Oportunidades de crescimento, remuneração competitiva e flexibilidade são os aspetos mais valorizados pelas mulheres no setor tecnológico, revela estudo Mais de meio milhar de mulheres na área tecnológica contribuiu para o primeiro estudo sobre mulheres em tecnologia, em Portugal. O estudo, de nome Pioneers, revela que 48% das inquiridas escolheram trabalhar em tecnologia por paixão ao setor
A comunidade Portuguese Women in Tech (PWIT), em parceria com a Polar Insight e com o apoio da Deloitte, criou um estudo que permite contextualizar a realidade das mulheres na tecnologia em Portugal. Os resultados estão agora disponíveis e os números são surpreendentes e revelam a desigualdade de género ainda muito presente no setor.
O drive das mulheres na tecnologia
A escolha de carreira nem sempre é pacífica quando falamos de setores tradicionalmente associados a um género. Metade das mulheres entrevistadas afirma que paixão genuína pela área tecnológica foi o principal motivo para a opção pelo setor, seguido de perto por estabilidade (uma em cada três mulheres refere este tópico como principal). Trabalho intelectualmente estimulante e oportunidade de contribuir para o desenvolvimento de novos conhecimentos ocupam o terceiro e quarto lugares, respetivamente, no pódio de motivos.
No que diz respeito a emprego, 20% das inquiridas está à procura de forma ativa, 35% de forma passiva e 45% não está à procura. As novas oportunidades chegam-lhes principalmente através do LinkedIn (52%) e através de familiares, amigos e colegas (37%). Apenas 11% utiliza plataformas especializadas. As mulheres inquiridas ainda se mostram muito conservadoras na procura de novo emprego, preocupando-se com a capacidade em preencher todos os requisitos da vaga. De forma geral, candidatam-se a uma posição idêntica àquela que já têm, e muitas vezes vão para empresas concorrentes.
Na avaliação de oportunidades, as mulheres dão prioridade a grandes empresas na
área
tecnológica,
acreditando
que
a
possibilidade
de
crescer
profissionalmente é maior do que em departamentos tecnológicos de empresas de outro setor, ou em pequenas empresas.
De facto, o lento crescimento salarial e a baixa possibilidade de crescimento na carreira são fatores que as afastam. Pelo contrário, a remuneração competitiva, o crescimento profissional, e o equilíbrio entre vida laboral e pessoal (por esta ordem) são fatores que as atraem. Qualidade de chefia e das equipas, afinidade com cultura e valores da empresa, novos desafios e possibilidade de trabalhar com stacks da sua preferência são também fatores de atração. No entanto, e apesar de a remuneração competitiva aparecer em primeiro lugar, esta não é uma questão de ambição para as mulheres entrevistadas, mas sim uma questão de reconhecimento.
O equilíbrio entre a vida pessoal e profissional é valorizado, principalmente para as gerações mais recentes. Para as mulheres mais jovens, isto traduz-se em horários flexíveis e trabalho remoto. Para as mais velhas, significa morar perto do trabalho ou encontrar oportunidades na cidade da origem, ficando perto da família. A maternidade é também um tema em cima da mesa, sendo que o setor ainda não proporciona as condições desejadas - as mulheres inquiridas não estão confortáveis com as opções de trabalho a tempo parcial que algumas empresas oferecem e têm receio de ser afetadas na remuneração.
Um caminho a percorrer na área da inclusão e da igualdade salarial
O sexismo é um dos principais tópicos abordados nesta pesquisa, com 78% das inquiridas a admitir que já sofreu observações, piadas ou gestos sexistas pelo menos uma vez; enquanto 74% já ouviu suposições sobre a sua carreira com base no facto de ser mulher. Já 72% sentiu que não foi ouvida até que um homem dissesse o mesmo. Uma média de 20% das mulheres afirma passar por estas situações “com frequência”.
Metade das mulheres entrevistadas é minoria nos departamentos em que trabalha. Na verdade, uma em cada dez é a única mulher no seu departamento.
No que diz respeito a remuneração, 38% já sentiu que ganhava menos que os seus pares apenas por ser mulher, e 49% já sentiu discriminação nos processos de promoção. Falta de reconhecimento pelas suas conquistas por ser mulher já foi sentida por cerca de 40%. Problemas de confiança também afetam as mulheres (34% já sentiu que era menos capaz que os homens e 39% sentiu falta de confiança apenas por ser mulher).
Mas as bases para a desigualdade começam na universidade. Das mulheres que participaram no estudo, 39% foi minoria na turma, afirmando que, em cada cinco alunos, quatro eram homens. Ainda, 43% sentiu falta de integração e 47% que o clima era não-inclusivo.
No campo das iniciativas, nenhuma das mulheres inquiridas disse conhecer políticas e práticas de igualdade de género nas universidades e apenas 16% diz conhecê-las nas empresas, considerando que estas pretendem apenas atingir metas pré-estabelecidas. Boa parte das mulheres não é a favor de quotas, preferindo iniciativas de chamada de atenção para a diversidade e inclusão.
E soluções?
O estudo questionou ainda as mulheres acerca de soluções para a disparidade de género, nomeadamente na área tecnológica.
As soluções mais votadas relacionam-se com o aumento de iniciativas focadas em capacitar as mulheres para atuar no setor - escolas de programação, iniciativas para unir a comunidade feminina na área (como meetups e hackathons), intervenção de líderes organizacionais/educacionais contra atos discriminatórios, e reconhecimento e visibilidade atribuídos a mulheres em posição de destaque no setor. Discriminação positiva aparece em último lugar no ranking.
Sobre o Estudo “Pioneers” foi realizado através de um inquérito a mais de meio milhar de mulheres na área tecnológica, assim como através de entrevistas em profundidade. Da amostra de mulheres que trabalham no setor, 20% têm entre 18 e 24 anos, 38% entre 25 e 34, 26% entre 35 e 44 e 16% entre 45 e 54. A maioria encontra-se em funções de gestão (13%), consultoria (12.1%) ou dados (12.6%). Apenas 0,8% é investidora e apenas 1.3% é fundadora ou cofundadora de empresas tecnológicas. Em termos de coordenação de pessoas, 63% das mulheres não tem qualquer responsabilidade nesse sentido.
A ligação entre os diferentes parceiros foi crucial para o desenvolvimento deste documento, permitindo à Portuguese Women in Tech a primeira informação concreta sobre o estado das mulheres em tecnologia em Portugal. “Este estudo é o culminar de um trabalho que temos vindo a desenvolver desde 2016 e é também um marco importantíssimo para percebermos a realidade das mulheres em tecnologia em Portugal. Pela primeira vez, temos números e ‘insights’ concretos sobre a realidade nacional e podemos agora lançar mais projetos e iniciativas que respondam da melhor forma às necessidades e desafios identificados”, afirma Inês Santos Silva, cofundadora da comunidade PWIT. “A
aposta
na
qualificação
e
valorização
de
profissionais
altamente
especializados na área das tecnologias de informação é uma prioridade na estratégia de negócio. Acreditamos que o nosso papel, como líderes de mercado, é de agente de mudança e apoio à diversidade e inclusão. Por essa razão, decidimos associar-nos a esta pesquisa inédita sobre o setor”, refere Gonçalo Simões, sócio e líder de talento da Deloitte. “Após meses de pesquisa aprofundada com profissionais e estudantes em Portugal, estamos incrivelmente entusiasmados com o lançamento do ‘Pioneers’, um retrato das mulheres que trabalham em tecnologia no país. O propósito da Polar Insight é criar ambientes de trabalho de confiança e
resilientes, onde as pessoas se sintam incluídas e realizadas. Acreditamos que este estudo contribui para essa missão e fornece um banco de dados extremamente necessário, com o qual as equipas se podem inspirar, identificando áreas nas suas próprias organizações que ainda exigem transformações”, partilha James Tattersfield, Managing Director da Polar Insight em Portugal.