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Bonde do Youtube
Plataforma vira principal canal de lançamento do funk e traz nova lógica ao mercado
por_ Patricia Espinoza ■ do_ Rio
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Soundsystems, bailes de favelas, a conquista das rádios, a venda maciça de discos. Ao longo de sua história, o funk, mesmo marginalizado e até proibido, jogou mais ou menos segundo as regras. Ou seja, seus artistas viviam de direitos autorais por execução pública (rádios, TV, shows), direitos de reprodução (discos) ou, em alguns casos, venda de ingressos para bailes. Em sua enésima reinvenção, a lógica é outra, e o ritmo popular mais controverso da nossa música apela à maior e mais poderosa arma de “dominação em massa” do nosso tempo, o YouTube. Que não se vê como uma plataforma de execução pública, não paga direitos autorais na mesma proporção que outros atores do mercado, mas abre uma nova e promissora janela de lucros por meio de anúncios.
No princípio era o soul O funk (clássico) é um filho sessentista do soul, do jazz e do rhythm and blues americanos. No Brasil, o ritmo ganhou corpo na década seguinte, e o que se ouvia, por aqui, apesar das influências de James Brown e cia., era diferente. Dialogava já com o miami bass e o freestyle e animava os bailes black, que recebiam abrigo nas favelas do Rio. Nos anos 1980, as soundsytems e seus paredões de caixas de som ditavam os passinhos nos bailes. Era o início do reinado de equipes como Furacão 2000, Pipo’s e Cash Box, que desceram ao asfalto e conquistaram as rádios.
PRIMEIRO A REDE, DEPOIS A TV
Para muitos artistas, o que antes era impensável, como a veiculação de um clipe na MTV, passou a ser possível. Afinal, os meios tradicionais, hoje, miram os digitais mais que o contrário. É o que diz Washington Rodrigues, dono da Tom Produções, um megacanal de funk no YouTube com “mais de um bilhão de visualizações”. “O YouTube hoje é a melhor forma de divulgação. Para aparecer na TV é preciso, primeiro, ter sucesso na rede. Já trabalhamos com Nego do Borel, Bonde das Maravilhas, Biel, Mr. Catra, Menor do Chapa, Livinho, Pedrinho, Duduzinho e Marcelly, entre outros. Produzimos uma média de 10 a 20 clipes por mês.”
“Antigamente era muito caro produzir um clipe legal. Hoje em dia está tudo mais acessível. Ou seja, investese menos, e dá para fazer uma coisa bem feita”, conta o produtor e compositor Dennis DJ, que alcançou 80 milhões de visualizações com o clipe de “Malandramente”, protagonizado pelos MCs Nandinho e Nego Bam.
A prova de que o filão é viável é que o funk atravessou de vez a Dutra e se tornou forte nas periferias paulistanas. Um dos “reis” desse mundo neofunkeiro é MC Gui, que alcançou 54 milhões de cliques com o clipe da música “Sonhar”, lançada em 2014.
“Conheci o funk por meio de ídolos como o Mr. Catra e o Buchecha. Depois veio (a divulgação por meio do) YouTube. Apesar disso, acho a rádio ainda mais abrangente”, afirma Gui, citando um meio paradoxalmente mais difícil de alcançar hoje.
CATRA: “JÁ TENHO MEU CANAL” Representante da velha guarda do funk e grande apreciador do que a garotada está produzindo, no eixo Rio-São Paulo, Mr. Catra analisa: “Quem não acompanhar vai ficar para trás. Ainda estou aprendendo como funciona, mas já tenho o meu canal também.” De uma coisa ele diz ter certeza: qualquer que seja o meio de divulgação, o universo funkeiro não deixará nunca de se reinventar.
Que o diga o jornalista Silvio Essinger, especialista no gênero e autor do livro-reportagem “Batidão: Uma História do Funk” (2005). “Como sensação da mídia, o funk vai e vem. Mas a verdade é que está o ano inteiro aí. No Rio, é a trilha da cidade, com todas as suas contradições.”
Trilha sonora e, para Catra, tábua de salvação: “Vi amigos meus entrarem para o crime e famílias acabarem no tempo em que se proibiram os bailes nas comunidades. O funk veio do gueto, mas por muito tempo não podíamos fazer eventos lá. Hoje o momento é outro, com o mundo digital, que nos tirou novamente do submundo. E estou muito feliz com isso.”
VEJA MAIS!
Assista a vídeos no canal Tom Produções, um dos maiores do funk, em goo.gl/KQ8kAl