Rubem Alves e Moacyr Scliar

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FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELO Sistemas de Bibliotecas da UNICAMP / Diretoria de Tratamento da Informação Bibliotecário: Helena Joana Flipsen - CRB-8ª / 5283 AL87r

Alves, Rubem, 1933-. Rubem Alves & Moacyr Scliar conversam sobre o corpo e a alma : uma abordagem médico-literária / Rubem Alves e Moacyr Scliar. -- Campinas, SP : Saberes Editora, 2011. ISBN 978-85-62844-08-9 1. Literatura. 2. Psicologia. 3. Medicina. 4. Qualidade de vida. I. Scliar, Moacyr, 1937 - II. Título.

CDD - 800 - 150 - 610 - 613


RUBEM ALVES & MOACYR SCLIAR CONVERSAM SOBRE O CORPO E A ALMA Uma abordagem médico-literária


Copyright © by Rubem Alves e Moacyr Scliar Direito desta edição Saberes Editora - 2011

Editores Lenir Santos Luiz Odorico Monteiro de Andrade Capa Bruna Mello Projeto gráfico e editoração Valéria Ashkar Ferreira Fotografia e áudio Flavio Bekeredjian Raphael Lupo Revisão Anna Carolina Garcia de Souza

Av. Santa Isabel, 260 - sala 5 B.Geraldo - Campinas, SP - Brasil CEP 13084-012 Fone +55 19 3288.0013 saberes@sabereseditora.com.br www.sabereseditora.com.br

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RUBEM ALVES & MOACYR SCLIAR CONVERSAM SOBRE O CORPO E A ALMA Uma abordagem médico-literária



ÍNDICE

APRESENTAÇÃO SAÚDE, FELICIDADE, CORPO E ALMA DOENÇAS DA ALMA O SOFRIMENTO DO CORPO E DA ALMA E A CRIATIVIDADE DOENÇAS DA ALMA E SAÚDE MENTAL O PODER MÉDICO A PALAVRA E SEU PODER TERAPÊUTICO A SAÚDE E A DOENÇA NA BÍBLIA A VELHICE E A MORTE

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APRESENTAÇÃO

Juntar dois grandes autores em uma conversa não se trata de uma ideia nova, mas sempre será nova em relação às pessoas que se juntam e ao tema discutido. É o caso deste livro. Instigada pela vontade de ver em uma mesma sala Rubem Alves e Moacyr Scliar discutindo saúde do corpo e da alma, dei asas à imaginação, e a ideia logo se transformou em realidade. Esta obra traz Rubem Alves, educador, psicanalista e autor que escreve prosa como se fosse poesia e Moacyr Scliar, médico,


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especialista em saúde pública, escritor renomado que honrou seu público com obras como Saturno nos trópicos, em que versa sobre a melancolia. Com o Rubem sempre mantive uma relação de amizade, da época da Unicamp quando ele fez o meu casamento com o Guido Ivan. Cerimônia na qual recebemos de presente uma gaiola com a porta sem trava e um pé de morango – este último para que nunca nos esquecêssemos de que mesmo à beira de um abismo pode haver um morango nos chamando para a vida. Com o Moacyr uma relação de leitora-escritor. Seus livros sempre andaram pelas minhas cabeceiras e o seu Saturno nos trópicos me levou a imaginar esta conversa com o Rubem que ora a Saberes apresenta aos leitores. A saúde, em sua maior dimensão, está envolta em grande complexidade por se tratar de um tema cheio de nuances, implicando o corpo, as alegrias, as dores físicas e metafísicas do indivíduo. Todas as nossas emoções acabam tendo, de algum mo­do, a ver com nossa saúde. Geralmente quando se pensa em saúde, lembramos-nos de imediato da doença do corpo, nos esquecendo da dimensão da alma. Todos os nossos estados de bem-estar ou mal-estar estão ligados à saúde, seja a do corpo, da alma ou do espírito. E é nessa dimensão que se desenvolve a conversa entre os nossos autores. Se viver é perigoso, como dizia Riobaldo, em Grande Sertão: Veredas, é importante dimensionar os riscos que devemos e podemos correr para se viver uma vida de maior plenitude. E os temas 12


Apresentação

saúde, felicidade, alegria, melancolia, riscos, medo, psicoses, paixão, fazem parte da conversa entre Rubem e Moacyr. Rubem sempre com suas metáforas, em uma clara tentativa de melhor elucidar esses estados da alma, e Moacyr voltando-se para as ciências médicas e sua história ao longo do tempo. Ambos trouxeram seus profundos conhecimentos bíblicos para discorrer sobre a doença na Bíblia, nela tratada como se fosse um castigo divino e, sua cura, uma dádiva, uma recompensa ou uma bondade de Deus – o pecado e a absolvição. E não deixaram de lado o relevante e instigante tema do poder mítico do médico. A figura do médico diante de um paciente sempre enfraquecido pelas dores físicas, morais ou mentais que a ele recorre como quem vai a um oráculo sagrado detentor do dom da cura. Os autores, como literatos que são, não poderiam deixar de lado a discussão sobre o poder terapêutico da palavra – o verbo – e o papel da literatura sobre a saúde mental de seus leitores, tema tão ricamente explorado nessa conversa informal que teve como cenário a minha casa, em Campinas, num dia de céu claro e culinária a agradar o corpo e a alma. A discussão acabou sendo mediada por Odorico Monteiro. Interessante que inicialmente esta conversa não teria um mediador. Isto foi decidido nos últimos instantes de maneira muito feliz. Odorico, também médico e editor da Saberes Editora, acabou sendo o responsável por instigar nossos brilhantes autores a refletir sobre a importância do modo de vida das pessoas em relação à sua saúde. Tudo isso resultou em um caldo médico-literário que leva o leitor a realizar profundas reflexões sobre a vida, a saúde e 13


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tudo aquilo que pode interferir em nosso modo de viver e nos levar tanto a caminhos de maior sabedoria e serenidade como ao aprofundamento dos conflitos que cotidianamente nos assolam em um mundo muito apressado. Esperamos que todos aproveitem a erudição, as metáforas, as reflexões que emergem o tempo todo na conversa entre Rubem Alves e Moacyr Scliar. Certamente será uma leitura prazerosa e reflexiva.

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SAÚDE, FELICIDADE, CORPO E ALMA

Odorico Monteiro – Vocês conhecem o conceito de saúde da Organização Mundial de Saúde (OMS): “saúde é o estado de mais completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de enfermidade”. Iniciemos esta conversa com a seguinte provocação: esse não seria o conceito de felicidade? Rubem Alves – Talvez, como brincadeira, eu faria uma primeira pergunta (que fiz quando me encontrei com todos vocês hoje): Será que o Mike Tyson tem boa saúde? E como não consegui chegar a uma conclusão sobre tal ques-


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tão e não sei se ela combina bem com a definição da Organização Mundial de Saúde, então a passo para o Scliar e para o Odorico, ambos médicos. Moacyr Scliar – Em primeiro lugar, quero dizer que é um prazer muito grande estar aqui com essa figura absolutamente lendária que é o Rubem Alves, alguém que faz parte do patrimônio cultural brasileiro e do mundo como um todo, discutindo tão interessante assunto, precipitado por essa sua pergunta tão insólita quanto provocadora. Mike Tyson é um homem sadio, e Rubem nos remete ao conceito de saúde da OMS colocado inicialmente pelo Odorico. Esse conceito, para aqueles que não o conhecem, surgiu em 1948 e, ao afirmar que saúde é um estado do mais completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas ausência de enfermidade, torna a avaliação do estado de saúde de uma pessoa muito difícil. No caso do Mike Tyson, se este for examinado por um clínico, talvez se possa afirmar que suas condições circulatórias, respiratórias etc. são boas; a massa muscular então, nem se fala! Mas será que ele possui o mais completo bem-estar físico, mental e social? Será que é uma pessoa sem queixas? Por causa disso, essa definição, ao longo do tempo, foi muito criticada na área da saúde pública, na qual trabalhei por muitos anos. A observação que se faz é de que não se trata de uma definição de saúde, mas de felicidade. O mais completo bem-estar físico, mental e social existe? Será que algum indivíduo pode dizer que vive no mais completo estado de bem-estar físico, mental e social? 20


Saúde, felicidade, corpo e alma

Rubem Alves – Eu acho que sim, desde que essa pessoa seja mentalmente perturbada, porque alguém que se julga feliz, que diz viver em estado de felicidade, até pode pensar que é feliz. Mas ela não pode se sentir feliz o tempo todo conforme o conceito da OMS. Isso é quase impossível para um indivíduo normal, uma vez que a inquietação, a melancolia, a tristeza, a raiva, as dúvidas existenciais fazem parte da natureza humana, caso contrário o homem não teria evoluído. A evolução é fruto da insatisfação, da inquietação, da infelicidade. Lembro-me de um pequeno trecho de ­ Fernando Pessoa no qual afirmava ter uma raiva imensa das pessoas que se julgavam felizes, porque elas apenas pensavam que eram felizes, uma vez que não conseguiam perceber a infelicidade intrínseca à realidade humana. Moacyr Scliar – Muito bem, Rubem. Você nos indica outro rumo, que é o da felicidade, mencionado pelo Odorico logo no início. A felicidade em contraposição à saúde, porque o critério de ausência de enfermidade é relativamente simples. Podemos examinar uma pessoa e constatar que, ao menos naquele momento, ela não tem doença nenhuma. Mas, afirmar que esse indivíduo é feliz é um problema muito difícil. Freud, que dedicou sua vida a estudar o psiquismo humano, dizia que a felicidade é uma coisa que não existe. O máximo que podemos almejar, dizia ele, é um estado de tranquila infelicidade, ou seja, se não podemos ser felizes, sejamos ao menos tranquilos, estejamos ao menos em paz conosco mesmo. Ele sabia muito bem que o tratamento que preconizou, a psicanálise, que deve ser feita por um bom tempo, não levaria a 21


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pessoa à felicidade, mas a um autoentendimento que a ajudaria a viver melhor. Odorico Monteiro – Rubem, fale um pouco mais sobre a felicidade. Certa vez ouvi você comentar que “felicidade” é uma palavra muito grande. Você e o Moacyr poderiam também comentar um pouco mais a afirmação de Freud de que a felicidade não existe? Como é que vocês encaram a felicidade? Na opinião de ambos, somos ou não felizes? Ou somos infelizes, conforme o título da obra Perche siamo infelice, a ser em breve lançado pela Saberes Editora. Rubem Alves – Felicidade, felicidade... Primeiro, a palavra é grande demais e o sentimento, pleno demais: dizer “eu sou feliz”, seria possível? Felicidade é grande demais para se realizar. O Riobaldo, em determinado momento diz que felicidade “só em raros momentos de distração”. A gente agarra aquele momento, mas ele escorrega, escorrega e vai embora tão rápido, tão rápido, que é uma tristeza. É uma tristeza que assim seja. A minha área não é a das enfermidades físicas. Vejo somente as coisas que podem ser vistas com a alma. Quando a alma sofre, ela sofre, porque sofre? Nem sempre sabemos bem por quê. Eu não sei por que a alma sofre, e, quando sofre, mergulha-se em um estado completo de sofrimento metafísico. Eu sofro. Por que sofro? Estou deprimido. Por que estou deprimido? Por que razão a gente sofre muitas vezes sem causa aparente? Nem sempre sabemos. Nem sempre se sabe. O Browning dizia que a gente vai tranquilamente andando pela rua e de repente um pôr de sol de novo... E estamos perdidos. Só de 22


Saúde, felicidade, corpo e alma

pensar o que o pôr de sol traz... Porque o pôr do sol é metafórico. Nós e a nossa alma ficamos enfermos de metáforas ao ver o pôr do sol, porque ele é metafórico. A metáfora da beleza e da finitude da vida. Que coisa interessante pensar que a metáfora possa, em certos momentos, nos trazer a enfermidade da alma. Moacyr Scliar – Isso que o Rubem comenta é algo curioso porque nos remete ao nosso outro lado que é o da literatura. A metáfora é a matéria-prima da literatura. Mas existe uma relação curiosa entre metáfora e doença que foi muito bem expressa em um livro da escritora norte-americana Susan Sontag, A doença como metáfora. Na realidade, não se tratava de um livro, mas de um artigo publicado no The New York Review of Books. Nesse artigo, ela analisou, digamos, o significado imaginário das doenças. Trabalhou com duas doenças, a tuberculose e o câncer, depois acrescentou ainda uma terceira: a AIDS. A autora mostra como essas doenças tinham grande significado simbólico. A tuberculose, por exemplo, era a doença do romântico. Aquela coisa de ver a tuberculose como castigo ao mesmo tempo em que também era uma oportunidade de elevação do espírito, fazendo o doente viver emoções intensas. Trabalhei um tempo com pessoas tuberculosas e essa imagem real­mente existia. A imagem de que o tuberculoso vivia em frenesi era, até certo ponto, compreensível, porque a tuberculose acometia pessoas jovens em uma época em que tal doença era mortal, incurável. Castro Alves é um bom exemplo. Morreu jovem dessa doença, aos vinte e poucos anos. Era a excitação da vida versus a proximidade da morte. 23


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Rubem Alves – O Keats morreu de tuberculose. Há um belo filme sobre isso. Moacyr Scliar – Realmente é um filme muito bonito. A tuberculose fazia com que esses jovens acelerassem seu ritmo vital, era a doen­ ça da paixão. O sanatório onde trabalhei era impressionante. Falava-se do tesão do tuberculoso. Um impulso sexual irresistível os acompanhava durante toda a doença. Esse estado era atribuído, em parte, ao estado febril e, em parte, à sensação, à consciência de finitude trazida pela doença. Odorico Monteiro – Eu gostaria que vocês retomassem o tema da alma. O Rubem introduziu uma questão importante, a do sofrimento da alma. Como é que vocês veem o sofrimento da alma e do corpo durante a caminhada civilizatória, culminando atualmente na humanidade mergulhada na tecnologia, na pluralidade e na velocidade do conhecimento. Como se deu e se dá esse diálogo do corpo e da alma? Rubem Alves – Gosto de usar metáforas. Talvez por ter formação teológica, ainda que não acredite nas entidades teológicas. Assim, prefiro trabalhar com metáforas. Vou usar a seguinte metáfora: corpo e alma são instrumento musical e música. O corpo é o ­hardware, o instrumento, é o violino, e a alma, a música que o violino toca. Pode-se ter um instrumento maravilhoso como o do Mike Tyson, que é um instrumento perfeito, mas que não toca nada. E pode-se ter um instrumento extremamente frágil, um violino com 24


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uma corda só, e tocar uma coisa fantástica naquele instrumento tão pobre! Produz-se beleza. Às vezes, o instrumento produz beleza, a doença produz beleza. Liszt comentava que Chopin estava sendo destruído pela tuberculose, mas era como se a doença atingisse sua alma. Aquela doença o tornava melancólico. Era uma doença que atingia sua alma. Os Noturnos de Chopin são de uma melancolia, de uma tristeza, e penso que tudo aquilo tinha a ver, de alguma maneira, com a sua alma. Ela estava tocada pela doença de um modo criativo, produzindo beleza. Moacyr Scliar – A minha aproximação do tema é um pouco diferente. Não se trata de uma aproximação fundamentada talvez pelo estudo da medicina. Médicos em geral estão mais preocupados com as coisas concretas do corpo, pelo fato de poderem diagnos­ ticar e tratar. Assim, deixam a alma para outros especialistas. O corpo é deles, e a alma, de outros. Mas trata-se de algo curioso, porque isso foi se estabelecendo de forma gradual ao longo da história. Quer dizer, se olharmos para a Antiguidade, por exemplo, e sobretudo se analisarmos as religiões monoteístas, veremos que a alma é uma entidade muito importante. Na verdade, o corpo é apenas o invólucro, a carcaça, que a alma usa temporariamente como habitação. Quando a morte chega, a alma se liberta. Isso é curioso, assim como a ideia da morte, hoje mal aceita. Nas religiões antigas, ao contrário, a morte era às vezes encarada como bênção, como a libertação do indivíduo do vale de lágrimas. Era a morte que o conduziria para uma redenção misericordiosa. Por isso, o estudo do corpo ficava em um plano absolutamente se25


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cundário. Na história da medicina isso fica bastante evidente, porque por muito tempo o estudo das doenças ou a teoria sobre as doenças prescindia da anatomia. O estudo do cadáver, aliás, era proibido pelas religiões monoteístas e pelas culturas grega e romana. Com a Modernidade começaram os estudos de anatomia, o que é compreensível porque com a Modernidade as fronteiras foram rompidas. De repente, os navios passaram a navegar pelo mundo todo, os telescópios estavam voltados para os astros, substâncias químicas estavam sendo descobertas, investigadas. Então, nessa conjuntura, não fazia sentido o corpo continuar sendo território desconhecido. É exatamente no começo da Modernidade que surge a anatomia. Mais tarde surge o conceito cartesiano da máquina corporal, o organismo sendo comparado a uma máquina. Mas Descartes não prescindia da noção de alma. A alma era algo incorporado ao corpo. Era “the ghost in the machine”, na expressão do filósofo Gilbert Ryle, o fantasma na máquina. Mas, obviamente, é muito mais fácil lidar com a máquina corporal, consertar a máquina corporal, um conceito que a medicina seguiu durante muito tempo e continua seguindo. É mais simples do que se preocupar com a alma, algo que a maioria das pessoas realmente não entendia e deixava para os teólogos, sacerdotes e místicos. Rubem Alves – Mas a ideia da máquina é muito atraente, não acham? Porque se quebramos uma perna, vamos ao mecânico, e, se tudo fosse simples assim, o mecânico e suas ferramentas bastariam, mas quando lidamos com a alma... O que é isso? Uma entidade? Por onde desliza? Um dos problemas discutidos pelos filósofos 26


Saúde, felicidade, corpo e alma

antigos era como fazer a conexão entre a coisa material e a espiritual. Há um grande mistério. Um mistério como o dos talentos. Um músico como Nelson Freire, fisicamente muito parecido comigo, nascido na mesma cidade que eu – Boa Esperança, em Minas Gerais –, mas tem um negócio dentro dele... Alma? Não sei. Mas sei que não é matéria. Disso eu tenho certeza. Essa coisa faz com que ele se assente ao piano... E aí o piano adquire alma, o mundo adquire alma, e faz com que todas as almas fiquem irmanadas na beleza que ele produz. Sobre isso eu não sei dizer. Estou pensando em criar um outro tipo de professor, um professor de espantos! Moacyr Scliar – Muito bom, Rubem. Isso dá um título de livro. Rubem Alves – Espantos porque certas coisa são tão espantosas, tão espantosas como a questão da alma. Quer algo mais espantoso do que isso?

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