país seja tão evidente a necessidade de uma rede de transporte multimodal bem planejada e que contribua para a redução do Custo Brasil e ainda a possibilidade de “cortes” ou de “congelamento” de recursos do governo federal para o setor. Essa é verdadeiramente uma hipótese inadmissível para qualquer brasileiro que deseja ver o Brasil se desenvolvendo e gerando mais empregos e renda para o seu povo. O certo é que o espetáculo do crescimento, tão decantado pelo governo, ainda não ocorreu no mundo do transporte. Não temos visto nos últimos anos ações sistemáticas e eficazes de recuperação da logística de transporte nacional. Não temos exemplos de planos governamentais conseqüentes, amadurecidos e capazes, a médio e longo prazos, de reverter a situação que presenciamos principalmente nos portos, rodovias e hidrovias nacionais. O que os transportadores têm assistido nos últimos anos são operações tapa-buracos; a falência da
P
capacidade de investimento do Estado na recuperação e manutenção das rodovias, o atraso na implantação de projetos para modernizar o setor portuário e a falta de aportes governamentais na ampliação da malha ferroviária do país. Enfim, os transportadores presenciam o descaso com a área de transporte, cujo contínuo progresso é elemento crucial para consolidar o tão sonhado desenvolvimento sustentável. No que se refere a sistemas de transporte, é preciso que o governo federal veja o Brasil de forma integral. O Brasil necessita de uma interação planejada e persistente de seus modais, particularmente das rodovias, ferrovias e hidrovias. Sem isso, o país estará fadado a correr sempre atrás do prejuízo, enquanto outros países, que investem pesado em logística de transporte, avançam cada vez mais nessa área. A CNT defende que a integração física da América do Sul, um assunto recorrente no governo federal, comece primeiramente pela integração dos sistemas de transporte brasileiros. Esse seria certamente um bom início. Chega de ações pontuais, paliativas e que só aumentam o tamanho dos problemas. Os brasileiros estão cansados. Não podemos ficar à espera de que, apesar de toda a boa intenção governamental, programas e propostas embutidos em siglas, como PAC, PPPs, Procrema etc, continuem ainda sem dizer a que vieram. Afinal, o Brasil não é feito de siglas, mas de cidadãos contribuintes e que têm o direito e o dever de cobrar do Estado a devida contrapartida em obras e serviços.
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CNT CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO TRANSPORTE PRESIDENTE Clésio Soares de Andrade PRESIDENTE DE HONRA DA CNT Thiers Fattori Costa VICE-PRESIDENTES DA CNT
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Marcus Vinícius Gravina Tarcísio Schettino Ribeiro José Severiano Chaves Eudo Laranjeiras Costa Antônio Carlos Melgaço Knitell Abrão Abdo Izacc Francisco Saldanha Bezerra Jerson Antonio Picoli José Nolar Schedler Mário Martins
Escreva para CNT TRANSPORTE ATUAL As cartas devem conter nome completo, endereço e telefone dos remetentes
DOS LEITORES revistacnt@acsmidia.com.br
TRANSPORTE DE CARGAS
Newton Jerônimo Gibson Duarte Rodrigues TRANSPORTE AQUAVIÁRIO, FERROVIÁRIO E AÉREO
Meton Soares Júnior TRANSPORTE DE PASSAGEIROS
Marco Antonio Gulin TRANSPORTADORES AUTÔNOMOS, DE PESSOAS E DE BENS
José Fioravanti PRESIDENTES DE SEÇÃO E VICE-PRESIDENTES DE SEÇÃO TRANSPORTE DE PASSAGEIROS
Otávio Vieira da Cunha Filho Ilso Pedro Menta TRANSPORTE DE CARGAS
Flávio Benatti Antônio Pereira de Siqueira TRANSPORTADORES AUTÔNOMOS, DE PESSOAS E DE BENS
José da Fonseca Lopes Mariano Costa TRANSPORTE AQUAVIÁRIO
Glen Gordon Findlay Hernani Goulart Fortuna TRANSPORTE FERROVIÁRIO
Rodrigo Vilaça TRANSPORTE AÉREO
Wolner José Pereira de Aguiar José Afonso Assumpção CONSELHO FISCAL (TITULARES) David Lopes de Oliveira Éder Dal’lago Luiz Maldonado Marthos José Hélio Fernandes CONSELHO FISCAL (SUPLENTES) Waldemar Araújo André Luiz Zanin de Oliveira José Veronez DIRETORIA TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE PASSAGEIROS
Luiz Wagner Chieppe Alfredo José Bezerra Leite Jacob Barata Filho José Augusto Pinheiro
TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS
Luiz Anselmo Trombini Eduardo Ferreira Rebuzzi Paulo Brondani Irani Bertolini Pedro José de Oliveira Lopes Oswaldo Dias de Castro Daniel Luís Carvalho Augusto Emílio Dalçóquio Geraldo Aguiar Brito Viana Augusto Dalçóquio Neto Euclides Haiss Paulo Vicente Caleffi Francisco Pelúcio TRANSPORTADORES AUTÔNOMOS, DE PESSOAS E DE BENS
Edgar Ferreira de Sousa José Alexandrino Ferreira Neto José Percides Rodrigues Luiz Maldonado Marthos Sandoval Geraldino dos Santos Dirceu Efigenio Reis Éder Dal’ Lago André Luiz Costa Mariano Costa José da Fonseca Lopes Claudinei Natal Pelegrini Getúlio Vargas de Moura Braatz Nilton Noel da Rocha Neirman Moreira da Silva TRANSPORTE AQUAVIÁRIO, FERROVIÁRIO E AÉREO
Luiz Rebelo Neto Paulo Duarte Alecrim André Luiz Zanin de Oliveira Moacyr Bonelli José Carlos Ribeiro Gomes Paulo Sergio de Mello Cotta Marcelino José Lobato Nascimento Ronaldo Mattos de Oliveira Lima José Eduardo Lopes Fernando Ferreira Becker Pedro Henrique Garcia de Jesus Jorge Afonso Quagliani Pereira Eclésio da Silva
INFRA-ESTRUTURA Gostaria de parabenizar a revista CNT Transporte Atual pela edição especial que abordou de maneira extremamente realista a preceriedade da infra-estrutura de transporte do Brasil. O PAC, que o nosso presidente trata como a solução de todos os males do país, realmente não chegou aos transportes e isso é visível a qualquer cidadão que precise se deslocar pelas rodovias nacionais. Apenas com críticas severas dos meios de comunicação é que conseguiremos, quem sabe, um pouco dessa mágica do PAC para o transporte. Glauber Humberto São Bernardo do Campo, SP.
ENSAIO Fiquei chocada com as imagens do ensaio fotográfico presente na edição 152 da revista CNT Transporte Atual. Sou do Sul do país e, por mais que veja rodovias em condições ruins, nada se equipara ao que acontece nas estradas do Norte e Centro-Oeste brasileiro. É interessante notar o quanto estamos distantes de lá e ao mesmo tempo somos prejudicados, uma
vez que são vários os produtos que passam por essas regiões antes de chegar às nossas casas. O ensaio foi uma ótima escolha para conscientizar os leitores. Andréia Huffneigel Santa Catarina, SC MILAGRES A edição 152 da revista CNT Transporte Atual é uma arma e tanto para utilizarmos contra as falácias do governo sobre os milagres do PAC. Ela está carregada de argumentos e provas de que, quando se trata da infra-estrutura do transporte, a União não tem feito muita coisa. Tanto o ensaio fotográfico, quanto as matérias focadas em cada modal são provas de que o problema não se concentra em estradas esburacadas, como muitos pensam, e sim, em todo um sistema que se encontra em desordem. Sérgio Caldeira Rio Branco, AC CARTAS PARA ESTA SEÇÃO
Rua Eduardo Lopes, 591 31230-200 - Belo Horizonte (MG) Fax (31) 3411-7007 E-mail: revistacnt@acsmidia.com.br Por motivo de espaço, as mensagens serão selecionadas e poderão sofrer cortes