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Terapia Laser de Baixa Potência na Analgesia Silvia Cristina Núñez

INTRODUÇÃO A dor é uma sensação difícil de ser definida, mensurada e avaliada. Segundo a Associação Internacional para o Estudo da Dor (International Association for the Study of Pain), pode ser definida como uma experiência sensitiva desagradável que pode ou não estar associada a um dano real ou potencial ao organismo1. A percepção da dor é caracterizada por grande variabilidade intra e interindividual, ou seja, pessoas diferentes respondem de forma diferente a iguais estímulos dolorosos, e um mesmo indivíduo pode apresentar diferentes sensibilidades, em diferentes regiões ou momentos, a um mesmo estímulo. A percepção de dor pode variar em um mesmo local e indivíduo de um dia para outro2. Esses fatores são importantes na análise de qualquer modalidade de tratamento com caráter analgésico, uma vez que os mecanismos para mensuração do alívio da dor em indivíduos são, em sua maior parte, subjetivos. Dessa forma, muitos estudos sobre avaliação de dor são realizados em animais que têm suas funções normais comprometidas por um determinado estímulo doloroso e o tempo decorrido para o retorno à normalidade pode ser avaliado e classificado como efeito analgésico.

CLASSIFICAÇÃO DA DOR A dor pode ser classificada, de acordo com a duração e a frequência das manifestações, em diferentes tipos. A dor aguda é de manifestação transitória, pode durar minutos ou até semanas e normalmente está associada a alguma injúria em órgãos e/ou tecidos. A dor crônica apresenta longa duração e normalmente está associada a um quadro de doença crônica ou má formação e pode durar de vários meses até anos. A dor recorrente, comum em alguns quadros de disfunção temporomandibular, apresenta períodos de curta duração que se repetem ou podem se repetir com frequência durante toda a vida do indivíduo3. A dor também pode ser classificada, de acordo com sua origem, em diferentes categorias4: • • • • • • •

dor nociceptiva: causada por estímulo nocivo de natureza variada, como trauma e inflamação; dor neuropática: iniciada ou desencadeada por uma lesão ou disfunção que compromete primariamente componentes do sistema nervoso (cérebro, medula espinhal e nervos); dor reflexa: espalha-se por toda a área de inserção do nervo; dor referida: provocada por excitação de nociceptores e causada por espasmos musculares; dor transferida: apresenta-se em um local diferente da sua origem (por exemplo, infarto do miocárdio causando dor no braço e antebraço); dor visceral: difusa e mal localizada, usualmente transmitida por fibras tipo C; dor psicossomática: causada por transtornos psicológicos.

MECANISMO DE TRANSMISSÃO DO IMPULSO NERVOSO Antes de entendermos como a terapia laser de baixa potência (TLBP) pode atuar nos mecanismos de dor, devemos relembrar de forma rápida o processo de percepção e transmissão da dor. 53


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O sistema nervoso é responsável pela percepção da dor, e sua unidade funcional básica é o neurônio. O neurônio possui, além do corpo celular, prolongamentos chamados de fibras nervosas, as quais se conectam com outras localizadas nos nervos periféricos, na medula espinhal e no cérebro. Quando potenciais de membrana são gerados na fibra nervosa, ocorre a transmissão dos estímulos por todo o caminho ascendente até o cérebro e descendente do cérebro até a região ativada5. Diferentes estímulos podem excitar a fibra nervosa, causando a quebra do potencial de repouso da membrana e, dessa forma, desencadeando o impulso nervoso. A Figura 5.1 é uma representação esquemática do processo de estímulo da fibra nervosa. Os receptores de dor são os que apresentam interesse neste capítulo e estão especialmente relacionados com a odontologia, uma vez que o único tipo de receptor neural que a polpa dental apresenta são nociceptores. Eles são representados por terminações nervosas livres e, pelo fato de estarem relacionados com estímulos capazes de causar danos às células, têm importante valor protetor. Uma vez que a polpa dental possui somente nociceptores, a única sensação percebida pelos dentes é a dor; por essa razão todos os estímulos utilizados em testes de vitalidade pulpar (calor, frio, elétrico) são percebidos como dor 5. De uma forma simplificada, após o dano tecidual ou o início de um processo inflamatório, os terminais sinápticos são ativados e uma série de mediadores químicos e íons entra em ação para proceder à transdução do sinal e à sensibilização do sistema nervoso, promovendo uma resposta adequada ante o estímulo. Entre os mediadores químicos envolvidos no processo de sensibilização neural podemos citar as cininas, as prostaglandinas, os leucotrienos, a serotonina, a norepinefrina, a histamina, as interleucinas, entre outros6.

Figura 5.1 Representação esquemática da excitação da fibra nervosa. A letra A simboliza a fibra nervosa com polarização negativa interna e positiva externa no estado normal. Na letra B, a indução de estímulo químico, elétrico ou mecânico leva ao estado esquematizado em C, onde começa a ocorrer troca iônica até que em D nota-se a alteração da polaridade da fibra. (Fonte: arquivo pessoal.)


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MECANISMOS DE AÇÃO DA TLBP NA ANALGESIA É importante entender que a TLBP só poderá ter efeito analgésico se atuar em algum momento do processo de condução do impulso nervoso. Nesse contexto há relatos na literatura sobre a ação da TLBP em nervos e neurônios, especificamente sobre alterações morfológicas, efeito sobre neurotransmissores e nociceptores, velocidade de condução do impulso nervoso e potencial de ação. Simunovic cita em seu trabalho algumas explicações sobre os efeitos analgésicos da TLBP reportados por diferentes pesquisadores como resultado de trabalhos científicos4. Entre eles estão: • • • • • • • •

aumento nos níveis de β-endorfina; aumento da excreção urinária de glicocorticoides, que são inibidores da síntese de β-endorfina; hiperpolarização de membrana das células nervosas por diminuição da permeabilidade da membrana para Na/K; aumento de excreção urinária de catabólitos da serotonina; alteração do equilíbrio adrenalina-noradrenalina; aumento na produção de adenosina trifosfato (ATP), o que pode promover relaxamento muscular; aumento da microcirculação sanguínea local e, portanto, do aporte de oxigênio, reduzindo assim a asfixia do tecido e acelerando a retirada de catabólitos nos tecidos; aumento do fluxo linfático e redução do edema.

Logo, conforme apresentado, inúmeros são os possíveis processos de atuação da radiação sobre a dor. De acordo com Bradley, os lasers com emissão infravermelha são mais efetivos para a promoção de efeitos analgésicos7. Os mecanismos para explicação dos efeitos analgésicos não estariam completamente elucidados, porém algumas das prováveis explicações seriam: • • • • •

ação direta sobre fibras amielínicas com efeito específico sobre fibras C; ação específica no tronco nervoso da radiação infravermelha, demonstrando alterações na concentração de Na/K nos tecidos nervosos; estímulo da produção de enzimas, uma vez que tecidos lesionados podem apresentar déficit de enzimas. Tem sido demonstrado que radiações, tanto na porção vermelha como infravermelho próximo do espectro eletromagnético, podem restaurar a atividade enzimática, equilibrando o sistema, por exemplo, oxidorredutor local e inibindo, dessa forma, o estresse oxidativo; aumento no fluxo sanguíneo eliminando toxinas nos tecidos. Segundo o autor, a ação da TLBP pode ser capaz de elevar o fluxo sanguíneo, promovendo vasodilatação transitória e local, eliminando desta forma substâncias irritantes; efeito placebo, o qual tem sido associado à TLBP, como também a qualquer método analgésico testado. O efeito placebo é capaz de promover alívio da dor e promover a elevação dos níveis de opioides endógenos.

O efeito da TLBP realmente deve ocorrer por diversos caminhos distintos que provavelmente dependem dos cromóforos ou fotoabsorvedores que se encontram em maior quantidade no local irradiado no momento da aplicação da TLBP. Como nosso organismo encontra-se em atividade constante, o número de células e de capilares sanguíneos abertos ou fechados no momento da irradiação deve levar a importantes alterações nas respostas de cada indivíduo à irradiação. Dessa forma, não é tão surpreendente imaginar que em determinado momento a radiação vermelha possa produzir um efeito e, no estudo seguinte, outro mecanismo seja apresentado. Os resultados apresentados na literatura sugerem que não há um mecanismo único para a ação da TLBP na produção do efeito analgésico. A mediação do efeito analgésico por receptor opioide foi demonstrada em vários trabalhos, mostrando resultados positivos independente de receptores opioides8-10. Ebert e Chow afirmam que há aumento no potencial de membrana, portanto diversos mecanismos simultâneos ou não parecem ser responsáveis pelos efeitos analgésicos11. Honmura et al.8 utilizaram laser de emissão infravermelha e observaram a hiperalgesia criada na pata de ratos que sofreram irritação por injeção de carragenina. O resultado obtido com a irradiação foi comparável ao obtido com o uso de indometacina, um anti-inflamatório não esteroidal (AINE). Porém os autores observaram que o efeito analgésico foi parcial ou totalmente inibido pela injeção de naloxona, que age como antagonista dos receptores opioides de forma dose-dependente. O efeito da TLBP com laser de emissão infravermelha (830 nm) na analgesia mediada por opioides endógenos foi medido por meio de modelo inflamatório em ratos e, in vitro, pelo efeito em células Jurkat e células T. A expressão gênica do mRNA dos precursores de β-endorfina, propiomelanocortina e fator liberador de corticotropina foi avaliada por reação em cadeia da polimerase (PCR)9. Os autores observaram que o efeito da TLBP foi antagonizado pela injeção de naloxona e também um aumento na expressão gênica de precursores da beta-endorfina, tanto in vivo quanto in vitro. Ferreira et al., usando laser de emissão vermelha (633 nm), investigaram, em ratos, a contribuição de receptores opioides periféricos e a ação em mediadores de hiperalgesia estimulados por processo inflamatório. A injeção de naloxona também foi utilizada como antagonista10. Os autores reportam que a irradiação com laser de hélio-neônio (He-Ne) inibiu a sensibilização de nociceptores estimulada por mediadores de hiperalgesia, e concluem que o efeito da TLBP envolve a diminuição da liberação de mediadores hiperálgicos, e não a liberação de opioides endógenos. Esses resultados concordam com os achados de Bortone et al.12, que demonstram a redução da expressão de RNAm de receptores de cininas após a TLBP com dois lasers de emissão vermelha (660 nm e 684 nm) usando um modelo de inflamação tradicional. Os


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resultados apresentados sugerem que a expressão de receptores de cininas B1 e B2 é regulada pela TLBP e, assim, possivelmente contribui para a observação dos efeitos anti-inflamatórios e analgésicos. Uma vez que diferentes comprimentos de onda foram utilizados nos trabalhos descritos, podemos inferir que cada um deles atua de forma particular na analgesia. Porém Serra e Ashmawi, utilizando laser de 660 nm, portanto mesmo comprimento de onda do que o trabalho de Ferreira et al.10 e Bortone et al.12, com 0,15 J de energia aplicado sobre a pata de ratos que receberam injeção prévia de carragenina, observaram que o efeito do laser foi antagonizado pela naloxona, porém não foi comprometido pelo uso de metisergida, um conhecido antagonista de receptores de serotonina (5-hidroxitriptamina [5HT])13. O papel da serotonina na analgesia é controverso, possuindo ela diferentes tipos de receptores (5HT1, 5HT2, 5HT3, 5HT4, 5HT5, 5HT6, 5HT7) presentes em vários tecidos e com distintas funções. A serotonina tem sido considerada um agente pró-nociceptivo, entretanto o receptor 5HT1 parece produzir efeito analgésico em dor neuropática. Como nesse estudo não se verificou interação entre o uso da metisergida e os efeitos da TLBP, os autores sugerem que os mecanismos de ação da TLBP na analgesia são independentes dos receptores serotoninérgicos 5HT1, 5HT2 e 5HT7 presentes em regiões periféricas. Walker investigou os efeitos analgésicos da TLBP e para isso foram analisados nesse estudo 36 pacientes com dor crônica (duração superior a seis meses), irradiados com laser de He-Ne, potência de 1 mW, frequência de 20 Hz em uma área de 4 mm2 14. Foram coletadas amostras de urina de 24 h antes do início do experimento e em intervalos regulares durante o período experimental, a fim de verificar a concentração de catabólitos da 5HT. Os níveis maiores de excreção de 5HT precederam o alívio da dor por vários dias. Em um exemplo citado pelo autor, um paciente portador de nevralgia trigeminal teve pico de excreção de 5HT após 10 sessões de irradiação, enquanto o alívio completo da dor ocorreu após 20 sessões de irradiação. Resultados similares foram observados em indivíduos com diferentes diagnósticos de dor. O autor reporta que, de acordo com esses resultados, o pico de excreção urinária de catabólitos de 5HT pode ser indicador do início da analgesia, e tal alteração no metabolismo da serotonina pode representar um pré-requisito para efeitos de analgesia duradouros. As alterações no metabolismo da serotonina não foram observadas em pacientes sem dor que receberam irradiação por até 30 sessões e as alterações na excreção de 5HT puderem ser relacionadas com o mecanismo de analgesia por meio da TLBP, pois indivíduos que obtiveram alívio da dor como resultado da injeção de anestésicos locais ou massagem profunda também não demonstraram alterações em tal metabolismo. Magalhães também descreve, em seu estudo, aumento nos níveis de serotonina circulante em pacientes portadores de dores craniofaciais após irradiação com laser de emissão infravermelha com comprimento de onda de 830 nm15. Observando a Figura 5.2, que é uma representação esquemática de como podem ser sensibilizados os neurônios periféricos após uma injúria, podemos notar que, até aqui, a literatura tem apresentado explicações bastante plausíveis para os efeitos analgésicos reportados em estudos clínicos e que sustentam as indicações de aplicações clínicas. Além dos trabalhos que demonstram a ação da TLBP sobre a mediação química do processo da dor, estudos apontam para resposta direta obtida sobre a velocidade de condução de nervos periféricos e aferentes. Os aferentes primários relacionados com a transmissão da dor são fibras mielinizadas A-delta e não mielinizadas C, cujos corpos celulares estão localizados nos gânglios das raízes dorsais. A estimulação das fibras A-delta produz a primeira dor caracterizada por ser aguda, em pontada, localizada e de início rápido. As fibras C medeiam a chamada segunda dor, menos aguda, em ardência, mal

Figura 5.2 Esquema de sensibilização de neurônios periféricos e locais de atuação da TLBP. (Fonte: arquivo pessoal.)


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localizada e prolongada. As fibras mielinizadas A-delta são responsáveis pela condução rápida do estímulo doloroso (5 m-25 m/s), enquanto as fibras C são de condução mais lenta (≈2 m/s). Segundo alguns estudos, a TLBP pode ser mais efetiva sobre fibras de condução lenta, particularmente nos aferentes primários. Essa é uma razão pela qual a TLBP seria capaz de promover analgesia, porém não a anestesia do local irradiado16. O efeito sobre o potencial de ação neural foi estudado em nervo ciático de sapo11. Foi feita a análise da amplitude do potencial de ação composto, latência e velocidade de despolarização e repolarização. Os autores observaram aumento do potencial de ação composto no grupo irradiado quando em comparação com o grupo não irradiado. Kasai et al.17 analisaram o número de descargas elétricas promovidas pelo estímulo nocivo em nervo periférico de coelhos. A análise dos resultados desse estudo levou os autores a concluir que a TLBP produz efeito inibitório na condução do impulso em nervos periféricos. Em sua discussão os autores sugerem que a radiação pode atuar tanto na hiperpolarização da membrana nervosa como na desativação dos mecanismos de excitação. Em revisão sistemática, Chow et al. se propuseram a coletar bibliografia para analisar os efeitos da TLBP sobre nervos periféricos e avaliar sua relevância para os efeitos analgésicos da TLBP18. Os autores incluíram 101 artigos científicos sobre o tema, o que demonstra que poderíamos discutir, neste capítulo, muito mais mecanismos da TLBP analisando a literatura cientifica disponível. Porém, por não ser este o escopo desta obra, vamos resumir os principais pontos encontrados nessa revisão sistemática. Os resultados da revisão apontam para uma ampla variedade de mecanismos de bloqueio da dor promovidos pela radiação laser tanto de emissão vermelha quanto infravermelha. A deficiência neural promovida pela radiação inclui diminuição da velocidade de condução do impulso nervoso, supressão da resposta neuronal a estímulo nocivo, supressão da liberação de neurotransmissores envolvidos no mecanismo da dor, inibição de atividade enzimática e alterações morfológicas relacionadas com a condução nervosa. Os estudos realizados em voluntários humanos detectaram que a aplicação transcutânea da TLBP com comprimentos de onda na região do vermelho visível, bem como do infravermelho próximo, diminui a velocidade de condução do impulso nervoso e a amplitude do potencial de ação composto e/ou do potencial evocado do sistema somatossensor. De acordo com os autores, o primeiro ponto importante dessa conclusão é que a radiação, mesmo aplicada através da pele, pode inibir ou pelo menos diminuir a condução do impulso nervoso18. Uma importante conclusão clínica retirada do levantamento destes estudos é que o efeito é mais pronunciado quando a TLBP é aplicada em diversos pontos sobre o caminho do nervo quando comparado com o efeito produzido pela irradiação de um único ponto. Outro importante dado observado em relação à radiação de emissão infravermelha é que lasers de emissão contínua foram mais eficientes do que equipamentos de emissão pulsada na redução da velocidade de condução das fibras nervosas. Quanto à energia necessária para ativação desses processos, os autores reportam que, para obtenção de efeito analgésico, energias mais altas devem ser empregadas18. Os autores citam o trabalho de Greathouse et al.19, que obtiveram resposta de diminuição na velocidade de condução do impulso nervoso com aplicação de radiação por 120 s e mantendo todos os demais parâmetros (potência, densidade de potência e comprimento de onda), porém, aplicando a radiação por 20 s, os autores não detectaram efeito mensurável da TLBP. Apesar da menor penetração do comprimento de onda vermelho nos tecidos biológicos, ele também apresenta efetividade para a promoção da analgesia e, segundo os autores, provavelmente, quando a radiação vermelha é aplicada, ela atinge os nociceptores das camadas mais superficiais do tecido, sendo indicada para condições de dor como aftas, por exemplo, em que o estímulo doloroso é provocado por nociceptores de camadas superficiais da mucosa. Os estudos em animais avaliados nessa revisão proveem evidências de que a TLBP age sobre as fibras Aδ e fibras C, que transmitem estímulos dolorosos, promovendo déficit na condução do impulso não só por estímulos físicos, mas também por estímulos químicos efetuados com substâncias pró-inflamatórias. A supressão da atividade da bradicinina também parece estar bem documentada. Sendo a bradicinina associada a inflamação de nervos e sensibilização de nervos periféricos em áreas de agressão, a supressão da bradicinina não só explica efeitos analgésicos da TLBP, como também pode estar conectada à modulação da resposta inflamatória. Além da bradicinina, a supressão de substância P, outro neuropeptídeo associado à nocicepção, também é documentada. A supressão demonstrada de substância P implica na possibilidade de que a aplicação da TLPB em nervos periféricos, levando à diminuição do estímulo nociceptivo, pode causar uma inibição aferente da atividade sináptica por meio da plasticidade sináptica de neurônios de segunda ordem no corno dorsal até o centro da dor, com importância potencial na modulação da dor em longo prazo18. Alterações morfológicas em neurônios são apresentadas como, por exemplo, a formação de varicosidades axonais após irradiação. Uma das causas de formação de varicosidades axonais é a exposição a espécies reativas de oxigênio (ERO), mais especificamente a exposição ao peróxido de hidrogênio. Conforme verificado no Capítulo 3, um dos mecanismos de ação propostos para a TLBP é a formação de pequenas quantidades de ERO, logo, a hipótese de que a TLBP promova a formação de varicosidades axonais via formação de espécies reativas de oxigênio é levantada. Até então vimos possíveis explicações para a obtenção de efeitos analgésicos promovidos após estímulo nociceptivo, seja por vias físicas, químicas ou mecânicas, porém ainda é possível encontrar estudos em animais e também em humanos que sugerem o uso da TLBP de forma preventiva para diminuir a intensidade da dor que seria gerada por um trauma. Na odontologia essa aplicação pode ser de grande valia, uma vez que alguns procedimentos, como cirurgias e tratamentos endodônticos, podem gerar um processo inflamatório que tem maior tempo de duração do que o potencial de anestesia do anestésico lo-


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cal. Além disso, para a população de uma forma geral, os procedimentos odontológicos são automaticamente conectados a dor, logo o desenvolvimento de um método que diminua essa percepção é de extrema valia para o estímulo ao tratamento de afecções orais. Para investigar o potencial de efeito analgésico sobre os tecidos íntegros Pozza et al. irradiaram a região plantar de ratos com laser de emissão vermelha (665 nm) com 10 J20. O tempo de duração da irradiação foi de 334 s e dois grupos controle foram instituídos: um sem irradiação e outro com a pata em posição de irradiação e o laser desligado em contato com a pata por 334 s. Imediatamente após as irradiações os pesquisadores injetaram solução de formol a 2% na pata e observaram o tempo durante o qual o animal mantinha a pata erguida, fora de contato com o solo, denotando dor causada pelo apoio na pata. Os resultados demonstraram que os animais irradiados voltaram mais rapidamente à posição normal, demonstrando menos dor em todos os tempos analisados após a injeção (5, 10, 15, 20, 25 e 30 minutos). Os autores realizam, em sua discussão, uma extrapolação para o ambiente clínico sugerindo o uso da TLBP antes da introdução de agulhas para, por exemplo, punção anestésica. Em trabalho seguinte, ainda sobre o efeito da radiação sobre tecidos sadios, dois comprimentos de onda foram testados com a mesma densidade de potência (107 mW/cm2), potência de 30 mW, energia de 10 J e tempo de exposição de 334 s, portanto a única variável foi o comprimento de onda, que foi de 660 nm e 830 nm, vermelho e infravermelho, respectivamente. O controle foi feito com placebo (laser posicionado, porém desligado)21. Os animais receberam a injeção de solução de formol a 2% imediatamente após a irradiação e o tempo para retorno da pata à posição normal foi calculado. Os resultados mostraram que os dois comprimentos de onda foram eficientes para promover analgesia, porém o comprimento de onda de 660 nm (vermelho) se mostrou mais eficiente que o infravermelho. Esse dado corrobora o apresentado anteriormente sobre a dessensibilização de nociceptores superficiais. Devido ao mecanismo de ação da dor induzida pela injeção de formol e pelos tempos de análise (5 minutos até 30 minutos pós-irradiação), os autores sugerem que o mecanismo de ação da TLBP na prevenção da dor em tecidos sadios esteja ligado à redução da condução do impulso nervoso20-21. Esse resultado é confirmado por estudo clínico realizado em 40 voluntários que tiveram a região do nervo radial superficial irradiada com laser de emissão vermelha (633 nm) ou placebo22. A região do nervo foi dividida de forma aleatória em seis partes iguais e cada uma recebeu irradiação por 20 s. Foram avaliadas as latências pré e pós-testes em todos os indivíduos. O grupo irradiado apresentou aumento da latência, que corresponde à diminuição da velocidade de condução do impulso nervoso. No contexto clínico, como sugerido por alguns autores20-21, a irradiação prévia, ou até imediatamente após o procedimento odontológico, de áreas que receberam alguma espécie de trauma e que estarão, portanto, sujeitas a resposta inflamatória, pode realmente ser interessante. Em estudo clínico Dantas et al. verificaram o efeito antiálgico da TLBP na punção anestésica realizada no palato de pacientes23. Sessenta pacientes participaram do estudo e foram divididos em três grupos. Um grupo recebeu irradiação laser com comprimento de onda de 830 nm, 120 mW de potência e tempo de exposição de 33 s, portanto entregando uma energia de 3,96 J. Um segundo grupo foi informado de que estava recebendo irradiação laser, mas foi submetido a irradiação realizada com fotopolimerizador com potência de 500 mW e 30 segundos de tempo de exposição, portanto entregando uma energia de 15 J com comprimento de onda próximo a 450 nm (azul). O terceiro grupo não recebeu tratamento pré-anestésico. As médias de dor registradas em cada grupo foram 1,9 para o grupo laser, 2,7 para o grupo fotopolimerizador e 4,35 para o grupo sem tratamento. Os autores concluem que, mesmo observado o efeito placebo (pela análise do grupo fotopolimerizador), a irradiação com comprimento de onda infravermelho apresentou efeitos significativos na redução da dor ocasionada pela punção anestésica. A aplicação preventiva é também sugerida por Honmura et al., que utilizaram um laser de GaAlAs para verificar os efeitos da irradiação sobre um modelo inflamatório com carragenina em ratos24. Os autores expõem que o laser de GaAlAs tem efeito inibitório na permeabilidade vascular no estado agudo e na formação do granuloma em um modelo inflamatório de carragenina em ratos, e, segundo eles, a irradiação deve ser realizada imediatamente antes e logo após a indução da inflamação. Alguns resultados de estudos clínicos que vêm sendo realizados há décadas, além de demonstrarem efeitos positivos da TLBP, apontam para o fato de a terapia ser de fácil execução e sem efeitos colaterais se aplicada dentro dos padrões apropriados. Estudo clínico para análise dos efeitos da irradiação em dores miofaciais crônicas e agudas executou o tratamento de 243 pacientes irradiando os chamados pontos-gatilho (trigger points)25. Os pontos-gatilho são as regiões que, durante a palpação executada em exame clínico, apresentam sensibilidade aumentada em relação às demais áreas. Os resultados clínicos demonstraram efetividade de 96%, sendo que, após a terapia, apenas 4% dos pacientes apresentavam persistência do quadro doloroso. Schindl et al., em relato de caso clínico, demonstraram os efeitos da TLBP com laser de He-Ne (632,8 nm) em diferentes fluências em casos de tromboangina obliterante (doença de Buerger)26. Essa condição clínica é extremamente rara, atinge pacientes jovens e gera alta taxa de perda de membros por amputação. Essa doença afeta primariamente as extremidades inferiores, com comprometimento de pequenos e médios vasos sanguíneos. Altos escores de dor sem remissão após terapêutica medicamentosa e cirúrgica com remoção de terminações nervosas são a maior causa de perda dos membros. Os autores apresentam, nesse relato, três casos clínicos da doença de difícil resolução, em que a terapia convencional não surtia efeitos e que teriam como solução a amputação. Em casos de pacientes já amputados, mas com dor persistente, comumente referida como dor do membro fantasma, uma maior mutilação da área afetada teria que ser realizada. Esses casos foram tratados com TLBP com diferentes fluências, estipuladas de acordo com as características das áreas afetadas, e os tempos de tratamento também foram individualizados e esquematizados, de acordo com a evolução clínica dos casos. Como resultado, dois dos três pacientes foram completamente curados com acompanhamento de um ano e o terceiro apresentava prognóstico bastante favorável. Segundo os autores, foi demonstrado, por meio desses casos clínicos, que a TLBP aumenta o fluxo sanguíneo na microcirculação de áreas isquêmicas e, apesar de seus mecanismos de ação não estarem completamente evidentes, essa terapia deve ser considerada uma alternativa terapêutica no tratamento de condições clínicas desfavoráveis em relação à microcirculação26.


Capítulo 5 – Terapia Laser de Baixa Potência na Analgesia

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Tabela 5.1 Principais aspectos da TLBP na obtenção de efeitos analgésicos Comprimento de onda

Energia Potência e densidades de potência Pontos de irradiação Condição dos tecidos

Tipo de dor

Tanto a radiação vermelha quanta a infravermelha apresentam potencial de ação analgésico O mais recomendado é o infravermelho, porém, para analgesia superficial, a emissão vermelha apresenta bons resultados As energias mais altas (acima de 10 J) são mais eficazes no controle da dor Não há evidências quanto às diferentes potências e densidades de potência. Lasers de 1 mW apresentam resultados positivos em analgesia Vários pontos ao longo do caminho do nervo apresentam melhores resultados que a irradiação de ponto isolado sobre a área de interesse Tecidos íntegros também podem responder à irradiação que se propõe utilizar para promover analgesia e efeito anti-inflamatório antes da geração de um trauma Os efeitos da TLBP na analgesia são obtidos tanto nos casos de dores agudas como crônicas

Os benefícios clínicos da analgesia promovida pela TLBP para tratar dores na região maxilofacial são reportados por Pinheiro et al.27, que, em dois estudos apresentaram o tratamento de cerca de 400 pacientes com queixas variadas como dor por disfunção temporomandibular, nevralgia do nervo trigêmeo, dores musculares, aftas, inflamação e sensibilidade dental. Nos resultados divulgados os autores afirmam que 274 dos 400 pacientes estavam assintomáticos após o término do tratamento, 75 apresentaram melhora considerável e 57 ainda apresentavam sintomas dolorosos. Os resultados mostram uma marca significativa; aproximadamente 68% dos pacientes ficaram livres de dor sem o uso de medicação e aproximadamente 18% dos pacientes relataram melhora, o que significa que 86% dos pacientes que utilizaram a TLBP foram beneficiados pelos efeitos analgésicos. A analgesia obtida com a TLBP também foi medida após tonsilectomias realizadas em 18 crianças com idade entre 5 e 15 anos28. As crianças foram aleatoriamente divididas em dois grupos. Um deles recebeu a TLBP imediatamente após a cirurgia e o outro recebeu a terapia convencional (analgesia farmacológica com dipirona via oral sempre que necessário). Os parâmetros utilizados para a TLBP foram laser de emissão vermelha 685 nm com 50 mW de potência com 3 minutos e 20 segundos de tempo de exposição em cada leito cirúrgico (energia de 10 J). Os resultados demonstraram que os pacientes submetidos à TLBP apresentaram menos dor que o grupo-controle e utilizaram menos analgésicos durante o pós-operatório. Alguns dos mais notáveis efeitos analgésicos da TLBP são observados clinicamente em pacientes com quadro de mucosite oral. Em revisão sistemática sobre o tema é reportado que há evidência de que o uso da TLBP diminua a incidência de mucosite oral e, principalmente, atue sobre a dor associada a esses quadros clínicos, melhorando significativamente a qualidade de vida dos pacientes29. Os notórios efeitos analgésicos da terapia fizeram que a Organização Mundial da Saúde (OMS) adicionasse a TLBP à lista de terapias recomendadas para o tratamento de dor crônica na região cervical30. Apesar de falta de informações precisas sobre o mecanismo exato de ação de cada comprimento de onda sobre o processo de geração e condução do estímulo doloroso, os benefícios reportados encorajam o emprego dessa terapia para a obtenção de efeitos antiálgicos. Nos capítulos subsequentes que são apresentados nesta obra veremos muitas aplicações clínicas que estão relacionadas com o alívio da dor e, portanto, a melhora na qualidade do atendimento oferecida aos pacientes que buscam tratamento odontológico. A Tabela 5.1 apresenta os pontos-chave descritos neste capítulo sobre os mecanismos e efeitos da TLBP na dor.

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Laser de Baixa Potência – Princípios Básicos e Aplicações Clínicas na Odontologia

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