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Terapia Laser de Baixa Potência na Mucosite Oral Fernanda de Paula Eduardo Letícia Mello Bezinelli Luciana Corrêa
INTRODUÇÃO A mucosite oral constitui um quadro inflamatório na mucosa oral decorrente dos efeitos citotóxicos oriundos de quimioterapia geral e radioterapia de cabeça e pescoço, cuja evolução para ulcerações pode acarretar alta morbidade ao paciente. O quadro doloroso decorrente das ulcerações dificulta a mastigação e a deglutição, predispondo o paciente a deficiências nutricionais cujo impacto pode ser alto durante o tratamento oncológico. Além disso, a perda de continuidade da barreira imune inata representada pelas estruturas da mucosa oral predispõe o paciente a infecções secundárias que podem causar sepse grave. Várias modalidades de tratamento da mucosite oral têm sido propostas, porém ainda não há consenso quanto à terapia mais adequada. A terapia com laser de baixa potência (TLBP) tem se destacado nos últimos anos como uma opção de prevenção e tratamento da mucosite, principalmente em função de suas propriedades de estímulo ao reparo tecidual sem acarretar efeitos colaterais significativos. Neste capítulo serão discutidas as propriedades do laser de baixa potência que favorecem o controle da mucosite oral, relacionando essas propriedades com aspectos conhecidos da etiopatogenia dessa morbidade. Serão discutidos, ao final, os protocolos descritos na literatura que demonstraram eficiência na prevenção e no tratamento dessas lesões.
ASPECTOS CLÍNICOS E FATORES DE RISCO PARA A MUCOSITE ORAL O termo “mucosite”, a despeito de seu significado genérico de “inflamação na mucosa”, tem sido utilizado na literatura científica para indicar lesões decorrentes dos efeitos citotóxicos provocados por quimioterapia em geral e radioterapia de cabeça e pescoço que ocorrem nos tratos oral, esofágico e gastrointestinal como um todo. Atualmente, é conveniente distinguir a mucosite oral da mucosite esofágica e estas da gástrica e intestinal, haja vista as peculiaridades de cada tipo de mucosite, considerando suas variadas formas clínicas de manifestação, os tratamentos instituídos e a evolução clínica delas1. O termo “estomatite” também é bastante frequente na literatura para indicar as inflamações na mucosa oral com origem em diversos fatores, entre eles os decorrentes de toxicidade por agentes quimioterápicos e radioterápicos. Porém atualmente é considerada inadequada para individualizar o quadro específico da mucosite oral e deve ser evitada nesses casos2-3.
ASPECTOS CLÍNICOS DA MUCOSITE ORAL O aspecto clínico da mucosite oral permite diferenciar fases distintas das lesões, que indicam o seu grau de severidade. Vários sistemas de classificação existem para se avaliar o estado de evolução das lesões e do comprometimento do paciente como um todo4. Os mais frequentemente utilizados em pesquisa clínicas estão citados no na Tabela 11.1. Ao instituir a TLBP e os demais cuidados orais necessários ao sucesso do tratamento, é sempre conveniente o clínico adotar um sistema de classificação, para que possa avaliar de forma padronizada a história clínica e a evolução das lesões. Alguns dos graus apresentados na Tabela 11.1 são estabelecidos com base em três aspectos distintos da mucosite oral, os quais estão relacionadas diretamente com a intensidade da sintomatologia dolorosa e, esta, com as dificuldades de alimentação, predispondo o paciente a severo comprometimento sistêmico. Esses aspectos serão descritos a seguir. 105
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Laser de Baixa Potência – Princípios Básicos e Aplicações Clínicas na Odontologia
Tabela 11.1 Exemplos de sistema de classificação clínica da severidade da mucosite oral Organização Mundial da Saúde* 0 – ausência de sinais e sintomas 1 – desconforto e/ou eritema 2 – eritema, úlceras, mas o paciente consegue ingerir alimentos sólidos 3 – úlceras com eritema amplo; o paciente não consegue ingerir alimentos sólidos 4 – impossível a alimentação Cancer Institute (NCI) – Common Toxicity Criteria for Adverse Effects (NTC-CTCAE version 4.0)** 0 – mucosa normal, sem sinais e sintomas 1 – eritema; sintomas mínimos, dieta normal 2 – úlceras isoladas ou presença de pseudomembrana; há dor moderada, porém é possível mastigar e deglutir dieta modificada 3 – ulcerações ou pseudomembrana confluentes; sangramento com mínimo trauma; há dor intensa, que interfere na ingestão por via oral 4 – tecido necrótico; sangramento espontâneo significativo; consequências para a sobrevida do paciente, sendo necessário intervenções Oral Mucositis Assessment Scale (OMAS)*** Para eritema: 0 – ausência 1 – não severa 2 – severa Para ulcerações: 0 – ausência 1 – menor que 1 cm2 2 – 1-3 cm2 3 – maior que 3 cm2 Ambas as gradações devem ser feitas individualmente para os seguintes locais anatômicos: lábios superior e inferior, região ventrolateral direita e esquerda da língua, assoalho bucal, palato mole e palato duro, mucosa jugal direita e esquerda Radiation Therapy Oncology Group (RTOG) – Acute Radiation Morbidity Scoring System – Mucous Membrane**** 0 – ausência de alterações 1 – pode haver dor leve que não requer prescrição de analgésicos 2 – mucosite isolada que produz exsudação serossanguínea; pode haver dor moderada que requer prescrição de analgésicos 3 – mucosite fibrinosa confluente; pode haver dor intensa que requer prescrição de narcóticos 4 – ulceração, hemorragia e necrose *World Health Organization. Handbook for reporting results of cancer treatment. Geneva, Switzerland: World Health Organization; 1979:15-22. **National Cancer Institute Common Terminology Criteria for Adverse Events v4.0 (CTCAE). Cancer Therapy Evaluation Program. Disponível em: http://ctep.cancer.gov/protocolDevelopment/electronic_applications/ctc.htm. Acesso em 30 de junho de 2011. ***Sonis ST, Eilers JP, Epstein JB, et al. Validation of a new scoring system for the assessment of clinical trial research of oral mucositis induced by radiation or chemotherapy. Mucositis Study Group. iámet. 1999;85:2103-2113. ****Radiation Therapy Oncology Group. Acute radiation morbidity scoring criteria. Disponível em http://www.rtog.org/ResearchAssociates/ AdverseEventReporting/AcuteRadiationMorbidityScoringCriteria.aspx Acesso em 30 de junho de 2011.
Presença de Eritema Nota-se a presença de lesão avermelhada na mucosa oral indicativa de lesão de natureza inflamatória aguda, porém sem haver alteração clínica da barreira epitelial. Nessa fase clínica, a sintomatologia é variada, consistindo desde em ausência de sintomas até sensação de queimação e desconforto durante ações mecânicas de escovação, mastigação e deglutição. Devido ao fato de boa parte dos pacientes não manifestar queixa das lesões eritematosas, é fundamental que o cirurgião-dentista diagnostique a mucosite oral nessa fase, de preferência ainda bem discreta e inicial (Figura 11.1), quando é possível evitar que evolua para as fases seguintes. Como será abordado mais adiante, a TLBP é altamente eficaz para o controle da mucosite oral quando esta ainda se encontra na fase de eritema, portanto é fundamental o acompanhamento dos pacientes antes, durante e após as intervenções por rádio e quimioterapia para se instituir a TLBP no momento clínico que permite maior eficácia da irradiação laser. Vale dizer que, quando iniciais, as lesões podem ser confundidas com outros processos inflamatórios de natureza mais geral, como gengivite e lesões traumáticas não ulcerativas, sendo indispensável ao profissional certa experiência prévia de reconhecimento de todas as fases da mucosite oral. Outro ponto importante a se considerar é que geralmente há manifestação de uma única lesão inicialmente, a qual rapidamente é seguida por múltiplas lesões. É conveniente se instituir a terapia a laser na fase de lesão única, uma vez que pode haver efeitos amplificadores negativos de uma lesão sobre a outra, ou seja, parece ser mais difícil reverter o quadro de mucosite oral quando esta se constitui em múltiplas lesões5.
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Figura 11.1 Aspecto eritematoso inicial da mucosite oral, com presença de lesão avermelhada isolada na mucosa. (Fonte: arquivo pessoal.)
Figura 11.2 Fase de pseudomembrana. (Fonte: arquivo pessoal.)
O período de manifestação das lesões eritematosas é bastante variado e depende de vários fatores, entre eles o tipo e a dose de quimioterápico, bem como as associações a outras drogas, a frequência dos ciclos e a dose de radioterapia instituída. As variações individuais de sensibilidade aos efeitos citotóxicos também devem ser consideradas. A fase de eritema parece se manifestar entre o quarto e quinto dias pós-infusão da droga quimioterápica ou a partir de doses cumulativas de 10 Gy para radiação de cabeça e pescoço (na segunda semana de tratamento)6-7. Ao se instituir a TLBP preventiva para a mucosite oral, é conveniente considerar esse período de manifestação clínica e iniciar as irradiações no segundo dia do ciclo de químio ou radioterapia.
Presença de Pseudomembrana A presença de pseudomembrana constitui o sinal clínico de que a sinalização inflamatória, antes representada pela hiperemia na lâmina própria, agora envolve o epitélio da mucosa oral, o qual exibe áreas atróficas e/ou necróticas (Figura 11.2). Frequentemente ocorrem nessa fase sangramentos oriundos de traumas mecânicos leves e, em seguida, ulcerações. A sintomatologia dolorosa nesses casos pode ser moderada e requer intervenções clínicas que podem envolver a prescrição de analgésicos. A TLBP nessa fase deve ser instituída não só como um agente promotor de reparo, mas também para efeito analgésico. O protocolo de irradiação deve visar sobretudo à proliferação epitelial para restituição da barreira de defesa inata da mucosa oral, bem como a maior permanência de analgesia no local. Nessa fase é crucial a avaliação diária do paciente para evitar as ulcerações e o aparecimento de lesões múltiplas. O paciente pode também relatar diminuição do fluxo salivar ou mesmo alterações na consistência da saliva, as quais podem ser decorrentes de ação citotóxica sobre as glândulas salivares8. Vale dizer que não se pode desprezar esse fato ao se acompanhar a evolução da mucosite oral, já que as alterações salivares estão diretamente relacionadas com as dificuldades de reparo na mucosa oral9.
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Não é possível apontar um período, mesmo que incerto, para o aparecimento da fase de pseudomembrana, mas pode-se dizer que ela se manifesta em período transitório às ulcerações, descrito a seguir.
Presença de Ulcerações A presença de ulcerações na mucosa oral no paciente sob quimioterapia ou radioterapia de cabeça e pescoço obriga a instituição de um prognóstico de alto risco para infecções secundárias, de dificuldades importantes de alimentação e de grande piora na qualidade de vida. É fundamental reforçar que a TLBP deve ser instituída para evitar as ulcerações, e não somente para repará-las. As úlceras podem ser únicas (Figura 11.3), múltiplas e isoladas ou múltiplas e confluentes (Figura 11.4), essas últimas indicativas de alta severidade. Quando únicas, podem ser confundidas com úlceras traumáticas, porém exibem bordas mais eritematosas e mais planas e estão localizadas em regiões da mucosa que exibem atrofia de maneira geral (Figura 11.3). As lesões múltiplas são bem características e também podem ser confundidas com outras doenças, principalmente de natureza viral, como as lesões por herpes vírus simples (HSV) e citomegalovírus (CMV), e fúngicas, como a candidíase oral3,10,11. Especificamente para o transplante de células-tronco hematopoiéticas há a possibilidade ainda de essas ulcerações serem confundidas com a fase aguda da doença do enxerto contra o hospedeiro (DECH)12. Nesse caso, ao se utilizar a TLBP pode-se perceber certa dificuldade de remissão das lesões, as quais perduram mais e podem vir acompanhadas de outros sinais e sintomas sistêmicos. A sintomatologia dolorosa é intensa na fase de ulcerações, o que compromete sobremaneira a qualidade de vida do paciente, muitas vezes levando-o a desistir do tratamento antineoplásico13. Nesse sentido, a propriedade de analgesia da irradiação laser pode constituir um agente fundamental para a manutenção da qualidade de vida do paciente oncológico. Mesmo que não haja clinicamente uma evolução para o reparo das lesões, a TLBP pode agir de forma sintomática, o que contribui diretamente para o sucesso do tratamento antineoplásico, já que o paciente pode conseguir manter razoavelmente suas funções mastigatórias, de ingestão alimentar e de fonação. A despeito das variações já comentadas anteriormente, o período de aparecimento das ulcerações pode envolver de sete a 10 dias após a infusão da droga quimioterápica, ou com média de 30 Gy de doses cumulativas de radiação (a partir da terceira semana de radioterapia)6-7. No caso de quimioterapia, as úlceras duram cerca de uma semana e após 21 dias já estão reparadas. No caso de radioterapia, as úlceras exibem pico mais prolongado, geralmente até duas semanas após a finalização da radioterapia, quando se chega à dose cumulativa de 60-70 Gy. Assim a mucosite oral por radioterapia pode ser severa por até cinco a sete semanas7. Portanto a TLBP deve ser instituída considerando-se os períodos peculiares de reparo inerentes a cada modalidade de citotoxicidade.
FATORES DE RISCO PARA A MUCOSITE ORAL Os fatores de risco para mucosite oral ainda não estão bem estabelecidos e suscitam discussões na literatura científica. A descrição dos efeitos citotóxicos na mucosa oral em pacientes oncológicos ainda é bastante negligenciada, o que limita as análises epidemiológicas, incluindo os fatores de risco. É difícil precisar o risco para a mucosite oral de severidade leve (graus I e II), já que estas são muitas vezes não diagnosticadas; para os casos em que há ulceração (graus III e IV), descritos com mais detalhe e maior frequência na literatura, é possível relacionar alguns fatores à maior incidência de mucosite oral4. Assim, crianças e idosos constituem dois grupos de pacientes com aparente maior suscetibilidade à mucosite oral: as crianças, devido à maior dose de químio e radioterapia utilizada no tratamento antineoplásico; e os idosos, devido às modificações presentes na mucosa oral inerentes ao processo de envelhecimento (atrofia
Figura 11.3 Aspecto da mucosa eritematosa com lesão ulcerativa isolada. (Fonte: arquivo pessoal.)
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Figura 11.4 Múltiplas ulcerações confluentes com extensas áreas necróticas. (Fonte: arquivo pessoal.)
epitelial, redução da imunidade etc.), ou associadas ao maior tempo necessário à recuperação da homeostase13. É fundamental que a TLBP seja ajustada a cada situação de pacientes, adaptando-se principalmente a dosimetria (veja adiante a descrição dos parâmetros de irradiação laser). Tanto para crianças quanto para idosos têm sido relatados trabalhos em que foi utilizada, de forma eficiente, a TLBP para o controle da mucosite oral, apesar das dificuldades de acesso e de adesão ao tratamento14. Outro fator que tem sido associado, porém sem consenso, ao maior risco de mucosite oral é o sexo feminino, devido a uma possível influência de alterações hormonais que podem existir durante a terapia antineoplásica13. O tipo e a dose de regime quimioterápico e radioterápico parecem ser os fatores de risco com associação direta a mucosite oral3,4,11,13. A Tabela 11.2 mostra a porcentagem média de pacientes que exibiram mucosite oral graus III e IV segundo algumas associações de quimioterápicos e de radioterapia. Observa-se que há maior frequência de pacientes com mucosite severa principalmente em regimes com 5-fluorouracil (5-FU) e taxanos, bem como em transplantes de células hematopoiéticas em que se utilizam melfalan associado a outros agentes. A radioterapia associada à quimioterapia, principalmente a de corpo total, também constitui alto risco para mucosite severa. Em pacientes com câncer de cabeça e pescoço submetidos a radioterapia, a incidência de mucosite oral atinge 80%, com 39% apresentando graus III e IV. Quando o regime radioterápico é fracionado, o risco parece ser maior (57% dos pacientes exibem graus III e IV)15. Entre os tumores primários, a mucosite oral parece estar mais presente em pacientes com leucemia linfoblástica aguda, linfomas em geral, câncer de cabeça e pescoço, câncer esofágico, tumores gastrointestinais, tumores de células germinativas em geral, sarcomas, câncer de pulmão e câncer do trato genitourinário4,16. Em todas essas situações, é fundamental que a TLBP seja utilizada como profilaxia para mucosite oral, evitando que as lesões atinjam graus severos. Recentemente tem-se discutido que fatores genéticos também poderiam estar relacionados com maior risco para mucosite oral. Estudos envolvendo transplantes alogênicos de células-tronco hematopoiéticas têm demonstrado que alguns indivíduos são geneticamente mais suscetíveis aos efeitos citotóxicos dos quimioterápicos, e isso predispõe ao aparecimento da mucosite oral. Exemplos são a maior expressão dos genes da família do citocromo P450, que interferem no metabolismo da ciclofosfamida, um quimioterápico de alto risco para mucosite oral17, ou variações genéticas envolvendo a produção de enzimas que metabolizam o folato, as quais podem predizer maior risco de mucosite oral em pacientes sob tratamento com metotrexato18. Algumas regiões da cavidade oral também são mais suscetíveis que outras aos efeitos citotóxicos da radiação e da quimioterapia. Os locais mais acometidos são aqueles em que não há ortoqueratinização do epitélio e nos quais há mobilidade da mucosa oral, como mucosa labial, mucosa jugal, ventre lingual, assoalho bucal, gengiva marginal e palato mole. Todos esses sítios anatômicos devem ser de eleição e prioritários para a irradiação laser, mesmo na ausência de sinais de mucosite oral. Como parte de um protocolo integral de prevenção às lesões ulcerativas, é recomendável também a inclusão dos demais sítios anatômicos, como gengiva inserida e palato duro.
BASES BIOLÓGICAS E PATOGÊNESE DA MUCOSITE ORAL A patogenia da mucosite oral envolve uma cascata de eventos de natureza inflamatória que culminam com a interrupção dos processos de renovação epitelial por meio do bloqueio da mitose de queratinócitos e da indução de apoptose nessas células, com consequente ulceração na mucosa. Essa constitui uma regra geral da citotoxicidade provocada tanto pela quimioterapia quanto pela radioterapia. Sonis et al.4 criaram um modelo teórico para explicar a cascata de eventos da mucosite oral que envolve não só o epitélio, mas também a lâmina própria e a submucosa, ampliando o olhar para explicar a origem dessa lesão. Nessa abordagem mais completa, as diferenças entre a mucosite oral oriunda de quimioterápicos da originária da radiação foram sendo descritas19, o que atualmente obriga uma descrição distinta entre os dois processos.
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Tabela 11.2 Porcentagem média* de pacientes acometidos por mucosite oral de alta severidade (graus III e IV), segundo tipo de alguns quimioterápicos e suas associações, transplantes e regimes pediátricos Regime quimioterápico Antraciclinas Docetaxel + 5FU Docetaxel + platina Paclitaxel, docetaxel + ciclofosfamida Taxanos Docetaxel + radioterapia Paclitaxel/5FU + radioterapia Paclitaxel/platina + radioterapia Platina Platinum/taxanos + radioterapia Oxaliplatin + radioterapia 5-FU 5FU/platinum + radioterapia 5FU/leucoverin/ taxano 5FU/Irinotecan + radioterapia Transplante de células-tronco hematopoiéticas (adultos) Com radiação de corpo todo (TBI) Com bussulfan Com melfalan/etoposida/carboplatina (BEAM) Com bussulfan/etoposida/ciclofosfamida Transplante de células-tronco hematopoiéticas (crianças) Com radiação de corpo todo (TBI) Com melfalan/etoposida/carboplatina (BEAM) Com bussulfan/etoposida/ciclofosfamida Com metotrexato para profilaxia para DECH
% 66 12 11 98 75 60 64 31 38 45 36 64 52 90 82
42 31 27 23
*Adaptado de Sonis et al.4 e de Blijlevens et al.33, Vokurka et al.34 e Wardley et al.35 DECH – doença do enxerto contra o hospedeiro.
PATOGENIA DA MUCOSITE ORAL DE ORIGEM QUIMIOTERÁPICA Os mecanismos que levam a danos na mucosa oral originários de quimioterápicos ainda são desconhecidos. Hipoteticamente o agente quimioterápico atinge as células epiteliais por intermédio de sua difusão para a matriz extracelular do tecido conjuntivo. Nesse processo, analisando-se de forma linear os eventos, o que pode não ser biologicamente correto mas didaticamente adequado, o primeiro contato do agente quimioterápico na mucosa oral ocorre na parede vascular da microcirculação, quando de sua difusão para a matriz extracelular do tecido conjuntivo. Pode-se imaginar então que a primeira célula da mucosa oral a sofrer os efeitos tóxicos da droga é o endoteliócito. O efeito citotóxico nesse nível ocorre via produção intensa de espécies reativas de oxigênio (EROs), fazendo que essa célula libere fatores pró-inflamatórios e estimule a cascata da coagulação, a qual também contribui para eventos inflamatórios. Essa produção de EROs rapidamente se estende para as demais células do tecido conjuntivo e do tecido epitelial à medida que ocorre a difusão do agente quimioterápico. Cada agente quimioterápico age na inibição da mitose e na morte celular por diferentes vias de bloqueio do ciclo celular. Como os queratinócitos orais da camada basal do epitélio são uma das células da mucosa oral que possuem ciclo celular mais curto (possuem alto turn-over), há maior chance de serem bloqueados primeiro pelo quimioterápico em relação às demais células, o que os torna mais suscetíveis à toxicidade. Porém é necessário certo tempo para que um número considerável de queratinócitos seja danificado pelo quimioterápico a ponto de se ter alteração visível clinicamente. Nesse sentido, a fase inicial de eritema é o sinal das alterações que estão ocorrendo no tecido conjuntivo e que já estão exacerbadas, mas que ainda não foram suficientes para causar danos no epitélio que sejam detectados clinicamente. As EROs desencadeiam a produção de uma série de fatores de transcrição, entre eles o fator nuclear transcricional capa-beta (NF-κB), o qual é responsável pela superregulação de genes que produzem citocinas pró-inflamatórias, como interleucina 1β (IL1β), interleucina 6 (IL-6) e fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), bem como pela ativação de genes que regulam a expressão de moléculas de adesão e ativam a via das cicloxigenases-2 (COX-2). Esse conjunto de proteínas acarreta vasodilatação, alterações na permeabilidade vascular, exsudação plasmática e celular, bem como estimula angiogênese, o que explica o quadro de eritema nas
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fases iniciais da mucosite oral. É importante apontar, contudo, que esse quadro inflamatório não constitui o de uma inflamação aguda típica, já que praticamente não se observa exsudato neutrofílico abundante. Vale considerar que os pacientes sob quimioterapia frequentemente encontram-se neutropênicos, o que explica algumas das peculiaridades da inflamação na mucosite oral. Um evento fundamental diretamente ligado à morbidade da mucosite oral é o alto grau de apoptose observado nas células danificadas. A apoptose de queratinócitos é oriunda tanto dos efeitos indiretos produzidos pelas citocinas originárias no tecido conjuntivo, principalmente do TNF-α, quanto da ativação da via da ceramida-sintase pelo agente quimioterápico. Portanto há uma somatória de eventos diretos e indiretos originários do agente quimioterápico que culminam com a morte celular. O alto índice de apoptose dos queratinócitos da camada basal do epitélio determina o aparecimento da atrofia epitelial. Ao mesmo tempo, a alta taxa de citocinas e a produção de metaloproteinases no tecido conjuntivo provocam a degradação da matriz extracelular pela solubilização de proteínas da matriz, como a fibronectina. Assim, os queratinócitos encontram-se em menor número e sem matriz extracelular adequada para sua sustentação, o que os torna friáveis e sem adesão entre si. Pode-se reconhecer aqui a fase de pseudomembrana e de ulceração, em que ocorre o desprendimento do epitélio e a consequente exposição do tecido conjuntivo. A exposição do tecido conjuntivo acarreta algumas modificações no padrão microscópico do quadro inflamatório até então descrito. A necrose superficial gerada por essa exposição favorece a colonização bacteriana, cujas toxinas sinalizam a fagocitose de macrófagos e a exsudação neutrofílica. A intensa ativação da fagocitose de macrófagos contribui tanto para a produção de citocinas pró-inflamatórias, quanto para a produção de fatores de crescimento, os quais estimulam o reparo tecidual. Os fatores de crescimento ativam a produção de proteínas da matriz extracelular ao mesmo tempo em que provocam proliferação celular e angiogênese. O controle da infecção bacteriana contribui para o reparo das lesões, bem como para evitar bacteremia e sepse, porém ele não é o único determinante da cura das lesões. É fundamental haver redução da taxa de toxinas bacterianas, redução da meia-vida do agente quimioterápico localmente na mucosa oral e alta produção de fatores de crescimento para que ocorra a ativação da proliferação de queratinócitos. Dá-se início, então, à reepitelização, a qual pode ser finalizada em um prazo de uma ou duas semanas. Ocorre reparo completo das lesões quando houver reconstrução completa do tecido conjuntivo subjacente ao epitélio, reconstituição da membrana basal e reepitelização completa. O remodelamento do epitélio, em que há restituição da espessura adequada ao sítio anatômico, bem como o restabelecimento do grau de queratinização, é fator fundamental para que o local lesionado não fique suscetível a recidivas. Assim, mesmo após o reparo clínico, é conveniente continuar a TLBP no local, para acelerar o processo de remodelamento e prevenir a recorrência das lesões.
PATOGENIA DA MUCOSITE ORAL DE ORIGEM RADIOTERÁPICA Praticamente todos os eventos descritos na patogenia da mucosite oral de origem quimioterápica fazem parte dos mecanismos conhecidos sobre a mucosite de origem radioterápica. Porém não se pode descartar o fato de que a quimioterapia gera efeitos citotóxicos locais e sistêmicos, enquanto a radioterapia gera danos locais1,3. O indivíduo sob quimioterapia exibe altos níveis de ERO e citocinas em nível sérico, bem como se encontra em total perda da homoestase, com episódios de intenso metabolismo e catabolismo. Já o indivíduo sob radioterapia, quando esta não está associada a quimioterapia, não exibe quadro sistêmico semelhante. Mesmo na ausência de estudos que identifiquem os fatores sistêmicos que diretamente interferem na patogenia da mucosite oral, não é difícil de depreender essas influências. Outro ponto importante é o fato de a radiação atingir, em primeira instância, as células epiteliais da mucosa oral e, em segunda instância, mesmo que com intervalo de tempo desprezível, o tecido conjuntivo. Pode-se considerar, assim, que a agressão inicial da radiação atinge diretamente as células epiteliais, diferentemente do agente quimioterápico, que chega até o epitélio por difusão a partir do tecido conjuntivo. Os queratinócitos da camada basal do epitélio sofrem imediatamente danos no DNA provocados diretamente pela radiação ionizante, porém boa parte dos efeitos citotóxicos advém de efeitos indiretos das radiações sobre a água, gerando ERO. A partir daí, a sequência de eventos descrita para a mucosite oral de origem quimioterápica, com ativação de fatores de transcrição e de produção de citocinas, aplica-se também às derivadas da radioterapia. Dörr et al. demonstraram que o epitélio da mucosa oral submetido a radiação ionizante e exibindo mucosite oral de graus I a III apresenta ciclos bifásicos de atrofia e hiperplasia, como resposta ao desequilíbrio entre proliferação e processos de morte celular6. Ao final da primeira semana após a radiação ocorre diminuição significativa da densidade de queratinócitos, apesar de clinicamente as lesões poderem ser classificadas como grau 0. Isso indica que a ausência de sinais clínicos não quer dizer que a mucosa exiba características de normalidade em nível celular, o que justifica a TLBP dita “preventiva” em termos clínicos. As quedas de densidade celular são imediatamente seguidas de intensa proliferação compensatória, indicando que a mucosa oral, apesar de danificada pela radiação, não perde sua capacidade de regeneração. As ulcerações são decorrentes da resultante de morte celular em detrimento da proliferação, porém o estudo de Dörr et al.6 não encontrou diferenças significativas entre as baixas densidades de queratinócitos observadas dos graus I e II de mucosite e dos graus III e IV. Além dessas oscilações no epitélio, várias alterações no tecido conjuntivo são descritas, entre elas modificações importantes na microcirculação, oriundas da intensa apoptose dos endoteliócitos. Há indícios de que essas alterações vasculares são anteriores às epiteliais nas mucosites intestinais, porém na cavidade oral essas evidências não se confirmaram4. Contudo, tal qual na mucosite de origem quimioterápica, os danos no tecido conjuntivo constituem elementos-chave para explicar a patogenia da mucosite oral radioterápica e devem ser mais bem estudados.
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Laser de Baixa Potência – Princípios Básicos e Aplicações Clínicas na Odontologia
EFEITOS BIOMODULADORES DO LASER DE BAIXA POTÊNCIA SOBRE A MUCOSITE ORAL A TLBP é conhecida na área odontológica por sua produção de calor mínima ou inexistente e que acarreta efeitos fotobiológicos com potencial de estimulação da proliferação celular, de inibição de alguns mediadores químicos da inflamação e de interferência em terminações nervosas locais, gerando analgesia. Todos esses efeitos foram descritos em detalhes em capítulo anterior e podem ser reproduzíveis para a situação clínica da mucosite oral. Com base na patogenia da mucosite oral, é possível, contudo, pormenorizar alguns desses mecanismos benéficos da TLBP para subsidiar adaptações de protocolos que porventura sejam necessárias. A Tabela 11.3 resume alguns aspectos do mecanismo da mucosite oral que podem ser relacionados com as propriedades da TLBP. Os itens adiante contêm alguns comentários sobre a literatura científica atual pertinente a essas propriedades.
Tabela 11.3 Alguns mecanismos relacionados com a patogenia da mucosite oral e os efeitos do laser de baixa potência que podem ter influência sobre esse mecanismo Patogenia da mucosite oral
Efeitos do laser de baixa potência
Alta produção de ERO, Incremento da produção levando a célula à morte de ERO de maneira dose-dependente, levando a célula à proliferação
Alta taxa de apoptose
Tipo de estudo com TLBP
Referência
He-Ne laser (633nm), diâmetro do spot 0,635 cm; durante 0,8, 1,33, 2,6, 4, 6,66, ou 13,33 min, densidade de energia de 3,5, 10, 15, 25, e 50 J/cm2, respectivamente, 25,2 mW, 64,6 mW/cm2
Cultura de células He-La
Zhang et al.20
Cultura de células miogênicas
Shefer et al.21
Inibição da apoptose He-Ne laser (633 nm, pela estimulação 4,5 mW; 1,8 mm de de proteínas diâmetro da fibra) antiapoptóticas (como Bcl-2) e inibição de proteína pró-apoptóticas (como BAX)
Alta taxa de citocinas Inibição gênica e da pró-inflamatórias (IL-1β produção de IL-1β e TNF-α) Inibição da taxa de TNF-α de maneira dose-dependente Ativação da via da cicloxigenase-2, com consequente liberação de prostaglandina E2
Tipo de laser e parâmetros
780 nm laser de diodo (2 J/cm2) GaAlAs laser, 650 nm, 0,11 J, 31,3 mW/cm2 durante 5 min
Inibição da produção de 35 mW, 100 mW cicloxigenase 1 e 2, com consequente queda na GaAlAs diodo laser taxa de prostaglandina E2
Liberação de fatores de Antecipação da presença Vários parâmetros crescimento somente na de maior taxa de fatores fase de reparo de crescimento no tecido pela estimulação da liberação dessas proteínas Intensa dor devido a ulcerações
Efeito analgésico devido à inibição de β endorfinas e da condutividade nervosa
780 nm, 2,5 e 1 J /cm2
Cultura de Gavish et al.22 queratinócitos humanos Modelo de injúria aguda Aimbire et al.23 em pulmão de rato Modelo animal de mucosite em hamster Cultura de fibroblastos gengivais
Lopes et al.26
Vários modelos
Gao & Xing 28
Modelo de indução de dor em ratos
Laakso, Cabot 30
Sakurai et al. 27
Capítulo 11 – Terapia Laser de Baixa Potência na Mucosite Oral
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ESPÉCIES REATIVAS DE OXIGÊNIO Foi comentado anteriormente que um dos primeiros eventos, se não o mais importante, da mucosite oral é a geração intensa de EROs no interior das células, levando à indução de apoptose e à produção de vários fatores de transcrição, que determinam a cascata de eventos inflamatórios. A produção de EROs no interior das células tem sido atualmente estudada em várias situações biológicas praticamente sob duas vertentes: uma em que se evidencia que a alta concentração de estresse oxidativo e provoca reações bioquímicas intracelulares que culminam com a morte celular; e outra em que uma pequena elevação da concentração de ERO intracelular é suficiente para acionar outros mecanismos que estimulam a proliferação celular. A irradiação com laser de baixa potência, em particular o vermelho e o infravermelho, promove a sensibilização de cromóforos (como citocromos, flavinas e fosfato de nicotinamida adenina dinucleotídeo NADPH), os quais são responsáveis pela produção de ERO; estes estimulam a regulação de várias proteínas quinases, como o fator de crescimento epidermal (EGF), a proteína quinase mitogênico-ativada (MAPK) e Akt, os quais, por sua vez, determinam a proliferação, diferenciação e migração de células eucarióticas (Capítulo 3). Essa produção de ERO ocorre em nível mitocondrial, diferentemente daquela produzida a partir da terapia fotodinâmica, em que a elevação de ERO ocorre no local da célula onde se aloja o fotossensibilizador. Além disso, a produção de ERO pela TLBP é dependente da densidade de energia, ou seja, quanto maior a densidade de energia, maior a produção de ERO20. Assim, é fundamental o desenvolvimento de protocolos de irradiação laser para mucosite oral cuja dose seja compatível com a ativação de proteínas estimuladoras de proliferação, e não de inibição mitogênica e ou morte celular, considerando a alta concentração de estresse oxidativo já existente nessa lesão (Capítulo 3).
APOPTOSE Como foi descrito anteriormente, o mecanismo fundamental originário da mucosite oral é a alta taxa de apoptose de queratinócitos, levando a ulcerações. A TLBP pode inibir a apoptose ao promover a ativação da célula B de linfoma (Bcl-2) e inibição da proteína X associada a BCL2(Bax2). Assim, a irradiação laser pode facilitar a reepitelização, diminuindo a taxa de apoptose nos queratinócitos, bem como atenuar as alterações vasculares geradas tanto pelos quimioterápicos quanto pela radiação ionizante, ao promover também a diminuição da apoptose de endoteliócitos.
CITOCINAS PRÓ-INFLAMATÓRIAS Como já foi comentado anteriormente, na fase de amplificação da mucosite oral, as citocinas pró-inflamatórias IL-1β, IL-6 e TNF-α estão em alta concentração no tecido, levando à manutenção do processo inflamatório e da apoptose. A TLBP, particularmente a realizada com laser infravermelho, pode inibir a produção de IL-1β, principalmente de queratinócitos22. Já o laser vermelho (650 nm) pode diminuir significativamente os níveis de TNF-α, porém a máxima eficácia dessa diminuição é dose-dependente3.
CICLOXIGENASE-2 E PROSTAGLANDINA E2 (PGE2) A ativação das COX2 constitui um dos eventos inflamatórios de maior importância na patogenia da mucosite oral24 por gerar a liberação de PGE2, a qual atua nos processos de exsudação e de promoção de sintomatologia dolorosa25. A TLBP inibe a produção de COX2 em mucosite oral induzida em hamsters26, bem como em fibroblastos humanos gengivais, nos quais também se observa diminuição da expressão de PGE227.
FATORES DE CRESCIMENTO Os fatores de crescimento na mucosite oral elevam sua taxa quando há queda dos agentes agressores, a qual coincide com o esgotamento da ação do quimioterápico sobre as células e com a cessação dos efeitos cumulativos da radiação ionizante sobre o DNA celular. A TLBP pode antecipar essa produção, já que estimula a produção de inúmeros fatores de crescimento, entre eles o fator de crescimento de queratinócitos (KGF), o fator de crescimento fibroblástico (FGFb), o fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF) e o fator de crescimento vascular endotelial (VEGF). Assim, é possível estimular a proliferação de queratinócitos, fibroblastos e células endoteliais, havendo o incremento da reepitelização, a reconstrução do tecido conjuntivo e da membrana basal, bem como o aumento da angiogênese28.
ANALGESIA A dor superficial nociceptiva constitui um dos sinais clínicos da mucosite oral que causa alta morbidade e expressiva piora na qualidade de vida29. A prescrição de analgésicos, como combinação de acetoaminofeno, anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e
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opioides, parece ser ineficaz para o controle da dor na cavidade oral29. A TLBP acarreta potente efeito analgésico, cujo mecanismo ainda é bastante controverso. Acredita-se que exista, além do efeito inibitório sobre as PGE2, inibição também da produção de β endorfinas e da condução nervosa nos nervos sensitivos30 (Capítulo 5).
PROTOCOLOS CLÍNICOS DE TLBP PARA CONTROLE DA MUCOSITE ORAL Os protocolos clínicos da TLBP para controle da mucosite oral são variados, porém parecem ser eficazes. Uma revisão sistemática recente sobre esse efeito foi realizada com estudos clínicos randomizados e evidenciou que há redução do risco relativo em até duas vezes de haver o desenvolvimento da mucosite oral em pacientes irradiados com TLBP. O estudo também demonstrou que o risco de ocorrência de mucosite oral em pacientes sob irradiação preventiva com laser cai em até três vezes31. Ficou evidente que a TLBP reduz a severidade, a duração da mucosite, bem com a sintomatologia dolorosa. Os lasers utilizados no controle da mucosite oral são o de emissão vermelha (630 nm a 660 nm) e infravermelha (780 nm e 830 nm), geralmente em modo contínuo, pontual e em média com 2 J de energia. A Tabela 11.4 resume alguns trabalhos em que foi apresentado o protocolo utilizado nos casos de mucosite oral. O tempo de irradiação e a posologia em relação ao número de dias também são bastante variáveis e até certo ponto empíricos. Aplicações diárias parecem ser mais adequadas e de maior eficácia no controle das lesões. Pode-se admitir certa adaptação desse tempo em função da severidade das lesões, visando-se obter maior tempo de analgesia, por exemplo. Contudo deve-se ter cautela em não se sobredosar o local, considerando-se as discussões anteriores com relação à excessiva produção de EROs. Vale dizer que trabalhos têm evidenciado que menores densidades de energia acarretam melhores resultados de biomodulação dos lasers de baixa potência32. Não se deve esquecer também de que nem sempre parâmetros diferentes em termos de tempo de irradiação e de densidade de potência, mas com a mesma densidade de energia, geram o mesmo efeito biológico32. Assim, o controle da mucosite oral pela irradiação laser é parâmetro-dependente, não estando descartada a possibilidade de densidades de energia excessivas acarretarem piora no quadro clínico do paciente (Capítulo 2). Um ponto importante ao se instituir a TLBP é realizar, paralelamente às irradiações, todos os cuidados orais necessários a manutenção da higiene oral, salivação e controle de focos infecciosos. Como já foi comentado, a severidade da mucosite oral é influenciada também pela presença de infecções bacterianas no local. Assim, o controle da higienização oral é fundamental para o sucesso da TLBP.
Tabela 11.4 Alguns protocolos de TLBP aplicados à mucosite oral citados na literatura Referência
Protocolo da TLBP
Duração da TLBP
Barasch et al.36 Cowen et al.37
He-Ne (633 nm), 25 mW, 1 J/cm2 (E = 1 J) He-Ne (633 nm), 60 mW, 1,5 J/cm2 (E = 0,6J)
Bensadoum et al.38
Corti et al.44 Cruz et al.14 Antunes et al.45
He-Ne (633 nm), 60 mW ou 25 mW, 2 J/cm2 (E = 2 J) NIS, 45-50 mW, dose total 50-60 J (0,7 ou 0,8 J/ cm2) GaAlAs, 780 nm, 60 mW, 2 J/cm2 He-Ne (633 nm), 60 mW, 2 J/cm2 NIS, 660 nm, 30 mW, 2 J/cm2 (E = 2 J) He-Ne (633 nm), 10 mW E=2J LED, 645 nm, 7,8 mW, 0.99 J/cm2 (E = 2,34 J) NIF, 780 nm, 60 mW, 4 J/cm2 InGaAIP, 660 nm, 50 mW, 4 J/cm2 (E = 0,8 J)
40 s por sítio anatômico por 5 dias consecutivos 10 s por sítio anatômico uma vez por dia por 5 dias consecutivos 33 s ou 80 s em 9 pontos, durante 5 dias consecutivos Semanalmente por 15-20 min, até a remissão das lesões 5 dias consecutivos, durante 7 semanas 5 dias consecutivos durante 7 semanas 1 min diariamente até a remissão das lesões 3 min, diariamente, durante 5 dias
Schubert et al.5 Eduardo et al.46
GaAIAs, 650-780 nm, 40-60 mW, 2 J/cm2 InGaAIP, 660 nm, 40 mW, 4 J/cm2
Wong & WilderSmith39 Migliorati et al.40 Bensadoum & Ciais41 Sandoval et al.42 Arun Maya et al.43
Cauwels & Martens47 GaAIAs, 830 nm, 150 mW, Gouvêa et al.48 GaAIAs, 660 nm, 10 mW, 2,5J/cm2 49 Silva et al. 660 nm, 40 mW, 4 J/cm2 Adaptado de Eduardo et al.46. Foram feitas complementações.
5 min, 3 vezes por dia, durante 7 dias 5 dias consecutivos 16,7s em cada sítio anatômico por em média 10 dias Diariamente por 7-13 dias Diariamente, até a remissão das lesões ou até o término do tratamento A cada 48 h, até a remissão das lesões Antes de cada radiação fracionada
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