Pole dance, antes visto como dança de casas de show, mostra sua real importância para o universo feminino
festival de comunicação e artes reúne olhares urbanos de rappers, fotógrafos e dançarinos Marianne Fonseca
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Flora Silberschneider
o Rapper Flávio Renegado fala sobre a importância da música em comunidades carentes como o Alto vera cruz
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Marianne Fonseca
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Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo . Faculdade de Comunicação e Artes . PUC Minas . Ano 43 . Edição 325 . Novembro . 2016
Mariana: um ano de incertezas Ocupações marcam momento político Alunos secundaristas mantêm ocupações em várias escolas de BH contra a reforma do ensino médio do governo Temer. Eles também são contrários à PEC 241 que agora tramita no Senado como PEC 55.
Ainda no campo da política, o prefeito eleito Alexandre Kalil terá dificuldades para conquistar os 642.050 eleitores que decidiram por votos nulos, brancos e abstenções no segundo turno. Páginas 3-4 Marianne Fonseca
Lucas de Godoy / Jornal A Sirene
leia ainda
Motivo de vazamento é desconhecido Imóveis foram interditados no João Pinheiro, depois de um vazamento nos canos da Copasa. Os moradores precisaram ser retirados. A Copasa já consertou os canos, mas não se sabe a causa do problema. Página 10 Flora Silberschneider
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m editorial
A cidade que Kalil vai herdar Marianne Fonseca 5º Período
Um ano após o crime ambiental em Mariana, a situação atual dos moradores dos distritos atingidos pela lama nos faz refletir. Uma repórter do MARCO esteve no município e registrou o sentimento de desolação, tristeza e aflição dos atingidos, agora também vitimas de discriminação dos marianenses. No campo das manifestações políticas, as ocupações dos estudantes secundaristas é destaque nessa edição. Eles são contrários á proposta de reforma do ensino médio,do governo Temer e contra a PEC 241, atual PEC 55. Os secundaristas ocupam a Escola Estadual Governador Milton Campos, conhecida como Estadual Central, uma escola que tem história em Belo Horizonte. Nela estudaram vários políticos e artistas conhecidos. Por outro lado, o novo prefeito de BH, Alexandre Kalil, do PHS, vai herdar uma cidade com muitos problemas e desafios, tais como: mobilidade urbana, recolhimento de lixo e saúde pública. O que se espera dele e de sua equipe é que trabalhem em consonância com os moradores, conhecendo mais de perto os problemas da cidade. Essa edição traz, ainda: uma matéria sobre a eutanásia, explicando o que é, e como a questão é vista pela sociedade brasileira; reportagem sobre a ressignificação do pole dance, atualmente considerado esporte,que vem contribuindo para que as mulheres aceitem melhor o próprio corpo. O MARCO traz isso e muito mais para você. Uma ótima leitura e sintam-se a vontade para nos enviar comentários, criticas e sugestões pelo e-mail: jornalmarco@pucminas.br
OPINIÃO CRÔNICA
Jogar peteca com a Dona Morte Matheus Moura Cinema e Audiovisual 2º Período
Eu definitivamente sou um nômade, e para alimentar esse meu adjetivo, decidi mudar de casa novamente. Após breve pesquisa, um deles me chamou atenção. O que me cativou interesse não foi a dependência de empregada, ou o piso carpetado, mas sim o fato do corretor alertar-me que o antigo dono ali morrera (o que não me pareceu ser a estratégia mais esperta ao tentar vender um imóvel). Ao indagar o porquê de alguém não comprar um apartamento porque o antigo dono havia dado seu último suspiro em um daqueles cômodos, refleti sobre o quão injusta a morte é: além de você ir embora sem se despedir de ninguém, a dona morte despreza todo seu esforço quando vivo! Ela não liga se você deixou de lado aquela gordurinha da picanha no churrasco, se você ignorou o elevador e decidiu subir as escadas, ela não dá a mínima se você chegava no ponto ás12h30min, mas só pegava o ônibus das 13h, que
mesmo deixando-o atrasado no trabalho, proporcionava-lhe estar no mesmo ambiente que a menina que trabalhava no Itaú, no centro da cidade. Resumindo, a morte é injusta. Partindo do princípio de que injustiça é violação do direito de outrem, a morte nos priva do direito de viver. E por mais redundante que seja, não deixa de ser passível de pesar e reflexão. Por mais que seja prudente preocupar-se com a morte, é um pensamento egoísta tentar ludibriá-la alargando a vida ao máximo. Quando formos candidatos a morrer, devemos ser complacentes ou mais que isso: devíamos propor jogar peteca com a Dona Morte ou algo do tipo. Depois de um tempo pensando a respeito, decidi que vou encarar a morte como apenas mais uma mudança e quando acontecer, a primeira pessoa que vou procurar no pós-vida é o antigo dono do apartamento (decidi alugá-lo, a propósito) e perguntar onde fica a caixa de gordura.
CRÍTICA
Espaço, memória e resistência em Aquarius Marcelo Cesar Silva Cinema e Audiovisual 6º Período
Abordando questões como espaço, memória e resistência, o filme Aquarius (2015), de Kleber Mendonça Filho, é uma grande expressão das angústias que atormentam o nosso tempo. Sônia Braga faz o papel de Clara, uma escritora e jornalista especializada em música, moradora do Edifício Aquarius. Ela resiste em vender o seu apartamento para a construção de um condomínio de luxo, embasada na memória que o lugar lhe traz: foi lá que viveu intensamente com o marido e os três filhos, lutou contra o câncer e adotou uma vida tranquila. Segundo Gilles Deleuze, “a memória é conduta de narrativa” e é, com conduta similar, que Kleber começa a contar a sua história. Filma álbuns de fotografia e escolhe a dedo a trilha sonora, baseada em lembranças do passado. Assistimos a
várias cenas muito bem dirigidas, com o tempo estendido, dando profundidade aos sentimentos das personagens, regidas por Maria Bethânia, Gilberto Gil e Taiguara. O espaço, nos filmes de Kleber, também é onde se dão as problemáticas das vivências sociais e a especulação imobiliária. Vemos, por um lado, a relação ambígua de Clara e suas empregadas. Por outro, seu enfrentamento com Diego, herdeiro da imobiliária que tenta comprar, a todo custo, o seu apartamento. À parte sua estética, o filme foi marcado pela manifestação contra o atual presidente Michel Temer no Festival de Cannes, se envolveu na discussão pela indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro e foi alvo de censura, tornando-se bandeira de resistência política. Questões que só trouxeram maior visibilidade ao filme,.
m expediente Jornal MARCO Laboratório da Faculdade de Comunicação e Artes da PUC Minas www.pucminas.br | e-mail: jornalmarco@pucminas.br Rua Dom José Gaspar, 500 | CEP 30.535-610 | Coração Eucarístico Belo Horizonte | MG | Tel: (31) 3319-4920 Sucursal PUC São Gabriel: Rua Walter Ianni, 255 | CEP 31.980-110 Bairro São Gabriel | Belo Horizonte | MG | Tel: (31) 3439-5286 Diretora da Faculdade de Comunicação e Artes: Profª. Cláudia Siqueira Chefe de Departamento: Prof. Ercio do Carmo Sena Cardoso Coordenador do Curso de Jornalismo: Prof. Francisco Braga Coord. do Curso de Comunicação / S.Gabriel: Profª. Alessandra Girard Coordenador do Curso de Jornalismo (S. Gabriel): Prof. Jair Rangel Editora: Profª. Ana Maria Oliveira Subeditores: Profª. Maura Eustáquia e Prof. Getúlio Neuremberg Editor Gráfico: Prof. José Maria de Morais Monitores de Jornalismo: Ana Clara Carvalho, Débora de Souza, Giulia Staar, Karine Borges, Letícia Perdigão e Marina Moregula Monitoras de Fotografia: Flora Silberschneider e Marianne Fonseca Monitores de Diagramação: Laura Brand e Samuel Lima Apoio: Laboratório de Fotografia e NEP CTP e Impressão: Fumarc. Tiragem: 12.000 exemplares
m errata Da entrevista com a cineasta Anna Muylaert, publicada na edição nº 324, também participaram as alunas Isabella Guimarães, Izabela Silva e Juliana Gusman.
m fórum dos leitores Saraus de poesia
Cumprimento vivamente os responsáveis pela publicação pelo interesse na divulgação da experiência da poesia suscitada pelos saraus, uma manifestação cultural que muitos até então julgavam elitizada, inexpressiva ou extinta. É reanimador, em tempos tão cinzentos, encontrar, pelas páginas de um jornal e em linguagem de “dia de semana”, espaço para discutir e pensar a arte. O mundo agradece! Obrigada à Ana Carolina Diniz por me permitir dar voz à minha experiência. Nathália Campos, professora de literatura e língua portuguesa
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POLÍTICA
Ocupação de escolas cresce na capital Marianne Fonseca
Alunos permanecem no Estadual Central na luta contra a reforma do ensino médio e a PEC 241 Marina Moregula Samuel Lima 4º Período
Quando o governador de São Paulo anunciou uma reorganização das escolas em 2015, não imaginava que provocaria a chamada “primavera secundarista”: estudantes paulistas do ensino médio ocuparam suas escolas para ser ouvidos. A Medida Provisória 746 e a Proposta de Emenda Constitucional 241 provocam agora a mesma reação em secundaristas de todo o país. A Escola Estadual Governador Milton Campos, conhecida como Estadual Central, está ocupada por cerca de 50 alunos desde o dia 6 de outubro e assim deve permanecer até que o governo federal desista da reforma. Já são oito as escolas ocupadas em BH; 66 em Minas Gerais e mais de mil escolas em todo o país. O Estadual Central foi o primeiro colégio público do estado e teve sua sede original em Ouro Preto. Na nova capital, Belo Horizonte, o Colégio funcionou em varios endereços. Hoje, ele funciona em um edifício projetado por Oscar Niemeyer, no bairro de Lourdes. Personalidades como Getúlio Vargas, Dilma Rousseff, Fernando Sabino e Fernando Pimentel estudaram lá. É uma escola de tradição na luta política, reconhecida pelos seus professores e a direção, que vêem a atitude dos alunos como algo que merece respeito pelo que representa na luta pela educação de qualidade no país e para o aperfeiçoamento do processo democrático. Os alunos se organizaram de forma pacífica e eficiente,
de modo que a ocupação não impeça que as aulas aconteçam normalmente. Uma programação de debates e eventos culturais, promovidos na ocupação, é divulgada na página do Grêmio “Abre Alas” no Facebook. A proposta é ir além do objetivo de ocupar, pensando também no aprendizado e no envolvimento dos estudantes com política e com a arte. Como muitos alunos são menores de idade, o diálogo com os pais foi importante para a articulação. Eles contam com autorizações assinadas pelos responsáveis para passar a noite na escola. ORGANIZAÇÃO Dos 2.500 alunos do Estadual Central, cerca de 200 participam da ocupação ao longo do dia e 50 viram a noite por lá. Daniela Nunes Moura, 16 anos, é presidente do Grêmio “Abre Alas” e tem dormido todas as noites na ocupação, desde seu início. Ela explica que os ocupantes se dividem em grupos de trabalho para realizar as tarefas das oficinas de comunicação, cozinha e limpeza. “Cada pessoa do grêmio, ou estudante que queira participar, vai para um desses grupos para fazer a ocupação funcionar e não ficar desorganizada”, disse. O movimento conta com doações de alimentos e produtos de higiene para se manter. Os produtos vêm de pais, professores e outras pessoas que apoiam a causa. O vestiário da escola fica disponível das 7h às 15h30min para que os ocupantes tomem banho, mas Daniela conta que um chuveiro foi improvisado em uma árvore com uma mangueira e uma garra-
Propostas afetam o Ensino Médio A Medida Provisória 746 e a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241 incentivaram a mobilização dos estudantes por afetarem diretamente a educação. A MP amplia a carga horária anual do ensino médio de 800 horas para 1400 horas. Este fator pode causar uma evasão escolar, pois muitos estudantes que precisam trabalhar teriam que escolher entre os estudos e a fonte de renda. Além disso, a MP prevê que português e matemática sejam as únicas disciplinas obrigatórias do ensino médio. As matérias restantes iriam ocupar apenas metade do tempo nos três anos, sendo divididas de acordo com o modelo das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A PEC 241 impõe um
teto para gastos públicos do Governo Federal, impactando nos recursos destinados à educação. Este teto seria definido pela inflação acumulada nos últimos 12 meses e permaneceria por 20 anos. Os jovens acreditam que isso causará ainda mais problemas ao sistema educacional brasileiro, já que o aumento na verba da educação será restrito à inflação anual. O dia 21 de novembro é o prazo final para prorrogar a MP 746 por mais 60 dias no Senado Federal e a medida entra em regime de urgência a partir de 7 de novembro. A PEC 241 já foi aprovada em duas votações na Câmara dos Deputados mas, para valer, precisa ser aprovada mais duas vezes pelo Senado, onde passou a ser a PEC de número 55.
fa pet para que eles possam tomar banho também à noite. Daniela faz parte da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes). Ela diz que foi em uma reunião da entidade com outros movimentos do Estado que surgiu a iniciativa da ocupação: “Nada melhor que começar pelo Estadual Central. Temos como modelo pessoas que estudaram aqui que foram à luta contra o Collor e contra a ditadura. Não podíamos ficar fora dessa”. A Ubes, fundada em 1948, resistiu à ditadura militar e tem uma tradição histórica de ocupar escolas. DIREÇÃO Atualmente, mais de mil escolas estão ocupadas no país. A Ubes, que está à frente de todas elas, disponibiliza a lista dos colégios em seu site. Bruna Helena, 18, vice-presidente da Ubes de Minas Gerais, também estuda no Estadual Central. Ela explica que a instituição tem um presidente nacional, um vice nacional e um vice para cada estado. Em BH, outras sete escolas estão ocupadas. A Escola Estadual Santos Dumont e a Escola Estadual Prof. Ricardo Souza Cruz foram ocupadas logo após o Estadual Central. Bruna já visitou outras ocupações para orientar os alunos e fazer a comunicação entre os movimentos das escolas, mas passa a maior parte do seu tempo no Estadual Central, já que estuda lá. Como vice da Ubes do Estado, ela procura estar sempre presente nas primeiras noites de cada ocupação. Sobre a Escola Santos Dumont, ela conta que a ocupação enfrentou resistência da direção, mas isso motivou a luta dos alunos ainda mais. “É uma escola em que os meninos não podem dobrar a calça na canela, senão não entram”, comenta. Lá, as aulas foram interrompidas, pois a ocupação trancou o portão de entrada. Já no Ricardo Souza Cruz, a direção não se opôs ao movimento: “O pessoal pode usar tudo: a cozinha, o laboratório, a biblioteca, a sala de informática, a diretora deixa tudo aberto”. Bruna conclui que são três ocupações com perfis bem diferentes. Isso acontece também pela localização das escolas. “Nas outras duas escolas, a maioria dos meninos é de periferia, então é diferente a forma que a galera vê o mundo”. Em sua opinião, o Estadual Central é uma escola dividida porque ali estudam tanto jovens de periferia quanto da região centro-sul. A direção do Estadual Central não se opôs à ocupação. Rosiane Gomes é vice-diretora do turno da tarde da escola e, segundo ela, a direção não pode ser nem contra nem a favor do movimento, mas se preocupa com a segurança dos ocupantes durante a noite. “Nós pedimos que a Polícia Militar faça rondas durante a noite nos arredores do colégio para que ninguém pule o muro. Manter a
Os participantes da ocupação estão dormindo no pátio do colégio segurança dos alunos é, para nós, o mais importante”, afirma. Segundo a diretora, a Secretaria da Educação também ofereceu apoio aos alunos: “Eles vieram no primeiro dia da ocupação e participaram das reuniões”. Ela reforça que a ocupação tem sido tranquila e não prejudicou, em momento nenhum, o andamento das aulas. PREOCUPAÇÃO Os pais dos alunos tiveram receio no início, mas entenderam a importância do movimento. “A sociedade coloca a ocupação como se fosse uma bagunça, mas não é assim: são adolescentes e professores, juntos, que querem mudar a realidade. Meu pai e minha mãe entendem que não tem lugar melhor para eu estar do que dentro da minha escola”, conta Daniela, presidente do grêmio do Estadual Central. Alguns pais visitaram a ocupação e ajudaram na cozinha e na limpeza. Bruna Helena afirma que sua mãe sempre a apoiou: “Já tem dois anos que estou no movimento secundarista. Ela aceitou que é isso que eu quero fazer”, conta. A vice da Ubes está tentando implantar, nas outras ocupações,
o sistema de autorizações assinadas pelos pais dos menores para que eles fiquem na escola, já que isso funcionou bem no Estadual Central. A maioria dos estudantes apoia o movimento, mas os organizadores da ocupação continuam promovendo debates e divulgando conteúdo nas redes sociais para envolver o restante das pessoas. “Queremos fazer uma escola diferente, com mais cultura e mais informação”, diz Daniela Moura. Ela comenta que o diálogo nas escolas é importante e que, se a escola não abre esse espaço, cabe aos próprios estudantes fazê -lo. Debates sobre racismo e homofobia, saraus, oficinas de circo e música já foram realizados no espaço da ocupação. Para a presidente do grêmio, a ocupação é um exemplo do que seria uma reforma ideal do ensino médio. “Hoje só 19% dos jovens brasileiros estão estudando. A gente precisa atrair essa juventude com oficinas culturais, aulas que eles vão gostar de fazer. A escola está aí para ser uma casa pra gente, e a ocupação mostra que ela pode ser. Um modelo de ensino bom seria um em que o aluno pudesse dizer o que ele acha melhor.”
No dia 3 de novembro, cerca de 80 estudantes ocuparam o Instituto de Ciências Humanas (ICH) da PUC Minas. É a primeira ocupação de uma instituição de ensino privado no país. Segundo Pollyana Lage, uma das responsáveis pelo trabalho de comunicação da ocupação, o movimento é apartidário e em apoio às ocupações dos secundaristas e da UFMG. A reitoria da PUC apoiou o movimento, contanto que ele não interferisse no Enem. Pollyana esclareceu que a ocupação não pretendia atrapalhar o exame e nem as aulas na universidade. O Marco acompanhou as ocupações até o fechamento desta edição, no dia 3 de novembro. Marianne Fonseca
Estudantes são contra as reformas propostas pelo novo Governo
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CIDADE
Kalil terá que conquistar a população A descrença na política e a falta de representatividade ficam evidentes nos resultados das eleições municipais. Em BH, prefeito terá que buscar confiança do povo Cristino Melo 5º Período
A crise política brasileira finalmente chegou às urnas. A insatisfação dos cidadãos se refletiu na quantidade de votos brancos, nulos e abstenções, que foram recorde no segundo turno. Os números nacionais ainda não foram divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas algumas cidades têm estatísticas que assustam. Em Belo Horizonte, a soma de nulos, brancos e abstenções no primeiro turno chegou a superar os votos obtidos pelos dois primeiros colocados, juntos. Os 741.915 “não-votos” superaram os votos de João Leite (PSDB) e Alexandre Kalil (PHS) que juntos que somam 710.797 votos. Já no segundo turno, os “não-votos” em BH foram 642.050. Esses números só refletem o que as pesquisas nesse período eleitoral já identificaram: o protesto do eleitor. Em São Paulo (SP), por exemplo, a soma de ausentes, nulos e brancos chegou a 38,48%. Lá, o prefeito eleito, João Doria, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), alcançou 3,085 milhões de votos, enquanto 3,096 milhões de eleitores não escolheram candidato ou não votaram. Em outras nove capitais estaduais, as abstenções, votos nulos e brancos superaram a votação do primeiro colocado. Em pesquisa divul-
gada no último dia 6, a percentagem de rejeição é altíssima. Quase 50% dos entrevistados afirmaram que não votariam no candidato eleito, o ex-presidente do Atlético Mineiro, e pouco mais de 39% não votariam no seu oponente. Para os especialistas, Orion Teixeira, colunista político do Jornal “Hoje em Dia” e Nayla Lopes, mestre em ciência política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), esses resultados refletem o total descaso em relação à política e a descrença nos políticos. Além desses fatores ,mais óbvios, também apontam uma falta de liderança e de candidato que se destaque, como explica Nayla: “tivemos uma disputa sem candidato à reeleição e com menos tempo de campanha, o que reduz as informações circulantes sobre os postulantes e aumenta a incerteza do eleitor quanto à qualidade de alguma das alternativas disponíveis. Com muitos candidatos no primeiro turno e sem a polarização no segundo que se viu em 2012, entre Márcio Lacerda e Patrus Ananias, a apatia predominou.” Mesmo com os números assustadores do primeiro turno, os candidatos, no segundo não mudaram a sua forma de campanha: “João Leite concentrou sua campanha em falas negativas a respeito do oponente (o que não é nenhuma novidade em eleições, dado à
tendência de crescimento do adversário, como o que houve no segundo turno de 2008, por exemplo, e Alexandre Kalil seguiu reforçando seu caráter apolítico, apesar de ser filiado a um partido. O que eles têm em comum, é a necessidade que demonstraram ter de se desvincular de todas as maneiras da atual gestão de Marcio Lacerda, do PT e dos apoiadores controversos, como Aécio Neves e Marcelo Aro”, observou Nayla Lopes. A previsão de Teixeira de que os números da eleição do segundo turno seriam semelhantes aos do primeiro foi confirmada: “quem votou nulo e branco, ou abstenção, tende a ficar onde está, porque a insatisfação não mudou, ao contrário, foi ampliada.” SEM SAÍDA
Apesar de toda a insatisfação da população belo-horizontina, a realidade é que Alexandre Kalil irá governar a capital a partir de 2017. E para os especialistas é fundamental que ele conquiste a confiança do povo: “ele precisará demonstrar muita habilidade de diálogo e de negociação com os setores da sociedade que também não aderiram à sua candidatura”, diz Nayla. “Um prefeito deve governar para todos, e é bom que haja uma oposição ao governante para fiscalizar seu mandato e cobrar que se implementem políticas necessárias aos cidadãos”,
Amira Hissa
Kalil venceu o segundo turno com menos votos do que a soma de nulos, brancos e abstenções
observou. Toda essa falta de representatividade nas urnas acaba gerando um debate sobre o sistema eleitoral. Para Teixeira, deve acontecer uma reforma eleitoral: “acho que caminhamos para uma reforma que inclua o voto não-obrigatório; candidaturas avulsas (sem partidos); nova forma de financiamento eleitoral, além de mecanismos de maior controle e ética na política e na administração pública.” Já Nayla entende que é opção do eleitor, que vota em branco ou nulo, não influenciar no resultado da eleição. “Candidatos não faltam, tivemos onze postulantes a prefeito em 2016, em BH, e é de um otimismo ingênuo acreditar que, caso fossem mais candidatos, o eleitorado se entusiasmaria mais. As pessoas devem ter assegurado o direito de se abster mas, os que querem participar, Jacqueline Caixeta
através do voto em algum dos candidatos, também devem ter suas escolhas consideradas. As regras do jogo devem garantir o respeito ao resultado das urnas,” afirma. DESCRÉDITO
É fato que existe um descrédito em relação ao político no país. E para os especialistas, esse descrédito está resultando numa nova categoria de políticos. Nestas eleições “candidatos buscaram exatamente se dissociar da política, que ultimamente é tida como algo ainda mais pejorativo do que, habitualmente, já era visto no Brasil. Os candidatos ‘apolíticos’ ou ‘antipolíticos’, por mais que isso pareça contraditório para quem estuda ciência política, fazem mais sentido para o eleitor, cansado dos escândalos de corrupção”, explica Nayla. Já Teixeira é mais incisivo ao afimar que a
“vinculação da política à corrupção é algo que está muito cristalizado no conceito popular.” Existem vários riscos para esse descrédito nas forças políticas nacionais. Um deles é o de deixar este importante espaço aos oportunistas e desonestos. Tanto Orion Teixeira quanto Nayla Lopes observam que a retirada de uma presidente legalmente eleita, do poder, a prisão de senadores e deputados são acontecimentos que afetam a visão da politica pela juventude, bem como o crescimento da direita, a defesa da ditadura militar, retrocessos em vários setores, e avanços do preconceito, da homofobia, do racismo, da misoginia, da defesa da pena de morte. Contribuem também para o desencanto dos mais novos retrocessos legais como a redução da maioridade penal, dentre outras medidas consideradas reacionárias e fascistas.
Marco oficializa sua presença na história da mídia A Academia Mineira de Letras, dentro do 3º Ciclo de Conferências sobre a História da Mídia em Minas, que se realiza este ano, convidou a equipe do MARCO para uma palestra na Academia no dia 28 de outubro. O MARCO, que faz parte dessa história há
44 anos, oficializou, assim, sua presença neste cenário, com a narrativa de sua trajetoria na formação de novos profissionais do jornalismo. Foram abordados a estrutura do Marco, sua linha editorial, a composição da equipe e suas reportagens mais marcantes.
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5 ECONOMIA
Nova rodoviária é um terminal de incertezas Estofador e moradores estão preocupados com a falta de informações sobre a construção Guilherme Peixoto João Morais 1° e 6° Período
O novo Terminal Rodoviário de Belo Horizonte, localizado no bairro São Gabriel (Região Nordeste) com previsão de entrega no segundo semestre de 2017 fez com que muitos moradores da região tivessem que sair de suas casas para viabilizar a construção. No entanto, enquanto a obra segue devagar, permanece um clima de incerteza, entre os moradores, face ao escasso diálogo entre eles e as instituições municipais.
As tratativas em torno do novo terminal rodoviário começaram em 2008, ainda na gestão municipal de Fernando Pimentel. No entanto, o terreno só foi entregue pela Prefeitura ao Consórcio SPE, vencedor da licitação, em 29 de janeiro de 2016, após uma demorada limpeza do local. Além dos transtornos vividos pelos moradores, as invasões e desocupações estão diretamente ligadas ao principal motivo de atraso nas obras alegado pela atual administração: as disputas judiciais envolvendo os
imóveis do entorno. Esse é o caso do estofador Carlos Roberto Paulino, de 54 anos, proprietário de uma oficina localizada na Rua Jacuí, ao lado de sua antiga moradia. Paulino deixou de morar no local, antes mesmo do início da construção, mas, mesmo assim, acaba sofrendo com o impasse. Sem saber quando vai ter que fechar a oficina, ele não consegue planejar seu futuro. Tal situação se estende aos demais moradores do entorno da obra, que convivem, diariamente, com a incerteza. João Morais
Em meio a moradias e lojas fechadas, o estofador Carlos Roberto resiste na incerteza de um fim para as obras
Sem informações sobre o andamento dos trabalhos, restam as especulações sobre os rumos do projeto. O quadro se deve aos interesses imobiliários, críticas sobre a própria estrutura da região para receber tal empreendimento, e a busca por uma digna atenção das autoridades. Os moradores e comerciantes que convivem no dia a dia, no São Gabriel, afirmam que recebem poucas informações da Superinttendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) ou da Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel). OBRA COMEÇOU
Os primeiros sinais da construção, de fato, surgiram em agosto ultimo, quando se iniciaram os procedimentos para o nivelamento da área. Por meio de nota oficial, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) disse não se posicionar sobre casos particulares de desapropriação. Os proprietários que desejam connhecer a situação de seus imóveis devem se dirigir à Sudecap, para que abertura de protocolos individuais. Eles devem levar a escritura do imóvel ou o comprovante de IPTU, a partir de 2014. Até o momento, foram realizadas cerca de 270 desocupações para viabilizar o as obras do novo terminal e a expansão de vias.
Carlos Paulino, o estofador, diz também que, além de estar prejudicado com a lentidão das ações, suspeita que as máquinas parem agora, após as eleições. “Não acredito muito, não. Estou achando que é mais ‘caso’ de eleição. Até hoje, só deixaram dúvidas pra gente”. RISCO PREVISÍVEL
Com a chegada da época de chuvas, uma possível interrupção das obras poderia ocasionar mais transtornos e até acidentes, na região, já que não existem calçadas no caminho para a estação do metrô, e é grande o tropeço de pedestres. O ponto de ônibus localizado atrás da futura rodoviária é motivo de muita reclamação: falta de segurança, lama, exposição ao sol forte em dias de calor e a falta de iluminação artificial incomodam os usuários. A BHTrans já confirmou, depois de questionamentos da imprensa, a criação de pelo menos seis ruas e a remoção de uma “perna” da Rua Jacuí para o surgimento de um novo traçado. A PBH anunciou investimento de mais de R$ 40 milhões em desapropriações e remoções para o projeto e negou a existência de empecilhos físicos para a conclusão do terminal no fim do próximo ano. Os moradores, porém, duvidam.
Trabalho com detentas chama atenção no Minas Trend Estilista mantém confecção oferecendo trabalho a mulheres do sistema prisional de Minas Catarina Faria 3° Período
Na última edição do Minas Trend Preview, que aconteceu no Expominas em outubro, um desfile chamou atenção por sua originalidade: o da estilista da marca Doisellés, Raquel Guimarães, que trouxe para a passarela desta edição peças confeccionadas por detentos, homens e mulheres, e modelos que estão em prisão de segurança máxima. A marca mineira apresentou resultados do trabalho que vem desenvolvendo, desde 2008, com sentenciados de Minas Gerais, valendose de dispositivos da lei de execução penal, que permite o trabalho na prisão. “São
cerca de 40 prisioneiros homens e mulheres cujo trabalho contribui para melhorar sua auto estima ao aprender uma profissão. Assim, ao sair da prisão com experiência e capacidade de gerar renda, elas evitam a humilhação de tomar uma porta na cara por ser ex-detenta”, disse a estilista. Para ela, o ponto corrente do crochê, que eles fazem, tem um simbolismo para quem está no cárcere:abre portas ao invés de deter, reter entre grades. A grife teve como destaque, no desfile, a detenta Marcela Moreira Cagnani, vencedora do concurso Miss Prisional Minas Gerais 2016. Antes da sentença, Marcela trabalhou como modelo e desfilou para algumas marcas
mineiras. O sonho foi reacendido com o convite para desfilar da Doisélles. Marcela, que além de estrelar o desfile também trabalhou na produção das peças. A iniciativa faz parte do programa da Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap), para humanização do cumprimento da pena e ressocialização das pessoas. A Seap trouxe a proposta à estilista, que abraçou a ideia. “Eu não me relaciono com o criminoso; na oficina entra a pessoa e o preso fica do lado de fora. Para a sociedade ela está pagando por seu crime com a privação de liberdade; para mim eles são, apenas, trabalhadores”, diz Raquel. Outro aspecto da apresentação que chamou atenção
foi a trilha sonora, que fugiu da convencional batida eletrônica, dando espaço para a música “Ainda há tempo” do Criolo que estava no desfile, cantando os versos, “As pessoas não são más, elas só estão perdidas. Ainda há tempo”, diz a canção. A trilha sonora levou os
espectadores do desfile a refletir sobre a realidade prisional. As peças de tricô e crochê, marcas da moda mineira, muito pesadas e trabalhadas, ali ganharam beleza e fluidez ao contribuir para a divulgação de uma causa tão nobre uma apresentação surpreendente. Omar Freire
A esquerda, Miss Prisional Marcela Moreira ao lado de Raquel Guimarães
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CAMPUS
FCA sob nova direção
Bruna Curi Mike Faria 2º Período
Motivada. É assim que se sente a professora Claudia Siqueira, ao iniciar seu trabalho como a nova diretora da Faculdade de Comunicação e Artes da PUC-MG. “Eu gosto de gestão, do trabalho de gestão. Poder aliar isso à Comunicação, área pela qual sou apaixonada é muito bom, é um casamento gostoso, muito gratificante” disse ela. Claudia trabalha na PUC Minas há 16 anos, desde 2001, e aqui se sente confortável, pois a universidade é seu ambiente natural de trabalho. Sua trajetória começou como professora de Teoria da Comunicação e Introdução aos Estudos da Comunicação, em Arcos. De lá, ela foi trabalhar na PUC em Poços de Caldas e depois, veio para Belo Horizonte lecionar no campus do Coração Eucarístico. Seus trabalhos mais recentes foram como professora de de Teorias da Imagem e Semiótica, no curso de Relações Públicas, e como coordenadora da PUC TV e diretora da TV Horizonte. A motivação para ser diretora da FCA, escola que está comemorando 45 anos de existência, vem do trabalho com a comunicação, ou seja, algo “em que se age
A professora Cláudia Siqueira assume cargo de diretora da FCA após anos de trajétoria na PUC muito movido pelo afeto”. A paixão pela área, na qual se realiza, e a vontade de ter nova experiência no campo da gestão com o qual tanto se identifica e de que gosta, foi a combinação ideal que levou-a a aceitar a proposta de concorrer ao cargo de direção da FCA. Mas Cláudia não tem ilusões, sabe que o cargo é cheio de dificuldades, ainda mais em tempos de crise econômica e política. A universidade como um todo teve uma diminuição na demanda e é preciso ficar atento, para se prevenir e
antecipar algumas propostas alternativas. Segundo ela, uma é, por exemplo, a possibilidade de oferta de cursos livres no São Gabriel, que acaba sendo uma oportunidade para o corpo docente, para o crescimento da própria faculdade e de oferta para os próprios alunos. Observa, porém, que os desafios específicos são de toda gestão e é necessário ter coerência entre o que se diz e o que se faz. “Eu acho que o desafio é esse, ter paciência para poder exercer a direção da FCA dialogando com todos, uma forma que Flora Silberschneider
Cláudia credita à sua paixão pela àrea a motivação para se tornar diretora
eu considero como ideal”. A direção da FCA não vê problemas em dar continuidade aos projetos anteriores, ainda mais em se tratando de propostas bem sucedidas. ‘‘É necessário incentivar nossa atividade a crescer, levar para frente boas ideias e iniciativas, para nossa Escola ganhar uma dimensão ainda maior. O crédito sempre será dado a quem de direito: quem começou, viabilizou ou realizou’’. Os novos planos da professora Cláudia frente à FCA estão em andamento ou construção, em reunião mensal com as coordenações, já que as decisões mais importantes dela quer levar para o grupo e discuti-las. “Afinal, a faculdade não é só a direção, mas todos os que aqui trabalhamos”, explica ela. Além disso, uma comissão, designada por ela, vai se reunir toda semana para a construção do planejamento estratégico da FCA. Nela estão presentes representantes de todos os cursos e também do corpo técnico administrativo. As necessidades da FCA variam de acordo com cada realidade: Poços de Caldas,
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São Gabriel e Coração Eucarístico. Mas, para a professora Cláudia, o mais urgente é promover a integração de todos os cursos, pois nem todos se sentem parte da FCA e é preciso que essa situação mude. “Eu acho que aqui no Coração Eucarístico as pessoas se sentem, mas fora daqui nem todo mundo tem o sentimento de pertença a este universo, o que eu acho necessário”. As melhorias para os laboratórios também estão começando a ser pensadas. Já nesse ano, ela vai falar com o pró-reitor de infraestrutura para solicitar a compra de alguns equipamentos, mas ainda não sabe o que a universidade irá aprovar. ‘‘Toda a demanda foi feita pelos coordenadores dos laboratórios, já que cabe a eles identificar as prioridades setoriais’’. A proposta da nova direção da Faculdade de Comunicação e Artes é desenvolver uma gestão participativa, mais colaborativa, que pretende aproximar de forma mais ordenada aqueles que compõem a FCA. ‘‘Como tudo na vida, principalmente, na comunicação, nada se faz sozinho. Durante esses três anos que estarei aqui, eu entendo o papel da direção como o de um mediador, um mediador de processos construtivos.” Marianne Fonseca
Homenageado pelos alunos, funcionário se sente reconhecido Byanca Soares Madureira 1º Período
“Motivacional e gratificante”, é como o recepcionista da clínica de fisioterapia, Eduardo Bonfim Miranda, 28 anos, descreve sua experiência no trabalho. Com 8 anos de trabalho, ele é o funcionário mais antigo. Além de atuar na clínica, Eduardo também é professor de natação. Em convênio com o Sistema Único de Saúde (SUS), a clínica presta o serviço de fisioterapia e fonoaudiologia: “realizada a triagem no SUS, os pacientes são encaminhados para cada área de acordo com os critérios de uma divisão regional”. Além das vagas para pacientes encaminhados pelo SUS, a
clinica abre-se ao atendimento de alunos e funcionários. Na fisioterapia são 10 vagas: cinco no período da manhã e cinco no período da tarde. A clínica atende, em média, de 150 a 200 pessoas por dia, sendo a terça-feira o dia de maior movimento, quando pode exceder esse número. Eduardo fala do prazer de estar todos os dias com os pacientes.“Eles têm muito afeto comigo; interagem muito e demonstram isto de várias formas: por meio de um sorriso, um abraço, conversa e esses laços construídos vão além do campo profissional. O reconhecimento também vem dos alunos, que todo semestre, antes de se formarem, homenageiam um funcionário. Ele conta que já foi homenage-
ado seis vezes consecutivas. Miranda disse que, ali, às vezes ocorre um pequeno problema quanto ao prazo para a entrega de documentos: “eu preciso deles com urgência e às vezes isso dificulta.” Ele observa que o convívio com os fisioterapeutas e demais funcionários é uma chance enorme de aprendizado. “Outro ponto importante é o fato de aqui ser uma clínica escola, na qual alunos têm a oportunidade de ampliar conhecimentos técnicos e sobre o ser humano”, destaca Eduardo. Ele enfatiza o seu enorme prazer de trabalhar na clínica, onde conhece diferentes tipos de pessoas, de vários lugares, muitos até bem debilitados, e poder acompanhar a recuperação deles. “É algo único
Para Eduardo Bonfim , o trabalho oferece constante aprendizado
e muito bom. Realmente uma lição de vida. A força que eles têm e transmitem é motivacional, encantador e ao mesmo tempo admirável, pois mesmo diante dos problemas e das dificuldades, eles estão sempre sorrindo, felizes e vivenciar isso é algo que não tem preço.” A paciente da clínica, Dona Maria José, 80 anos, de Conselheiro Lafaiete, é atendida há seis meses, de 15 em 15 dias, e está satis-
feita comos serviços prestados. “Estou gostando muito e senti melhoras a cada dia. O atendimento é excelente,” afirmou. Hélio Francisco Neves de Freitas, 74 anos, também paciente e de Conselheiro Lafaiete, diz que iniciou o tratamento há dois anos. “O atendimento em geral prestado é muito bom. A professora Cintia que faz o meu acompanhamento, o médico e as duas turmas de alunos são ótimos.”
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CAMPUS
Museu da PUC Minas ganha prêmio Flora Silberschneider
Museu de Historia Natural vence disputa com 46% dos votos do público Ayana Braga 4º Período
O Museu de Ciências Naturais da PUC Minas recebeu o Prêmio de Melhor Museu das CidadesSede das Olimpíadas 2016. O Prêmio, conferido pela Upis (União Pioneira de Integração Social), instituição de ensino superior do Distrito Federal, está em sua 26º edição. Na categoria turismo, o museu da PUC e outros cinco estavam na disputa (Museu Náutico, na Bahia; Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro; Memorial JK, no Distrito Federal; Museu da Amazônia, no Amazonas e Museu do Futebol, em São Paulo). A votação foi feita pelo público e o primeiro colocado obteve mais de 46% dos votos. O professor Bonifácio Teixeira, coordenador do museu, disse que além de votarem, pesquisadores e amantes do museu mandavam cartas explicando o porquê de seu voto. Funcionando desde 1983, a instituição recebe mais de 60 mil pessoas por ano e tem uma das maiores coleções de paleontologia da América do Sul.
HISTÓRIA O curador do museu da PUC-MG, professor e paleontólogo Cástor Cartelle é um pesquisador respeitado internacionalmente. Nascido na Espanha, veio para o Brasil com 19 anos e formou-se em letras e filosofia. Chegou à PUC-MG, na década de 1970, para cursar ciências naturais. Ele sempre viajou muito por causa do seu trabalho, e o fato de o Brasil ser o país com a maior biodiversidade do mundo o atraiu de modo especial. Ao longo de sua vida, tornou-se um colecionador de objetos pré-históricos que testemunham a existência dos primeiros humanos sobre a Terra. Seu acervo está no museu que ele vê “como um presente não só para a Universidade ou para a cidade, mas para o país. Construímos aqui, um espaço que dá oportunidade ao direito à informação de todos”, comenta o professor. O que era uma sala, em 1983, debaixo de uma escada no prédio de Pedagogia virou um corredor, depois um galpão no prédio de Engenharia e, em 2002, com o financiamento de
uma empresa estatal, foi construído o prédio atual, que abriga mais de 70 mil fósseis. Cartelle destaca a coragem da Universidade de investir continuamente no maior projeto de extensão universitária e abri-lo ao público para “plantar a semente do interesse na população” pelo estudo do seu passado remoto. Em 1992, com o acervo do paleontólogo, houve uma mega exposição de arqueologia, espeleologia e paleontologia no Palácio das Artes. Foram cerca de 150 mil pessoas em 15 dias visitando a mostra; a maior que o local já recebeu até hoje. No início de 2013, um incêndio atingiu o museu e destruiu parte do acervo. Ele ficou fechado por 11 meses e, de acordo com o coordenador, a maior perda foram as 60 mil pessoas que deixaram de visitá-lo nesse período. Mesmo com esse infortúnio, a parte positiva foi a reforma geral que o Museu ganhou e que contou com a ajuda de mais de 150 pessoas, tanto na recuperação das peças quanto na reparação do lugar. O prédio atual tem três
Excursões trazem alunos de todas as idades para conhecer o acervo do museu andares e conta com exposições fixas e móveis. IMPORTÂNCIA O Museu de Ciências Naturais recebe pesquisadores do mundo todo e alunos de várias escolas e faculdades de Minas Gerais e do Brasil. Ele é um dos cartões de visita da Universidade não só pelo que expõe, como também pelo que faz nos bastidores. São mais de 60 alunos de graduação e pós-graduação envolvidos em projetos e pesquisas nos seus laboratórios. As pesquisas são
nas áreas de paleontologia, zoologia e conservação da natureza. O Prêmio recebido da Upis é um reconhecimento do trabalho do museu e uma ajuda na popularização da ciência e da informação. Vai ajudar na “plantação de raízes do conhecimento científico entre as pessoas”, disse Cartelle. Ele explica a importância do museu, em uma Universidade Católica: “a ciência e a religião andam sempre juntas; são ferramentas usadas por Deus para estar sempre presente”. Ele destaca o apoio in-
condicional da instituição a todos os setores e atividades científicas, educacionais e culturais desenvolvidos pelo museu. Hoje com 78 anos, o professor Cartelle gosta de olhar para trás e sentir que “tudo valeu a pena. Gosto de continuar olhando para frente por acreditar que vai continuar valendo a pena”. Seu sonho, nesses mais de 30 anos, após fundar o Museu de Ciências Naturais, é conseguir investimento para uma exposição completa sobre o “Fenômeno Humano”.
despreparo da universidade, quanto ao assunto, tanto dos alunos, quanto dos funcionários e professores. Ela explica que já ocorreram inúmeros casos de transfobia no ambiente universitário: “É completamente desumano. Você, ao negar o nome, está negando a humanidade de uma pessoa”. Outras universidades
da capital aprovaram medidas parecidas, como o Centro Universitário UNA, em abril, a Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), em maio, e a UFMG em julho de 2015. Mesmo reconhecendo a importância da decisão do MEC, as pessoas que utilizam o nome social condenam o fato de ele não poder figurar em documentos.
Larissa Magnavita Matheus Cassano Pollyana Sales 3º Período
O Conselho Nacional de Combate à Discriminação dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais aprovou um documento, em 2015, que orienta escolas e universidades a encamparem o nome social de travestis e transexuais nas salas de aula. A PUC Minas adotou a medida mas, um ano depois, ainda são grandes as dificuldades desses alunos para se sentir respeitados em relação à sua identidade de gênero. Segundo o decreto nº 8.727, de abril de 2016, nome social é a “designação pela qual a pessoa - travesti ou transexual - se identifica e é socialmente reconhecida”. Ele, também estipula que identidade de gênero é a “dimensão da identidade de uma pessoa que diz respeito à forma como se relaciona com as representações de masculinidade e feminilidade e como isso se traduz em sua prática social, sem guardar relação necessária com o sexo atri-
buído no nascimento”. O documento destinado às universidades e escolas assegura a permissão do uso do nome social nesses estabelecimentos. A medida visa resolver um problema sério: cerca de 82% das transexuais e travestis abandonam o ensino médio, entre os 14 e 18 anos, por constrangimento decorrente de seu desconforto em relação ao seu nome de registro. Apenas uma minoria chega à universidade. O nome social é uma forma de incentivar essas pessoas à escolarização e a se sentirem incluídas e respeitadas, uma vez que a discriminação é um dos principais motivos que levam esses cidadãos a abandonar a escola. Há mais de um ano, a PUC Minas adotou essa medida e, mesmo assim, pouco se fala sobre esse assunto. Ao conversar sobre isso com alunos na universidade nota-se que poucos têm informação sobre o que é nome social e tudo o que envolve essa medida. A falta de informação e divulgação do tema não contribui para que as situações de
discriminação e constrangimento diminuam, como é o objetivo. DIREITO Rita Elizabeth, estudante de história na PUC, lutava desde 2014 para conseguir usar seu nome social e chegou a organizar um grupo para fazer um abaixo-assinado. “Quando já estávamos com alguns milhares de assinaturas saiu a orientação do MEC e só aí a faculdade resolveu adotar o nome social. ” Rita conta que há muita burocracia e que a mudança é apenas no nome da chamada, o que para ela não é suficiente. “Até hoje, nos sistemas virtuais, eles tratam as pessoas trans pelo nome de registro, assim como em outros documentos.” A vice-reitora, professora Patrícia Bernardes, esclarece que no dia 30 de março de 2015, foi aprovada pela Reitoria a portaria 21/2015. Através dela, é possível que alunos transexuais usem seu nome social durante o processo de matrícula. Ela conta que a portaria foi adotada para
se criar um ambiente educacional mais confortável para todos os alunos da universidade. “Alguns professores prestavam atenção durante a chamada e respeitavam os alunos trans”, diz a vice-reitora. “Contudo, apenas essa atitude não era o suficiente para assegurar os direitos e bem-estar deles.” Por esse motivo, a reitoria entrou em diálogo com alguns professores e os alunos transexuais, em busca de soluções capazes de deixá-los mais confortáveis. Mas o Grupo Juntos, criado em 2011, acha que o “uso do nome social na PUC é uma cidadania de gambiarra”. O grupo existe como uma alternativa para a juventude se organizar coletivamente e lutar por suas demandas. Segundo seus militantes, a medida não é suficiente, pois “o nome aparece somente na chamada e o professor tem a opção de chamar ou não o aluno polo nome social.” Débora Miranda, que faz parte da direção estadual e municipal e é coordenadora do núcleo na PUC, diz que existe grande
Arte: Ana Clara e Laura Brand
Nome social poder ser usado na PUC
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CIDADE
Assaltos em ônibus são recorrentes Instalação de câmeras nos coletivos e uso de “kit de roubo” não diminuíram o número de furtos e roubos constantes no transporte público da cidade Ester Pinheiro 1° Período
Apesar de Belo Horizonte contar, desde o ano passado, com vigilantes nas estações do Move, com várias operações policiais nas ruas e quatro câmeras dentro dos ônibus, os roubos e furtos dentro dos coletivos são constantes. Motoristas, cobradores e passageiros têm reclamado da falta de segurança nos ônibus que circulam na cidade. Os usuários têm adotado um “kit roubo” para tentar enganar os assaltantes que contém produtos de segunda linha, enquanto os verdadeiros pertences dos passageiros ficam junto ao corpo em um porta-dólar. De acordo com a Secretaria do Estado de Defesa Social (Seds) houve um aumento de 81,7% no índice de assaltos este ano se comparado a 2015. Claudia Halley, estudante de enfermagem, conta que foi assaltada no primeiro semestre e que presenciou outro furto no ano passado. Segundo ela, na parte da manhã, o assaltante puxou seu celular, pela janela do ônibus da linha 4111, perto da avenida Afonso Pena. “E outra vez naquele mesmo lugar quase aconteceu o mesmo. Só que consegui puxar o celular antes”, conta. Já o roubo que ela presenciou ocorreu dentro de um ônibus da linha 51, pró-
ximo à estação do Hospital Belo Horizonte. Claudia lembra que, novamente, um homem puxou o celular do passageiro; só que, dessa vez, a vítima correu atrás do assaltante para tentar recuperar o aparelho. Ela diz que se sente impotente diante da criminalidade em BH. “Acho que precisaria de uma mudança de cultura, que é chamado, hoje, de cultura da paz. A educação e melhoria nas condições de vida também contribuem muito”, diz. Jorge Mansur era motorista da linha rodoviária de Itaúna para BH. Ele se aposentou e hoje é motorista de ônibus na grande BH. Há seis meses trabalha nas linhas 1730 e 1740, que circulam na região do Eldorado, em Contagem, no Barreiro e na Estação Diamante. Nesse curto período, o ônibus já foi assaltado duas vezes. “Eles pulam a roleta, sem pagar, e depois de um tempo pulam a roleta de novo já me abordando com uma arma”. Na segunda vez, uma arma foi apontada para seu rosto. Ao avistar um grupo de três jovens pular a roleta na região perto da estação do metrô Eldorado e, passados três minutos, mais dois homens fazerem o mesmo, Jorge comenta: “Viu? É tão repetitivo que pular a roleta não é mais novidade, mas a violência e os assaltos continuam assustan-
Marianne Fonseca
Passageiros ficam vulneráveis aos assaltantes tanto dentro dos veículos quanto nos pontos de ônibus do, porque eu não sei se ele vai atirar ou não”. Segundo o funcionário, a maioria dos assaltantes está sob efeito de drogas, entretanto, os infratores da lei, que pulam a roleta sem pagar, são cidadãos comuns e geralmente estão bem vestidos. “É preciso que os guardas municipais e policiais militares estejam nas proximidades dos pontos de ônibus”, comenta o motorista. Também é necessário menor burocracia para se fazer o boletim de ocorrência. “Nós queremos buscar nossos direitos, mas se às oito horas da noite eu faço o boletim, eu só saio da delegacia de madrugada.”
Soluções são pensadas Em relação às agressões ou ameaças durante os assaltos, como ocorreu com o motorista Jorge Mansur, a PM e a Setra-BH recomendam o imediato registro de ocorrência e a suspensão do serviço do ônibus no qual ocorreu o crime. Os passageiros, porém, querem uma prevenção para os assaltos que são recorrentes nos coletivos. Por isso uma grande parte dos usuários adotou o “kit roubo”, que consiste em celulares de modelo antigo e pouco dinheiro. Segundo a população, essa é uma forma de enganar os assaltantes e evitar a perda periódica de seu patrimônio. Entretanto, mesmo após a idéia do kit, os assaltos continuam a acontecer nos ônibus e a integridade dos passageiros não é garantida. Além desse “kit roubo”, o Movimento Passe Livre (MPL), em setembro deste ano, distribuiu um kit que vem com um informativo, um adesivo da campanha, além de um apito e alfinete de segurança (o
tipo usado para prender fraldas). Para o movimento, os assaltos e agressões no transporte público são constantes, como também o assédio às mulheres. O alfinete serve para afastar o assediador e o apito seria usado pela vítima para alertar os passageiros sobre o que está acontecendo. A PM desestimulou o uso do alfinete e orientou as vítimas a procurar as autoridades. Também afirmou que está intensificando a patrulha, principalmente nas áreas próximas às estações dos coletivos, mas os usuários afirmam que essa não é a solução. “Olha, é meio utópico, mas eu acho que polícia não adianta tanto porque naquela região da Praça Sete, por exemplo, sempre tem policial, mas continua tendo assalto. É muito rápido”, comenta a vítima Claudia Halley. “A solução seria uma mudança de investimentos governamentais, já que a educação é mais eficaz do que a punição”, conclui.
PREVENÇÃO Para o SetraBH (Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de BH), assaltos e furtos no interior dos ônibus do sistema de transporte coletivo urbano são um problema de segurança pública. Na busca da redução do problema, quatro câmeras foram instaladas em cerca de 3.000 veículos que circulam diariamente na cidade, para a identificação dos autores de práticas criminosas. Eles informam que os motoristas e passageiros são orientados a não reagir a assaltantes e a buscar auxílio junto à autoridade po-
licial ou guarda municipal. Dessa forma, tragédias como o caso da passageira do ônibus 7120, com destino à Betânia, que em agosto reagiu a um assalto e matou o criminoso com golpe de canivete no pescoço, seriam evitadas. O Sindicato relembra que o Consórcio Operacional do Transporte Coletivo de Passageiros por Ônibus do Município de Belo Horizonte (Transfácil) disponibiliza a aquisição do cartão BHBUS Usuário ao Portador. A iniciativa tem por finalidade reduzir a circulação de dinheiro a bordo e desestimular a ação de assaltantes.
Medo faz parte da rotina A médica Ingrid Matias abordada por um rapaz em um ponto de ônibus na Rua Espírito Santo, em 2011. Acredita que seus fones de ouvido podem ter chamado atenção. Ela, que já foi furtada duas vezes nos coletivos em BH, estava esperando um ônibus da linha 2104 quando o criminoso colocou a mão em seu bolso para pegar o celular. Ingrid se recusou e reagiu batendo no criminoso com sua bolsa. “Naquele momento de estresse, nós despersonalizamos, fugindo da nossa regra de conduta”, diz. Segundo ela, as pessoas que estavam no ponto não a ajudaram. Então, ela se afastou do assaltante, mas foi agredida e caiu no chão. Percebendo que poderia ser espancada, começou a gritar para os carros que passavam na rua. Mesmo no meio de uma corrida, um taxista a ouviu e parou para ajudá-la. Anos se passaram, mas esse assalto violento permanece em sua memória. “Fiquei muito tempo sem sair de casa à noite e sempre que ando na rua fico olhando pra trás”, conta. Com o intuito de inibir essas práticas criminosas, a Setra-BH afirma que
todas as agressões são registradas em Boletim de Ocorrência e os vídeos com registro de assaltos ou outras ações criminosas ou ilegais são entregues às autoridades policias, para a apuração das responsabilidades. Entretanto, o trabalho rotativo da policia, as câmeras dentro dos coletivos e os vigilantes nas estações do Move não têm trazido maior segurança à população. “Não me sinto nem um pouco mais segura”, completa a médica, que este ano presenciou vários assaltos na cidade. Segundo nota da BHTrans, a garantia de segurança pública é atribuição do Estado. No caso específico de ocorrências relativas a assaltos, os operadores do transporte são orientados a acionar a PM e lavrar um boletim de ocorrência. A PM garante que o patrulhamento em regiões próximas aos pontos está sendo intensificado, principalmente nas áreas onde há mais reclamações, como nas avenidas Nossa Senhora do Carmo e Cristiano Machado. Segundo a PM, um dificultador é a falta de registro imediato da ocorrência, por isso o ideal seria parar o ônibus e ligar para o 190.
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Angústia é sentimento comum Pessoas atingidas pelo desastre ambiental querem de volta seu passado: retomar memória e seu modo de vida Voal Fotografia / Jornal A Sirene
Flora Silberschneider, de Mariana (MG) 7º Período
“Não perdi uma casa de tijolos e paredes, mas história de vida”. Esta é a visão de Marino D’Ângelo, membro da Comissão de Paracatu de Baixo e ex-morador do distrito, que se emociona ao contar sua história após a tragédia. Teve parte da sua propriedade invadida pela lama e, sem poder retornar ao local, foi realocado em uma nova casa. Depois de alguns meses, com dificuldades, conseguiu receber o cartão de indenização da Samarco. Lembra que, próximo à sua casa, estava a de seu sogro, onde sua esposa nasceu e onde festejaram o casamento. Agora, debaixo de metros de rejeitos estão pessoas, animais, histórias, lembranças, rotinas e emoções. Um ano depois da lama da Barragem Fundão, da mineradora Samarco, cobrir e isolar distritos como Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, esperança já não é um sentimento muito presente na vida dos atingidos. Sem perspectivas para o futuro, Marino reclama que a empresa Samarco mede quem é ou não atingido apenas pela quantidade de coisas materiais perdidas. Hoje ele diz que luta para viver e retornar à rotina que tinha. Antes não conseguia conversar sobre o acontecimento por ficar muito emocionado e, agora, toma dois antidepres-
Dona Tita é uma das atingidas que não se acostumou com a nova cidade
sivos e faz tratamento psiquiátrico para poder compreender melhor a situação que vive, no momento, muito conturbada e cheia de incertezas. Na mesma situação, estão mais de 900 pessoas que ficaram desabrigadas e foram realocadas em Mariana após o derramamento de cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos da mineradora Samarco. A tragédia, que matou 19 pessoas aconteceu no dia 5 de novembro de 2015. Um ano após a tragédia, pouca coisa se resolveu e muitos outros problemas surgiram. O medo, a angústia e o receio do futuro são sentimentos comuns entre os atingidos. Agora, a vida deles se resume à leitura de processos, reuniões, ida aos fóruns, audiências públicas e readaptar-se a um novo ritmo da cidade de Maria-
na, que fica cerca de 50 km de distância de Bento Rodrigues, o primeiro distrito atingido pela lama. Logo após o rompimento da barragem, cerca de 4.000 voluntários acompanharam os atingidos, tanwto na questão judicial e de realojamento, quanto na questão de apoio psicológico e emocional, relembra o secretário de Desenvolvimento Social e Cidadania, João Paulo Paranhos. Ele explica que os problemas psico-sociais estão aparecendo agora. Incômodos como, por exemplo, a nova rotina, as novas casas, a distância dos familiares, vizinhos, dentre outros. A pergunta que mais se escuta das vítimas é “Quando vamos voltar?”, disse ele. Idosos e crianças, por natureza mais frágeis, são mais susce-
tíveis à apresentação de quadros psíquicos mais graves, explica o Coordenador da Rede Psico-Social de Mariana, Sérgio Rossi. No caso das crianças, é importante ter o cuidado no sentido de tentar “orientá-las e passarlhes uma segurança bem como estabelecer, o mais rápido, uma nova rotina de vida”. Rossi afirma que não existe um transtorno específico. Cada indivíduo está vivenciando uma situação que causa sofrimento e há diversas reações, o que pode gerar um adoecimento psíquico, como depressão, ansiedade, crises psicóticas, dentre outros. É preciso ter um olhar abrangente para tratar dos atingidos. “Não podemos cair num processo de patologização e medicação de um sofrimento que é inerente a esse processo”, observa. São diversas as histórias de pessoas que foram afetadas pela lama e estão encontrando novas maneiras para sobreviver. Para manter a memória sempre viva, um grupo de cidadãos criou o coletivo ‘Um minuto de Sirene’, que além de organizar protestos nas praças, manifestações mensais para não esquecer o ocorrido, produzem o jornal ‘A Sirene’. As matérias são pautadas e escritas pelos próprios moradores dos distritos atingidos, que contam histórias, dúvidas, resoluções, perspectivas futuras e esclarecimentos judiciais. Fernanda Trópia é membro do coletivo e conta que cada atingido está criando sua válvu-
la de escape para sobreviver dia a dia. Ela relembra da história de Dona Tita, que morava em Ponte do Gama, distrito que não foi afetado pela lama, mas isolado por ser área de risco. Já idosa, Dona Tita não conseguiu se acostumar à nova cidade e rotina. Por não conhecer Mariana, prefere ficar dentro de casa com medo de se perder. Para alegrar a mãe, seus filhos todo mês a levam para visitar o que restou da sua antiga casa em Ponte do Gama, passam o dia por lá revivendo memórias. O psicólogo Rossi esclarece que, ao longo da nossa vida, vamos estabelecendo relações afetivas com o lugar que vivemos. No caso dos moradores atingidos, toda memória afetiva foi construída na região que agora está coberta de lama. Para ele, o espaço não é só um território geográfico, é um território afetivo, de experiências de vida. Com a devastação desse local, as pessoas perderam essas referências, os vínculos e identidades. “Toda essa relação de pertencimento afetivo e simbólico fica fragilizado a partir desse processo de ruptura abrupta e traumática”, explica. A esperança de muitos moradores é a reconstrução da comunidade em outro local estimada para 2018. Para Rossi, esta data é muito distante e é possível que os moradores já tenham se acostumado a Mariana e realocá-los seja um novo impacto. Isto porque, de acordo com ele, muitos já teriam perdido a referência simbólica da comunidade anterior. Além disso, explica que, por não quererem lembrar-se da tragédia, alguns moradores negam o acontecido e procuram seguir a vida em outro lugar.
Hostilidade afeta a nova rotina O que os atingidos não podiam imaginar era que, ao perderem tudo e serem obrigados a mudar radicalmente suas vidas, iriam ainda sofrer preconceito e serem hostilizados pelos moradores de Mariana. É visível, em certos pontos da cidade, o incômodo de antigos moradores em relação aos “forasteiros”, que vieram das cidades atingidas pela lama. Mônica dos Santos, da comissão de Bento Rodrigues e ex-moradora do distrito, afirma que se assusta com coisas que escuta ao andar pela cidade. Relembra que na fila do supermercado, por exemplo, escutou frases como “a lama devia ter passado à noite para matar todo mundo e a Samarco não ter que ter trabalho”; “o que esse povo está reclamando? Antes moravam no meio do mato e agora estão com casa nova e recebendo dinheiro da Samarco”. Grupos foram criados com o intuito de receber os novos moradores e dar
apoio não só nas questões judiciais, mas também quanto aos problemas psicológicos. O Grupo Acolher é um deles. Através da iniciativa de psicólogos da rede municipal, reuniram professores, psicólogos, padres, entidades da sociedade civil dispostos a ajudar. O objetivo é trabalhar com a parcela da população já residente em Mariana através de fóruns, palestras, eventos, não apenas para discutir o preconceito, mas também para melhorar o acolhimento das pessoas da cidade aos atingidos. Silvany Diniz, que já era professora e ainda continua dando aula para os alunos de Bento Rodrigues, é membro do Grupo Acolher e ressalta que uma das razões para a hostilidade é econômica. Para ela, a cidade depende da Samarco que, com a tragédia, teve muitas de suas atividades paradas e setores fechados. Demissões aconteceram e a insegurança no comércio e na prefeitura deixou a po-
pulação aflita. “Geralmente as pessoas mais preconceituosas são as que não conhecem direito a situação e estão sendo prejudicadas por outro lado; procuram um bode expiatório e resolveram colocar justamente a comunidade atingida como responsável. É uma forma de fuga”, explica. Silvany conta que, há três meses, os alunos de Bento foram descriminados: um abaixo assinado correu pela cidade pedindo que eles fossem retirados da escola. De acordo com ela, nada passou de um mal entendido entre os moradores de Mariana e as ações da escola mas, mesmo o documento não tendo resultado em nada, a repercussão foi grande e afetou diretamente as crianças. O incômodo entre eles foi tanto que os alunos de Bento não queriam mais estudar lá e até chegaram a procurar outro prédio para montarem uma nova escola. O trabalho do Acolher, neste caso, foi dis-
Voal Fotografia / Jornal A Sirene
cutir com os alunos que sair do prédio não ia resolver a situação. “É preciso fazer um trabalho antes com o lugar, se não, não adianta”, enfatiza Silvany. SAÚDE Para o acompanhamento direto dos moradores atingidos pela lama, o município tem trabalhado, via Secretária de Saúde, com profissionais que prestam serviço à população, avaliam, identificam e fazem atendimentos direcionados a eles. O Centro de Referência Especializado de Atendimento Social (Creas), em parceria com o governo do Estado, surgiu da demanda de assistência e apoio continuados aos atingidos, em todos os âmbitos. Ainda em estruturação, o Centro contará com equipe de dois assistentes sociais, dois psicólogos e um advogado para dar assistência às famílias que sofrem com a incerteza do futuro, explica o Secretário de Desenvolvi-
Reuniões frequentes sem resultado frustram as pessoas mento Social e Cidadania, João Paulo Paranhos. O Coordenador da Rede Psico-Social de Mariana, Sérgio Rossi, explica que todas as ações de atendimento da rede de saúde mental acontecem no SUS local (Sistema Único de Saúde). “O município tem dado apoio porque isto faz parte da política de saúde, mas é claro que não estamos preparados para esse tipo de situação. Muitas coisas têm que ser pensadas, desenvolvidas, articuladas”, observa. Olhando para o futuro próximo, os ânimos estão baixos. De acordo com
Mônica, os atingidos estão ficando descrentes e já não participam ativamente das manifestações e audiências. Para ela, a união da hostilidade local com a falta de ação da empresa está levando-os ao desânimo de lutar por algo melhor. “Se com 11 meses não se resolveu praticamente nada em relação à empresa, não espero nada para 2017”. Já Silvany enfatiza que é bom lembrar aos moradores da cidade que a população dos distritos afetados já era marianense e continua sendo; logo, a cidade de Mariana também lhes pertence.
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BAIRRO JOÃO PINHEIRO
Imóveis permanecem interditados Após mais de um mês, a COPASA não tem informações sobre o motivo do vazamento que causou graves problemas a lojas, casas e estabelecimentos comerciais Tamiris Ciríaco 7° Período
No bairro João Pinheiro, na região Noroeste de Belo Horizonte, duas casas e três estabelecimentos comerciais foram interditados na Rua Frei Luiz de Souza após danos causados por um vazamento na rede de água da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA), no início do mês
de setembro. Após o incidente, o muro entre duas casas atingidas começou a rachar, bem como a fachada de uma delas, evidenciando risco de queda. Além disso, a rua cedeu cerca de cinco centímetros fazendo com que as famílias fossem retiradas de suas moradias. Elas receberam assistência da COPASA e foram levadas para ho-
téis, com hospedagem garantida por conta da empresa. Segundo nota da assessoria de imprensa da COPASA, ainda é preciso aguardar a conclusão do laudo pericial para informar a causa específica do problema. Das duas famílias que tiveram seus imóveis atingidos, apenas uma delas retornou para a casa. Roseli Cardoso Julio, moradora do Flora Silbershneider
Cesar Augusto Mendes é um dos afetados que, até hoje, não teve retorno da Copasa
número 311, foi bastante prejudicada. Além de ficar fora de casa durante quase um mês, teve que fechar seu salão de beleza que funciona no mesmo local. Com o lugar interditado a moradora precisou atender seus clientes em domicílio. PROBLEMA SÉRIO
O incidente ocorreu no dia 5 de setembro. Naquela noite, Roseli e sua família foram para casa de familiares e no dia seguinte para o hotel onde ficaram hospedados durante 23 dias. Mesmo de volta para casa e com o salão funcionando, Roseli ainda não está completamente acomodada. Os serviços no salão foram prejudicados e o movimento ainda está menor comparado ao que era antes. “As obras afetaram o movimento.
Ficou sem jeito para as clientes entrarem. Hoje que eles fizeram essa abertura aí para mim. Nós estávamos passando pelo lote”, explicou a moradora. Outra pessoa prejudicada foi o cabeleireiro Éder Jesus da Silva. Ele tem um salão há 16 anos e ficou parado sem poder trabalhar durante 15 dias. Todos os seus pertences de trabalho ficaram presos na loja por uma semana. Com o incidente, metade do local foi quebrado, não há previsão de indenização para os lojistas e nenhuma assistência foi dada, segundo o proprietário do salão. Éder da Silva precisou encontrar outro local para continuar sua atividade e, agora, mudou-se para uma loja que tem um custo de aluguel menor. Entretanto, o espaço também é reduzido, com desvantagem.
3º Período
Passear com os cães pode ter consequências positivas tanto para a saúde dos animais quando para seus tutores já que, através da prática da atividade física, pode-se ter melhor qualidade de vida para ambos. O problema é quando as fezes dos animais não são devidamente recolhidas e descartadas, deixando calçadas e ruas e preças sujas, trazendo risco tanto para a saúde das pessoas quanto para o próprio animal. Moradores do bairro Coração Eucarístico reclamam da sujeira nas ruas, especialmente da quantidade de fezes de cachorro nas calçadas, o que põe à prova o artigo 70 da Lei Municipal 10.534, aprovada em setembro de 2012,. Ela dispões sobre a limpeza urbana, os serviços e o manejo de resíduos sólidos em Belo Horizonte. “O proprietário, responsável ou o condutor de animal deverá proceder à limpeza, acondicionamento e
remoção imediata dos dejetos do animal depositados em logradouro público, mesmo que esteja sem guia ou coleira”. De acordo com as normas técnicas da Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), os dejetos de animais devem ser descartados na rede primária do sistema de esgoto sanitário local ou encaminhados, quando devidamente acondicionados, ao serviço regular de coleta e transporte de resíduos sólidos domiciliares. A multa prevista caso ocorra uma infração é de R$ 790,00. Talita Caixeta, 22, estudante de engenharia elétrica e moradora do bairro Coração Eucarístico, passeia com seu cachorro de duas a três vezes ao dia. Ela afirma que no caminho encontra fezes pelas ruas, mas que sempre carrega uma sacola para recolher e descartar adequadamente as do seu cão. “Esse hábito é uma questão de educação e responsabilidade coletiva e não de acesso à sacola. Eu sei que o Nestor pode fazer cocô no passeio então sempre levo uma sacola. O máximo que
O fechamento do quarteirão durou mais ou menos 30 dias; assim, não só os proprietários dos imóveis atingidos foram prejudicados como também outros lojistas ao redor. A comerciante Eliana Maria Orlando tem sua loja há 11 meses e conta que, com fechamento da rua, o movimento diminuiu bastante e, com a retirada do ponto de ônibus, quase ninguém passava pelo local. “Depois desse tempo de 30 dias eles liberaram a rua, voltaram o ponto de ônibus pra cá. Aí que começou a melhorar um pouco o comércio aqui. Nesse tempo interditado o comércio foi quase a zero”, explicou a comerciante que disse ter ficado bastante ilhada, com o acontecimento, e dessa forma, perdeu muitas vendas. Arte: Laura Brand
Fezes de cães em ruas e praças são risco à saúde da população Anabella Mendes Natália Alves
PREJUIZO GERAL
pode acontecer é ele não fazer e não precisar,” afirma. Outra moradora do bairro, que também reclama da presença das fezes, é Sandra Gomes, funcionária da Prefeitura, que passeia todos os dias com seus quatro cachorros. “Fico muito chateada. As pessoas acham que não precisam recolher, passeiam com o cachorro, ele faz cocô e elas vão embora; acham que é normal.” Afirma que faz questão de levar mais sacolas do que o necessário para garantir-se. DOENÇAS TRANSMITIDAS
A veterinária Márcia Nascimento explica que as fezes podem conter vírus e bactérias e levar à contaminação tanto dos animais, em vista de seu comportamento, quanto das pessoas. “No caso dos animais eles podem pisar no cocô ou em grama contaminada e lamber as patinhas. Por outro lado, uma criança que tenha costume de brincar em parquinho, no chão, pode pegar ou colocar a mão no sapato e levar a mão à boca e se conta-
minar”. As fezes espalhadas em locais públicos podem transmitir aos seres humanos, verminoses e giardíase e leptospirose. Além disso, quando descartadas inadequadamente, atraem moscas que podem participar da contaminação direta de alimentos e da água.
No caso dos animais, um número maior de doenças pode ser transmitido através das fezes. Márcia alerta que podemos ingerir acidentalmente esses dejetos em atitudes comuns no dia a dia. Em práticas como sentar na rua ou beirada de calçada.
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CULTURA
Grafite embeleza e resgata espaços públicos da cidade Em muitos espaços da capital é possível perceber a influência da arte dos grafiteiros na humanização de sua paisagem Gabriele Rosa 4º Período
Ao andar pela região central, bairros e favelas de Belo Horizonte é comum encontrar espaços públicos ocupados pelo grafite, arte urbana que, há anos, tem transformado e revitalizado a paisagem da cidade. Locais que antes estavam degradados, tornaram-se ambientes agradáveis para encontros e atividades ao ar livre, pelas mãos de artistas plásticos que fazem das paredes em ruas suas telas. Na maioria das vezes, essas manifestações artísticas convidam o cidadão à reflexão sobre assuntos contemporâneos, funcionando como um canal de comunicação com o grande público, capaz de gerar inúmeros impactos sociais e políticos na sociedade. O artista plástico Alexandre Rato, formado pela Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), diz que o grafite exerce várias funções e, como arte, anda na contramão do que é imposto à sociedade, disputando espaço com a propaganda e a publicidade. “O ser humano não pode se reduzir a um mero consumidor sem senso crítico, nem abrir mão dos seus ideais; caso contrário estaria se rebaixando
Priscila Amoni
à condição de animal irracional, sem amor, sem sentimentos nobres e sonhos”. Ele acrescenta que o grafite estimula a imaginação e a reflexão sobre os mais diversos assuntos. “Alguns artistas urbanos trabalham com a perspectiva do ativismo e protesto, priorizando mensagem críticas em suas obras”, explica o artista. Ele tem várias obras espalhadas pela cidade, algumas nos bairros Santa Tereza, Funcionários, Centro e Pampulha.
HISTÓRIA
EMBATES
Trabalhar fazendo arte nas ruas não é uma tarefa fácil; são vários os obstáculos enfrentados pelas pessoas que têm a iniciativa e querem deixar de forma positiva suas marcas pela cidade. Segundo Priscila Amoni, mestre em pintura pela Universidade de Lisboa e autora de pinturas espalhadas por locais como a rua Niquelina, Aglomerado da Serra e região da Favelinha, as pessoas enfrentam diversos desafios no dia a dia. “O principal e rotineiro empecilho que encontramos na nossa trajetória é o embate com o poder público para conquistar ou não o espaço de rua”. Priscila iniciou suas Marianne Fonseca
Os grafites podem mudar um ambiente antes hostilizado
intervenções urbanas em 2013, durante o período das manifestações populares e, desde então, vem pintando nas ruas. O grafite reúne elevado número de seguidores que aprovam a modalidade e incentivam a sua popularização nos territórios públicos. O estudante de psicologia, Luís Santos, que aprecia a arte, destaca o trabalho honesto e criativo de artis-
Flora Silberschneider
“Eu enxergo a cidade ainda com muitas barreiras, invisíveis. Barreiras para onde você pode e não pode ir, como você pode ou não estar.” Essa é a visão do MC Thiago Monge, um dos palestrantes da Oficina Rima e Beat, da quarta edição do Fica 13, Festival de Comunicação e Artes. O Fica 13, este ano com o tema “Comunicação e Narrativas da Vida Urbana: Olhares e Conflitos”, aconteceu nos dias 5 e 6 de outubro na PUC. Palestras e oficinas relacionados à vida urbana foram o ponto principal do evento que envolveu toda a comunidade da Faculdade de Comunicação e Artes. Monge faz parte da organização do duelo de MCs que acontece, periodicamente, no Viaduto Santa Tereza, em Belo Horizonte. MÚSICA
O Diretório Acadêmico do prédio 13 virou espaço para oficinas de grafite
tas que se comprometem com a sociedade, mesmo sem nenhum lucro, na maioria das vezes. “No caminho para o trabalho e para faculdade me distraio observando e refletindo sob o estímulo dos grafites que vejo. Existem muitos artistas bons na cidade, que se dispõem a dar o melhor para pessoas que nem conhecem. Grafitar é sem dúvida um ato de doação ao próximo sem
A história do grafite, no Brasil, inicia-se na década de 1970, em São Paulo, durante um período marcado pela censura da ditadura militar. Esta arte surge na cultura brasileira com a linguagem da rua, dentro da marginalidade, por meio dos que não faziam questão de seguir cânones pré-estabelecidos nem pediam licença para marcar as cidades com seus pensamentos e revolta gerando, dessa forma, incômodo na sociedade. A partir disso, grafitar se transformou em um importante meio de comunicação urbano, entre as vozes anônimas que gritavam suas mensagens. Desde os anos 70, os grafiteiros se apropriaram dos espaços públicos, transmitindo mensagens de carácter político, social, cultural e artístico. Mais do que uma linguagem artística, -o grafite também é importante instrumento de protesto e de transgressão dos valores estabelecidos.
Olhares diversos sobre a cidade Redação
MC Matéria Prima foi um dos artistas a participar das intervenções culturais
ganhar nada em troca, a não ser a admiração e respeito de pessoas assim como eu”, comenta.
Para Thiago Monge os duelos de MCs são uma forma de ocupação do espaço público em BH, apesar de todas as barreiras. “É um processo bem difícil na verdade, porque o Estado ainda não aceita, não topa e reprime absurdamente manifestações do povo”, desabafa. Houve tentativas de acabar com o duelo de MCs, mas
a alta participação do público nesses eventos impediu que isso acontecesse. “A gente bateu no peito e falou assim: não vai acabar”, conta. Já o outro MC, Thiago Augusto, conhecido como Matéria Prima, acredita que BH tem-se tornado um “ambiente cultural efervescente”. Ele que se apresentou também no segundo dia do Fica 13, defende a importância de estilos marginalizados, como o rap, para quebrar alguns estereótipos: “As pessoas têm uma ideia muito restrita do que o rap se trata”. Matéria Prima apresenta o programa “Rimas e Recortes” na rádio Inconfidência e considera esse espaço uma conquista muito grande. A rádio saiu do tradicional e abriu horário para o hip hop. “Todos os veículos de comunicação que falam de rap são marginalizados; agora a gente tem esse espaço e vai trazer, para dentro dele, um conteúdo capaz de fazer com que as pessoas pensem diferente e se questionem sobre porque esse gênero é marginalizado”. FOTOGRAFIA Alexandre Lopes é professor de fotografia da Fumec e retratista e ministrou a Oficina de
Retratos Analógicos. Para ele, BH tem um grande potencial: “Temos grandes fotógrafos aqui e gente cada dia aparecendo com uma produção muito instigante.” Disse que a nova geração de fotógrafos ocupa os espaços da cidade de forma alternativa e que promove cada vez mais o acesso à esta arte tão popular entre nós.” Para ele, “uma maneira de fazer uma fotografia diferente é ocupar espaços marginais para instigar pessoas da periferia a produzirem também e levar a produção delas ao conhecimento de outras pessoas”. DANÇA Uma das oficinas mais esperadas pelos alunos foi a de Dança Urbana, ministrada por Raquel Cabaneco. Ela diz que apesar da dança urbana ser mais descontraída, também exige técnica: “Mais livre, a pessoa pode criar sempre coisas novas em cima dos passos”. A dança urbana mistura hip hop, reggae, samba, entre outros ritmos. Sobre sua missão, Raquel diz que é levar arte e cultura para as ruas. “Ainda existe muita criminalidade e falta de informação. Quero levar arte e beleza para aqueles que estão à margem”.
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SAÚDE
Usar anticoncepcionais traz vantagens e riscos Médicos aconselham mulheres a consultar um ginecologista antes de usar algum método contraceptivo Bruna Leão 3º Período
Os anticoncepcionais hormonais estão sendo alvo de críticas e questionamentos nas redes sociais, sob o alerta de gerarem efeitos colaterais, como o desencadeamento de doenças, mesmo quando usados sob prescrição médica. Indicados geralmente como método fácil para
evitar filhos, os anticoncepcionais hormonais também podem ser prescritos com as finalidades de reduzir cólica menstrual, diminuir o fluxo menstrual, reduzir a perda do sangue menstrual, tratar a TPM (Tensão Pré Menstrual), regularizar ciclos menstruais e até paramelhorar a pele. Mas eles podem apresentar riscos e desvantagens, como a ocorrência de Ana Clara Carvalho
trombose. O dr. Agnaldo Lopes, médico ginecologista e obstetra, presidente da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais (Sogimig), explica que o uso de anticoncepcional (pílula) combinado com dois hormônios, o estrógeno e a progesterona, pode contribuir para a trombose. Mas observa que é uma complicação rara, embora potencialmente grave. “O risco de uma mulher jovem não usuária de anticoncepcional ter uma trombose é de cinco a cada 10.000 mulheres. Entre as que tomam pílulas, o risco é de dez a cada 10.000 e pós parto ou durante a gravidez é de 30 a cada 10.000 mulheres”. ALERTA
Devido ao uso dos rémedios, Maria teve embolia pulmonar
A página no Facebook, ‘Um veneno chamado anticoncepcional’, criada pela gaúcha Daniela Ayub, formada em direito, ajuda vítimas e propõe lei para prevenir doenças decorrentes disso. A ideia surgiu depois de ser diagnosticada com trombose venosa e embolia
pulmonar devido ao uso de anticoncepcional. Daniela defende a aprovação de uma lei que obrigue a realização de exames prévios de trombofilia e doenças autoimunes, ao ser prescrito o método contraceptivo hormonal. Para ela, a medida é necessaria pois existem casos de morte entre mulheres que não sabiam ser propensas a esse tipo de doença. De acordo com dr. Agnaldo Lopes, a Organização Mundial de Saúde (OMS) não recomenda a realização de testes genéticos para o uso de anticoncepcional hormonal, já que isso pode ser feito através da avaliação aprofundada do histórico da paciente. O médico pode verificar e explicar os melhores métodos para a paciente e quais as vantagens e desvantagens de cada um. A deputada federal Jô Moraes (PCdoB) afirma que o método contraceptivo é um direito universal e fundamental das mulheres, mas é necessario o conhecimento e o acesso à infor-
mação para que seja feita uma escolha com autonomia. Segundo ela, “há um desconhecimento, a falta de acesso aos métodos contraceptivos, falta de políticas públicas e até mesmo de legislação”. Ela acredita que deputados federais podem apresentar um projeto de lei determinando que a prescrição de anticoncepcional seja feita por ginecologista e antecedida de exames. ADVERSIDADES Maria Luisa Carvalho,
mora em Contagem e sofreu embolia pulmonar; uma amiga teve trombose na perna. Ela utilizou o Dianne 35 por seis meses e não pode mais tomar o u tro contraceptivo hormonal. No caso dela, o risco é de morte. O objetivo era regularizar seu ciclo menstrual e melhorar a pele. Ela não sabe se há um exame anterior ao uso do anticoncepcional capaz de prevenir efeitos colaterais, já que cada mulher pode apresentar reações diferentes e em tempos diferentes.
Métodos Alternativos Existem outras formas de contracepção fora as diferentes pílulas hormonais, mas a escolha do melhor método, para cada mulher, deve ser feita sob orientação médica, após a discussão e avaliação das suas necessidades e preferencias. A camisinha, por exemplo, é um método contraceptivo, também eficiente na proteção contra doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), acessível, e para o qual não há contraindicação. O dispositivo intrauterino (DIU) feito de cobre, fica dentro do útero e pode proteger a mulher de cinco a
dez anos; é um método também reversível. Ligadura de trompas ou laqueadura é uma cirurgia para a esterilização que pode ser realizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Somente são indicadas mulheres acima de 25 anos, que já tenham, ao menos, dois filhos vivos, já que não é reversível. Já o diafragma é um anel flexível envolvido por uma borracha fina, que impede a entrada dos espermatozoides no útero. Vasectomia é uma pequena cirurgia, no homem, de esterilização definitiva. Por isso, ele deve ter certeza de que nunca mais quer ter filhos.
Vicio em remédios pode ser um passo para dependência Ana Laura Alcântara Laís Politi 2° Período
Considerada uma doença urbana, a dependência de remédios está se tornando cada vez mais comum entre pessoas acostumadas ao uso indisciplinado da medicação para fins específicos. Classifica-se como dependente de medicamentos quem sofre grave desconforto em abstinência, ou seja, quando não toma determinado remédio, vê cair sua qualidade de vida. A sensação de bem-estar leva muitas pessoas a tomar, assiduamente, medicamentos que causam vício e sérios danos à saúde. Os benzodiazepínicos, drogas hipnóticas e ansiolíticas, conhecidas popularmente como Benzepan ou Rivotril, são os principais da lista. Eles têm o intuito de ajudar a dormir e ainda proporcionar relaxamento físico. O diagnóstico da dependência medicamentosa é difícil e só é possível perceber suas reações adversas quando o paciente suspende as dosagens. A doutora em farmacologia, Virgínia
Vidigal, afirma: “Quando o paciente é farmacodependente, ao suspender a droga, ele tem a síndrome de abstinência que gera irritabilidade, insônia, estresse e mal-estar. Essa síndrome é um dos principais sintomas”. TRATAMENTO
“O tratamento depende de cada paciente e do tipo do medicamento e se dá através de substituições e/ou retiradas graduais. O paciente deve consultar seu médico e pedir a diminuição das dosagens ou um fármaco mais fraco até seu organismo se adaptar à falta da droga”, explica a dra. Virgínia. É comum equiparar-se o hipocondríaco ao “viciado em remédio”, porém há distinção entre eles. A hipocondria é simplesmente a mania de tomar remédios em qualquer situação. “Sempre que tenho um principio de dor de cabeça já tomo algum analgésico. É inevitável, tenho essa mania em todas as situações independente do problema”, relata a estudante L.S.P., de 19 anos. Quando
se trata do dependente, a situação é bem mais delicada. A dependência é um estado total de subordinação e o sujeito tem sérias complicações desde o diagnóstico até o tratamento. A aluna L.A., de 20 anos, relata que era dependente da Paroxetina, um antidepressivo inibidor seletivo da recaptação da serotonina. “Por muito tempo a medicação me fez bem. Eu só me dei conta de que estava dependente quando o remédio acabou pela primeira vez. Aí começaram as tonturas, o enjoo, a sensação de mudança de temperatura brusca, os pensamentos ruins, pesadelos e ansiedade. Até comprar outra cartela, já sentia como se meu corpo não conseguisse funcionar sem aquilo”, relata a aluna. Ela diz que há duas semanas iniciou o tratamento com seu médico e, desde então, não tomou mais o remédio. “Atualmente me considero livre. O remédio já não tinha mais efeito. Meu médico já tinha reduzido a dosagem máxima para a mínima. Eu tomava a dose máxima de 80mg,
Marianne Fonseca
As drogas hipnóticas e ansiolíticas são as que mais causam dependência e danos à saúde por volta de 4 comprimidos,” informa a estudante. ALTERNATIVAS
Consideradas como sistema medicinal alternativo, a fitoterapia e a homeopatia são dois métodos naturais considerados semelhantes. Porém, se diferenciam pelas técnicas terapêuticas e os elementos utilizados. A fitoterapia foi desenvolvida com o uso de plantas para tratar ou curar doenças. Já a homeopatia possibilita o equilíbrio das energias reguladoras da
saúde do paciente, através de substâncias diluídas e do uso de elementos de origem mineral ou animal. Entretanto, a homeopatia busca tratar o doente e não a doença, modificando-o de dentro para fora. Já o tratamento fitoterápico se baseia nos princípios contrários, buscando suprimir os sintomas das doenças com substancias naturais que atuem contra eles. No entanto, a grande diferença entre os dois é a dependência. Como os medicamentos utilizados na
fitoterapia podem ser manipulados ou encontrados em farmácias, podem viciar o paciente dependendo da frequência e quantidade ingerida enquanto o tratamento homeopático, com fármacos fracos, tem risco de vício menor. Apesar de ter origem natural, os medicamentos homeopáticos e fitoterápicos podem ter efeitos colaterais, se consumidos em excesso. Portanto, é aconselhável consultar um profissional antes de se automedicar.
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SAÚDE
Arte: NEP
Giulia Staar Anna Luiza Machado 4° e 3° Períodos
O que sustenta uma vida? As ligações que o ser humano mantém com o mundo definem sua existência. Entretanto, essas ligações podem se romper. O fim da vida é um assunto delicado, principalmente quando se trata da escolha por alguns de abreviar o seu sofrimento, optando pela eutanásia. Trata-se de um tema sensível e de complexas conotações éticas e morais. O conhecimento sobre as implicações da eutanásia ainda é incipiente no país. Neste ano, o debate foi acalorado. Em agosto o caso da belga Marieke Vervoort, atleta paralímpica e medalhista nos jogos do Rio 2016, impressionou o mundo. Ela assinou a documentação para submeterse à eutanásia, caso um dia opte por isso. A atleta tem a metade inferior do corpo paralisado, a visão reduzida a 20% e dores no corpo que prejudicam seu sono à noite. No mesmo mês, a norte -americana Erika Bolen, de 14 anos, tomou a decisão de fazer a eutanásia. A garota passou a sua infância lidanArte: Laura Brand
Questão divide opiniões entre sofrimento e uma boa morte O procedimento polêmico coloca em pauta principios éticos e humanitários na sociedade brasileira do com os efeitos da atrofia muscular espinhal, uma doença degenerativa, sem cura. A situação chamou atenção por sua pouca idade. Casos como esses são cada vez mais comuns na sociedade e trazem dilemas éticos e religiosos que conduzem à reflexão sobre o fim da existência humana. Estes dilemas foram ilustrados, recentemente, no filme de sucesso “Como eu era antes de você” e na minissérie da TV Globo “Justiça”. A palavra eutanásia, significa a morte calma, a morte boa, a morte humanitária. Caracteriza-se como o ato de proporcionar morte sem sofrimento a um paciente em estado terminal ou que esteja sujeito a dores insuportáveis, sejam físicas ou psíquicas. A ideia base defendida é a de que todo ser humano tem direito de pôr fim à sua própria vida, de ter uma morte digna. LEGISLAÇÃO No Brasil essa prática é proibida por lei e capitulada como crime de homicídio. De acordo com o Código Penal, quem causa a morte de um doente, mesmo que a pedido dele, fica sujeito a julgamento por juri popular; sua pena pode ser de 6 até 20 anos de prisão. Diferentemente do Brasil, países como Holanda, Suíça e Bélgica admitem a eutanásia como direito legalmente previsto. As exigências para sua realização variam de país para país, mas a maioria das legislações prevê um documento assinado voluntariamente pelo paciente. Além disso, deve-se provar que ele está sofrendo dores fortes irreversíveis, com laudos comprobatórios de psicólogos, médicos e avaliações de juízes. A professora de psicologia da PUC Minas, Eliana Ferreira, explica que o procedimento da eutanásia pode ser passivo ou ativo. A eutanásia ativa é quando há o auxílio ou ação de outra pessoa, que por meio de um
processo específico promova o cessar das atividades vitais do paciente. Já a eutanásia passiva, conhecida principalmente como ortotanásia (ou morte correta) é quando os médicos param os tratamentos do paciente e deixam que a morte venha naturalmente. Esta é uma prática que não consta na lei, mas é permitida no país por uma resolução do Conselho Federal de Medicina. Segundo a resolução (n° 1.805/2006), “na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindolhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, respeitando a vontade do paciente ou de seu representante legal.” A professora esclarece que, sem a alternativa da eutanásia, a ortotanásia é uma boa opção para os pacientes em estados terminais, assim como foi para o seu pai. “Meu pai estava em estado terminal, então optamos pela ortotanásia para ele ter uma morte digna. Ele tomava morfina, ficava sedado e só utilizava medicação paliativa para não ter dor. Quando ele não estava medicado para dor, era uma coisa insuportável até de assistir”. Eliana observa: “Minha família pensava que aquilo não era vida. Aquilo não era viver”. DOR Como especialista em psicoterapia, Eliana Ferreira enfatiza que, para viver, o indivíduo precisa de um sentido: “O que muitas vezes acontece com pessoas em estado terminal, ou que sofreram um grave acidente, é que elas perdem esse sentido da existência. Já convivi com pacientes terminais que diziam: ‘’se a minha vida for uma continuidade do que está acontecendo agora, desse sofrimento, eu prefiro não viver”.
Para a médica oncologista, Marcela Lagoas, a eutanásia não deve se tornar uma opção. “Vive-se uma época em que há muitos recursos para reduzir a dor”. A médica afirma que, apesar de o sofrimento físico e psíquico serem justificativas para buscar melhor maneira de confortar o paciente, não se deve abrir portas para a eutanásia. “Uma boa relação médico-paciente é uma excelente maneira de amenizar o sofrimento psíquico.
Uma aproximação familiar, um encontro espiritual, independente da religião, é um ótimo remédio para um sofrimento emocional. Há outros recursos além da eutanásia,” comenta. Marcela ainda defende que sempre cabe ao médico o papel de encontrar o melhor caminho para que a morte do paciente seja menos sofrida e dolorosa, “porém sem acelerar ou abreviar essa passagem.” De acordo com a profes-
sora Eliana, existem dores psíquicas intoleráveis e, por isso, em alguns casos, não é possível tentar resgatar do paciente a vontade de viver. “A ética da psicologia é trabalhar o sofrimento psíquico. É um processo lento, mas ele pode, sim, acontecer. Contudo, existem vezes em que essas dores não conseguem ser trabalhadas; daí surge a eutanásia como opção para tais pacientes.” Eliana frisa que ser a favor da eutanásia não é ser a favor da morte. É ser a favor do direito da pessoa de escolher morrer de forma digna.
Valores éticos e religiosos em pauta O direito à vida ou à morte tem várias facetas, que englobam tanto questões filosóficas, quanto religiosas. Tratando-se da legalização da eutanásia no Brasil, a discussão não poderia deixar de passar por essas considerações. Segundo o professor de direito da PUC Minas, Mario Lúcio Quintão, a eutanásia, no plano filosófico, faz parte dos direitos dos cidadãos: “Entretanto, a vida depende de muitas outras coisas, além da plena autonomia individual”. O advogado esclarece que a legalização da eutanásia envolve fatores como o sistema judiciário, a estrutura médica e a formação cristã brasileira. Quintão reforça que o sistema judicial não está pronto para permitir a eutanásia: “No nosso cenário atual, conservador, seria praticamente impossível legalizar tal ato. O STF (Supremo Tribunal Federal) não é de formação laica, é composto por membros de formação religiosa.” Ele observa que os países que regulamentaram a eutanásia já atingiram um alto patamar civilizatório, “o que ainda não é o caso do Brasil.” A oncologista Marcela Lagoas também acredita que o país não está pronto para eutanásia: “O Brasil, hoje, não dispõe de uma estrutura multiprofissional para apoio psicológico, emocional, espiritual e físico para que os pacientes e familiares possam tomar esse tipo de decisão”. Já o professor de cultura religiosa, José Martins dos Santos, lembra que a questão da eutanásia é bastante polêmica no âmbito religioso. “As principais religiões, como o judaísmo, islamismo, cristianismo e hinduísmo, de modo geral, posicionam-se contra esse procedimento, visto por elas como uma espécie de homicídio ou suicídio”. O argumento básico delas se organiza
em torno da defesa da vida, compreendida como um bem precioso e sagrado. “Deus seria aquele que dá a vida e só ele teria o direito de subtraí-la.” Ele lembra que, para as religiões ressurreicionistas, como o judaísmo, o cristianismo e o islamismo, diminuir o tempo de vida, não importa por quais razões que a pessoa tenha, “é um pecado mortal, pois vai contra o plano do Criador”. Já para as religiões reencarnacionistas, como o hinduísmo e o espiritismo, que creem na lei do Carma, “a eutanásia bloqueia a oportunidade de evolução que o espírito recebeu ao encarnar-se em um corpo no planeta Terra.” O professor Santos explica que a Igreja Católica, pelo documento “Declaração Sobre a Eutanásia” da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, de 1980, defende que a morte voluntária ou o suicídio são tão inaceitáveis quanto o homicídio. Assim como a Igreja Católica, a doutrina islâmica tem o Código Islâmico de Ética Médica, elaborado pela Organização Islâmica de Ciências Médicas, em 1981, segundo o qual, “o médico é um meio do qual Deus se serve para aliviar as doenças e preservar a vida e não eliminá-la ou ajudar o paciente a fazê-lo.” Por ele, é vetado ao médico subtrair a vida de seu paciente. Já Regina Parizi, em palestra na Sociedade Brasileira de Bioética, afirma que as religiões não deveriam entrar na discussão sobre a prática da eutanásia, pois assim “o Brasil troca a discussão profunda sobre a questão pela discussão dogmática.” Ela comenta que a Sociedade respeita as opiniões divergentes, mas, para seus profissionais, a autonomia do paciente deve estar em primeiro lugar.”
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Assédio virtual põe jovens em perigo Internet tornou-se campo para criminosos encontrarem suas vitimas, que muitas vezes não denunciam o crime por medo ou por não conhecerem seus direitos Bárbara Lima Sylvia Amorim 2° Período
O abuso sexual na internet cresce cada vez mais. Ele pode ter consequências sérias para a vítima, causando desconforto, constrangimento e, até mesmo, problemas psicológicos. Por medo, muitas pessoas não denunciam o crime. Em 2015, a Pew Research Center realizou um estudo sobre assédio na internet, revelando que 73% dos usuários da rede já viram alguma situação de assédio e que 55% deles alegam terem sido vítimas. Renata Ribeiro Fagundes, delegada de Crimes Virtuais da Polícia Cívil, formada em direito pela PUC Minas, explica a diferença entre assédio na internet e na vida real. Segundo ela, o termo “assédio sexual” refere-se somente aos casos em que um superior hierárquico assedia uma funcionária. Já os, crimes sexuais na internet são referidos apenas como “assédio”. CRIME Segundo a delegada Renata, entre os crimes de assédio encontram-se a extorsão (ato através do qual se obriga alguém a assumir um comportamento, por meio de ameaça, com intenção de
receber lucro) e a injúria (ato contra a honra). “Há uma certa dificuldade na identificação de casos de calúnia, injúria e crimes contra a honra no Facebook, pois o site é estrangeiro e eles não reconhecem isso como crime. Logo, não é fácil conseguir a quebra de sigilo. Em casos de ameaça, já não é tão difícil,” explica a delegada. Diante do abuso virtual, algumas pessoas tentam relevar e esquecer o assunto, convencendose de que se trata apenas de um flerte, de coisa leve. Mas, se a pessoa se sentir incomodada ou ameaçada, deve registrar um boletim de ocorrência. Renata lembra que a internet é uma ferramenta útil, que possibilita rapidez na comunicação. Entretanto, “com a facilidade de acesso a redes sociais e aplicativos de mensagens, muitos criminosos utilizam-na para praticar atos ilegais. O assédio no mundo digital é comum nos dias de hoje e muitas vítimas não denunciam o crime por medo.” HISTÓRIAS Foi o que aconteceu com I.A, 20 anos, estudante da PUC Minas. Até hoje, ela tem dificuldade de encarar os fatos. Com os olhos baixos, timidamente, conseguiu
dizer uma palavra. Depois duas. O barulho do lado de fora atrapalhava o seu discurso, mas nada que a fizesse perder o foco ao narrar sua breve história de muito sofrimento. I.A, aos 10 anos foi assediada virtualmente. Comprou um webcam para conversar com seus amigos de escola pelo MSN (antigo site de relacionamentos, que possibilita conversas particulares como o WhatsApp). Sempre teve um crescimento muito precoce comparado ao de outras garotas de sua idade. Com seios já desenvolvidos, era motivo de atenção e assédio de vários homens. Um deles entrou em contato com I.A pelo MSN; queria sempre conversar por webcam. Os dois trocavam informações diversificadas. O indivíduo nunca expôs o rosto, mostrando-se, apenas, do pescoço para baixo. Em uma das conversas, desafiou a menina a provar que estava usando sutiã e calcinha e ela mostrou as alças de suas roupas íntimas para o homem. Segundo Renata, esse tipo de crime é muito recorrente: assim o assediador manipula, aos poucos, sua vítima convencendo-a, progressivamente, a mostrar partes do corpo. Tempo depois, o
Denunciar é o primeiro passo para coibir o assédio virtual Alexandre Atheniense, advogado da área de crimes cibernéticos, afirma que a vítima deve se dirigir a uma delegacia e fazer uma representação contra o assediador. Assim, a autoridade policial iniciará a investigação instaurando um inquérito e, posteriormente, o Ministério Público procederá à denúncia. Para rastrear a pessoa que prática o assédio virtualmente, Alexandre e a delegada Renata usam o mesmo método: equipes formadas por profissionais da área de direito digital que, além disso, têm conhecimento avançado em tecnologia da informação. Há, inclusive, na lei própria para crimes cibernéticos, (Lei Nº 12.737), punição para a invasão de dispositivos eletrônicos. Segundo a delegada, “os criminosos acham o campo virtual mais fácil, se sentem protegidos. Mas tudo que você faz na internet deixa rastros, então é possível uma identificação.”
Ela incentiva as vítimas a denunciarem os casos, mesmo se o crime tiver acontecido quando era menor de idade. O prazo de prescrição para denúncia acontece quando a vítima atinge a maioridade. I.A e M.R podem, portanto, registrar um boletim de ocorrência, assim como L.N, que com apenas 15 anos, se apaixonou por uma pessoa do meio virtual. Sempre muito sorridente, L.N. fica séria e conta entre lágrimas o que houve: “O homem, dez anos mais velho do que eu, conversava comigo de madrugada pela webcam”, relata a estudante da Fumec. Em uma madrugada qualquer, o individuo assediou-a se masturbando enquanto a observava pelo vídeo.“Eu fui totalmente seduzida por ele. Demorou muito tempo para eu parar de me sentir culpada por ter feito o que fiz”, confessa a estudante.
Flora Silberschneider
Assédios são mais reais do que nunca na vida dos brasileiros que acessam redes sociais
homem ameaçou-a, dizendo que publicaria as imagens em outras redes sociais se ela não gravasse vídeos fazendo o que ele quisesse. Ele chegou até a forçar a menina - de apenas 10 anos - a inserir objetos em suas partes íntimas. Depois disso, I.A, uma garota inocente do interior, mudou-se para Belo Horizonte, para estudar, suportando o peso de traumas. Ela excluiu todas as suas redes sociais e não contou para nenhum adulto o ocorrido. Afinal, o medo de ser julgada a amedrontava. Uma pesquisa realizada pelo Unicef (Fundo das Nações para a Infân-
cia) indicou que oito em cada dez adolescentes, quando sofrem assédio online, procuram mais amigos do que pais e professores para desabafar. Como ocorreu com I.A. Com M.G. não foi muito diferente. Seu jeito simpático e doce de tratar todos encantava qualquer um. No terceiro ano do ensino médio, a estudante, que hoje tem 21 anos e é estagiária da PUC Minas, foi aluna de um professor dinâmico, “ativo, que adorava dar aulas e era super conversado”. Porém, ele queria ter o tipo de liberdade que não devia. Adicionou-a no Facebook e mandou uma mensa-
CULPA Luiz Carlos Castello Branco, professor de psicologia da PUC Minas, formado também em pedagogia com especialização em educação afetivo-sexual, explica que as vítimas escondem o caso por vergonha e culpa. No entanto, quando o assédio se repete, alguns indivíduos tendem a compartilhar a experiência apenas com os seus iguais, amigos, por exemplo. O psicólogo afirma que uma medida importante é a participação de profissionais em grupos que estudam crimes cibernéticos para melhorar seus conhecimentos do mundo virtual, e ir definindo formas de prevenir o assédio e de ajudar a vitima. E por último, denunciar. Para o professor, várias são as causas que levam o individuo a assediar. A mais comum, é um possível abuso durante a infância, gerando trauma psicológico e levando-o a se vingar do ocorrido. As demais são relativas a comportamento e conduta que não atendem à normalidade. Os casos de assédio virtual tem se disseminado com o passar dos anos. São milhares de vitimas. “O assédio virtual
gem em um chat privado, convidando-a para sair. Na época, a vítima tinha 16 anos e o homem, o dobro de sua idade. M.G. não se sentiu confortável para denunciá-lo, afinal “ele era professor e eu apenas aluna” relata. “As escolas abafam esses casos. Precisamos tratar o assédio com a seriedade que merece”, disse ela. Na época M.G. não teve recursos para denunciar e nem apoio familiar mas, atualmente, denunciaria por ter mais instrução, informação e segurança para fazê-lo. Para ela “o grande problema é para quem não tem” isto.
pode ocorrer com homens também, mas em sua maioria, as vitimas são mulheres”, diz a delegada Renata. Observa que a prevenção e punição são extremamente necessárias para evitar que o número cresça cada vez mais. Nas escolas, principalmente, uma orientação aprofundada de formas de prevenção é indispensável, e é importante deixar de tentar silenciar vítimas e esconder os seus relatos. I.A, M.G e L.N acabaram as entrevistas com um nó na garganta. A vergonha e a culpa estão presentes no cotidiano dessas garotas. O psicólogo Castelo Banco diz que nenhuma vítima se esquecerá do assédio, mas talvez deixe de ser refém de um passado frustrado, atormentada pela possibilidade de ter feito diferente, denunciando ou contando para alguém. “A culpa nunca é da vitima, disso elas precisam ter certeza. Denunciar, não esconder o que aconteceu e tentar superar são medidas importantes para elas. Além disso, a prevenção é essencial ”– disse ele. De acordo com Renata, usar a rede social com moderação e segurança é importante, bem como todo cuidado ao conversar com desconhecidos.
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COMPORTAMENTO
Pole Dance vai além da sensualidade Flora Silberschneider
Antes vista como coreografia de casas de stripper, dança entra em processo de ressiginificação Gabrielle Monteiro Ludmilla Caroline 2° Período
O pole dance é uma prática muito conhecida por suas cenas sensuais em filmes e séries de TV. Porém, a atividade física é muito mais do que isso; é uma forma de dança e ginástica que tem diversas categorias, como o pole artístico, sensual e o fitness. A diferença entre elas é, basicamente, o foco de cada uma. No sensual, não se faz muitas acrobacias na barra; trabalhase mais com a dança e o contato do corpo com o chão. Já no artístico, quem dança é um performer, cria um personagem que além de fazer manobras na barra, envolve o público na apresentação. E o fitness não requer talento teatral: é apenas técnico e compreeende muitas acrobacias na barra. Hoje, estúdios de aula de Pole Dance vêm ganhando espaço no mercado e, cada vez mais, mulheres aderem à atividade física que, além de trabalhar todo o corpo, trabalha também com a mente, empoderando a pessoa que dança. A maioria das alunas tem a autoestima baixa, é insatisfeita com o próprio corpo, tem medo do julgamento social o que torna o trabalho do professor mais complexo. Além de mostrar para as alunas que independen-
te de sua idade, peso ou corpo, elas são capazes de fazer todos os exercícios e que, aos poucos, tanto a autoestima quanto a performance vão mudando e evoluindo para melhor. Rinara França, 36, é educadora física e foi a primeira a criar um estúdio de Pole Dance em Minas Gerais. O Vertical Studio funciona há nove anos e o número de alunos só cresce. Luiza Senra, 28, é publicitária por formação, mas não exerce mais a profissão. Há cinco anos, descobriu o Pole Dance e procurou um estúdio para conhecer melhor a atividade. “Em minhas primeiras aulas eu tinha muita dificuldade; logo no início pensei muito em desistir, achei que não era para mim”, disse ela. Porém, sentiu-se desafiada e persistiu, estudando mais a fundo o exercício e procurando cursos para se capacitar. Hoje, Luiza é dona do Studio A, uma rede de academias com aulas de Pole Dance em Belo Horizonte e afirma que o maior desafio de se ensinar essa prática é trabalhar com as frustrações do público. “A gente não esta mexendo só com corpo, não estamos deixando as meninas só mais fortes, mais seguras, com corpo mais bonito, com mais equilíbrio e coordenação motora. Estamos trabalhando com a cabeça de-
las, mostrando que elas podem superar os próprios desafios, podem se sentir melhores, não precisam ter medo. É um trabalho com a autoestima mesmo, é o amor ao próprio corpo, uma série de coisas”, afirma. Gabriela Amaral, 32, concorda com Luiza quanto a esse ser o maior desafio do ensino de Pole Dance. A jovem é formada em enfermagem e dá aulas nas barras há um ano. Entrou em contato com a atividade quando sua irmã pediu companhia para fazer uma aula experimental, já que estava com vergonha. “Foi amor ao primeiro contato e saímos da aula as duas matriculadas”, disse. Gabriela reforça que não existe um pré-requisito para a pole, “Não importa o quanto estão pesando ou se já praticam alguma atividade física; qualquer um que queira pode começar as aulas. Não é necessário ser forte”, afirma a professora. Ela diz que o mais gratificante de ensinar a arte é o empoderamento que acontece, a confiança que as alunas ganham ao perceberem que são belas e conseguem realizar acrobacias. CAI PRECONCEITO Com o crescimento da prática do Pole Dance, parte do preconceito existente em relação à dança se esvaiu. Porém,
Sempre com segurança, as alunas de Luiza Senra evoluem a cada dia
ainda existem pessoas extremamente críticas quanto à atividade. O fato de ser praticado com roupas curtas, normalmente um short e um top no caso das meninas, é um argumento utilizado pelas pessoas que não aceitam a atividade. Mas “as roupas precisam ser curtas, já que o atrito com a pele é fundamental para executar acrobacias na barra do pole (que utiliza como travas de segurança as pernas, abdome, costas e braços). Outro fator que contribui para o preconceito é a falta de informação, que segundo a instrutora Luiza, não deve ser rebatido com brigas e discussões, “O que precisa ser feito
é educar o público; eu tive que educar a família, minhas amigas e amigos, educo quem vem falar alguma coisa desagradável e pejorativa”, diz ela. Nos dias atuais, a intensificação da dança é tão grande que existem vários campeonatos, sendo o mais conhecido o que acontece no evento “Arnold Classic South America” chamado de Pole World Cup. Este ano, recebeu 54 atletas vindos de vários países que competiram nas categorias: amador, master, masculina e profissional. Existem também grupos como a Federação Brasileira de Pole Dance e o IPSF, Liga brasileira de Pole Esportes. Marianne Fonseca
Mulher ainda sofre discriminação por escolher profissões “masculinas” Elisa Senra Larissa Duarte 2º Período
A diferença salarial entre homens e mulheres nem sempre é a maior dificuldade encontrada por elas no mercado de trabalho. Algumas sofrem preconceito por causa da profissão que escolheram. É o caso de encanadoras, motoristas, eletricistas, pedreiras, mulheres em profissões, julgadas pelo senso comum, como “masculinas”. Isto resulta das expectativas profissionais sobre homens e mulheres com origem no tipo de socialização que os indivíduos vivenciam desde cedo, explica a doutora em ciência política, Mariah Casséte. Ela observa que os chamados “papéis de gênero” são construídos desde a infância e dizem respeito
a tudo que a sociedade espera e exige dos homens e das mulheres. “A sociedade construiu certos parâmetros em relação às diversas profissões e ofícios: quem pode ocupar certos cargos, o que se espera em relação ao comportamento de quem o ocupa e, muitas vezes, torna-se também delimitado o sexo que deveria ser ‘responsável’ por determinadas profissões”. A discriminação das mulheres ocorre, muitas vezes, na hora de tentar uma nova oportunidade de emprego. Várias já foram recusadas para uma vaga por causa do gênero. É o caso de Simone Viera, engenheira eletricista. “Quando fazia estágio em uma empresa, solicitei a oportunidade de estagiar em outra área, porém o meu pedido de trabalho foi rejeitado pelo gestor do setor. Segundo ele, por
eu ser mulher não era adequado, pois futuramente eu poderia me casar, ou querer ter filhos, o que para ele poderia trazer prejuízos para o projeto”, disse Simone. “No momento estou desempregada, acho que se fosse homem teria mais facilidade de me recolocar”. DISCRIMINAÇÃO Maria Luiza Pereira trabalha na empresa de seu pai, na área de contabilidade, e falou que ouviu comentários desagradáveis em tom de brincadeira. “Eu ouvi que por ser mulher não vou conseguir comandar uma empresa como meu pai”. Esses comentários, aparentemente inofensivos, trazem grande carga de preconceito e machismo que prejudica a autoestima das mulheres. Para concluir o curso técnico de equipamentos
biomédicos, Hannah Walder, 19 anos, é estagiária em uma empresa de manutenção de equipamentos de esterilização. Ela conta sobre os comentários que escuta no trabalho: “A manutenção das peças é bem simples, mas o peso do aparelho dificulta. Escutava constantemente que não conseguiria carregá-los. Muitos duvidaram que eu continuaria trabalhando; diziam que quando eu quebrasse uma unha sairia logo de lá”. Apesar de sua chefe também ser mulher, Hannah acredita que se fosse homem teria mais reconhecimento na área: “Todos os outros técnicos são homens e eles são mais bem tratados do que nós, mulheres”. De acordo com Mariah, no Brasil e nos Estados Unidos, as mulheres ganham cerca de 30% a menos que homens que
Apesar do preconceito, M. Luiza não desistiu do seu trabalho
exercem as mesmas funções. Isso gera diversos impactos na vida das mulheres como “a inferiorização no campo profissional, a permanência de situações constrangedoras como o assédio sexual no ambiente de trabalho, e a fixação das mulheres na esfera privada. A elas é demandado, muitas vezes, o abandono de suas carreiras para cuidar da casa e dos filhos, uma vez que seu salário é menor que o do seu parceiro”, disse Mariah. Apesar dos problemas, muitas mulheres acreditam que a situação está
melhorando. “É nítido o aumento de mulheres no mercado de trabalho. Recentemente, vejo muitas mulheres dirigindo ônibus pelas ruas de BH, e isso é maravilhoso”, afirmou Maria Luiza. A estudante de engenharia de controle e automação Lisley Souza afirmou que já perdeu vaga de emprego por ser uma área que só tinha homens, mas está confiante quanto ao aumento do reconhecimento da mulher no mercado: “Muitos homens da minha família não tiveram algumas oportunidades que eu tive”.
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FLÁVIO RENEGADO
jornalmarcoedição325novembro2016
ENTREVISTA
KARINE BORGES, 5º Período. Colaboração de Ana Luisa Santos e Juliana Gusman
Como foi o início de sua relação com a música e sua trajetória?
Sonhar é bom, mas fazer acontecer é melhor ainda
Sempre morei no Alto Vera Cruz e até os meus 11 anos era altamente treinado pra ser serviçal. É isso que eles fazem com a gente, treinam pra ser serviçal o tempo inteiro. Um dia estava tendo uma semana de arte e cultura na minha escola e aconteceu uma roda de capoeira, eu fiquei fascinado por aquilo e falei “cara eu quero fazer isso” e Nascido e criado na comunidade do Alto Vera Cruz, em Belo Horizonte, Flávio comecei a fazer. A capoeira, então, foi Renegado viu na música um caminho para realizar seus sonhos. Influenciado pelo meu primeiro contato com a cultura, grupo Racionais MC’s e outros nomes do rap, criou uma carreira com personalidade. com a arte. Foi a minha introdução, Em 2008, lançou o disco de estreia Do Oiapoque a Nova York. Em 2011, Minha digamos assim. Ela me ensinou coisas Tribo É o Mundo, com uma sonoridade mais urbana, influenciada pela multiplicidaque levou-me a refletir sobre o que não pensava, até então. Eu não tinha a míde dos movimentos urbanos e contemporâneos. Relatos de Um Conflito Particular, nima noção de nada, sabia que era preálbum de 2015, traz como tema os sete pecados capitais. to e só. Não entendia questão de clasApós a grande repercussão dos sete pecados, Renegado compôs outras sete se, questão racial, social em que a gente músicas relacionadas às virtudes, contando a própria história. Assim nasceu “Outono vive. A capoeira me mostrou tudo isso, Selvagem”, lançado em julho deste ano. a ter esse tipo de olhar. Ensinou-me disciplina, hierarquia, o que era ser negro, por que a maioria das pessoas que que vai ter um evento na comunidade gados. Falei que ia adotar esse nome, tradicional, deixar rolar o sistema e famorava naquele lugar também tinha a e eu tenho um grupo de rap e queria porque ser renegado pode ser legal, às minha cor. E a capoeira foi me levando zer o que o acha que tem que ser feito. tocar”. Ela virou e falou que eu poa esses tipos de reflexão. Depois disso, vezes. Isso te move, te tira do lugar. dia fazer um rap sobre o tema e se ela quando eu tinha 14 anos, conheci o hiComo foi a criação do primeiro gostasse eu poderia me apresentar no Como você acha que a música pode ajudar p-hop e ele bateu muito forte pra mim. centro cultural de vilas e favelas? evento. Acabou que fui pra biblioteca, uma comunidade como o Alto Vera Cruz? Eu tinha um amigo e fui pra casa dele A gente estava sentindo falta de um de novo, pesquisar o que era o Dia Indepois da capoeira; ligamos o som em Tem uma parada que eu sinto. Os licentro cultura e na época do ex-preternacional da Mulher; fiz o rap e levei uma rádio comunitária, eu nem sabia o vros de História eles não falam muito feito Patrus Ananias-PT tinha um pra ela. Ela gostou e me deu a oporque era rádio comunitária e, na hora, da nossa história, geralmente, falam da programa chamado “orçamento partunidade. Foi aí que tudo começou. que a gente ligou, estava tocando Thahistória do vencedor, que quase sempre íde e Dj Hum – Corpo ticipativo”, onde o município abre a é o opressor. Acho que a música e a Por que o Fechado e, depois, na chance de definir verba para projetos arte têm esse poder de falar da gente, sobrenome Renegado? sequência, tocou Raciode afirmar o que a gente vive, o que apresentados pela comunidade. A genEu acho que não esconais – O Homem Na a gente sente, quem nós somos e por te foi para a reunião do orçamento parlhi esse nome, foi ele Estrada e eu falei “esse que fazemos as coisas. Quem tem essa ticipativo tentar o nosso que me escolheu. O que cara fala uns bagulhos Acho que a músifunção social são centro cultural. Chegou aconteceu foi que tinha iguaizinhos à minha ca vira uma forma as pessoas, não a lá tinha um pessoal faum centro cultural na vida, essa parada é muide contarmos nossa música. lando que era mais imcomunidade com vários to doida”. E então eu Ser renegado pode história e de manportante abrir uma rua grupos de rap. E dencismei de cantar rap: na ser legal, às vezes. tê-la viva. Acho que tro do rap tem essa traminha época, não tinha do que um centro cultuIsso te move, te isso ajuda a manter dição, do “re-batismo”. Você vai pra Google, então a gente ia pra biblioteca ral, e realmente é tamtira do lugar a memória da corua e ganha outros nomes. Você tem pesquisar. Foi a primeira vez que entrei bém, né? Mas a gente munidade, levantar a opção de ser o que você quiser. A em uma biblioteca na minha vida, tudo a autoestima dela. sabia que o centro teria gente tinha essa parada, e organizava por causa do hip-hop. Uma coisa inteSe eu não falar do um poder transformador isso com os grupos; todo mundo tiressante foi que o hip-hop me levou a Alto Vera Cruz qual música vai fana comunidade. Nós perdemos no prinha codinomes, apelidos. Até ajudei participar na associação de moradores lar dela? A arte serve pra isso, fameiro ano, mas falamos que voltaríaa dar vários pra galera. Só que eu não do bairro onde eu conheci a Dona Valzer o registro histórico das coisas. mos no segundo mais organizados. E tinha apelido e um dia um cara chedete, fundadora do grupo Meninas de voltamos, organizamos a comunidade, gou e falou “oh você é um renegado”. Sinhá, que faleceu há uns dois anos. Como você vê a reação da sociedade Fiquei bolado na hora, mas fui pra nos preparamos e, finalmente, conseconservadora à recepção de músicas casa pensando. Acabei percebendo que Como foi sua primeira vez no rap? guimos a parte do orçamento particique trazem críticas sociais, religiosas, ele tinha razão. Eu era um renegado. E ia ter um evento na comunidade pativo para o centro cultural. E assim de gênero etc.? A gente que mora em comunidade, é do Dia Internacional da Mulher, e eu a gente conseguiu o primeiro centro É uma incógnita porque, ao mesmo renegado: saneamento básico não tem, doido pra arrumar uma oportunidade tempo em que o grande mercado, o cultural de vilas e favelas de Belo Hoescola bacana não tem, saúde legal, pra mostrar meu grupo de rap, cheguei mainstream memory, não absorve esse rizonte que é o do Alto Vera Cruz. também não, são bens negados e renena Dona Valdete e falei: “o dona, sei tipo de produção, o mercado mudou. Marianne Fonseca Hoje você vê que o YouTube virou uma Qual você acredita ser a função social grande janela. E a MTV é o YouTube, do rap? Ele tem esta responsabilidade? ela tem tudo. Ou seja, a forma de se Eu fico pensando várias coisas porque, acessar e de consumir isso tudo musó para o cara chegar e cantar o seu dou. Você vai muito mais em busca do meio, já é uma evolução no processo que quer consumir, e não mais daquilo de cumprimento da função social dele. que alguém lhe impõe consumir. E essa Para o cara cantar rap ele tem que, primúsica, esse tipo de produção começou a ter um mercado mais forte. A gente meiramente, estar pré-disposto a exervê artistas que vêm surgindo, e com cer essa função, a de botar o dedo nas força com a questão de gênero em pauferidas do seu meio. Mas, por si só, o ta, como Johnny Hooker, As Bahias e rap já cumpre um papel importante. a Cozinha Mineira. Quer dizer, trans, Ele tira de um lugar comum e leva gays, LGBT’s tudo tem sua voz. Os capara um outro campo de pensamento, ras vão lá se organizam no estilo deles e a mensagem das periferias, dos renegacada vez mais isso vai acontecendo e codos. Mas eu vejo o rap mais como uma meçando a formar os seus representanexpressão artística. Quem tem essa tes, aprendendo a se organizar, a criar função social são as pessoas, não a múmercado. E eu acho muito legal porque sica. Ou seja, somos nós, os cidadãos. a magia toda é essa: quebrar a estrutura