Fabulações da paisagem

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valéria scornaienchi

Fa bul aç õe s da pai sag em


Talvez a invenção da paisagem seja o lugar para onde a mente e o corpo vão em momentos diferentes. Talvez seja descobrir novos caminhos para me deslocar, seja através do corpo ou da mente. Durante esse período de quarentena eu tenho pensado em como, quando nos deslocamos para lugares diversos, somos levados a ver tudo de uma determinada forma. Somos conduzidos a realizar percursos, a repetir caminhos percorridos por todos que ali viajam. O fato de não poder sair de casa, e pensar nessas questões me fez experimentar o que seria estar em outros lugares sem sair de casa. Um encontro com um sentimento do viajante que busca outros lugares, desconhecidos, desabitados e talvez inexistentes. Esse livro mescla desenhos feitos de montanhas de diversos lugares do mundo, e de imagens retiradas da internet sobre os andes, acompanhadas de um diário de uma viagem inventada.


Dia 01


Percorre mais de uma dezena de quilôme tros antes de solidific ar. Pequen os lobos e dedos que rompe m continu amente a superfíci e. Um mar profund o. Perman ência.



A ch uv a co m ca nt o do s pรก ss ar o. D eix e ir.


Dia 03

O dia amanhece gelado. Me cubro de roupas, aqueço a cabeça e as mãos, deixando somente os olhos de fora. Aqui as geleiras tropicais não são afetadas por temperaturas mais amenas associadas aos trópicos. Andar no frio é um desafio, mesmo estando aqui já a alguns dias ainda o frio me atravessa, me rasga por dentro e nem a vontade de ver a paisagem gelada e branca dá conta de resistir. Me esforço e continuo caminhando em direção aos rios geleiras, um mar de espelhos azuis e brancos que ofuscam o olhar. Não há como não pensar em caminhar pelos rios gelados e lembrar das cenas de filmes de casais patinando no gelo emoldurados pela imensa paisagem branca.


Cascas, pedras, troncos, insetos, vento, flor, semente s, paina, folha, terra, pena.

A areia da planĂ­cie ĂŠa rocha inquieta da montan ha que chegou ao seu estado de tranquili dade.


Dia 04


17508 ilhas localizadas entre o Sudeste Asiático e a Austrália. Sempre que penso em ilhas me vem duas coisas distintas, o isolamento e ao mesmo tempo o pertencimento. Se consideramos que as ilhas oceânicas se formam através dos vulcões, que entram em erupção debaixo das profundezas e empurram o seu fundo de terra para cima criando uma montanha; a montanha, a ilha e o vulcão são a mesma coisa?


Dia 05



Dia 06

Com botas de borracha atravesso riachos e vejo o rio que canta para a montanha; e a montanha que carrega o canto do rio. Sussurro no ar, e a montanha canta para o cĂŠu. Orquestra de montanhas no silencio dos Andes. Carrego os cantos do rio e da montanha e, passo a passo, vou me encantando de rios, montanhas e lagos. E por um momento vejo os rios que sobem as montanhas e desaguam no seu cume.



Dia 07

É preciso um bocado de determinação, resgatar a força e vencer a solidão. Esquecer o cansaço e observar a realidade. Natureza de todos os lados. Vulcão, montanhas, pedras, árvores, desejo, medo, disciplina, amor e tudo vai se repetindo com alternados sentimentos. Deixo rastros no caminho e levo o ar que me toca. O sol aquece o corpo e a mente determinada me faz presente. De cima vejo as rochas salientes no mar. Mar rochedo. Ar rochedo.



Dia 08

A subida íngreme me faz alternar subir caminhando de frente e de costas. Alternância de paisagem. As pedras no chão e o verde das encostas. Ali não se podia ver o fim do caminho e nem mesmo por quanto tempo ainda teria de caminhar. O ar que faltava e a deslumbrante paisagem. Pedras esculpidas pelos ventos e cachoeiras. Parte essencial da crosta terrestre. Arte essencial da crosta terrestre.


C a mi nh o d o ri o Ri o e M ar En co nt ro da s ag ua s Va le di st an te


Dia 09

Gestos orgânicos. Restos orgânicos


Dia 10


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