Biblion #10 (PT)

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W W W . B I B L I O N . P T

e d i ç ã o Revista de Livros, Livros em Revista

d i g i t a l PUBLICAÇÃO DE INSPIRAÇÃO CRISTÃ | Nº 10

opinião: a arte da guerra espiritual

caedmon davey dostoiévsky ferguson

passatempos sopa de letras, palavras cruzadas e mais!

kierkegaard malory sienkiewicz

B ib li on X celebrando a décima edição com obras históricas


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EDIÇÃO Nº10


be m - v indo

EDITORIAL O "X" Marca o Lugar

C A PA :

X DESIGN: DA N I E L G O MES

Revista de Livros, Livros em Revista

EDIÇÃO X Outubro / Novembro / Dezembro 2018 Colaboram nesta edição: Daniel Gomes (Assistant Editor), Vitor Marini (Retratos dos Autores), Samuel Ascenção (Suporte à Produção)

FICHA TÉCNICA

email: mag@biblion.pt web: www.biblion.pt

PROPRIEDADE: Unique Creations, Lda. REDAÇÃO: Tv. Francisco dos Santos, 2-6ºD 2745-271 Queluz REGISTO: Dep. Legal Nº 405423/16 NIPC nº 510951910 ISSN: 2183­-7899

EDIÇÃO: BIBLION MEDIA by Unique Creations EDITOR E DIRECTOR: Paulo Sérgio Gomes DESIGN E PROJETO GRÁFICO: UC Design Studio

MISSÃO / PROPÓSITO: Promover e estimular hábitos de leitura de inspiração Cristã, criando condições para todos poderem aceder aos livros. Conheça o que nos move e os nossos valores em www.biblion.pt. CONTEÚDOS: Os conteúdos apresentados representam a opinião dos seus autores. REPRODUÇÃO DE CONTEÚDOS: Tendo como objectivo primordial a divulgação de obras e autores, é permitida a reprodução dos textos, desde que mencionada a fonte, quando não para fins comerciais. PREÇOS E DISPONIBILIDADE: Os valores mencionados incluem IVA. Os produtos apresentados estão sujeitos a disponibilidade de stock aquando da encomenda.

Apesar de tudo... perseveramos, em prol da leitura! Com a presente edição da Biblion, eis-nos chegados à décima revista. Nada mau, mas sinceramente, gostaríamos de ter feito ainda mais nestes quase 3 anos de existência. No entanto, sentimos o “dever cumprido”, pelo pioneirismo com que a Biblion se desenvolveu na promoção da leitura, e na divulgação de livros e autores. Senão vejamos: Apesar da parca divulgação da literatura evangélica, a Biblion apresentou já cerca de 200 livros, escritores e editores, junto do nosso público. Apesar da pequenez do nosso país, a Biblion alargou o seu espectro de audiência lançando, em acréscimo ao idioma original, em português, uma versão da revista em língua inglesa, tendo já sido lida por leitores em mais de 100 países. Apesar da edição literária evangélica em Portugal ser, cada vez mais inexistente, a Biblion foi a única editora portuguesa a se associar à celebração dos 500 anos da Reforma Protestante, com a publicação da tradução para português da obra “A Liberdade Cristã”, de Martinho Lutero. Apesar de tudo isto, e na expetativa do que vier a seguir... prosseguimos, pela “causa” da leitura saudável.

PAU L O S É R G I O G O M E S

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ÍNDICE

28 ESCOLHA DO EDITOR

In the year of our lord sinclair b. ferguson

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FICÇÃO HISTÓRICA

quo vadis Um retrato brilhante de amor e loucura na Roma de Nero.

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FANTASIA

le morte d'arthur Tudo o que há para saber sobre o mítico Rei Artur, numa só compilação.

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LOUVOR

hino de caedmon A décima edição da Biblion traz a luz o mais antigo poema do povo Anglo-Saxónico.

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BIOGRAFIA

O Jovem que abalou o mundo

MISC.

O livro de Cyril Davey inspirado a vida incrível de Martinho Lutero.

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FILOSOFIA

o grande inquisidor A história chocante de um encontro improvável entre Cristo e Clero.

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FILOSOFIA

fear and trembling Um tratado sobre Abraão que definiu o movimento existencialista.

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EDIÇÃO Nº10

opinião "a arte da guerra espiritual"

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passatempos sopa de letras ligar os pontos palavras cruzadas


A EQUIPA

Paulo Sérgio Gomes editor - in - chief

Paulo Sérgio desenvolveu a sua carreira no turismo, onde ele alcançou reconhecimento e realização pessoal. No caminho, ele dedicou os seus recursos e talentos a vários projetos filantrópicos, desde educação financeira e futebol de rua até à gestão de uma livraria de igreja. Atualmente dirige o projeto de uma vida - uma pequena revista chamada Biblion, tentando manter vivos os bons hábitos de leitura e a edição de livros no seu país.

Daniel Gomes assistant editor

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copywriter

O mais jovem do duo "pai & fliho" da Biblion, Daniel Gomes é um designer gráfico de Lisboa. Ele é responsável por grande parte do design da revista, embora o seu papel na Biblion se extenda também a produzir, rever e traduzir conteúdo escrito.

edições anteriores

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biblion #9

C1

compendium

F3

flash #3

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a nossa identidade

fique a con

Quem Somos - A Biblion é uma revista digital de distribuição gratuita e produção trimestral que visa promover a literatura cristã e o hábito de leitura. - Criada em 2016, a Biblion é uma iniciativa da editora Unique Creations que conta com a participação de colaboradores residentes e convidados. - Atualmente a revista encontra-se na sua 9ª edição, com as versões Digital (Issuu) e Interativa (Joomag) disponíveis em Português (EU) e Inglês (US).

O Que Fazemos - Reviews de livros considerados benéficos para a edificação intelectual e/ou espiritual do leitor; - Entrevistas a autores, pastores e personalidades envolvidas com o desenvolvimento e divulgação da literatura cristã; - Crónicas relativas a temáticas éticas e religiosas; - Produção de conteúdos próprios; - Divulgação de literatura cristã e de interesse geral; - Promoção de hábitos de leitura para todas as idades.

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a nossa identidade

onhecer-nos

A Nossa Missão - Promover a literatura cristã e a produção de livros de inspiração cristã em Português de Portugal; - Estimular a publicação de obras de autores nacionais; - Incentivar a prática do “preço justo” e tornar a leitura acessível às condições económicas de todos; - Promover hábitos de leitura salutares; - Acolher o diálogo saudável entre perspetivas diferentes.

Como Você Pode Ajudar - Subscreva a Biblion no Issuu para não perder os lançamentos mais recentes! - Apoie o nosso trabalho através do Patreon ou PayPal! - Siga-nos no Facebook e partilhe os nossos posts! - Subscreva ao nosso canal de Youtube! - Classifique os nossos artigos em www.biblion.pt e deixe-nos o seu feedback!

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f icção h ist ó rica

testemunhe roma em toda a sua loucura

quo vadis henryk sienkiewicz

por Daniel Gomes

Talvez você até viu o filme, mas já ouviu falar do livro que o inspirou? Quo Vadis, uma das obras mais conceituadas de Henryk Sienkiewicz, é um tour de force que o levará de volta à Roma de Nero, numa história magnífica onde o amor e a fé triunfam até mesmo sobre a loucura do imperador. O autor polaco e vencedor do Prémio Nobel, Henryk Sienkiewicz, conta-nos a história de Vinícius, um tribuno romano, e Lígia, uma mulher cristã e serva de patrícios romanos. Ao regressar a Roma, Vinicius 8

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conhece Ligia e apaixona-se por ela imediatamente, o que resulta numa grave série de eventos que porão os sentimentos de tribuno à prova. Nesta série de eventos, Vinicius descobre a fé cristã e torna-se um crente, e a sua ligação com Ligia cresce ainda mais profundamente. No entanto, Nero incendeia Roma e põe as culpas nos cristãos, o que causa uma perseguição caótica e sangrenta aos cristãos. É escusado dizer que as consequências são tão vis como o ato em si: Vinicius é obrigado a usar todo o seu poder e a sua influência


10 edições +100 países +120 reviews de livros +200,000 impressões/mês* se gosta de ler e escrever proponha-nos um dos seus artigos e habilite-se a ser incluído na nossa revista! saiba mais em www.biblion.pt *baseado nas estatísticas da plataforma issuu


f icção h ist ó rica

que lhe restam para salvar Ligia e fugirem juntos, e mesmo isto impõe certos sacrifícios. Quo Vadis é um exemplo notável da habilidade de Sienkiewicz enquanto autor de romances históricos. Ficção e realidade misturam-se de tal forma que por vezes é difícil distinguir personagens reais dos fictícios e vice-versa. A caracterização por parte do autor de personagens como

Nero e Caius Petronius é profunda e fiel; eles não são arremessados na obra apenas para preencher espaço. Estes são personagens humanos complexos, que parecem fieis às figuras históricas, representadas de acordo com a localização histórica da obra. Outra prova da habilidade do autor como um romancista é a progressão dos personagens. Embora

"Ichthus": símbolos cristãos em quo vadis O peixe é um símbolo célebre para os Cristãos. É provável que você já o tenha visto na traseira de um carro; se esse for o caso, então é provável que já se tenha perguntado: "Porquê um peixe?" ou "O que é que isto significa?" O seu significado está entrelaçado com as suas raízes, sendo o peixe um símbolo quase tão antigo como o próprio Cristianismo. A palavra "peixe" no Grego é Ichthus (ou Ichthys), adotada pelos cristãos como uma sigla: "Iesous Christos, Theou Uios, Soter" ou "Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador". Era usado pelos cristãos pela sua natureza inocente - sendo a cruz um sinal bem mais direto da fé cristã - e tornou-se bastante popular durante as perseguições. Assim sendo, o símbolo está bem presente em Quo Vadis, mas não é o único exemplo de simbolismo cristão na obra. O próprio título é uma referência aos Atos de Pedro, um livro apócrifo onde Pedro, fugindo de Roma, faz a Cristo a famosa pergunta, "Quo Vadis, Domine?" ("Onde vais, Senhor?"), ao que Cristo responde que vai a Roma para ser crucificado uma segunda vez, agora no lugar de Pedro. Ao ouvir estas palavras, Pedro volta a Roma e enfrenta o seu destino. Este episódio conclui a obra de Sienkiewicz - uma obra que conta não só com o Apóstolo Pedro, mas também com o Apóstolo Paulo.

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eles nem sempre agem de forma racional (aqui Nero sendo um exemplo óbvio), os personagens não se traem a si mesmos. Os personagens de Quo Vadis sempre se comportam de acordo com a natureza e o estatuto dos mesmos, tornando o desenvolvimento destes personagens ainda mais genuíno. De pequenas adaptações a grandes transformações, a progressão de um personagem nunca é desajustada nesta obra. Um exemplo admirável disto mesmo é a conversão gradual de Vinícius ao Cristianismo: ele crê e aceita Cristo como seu Senhor e Salvador, mas sendo novo na fé cristã e nos seus ensinamentos, a sua mentalidade continua assente na sua educação romana e na sua experiência como militar. Assim nós vemos em Vinicius uma luta interna voraz, em que a sua impaciência e o seu orgulho naturais costumam levar a melhor, ainda que ele queira abraçar os princípios cristãos de humildade e temperança. Apesar da influência do filme, Quo Vadis tem poder para se distinguir como uma obra cativante de ficção histórica – uma das melhores

que já abordámos nesta revista. O seu charme e perspicácia vão encantá-lo a partir do momento que pega no livro, e o seu enredo mirabolante não o vai deixar largá-lo até o acabar de ler. Seria negligente da nossa parte dedicar a décima edição a obras históricas e não incluir uma obra tão merecedora, e um autor igualmente tão ilustre. Leia; entregue-se a este romance e deixa-o absorver o seu ser mais íntimo – esta história de amor é mais do que aquilo que aparenta ser.

se você é um autor independente à procura de um review do seu trabalho, contacte-nos!

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f antasia

um recontar épico de uma lenda épica

le morte d'Arthur Sir thomas malory

por Daniel Gomes

O

reconto épico da lenda do Rei Artur na forma de Le Morte d'Arthur imortalizou não só o seu autor, mas até a própria lenda de Artur e dos seus valentes cavaleiros da Távola Redonda. Contém tudo o que um grande livro de ficção deve ter – aventura, amor, cavalheirismo, perigo, traição e uma pitada de magia – e como tal, a Biblion orgulha-se de apresentar um dos primeiros e melhores livros impressos na Grã-Bretanha.

Voltemos pois até um lugar de reis e rainhas, de grandes batalhas e festas alegres, de cavaleiros valorosos e astutos, de amantes fieis e

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manipuladores. Voltemos a Camelot. Voltemos ao tempo do Rei Artur. Le Morte d'Arthur é um relato valiosíssimo das aventuras do Rei


Artur e dos seus cavaleiros leais, escrito por um misterioso Thomas Malory e publicado depois da morte do seu autor pelo célebre editor William Caxton em 1485. Com uma quantidade excecional de detalhe, a obra-prima de Malory atrai o leitor a uma era mítica, onde a fantasia e a historicidade se misturam para produzir uma obra magnífica de ficção medieval. Nesta longa compilação de contos e aventuras, nós assistimos à ascensão e queda do Rei Artur e tudo o que se passa entre as duas. Malory descreve inúmeros eventos que tornaram a lenda de Artur tão icónica, incluindo a história de como Artur tirou a espada Excalibur da pedra em que se encontrava inserida, o caso de Guinevere com Lancelote e a busca do Santo Graal. Embora muito do livro se concentre no mítico Rei de Camelot, Malory escreve extensivamente tanto sobre os personagens principais como os secundários; isto aplica-se a muitos dos cavaleiros de Artur que têm um papel mais humilde na corte do Rei mas que ainda assim se encontram

causas e consequências Um dos temas mais persistentes na obra de Malory Le Morte d'Arthur é a humanidade dos seus personagens. Embora eles sejam nobres chamados a honrar os mais altos critérios morais, os cavaleiros e as damas do reino – incluindo o venerável Rei Artur – continuam a ser humanos, propensos a agir em prol dos seus instintos e sentimentos. Mas estas ações não ficam impunes, independentemente de quem as comete. A obra-prima de Malory é formada pelas consequências das transgressões, e até os mais puros e cavalheirescos não escapam à regra. O caso entre Guinevere e Lancelote cria um conflito catastrófico entre o cavaleiro e o rei; a paixão de Merlin pela Dama do Lago leva-o a ficar preso debaixo de uma rocha. Talvez o melhor exemplo é mesmo o do Rei Artur, cujo incesto acidental com a sua meia-irmã Morgause leva ao nascimento de Mordred. Artur tenta livrar-se do bebé ao estilo de Herodes, mas Mordred sobrevive e volta muitos anos mais tarde, infiltrando-se na corte de Artur e eventualmente usurpando o trono do seu pai. No fim de contas, Mordred é a ruína de Artur, uma vez que os dois se confrontam numa batalha final de proporções épicas. Artur mata o seu filho, mas não sem este primeiro lhe ferir de forma letal. Causas e consequências são as tecelãs da tapeçaria de Malory, e elas fizeram realmente um grande trabalho.


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bem desenvolvidos. As suas aventuras são cruciais no desenrolar do enredo, que culmina numa grande batalha entre Artur e o seu “sobrinho,” o usurpador Mordred. Apesar dos seus muitos anos, Le Morte d'Arthur continua a ser uma obra influente e uma das mais conceituadas fontes sobre o Rei Artur. Ela moldou a nossa perceção das aventuras lendárias em volta dos Cavaleiros da Távola Redonda e do seu rei, e até um certo ponto, impactou a ficção histórica e a literatura de fantasia de uma forma irreplicável. É verdade que o livro não envelheceu muito bem – a sua cadência e as suas raízes no Inglês Médio colaboram para que a obra pareça insípida ao leitor contemporâneo – mas com a mentalidade correta, o leitor pode desfrutar do legado de Malory e encará-lo como o clássico de literatura medieval que realmente é. Adquira já!

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Envelheceu como um bom vinho (?) Há uma coisa que se torna evidente para muitos quando se começa a ler Le Morte d'Arthur: ela não flui. As frases não parecem fluir quando a grande maioria começa com «Então...», «Depois...», «E...», ou uma combinação destas palavras. Às vezes parece que Malory está mais focado em apontar factos do que em contar uma história. Todos estes são bons pontos, e o excerto seguinte será certamente prova disso:

«Em dois anos o Rei Uther ficou acamado por uma grande enfermidade. E entretanto os seus inimigos conspiravam contra ele, e combateram ferozmente os seus homens, e mataram muitos deles. 'Senhor', disse Merlin, 'vós não podeis descansar como fazeis agora, pois tendes de ir para o campo (de batalha) ainda que numa liteira: pois nunca derrotareis os vossos inimigos a não ser que estejais lá, e então tereis a vitória.' Então foi feito como Merlin planeou, e eles trouxeram o rei numa liteira com um grande exército até aos seus inimigos. E em St. Albans um grande exército vindo do Norte se encontrou com o rei. E naquele dia Sir Ulfius e Sir Brastias realizaram grandes proezas, e os homens do Rei Uther derrotaram as forças do Norte e mataram muita gente, e puseram o resto em fuga. E então o rei voltou a Londres, e houve muita alegria pela sua vitória. E depois ele adoeceu gravemente, de tal forma que ele não disse nada durante três dias e três noites...» (tradução livre) Porém o leitor contemporâneo pode ultrapassar essas desvantagens com um pouco de imaginação da sua parte. Vejamos primeiro como Malory constrói as frases. Ele repete muitas das mesmas conjugações para dar um aspeto de continuidade, e isto pode ser tido contra ele – mas eu não o faria, especialmente quando podemos dar a volta a isso. Algo que funcionou para mim foi imaginar o próprio narrador a a contar a história, como um avô conta histórias aos seus netos, ou como amigos numa taberna contam histórias uns aos outros (esta última terá certamente um aspeto mais medieval). Com isto em mente, leia o excerto novamente e confira se funciona para si! Quanto à ideia de que Malory está a “apontar factos”, ela faz realmente sentido. Mas talvez era mesmo essa a ideia de Malory: fazer com que estes mitos parecessem história exata. Se aplicarmos o conceito do narrador que acabei de sugerir com a ideia de que estes contos devem ser reais, a experiência torna-se ainda mais rica. Já não estamos a ler um relato atabalhoado de lendas e mitos. Estamos sim a conhecer um relato incrível de eventos históricos passados na Grã-Bretanha, como se Malory – ou quem a gente quiser, se é que importa – estivesse sentado ao nosso lado, contandonos como o rei foi para a batalha mesmo estando doente e estendido numa liteira! Vê a diferença? Os anos não têm sido bondosos para com Le Morte d'Arthur, mas a obra continua própria para consumo – desde que o leitor saiba como a deve ingerir.

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lou v or

uma relíquia de poesia cristã

o

hino de

caedmon

O

Hino de Caedmon é o mais antigo poema escrito no Inglês Anglo-Saxão, língua falada na Grã-Bretanha do séc. V ao séc. XI. O seu autor, Caedmon, era supostamente um vaqueiro iliterado com o dom de compor versos em louvor a Deus. O Hino é a sua única obra conhecida, chegando aos nossos dias em grande parte através da obra-prima do Venerável Bede, a História Eclesiástica, escrita em 731 d.C.

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techyng; for whi it is in the nexte to fynde it. Se ye with youre iyen, that Y trauelide a litil, and Y foond myche reste to me. Take ye techyng in myche noumbre of siluere, and welde ye plenteuouse gold ther ynne. Youre soule be glad in the merci of hym; and ye schulen not be schent in the preysing of hym. Worche ye youre werk bifore the tyme; and he schal yyue to you youre meede in his tyme.

O Hino de Caedmon “Agora devemos honrar o Guardião dos Céus, O poder do Arquiteto, e o Seu propósito, A obra do Pai da glória, Como Ele, o eterno Senhor, estabeleceu o começo das obras; Primeiro criou Ele para os filhos do homem O Céu como cobertura, o santo Criador Depois o Guardião da humanidade, O eterno Senhor, fez em seguida a terra média, As terras para o homem, o Deus Todo-Poderoso.” What tarien ye yit? and what seien ye in these thingis? youre soules thristen greetli. Y openyde my mouth, and Y spak, Bie ye wisdom to you with out siluer, and make youre necke suget to the yok therof, and youre soule resseyue techyng; for whi it is in the nexte to fynde it.


biogra f ia

o jovem que abalou o mundo Cyril Davey novas de alegria por daniel Gomes

C

yril Davey perpetua o grande legado deixado pelo Pai da Reforma Protestante em O Jovem que Abalou o Mundo, uma pequena obra de ficção baseada na vida de Martinho Lutero.

Quem foi Lutero? Porque é que ele se revoltou contra a Igreja Católica? Como é que ele ganhou a proteção do Príncipe-eleitor da Saxónia, Frederico o Sábio? As respostas a estas e outras perguntas estão no livro de Cyril Davey, O 18 EDIÇÃO Nº10

Jovem que Abalou o Mundo, um olhar romantizado sobre a vida e os feitos de Martinho Lutero. Da infância de Lutero na Saxónia ao seu casamento com Catarina de Bora, o livro explora a vida do monge alemão, abordando os eventos


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mais importantes na vida de Lutero e as razões por trás dos mesmos. Davey é particularmente eficiente em mostrar isto, apresentando um cenário persuasivo da viagem de Lutero desde o Catolicismo até à reforma. Ao revelar ao leitor uma Alemanha fragmentada que tem dificuldade em lidar com as políticas de Roma, o autor providencia uma estrutura sólida para a ascensão do Protestantismo de Lutero, estrutura essa que reconhece tanto as motivações políticas da Reforma como as religiosas. Davey também demonstra grande habilidade em usar o diálogo na sua obra. As conversas entre personagens parecem bem estabelecidas e coerentes com o enredo e a localização da história, enriquecendo uma mistura de realidade e ficção poderosa por si só. O autor é capaz de atribuir a estes

personagens um carácter apropriado, que se revela de forma mais fiel através das interações verbais. Juntamente com um diálogo credível, as descrições ponderadas e as transições suaves de Davey tor nam esta obra num achado preciosíssimo. Embora tenhamos de ser criteriosos quanto à licensa poética exercida pelo autor, O Jovem que Abalou o Mundo demonstra ser um testemunho curioso e cativante da vida de Lutero. A sua mistura impressionante de factos históricos com elementos de ficção tornam a obra tão interessante como é didática. Apesar de ter sido ignorado, este é um livro para ser lido, tanto como uma obra biográfica como um exemplo de boa escrita, por todos aqueles que querem conhecer Lutero o melhor possível.

+100 países www.biblion.pt 19


f iloso f ia

o grande inquisidor fiódor dostoiévsky

por Daniel Gomes

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oucas obras contêm capítulos tão ricos e impactantes que se destacam do resto do livro, mas isto é precisamente o que acontece com a história d'O Grande Inquisidor, da obra Os Irmãos Karamazov, a última de Fiódor Dostoiévsky. Num conto chocante e desinibido, Dostoiévsky examina uma das questões mais desconcertantes de sempre: “E se Cristo viesse de novo à Terra?”

O último livro do famoso autor russo Fiódor Dostoiévsky, Os Irmãos Karamazov, fascinou e influenciou algumas das maiores mentes da história moderna, desde Einstein a

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Freud e a Camus. O seu enredo complexo em volta da reunião de uma família disfuncional e as peripécias que daí advêm, assim como os temas filosóficos presentes na história, con-


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f iloso f ia

tinuam a deslumbrar os leitores até hoje. Existe porém um certo capítulo neste livro – ou melhor, parte de um capítulo – que ganhou popularidade mais que suficiente para se destacar dos demais. Esta é o conto d’O Grande Inquisidor. A história surge enquanto dois dos protagonistas do livro, os irmãos Alyosha e Ivan Karamazov, conhecem-se melhor num jantar, depois de muitos anos sem se verem. Ivan, um niilista, confronta Alyosha, um cristão devoto e iniciado no mosteiro local, com o facto de este último querer saber se Ivan crê ou não em Deus. Ivan explica a sua dificuldade em lidar com o problema do mal e do sofrimento no mundo, concluindo que ele não se pode juntar a uma entidade divina que deixa a sua criação sofrer tanta dor e injustiça. Alyosha relembra o seu irmão do sacrifício de Cristo, que de forma dolorosa e injusta morreu pelos pecados do Homem. Ivan não se surpreende com esta resposta, e apresenta o seu “poema” em defesa do seu ponto de visto. Ivan começa com Cristo voltando à terra em forma humana durante os 22 EDIÇÃO Nº10

tempos da Inquisição, eventualmente chegando a Sevilha. Os habitantes reconhecem Jesus à medida que Ele se aproxima da catedral. Ele começa a realizar milagres tal como fez nos Evangelhos, incluindo a ressurreição dos mortos; o Grande Inquisidor testemunha estes feitos e, em vez de reconhecer abertamente que Cristo é Senhor, ele manda os seus guardas prenderem-No. Nessa mesma noite, o Grande Inquisidor aparece ao Cristo encarcerado. O que se segue é um sermão longo e brutal por parte do Inquisidor sobre o fracasso de Cristo em fazer o Homem feliz ao dar-lhe liberdade – um fracasso que o Inquisidor crê ter sido corrigido pela Igreja através do trabalho da Inquisição. O velho Inquisidor explica como as tentações do Diabo no deserto foram de facto oportunidades para Jesus estabelecer o Seu Reino na terra, assim como, ao dar justificação e liberdade pela fé, Cristo impôs ao Homem um fardo pesado demais. O Inquisidor também afirma que ele e outros como ele se empenharam em guiar os “milhares de milhões” à felicidade terrena, mesmo que tal leve à


morte e destruição eternas, e que ele não iria permitir que o próprio Cristo interferisse com o seu trabalho. Jesus mantém-se em silêncio durante todo este monólogo; a sua única resposta ao Inquisidor é um beijo que apanha o ancião desprevenido. O Inquisidor liberta Jesus, dizendo-Lhe para nunca mais voltar. Apesar da sua conclusão dúbia, O Grande Inquisidor continua a ser um dos mais enfáticos e relevantes excertos da obra de Dostoiévsky. Ele obriga os leitores a imaginar uma versão peculiar da segunda vinda de Cristo, a entrar na mente deste velho clérigo e a considerar a sua lógica com a devida dedicação. Abraçando temas como o livre-arbítrio, a natureza pecadora do homem e o sofrimento, este “poema” é celebrado por leitores religiosos e seculares até hoje. O seu charme incisivo e as suas deliberações marcantes fazem desta história uma parte essencial da nossa décima edição, dedicada em especial a obras históricas.

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biblion?

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f iloso f ia

mergulhe na angústia e sofrimento do servo fiel de deus

temor e

tremor soren kierkegaard

por Daniel Gomes

A

braão é para os cristãos um exemplo de fé, com uma história incrível de esperança no meio das adversidades. Kierkegaard, no entanto, vai mais além. No que muitos consideram a sua obra-prima, o filósofo dinamarquês expressa a sua tremenda admiração pelo homem que apelida de “cavaleiro da fé.” Temor e Tremor não podia ser um título mais adequado para esta obra poderosíssima de Søren Kierkegaard, dedicada ao episódio mais marcante da vida de Abraão: o sacrifício de Isaque. Kierkegaard aborda a forma impressionante como Abraão lidou 24 EDIÇÃO Nº10

com o teste que lhe foi imposto: durante mais de três dias, Abraão viajou com o seu filho Isaque – o filho que Deus prometera a Abraão já em idade bastante avançada, através do qual iria nascer a nação de Israel – com a missão de o sacrificar.


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Sem contar a ninguém do teste que Deus lhe havia encarregado, Abraão enfrenta sozinho a angústia aterradora de ter de matar o seu próprio filho. Mesmo no cimo do monte, tratando dos preparativos necessários para o sacrifício do seu filho, Abraão não deixa de amar Isaque, nem deixa de crer nas promessas que Deus cumprirá através de Isaque – e no entanto, Abraão está preparado para levar a cabo o seu dever de forma intransigível. É esta contradição, este paradoxo insólito e quase inexplicável que cativa a curiosidade do autor. Kierkegaard compara o exemplo de Abraão com o de Agamémnon e o de Fausto, enaltecendo o personagem bíblico acima de todos os outros pela sua fé e pela natureza singela do seu teste.

Para o dinamarquês, Abraão é um caso excecionalmente raro; tentar emular o seu carácter na sua plenitude – o carácter de um “cavaleiro da fé” – não terá o mesmo resultado. Apesar disso, Abraão é também um caso digno de admiração do qual se podem tirar grandes lições de vida aplicáveis a qualquer indivíduo. A linguagem erudita tão frequentemente utilizada pelo filósofo e a complexidade dos seus pensamentos tornam a leitura desta obra numa tarefa extenuante, mas sem dúvida compensadora. Este é de facto um estudo incomparável do exemplo de fé que Abraão é para milhões e milhões de crentes, exemplo esse que também influenciou a vida de um dos maiores filósofos do século XIX.

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enchir

o man

brevem


ridion

nual

mente


escol h a do editor

reflexões sobre vinte séculos de história de igreja

in the year of our lord Sinclair B. Ferguson reformation trust por Paulo Sérgio Gomes

S

inclair B. Ferguson é professor de Teologia Sistemática no Reformed Theological Seminary, prega regularmente na St. Peter's Free Church, em Dundee, e já escreveu mais de cinquenta livros, desde títulos académicos até aos infantis. Na sua Escócia Natal, pastoreou uma pequena congregação de Unst, a ilha habitada mais setentrional do Reino Unido, e uma outra no centro de Glasgow. Serviu ainda como pastor-senior na First Presbiterian Church, em Columbia, na Carolina do Sul.

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O título No Ano do Nosso Senhor (In the Year of Our Lord) foi escolhido com propósito, e não se tratando, segundo o autor, de história da Igreja, conta algumas das mais significativas histórias destes dois milénios de Cristianismo. A pertinência de um livro como este, tem que ver com uma tendência notória a nível global para diminuir a influência que Jesus Cristo tem na História da Humanidade. Isto acontece até mesmo nas antigas universidades, onde as antes conhecidas como faculdades de teologia ou divindade, são agora departamentos de religião ou estudos religiosos. Em muitos casos, aquelas faculdades que eram de topo, foram integradas nas “artes” ou “estudos sociais”. Na essência tornaram-se ramificações de um alargado conceito de antropologia (o estudo do homem, o seu ambiente, filosofia, etc...). O foco não está mais em Deus, mas o homem e a sua experiência espiritual (religiosa), subordinando a fé cristã a uma mera experiência religiosa. Tomando como ponto de partida excertos de textos correspondentes a

cada época, Ferguson conta, explicando, factos e eventos marcantes da história da Igreja Cristã. Ao longo dos vinte capítulos do livro, um por cada século, desde o início do movimento Cristão, o autor apresenta-nos figuras e acontecimentos que tiveram significativa relevância no desenvolvimento da Igreja de forma universal. Um desses personagens é Orígenes de Alexandria, ou de Cesareia. talvez o mais brilhante, mas também o mais aventureiro, pensador cristão do séc. III. Viveu segundo padrões rigorosíssimos de autodisciplina e negação, levando à letra Mateus 19:12, castrando-se. O quarto século foi dos mais significativos do primeiro milénio da Igreja, atendendo às brutais perseguições movidas aos cristãos, ordenadas pelo Imperador Diocleciano, que visavam a destruição das Escrituras, impedindo assim a progressão do Cristianismo. Entretanto, no séc. XI, surgiria Anselmo de Cantuária, e o seu argumento ontológico a favor da existência de Deus, talvez o menos

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escol h a de editor

conhecido dos argumentos clássicos, mas o mais fascinante para os filósofos do que qualquer outro. No século seguinte, com o surgimento das universidades e o nascimento da Inquisição, emergiu outra figura repleta de carisma no seio da cristandade – Bernardo de Clairvaux (já apresentado na Biblion nº6), que fundou o seu mosteiro em 1115, destacando-se pelo fenomenal conhecimento das Escrituras, a influência sobre o meio eclesiástico e o entusiasmo com que defendia as Cruzadas. Antecipando a chegada da Reforma Protestante, Sinclair Ferguson aborda o peso que vários personagens tiveram na antecâmara dos acontecimentos protagonizados por Martinho Lutero, de John Wycliffe, um dos mais poderosos precursores da Reforma, a Jan Hus, que viu os seus livros serem queimados na Ca-

tedral de Constança, tendo ele próprio morrido recitando Salmos, ou Girolamo Savonarola, que acabou excomungado e executado, depois de ter cativado o povo de Florença com a eloquência da sua pregação. Nesta edição de leitura mais que recomendável, ainda há lugar para individualidades como William Wilberforce, Charles Spurgeon ou Dietrich Bonhoeffer, entre muitos outros. A finalizar, Ferguson desafianos, refletindo sobre os vinte séculos de fé cristã, a eleger o livro do século XX. A escolha do autor recai sobre Conhecendo Deus, de J. I. Packer, aliás, absolutamente merecido. Concluindo, na verdade Jesus, passados dois mil anos, continua a construir a Sua igreja, com o Seu povo, até ao fim dos tempos, e para sempre. É esta a história (inacabada) de No Ano do Nosso Senhor.

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xi'an-fu: o cristianismo na China (635-845) No capítulo 8, é apresentado um excerto do conteúdo esculpido numa lápide, erigida em 781 – a Xian-Fu, ou Si-ngan-fú, descoberta no noroeste da China, em 1625, e traduzida pelos padres jesuítas portugueses Álvaro Semedo e Manuel Dias Júnior. Nela foram registados factos sobre a Religião Ilustre, transmitidos pelo monge missionário sírio Alopen (ou Olopun), que ali chegou no ano de 635. O missionário, conhecido pelos chineses como A-lo-pen, levou consigo os livros sagrados e quando chegou à fronteira de Chang-an, foi recebido pelo primeiro-ministro chinês, Fang Huang Ling, que o acompanhou ao Imperador Tai-Tsong. Ficando deveras impressionado com a retidão e verdade da sua religião, promoveu Alopen a Grande Senhor Espiritual, Protetor do Império, e ordenou a tradução dos livros e a sua distribuição por todo o território. Infelizmente, no século seguinte (845), o Imperador Wu Zong, da dinastia Tang, decretou o fim das religiões estrangeiras, eliminando por completo o testemunho de Jesus Cristo e a adoração ao seu nome. Na Diocese de Macau é possível encontrar uma referência a esta efeméride.

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opinião

A arte da guerra espiritual por daniel gomes

“Toda a guerra é baseada no logro.” — Sun Tzu, a Arte da Guerra

O conflito faz parte da vida. Todos já o experimentámos de uma maneia ou outra, e todos já saímos a ganhar ou a perder com ele. Da disputa mais insignificante até à guerra mais devastadora, o ser humano está familiarizado com o conflito e sempre procura a forma mais vantajosa de lidar com ele. Enquanto que alguns estão confinados a códigos de conduta mesmo estando em conflito, 32 EDIÇÃO Nº10

outros crêem que na guerra, tal como no amor, não existem regras.Aqueles que ousam fazer qualquer coisa são normalmente bem sucedidos nas coisas que outros não se dignam a fazer, e os indivíduos mais brilhantes e vitoriosos da história costumam pertencer ao primeiro desses dois grupos. Sun Tzu era um desses indivíduos. O perito chinês estudou e


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aperfeiçoou a guerra ao ponto de a tornar numa arte: ele identificou noções comuns e princípios sistemáticos vitais ao sucesso de qualquer empreendimento militar, e o seu tratado continua a ser um dos livros mais populares sobre o tema, vinte e cinco séculos depois de ter sido escrito. Apesar da sua ênfase militar, muitos dos conceitos da obra podem ser aplicados a qualquer tipo de conflito de interesses – discussões, batalhas legais, desporto e por aí fora. Talvez o mais icónico dos princípios ditados por Sun Tzu seja o uso do logro na guerra. Para ele, o logro era uma ferramenta essencial no arsenal de qualquer general, uma vez que lhe permite subverter a perceção do inimigo – uma vantagem decisiva quando manipulada corretamente. Quando devidamente aplicado, este princípio impede um opositor de agir de acordo com os seus interesses: a incerteza pode tomar conta dele, ou ele pode ser levado a crer que age de forma apropriada quando de facto não o faz. Sun Tzu declarou que o uso de subterfúgio e dissimuação é inerente à guerra e pode efetivamente virar o rumo de batalhas e guerras.

Até agora, a história provou que Sun Tzu tinha razão, pelo menos no que toca a conflitos de natureza terrena. A guerra espiritual, porém, não admite o logro. Mais especificamente, a guerra espiritual cristã não pode fazer uso deste princípio em forma alguma, uma vez que o próprio logro é o inimigo. Satanás, o “Acusador”, é a personificação de orgulho desmedido, e domina todo o instrumento – especialmente o logro - para desviar a humanidade de agir de acordo com os seus interesses, isto é, de se unir com Deus em perfeita harmonia. O Diabo semeia divisão e destruição desde o início dos tempos, na esperança vã de vencer uma guerra condenada desde o princípio; ainda assim, ele continua a trabalhar diligentemente, se não para ganhar, então para causar o maior número de perdas que conseguir efetuar ao lado contrário. Para este fim ele tem levado muitos à perdição, a sua mentira tendo corrompido tudo o que deve ser sagrado e puro. Por isso, o logro tem de estar abaixo do cristão. Ele não pode mentir quando jura fidelidade a um Deus omnisciente que preza a retidão e www.biblion.pt 33


opinião

a justiça. Ele não pode enganar o Adversário astuto, ou acabará sendo enganado por ele. Ele apenas pode enganar-se a si próprio e aos outros; mas fazer isso seria desprezar os preceitos da fé cristã. Existem certas religiões neste mundo que permitem ao seus praticantes esconder e até rejeitar a fé diante dos seus opositores em certas situações, mas o cristão não pensa assim. Perjúrio e hipocrisia são armas do Diabo, não de Cristo; se Pedro sentiu vergonha depois de ter negado Jesus em público, não deviam todos os cristãos sentir o mesmo quando o fazem

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nos seus corações, quanto mais em público? O logro é assim incompatível com a fé cristã – e no entanto cresce tanto em círculos cristãos como em seculares. No final de contas, o homem continua a ser um homem, o que no Cristianismo se traduz numa criatura incrivelmente incongruente, uma pessoa feita na imagem de Deus mas corrompida pelo pecado. Dito isto, não é de admirar que a guerra espiritual do cristão nunca pára, uma vez que ela é tentada mesmo em alturas que parece estar mais segura. No entanto, esse é exatamente o


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propósito do logro de Satanás: atacar quando menos se espera, manipular os seus inimigos – que, de acordo com a Bíblia, inclui Deus e toda a Sua criação – e deixá-los vulneráveis. A arte da guerra espiritual baseiase não no logro, mas na verdade. O cristão fiel sabe que a verade é a única forma de vencer o Adversário. Mas como disse Pilatos, “O que é a verdade?” Para o crente, a verdade é a Palavra de Deus. Ela contém a promessa de redenção e graça através das quais o homem é justificado pela fé. Ela revela o carácter de Deus e denuncia a rebelião de Satanás. Ela traz luz à vida imaculada de Cristo, que no entanto sofreu um castigo brutal para a salvação de muitos. Ao agarrar-se à verdade e ao proclamá-la – mesmo à custa da sua própria vida – o cristão cumpre o seu chamado e emerge vitorioso da

batalha espiritual em que está constantemente envolvido. Ao confessar perante Deus e arrepender-se do seu pecado, o cristão nega a Satanás a oportunidade de o acusar. Aí está o conceito fundamental da arte: a verdade e apenas a verdade derrota o Adversário, contraria os seus planos e desarma as suas armadilhas. É uma grande provação pôr este princípio em prática, e haverão alturas em que o crente simplesmente não conseguirá fazê-lo; nestas alturas, o crente deve-se lembrar que não está só, que Aquele que lhe trouxe a verdade o ajudará a defendê-la. Se ele se cingir à verdade, ele vai com certeza triunfar; ele terá posto o Diabo em cheque-mate na luta pela sua alma e ganho para si mesmo a coroa do vencedor – uma recompensa merecedora para aquele que domina a arte da guerra espiritual.

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Ulfius

Ector

Mordred

Uther

Gareth

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L igar os pontos

AUTORES CRISTÃOS DO SÉC. xx (r.u.) G. K. Chesterton •

• Basic Christianity

C. S. Lewis •

• The Hobbit

J. R. R. Tolkien •

• Knowing God

Evelyn Underhill •

• Mysticism

John Stott •

• As Crónicas de Nárnia

J. I. Packer •

• Orthodoxy

COMO UTILIZAR ESTA SECÇÃO:

1: Fazer o Download do PDF

2: Imprimir as páginas específicas

3: Divirta-se!

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38 EDIÇÃO Nº10 R espostas : 1 - Quintiliano; 2 - Lucano; 3 - Séneca; 4 - Echegaray; 5 - Averróis; 6 - Cervantes; 7 - Saramago; 8 - Pessoa; 9 - García Lorca; 10 - Maimónides; 11 - Camões.

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1 - Orador romano famoso que influenciou as escolas de retórica Renascentistas com a obra Institutio Oratoria.

2 - Um dos grandes poetas da Roma Antiga, autor de Farsália, condenado à morte com apenas 25 anos de idade.

4 - O primeiro autor espanhol a vencer o Prémio Nobel, louvado pela sua habilidade como dramaturgo.

3 - Estadista romano e filósofo estoico de renome, tutor e conselheiro de Nero.

5 - Filósofo andaluz conhecido pelo seu comentário de Aristóteles e pela obra Tahafut al-Tahafut, uma resposta à crítica da filosofia ocidental por parte de Al-Ghazali.

6 - Autor de Don Quixote, considerado o maior escritor espanhol de todos os tempos, e um dos melhores romancistas da história.

7 - Autor português laureado com o Prémio Nobel, conhecido pelo seu estilo incomum de escrever.

9 - Poeta e dramaturgo espanhol oriundo da Andaluzia, morto aos 38 anos de idade.

8 - Poeta português ilustre, conhecido por ter escrito sob dezenas de pseudónimos, autor de Mensagem.

10 - Filósofo judeu sefardita de Córduba, autor do Mishné Torá e mestre da lei Judaica, considerado o mais importante da Idade Média. 11 - Autor d'Os Lusíadas, considerado o maior poeta português da história.

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