18ª Festa Literária Internacional de Paraty 2020
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Ministério da Turismo e Associação Casa Azul apresentam
18ª Festa Literária Internacional de Paraty 2020
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Sumário Table of Contents
Ensaios e inéditos Essays and unpublished items
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Bem-vindos à Flip 2019 Liz Calder
Welcome to Flip 2019 Liz Calder
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O dédalo de Euclides Carlos Augusto Calil Triste Brasil Elizabeth Hardwick Um raro modo de se fazer cidades Guilherme Wisnik Cabeça-de-frade Cacaso
Euclides’ labyrinth Carlos Augusto Calil Sad Brazil Elizabeth Hardwick A rare way of making cities Guilherme Wisnik Cabeça-de-frade Cacaso
A memória coletiva das ruas de Paraty Mauro Munhoz Vertigem brasileira Fernanda Diamant Canudos sobrevive Otavio Frias Filho Programa
The collective memory of the streets of Paraty Mauro Munhoz Brazilian vertigo Fernanda Diamant Canudos survives Otavio Frias Filho Programme
Quarta Quinta Sexta Sábado Domingo
Wednesday Thursday Friday Saturday Sunday
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Programa Principal Main Programme
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atual
Programa Educativo Education Programme
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Terra Nova
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158 166
176 178 Flip+
lizar
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Leitor adulto não brota do vazio Belita Cermelli Programa Atividades
Adult readers don’t emerge from nothing Belita Cermelli Programme Activities
Apresentação Mauro Munhoz Máquinas do mundo No ar
Foreword Mauro Munhoz Máquinas do mundo No ar
Diferentes linguagens, diferentes culturas Programa Exposições Flip+ Cinema Rodas de conversas e apresentações artísticas
Different languages, different cultures Programme Exhibitions Flip+ Cinema Roundtable talks and artistical presentations
Paraty
196 198 202
Praça Aberta Comer e beber Hospedar-se
Praça Aberta Where to eat and drink Where to stay
Parceiros Partners
206 214 216 240
Parceiros Patronos Casas parceiras Agradecimentos
Partners Patrons Partner places Acknowledgements
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Ensaios e inĂŠditos Essays and unpublished items
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Pandemia, prosa, Paraty
Em setembro de 2020, a pandemia já tinha tirado mais de um milhão de vidas humanas em todo o planeta. Os números aumentam dia a dia e as consequências e efeitos da doença continuam imprevisíveis. Os meses de distanciamento social do primeiro semestre do ano — que ainda são uma realidade para muitos e que continuam como possibilidade para todos — fizeram com que os olhares se voltassem para o interior de cada um, assim como para os ambientes privados, em oposição aos públicos. Contudo, por forçar uma mirada para dentro das casas, a pandemia fez com que a ausência ou precariedade delas para grande parte da população ficasse ainda mais evidente. Nesse sentido, ainda que isolados, a pandemia fez com que todos olhassem para as cidades, suas desigualdades e contradições. Este livro de ensaios da 18ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) propõe-se a ser um possível retrato do momento atual para uma Festa Literária, para Paraty, para a cultura e para o modo como fazemos e pensamos as cidades. Com ensaios de Mauro Munhoz, diretor artístico da Flip; Gustavo Pacheco, escritor, antropólogo e 8
diplomata; Tuca Vieira, fotógrafo; Flávio de Araújo, poeta paratiense; XX, XX; e XX, XX, este é um livro bem enraizado no momento, mas também perene, pelo simples motivo de que vai atrás de respostas onde a Flip sempre as buscou: na literatura e nas artes. Boa leitura!
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Paraty, caminhos que se entrosam Mauro Munhoz
Uma comunhão, uma convergência. Foi assim que, na década de 1960, o urbanista Lúcio Costa definiu Paraty ao dizer que ela é “a cidade onde os caminhos do mar e os caminhos da terra se encontram, melhor, se entrosam”. Paraty é a água que flui para as ruas, alagando o passeio público, embaçando fronteiras. E é essa característica de diluição de divisas que baliza toda a vida local. Nesse sentido, Paraty também não separa cultura e paisagem. Ignorar isso é ignorar a própria essência da cidade. Durante cerca de quatro meses neste ano, Paraty fechou suas portas aos visitantes. Uma responsável resposta à pandemia de Covid-19. Nesses dias, as ruas vazias fizeram lembrar um outro tempo de isolamento, anterior ao turismo de massa, anterior à década de 1970 – antes da construção da Rio-Santos, a BR-101, que foi alardeada pelo então governo militar como um “elo de integração turística”. Na época, a rodovia — de fato e de forma necessária — religou Paraty às grandes capitais do sudeste, Rio de Janeiro e São Paulo, mas também desconsiderou em grande parte o entrosamento tão característico da 10
cidade. Concretamente dividiu territórios tradicionais, quilombolas, indígenas, caiçaras que, assim como os rios que fluem para dentro das ruas paratienses, precisam dessa diluição de fronteiras para continuar existindo. Em certo sentido, foi como a construção de um muro, que tornou mais difíceis as trocas socioculturais do território. Ao contrário do traçado da Rio-Santos, cego aos matizes do território, a Flip surgiu, em 2003, com a intenção de se alimentar, mas também de nutrir, a força de Paraty. Através da literatura, das artes e de uma intervenção urbana não invasiva — capaz de ressignificar espaços públicos por meio das estruturas de diferentes temporalidades instaladas no cotidiano da cidade e nos dias da Festa —, a Flip vem buscando a comunhão entre a cidade e os visitantes, sejam eles convidados renomados ou o público interessado. Outro aspecto da pandemia foi que, ao olhar Paraty vazia, o tempo evocado (anterior à BR-101) trouxe à memória o isolamento, mas também os encontros proporcionados pelas ruas da cidade: o artista local, Zé Kleber, em troca constante com o Cinema Novo; a pintora Djanira inspirando e sendo inspirada pelos paratienses; e o bar Valhacouto, reduto da boemia local, que reunia intelectuais, artistas e visitantes de passagem pela cidade. Todas essas imagens — o isolamento, a rodovia, a vida cultural paratiense — deixaram claro que a 18ª edição da Flip também se fazia necessária neste complexo ano 11
de pandemia. E que ela não poderia prescindir das quatro letras que formam seu nome: Festa Literária Internacional de Paraty. Tinha que ser uma Festa, um encontro; tinha que ser literária, com sua dimensão artística que tanto explica do mundo; tinha que ser internacional, embaralhando as fronteiras entre o local e o global; tinha que respirar Paraty. Ao contar com a presença dos jovens cirandeiros Fernando e Marcello Alcantara, caiçaras, músicos, lutieres e pesquisadores de sua própria cultura na festa virtual este ano, a Flip está reafirmando e se nutrindo do que há de mais intrínseco em Paraty: o entrosamento descrito por Lúcio Costa. A mesa com os cirandeiros, filmada no beco do Propósito – um dos locais mais simbólicos para a cultura paratiense –, e transmitida pela primeira vez durante os dias da Flip Virtual, não é um caso isolado na programação. Ao lado dela também estão as mesas entre Elisa Pereira e Rodrigo Ciríaco, e Luz Ribeiro e Nathalia Leal, que além de gravadas na cidade, entrosaram locais e convidados de fora. Elisa, que adotou Paraty como sua cidade, é escritora e fundadora do Fuzuê Literário, sarau que nasceu de uma oficina ministrada por Rodrigo, poeta e educador das periferias de São Paulo. Nathalia, que também escolheu Paraty para viver, é poeta e uma das organizadoras do Slam de Quinta, batalha de poesia falada que se conecta à Luz, poeta, pedagoga e primeira mulher a vencer o campeonato brasileiro de slam, o Slam BR, em 2016. Juntas, essas três mesas fornecem um retrato fiel 12
e atual da cidade: o tradicional e o contemporâneo. No passado, o poeta paratiense Flávio de Araújo, que trabalhava como entregador de quentinhas, quase atropelou o escritor britânico Benjamin Zephaniah, convidado da Flip. Naquele momento, decidiu se dedicar à escrita com mais afinco. Hoje, já publicou seu livro de poesia Zangareio, tem textos traduzidos em diferentes coletâneas e assina uma crônica neste livro. Uma vez que a Flip continua perseguindo a possibilidade de esbarrões (ainda que virtuais), como o de Flávio e Benjamin, outros encontros e coincidências começam a surgir naturalmente. É o caso, por exemplo, da região costeira de Buenaventura, descrita pela autora colombiana Pilar Quintana em seu livro A Cachorra, e que, em muitos aspectos, lembra Paraty. Por fim, durante os meses de fechamento da cidade na pandemia, as ruas completamente vazias também trouxeram à memória um tempo em que os moradores do centro histórico abriam a porta de casa para conversar e ver o mundo passar nos fins de tarde. Essa cena, contudo, não se repetiu. Não por causa da pandemia, mas por causa da lógica econômica e social que mudou a forma de uso do casario de Paraty: antes moradia, agora comércio. De certa forma, a pandemia fez olhar para dentro, e foi fácil constatar que algo se perdeu nesse caminho que teve início lá atrás, com a construção da BR-101. Por outro lado, é possível ver outras urbanidades se formando em Paraty para além do centro histórico e 13
que são tão bem retratadas, por exemplo, pelos slams organizados por jovens, que acontecem na rodoviária. Por isso, a pandemia também fez ver que, sim, há uma dimensão humana que existe nas coisas, no encontro entre a água e as ruas, que vem se esgarçando. Mas a arte e a literatura continuam aqui para alimentar essa dimensão.
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Problemas seletos Gustavo Pacheco 1 No vigésimo dia de quarentena, ou talvez no trigésimo sexto, você resolve baixar livros de poemas de César Vallejo na internet. Entre os vários títulos que a ferramenta de busca oferece, há um chamado Problemas selectos. Curioso, você abre o arquivo, imaginando que deve haver algum erro, e descobre que o título é esse mesmo, pois se trata de um livro de problemas matemáticos publicado pela Universidade César Vallejo. Você levanta os olhos da tela do computador e pensa na beleza sóbria e concreta de um título como Problemas selectos, e diz a si mesmo que é um bom título para um livro de poemas; depois pensa que a vida é demasiado curta para ter problemas que não sejam seletos, e em seguida examina melhor o que significa a frase “ter problemas seletos”, e é inevitável deixar César Vallejo de lado e voltar a pensar nos seus problemas. Você diz a si mesmo que problemas seletos são problemas escolhidos a dedo, problemas de excepcional qualidade que você, como um cliente exigente num supermercado, seleciona com cuidado dentre muitos outros problemas possíveis que reclamam sua atenção 16
enquanto você passa diante deles. Você diz a si mesmo que tem saúde, sua mulher e seus filhos têm saúde, você ama sua mulher e seus filhos, você tem um emprego estável e que paga um bom salário. Seus problemas principais hoje são a sensação generalizada de tristeza e desânimo com o destino do mundo e mais especificamente do seu país, a dolorosa saudade de encontrar e abraçar os amigos, a incapacidade de escrever qualquer coisa que preste. Não são problemas originais, é claro; mas você quer acreditar que pelo menos eles são seletos, e que isso é o que importa.
2 Dois dias depois, ou talvez nove, você recebe um e-mail do escritor. Ele diz que acabou de escrever um conto, quer publicá-lo numa revista e pergunta se você teria o contato do editor. Você está às voltas com seus problemas seletos e leva dois dias para responder. Nesse meio tempo, o escritor já acertou a publicação do conto com um jornal, mas diz que está terminando outro texto para publicar na revista. Você tem trinta anos a menos do que ele e diz que inveja sua produtividade. "Esse medo do futuro está me deixando a mil”, diz ele.
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3 Cinco dias depois, ou talvez treze, você fica sabendo que o escritor foi internado com coronavírus. Sua primeira reação é chorar, pois o escritor é velho e cheio de problemas de saúde, você sabe que ele não tem muitas chances de sair dessa vivo. Sua segunda reação é secar as lágrimas e lembrar de alguma frase de Sêneca, ou talvez de Epicteto, que diz para não perdermos tempo com aquilo que não está sob nosso controle. Você repete a frase a si mesmo várias vezes ao longo do dia enquanto se entrega àquela faxina pesada na casa, que você deveria fazer uma vez por semana, mas na prática só faz duas ou três vezes por mês, e então você decide que esse é um bom dia para varrer e passar um pano molhado na casa inteira, e se agarra à beleza sóbria e concreta desse trabalho para tentar esvaziar a cabeça.
4 No dia seguinte, você recebe uma mensagem de um jornalista que pergunta se você toparia escrever o obituário do escritor. Você nunca escreveu um obituário na sua vida, muito menos de alguém de quem você era próximo e que ainda estava vivo. É algo que beira o masoquismo. Mesmo assim, você aceita. Você passa uma noite longa e estranha escrevendo o obituário. Você bebe duas garrafas de vinho sozinho 18
enquanto passa doze horas diante do computador pensando no escritor, relendo trechos de seus livros e dos e-mails que trocou com ele nos últimos anos, e tentando espremer os 78 anos de vida e os vinte livros do escritor em seis mil caracteres, incluindo espaços. Você precisa domesticar de alguma forma a estranheza dessa situação, então começa a fantasiar que escrever o obituário é uma espécie de bizarro ritual propiciatório, uma forma de simular a morte para assim evitá-la. Enquanto escreve, você cria imagens mentais em que o escritor melhora, sai do hospital e volta para casa. Você imagina o escritor lendo o obituário que você escreveu, fazendo piadas de humor negro e reclamando, de brincadeira, que você não foi laudatório o suficiente. Você termina de escrever às nove da manhã, bêbado e exausto, e manda o texto para o jornalista junto com uma mensagem que diz: imagino que você já esteja acostumado a situações como essa, eu não estou. O jornalista responde: já passei várias vezes por situações como essa, mas continuo achando estranho; não são poucas as vezes em que o homenageado melhora e a gente precisa arquivar o texto. O arquivo do jornal está cheio de obituários que não chegaram a ser publicados, alguns estão aqui há mais de quinze anos, diz ele.
5 No dia seguinte, você fica sabendo que o escritor melhorou e que diminuíram sua sedação. Se alguém lhe 19
perguntasse isso, você negaria, é claro, mas algo dentro de você insiste em levar em consideração a possibilidade de que o seu ritual particular possa ter algo a ver com a melhora dele. Já curado da ressaca do dia anterior, você abre outra garrafa de vinho.
6 Você bebe bem mais do que havia planejado e acorda às duas da tarde. Há uma enxurrada de mensagens no seu celular. A primeira delas, enviada de manhã bem cedo, é do jornalista avisando que o escritor teve uma parada cardíaca de madrugada e que o obituário tinha sido publicado naquele dia.
7 Três dias depois, ou talvez trinta, você volta a pensar no que significa a frase “ter problemas seletos”, e é inevitável deixar os seus problemas de lado e se lembrar dos livros de César Vallejo que baixou na internet. Você abre um deles e lê essas palavras:
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¡Cómo, hermanos humanos, no deciros que ya no puedo y ya no puedo con tanto cajón, tanto minuto, tanta lagartija y tanta inversión, tanto lejos y tanta sed de sed! Señor Ministro de Salud: ¿qué hacer? ¡Ah! desgraciadamente, hombres humanos, hay, hermanos, muchísimo que hacer.
In memoriam Sérgio Sant'Anna, 1941—2020
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Fronteira movediça
Antes, a cidade histórica terminava na rua da Praia; hoje vai até a rua Fresca. Para além dali, o mar. Em Paraty, os limites da cidade vêm sendo alterados ano a ano, década a década. São movediços, nesse sentido. Há a ação do homem: canalizando, assoreando, dragando, aterrando. Mas há a ação também da natureza, imparável, e que faz com que nessa cidade a fronteira entre água e ruas seja sempre imprecisa. É um processo sistêmico, um leque de aluvião infindável, que faz com que as águas dos rios e do mar ditem a forma da terra e a terra desenhe o caminho da água. Assim, para além da rua Fresca, onde qualquer ideia mais cartesiana sugeriria um limite claro entre cidade e mar, Paraty acaba num território que vem se renovando dia a dia e que é impossível de ser captado, porque sempre mutável. Ora ele se assemelha a um manguezal, ora a uma praia. Talvez por isso, por essa incapacidade de ser definido, ele permaneça muitas vezes como um estranho à cidade e seus visitantes. Já foi indesejado a ponto de ser relegado a despejo de entulho ou estacionamento.
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No ensaio a seguir, assinado pelo fotógrafo e pesquisador Tuca Vieira, que vem estudando os limites das pequenas e grandes cidades há anos, esse território paratiense, fronteira movediça da cidade, surge em todo seu potencial. Ele é, de certa forma, o maior representante simbólico do espírito de Paraty: um lugar que dissolve e embaça fronteiras, que proporciona encontros, que serve sempre como um entrosamento de caminhos, sejam eles naturais ou culturais. Sobre o fotógrafo Tuca Vieira é fotógrafo, mestre em Arquitetura e Urbanismo (FAU-USP) e bacharel em Letras (FFLCHUSP). Fez parte da equipe de fotografia do jornal Folha de S. Paulo de 2002 a 2009. Atualmente, é fotógrafo independente, desenvolvendo projetos que envolvem um olhar diferente para cidades, paisagem urbana, arquitetura e urbanismo. É também autor do livro Salto no escuro: leituras do espaço contemporâneo (Hedra, 2020).
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A fera e os radicais Flávio de Araújo Impossível deixar a perplexidade de lado após a leitura, mas ponderava arriscar minha vida a fim de sair às ruas da cidade deserta em busca de ingredientes para fazer coalhada seca. Receita bem fácil, claro, dá pra fazer com leite de caixinha, mas o crème de la crème é feito com leite fresco, e não é em todo lugar que se acha, principalmente agora. Foi-se o tempo, não o meu tempo, mas antes não havia quem não pescasse vacas nos cercos flutuantes ou tivesse sua plantação de peixes no quintal, tamanha a fartura. E seguia me preparando para sair de casa, primeiro a roupa, os pés de pato, a quantidade de oxigênio no cilindro, o afiado arpão e, claro, um bom cuspe na máscara de mergulho para desembaçar. Sobretudo é preciso retirar o cheiro acre das mãos espalmadas e que as mãos não aflijam o dorso salgado do oceano em aquaplanagem, pois, dependendo do impacto, podem desencadear ondas, aguçando as ampolas de Lorenzini em seu focinho. Ser extremamente enérgico nisto: retirar o sangue imiscuído por entre as frinchas das unhas, pois o menor resquício desleixado entre o sabugo pode excitar os eletrorreceptores e a sanha mortal da fera. A perturbação permanece até agora, após ter lido Tubarão, do Peter Benchley, bem no início da pandemia. O clássico, também levado à telona por Steven 56
Spielberg, retrata uma comunidade de veranistas ameaçada por um grande tubarão branco, enquanto os mandantes locais minimizam a bocarra da besta em detrimento do quiproquó que essa notícia acarretaria, pois afugentaria milhares de visitantes que aquecem a economia exatamente na chamada alta temporada. Não por temer o ataque do anhangá dos mares, que de demônio não tem nada, aliás, o sicário de Benchley acabou se tornando a vítima, entrando na lista dos animais ameaçados de extinção após a adaptação de Spielberg; não, meu medo é outro, pois está posta a analogia, o vírus, esse grande tubarão invisível, nos ronda lá fora, esse sim, algoz, que atravessou o atlântico golfando terror através de suas poderosas guelras e que agora ergue sua cauda notável em nossas águas mornas, portanto a urgência de fecharmos nossas praias. O tubarão é astuto, eu sei, é capaz de abalroar embarcações de bom calado e de arrancar qualquer membro do corpo a um golpe rápido de seus muitos dentes. Como em Amity, balneário fictício de Long Island, o Brasil flerta com o negacionismo. É fácil se deparar com figuras como o alcaide Larry Vaughan, que, bem pior que os negacionistas, tem ciência do predador e mesmo assim protela a debandada dos banhistas, afirmando que a fera não passa de um bagrezinho. Mas cá entre nós, pescadores locais, a diferenciação entre peixes é bem simples: cação é o que você come, tubarão é o que come você; e sobre ser ou não ser um tubarão que lhe morde, não conheço quem queira dar o segundo braço para tirar a dúvida. Poucos aqui 57
lembram, não é a primeira vez que o tubarão surge, na verdade ele nunca deixou de mostrar suas barbatanas por aqui. No sistema capitalista, muito próximos dos padrões da geometria fractal de Mandelbrot, onde o objeto, físico ou geométrico, é ordenado por partes reduzidas com forma similar à dele próprio, como, por exemplo, um floco de neve ou uma folha de samambaia, os ciclos econômicos, como se caracterizam, se fecham em torno do seu próprio eixo; no entanto, em seu centro, apenas o esgarçamento dos desvalidos, refiro-me a populações que foram destituídas de coordenar o compasso em torno de suas próprias vidas, vergadas à monocultura de que tanto falou Eduardo Galeano em As veias abertas da América Latina. Obrigada a isolar-se frente à pandemia, vejo Paraty se absurdar, dando conta de que seu isolamento é bem mais doloroso do que em muitas cidades, pois não foi apenas necessário se afastar de seu próximo, mas vital fechar-se àquele estranho que lhe apraz. Parece contraditório relacionar o sistema capitalista com toda a desigualdade social que acarreta do padrão fractal, mas basta apenas uma grande dentada do tubarão para observar como o paradigma se repete nos fiapos. Dadas as devidas exceções, o sistema transforma qualquer sociedade com base apenas num segmento econômico-social, repetidor da sua imagem e semelhança, sim, o capitalismo é um grande brócolis romanesco. 58
Que ninguém se engane: há uma especificidade no predador em questão que destoa dos demais: tal como o vírus, é mutante até a cepa. O tubarão é um velho e indesejado conhecido, sua investida acarretou sangria econômica em Paraty em 1710 após a abertura do Novo Caminho, levando a coroa a temer a mordida em seus lingotes, proibindo que o ouro de Minas saísse do nosso porto rumo a Lisboa, findando o primeiro ciclo. Entretanto, dez anos depois, a cidade estancou suas feridas, afugentando a fera ao usar cachaça como repelente, tanto que Paraty virou sinônimo da bebida. Dando conta de que a commodity produzia algo extremamente rentável, utilizou o destilado como moeda de troca na compra de africanos escravizados, levando, assim, a cidade à opulência. Mas o tubarão, já trocando as barbatanas de tão bêbado, foi mais sagaz, macerando com açúcar e sem afeto o desprezível ciclo escravagista, levando a cidade à ruína. Pausa para o cafezinho. Paraty conseguiu lutar com a fera, embora tendo a metade do corpo dentro da goela do bicho. Mas a produção de café tipo exportação vinda do Vale do Paraíba foi tomada numa golada só pelo tuba com a inauguração da Ferrovia Pedro II, unindo Rio de Janeiro e São Paulo, ilhando o município dessa via comercial. O turismo é um capítulo à parte. Com a abertura da estrada Rio-Santos, deslumbrada por suas benesses, a bela adormecida aos pés do mar não se abstraiu de sua própria história, principalmente enlevada pela ideia de que, diferente da estagnação de sua prosperidade 59
perpetrada pelo fim dos ciclos do ouro, cana de açúcar e café, o turismo estava longe de ser um ciclo como os demais enquanto perpetuum mobile de força irrefreável, no entanto, o tubarão surgiu mais uma vez para dizer que não é bem assim, que o turismo, tal como está, também pode ser engolido. A analogia do tubarão chegou na forma de um vírus, mas retornará travestida de revolução da inteligência artificial, de uma guerra e de repente até de invasão alienígena. O importante é desenvolver redes de proteção, levar em conta o que Harari, autor de Sapiens, disse sobre governos defenderem pessoas, e não os seus empregos; e não estar sujeito às variações dos ciclos econômicos, pois, entre um ciclo e outro, vidas são levadas. Fugir do patriotismo desnecessário, pois tubarões não se sujeitam às demarcações, bem fácil entender, pois contamos diariamente nossos mortos na cadência dos milhares, e me ocorre a fala de José Arcadio Buendía em Cem anos de solidão “Ainda não temos um morto – ele disse. A gente não é de um lugar enquanto não tem um morto enterrado nele”; desde então, não há um sequer que possa negar a sua brasilidade. A cidade isolada por obstante não me isola, pois eu sou maior que a cidade repleta, a vida da minha vizinha vale mais que um hotel repleto de turistas; e se havíamos pensado que o turismo nos daria tudo, voltamos a pescar nossos peixes, a colher nossa comida e a plantar nossos remédios, porque o ciclo baseado num turismo vazio, tal como os outros, levou mais do que ofereceu. 60
Voltando à feitura da coalhada seca, mesmo paramentado, resolvi ficar em casa, o luxo de sair às ruas só para comprar leite fresco me desqualificaria, principalmente se me deparasse com o tubarão, me forçando a levá-lo para casa comigo. Vasculhei no armário e acabei encontrando leite, de caixinha mesmo, esperei que amornasse após a fervura, então viria o fracasso ao ver que não tinha o iogurte, mas sorte minha ter me lembrado de minha mãe falando que com um copo da coalhada já feita é possível produzir mais coalhada, pois tem os mesmos lactobacilos que coagulam o leite, e assim sucessivamente, como nos fractais. Flávio de Araújo é filho de uma família de pescadores caiçaras da Praia do Sono, em Paraty. Em 2008 publicou pelo Selo Off Flip seu livro de estreia, Zangareio, participando como autor convidado em diversos festivais no Brasil e no exterior. Tem poemas publicados em coletâneas, sites e revistas literárias, entre os quais o Jornal de Poesia, Germina, Washington Square Review, Jornal de Poesia, Revista Mānoa – Hawaii e Ruído Manifesto. Possui os inéditos: Vermelho Guelra (poesia) e O insustentável equilíbrio das perdas (romance), ainda sem editora.
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(Título?) Alice Plane Ao despertar, pensei que seria um dia como os outros. Olhei para as frestas da janela cor-de-pele para adivinhar o horário através da luminosidade rosada. Estava ainda escuro, mas o canto dos pássaros anunciou que era hora; seria apenas um dia nublado. Coloquei as plantas dos pés no chão para sentir o toque da madeira. Evitando farpas, caminhei até o banheiro, aterrissei no mármore e me olhei no espelho. Nessa hora, talvez, eu pudesse ter antecipado que havia algo diferente em mim, mas não. Parecia tudo normal. Enrolei meus cachos no coque habitual e rumei para a cozinha. Foi no meio do corredor, depois da xilogravura e antes do mapa da Amazônia, que me veio a sensação estranha. Como um raio, a impressão de já ter estado em outro lugar que não fosse o quarto, o banheiro, o corredor, a cozinha, entende? Varri essa ideia da cabeça rapidamente, desinfetei o lugar de onde ela brotou com o gel e foquei na rotina. Seria gostoso saborear café agroecológico torrado à lenha no sul de Minas. Comecei a preparar panquecas, afinal, terças-feiras são dias de panquecas. Quando o leite jorrou da garrafa para a tigela, no entanto, o fluxo me remeteu a outro lugar de novo. Um lugar onde as águas reluzem no sol, no fluxo das águas. Aquilo me deixou nervosa. Conferi que havia tomado meus florais e estava tudo certo. Talvez fosse pressão baixa. Sim, devia ser isso. Coloquei uma playlist 62
animada para sacudir a manhã, preparei café sem olhar muito para ele, me sentei na mesa com uma determinação sem tamanho, mas, quando cravei a faca na manteiga, tive a sensação nítida de já ter estado em outro lugar. De que o meu corpo já tinha atravessado a porta através da qual eu recebo os alimentos. Não apenas as sacolas passavam para dentro, mas eu também passava para fora, entende? Deixei o café quente escorrer na minha boca para ter certeza de que não era um sonho. A cafeína só atiçou a fantasia. Como num sonho estranho, vi meu corpo atravessar a porta sem sapatos, e pior — sem máscara. Eu caminhava pela rua que fica na frente do meu prédio. Havia outras pessoas lá, igualmente desprotegidas. Fiquei agitada, mas não consegui evitar aqueles pensamentos. Fiquei ali, com o olhar vidrado, me vendo cumprimentar as pessoas e, acredite, uma mulher ruiva parou e, toda sorridente, me abraçou. Me perguntou como ia o meu trabalho. Nessa hora, engasguei feio e tive que erguer os braços e respirar fundo para ganhar pé. Eu já trabalhei? Recobri um pedaço da panqueca com geleia de amora, mas não levei à boca. Aquelas imagens tinham cheiro de memórias passadas, não sonhos. Sonhos não têm cheiros. De toda forma, seria possível sonhar com algo que nunca se viu? Será que eu já tinha estado fora de casa? Andado na rua na frente do meu prédio? Então, aquelas imagens começaram a se ampliar, e eu me vi dentro de um avião, desses que voam no céu da varanda. Uma sequência de imagens minhas chegando numa cidade marrom, diferente da minha, que é cinza. Fiquei sem ar. Eu encontrava pessoas e elas me saudavam alegremente. Quando eu 63
estava quase hiperventilando, Antônio apareceu ao lado do liquidificador. Me perguntou por que eu acordei tão cedo e caminhou rumo à despensa. Eu disse que acordei na hora de sempre, quando os pássaros cantam. Fiquei sem saber se contava para ele ou guardava para mim a suspeita de já ter estado em outro lugar. Tive medo de contar e ele achar que estou ficando louca. Já aconteceu de eu dizer para ele, “Amor, eu sinto falta da praia” e ele dar uma gargalhada, alta de verdade. “Ah, sua sonhadora. Você sempre foi assim. É por isso que eu te amo tanto”. Então, achei melhor guardar para mim, ainda que elas me parecessem tão vividas… Antônio começou a contar feijões. Ele adotou essa prática, antes do café. Ele pega um saco de feijões e conta quantos feijões tem nele. Depois ele pega um caderninho e anota quantos vieram naquele saco. A estimativa dele é que haja uma variação de 5% para mais ou para menos, de acordo com a marca. Dentro da mesma marca, há uma variação de 2,3% no número de feijões, o que o leva a crer que em cada fábrica há uma medida diferente para encher um saco de feijões, ainda que todos venham como sendo de 1 kg. É importante a gente se manter ocupado, ele me diz. O Antônio é muito companheiro, eu não poderia jamais trair a confiança dele. Mas, outro dia, o mensageiro do prédio, ao trazer as sacolas, olhou para mim de comprido. Eu não soube dizer exatamente o que significava aquele olhar. Não era sedutor. Não era ameaçador. Aquela era a manhã de reorganizar sapatos na ordem inversa da semana anterior. Me lembro que, daquela vez, eu ordenava-os dos mais claros para os mais escuros. Outrora, já fizera pela altura dos saltos — dos mais baixos aos mais altos, 64
depois o inverso. Fiquei pensando no mensageiro. Que para chegar na minha porta, ele deve subir as escadas. Antes das escadas, o portão. Ou seja, ele certamente já esteve na rua. No dia seguinte, quando a campainha tocou, Antônio estava desfazendo um tricô que fizera na semana passada para refazê-lo em seguida. Estava tão compenetrado que eu disse, “Pode deixar que eu atendo”. Sei que a gente deve deixar o momento mais divertido do dia para o nosso companheiro, mas ele estava tão focado que nem me ouviu. Então, pousei os calcanhares no chão de linóleo e segui com firmeza, o coração pulsando. Ultrapassei a fronteira da sala, reservada para atividades noturnas, coloquei a máscara, as luvas, olhei no olho mágico para ter a certeza e girei a chave. O mensageiro estava lá e disse, “Boa tarde”. Eu ecoei “Boa tarde” e já ia fechando a porta quando a coragem se ergueu. “Ei…”, eu o chamei. “Posso te fazer uma pergunta?”. Ele pareceu surpreso. “Claro”. Olhei para o final do corredor, para ter a certeza de que Antônio não nos ouviria e falei baixinho, “Você, por acaso, já me viu lá embaixo?” Meu corpo inteiro enrubesceu. Ele olhou para os lados também, parecendo incerto sobre o que responder. Nessa hora, Antônio surgiu ao lado do piano, que fica ao lado da porta. E, bem, meu coração trepidou e, apesar de querer muito saber a resposta, tive medo. Talvez a boca do mensageiro tenha balbuciado algo, mas eu lacrei meus olhos e ouvidos, agradeci por ele trazer as compras para casa e bati a porta. Antônio ergueu o tricô com uma mão e um novelo com a outra e perguntou, “Amor, você acha que esse tom de amarelo é o mesmo desse ou é um ton-sur-ton?” Eu olhei para os novelos. Eram 65
absolutamente idênticos. Ele é um cara especial, o Antônio. A calma que ele transmite contagia. Ao lado dele, meus sentimentos estranhos desaparecem. Me senti eu mesma de novo e então respondi, “São idênticos, amor”. Ele sorriu para mim, animado. Arrematei, “Agora, vou desfazer a colcha de retalhos e montá-la toda em outro padrão!” Ele vibrou, “Que ótima ideia!” e ainda me lembrou, “Não esqueça que às 14:32 temos nosso jogo de cartas na varanda”.
*Texto premiado com o 1º lugar (tema: Brasil) no concurso “Traversées – Travessias: Concurso de Escrita Criativa”, realizado pela Embaixada da França.
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(Título?) Eu estou aqui. Eu continuo aqui. Costumava-se dizer que “muita água correu por baixo da ponte”, mas agora é o caso de dizer que a água secou embaixo da ponte, ou então que ela transbordou e levou a ponte junto. Tudo depende se falamos do verão, esmagador, que evapora cada gota de suor, ou se falamos do inverno, glacial, com suas tempestades que absorvem o som, deixando somente um silêncio interminável. Sobre o telhado vegetalizado, um gota-a-gota mantém o calor em níveis aceitáveis no interior do prédio, neste mês de junho de 2070. A água impregna um espesso alinhamento de vasos de terracota, descendo do telhado e ao longo da fachada. A umidade assim mantida é uma barreira eficaz contra as ondas de ar ardente, e ainda permite que cresçam as leguminosas e algumas verduras. Cada prédio dispõe de uma base alimentar autônoma. As crianças gritam. Elas correm e percorrem sempre o mesmo circuito, inscrito no chão à força de circularem ainda e uma vez mais no espaço interior das mesmas paredes, sobre o mesmo chão, como eu antes deles e os filhos deles depois deles. A onda de calor na qual mergulhamos no dia 12 de maio não diminui em nada sua energia. Toda noite eu os autorizo a subir e descer as escadas umas dez vezes seguidas, para assim liberar o excesso de tudo que os preenche. Os vizinhos não gostam — pode acontecer alguma transmissão. Por alguma razão estranha, em sua alegria inocente, em sua energia, as crianças assustam. 68
Sobretudo os idosos. A solução encontrada foi a seguinte: intervalos que dividimos proporcionalmente entre as crianças e adultos em bom estado de saúde. Em troca, nos ajudamos uns aos outros. As crianças colaboram, nos revezamos subindo e descendo as coisas da senhora do quarto andar. Drones depositam e depois recolhem tudo no piso térreo. Umas poucas vezes um ser humano, mesmo depois de setembro, quando a onda de calor perde força, é fato raro. As entregas têm quer ser feitas no intervalo atribuído à utilização das escadas, e somos obrigados a pegar a entrega praticamente na mesma hora. Do contrário, dá tudo errado. Com um pouco de organização, as coisas acontecem direitinho. Só nos comunicamos por mensagens instantâneas entre nós, o grupo do número 100 da rua de Silly — aliás, como com todos os outros. Quanto aos amigos, os encontros são feitos em fóruns online, ou então em plataformas de vida virtual. Os picos de temperatura são tais que qualquer outro tipo de contato ou ligação não é sequer considerado. Quanto às escadarias, encontramos um sistema de refrigeração natural. Utilizamos os esgotos como “qanat”, essas redes subterrâneas de águas profundas que ventilam um ar relativamente fresco. É uma técnica ancestral utilizada pelos persas do deserto. Combinados com nossas antigas chaminés, aumentadas e adaptadas, os “qanats” formam um sistema de renovação de ar inteiramente mecânico, natural, entre o subsolo e o prédio. Não é preciso eletricidade — que, aliás, é proibido ter desde meu nascimento, em 11 de dezembro de 2037. Os gases fluorados dos aparelhos de ar condicionado há menos de um século contribuíram para 69
fazer do mundo o que ele é hoje. Graças ao nosso sistema, no vão das escadas é quase mais agradável e ameno do que dentro dos apartamentos. E, no entanto, ninguém deixa a porta aberta. Muito arriscado. Os idosos se angustiam. Tudo tem um fim, eles sabem. Mas quanto mais eles se aproximam do fim, menos eles se sentem prontos. E cinquenta anos já é bastante tempo. Quando eles eram jovens, tudo era diferente, mesmo que tenha sido nessa época que o confinamento começou. Cinquenta anos era pouco mais da metade de uma vida, a “flor da idade”. Atualmente, cinquenta anos é sem dúvida demais. O que eles chamavam de liberdade incluía viajar de avião, de carro, de ônibus, de trem, dar caminhadas ao ar livre... Pode parecer um pouco maluco, como vida, e francamente não tenho vontade. Eu fico bem em casa, não tenho a menor necessidade de sair. Mas, para eles, isso soa como um paraíso perdido. Eles lidam mal com a perda. Com ficarem trancados em casa. E, apesar de estarem conectados, como todo mundo, falta alguma coisa. Quanto a mim, tanto faz. Eu estou aqui. Estou sempre aqui. Cresci desse jeito. É assim para todo mundo. Mesmo para as crianças. Eu cumpri meu dever cívico: faz quatro anos que isso dura, é longo e duro. Os dois primeiros bebês foram entregues para sorteio nacional, para serem distribuídos a outras pessoas. Os seguintes puderam ser escolha da barriga de aluguel. Eu mereci: fiz quatro. É raro. Por isso, pude criar dois. Além disso, como sou sozinha, de todo modo não seria possível criar os quatro. E eles, os que têm mais de sessenta anos, só sabem pensar a vida em termos de passado ou futuro: nas lembranças ou nos projetos. O presente está 70
ausente do modo de pensar deles. Eles simplesmente não consideram o presente contínuo, a ponto de muitos deles acabarem desistindo. Eles saíram a andar o pouco que ainda podiam e pronto. No verão, mesmo se hidratando em permanência, um ser humano gozando de boa saúde não suporta 72 horas na rua — por causa do calor, o corpo não aguenta. Azar. É, sem dúvida, um drama individual, mas coletivamente está tudo bem: o essencial do saber deles está consignado e gravado, salvo em inúmeros centros de dados informatizados espalhados pelo mundo todo, em diversas latitudes. Só o que desaparece é a experiência individual. Os saberes estão aí, estarão aí para sempre. Eu vou consultá-los com frequência, sinto uma certa nostalgia. Faço parte da primeira geração que cresceu com um único progenitor, atribuído por sorteio. O estoque de dados me permite criar as raízes que não tenho. Invento para mim mesma um passado que não tenho e depois outro, a cada vez diferente, sobre a trama das minhas recordações ou de objetos que ficaram no apartamento. Eu me considero uma viajante, mesmo que nunca, por mais que recue nas minhas lembranças, eu me lembre de ter saído deste apartamento no número 100 da rua de Silly, em Boulogne Billancourt. A imobilidade física é perfeitamente compatível com a ubiquidade digital. Eu estou aqui, mas estou em toda parte, onde quiser, quando quiser. Navego no rio Amazonas pescando piranhas, acampo com girafas e mergulho em águas profundas entre baleias jubarte. E, no subsolo, corro uma maratona em 6 horas e 12 minutos, uma proeza. Estou feliz porque tenho tudo o que quero. Meus filhos me trazem ao mesmo tempo a suavidade física deles, 71
sua intensidade emocional e seu sentido de aprendizado permanente. Eu adoro estar com eles. No momento certo, porei o apartamento no nome deles. Um deles vai seguramente ter que ir embora para que o outro possa fundar uma família aqui. Uma geração depois da outra, cada um a seu turno. Eu avisarei os drones e em seguida também irei caminhar, num verão, numa noite em que faça 50°C. Sentirei na pele a queimadura de um amanhecer e, então, num momento de incerteza, meu presente chegará ao fim, pela primeira vez.
*Texto premiado com o 1º lugar (tema: França) no concurso “Traversées – Travessias: Concurso de Escrita Criativa”, realizado pela Embaixada da França.
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teste A fera e os radicais Flávio de Araújo
Impossível deixar a perplexidade de lado após a leitura, mas ponderava arriscar minha vida a fim de sair às ruas da cidade deserta em busca de ingredientes para fazer coalhada seca. Receita bem fácil, claro, dá pra fazer com leite de caixinha, mas o crème de la crème é feito com leite fresco, e não é em todo lugar que se acha, principalmente agora. Foi-se o tempo, não o meu tempo, mas antes não havia quem não pescasse vacas nos cercos flutuantes ou tivesse sua plantação de peixes no quintal, tamanha a fartura. E seguia me preparando para sair de casa, primeiro a roupa, os pés de pato, a quantidade de oxigênio no cilindro, o afiado arpão e, claro, um bom cuspe na máscara de mergulho para desembaçar. Sobretudo é preciso retirar o cheiro acre das mãos espalmadas e que as mãos não aflijam o dorso salgado do oceano em aquaplanagem, pois, dependendo do impacto, podem desencadear ondas, aguçando as ampolas de Lorenzini em seu focinho. Ser extremamente enérgico nisto: retirar o sangue imiscuído por entre as frinchas das unhas, pois o menor resquício desleixado entre o sabugo pode excitar os eletrorreceptores e a sanha mortal da fera. A perturbação permanece até agora, após ter lido Tubarão, do Peter Benchley, bem no início da pandemia. O clássico, também 74
levado à telona por Steven Spielberg, retrata uma comunidade de veranistas ameaçada por um grande tubarão branco, enquanto os mandantes locais minimizam a bocarra da besta em detrimento do quiproquó que essa notícia acarretaria, pois afugentaria milhares de visitantes que aquecem a economia exatamente na chamada alta temporada. Não por temer o ataque do anhangá dos mares, que de demônio não tem nada, aliás, o sicário de Benchley acabou se tornando a vítima, entrando na lista dos animais ameaçados de extinção após a adaptação de Spielberg; não, meu medo é outro, pois está posta a analogia, o vírus, esse grande tubarão invisível, nos ronda lá fora, esse sim, algoz, que atravessou o atlântico golfando terror através de suas poderosas guelras e que agora ergue sua cauda notável em nossas águas mornas, portanto a urgência de fecharmos nossas praias. O tubarão é astuto, eu sei, é capaz de abalroar embarcações de bom calado e de arrancar qualquer membro do corpo a um golpe rápido de seus muitos dentes. Como em Amity, balneário fictício de Long Island, o Brasil flerta com o negacionismo. É fácil se deparar com figuras como o alcaide Larry Vaughan, que, bem pior que os negacionistas, tem ciência do predador e mesmo assim protela a debandada dos
banhistas, afirmando que a fera não passa de um bagrezinho. Mas cá entre nós, pescadores locais, a diferenciação entre peixes é bem simples: cação é o que você come, tubarão é o que come você; e sobre ser ou não ser um tubarão que lhe morde, não conheço quem queira dar o segundo braço para tirar a dúvida. Poucos aqui lembram, não é a primeira vez que o tubarão surge, na verdade ele nunca deixou de mostrar suas barbatanas por aqui. No sistema capitalista, muito próximos dos padrões da geometria fractal de Mandelbrot, onde o objeto, físico ou geométrico, é ordenado por partes reduzidas com forma similar à dele próprio, como, por exemplo, um floco de neve ou uma folha de samambaia, os ciclos econômicos, como se caracterizam, se fecham em torno do seu próprio eixo; no entanto, em seu centro, apenas o esgarçamento dos desvalidos, refiro-me a populações que foram destituídas de coordenar o compasso em torno de suas próprias vidas, vergadas à monocultura de que tanto falou Eduardo Galeano em As veias abertas da América Latina. Obrigada a isolar-se frente à pandemia, vejo Paraty se absurdar, dando conta de que seu isolamento é bem mais doloroso do que em muitas cidades, pois não foi apenas necessário se afastar de seu próximo, mas vital fechar-se àquele estranho que lhe apraz. Parece contraditório relacionar o sistema capitalista com toda a desigualdade social que acarreta do padrão fractal, mas basta apenas uma grande dentada do tubarão para observar como o paradigma se repete nos fiapos. Dadas as devidas exceções, o
sistema transforma qualquer sociedade com base apenas num segmento econômico-social, repetidor da sua imagem e semelhança, sim, o capitalismo é um grande brócolis romanesco. Que ninguém se engane: há uma especificidade no predador em questão que destoa dos demais: tal como o vírus, é mutante até a cepa. O tubarão é um velho e indesejado conhecido, sua investida acarretou sangria econômica em Paraty em 1710 após a abertura do Novo Caminho, levando a coroa a temer a mordida em seus lingotes, proibindo que o ouro de Minas saísse do nosso porto rumo a Lisboa, findando o primeiro ciclo. Entretanto, dez anos depois, a cidade estancou suas feridas, afugentando a fera ao usar cachaça como repelente, tanto que Paraty virou sinônimo da bebida. Dando conta de que a commodity produzia algo extremamente rentável, utilizou o destilado como moeda de troca na compra de africanos escravizados, levando, assim, a cidade à opulência. Mas o tubarão, já trocando as barbatanas de tão bêbado, foi mais sagaz, macerando com açúcar e sem afeto o desprezível ciclo escravagista, levando a cidade à ruína. Pausa para o cafezinho. Paraty conseguiu lutar com a fera, embora tendo a metade do corpo dentro da goela do bicho. Mas a produção de café tipo exportação vinda do Vale do Paraíba foi tomada numa golada só pelo tuba com a inauguração da Ferrovia Pedro II, unindo Rio de Janeiro e São Paulo, ilhando o município dessa via comercial. O turismo é um capítulo à parte. Com a abertura da estrada Rio-Santos, 75
A fera e os radicais deslumbrada por suas benesses, a bela adormecida aos pés do mar não se abstraiu de sua própria história, principalmente enlevada pela ideia de que, diferente da estagnação de sua prosperidade perpetrada pelo fim dos ciclos do ouro, cana de açúcar e café, o turismo estava longe de ser um ciclo como os demais enquanto perpetuum mobile de força irrefreável, no entanto, o tubarão surgiu mais uma vez para dizer que não é bem assim, que o turismo, tal como está, também pode ser engolido. A analogia do tubarão chegou na forma de um vírus, mas retornará travestida de revolução da inteligência artificial, de uma guerra e de repente até de invasão alienígena. O importante é desenvolver redes de proteção, levar em conta o que Harari, autor de Sapiens, disse sobre governos defenderem pessoas, e não os seus empregos; e não estar sujeito às variações dos ciclos econômicos, pois, entre um ciclo e outro, vidas são levadas. Fugir do patriotismo desnecessário, pois tubarões não se sujeitam às demarcações, bem fácil entender, pois contamos diariamente nossos mortos na cadência dos milhares, e me ocorre a fala de José Arcadio Buendía em Cem anos de solidão “Ainda não temos um morto – ele disse. A gente não é de um lugar enquanto não tem um morto enterrado nele”; desde então, não há um sequer que possa negar a sua brasilidade. A cidade isolada por obstante não me isola, pois eu sou maior que a cidade repleta, a vida da minha vizinha vale mais que um hotel repleto de turistas; e se havíamos pensado que o turismo nos daria tudo, voltamos a pescar nossos peixes, a colher nossa comida e a plantar nossos remédios, porque o ciclo baseado 76
num turismo vazio, tal como os outros, levou mais do que ofereceu. Voltando à feitura da coalhada seca, mesmo paramentado, resolvi ficar em casa, o luxo de sair às ruas só para comprar leite fresco me desqualificaria, principalmente se me deparasse com o tubarão, me forçando a levá-lo para casa comigo. Vasculhei no armário e acabei encontrando leite, de caixinha mesmo, esperei que amornasse após a fervura, então viria o fracasso ao ver que não tinha o iogurte, mas sorte minha ter me lembrado de minha mãe falando que com um copo da coalhada já feita é possível produzir mais coalhada, pois tem os mesmos lactobacilos que coagulam o leite, e assim sucessivamente, como nos fractais. Flávio de Araújo é filho de uma família de pescadores caiçaras da Praia do Sono, em Paraty. Em 2008 publicou pelo Selo Off Flip seu livro de estreia, Zangareio, participando como autor convidado em diversos festivais no Brasil e no exterior. Tem poemas publicados em coletâneas, sites e revistas literárias, entre os quais o Jornal de Poesia, Germina, Washington Square Review, Jornal de Poesia, Revista Mānoa – Hawaii e Ruído Manifesto. Possui os inéditos: Vermelho Guelra (poesia) e O insustentável equilíbrio das perdas (romance), ainda sem editora.
Flávio de Araújo
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Parceiros Partners
Em 2019, o Itaú completa uma década de apoio à Flip, que soma dezessete anos de atuação, ao longo dos quais se consolidou como a mais importante Festa Literária do Brasil. A cada edição, a Flip mobiliza o país com as ações do Programa Principal e com a efervescência cultural que estimula. O apoio à Flip está alinhado a outras ações do banco em prol da cultura brasileira. Ponto central dessas atividades é o Itaú Cultural, que realiza, em sua sede em São Paulo, e em vários pontos do país por meio de parcerias com outras instituições, exposições, debates, cursos, peças de teatro e apresentações musicais, além de produzir conteúdo de referência sobre as artes.
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Em maio de 2019, o Itaú Cultural pautou o tema do sertão nordestino, também presente nesta edição por meio da voz do escritor Euclides da Cunha, Autor Homenageado do ano. No Instituto, a temática foi levantada pelo 25o número da Revista Observatório — publicação do Observatório Itaú Cultural, setor dedicado ao estudo de políticas e gestão cultural no Brasil. Com o lançamento, foram promovidos um minicurso sobre literatura sertaneja, uma mostra de filmes e uma série de espetáculos cênicos para adultos e crianças: nosso “maio dos sertões”.
VAI S
Mais destaques do diálogo entre o Itaú Cultural e a Flip ao longo dos anos se referem a alguns dos homenageados de anos anteriores como Nelson Rodrigues (2007), Mário de Andrade (2015) e Hilda Hilst (2018), autores igualmente aprofundados pelo projeto Ocupação, que se debruça sobre criadores fundamentais da cultura brasileira. O programa ainda abordou a escritora Conceição Evaristo, que marcou a Festa Literária de 2017 e 2018. Confira entrevistas, artigos e uma diversidade de conteúdos on-line em: itaucultural.org.br/ocupacao.
SAIR
Convidamos o público da Flip a descobrir a Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras, um acervo dos pilares que norteiam o desenvolvimento das atividades do Itaú Cultural. Acompanhe a agenda e a produção de conteúdo do Instituto em: itaucultural.org.br.
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Maior grupo português em operação no Brasil e com atuação em todos os segmentos do setor elétrico nacional, a EDP Brasil tem na valorização do idioma uma de suas bandeiras e direciona recursos a projetos de fomento à cultura lusófona e à língua portuguesa, a língua mais utilizada no hemisfério sul do planeta e um dos principais elos entre Brasil e Portugal.
As the largest Portuguese group working in Brazil with operations in every segment of the national electricity sector, EDP Brasil champions the valorization of language through funding projects that celebrate Lusophone culture and Portuguese: the most widely spoken tongue in the Southern Hemisphere and one of the main links between Brazil and Portugal.
Com mais de vinte anos no país, a EDP Brasil está comprometida com a missão de usar a energia para o cuidado com as comunidades onde atua e com o patrimônio histórico e cultural das cidades brasileiras. Ao longo de uma década, a Companhia investiu cem milhões, por meio de seu Instituto, em projetos voltados à cultura e à educação, que beneficiaram cerca de três milhões de pessoas em mais de quatrocentos programas desenvolvidos em todo o país.
Operating for more than twenty years in the country, EDP Brasil is committed to using energy to care for its communities and for the historical and cultural heritage of Brazilian cities. In the last decade, the company — through the work of its Institute — has invested one hundred million in projects that foster culture and education, benefiting approximately three million people in more than four hundred programs carried out across the country.
Presente na Flip, uma das festas literárias mais famosas do mundo, há três anos consecutivos, a EDP Brasil também é a maior patrocinadora da reconstrução do Museu da Língua Portuguesa, destruído por um incêndio em 2015 e, mais recentemente, tornou-se a primeira patrocinadora da restauração do Museu do Ipiranga.
As well as its third consecutive year at Flip — one of the most prestigious literary events in the world — EDP Brasil is also the main sponsor of the reconstruction of Museu da Língua Portuguesa, which was destroyed by fire in 2015. More recently, the group became the first sponsor of the restoration of the Museu do Ipiranga.
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VAI S
A CMPC, maior fabricante de celulose branqueada de fibra curta de eucalipto, entende a importância de apoiar iniciativas que contribuem com a educação e a leitura. Por isso, pela primeira vez, apoia a Flip. Em 2019, o grupo chileno, que completa dez anos no Brasil com sede localizada no Rio Grande do Sul, investe em mais de quarenta iniciativas culturais, socioambientais, educativas e esportivas que geram valor compartilhado e deixam um legado positivo para as comunidades. Nossa celulose pode ser encontrada em uma infinidade de itens cotidianos — de lenços de papel e cosméticos às embalagens dos produtos alimentícios e eletrônicos, por exemplo.
SAIR
Há quase trinta anos, a CMPC produz milhares de cadernos escolares e 1.8 milhão de folhas de papel offset em formato A4 que são anualmente distribuídos nos 62 municípios que possuem espaços da empresa, para uso na rede pública de ensino. Todas as atividades são desenvolvidas com base no que chamamos dos “três Cs”: criar soluções modernas a partir da celulose, base para produtos consumidos em todo mundo; conviver e desenvolver iniciativas sociais com as comunidades vizinhas; e conservar, com foco na manutenção das vegetações nativas. No Rio Grande do Sul, quase metade da área florestal em que se localiza a CMPC — e que chega a corresponder a 190 mil campos de futebol — é preservada.
CMPC — the largest producer of bleached short-fiber eucalyptus pulp in the world — fully understands the importance of supporting initiatives that contribute to education and the practice of reading. With this in mind, the company is sponsoring Flip for the first time. In 2019, the Chilean group — which has been working in Brazil for a decade from its headquarters in the southern state of Rio Grande do Sul — is investing in more than forty cultural, socialenvironmental, educational and sports initiatives that generate shared value and have a long-lasting impact in the communities where the company operates. Our pulp can be found in a wide range of everyday items, from tissues to cosmetics, food packaging and electronics. For almost thirty years, CPMC has produced thousands of school notebooks and 1,8 million A4 offset paper sheets that are annually distributed to public schools in the 62 municipalities that host the company’s facilities. All corporate activities are developed based on what we call the “three Cs”: to create modern solutions from pulp as the basis for consumer products all over the world, to co-live and to develop social initiatives with neighboring communities; and to have conversations focused on the preservation of native vegetation. In Rio Grande do Sul, almost half of the forest area where CMPC is located — which corresponds to almost 190 thousand football pitches — is preserved. 85
Desde sua criação em 1946, pelos empresários do setor de comércio e serviços, o Sesc — Serviço Social do Comércio — tem participado ativamente do cenário cultural brasileiro. Fruto de um sólido projeto socioeducativo, sua atuação no campo da cultura traz como marcas a inovação e a transformação. Ao longo dos anos, a Instituição implantou novos modelos de ação cultural, criou espaços qualificados para a manifestação de diferentes linguagens artísticas e investiu na educação como premissa para a transformação social.
Since its founding, by businesspeople from the trade and services sector in 1946, Sesc — Serviço Social do Comércio — has taken an active part in the Brazilian cultural scenario. The fruit of a solid socio-educational project, Sesc’s activity in the field of Culture has established innovation and transformation as its trademark. Over the years, the Institution has implemented new models of cultural action, created spaces suitable for different artistic languages and invested in education as a premise for social transformation.
A concretização deste propósito se deu a partir de uma intensa atuação no campo da cultura e de suas diferentes expressões, destinadas a todos os públicos, em diversas faixas etárias e estratos sociais. A presença do Sesc na Flip corrobora a vocação da Instituição de levar ao público experiências mais duradouras e significativas, por meio de ações e parcerias comprometidas com a democratização do acesso à cultura e à produção da arte.
This objective has been achieved by intense activity in the field of culture and its different manifestations, aimed at many different types of public, in various ages and social groups. The presence of Sesc at Flip corroborates the Institution’s vocation to provide the public with lasting and significant experiences, through actions and partnerships that are committed to the democratization of access to culture and the production of art.
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VAI S
A Fundação Roberto Marinho investe há quarenta anos em soluções de educação. Com o objetivo de ampliar o acesso à cultura e à experiência de aprender, a Fundação concebeu os museus da Língua Portuguesa, do Futebol, de Arte do Rio, do Amanhã e da Imagem e do Som, bem como a Casa da Cultura de Paraty e o Paço do Frevo. Na Flip, o Museu da Língua Portuguesa celebra a diversidade de nosso idioma em mesa literária com o angolano Kalaf Epalanga no Programa Principal, slam internacional e ações com estudantes de Paraty.
SAIR
The Fundação Roberto Marinho has been investing in educational solutions for more than forty years. Aiming to increase the access to culture and learning experiences, the Foundation is responsible for the following projects: Museu da Língua Portuguesa, Museu do Futebol, Museu de Arte do Rio, Museu do Amanhã e Museu da Imagem e do Som, as well as Casa da Cultura de Paraty and Paço do Frevo. This year, during Flip, the Museu da Língua Portuguesa celebrates the diversity of our language in an event in the Main Programme, with the Angolan author Kalaf Epalanga, as well in the Slam poetry competition and other activities with students from Paraty.
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Patronos
Patrono Ouro Alfredo Egydio Setubal Fernão Bracher (em memória) João R Teixeira Jr José Kalil Filho Patrono Amarelo Família Scodro Patrono Azul Guilherme Affonso Ferreira Lucia e Roberto Malzoni Filho Maria Lúcia Abdalla
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Patrono Verde Bento, Carmo e Jovelino Mineiro Bitu e José Luiz Alquéres Flávia Pedras Soares Haydée e Alain Belda Sr Eduardo Maneira Patrono Branco Karla Osorio Netto Leo Slezynger Margarida Cintra Gordinho Sue & Chris Lund Rafael Lozano Costa Tetê Etrusco
ATUAL
Como se tornar patrono
How to become a patron
O Programa de Patronos é um plano de mecenato voltado a pessoas físicas que apoiam a realização da Flip. Os benefícios incluem ingressos para o Programa Principal, convites para o coquetel de boas-vindas com a participação dos autores convidados, encontros com a curadoria e direção-geral da Flip, entre outras ações.
The Patrons Programme is a patronage plan designed for individuals who support the staging of Flip. Benefits include tickets to the Main Programme, invitations to the welcome cocktails event with the opportunity to meet the guest authors, and meetings with the festival’s curators and directors, amongst others.
Como ser empresa parceira
How to become a corporate partner
Ao se tornar uma parceira da Flip, a empresa investe no patrimônio material e imaterial do Brasil e na divulgação internacional da cultura brasileira, além de colaborar para uma série de ações ligadas ao território, à educação e à cultura em Paraty. O programa de parcerias desenha ações de visibilidade alinhadas com a política de patrocínios da empresa e coloca os parceiros em contato com formadores de opinião do Brasil e do mundo.
By becoming a Flip partner, a company is investing in the tangible and intangible assets of Brazil and in the international dissemination of Brazilian culture, as well as collaborating in a series of actions connected with the region, education and culture of Paraty. The partners programme designs visibility actions in line with the sponsoring company’s sponsorship policy and puts the partners in contact with opinion formers in Brazil and around the world.
LIZAR
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Agradecimentos
A 17ª edição da Flip só se tornou possível graças ao apoio e à colaboração de inúmeras instituições, empresas e indivíduos. Agradecemos aos paratienses e a toda a equipe que faz a Flip; a Fernão Bracher (1935-2019), pelo apoio ao longo de todos esses anos; a Caio Carvalho, Carlos Augusto Calil, Claudia Melli, Christopher Peterson, Cristina Maseda, Danilo Santos de Miranda, Davi Arrigucci Jr., Débora Putzeys, Dom João Henrique de Orléans e Bragança, Eduardo Gianetti da Fonseca, Eduardo Saron, Elisa Menezes, Elizama Almeida de Oliveira, Enrico Weg Sera, Esther Hamburger, Fernando Quintino, Fernando Serapião, Giorgio della Seta, Gisela Domschke, Guilherme Wisnik, Hugo Barreto, Jane Leite Conceição da Silva, João Moreira Salles, Jorge Broide, Jorge Caldeira, Jorge da Cunha Lima, José Kalil Filho, José Mario Brasiliense, Lídia Gondenstein, Lilia Schwarcz, Luis Gouveia, Luis Perequê, Luiz Schwarcz, Marcia Pastore, Margarida Cintra Gordinho, Mariano Marovatto, Marília Scalzo, Marina Dias Teixeira, Mariza Costa Cermelli, Miguel Setas, Nuno Sampaio, Paula Dias de Brito, Paulo Bilyk, Pedro Landim, Pinheiro Neto Advogados, Regina Pinho de Almeida, Renan Ivo, Roberto Schwarz, Roberto Teixeira da Costa, Rosa Emilia Dias, Rose Klabin, Rubens Barbosa, Rui Campos, Sheyla Miranda e Thiago Benucci.
Agradecemos, ainda, a Alcino Leite Neto, Álvaro Uliani, Ana Cristina da Silva Santos, Anna Ferrari, Ava Rocha, Beatriz Bracher, Benjamin Magalhães, Djaimilia Pereira de Almeida, Fernando Barros e Silva, Guilherme Freitas, Isabel Diegues, Ismail Xavier, José Guilherme Pereira Leite, José Mário Pereira, Judith Brito, Julia Duarte, Maria Emilia Bender, Paula Miraglia, Paulo Roberto Pires, revista serrote, Rita Mattar, Rita Palmeira, Rodrigo Teixeira, Rosa Maria da Silva e Walter Salles. Um agradecimento especial a Otavio Frias Filho (1957-2018), Miranda e Emilia Diamant Frias.
ATUAL
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Agradecemos aos diretores, coordenadores, professores, alunos e equipe de apoio das escolas e instituições educativas e assistenciais de Paraty e região, que se mobilizam de diversas formas para levar a leitura a seus alunos. A todos os parceiros, editoras, bibliotecas, coletivos, autores, artistas, oficineiros, pesquisadores, músicos, mediadores, educadores, Coletivo de Mulheres Pretas de Paraty – Articula Preta, Beto Silva, Einara Fernandes, Eliezer Ribeiro e aos pequenos autores da Escola Municipal Parque da Mangueira, Estela Vilela, Gabriela Gibrail e Colégio Estadual Engenheiro Mário Moura Brasil do Amaral – CEMBRA, Gibrail Rameck Júnior e Instituto Náutico de Paraty – INP, Helena Cerello, Iracema Santos
do Nascimento, Irlani Carvalho, Lucia Caetano, Mell Brites, Miriam Espósito e crianças do território Costeiro de Ponta Grossa de Paraty, Nádia Martins, Orquestra Pequenina Calixto, Penélope Martins, Rafaela Deiab e Rede Mar de Leitores de Bibliotecas Comunitárias de Paraty que contribuíram com o Programa Educativo da Flip 2019.
Bombeiro Militar de Paraty, ao 33º Batalhão de Polícia Militar de Angra dos Reis, à Defesa Civil, à Juíza da Vara Única de Paraty-RJ e ao Juizado de Menores de Paraty, ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Paraty (CMDCAP), à Paróquia de Nossa Senhora dos Remédios, ao Pároco Padre Roberto Carlos Pereira, aos fornecedores Audio Bizz, MVD Eventos, Quântica — Elétrica Shows e Eventos, Caprimar, Z2 Cenografia, RP Lighting, Extratech Engenharia, Flash Links e Technik, aos restaurantes, bares, hotéis, pousadas e lojas parceiros.
LIZAR Agradecemos ainda a Condor, Moinho Brasil, Roberto Zanocco e Trident, que forneceram materiais para as oficinas; e a Clarissa Freitas, Lucas Cordeiro e Coordenadoria da Juventude de Paraty, e Zaila Lopes, que ajudaram na mobilização dos jovens para as programações. Agradecemos também ao Ministério da Cidadania, à Secretaria de Estado da Cultura do Rio de Janeiro, ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), ao Instituto Trilha da Arte e Educação — ITAE, à Prefeitura Municipal de Paraty, às Secretarias Municipais de Administração, do Ambiente e Urbanismo de Assistência Social e Direitos Humanos, de Cultura, de Educação, de Esporte e Lazer, de Finanças, de Habitação e Regularização Fundiária, de Obras, de Planejamento, de Saúde, de Segurança e Ordem Pública, de Turismo, Executiva de Governo, ao Gabinete do Prefeito de Paraty, à 167ª Delegacia de Polícia de Paraty, ao 26º Grupamento de
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patrocĂnio oficial
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apoio
realização
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Flip 2019
Conselho diretor
Programa Principal
Programa Educativo
Liz Calder presidente
Mauro Munhoz direção artística
Belita Cermelli direção geral
Belita Cermelli Esther Hamburger Louis Baum Mauro Munhoz
Fernanda Diamant curadoria
Luis Filipe Porto
Guilherme Tauil coordenação de conteúdo
Biblioteca Comunitária Casa Azul
Coordenação geral
Sofia Nestrovski assistente de curadoria
Gabriela Roza coordenação
Irene de Hollanda
Daniela Roza Maia Pigot Sérgio Mariano Central Flipzona Instituto Asas Comunicação Educativa Experiências gráficas Desdobras Raras
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Arquitetura, Arte e Design
Comunicação
Produção
Mauro Munhoz direção geral
Beatriz Reingenheim coordenação
Lu Meili coordenação
Patricia Rabbat coordenação de arquitetura
Juliana Bitelli Marina Milhomem
Victor Aragão coordenação de design
Parcerias e patrocínios
Didito Torres Juliana Henriques Kadu Rocha Marcela Ignacio Marli Prado Og Torres Vivi Rapuano
André Stefanini Cadu Ruocco João Cassaro Junior Juliana Katayama Jeff Fisher ilustração Terra Nova Mauro Munhoz direção artística Fernanda Diamant curadoria Mariana Dupas consultoria e relacionamento institucional
Christopher Mathi coordenação Luiza Ribeiro do Valle Julia Soicher Relações internacionais Sandrine Ghys coordenação
Logística Juliana Pinheiro coordenação Nataly Arantes
Laura Martel
Administrativo financeiro
RP autores
Marco Cachada administração
Galileia Estrela coordenação Flávia Reis
Clélia Perez coordenação São Paulo Andresa Prado coordenação Paraty Adriana Lima Ana Maria Lima Consultoria jurídica Cesnik, Quintino e Salinas Advogados
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Créditos Credits Mapas de Canudos
Terra Nova
Fotos dos autores Flip Slam
Reproduções da edição de 1946 de Os sertões, pela Livraria Francisco Alves. Autoria não identificada.
No ar
© Nelson Kon
Author's Photos Flip Slam
Mapa de plano de operações de guerra no Estado da Bahia, 1897. Acervo da Biblioteca Nacional.
Máquinas do mundo © Renato Mangolin
Edyoung Lennon
© divulgação Portugal Slam 2016 Joelle Taylor © divulgação Pieta Poeta © Bloco Tapa de Mina
Canudos' Maps
Porsha Olayiwola © divulgação
Reproductions from the 1946 edition of Os sertões (Rebellion in the Backlands), published by Livraria Francisco Alves. Unknown authorship.
Raquel Lima © Carlie Febo
Map of war operations plan in the State of Bahia, 1897. National Library Collection.
Salva Soler © raluyfotograf
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Roberta Estrela D’Alva © Renato Nascimento
Fotos dos autores Programa Principal Author's Photos Main Programme Gaël Faye
Adriana Calcanhotto © Leo Aversa
© Nyirimihigo
Marcela Cananéa © Ricardo Papu
Ailton Krenak © Neto Gonçalves
Grace Passô © Lucas Ávila
Marcelo D’Salete © Rafael Roncato
Amyr Klink © Marina Klink
Grada Kilomba © Moses Leo
Mariana Enriquez © Nora Lezano
Aparecida Vilaça © Carlos Fausto
Guilherme Wisnik © divulgação
Marilene Felinto © Daniel Barbosa
Ava Rocha © Ana Alexandrino
Ismail Xavier © Elaine Ramos
Maureen Bisilliat © Juan Esteves – Acervo IMS
Ayelet Gundar-Goshen © Alon Siga
Jarid Arraes © Dani Costa Russo
Miguel del Castillo © Carolina Ribeiro
Ayòbámi Adébáyò © Pixels Digital
José Celso Martinez Corrêa © Bob Wolfenson
Miguel Gomes © O som e a fúria
Braulio Tavares © Cristina Evelise
José Miguel Wisnik © Renato Mangolin
Nuno Grande © divulgação
Camila Mota © Jennifer Glass
José Murilo de Carvalho © Jaime Acioli
Sheila Heti © Steph Martyniuk
Carmen Maria Machado © Art Streiber/AUGUST
Kalaf Epalanga © David Pattinson
Stuart Firestein © divulgação
Cristina Serra © Luis Paulo Ferraz
Karina Sainz Borgo © Jeosm
Walnice Nogueira Galvão © Bel Pedrosa
David Wallace-Wells © Beowulf Sheehan
Kristen Roupenian © Elisa Roupenian Toha
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Associação Casa Azul flip.org.br
São Paulo R Capitão Antônio Rosa 376 10º andar 01443 010 São Paulo SP T +11 3081 6331
Paraty R João Ayres Martins 132 Ilha das Cobras 23970 000 Paraty RJ T +24 3371 7082
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