TFG UNICAMP 2018 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

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MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO

DA FORMA: APLICAÇÕES EM

UM TEMPLO PROTESTANTE 2018

TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO FACULDADE DE ENGENHARIA CIVIL, ARQUITETURA E URBANISMO, UNICAMP

VERLEY HENRY CÔCO JÚNIOR PROF.DRA. GABRIELA CELANI PROJ. ESTRUTURAL: JOÃO PEDRO VALENTE

ORIENTADORA:



MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO

DA FORMA: APLICAÇÕES EM

UM TEMPLO PROTESTANTE 2018

TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO FACULDADE DE ENGENHARIA CIVIL, ARQUITETURA E URBANISMO, UNICAMP

VERLEY HENRY CÔCO JÚNIOR ORIENTADORA: PROF.DRA. GABRIELA CELANI PROJ. ESTRUTURAL: JOÃO PEDRO VALENTE



Aos meus pais, cujas lĂĄgrimas regaram as sementes dos frutos que colho hoje. Ao meu irmĂŁo, cuja amizade sempre me inspira a ser uma pessoa melhor.


Prezado leitor ou leitora, Espero que as próximas páginas deste memorial não só registrem intensões projetuais, soluções técnicas ou resultados, mas que possam ter marcos de gratidão gravados entre as suas entrelinhas a todos os que contribuíram para este momento. Neste trabalho está contida uma construção vagarosa que ocorreu ao longo da minha vida. Por isso, quero agradecer aos meus pais, Verley e Eliana Côco, que entenderam que o conhecimento e o exemplo são os melhores investimentos que poderiam fazer em mim e no meu irmão. Sendo que, para se manterem fiéis a esse propósito, muitas vezes tiveram que negar a si mesmos. Hoje, quando vejo as marcas da vida em suas mãos e em seus olhos para que eu pudesse ter um ensino superior, reconheço que esta graduação não é minha, mas de vocês. Eu

tive apenas o privilégio de regar as sementes que vocês plantaram. Pai, você é aquele que se fez criança quando eu era criança e construiu comigo cidades no chão de taco, prédios de papelão, estações de metrô de isopor, aviões de plástico e barcos vikings de argila. Você me mostrou o mundo. Mãe, com seu olhar sensível você me impulsionou para que eu crescesse e me deu asas para que eu ultrapassasse barreiras, seja naqueles dias em que a sala de casa era tomada por isopor e papelão seja nos momentos em que eu só precisava ouvir. Você me acolheu. Agradeço ao meu irmão, André Côco, que ao longo de todos esses anos tem sido um verdadeiro amigo. Suas opiniões sinceras e sábias construíram quem eu sou hoje e sua preocupação com a minha formação sempre me entusiasmaram. Meus sinceros agradecimentos a minha orientadora prof.dra. Gabriela Celani, cuja dedica-


ção à pesquisa e diligência nas atividades de ensino ampliaram a minha visão sobre a Arquitetura. Muito deste trabalho é consequência das nossas conversas que se iniciaram antes deste trabalho e, com certeza, ele não existiria sem a sua orientação precisa e solicitude. Agradeço ao prof.dr. Felipe Tavares da Universidade Federal da Bahia que gentilmente esteve disponível para assessorias em Engenharia de Estruturas. Sou grato ao João Pedro Valente, graduando em Engenharia Civil, que mesmo diante de muitos desafios não poupou esforços no desenvolvimento de um bom projeto estrutural neste trabalho. Agradeço a todo corpo docente da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), cuja bagagem passada, discussões e provocações levarei para as próximas fases da minha vida. Agradeço aos funcionários da nossa faculdade e a Unicamp por viabilizarem este

tempo de aprendizado. Agradeço aos familiares e amigos que estiveram ao meu lado em todo este tempo. Destaco a família Barboza, Costa, Barcaro, Rosa, Côco e Tondo. Ao longo desta caminhada foram muitos os ombros amigos. Espero que Deus os recompense em dobro. Por fim, agradeço a Deus por ter colocado essas pessoas ao meu lado, ter-me cercado de tantas oportunidades e me dado forças para chegar até aqui. Espero que nas etapas seguintes, eu possa refletir essa graça e bondade para nossa sociedade.

Atenciosamente, Verley Jr 26 de novembro de 2018



Que os erros de outrora nos façam pensar Que o tempo é agora e não pode esperar Que o amor não tem hora, nem cor, nem lugar E só tem sentido se a gente se amar Que a nossa garganta desate esse nó Num abraço apertado sem medo e sem dó Que a gente divida entre acordes e tons A honra e o prazer de juntar nossos dons Que Deus sobre nós multiplique esse amor Sadio e sincero no riso e na dor Que as nossas canções falem sempre de paz Nem muito de menos, nem pouco de mais Que a história se faça por sermos irmãos No peito e na raça, no aperto das mãos Que as nossas crianças nos vejam assim Amigos no início, no meio e no fim

(João Alexandre. Por sermos irmãos)



Sumário Introdução   13 Parte I: A necessidade de novos mecanismos de estruturação para a arquitetura    19 1. Fabricando edifícios sob um olhar contemporâneo    20 2. Cidade e edifício, espaço e tempo    27 Parte II: Embasamento teórico para um templo protestante    33 1. Templos cristãos antes da Reforma Protestante    36 2. Templos cristãos protestantes   41 3. Igreja protestante no Brasil    49 4. Uma igreja para a cidade    54 5. Referências programáticas   55 PARTE III: Município, bairro e terreno para o novo projeto    69 1. Panorama de formação histórica    71 2. Dinâmicas regionais atuais    74 3. Indicadores do município de Jundiaí    76 4. Indicadores do bairro Vila Arens     84 5. Dinâmicas do bairro Vila Arens    86 6. A indústria de tecelagem Japy    106 7. Um templo para a cidade    115 Parte IV: Proposta arquitetônica    119 1, Conceito e partido    120 2. Programa   130 3. Estruturação colaborativa do projeto da cobertura    132 4. Condicionamento térmico passivo    141 5. Projeto estrutural por João Pedro Valente    142 6. Desenvolvimento da cobertura    146 7. Auditório   150 Referências bibliográficas    188


ARCHITECTURE AND BUILDING

CONTRACTORS

PROFIT

VISION

ARCHITECTS/ CONSULTANTS

ARCHITECTS

MATERIAL SCIENTISTS

Kieran e Timberlake, 2004

PRODUCT ENGINEERS

MATERIALS AND PRODUCTS


Introdução | 13

Introdução Admiro os poetas. O que eles dizem com duas palavras a gente tem que exprimir com milhares de tijolos. (ARTIGAS, 1973)

sistemas hidráulicos e elétricos, de coordenação de projeto, ao mesmo tempo que os reúne para propor-

cionar eficiência nas trocas térmicas, no comportamento do som e da luz. Retomando os exemplos citados, habitações coletivas podem ter vãos otimizados Arquitetura é Arte e Técnica. Arquitetos e uma desejada modulação, uma implantação para buscam atribuir significados a significantes – isto é, minimizar os ganhos de calor; sistemas de reaproveiideia transmitida à parte material (Colin, 2009) - por tamento, captação e tratamento de água, estudo da meio da composição formal e material que exprima flora em relação as estações do ano ou ao solo são qualidades de hierarquia, ritmo, escala, percurso, essenciais em um projeto paisagístico; ou no caso centralidade, fugacidade e assim por de uma catedral gótica o desenvolviARQUITETURA É ARTE E diante. Há uma busca para que o promento de novas técnicas como o arco TÉCNICA. jeto construído crie em seus usuários ogival, abóbadas de aresta e arcobosentimentos, sensações, reflexões e tantes respondeu ao anseio por espaque venham tocar o espírito daqueles que estão no ços mais amplos e verticais – como Gombrich (1999, espaço. Uma residência ou habitação coletiva, por p. 185) destaca: “no início, poderíamos dizer que era exemplo, pode proporcionar sentimentos de acolhiprincipalmente uma invenção técnica; contudo, em mento e proteção em seus usuários; um parque ou seus efeitos, tornou-se muito mais do que isso [...]”. um jardim, sensações de liberdade, ordem ou até Arte e Técnica caminham juntas na arquitetura. Podeuma desordem natural; uma catedral, a perda de mos questionar, entretanto, se essa relação é efetiva escala diante de uma medida divina. São discursos ao longo do projeto e como mecanismos projetuais que aproximam a arquitetura da Arte. Como ocorre poderiam equilibrar a estruturação do projeto. na Arte Contemporânea, a arquitetura cria o objeto Kieran e Timberlake (2004) fazem uma expara ser lido de modo que o usuário construirá seus tensa crítica sobre o (des)equilíbrio da Arte e Técnica próprios significados segundo sua subjetividade. Ao visto na arquitetura e já apontado por Le Corbusier final, a arquitetura também está nos olhos, ouvidos e nas primeiras décadas do século XX (Corbusier, mãos dos usuários. 2000). Kieran e Timberlake (2004) colocam que, no Na mesma medida, arquitetura é técnica, século passado, a engenharia de produção automoticonstrução, fala de tijolo sobre tijolo, de formas de va, naval e aeronáutica alcançou um crescimento exconcreto, de acabamentos, da compatibilização de ponencial de qualidade e redução de custo e tempo


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de produção. Há nesses setores uma atenção efetiprofissionais, avanço tecnológico e disponibilidade de va aos processos com integração entre engenheiros materiais (Kieran e Timberlake, 2004). de produção, engenheiros de materiais, designers Oxman e Oxman (2010) defendem que o dee empregadores. A industrialização, após um longo senvolvimento tradicional de um projeto arquitetônico período voltado para a produção em massa, atingiu - que se inicia pela definição da forma por arquitetos, finalmente a personalização em massa, ou seja, a seguida da definição de estruturas por engenheiros e, produção customizada em larga escala por um menor por último, ambos profissionais escolhendo os matecusto. Essa abordagem também pode ser aplicada riais - não responde à atual complexidade econômica aos processos de projeto, como no uso de algoritmos e social. Eles defendem que deveríamos pensar em para a automatização e customização novos mecanismos de estruturação de procedimentos. Por outro lado, um novo estruturalismo - invertendo a UMA REVISÃO DO PROCESdesde a década de 1980, a arquitetura ordem convencional de projeto para SO PROJETUAL E PRODUpouco avançou na revisão de procesMateriais, Estrutura e, por último, a TIVO SE FAZ NECESSÁRIA sos de produção se comparada com Forma. Destacaremos quatro temas PELA CRESCENTE COMPLEas indústrias citadas. Ela se fechou pelos quais esta nova abordagem XIDADE ARQUITETÔNICA, em um discurso sobre resultados forocorre. (I) A Estruturação, onde há a DAS RELAÇÕES PROFISSIOmais e passou ao largo de uma comdefinição da lógica e sintaxe formal NAIS, AVANÇO TECNOLÓGIpleta automação. O sistema produtivo que conduzem ao entendimento da CO E DISPONIBILIDADE DE arquitetônico continua afirmando e parte ao todo ou, ainda, um procesMATERIAIS repetindo um modelo artesanal pré-inso de discretização dos padrões esdustrial como sinônimo de qualidade. truturais. (II) Tectônica digital, que faz Consequentemente, a arquitetura se torna sinônimo uso de scripts no processo de Estruturação, podendo de artigo de luxo restrito a uma elite econômica ou ser generativo segundo regras pré-estabelecidas. mesmo a uma abordagem oposta de baixar a quali(III) A estruturação da materialidade, isto é, os madade para conseguir resultados mais baratos e acesteriais são a base para a estruturação do projeto e síveis. São faces diferentes de um mesmo problema: pesquisa, pois as suas características físicas podem a desatenção aos processos produtivos, à industriaser exploradas ao máximo na Tectônica. (IV) Fabrilização e aos avanços tecnológicos. Uma revisão do cação, a Tectônica digital pode ser transformada em processo projetual e produtivo se faz necessária pela informações para fabricação por meio de ferramencrescente complexidade arquitetônica, das relações tas automatizadas. Temos, assim, um campo comum


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para estudo de engenheiros e arquitetos. Oxman e e contextos, desde o projeto de um mobiliário até Oxman (2010, p. 23) concluem: “Fabrication is not a o plano urbano. Neste trabalho, procuramos uma modelling technique, but a revolution in the making of aplicação que reunisse respostas às demandas soarchitecture”. ciais, nos trouxesse oportunidades técnicas a fim de Ao olhar para os mecanismos de estruturaconstruir um projeto nos termos de Oxman e Oxman, ção da forma de um edifício, também devemos olhar dentro das transformações urbanas no decorrer de para a cidade. A arquitetura deve ser pensada como décadas e, além disso, um programa que trouxesse uma costura na malha urbana ou mesmo um novo à discussão a significação do espaço pelo sagrado. traço sobre o palimpsesto que é a cidade. Ler e inEscolhemos aplicar estes conceitos na construção de terpretar essa complexidade urbana em constante um novo templo religioso de caráter cristão protesmutação e sintetizar em um projeto que responda às tante (e aqui trataremos “Evangélico” como sinônimo) demandas da sociedade é a preocucuja crescente visibilidade da igreja pação do Landscape Urbanism, como em solo nacional não tem sido acomAO OLHAR PARA OS MECAdiscorrem Corner (2006) e Waldheim panhada de conhecimento e fundaNISMOS DE ESTRUTURAÇÃO (2006). Parafraseando David Harley, mentação teórica sobre a sua relaDA FORMA DE UM EDIFÍCIO, Corner (2006, p.29) defende que “the ção com o espaço. Este templo será TAMBÉM DEVEMOS OLHAR projection of new possibilities for fuentendido como um ponto de partida PARA A CIDADE. ture urbanisms must derive less from para a construção de programas aran understanding of form and more quitetônicos secundários segundo as from an understanding of process – how things work necessidades sociais locais. in space and time”. Passados mais de quinhentos anos da ReTemos, assim, três camadas de desenvolviforma Protestante e um pouco mais de duzentos mento da forma que falam sobre seus mecanismos anos da presença do protestantismo no Brasil, a de geração: a industrialização (Kieran e Timberlake, igreja evangélica apresenta um rápido crescimento e 2003), uma abordagem que parte dos materiais e da pode vir a se tornar a maior religião em território naestrutura (Oxman e Oxman, 2010) e outra que parte cional em no máximo trinta anos conforme o Instituto da cidade até chegar na escala de projeto (Corner, Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), citado 2006; Waldheim, 2006). Podemos destacar que tais por Azevedo (2012), e também discutido em reportaabordagens não estão presas a um programa argens por Cardoso (2011) e pelo G1 São Paulo (2013). quitetônico específico; falam de diferentes escalas Trata-se de um ponto de inflexão da história religio-


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sa brasileira, o que torna propícia a discussão pela em uma escala temporal de curto e médio prazo e, arquitetura sobre como templos evangélicos podem: por último, como podemos enxergar a igreja em cin(I) ter qualidade para o usuário – conforto acústico, quenta ou cem anos. térmico e lumínico, (II) qualidades simbólicas - comuÉ dentro dessa abordagem sobre espaço nicar a fé de sua comunidade de forma consistente, e tempo que desde o início prevemos que o templo (III) ao mesmo tempo que podem servir à cidade de poderia ser montado, rearranjado e desmontado com modo positivo e (IV) responder às demandas da cidafacilidade quando necessário. É uma análise que toca de de modo sustentável. Este trabalho parte do prino seu ciclo de vida e antecipa uma questão: templos cípio de que esses quatro tópicos estão diretamente cristãos protestantes não deveriam ser projetados relacionados. para a eternidade, mas poderiam ser reinventados O sagrado para o protestante está mais a cada geração. Em um passo mais radical, talvez ligado a uma relação temporal que espacial (Abua igreja não precise possuir terrenos, mas seu temmanssur, 2004). Defendemos neste plo possa ser entendido como algo O SAGRADO PARA O trabalho uma análise separada de nômade, fixando-se em lugares onde programa e edifício, igreja enquanto PROTESTANTE ESTÁ MAIS possa dar uma contribuição efetiva à LIGADO A UMA RELAÇÃO comunidade e igreja enquanto conssociedade a partir de leituras urbanas, TEMPORAL QUE ESPACIAL. trução (Grudem, 1999; Keller, 2014). sendo que, depois de décadas, ele Na mesma medida que o sagrado está no uso e nas atividades cotidianas transcendendo o próprio edifício, o mesmo pode receber outros programas para servir à sociedade local, pois elas também são uma forma de culto pela teologia protestante (Keller, 2014), o que nos permite uma reflexão indo além do espaço e enxergando-o no tempo (Abumanssur, 2004). Na escala do “momento”, o ritmo de aproximação ao templo e as qualidades espaciais durante o tempo de culto; em uma escala semanal, como o espaço pode ser mais usado e flexibilizado para outros usos ao longo da semana, bem como o espaço pode se transformar ou permitir modificações

poderia ser desmontado e, se não totalmente, reutilizado no mesmo local para compor um novo edifício de caráter social. Arte e Técnica estão intrinsecamente ligadas neste sistema: na evocação do sagrado temporal em um espaço transitório e reinventável (Abumanssur, 2004). no qual podemos aplicar teorias projetuais contemporâneas partindo da definição de materiais, estrutura até chegar na forma (Oxman e Oxman, 2010); fazendo uso de sistemas pré-fabricados (Kieran e Timberlake, 2004) e construindo o edifício e o programa costurados na malha urbana. Isso não significa que não haverá memória ou atribui-


Introdução | 17

ção de significado ao espaço, pelo contrário, haverá o reforço de identidade na transitoriedade do sagrado (Abumanssur, 2004). Este Trabalho Final de Graduação está dividido em quatro partes. Na primeira, abordamos como podemos rever processos para a estruturação da forma arquitetônica aplicando uma abordagem de pré-fabricação alinhada com o desenvolvimento tecnológico. Da mesma forma que um edifício não deve ser pensado como um sistema isolado da cidade, pode estar, por outro lado, costurado na malha urbana. Em seguida, na segunda parte, falamos sobre como se estrutura um templo protestante quais as suas abordagens sobre a arquitetura, como isso se reflete no Brasil e como, segundo a sua cosmovisão, a igreja pode contribuir para a cidade. Apresentamos essa seção com o fim de fundamentar nossas escolhas futuras na construção do programa arquitetônico. Na parte seguinte, tratamos sobre a cidade, o bairro e o terreno para o novo projeto. Na quarta e última parte, fazemos uma aplicação prática na construção de um modelo conceitual de igreja protestante


Linha de montagem Ford T, veículo produzido entre 1909 e 1927. A racionalidade produtiva em uma linha de montagem fez o preço do automóvel baixar de 825 dólares em 1909 para 260 dólares em 1924. Mais de 16 milhões de unidades foram vendidas (Museu do Caramulo, 2018). Este é um marco de uma revisão do processo produtivo que deixou de ser por unidade, para acontecer em uma linha de montagem. Hoje a produção automotiva é modular (Kieran e Timberlake, 2004). Imagem disponível em: https://www.thinglink.com/scene/584451774274863105. Acesso 29 de Maio de 2018.


Parte I: A necessidade de novos mecanismos de estruturação para a arquitetura


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1. Fabricando edifícios sob um olhar contemporâneo A massa envolvente não é preconcebida, ela resulta. (Le Corbusier, 2000, p. 93)

Le Corbusier: Os primeiros automóveis foram construídos e dotados de carroceria à moda antiga. Isso contrariava as modalidades de deslocamento e penetração rápida de um corpo. O estudo das leis de penetração fixou um padrão, um padrão que evolui entre dois fins diferentes: velocidade, grande massa dianteira (carro de corrida); conforto, volume importante atrás (limusine). Nos dois casos, nenhum ponto em comum com a antiga carroça com deslocamento lento. (LE CORBUSIER, 2000, p. 93)

Le Corbusier (1887 – 1965), pai da arquitetura moderna, defendia um novo olhar sobre a arquitetura em seu manifesto Por uma arquitetura, de 1923. O autor defendia uma abordagem lógica sobre o projeto partindo de uma clara definição sobre o problema e em seguida uma sistemática busca pelo estabelecimento de padrões que uniriam beleza e eficiência, arte e técnica – como, segundo Atualmente, entretano autor, já acontecia naquele momenMAIS DO QUE UMA PROto, mais do que uma produção em to na engenharia naval, aeronáutica DUÇÃO EM MASSA, ELA massa, ela pode ser customizada e automobilística. Ele afirma que: PODE SER CUSTOMIZADA EM em massa, isto é, mais do que deci“os padrões são coisa de lógica, de MASSA. dir entre opções pré-determinadas, análise, de estudo escrupuloso; são o cliente pode combinar opções e estabelecidos a partir de um problema participar do processo de fabricação desde o início. bem colocado. A experimentação fixa definidamente De Le Corbusier para cá, a indústria passou por um o padrão” (Le Corbusier, 2000, p. 87). Deste modo, longo processo de automatização e racionalização o volume, a planta, a massa, partiriam de um estudo da produção muito em razão do avanço tecnológico. profundo sobre processos. Segundo Kieran e TimberSeja para a fabricação de carros, aviões ou navios, a lake (2004), Le Corbusier encontrou o denominador produção deixou de ser centralizada e passou por a comum entre design e industrialização pelo estabeleser entendida como partes e conjuntos que poderiam cimento de objetos tipo que poderiam ser fabricados ser feitos simultaneamente em lugares distintos e, ao proporcionando produtos com mais qualidade e por final, se uniriam em uma montadora. Ao longo da famenor custo. A indústria conseguia tais feitos pela bricação, cada parte passa por diversos controles de produção em massa de produtos idênticos – como o qualidade e pode ser objeto de um estudo para otimiFord T produzido entre 1908 e 1927. Nas palavras de zar a forma e a produção, sem contar que diversas


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Navios são construídos em grandes blocos completamente independentes para viabilizar a produção. Imagem disponível em: http://ectjoinville.com/AttractionsAndEquips/HowWorksDetail/8647. Acesso 29 de Maio de 2018.

Cada elemento de um avião é modular - como uma “boneca russa”, há módulos dentro de módulos. A eficiência construtiva impacta diretamente na diminuição do peso e, consequentemente, no consumo de combustível. Imagem disponível em: http://www.modernairliners. com/wp-content/uploads/2015/07/747-marrying-forward-section-and-centre-section.jpg. Acesso 29 de Maio de 2018.


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atividades podem ocorrer em paralelo reduzindo a Observemos que um braço robótico, uma máquina quantidade de encaixes no final pela pré-montagem. por controle numérico (CNC) ou impressoras 3D poConsequentemente, a qualidade do projeto cresceu dem produzir partes completamente diferentes de um exponencialmente assim como o seu escopo – conedifício pelo mesmo custo – são processos altamente segue-se fabricar projetos com mais qualidade ao customizados (Oxman e Oxman, 2010; Kieran e Timmesmo tempo que sua complexidade aumentou (Kieberlake, 2004). Este é o momento propício para rever ran e Timberlake, 2004). nossa metodologia projetual: “a ordem para mudança Entretanto, o discurso de Le Corbusier ainagora mudou para a arquitetura. Não podemos conda ecoa atualmente. A mesma eficiência conseguida tinuar a construir arquitetura a custos cada vez mais em setores da indústria pode ser imaltos, prazos mais longos e qualidade A MESMA EFICIÊNCIA plementada na arquitetura por meio inferior. Nós devemos agir” (Kieran e CONSEGUIDA EM SETORES do entendimento de um canteiro de Timberlake, 2004, p. 115, tradução DA INDÚSTRIA PODE SER obras como um “canteiro de monnossa). IMPLEMENTADA NA ARQUITEtagem”. Ainda hoje uma construção Olhar para os processos TURA POR MEIO DO ENTENconvencional é construída totalmente produtivos (para os mecanismos de DIMENTO DE UM CANTEIRO no lugar final em processo linear e estruturação da forma) ampliaria o DE OBRAS COMO UM “CANsequencial: “O arquiteto hoje começa escopo do arquiteto para construtor, TEIRO DE MONTAGEM”. representando uma ideia do resultaengenheiro de produção e cientista do desejado. Mais tarde, os desenhos de fabricação de materiais. Durante o renascimento o arquiteto reudetalham os métodos de montagem a serem usados nia estas funções pela simplicidade das tecnologias para efetuar o resultado desejado” (Kieran e Timberconstrutivas daquele tempo (Kieran e Timberlake, lake, 2004, p.115, tradução nossa) – um processo 2004). Vemos em Brunelleschi (1377-1446), por de forma, estrutura e materiais cheio de furos, tenexemplo, esta figura do master builder que, para a tativas e erros que levam a longos cronogramas e construção da cúpula da igreja de Santa Maria em altos custos. Não devemos encarar a pré-fabricação Florença, Itália, não seguiu os métodos convenciocomo um engessamento da criatividade, mas como nais até então usados no gótico, mas inventou novos um caminho para a liberdade criativa mediante uma sistemas de elevadores e mecanismos construtivos produção customizada e viável em orçamento e croalém de um uso inovador do tijolo. Gombrich (1999, nograma. E para isso, a fabricação digital vem ao p. 224) afirma que “quando [Brunelleschi] foi chamaauxílio da arquitetura pela automação de processos. do a projetar novas igrejas ou outras construções, ele


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decidiu descartar inteiramente o estilo tradicional e adotar o programa daqueles que ansiavam por um renascimento da grandeza romana”. O que Brunelleschi faz é uma leitura histórica e sua aplicação na realidade de Florença: O que Brunelleschi tinha em mente era um novo processo de construção, em que as novas formas da arquitetura clássica fossem livremente usadas para criar novos modos de harmonia e beleza. [...] Somente no século atual [século XX] os arquitetos começaram a questionar o programa de Brunelleschi e a rebelar-se contra a tradição renascentista de construção, tal como ele se revoltou contra a tradição clássica. [...] Se Brunelleschi queria criar a arquitetura de uma nova era, certamente o conseguiu”. (GOMBRICH, 1999, p. 224)

Atualmente, contudo, devido ao aumento da complexidade de projeto, do processo construtivo e do aumento dos materiais disponíveis, a figura do arquiteto como master builder à semelhança da renascença italiana seria algo impossível. Devemos, Panorama da cidade de Florença. Na direita, a igreja de Santa Maria.

ao contrário, pensar o arquiteto como um integrador de conhecimento e expertises devido ao caráter multidisciplinar da profissão; este é um novo master builder em um contexto mais horizontal e descentralizado. Como Kieran e Timberlake (2004, p. 115, tradução nossa) defendem: “Nós podemos restabelecer a construção em arquitetura pela integração da inteligência do arquiteto, empreiteiro, cientista de materiais e engenheiro de produção dentro de uma rede coletiva de informação”. A inteligência coletiva, o novo master builder, permite que o mecanismo de estruturação da forma se inicie pelos materiais, seguido da estrutura e tenha como resultado a forma – a forma que resulta e não é pré-estabelecida. Em um primeiro momento, como Oxman e Oxman (2010) afirmam, estes profissionais podem encontram uma língua comum no scripting, isto é, na construção de algoritmos na otimização da construção. Colocamos também que, se o novo master builder é coletivo, o interstício entre os profissionais tem grande valor, logo a gestão de dados e fluxo de trabalho necessita de atenção especial. A este respeito


C

DESEJÁVEL

D

B A

CUSTO X TEMPO

ABORDAGEM ARTESANAL

TENDEM A

RESULTADOS: A, B

- “BAIXO IÍNDICE DE INDUSTRIALIZAÇÃO;

- “ARQUITETURA COMO LUXO”;

- ARQUITETOS PRESOS A FORMA, ABORDAGEM LIMITADA SOBRE PROCESSOS;

- ALTO ÍNDICE DE AUTOCONSTRUÇÃO NO PAÍS E AUSÊNCIA DE PROJETOS;

- FORMA -> ESTRUTURA -> MATERIAIS - DESINTEGRAÇÃO ENTRE OS PROFISSIONAIS E AUSÊNCIA DE MECANISMOS DE GESTÃO INTEGRADOS;

- ARQUITETURA SOCIAL DE BAIXA QUALIDADE - PARA BAIXAR O CUSTO, DIMINUI-SE A QUALIDADE CONSTRUTIVA OU O ESCOPO DE PROJETO;

“INSANIDADE É CONTINUAR FAZENDO A MESMA COISA E ESPERAR RESULTADOS DIFERENTES.” (ALBERT EINSTEIN) ASSIM, A QUESTÃO É

COMO ALCANÇAR O PONTO DE MAIOR EFICIÊNCIA CONSTRUTIVA AO LONGO DE TODO O PROJETO E CONSTRUÇÃO?

É NECESSÁRIO UM NOVO MECANISMO DE ESTRUTURAÇÃO

QUALIDADE X ESCOPO

P

P: PONTO DE MAIOR EFICIÊNCIA CRESCIMENTO: A: QUALIDADE X ESCOPO < CUSTO X TEMPO B: QUALIDADE X ESCOPO = CUSTO X TEMPO C: QUALIDADE X ESCOPO > CUSTO X TEMPO D: QUALIDADE X ESCOPO < CUSTO X TEMPO


INVERSÃO DA ABORDAGEM ATUAL E PROPOSTA DE UM NOVO MECANISMO MODELO INICIAL

A

RACIONALIZAÇÃO

A.1. LEITURA. DEFINIR OS PARÂMETROS E VARIÁVEIS DO PROJETO; A.2. SUSTENTABILIDADE. EMPREGAR DIFERENTES MATERIAIS PARA DIFERENTES CONDICIONANTES;

MATERIAIS

A.3. AUTOMATIZAÇÃO. IMPLEMENTAR ALGORÍTMOS PARA OTIMIZAÇÃO DE SISTEMAS E PROCESSOS REPETITIVOS; A.4. EXPLORAÇÃO. GERAR POSSIBILIDADES E ENCONTRAR A MAIS EFICIENTE;

B ESTRUTURA

INTEGRAÇÃO

B.1. COLABORAÇÃO. REUNIR DIFERENTES EXPERTISES NA CONSTRUÇÃO DO PROJETO; B.2. GESTÃO. UTILIZAR MECANISMOS DE COMPATIBILIZAÇÃO E GESTÃO DE PROJETO;

FORMA ATENDE AOS REQUISITOS DE PROJETO, FAIXA “C”? SIM

C NÃO

MODELO FINAL

INDUSTRIALIZAÇÃO

C.1. PRÉ-FABRICAÇÃO. USAR PROCESSOS INDUSTRIALIZADOS O QUANTO POSSÍVEL; C.2. OTIMIZAÇÃO. TRANSFORMAR O CANTEIRO DE OBRAS EM “CANTEIRO DE MONTAGEM”; C.3. FLEXIBILIDADE. PROPORCIONAR QUE OS MATERIAIS EMPREGADOS POSSAM SER REUTILIZADOS APÓS A DEMOLIÇÃO;


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ção de código de edificações automatizado o Building Information Modelling (BIM) vem em resna prefeitura ou no escritório do arquiteto. posta a esta necessidade. O BIM se propõe a ser Empreiteiros de grandes projetos podem um grande banco de dados cujas informações são achar essa representação vantajosa para a editáveis e atualizadas em tempo real em um único programação e para os pedidos materiais. modelo virtual. Ele é construído exatamente como Diante das novas conjunturas social, ecoo edifício real, pois cada profissional envolvido ao nômica e tecnológica, projetar e construir artesanallongo do ciclo de vida da construção pode acrescer mente é um anacronismo que leva ao afastamento informações segundo a sua expertise. A atualização da arquitetura da realidade pela desatenção aos proem tempo real de desenhos e tabelas facilita a comcessos. Olhar para os mecanismos de estruturação patibilização entre os sistemas, minimizando, assim, nos conduzirá a não mais construir incoerências durante a obra. Eastman edifícios, mas fabricá-los em partes (2014, p. V) já apresentava o conceiO BIM SE PROPÕE A SER por meio de processos automatizato em 1975 em um trabalho intitulado UM GRANDE BANCO DE DA- dos fora do canteiro de obras, o que Building Description System: por consequência abrirá a arquitetura [Projetado por]...definir DOS CUJAS INFORMAÇÕES elementos de forma inte- SÃO EDITÁVEIS E ATUALIZA- para a engenharia de materiais e de rativa...deriva[ando] se- DAS EM TEMPO REAL EM UM produção. Vemos uma relação mais integrada e horizontal entre profisções planos isométricos ÚNICO MODELO VIRTUAL. ou perspectivas de uma sionais, um novo master builder, um mesma descrição de elenovo estruturalismo. mentos...qualquer mudança no arranjo teria que ser feita apenas uma vez para todos os desenhos futuros. Todos os desenhos derivados da mesma disposição de elementos seriam automaticamente consistentes...qualquer tipo de análise quantitativa poderia ser ligada diretamente à descrição...estimativas de custos ou quantidades de material poderiam ser facilmente gerados...fornecendo um único banco de dados integrado para análises visuais e quantitativas...verifica-

Que os olhos vejam [os transatlânticos]: esta harmonia está aí, função do labor regido pela economia e condicionado pela fatalidade da física. Esta harmonia tem razões; não é o efeito de caprichos mas o de uma construção lógica e coerente com o mundo ambiente. Na ousada transposição dos trabalhos humanos, a natureza está presente, e tanto mais rigorosamente quanto difícil era o problema. As criações das técnicas mecanicistas são organismos que tendem à pureza e sofrem as mesmas


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regras evolutivas que os objetos naturais seus visitantes a vêem ao mesmo tempo que olham que suscitam nossa admiração. A harmoseus cartões postais com imagens nia está nas obras que NA REALIDADE, TODAS AS antigas dos lugares que visitam. São saem da oficina ou da CIDADES ESTÃO EM CONS- paisagens bucólicas que não existem usina. Não é Arte, não é TANTE TRANSFORMAÇÃO E mais, pois deram lugar à metrópole e Sistina, nem Erecteion; ao progresso. O viajante conclui que REINVENÇÃO. são as obras cotidianas há uma sucessão de cidades no mesde todo um universo que mo espaço e ironicamente coloca que, por um acaso, trabalha com consciência, inteligência, preelas tinham o mesmo nome. Na realidade, todas as cisão, imaginação, ousadia e rigor. cidades estão em constante transformação e rein(Le Corbusier, 2000, p. 68)

2. Cidade e edifício, espaço e tempo Evitem dizer que algumas vezes cidades diferentes sucedem-se no mesmo solo e com o mesmo nome, nascem e morrem sem se conhecer, incomunicáveis entre si. Às vezes, os nomes dos habitantes permanecem iguais, e o sotaque das vozes, e até mesmo os traços dos rostos; mas os deuses que vivem com os nomes e nos solos foram embora sem avisar e em seus lugares acomodaram-se deuses estranhos. É inútil querer saber se estes são melhores do que os antigos, dado que não existe nenhuma relação entre eles, da mesma forma que os velhos cartões-postais não representam a Maurília do passado, mas uma outra cidade que por acaso também se chamava Maurília. (CALVINO, I, 1990. pp. 30-31)

Na cidade de Maurília, uma das cidades invisíveis do Escritor italiano Italo Calvino (1923-1985),

venção. “Sucedem-se no mesmo solo [...], nascem e morrem sem se conhecer” de uma forma discreta, mas constante. Atualmente, em tempos liquidez social, essa sucessão de cidades acontece em uma

Praça do Comércio em Coimbra, Portugal - Exemplo de espaço público como preservador de memória.


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velocidade muito maior e de modo não uniforme, isto é, as cidades no tempo não estão justapostas, mas se interseccionam e se sobrepõem no espaço. São redes invisíveis e de complexas relações cujo método projetual urbanístico Moderno top-down não corresponde à realidade. O landscape Urbanism procura capturar esta complexidade urbana em suas transformações e subjetividade de seus moradores com o propósito de construir uma cidade mais sustentá-

paisagística [landscape] para o projeto de uma cidade significa que o projeto urbano está procurando uma forma emergente em vez de uma forma final pré-concebida” (p. 250, tradução nossa). E isso vem da cidade que está em constante transformação, dentro de ciclos de vida e morte, na evolução de algo dinâmico e adaptável que pode ser notado nas micro escalas ou macro escalas, mesmo em projetos urbanos. Perante a complexidade urbana, a rapidez de mudança,

vel ambientalmente, socialmente e economicamente (Waldheim, 2006) Koh (2013) apresenta dez características do landscape urbanism. São elas: (I) Integração: em relação ao rural e o urbano, o espaço construído e o espaço aberto, o que fala também da gestão de ciclos naturais ou artificiais como da vida, da água, de consumo e produção acontecendo no mesmo espaço. (II) Generativo: ou seja, há uma valorização dos processos sobre os resultados: “uma abordagem

incerteza e indeterminação, se faz sensato colocar a cidade e a comunidade em um único sistema – no qual a cidade tem estrutura adaptativa e as pessoas podem transformá-la. (III) Dinâmico: o projeto ao longo do seu desenvolvimento está passível de descobertas de novos problemas e oportunidades. Sendo esta visão fluida, são estabelecidas diretrizes que sempre devem estar presentes no projeto, independentemente da mudança das condicionantes; por exemplo: sustentabilidade, justiça, identidade, comunidade, etc. Traçando


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um paralelo com Corner (2006), ele colocará que isto é um processo ao longo do tempo, afirmando que: “a promessa do landscape urbanism é o desenvolvimento de uma ecologia do espaço-tempo que trata todas as forças e agentes funcionando no campo do urbanismo e considera eles como rede contínua de inter-relações” (p. 30, tradução nossa). (IV) Estratégico: um projeto deve ser capaz de sobreviver às forças do mercado e a pressão política ao longo do tempo; assim são estabelecidas regras e diretrizes de proteção para que o projeto não seja retirado ou descaracterizado. (V) Valor da terra: há o reconhecimento no landscape urbanism do valor da terra e reconhecimento das suas características ecológicas distintas, o que resulta em uma busca pela eficiência tanto no seu uso (infraestrutura) como na gestão de recursos. (VI) Visão de baixo para cima: por natureza, Landscape remete a um lugar específico geograficamente e culturalmente. É algo construído em conjunto com a população segundo seus valores e necessidades. (VII) Fenomenológico: há uma atenção à experiência diária dos moradores que frequentam o espaço no qual se observa. Um projeto urbano não diz só respeito aos sistemas, formas e infraestrutura; fala sobre aspectos subjetivos e sensitivos. (VIII) Ordinário: o projeto deve ser feito para os moradores locais reforçando seu caráter democrático; há uma atenção aos espaços públicos. Corner

(2006) destaca que o imaginário coletivo deve ser a motivação para todo o esforço criativo. O que as pessoas querem para aquele lugar? O autor escreve que (p.32, tradução nossa): Os espaços públicos são, em primeiro lugar, os recipientes da memória e do desejo coletivos, e, em segundo lugar, são os locais de imaginação geográfica e social para ampliar novos relacionamentos e conjuntos de possibilidades. Materialidade, representação e imaginação não são mundos separados [...]. E assim parece que o urbanismo paisagístico é o primeiro e o último de um projeto imaginativo [...]


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(IX) Pós-moderno: o urbanismo não é uma tônico pode costurar-se no tecido urbano ao mesmo tábula rasa moderna; há aqui uma tempo que pode costurar tecidos fragbusca pelos valores e cultura local, DESTE MODO, UM EDIFÍCIO mentados - é um landscape architecuma atenção ao passado. A cidade SE INSERE NA MALHA URBA- ture, uma dicotomia entre o natural e é tanto a pintura quanto o quadro, o NA QUANDO PASSA A FAZER o artificial. Uma tensão na qual os artexto e o contexto. Kelbaugh (2013) PARTE DA NARRATIVA DOS quitetos podem tirar partido do equilípropõe que se rejeite o sistema me- MORADORES OU TRABALHA- brio ou desequilíbrio destes conceitos canicista moderno de uma variável (Jodidio, 2012). Além do edifício estar DORES DA CIDADE. por vez, mas vê a cidade como uma diretamente relacionado com o tempo sobreposição de camadas. e espaço, está associado à subjetivi(X) Eco-feminista: se simbolicamente os eledade dos usuários daquele espaço. Escrevendo somentos urbanos verticais podem remeter ao poder e bre memória e expectativa, Moore, Mitchell e Turnbull à masculinidade, pelo landscape urbanism há uma Jr. (2011, p. 23) escrevem: Às vezes as qualidades mais emocionanhorizontalidade, a cidade para vivenciar a humanites de um lugar não vêm daquilo que lá dade e a cultura, uma atenção à superfície. Corner está, mas das coisas a que ele remete, (2006) aborda esta característica como “o fenômeno através do tempo e do espaço, por meio da superfície horizontal, o plano do chão, o campo de nossas lembranças e esperanças. A de ações” (p.31, tradução nossa). Ele coloca que há imagem e, de maneira ainda mais forte, um interesse contemporâneo pela superfície contíos aromas das flores podem nos lembrar nua onde edifício e paisagem se tornam uma coisa momentos de nosso passado e de formas só pela continuidade da superfície entre coberturas ligadas a poesias ou a quadros de especial e solo. A superfície pode ser entendida como uma insignificado para nós. fraestrutura urbana para o futuro, ou seja, se leva em [...] As ruínas arquitetônicas e as árvores de idade avançada fazem com que a consideração no projeto possíveis mudanças sociais passagem do tempo se torne mais visível e econômicas ao longo do tempo. e transportam nossa imaginação para a Dentro deste contexto, o projeto de um novo história. edifício deve dialogar diretamente com a cidade. Ele A experiência urbana é pessoal porque cada não está sobre uma tábula rasa e não é alheio à hisimagem, cheiro ou textura falam de forma diferente tória local, cultura e valores dos moradores, fluxos diCidade de Londres - Justaposição entre o antigo e o novo. ários e transformações da cidade. O projeto arquite-


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aos usuários do espaço. Várias cidades não só se sucedem ao longo dos anos, mas acontecem simultaneamente em cada morador ou visitante que construirá pelos seus sentidos uma cidade única e invisível. As cidades serão feitas de caminhos, marcos, barreiras, acessos, etc. que transmitirão qualidades como segurança ou medo, conforto ou desconforto, receptividade ou exclusão e assim por diante. Deste modo, um edifício se insere na malha urbana quando passa a fazer parte da narrativa dos moradores ou trabalhadores da cidade, por exemplo, um edifício que causa surpresa pela implantação, forma ou circulação; que permite o relacionamento interpessoal e a troca de experiências - um “estar” no espaço para outras atividades além do programa do edifício; que cria visuais para a cidade e reflexão; que acolhe, é seguro e propicia uma vida saudável para os usuários. Esses são exemplos de elementos que formarão uma identidade dos usuários com o espaço. A arquitetura pode contemplar as dinâmicas urbanas ao se integrar no espaço como também estar pronta para mudanças físicas ao longo do tempo. Quando a cidade ao seu redor mudar morfologicamente, quando houver novas dinâmicas de fluxos ou mesmo uma nova conjuntura econômica e social, o edifício deve se reinventar para que não fique alienado dos usuários do espaço. A descontinuidade entre edifício e cidade pode acontecer porque mesmo que um projeto arquitetônico atenda às necessidades do presente, não quer dizer que responderá às per-

guntas de amanhã. Fazer arquitetura em tempos de efemeridade faz com que o arquiteto projete no espaço e no tempo, prevendo as possíveis mudanças na cidade ou nos usuários que levarão o edifício a se adaptar. Diante de tantas incertezas e transformações, o atual escopo projetual arquitetônico é mais do que responder ao presente, mas criar possibilidades para possíveis respostas futuras.


Interior of a Protestant, Ghotic Church during a Service, Emanuel de Witte, 1669. Ă“leo sobre painel, 44,5cm x 33,5cm. DisponĂ­vel em: https://www.rijksmuseum.nl/en/collection/SK-A-4055 acesso 28 de Maio de 2018. .


Parte II: Embasamento teรณrico para um templo protestante


“EU PENSO QUE TODOS NÓS QUE LEVAMOS UMA VIDA URBANA AGITADA SOMOS GRATOS PELA OPORTUNIDADE DE REFLETIR. [...] EDIFÍCIOS RELIGIOSOS CRIAM UM ESPAÇO PARA REFLEXÃO E CONTEMPLAÇÃO”.

FOSTER, Norman, 2018, tradução nossa - comentando sobre a participação da cidade do Vaticano na Bienal Arquitetura de Veneza de 2018.


Uma das capelas para a participação da cidade do Vaticano na Bienal de Arquitetura de Veneza de 2018. Projeto de Norman Foster. Citação e imagem disponíveis em: https://www.dezeen.com/2018/05/30/norman-foster-vatican-holy-see-pavilion-chapels-venice-architecture-biennale/. Acesso 07 de Junho de 2018.


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Do ponto de vista de quem observa um edifício religioso não pela ótica de um arquiteto, mas por aquela de quem se pergunta a respeito da religião nele praticada, uma análise de tal edifício deveria levar a uma compreensão maior da religião que ele abriga. (ABUMANSSUR, 2004, p. 193)

Nesta parte, faremos uma introdução de pontos históricos e teológicos que servirão de subsídio para o entendimento sobre em que acreditam os cristãos protestantes e como se relacionam com o espaço sagrado. Por se tratar de um tema abrangente, após uma breve introdução histórica. Após estes apontamentos, abordaremos como acontece a relação da igreja com a arquitetura, um panorama dos desdobramentos no Brasil e, por último, como pode ser sua inserção na cidade. 1. Templos cristãos antes da Reforma Protestante Quando falamos em templos, muitas imagens podem ser resgatadas na nossa memória associando-os a espaços e atividades separadas do plano dos homens, conduzindo a uma ambiência sagrada para encontro com alguma(s) divindade(s) ou mesmo para um estado elevado de espírito. Talvez sejam imagens de um pastor na televisão, um padre distribuindo hóstias, monges em procissão vestindo manto laranja, o tocar do atabaque ou o som do mantra. Seja qual for a atividade sagrada para aqueles que a fazem, ela sempre estará inserida no espaço

- mesmo as primeiras atividades que nos vêm à memória quando falamos a palavra templo: de um pastor em uma espécie de galpão lotado de pessoas a um templo de telhado chinês. É curioso e digno de um estudo a parte, a profusão de credos ao longo da história e consequentemente seu registro físico na construção de templos. Por consequência, em um caminho inverso, podemos construir a imagem de uma religião olhando para a sua materialização física, a arquitetura – os templos sempre revelam quem são e no que acreditam seus construtores. Uma pesquisa em um site de buscas por “templo cristão”, entretanto, mostrará uma arquitetura heterogênea – plantas quadradas, retangulares, com torres ou sem torres, uma variedade de cúpulas, janelas, portas, fachadas ou formas. Isso revela a extensa ramificação do Cristianismo ao longo de mais de dois mil anos. No Cristianismo, um templo se confunde com o termo “igreja” que pode significar tanto a comunidade de fiéis quanto o próprio edifício (Michaelis, 2018). No primeiro século, na Ásia Menor, alguns poucos fiéis foram chamados de cristãos porque agiam conforme um judeu chamado de Cristo, morto crucificado em Jerusalém pelo que pregava. Essa comunidade de fiéis crescia principalmente entre as classes sociais pobres, como escravos, e uma classe média baixa e um número menor de ricos e nobres. Eles anunciavam que somente Deus era digno de adoração, o qual enviou seu filho para resgatar a humanidade e conduzi-la para ele mesmo - isso é uma “boa


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No século XVI, iniciou-se a construção da atual basílica de São Pedro no Vaticano. O templo Católico Apostólico Romano foi construído no lugar da antiga basílica do século III.


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notícia”, expressão que significa “Evangelho” (Keller, uniu ao Estado Romano, tornando-se a religião oficial 2014). Isso não seria um problema para um Império do império. A partir de então, a igreja, que antes era Politeísta, como o Romano, se os cristãos não falasperseguida, além de banir o culto pagão, iniciou um sem de exclusividade de culto. Porém, ao passo que processo de acúmulo de poder, riqueza e centralidanão reconheciam a divindade de Marte, Júpiter, Diade em Roma na sombra do Estado. Estruturava-se na ou Minerva, na mesma medida não prestavam cula Igreja Católica Apostólica Romana. Era necessária to a César – “para as autoridades romanas”, escreve uma nova tipologia de templos neste novo contexto Cairns (2008, p. 75), “isso só podia significar que eles social, político e econômico (Cairns, 2008; Ching, Jarestavam tramando uma conspiração contra a seguzombek, Prakash, 2016). rança do Estado”. Por essa convicção, os cristãos foO templo nas civilizações antigas não era ram perseguidos e muitos deram a vida em espetácufeito para ser acessado por pessoas comuns por los imperiais. Conforme mais cristãos morriam, mais ser um espaço sagrado, mas apenas por sacerdotes pessoas aceitavam a fé cristã, cujas que intercediam em favor do povo por reuniões secretas aconteciam em cameio de sacrifícios diversos. Por isso, O CRISTIANISMO, PORÉM, sas adaptadas (a mais antiga conheera essencialmente um recinto fechaPROPUNHA UM CULTO COLEcida é de 232d.C. em Dura Europos do para abrigar a estátua de um deus TIVO DENTRO DO TEMPLO. na Síria), no templo judaico (até este – ou um altar, como na religião judaiser destruído em 70d.C.), auditório ca. O Cristianismo, porém, propunha público de escolas, nas sinagogas, quando era perum culto coletivo dentro do templo. Em todas as cidamitido, ou nas catacumbas. Cairns (2008, p. 70, 81) des Romanas havia espaços cobertos destinados à destaca que “o lugar não era tão importante como o discussão de assuntos públicos chamados de “basílimodo de se encontrarem para ter comunhão uns com cas”, como a ágora na Grécia antiga. Tinham entrada os outros e cultuar a Deus” e aponta que “estimativas lateral para um grande espaço interno flanqueado por sobre a população da Igreja por volta do ano 300 vacolunas e em uma das pontas uma abside onde ficariam entre 5 e 15 por cento da população do Império, va o tribunal. Esses espaços foram facilmente adapque girava em torno de 50 a 75 milhões”. Até que em tados para se tornarem templos cristãos. O acesso 313 d.C., no já decadente Império Romano, o imperapassou a ser em uma das suas extremidades criando dor Constantino deu liberdade de culto aos cristãos, um eixo de circulação longitudinal até a abside, que depois dele mesmo passar a professar a fé cristã um passaria a receber os assentos para o clero e o altar ano antes. Chegando em 391 d.C., o Cristianismo se (Cairns, 2008; Ching, Jarzombek, Prakash, 2016) -


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de certa forma há aqui uma continuidade da cultura clássica: apesar do povo acessar a nave, a classe sacerdotal continuou intermediando o Homem comum e a divindade tanto teologicamente quanto na arquitetura. Cairns (2008, p. 103) defende que “neste período, esses templos geralmente se caracterizavam por uma grande simplicidade, mas passaram a ostentar um esplendor cada vez maior a partir de 313, quando a igreja passou a contar com os

favores do Estado”. Nos séculos seguintes, as igrejas ganharam transeptos cada vez maiores, torres sineiras, deambulatórios e capelas no período que ficou conhecido como românico. Em sucessão, o Gótico trocaria as paredes espessas e a escuridão pelas paredes esbeltas e com grandes vitrais – Deus estava na luz. Norberg-Schulz (1980, pp. 177-178) escreve: [...] in the Gothic church optical or symbolic dematerialization is replaced by a real dissolution of the wall and it becomes transparent and interact with the environment. [...] Basically it was the concretization of a heavenly image and through its open structure the image was transmitted to the entire community. At the same time transparency offered a new interpretation to Christian light symbolism. In the cathedrals colored glass transformed natural light into a mysterious medium which seemed to prove the O Partenon - construído no século V a.C. em Atenas - foi dedicado a deusa protetora da cidade, Atena. O templo abrigava uma estátua da deusa com 10m de altura. Assim como os romanos fariam posteirormente em seus templos, somente sacerdotes poderiam adentrá-lo. Os rituais coletivos aconteciam ao ar livre. Planta disponível em: http://www.ysma.gr/en/parthenon. Acesso: 29 de Maio de 2018.


Da esquerda para a direita e de cima para baixo: planta da basílica de Pompeia, cidade romana destruída em 79 d.C. por uma erupção do Vulcão Vesúvio; planta da basílica de São Pedro em Roma, construída pelo Imperador Constantino no século III; perspectiva da basílica de São Pedro. Imagens disponíveis em: http://www. vitruvius.be/pompei.htm; https://objectspacebuildingplace.wordpress.com/2015/07/18/ old-st-peters-basilica/. Acesso 29 de Maio de 2018.


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immediate presence of God.

Em 1517, um monge agostiniano alemão fixa nas portas da igreja de Wittenberg noventa e cinco teses contra a venda de indulgências (os fiéis poderiam pagar para adquirir a salvação ou reduzir seu tempo ou de um parente no purgatório). Martinho Lutero inicia, assim, um processo que viria a ser chamado de Reforma Protestante e que nos anos seguintes levaria a uma cisão na igreja originando a igreja Protestante. Se olharmos para o seu contexto, a Reforma acontece em um tempo de profundas mudanças sociais, políticas, geográficas e econômicas. As relações medievais de clero, nobreza e camponeses não eram suficientes para explicar o mundo; começava a surgir novos arranjos sociais, urbanos e burgueses – o indivíduo é descoberto. O mundo deixou de ser bidimensional nas artes e plano na astronomia, agora há perspectiva, profundidade, ponto de fuga, bem como seria comprovado que a Terra é redonda matematicamente e pelas grandes navegações. Os fenômenos deixaram de ser explicados por uma ação sobrenatural, mas passariam a ser descritos por funções físicas. No campo político, os fragmentados estados europeus, insatisfeitos com a submissão ao papado, achariam no protestantismo um escape para se afirmarem - é o fundamento para o surgimento do Estado Moderno (Cairns, 2008; Ferreira, 2017). Se voltarmos e olharmos os reformadores do ponto de vista religioso protestante - e aqui incluímos, entre outros, Calvino (1509-1564), Zwingli

(1484-1531), Bucer (1491-1551), Brez (1499-1570) e Melanchthon (1497-1560), não houve uma busca de criar algo novo, nem mesmo de se fundar uma nova religião, mas restaurar os princípios elementares do cristianismo que haviam se perdido ao longo de um milênio de história da Igreja Católica Apostólica Romana. Justamente por esse anseio e atenção foram chamados de Evangélicos (Ferreira, 2017). Os templos cristãos católicos já não comportavam o culto cristão protestante por toda essa nova cosmovisão social e teológica. A relação do homem com o espaço sagrado foi diretamente modificada pela reestruturação teológica (Abumanssur, 2004). 2. Templos cristãos protestantes Muito do que podemos observar hoje na relação dos fiéis com templos evangélicos, se dá em consonância com a teologia reformada do século XVI. Há na tipologia arquitetônica protestante uma busca por racionalização e simplicidade, demonstrada em austeridade de ornamentação, iconoclastia, foco na exposição do sermão e uma visão funcional do espaço. Abumanssur (2004), doutor em Antropologia e professor do departamento de Teologia e Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, descreve como a arte e a arquitetura passaram por uma laicização durante o Renascimento, em especial nos países baixos no século XVII. Ele Escreve:


Interior of a Protestant, Ghotic Church during a Service, Emanuel de Witte, 1669 Óleo sobre painel, 44,5cm x 33,5cm A pintura de Witte não retrata uma igreja específica, mas reúne elementos de outras igrejas. A nave, por exemplo, é baseada na Oude Kerk em Amsterdã. Vemos uma tipologia de templo protestante com planta centralizada no púlpito e austeriadade de ornamentação. Disponível em: https://www.rijksmuseum.nl/en/collection/SK-A-4055 acesso 28 de Maio de 2018


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A laicização da demanda pôs as obras de do espaço para dar destaque necessário arte em trilhos que conduziram-nas para ao lugar da pregação. uma maior autonomia. [...] Os retratos ad(ABUMANSSUR, 2004, p. 98-99, grifos quiriram uma face mais humana e natural. nossos) Os símbolos, quando presentes, já não A arquitetura dos templos protestantes inseapontavam mais para uma realidade que rida no contexto renascentista passa por um processo transcendia o cotidiano do homem burde racionalização em lugar da superstição e misticisguês. mo. Na relação com o credo, vemos a centralidade e A arquitetura dos templos acompanhou a suficiência das Escrituras cuja exposição deveria ser mesma intuição. Ela perdeu a visão oblíqua compreensível para os que ouvem e do sagrado e se voltou HÁ NA TIPOLOGIA ARQUI- livre de distrações. O público deveria para a busca da imanênver e ouvir nitidamente aquele que exTETÔNICA PROTESTANTE cia da vida religiosa, traduzida no maior destaque UMA BUSCA POR RACIONA- põe a Palavra, pois somente ela seria para aspectos racionais e LIZAÇÃO E SIMPLICIDADE, capaz de produzir Fé mediante a Grautilitários de um edifício DEMONSTRADA EM AUSTERI- ça de Deus e por meio de Cristo, uma bem como a sua funcioDADE DE ORNAMENTAÇÃO, racionalidade que se estendeu para a nalidade. O próprio serviornamentação: ICONOCLASTIA, FOCO NA ço religioso pauta-se pelo EXPOSIÇÃO DO SERMÃO E [A ornamentação] de um templo protespapel de destaque que a tante era a mais despojada possível. As palavra pregada tem em UMA VISÃO FUNCIONAL DO paredes nuas e o ambiente de austeriESPAÇO. relação a qualquer outro dade visavam concentrar a atenção do elemento litúrgico. Assim, ouvinte na pregação do pastor ou líder o lugar onde se prega o sermão é o vértice religioso e evitavam qualquer elemento para onde convergem as atenções e, condispersivo. Quando muito, permitia-se uma sequentemente, as soluções arquitetônicas frase extraída da Bíblia em uma ou outra apresentam-se em função deste vértice. As parede e mesmo assim a intenção era a igrejas construídas nesse período [Renasde educar o povo. A pedagogia religiosa cimento], em geral, possuíam uma planta desloca-se das imagens para as palavras, centrada, isto é, onde o púlpito ocupava o da emoção – sobretudo o temor – para a lugar principal e os fiéis eram dispostos em razão. torno dele. Nas igrejas herdadas de outras (ABUMANSSUR, 2004, p. 99) tradições ou épocas havia uma adaptação

Somado a isso, o discurso de centralidade


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na obra de Cristo aproximou as igrejas da iconoclastia mediante uma interpretação literal de trechos bíblicos que condenam a fabricação de imagens para adoração. Falando sobre o posicionamento de Calvino sobre a arte, Abumanssur (2004, p. 123-125) escreve: [...] A arte tem um papel subalterno, ornamental, e já não fala das coisas divinas, já não retrata a ordem celestial. O sagrado se distancia do que é representado. O divino na obra já não provém mais do tema representado, mas da interioridade do artista. É ele o possuidor da intuição divina. O divino aqui, está na iluminação recebida de Deus

pelo artista. [...] A arte que assume pretensão salvífica, caminho alternativo, compete com a ética religiosa e como tal deve ser denunciada. Rejeitada, a arte está liberada do compromisso com a representação do Ser ou com a salvação.

Gombrich (1999) destaca que nesse período os artistas na Alemanha, Holanda e Inglaterra tiveram que se reinventar deixando de pintar retábulos ou afrescos em igreja, dando lugar à pintura de retratos, ilustração de livros ou temas cotidianos, isso porque muitos protestantes faziam objeção “à existência de Iconoclasm in a Church, Dirck van Delen, 1630 Óleo sobre painel, 50cm x 67cm O quadro retrata a ação de protestantes fanáticos que destruíram altares, estátuas e vasos sagrados de igrejas católicas em Agosto de 1566 na Holanda. Disponível em: http://hdl.handle. net/10934/RM0001. COLLECT.437407. Acesso 28 de Maio de 2018


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quadros ou estátuas de santos em igrejas, considerando um sinal de idolatria papista” (p. 374). A mesma austeridade vista na arquitetura, ornamentação e arte pode ser notada na liturgia dos cultos. Nas palavras de Abumanssur (2004, p. 99): A liturgia também obedecia ao mesmo padrão de simplicidade eliminando qualquer pompa de ritual. [...] Daí que os cultos adquiriram um caráter de reunião de fiéis e muitas das casas de cultos eram simplesmente conhecidas como “casas de reunião”. Essas casas de reuniões, pela despretensão arquitetônica e ritualística, apontavam para uma espiritualidade que tinha por origem e destino a comunidade e, por detrás dela, a sombra do indivíduo.

Há o conceito de separação de igreja visível e invisível. A igreja transcende as paredes dos templos e acontece no cotidiano, haja vista que para o culto não são necessários altares e objetos sagrados, apenas a presença de fiéis. Temos, deste modo, que as tipologias de templos Católicos não atendem mais ao Credo Protestante. O corte basilical com três ou cinco naves não se faz mais necessário, pois não há a necessidade de capelas e altares secundários – como vistos até então nas naves laterais ou em deambulatórios de catedrais – inclusive a separação por naves pode ser um inconveniente, pois as arcadas retirariam a visibilidade para o púlpito. Na cabeceira da igreja, não são mais requisitados o coro e a abside, pois não há

Temple de Charenton, Jean Marot, 1686 Disponíveis em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:L%27Architecture_fran%C3%A7aise_(Marot)_BnF_RES-V-371_130r-f275_Temple_de_Charenton,_Vue_en_perspective_du_dedans_(adjusted).jpg e https://commons. wikimedia.org/wiki/File:L%27Architecture_fran%C3%A7aise_(Marot)_BnF_ RES-V-371_131r-f277_Temple_de_Charenton,_Plan_et_Profil_(adjusted).jpg. Acesso 17 de novembro de 2018


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uma hierarquização entre clero e demais fiéis, assim como não há um altar mor pela ausência de imagens. Se o sagrado não está na forma, mas no uso e o culto transcende o espaço, a planta não precisa ter forma de cruz, logo são retirados o transepto e o cruzeiro. A relação com o divino não é mais entendida como uma procissão em uma longa planta longitudinal até “Deus”, intermediada pelo clero ou muitas capelas. O espaço, agora, deve reforçar a igualdade entre os fiéis, cujo único intermediário entre Deus e os Homens é o próprio Cristo apresentado pela Palavra bem como deve ser funcional para que haja a clara compreensão do que está sendo dito. Abumanssur (2004, p. 112) destaca que: A planta longitudinal nunca deixou de estar presente entre os protestantes, pois muitas igrejas eram adaptações de templos católicos, tomados ou doados para comunidades reformadas. Essas adaptações consistiam em eliminar a estatuária, o altar, eventualmente os vitrais. Como no protestantismo não há ritos processionais, o arranjo espacial era refeito para atender a uma liturgia na qual a mobilidade das pessoas não era prevista. O espaço, que nas antigas basílicas formava as naves laterais, foi ocupado por bancos, impedindo a deambulação e, certamente, a dispersão de atenções. [...] as capelas e altares secundários, comuns nas plantas de estilos românico e gótico, [foram] simplesmente abolidos. Qualquer pintura, entalhe, alto ou baixo relevo

Interior of the Oude Kerk at Delft during a Sermon, Emanuel de Witte, 1651 Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Emanuel_de_Witte_-_Interior_of_the_Oude_Kerk_at_Delft_during_a_Sermon_-_WGA25811.jpg Acesso 17 de novembro de 2018


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Oude Kerk in Delft. Igreja construída no séc. XIII como templo Católico. Após a Reforma Protestante foi adaptado para esta nova forma de culto. Disponíveis em: https://oudeennieuwekerkdelft.nl/old-church/ tower/history. e https://oudeennieuwekerkdelft.nl/old-church/ interior/groundplan Acesso 17 de novembro de 2018

Interior of the Paradis temple, J. Perrissin, 1564-1567.

Disponível em: http://temples.free.fr/english/lyon/paradis.htm. Acesso 17 de novembro de 2018


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era nivelado ou caiado de branco. Palavras como austeridade, simplicidade, sobriedade orientavam as ações e intenções gerando edifícios de paredes limpas e lisas.

Sobre as diferenças de templos católicos e protestantes no século XVIII na Inglaterra, Gombrich (1999, p. 457) escreve que “uma igreja desse tipo [protestante] é projetada principalmente como uma sala de reunião onde os fiéis se congregam para o culto. Seu propósito não é evocar visões de um outro mundo mas, pelo contrário, propiciar recolhimento. a meditação”. Nos novos templos, o sagrado é mais temporal do que espacial. Abumanssur (2004, p. 101) afirma: A teologia protestante não trabalha com a ideia de espaço sagrado. No entanto, para ela há tempo sagrado que é o da ação de Deus no mundo. A igreja, que se entende como comunidade de fiéis, quando reúne-se para o culto ou dá testemunho de fé, sacraliza o lugar onde está. O espaço sagrado é então, qualquer lugar onde a comunidade reúne-se ou atua. [...] O lugar da igreja não é espacial, mas temporal.

Podemos nos questionar, então, porquê templos protestantes são construídos. Discutindo essa questão, Abumanssur (2004, p. 101-105) afirma que: De fato, os protestantes têm uma compreensão sobre o significado do templo que os remete mais às necessidades e interesses humanos do que aos desejos divinos. O

templo é a expressão da vida da comunidade, sua riqueza espiritual ou pobreza material estão misturadas na argamassa das paredes. A suntuosidade ou o despojamento estão mais próximos do estilo de vida dos fiéis do que alguma intenção orientada para o divino. [...] entendem que “Deus não habita em templos feitos por mãos humanas”, eles os erigem como demonstração de fé e amor a Deus e como testemunho, símbolo, marco, e expressão de esperança de fé cristã. No entanto, a despeito de toda teologia laicizante, há uma atitude subjacente em relação ao templo o qual é percebido pelo conjunto de fiéis como um espaço diferenciado e usado com exclusividade para o culto. É uma posição para a qual não há defesa teológica aceita pelos próprios membros da igreja. É um comportamento subliminar, um hábito adquirido. Ao mesmo tempo que elabora um discurso laicizante, o protestante mantém uma postura de reverência quando está no lugar de culto.

A igreja protestante apresenta este dualismo entre um discurso laicizante do espaço e de reverência temporal durante o culto - sendo que as diferentes denominações evangélicas tratam a questão de maneira diversa dentro deste intervalo. Por exemplo, existem igrejas que alugam salas de teatro, de hotéis ou casas de show por um horário semanal para realizar o culto coletivo. Outras têm espaços tão flexíveis


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que seu “auditório” pode ser rapidamente desmontado e se transformar em uma quadra poliesportiva, receber uma pista de skate ou mesmo oferecer uma refeição para a comunidade, isto porque todas estas atividades podem ser uma expressão de louvor a Deus, como já falamos anteriormente. Outras igrejas podem não achar apropriado atribuir usos não religiosos para a construção ou estabelecem um certo limite no emprego dos mesmos.

O meio evangélico brasileiro é marcado pela heterogeneidade. Mesmo as tentativas de agrupamento são cheias de exceções. Entretanto, talvez, a classificação mais aceitável é separá-los em três grandes grupos: igrejas históricas, ou de missão ou tradicionais; pentecostais e neopentecostais (Abumanssur, 2004). De forma efetiva, a igreja protestante entrou no Brasil em 1810 com o tratado de Comércio e Navegação. Nele os ingleses residentes no Brasil pode3. Igreja protestante no Brasil riam construir igrejas desde que “[...] [...] é que as igrejas não as sobreditas igrejas e capelas sejam são os edifícios, nem os A IGREJA PROTESTANTE construídas de tal modo que exterespaços físicos, e igreAPRESENTA ESTE DUALIS- namente se assemelhem a casas de jas locais não são locais. MO ENTRE UM DISCURSO habitação; e também que o uso de São pessoas cujo centro LAICIZANTE DO ESPAÇO E sinos não lhes seja permitido para o não está em pessoas. DE REVERÊNCIA TEMPORAL fim de anunciarem publicamente as Homens e mulheres com DURANTE O CULTO. horas do serviço divino” (Cf. Duncan uma área de ação terreA. REAILY, História documental do na, mas contemporâneos protestantismo no Brasil, p. 26, Apud apenas no céu. Gente! (ÚRIA, Samuel in CAVACO, 2017) Abumanssur, 2004, p. 100). Isso foi reafirmado na constituição de 1823, artigo 5º: “A religião catholica Neste capítulo daremos um panorama da apostólica romana continua a ser a religião oficial do estrutura da igreja protestante no Brasil. Iniciaremos Império. Todas as outras religiões serão permitidas pontuando os três agrupamentos mais aceitos – as com seu culto doméstico ou particular, em casas para igrejas históricas, pentecostais e neopentecostais - e isso destinadas, sem forma alguma exterior de temem seguida falaremos brevemente das suas relações plo” (Constituição Política do Império do Brasil. Rio de com o espaço. Janeiro, Eduardo e Henrique Laemmert, 1863, Apud Abumanssur, 2004, p. 100). 3.1. Pluralidade Assim, Mendonça (2005) afirma que ao


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longo do século XIX houve um protestantismo de Cristo (1955) e Deus é amor (1962). É interessante imigração, isto é, os imigrantes que aqui chegavam notar que a primeira dessas três foi fundada por uma mantinham sua prática de culto protestante como asmulher, Aimee Semple McPherson, nos Estados Unisegurava o tratado de João VI de 1810. Mendonça dos em 1923; os outros dois são movimentos brasi(2005) coloca, ainda, que já em 1820 “os ingleses leiros oriundos da fragmentação do pentecostalismo. passaram a realizar cultos no templo construído no Além disso, estas denominações foram as primeiras Rio de Janeiro e, mais tarde, em outras partes do Braa fazer uso do rádio e grandes concentrações em essil, notadamente em São Paulo, pelos empregados tádios, cinemas e teatros. Abumanssur (2004) afirma da Estrada de Ferro que se construía entre Santos e que nas décadas de 50 e 60 era comum “fazerem reuJundiaí” (p. 53). Ao longo do século XIX, outros gruniões em tendas como as de circo” e conclui que “a pos de imigrantes protestantes também se estabelefacilidade de se armar e desarmar as tendas davam ceram em solo nacional, como norte-americanos, esa elas muita mobilidade podendo com isso abranger coceses, alemães, franceses, suíços, vastas áreas territoriais” (p. 87). DE FORMA EFETIVA, A húngaros, entre outros. Estão incluíNa década de 1970 surgem IGREJA PROTESTANTE dos neste grupo Anglicanos, Congreas primeiras igrejas neopentecostais, ENTROU NO BRASIL EM 1810 gacionais, Batistas e Presbiterianos. que hoje formam o grupo mais diverso COM O TRATADO DE COMÉRNo início do século XX, chedas igrejas protestantes brasileiras. CIO E NAVEGAÇÃO. gou ao Brasil a primeira onda de penAs mais representativas hoje são: tecostais pelas igrejas Congregação Igreja Universal do Reino de Deus, Cristã do Brasil em 1910 e a Assembléia de Deus em Internacional da Graça de Deus, Bola de Neve, Sara 1911. Abumanssur (2004) escreve que estas foram a Nossa Terra, Comunidade da Graça, Renascer em praticamente as duas únicas igrejas pentecostais por Cristo (Abumanssur, 2004). Este grupo tem como púquarenta anos e que “desde as suas origens no Brablico alvo as massas, por isso valorizam o uso dos sil foram marcadas por profundo anticatolicismo, pela meios de comunicação televisivos. Além de manter ênfase no dom de línguas, pelo sectarismo em relaas características dos outros dois grupos de penteção ao mundo e pela atitude ascética na vida prática” costais, “essas igrejas entendem que participam de (p. 86). uma ‘guerra espiritual’ entre Deus e o diabo e aquilo Na década de 1950 e início da de 1960, este que acontece aqui está, de alguma forma, relaciogrupo se amplia com mais três denominações: Igrenado com esta guerra” (Abumanssur, 2004, p. 87). ja do Evangelho Quadrangular (1950), O Brasil para Muitas delas, inclusive, apresentam símbolos, ritos e


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crenças provindas de um sincretismo religioso entre o ser as imagens mentais ou as de retórica presentes catolicismo popular e religiões afro-brasileiras como a no sermão”. (p. 95). umbanda (Abumanssur, 2004). As pessoas que se declaram evangélicas Mesmo que essa divisão temporal seja posatualmente formam 22,2% da população brasileira, sível, ela é cheia de nuances e exceções, procescomo aponta o censo de 2010 do IBGE. Percebemos sos de afastamento e proximidade de umas com as um rápido crescimento a partir da década de 1980 e outras. Por exemplo, na década de 1990, durante o simultaneamente uma queda no número de fiéis catóperíodo de implantação da terceira onda, surge nas licos quando olhamos a série histórica – se essa taxa periferias de São Paulo igrejas de nomes estranhos se manter, como aponta Azevedo (2012), o número que estão mais próximas do segundo grupo que do de cristãos protestantes será igual ao de cristãos caterceiro pelo ascetismo e rejeição do mundo (Abutólicos em trinta anos - um ponto de inflexão em um manssur, 2004). Cada grupo, mesmo cada denomipaís tradicionalmente católico. nação ou até igreja, possui elementos CADA GRUPO, MESMO comuns a outras ou específicos. 3.2. Templos Sobre Protestantes históri- CADA DENOMINAÇÃO OU ATÉ A resposta é necessariamente negativa IGREJA, POSSUI ELEMENse buscarmos nos lugares [templos procos, pentecostais e neopentecostais TOS COMUNS A OUTRAS OU testantes] expressões objetivas do sagraAbumanssur (2004) escreve que: do. O que se vê ali é um absoluto silêncio ESPECÍFICOS. [...] [eles] têm em suas maneiras ser um lado racional e um espiritual. Nisso se assemelham, mas não são racionalidades e espiritualidades distintas. Os pentecostais [incluindo os neopentecostais] com espiritualidade veem o sagrado como algo racional e manipulável. Os protestantes [históricos] com sua racionalidade percebem-no como algo distante e infenso a manipulações. (p. 94)

Apesar das diferenças, o autor coloca que nos três grupos, “no âmbito da estética, o sagrado não é mediado pelo espaço ou pela imagem, a não

quanto à estética e à arquitetura. Mas a resposta também pode ser positiva se entendermos que tal silêncio possui grande eloquência a respeito do que se cala. Um lugar cambiante, constantemente ressignificado, apropriado pelo fiel a cada reunião, visto e falado como um lugar diferenciado nos procedimentos litúrgicos. (ABUMANSSUR, 2004, p. 196

Como podemos observar, no Brasil, atualmente, é comum que templos evangélicos não tenham aparência de templos. Abumanssur (2004) elenca pelo menos quatro motivos que proporcio-


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nam este fenômeno: (1) as comunidades possuem tura do neogótico é seletiva, se “preserva as formas recursos financeiros limitados para esse tipo de inindicativas: janelas, pórticos, às vezes transepto, mas vestimento e uma certa limitação devida à pluralidade se livra das referências simbólicas de um mundo que denominacional; (2) pelo pouco tempo da igreja propertence ao passado” (Abumanssur, 2004, p. 122). testante em solo nacional; (3) quando, na República, Em linhas gerais, na construção de um novo os protestantes recebem liberdade para construírem templo protestante não há uma discussão sobre sigtemplos, não havia um estilo prevalecente que sernificado da forma e estilos. Não raro, há uma mistura visse de base para uma leitura nacional, consequensem critério de elementos. Uma comunidade semtemente não houve a formação de um estilo e (4) o pre dá mais importância à questão funcional que à próprio discurso de despojamento e simplicidade estética, inclusive fazendo-o multifuncional, pela falcontribuíram para que não houvesse o avanço nesta ta de recursos. O projeto é feito por associação de área. soluções que deram certo em outros templos e que No âmbito internacional, os cabem no orçamento da igreja. AbuNO BRASIL, ATUALMENTE, manssur (2004, p. 105) escreve que: estilos mais representativos foram o É COMUM QUE TEMPLOS A decisão de construir um templo é excluneoclássico e o neogótico. O primeiro diz respeito à racionalidade da fé EVANGÉLICOS NÃO TENHAM siva das comunidades de fiéis. As questões arquitetônicas, com raríssimas exceprotestante. A “disposição geométrica APARÊNCIA DE TEMPLOS dos elementos, a simetria na organização dos espaços, as proporções volumétricas, tudo faz entender que é um lugar feito para que o homem se sinta em um ambiente confortável ao espírito” (ABUMANSSUR, 2004, p. 116). Já o neogótico mostra uma face da fé com um deus soberano onde a “verticalidade de seus espaços e imensurabilidade de suas dimensões, a linguagem arquitetônica expressa no gótico, fala de realidades que transcendem a horizontalidade da vida cotidiana e coloca o ser humano em uma perspectiva que não é a dele” (Zevi, Saber ver arquitetura, p. 92. Apud Abumanssur, 2004, p. 120). No Brasil, entretanto, esta lei-

ções e com muita dificuldade, nunca são encaradas por elas como um problema teológico ou doutrinário. [...] As discussões das relações entre arquitetura e doutrina ficam restritas a uma elite teológica, passando ao largo dos interesses dos pastores e fiéis.

O sagrado será transitório e não fixo para protestantes históricos, pentecostais e neopentecostais. Abumanssur (2004) coloca que “enquanto o protestantismo histórico consegue uma dessacralização parcial do espaço de culto, os pentecostais, segundo Campos, caminham mais longe com essa ideia. [...]” (CAMPOS, L. S. Teatro, Templo e Mercado, p. 117


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Apud Abumanssur, 2004, p. 181). Há aqui uma tensão:

dade em todas as esferas – na prática do dia a dia, na tomada de decisões e construção de novos templos - são construídos nas periferias urbanas pelo custo da construção ou adaptam espaços na área central devido às restrições legais (Abumanssur, 2004). pentecostais se aproximam desta relação:

De um lado, uma teologia que transfere para o tempo da reunião de fiéis o poder de sacralização do espaço. Por outro lado, uma tradição fundada em épocas de maior carência material dos membros dessas igrejas. A indiferença quanto à importância do lugar em que se celebra pode, paradoxalmente, autorizar templos luxuosos que são encontráveis em comunidades mais abastadas. (ABUMANSSUR, 2004, EM LINHAS GERAIS, NA p.181)

“para ambos é a presença dos fiéis que santifica o lugar. E ambos têm uma atitude de respeito e circunspecção quando presentes em seus templos. Essa atitude deriva de hábitos arraigados que, paradoxalmente, não têm raízes nas suas concepções teológicas” (ABUMANSSUR, 2004, p. 193).

Abumanssur (2004) proble- CONSTRUÇÃO DE UM NOVO Os neopentecostais, entrematiza esta desterritorialização do sa- TEMPLO PROTESTANTE NÃO tanto, radicalizam a dessacralização grado, afirmando que quando falamos HÁ UMA DISCUSSÃO SOBRE do espaço olhando-o de modo estritade sua inserção na cidade, falamos de SIGNIFICADO DA FORMA E mente funcional: ESTILOS. não-lugares porque os templos não Afastaram os fiéis de qualquer comprosão reconhecidos como marcos urbamisso ou identificação com o templo. Não nos; antes passam invisíveis se perdendo na malha há uma comunidade de frequentadores urbana, pois são dependentes da afirmação do fiel que opine e decida sobre qualquer aspecto físico do edifício. Com esse expediente, foi para sacralizar o espaço. Um segundo aspecto é a eliminada a solidez do lugar sagrado ao se não-arquitetura, por relerem e ressignificarem espafazer recair o acento da estrutura organizaços que não foram projetados para tal fim religioso cional na transitoriedade e fluidez de fiéis. - todo espaço pode se transformar em uma igreja. (ABUMANSSUR, 2004, p. 193) Curiosamente, uma condição de não-lugar e não-ar Os templos protestantes no Brasil possuem quitetura próxima da igreja protestante no século XIX. características comuns de austeridade e iconoclas Por outro lado, protestantes históricos e netia desde os primórdios da sua inserção em território opentecostais possuem um posicionamento antagônacional. Os principais pontos da Reforma do século nico. O primeiro grupo mantém o espírito de comuniXVI foram o fundamento desta relação espacial que


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no Brasil somadas com condições adversas de ima afetar a saúde. E discute que a religião pode conplantação no período do Império, destribuir para a saúde mental de uma OS TEMPLOS PROTESTANcentralização e carência de recursos população: TES NO BRASIL POSSUEM A pesquisa sugere que frequência regular contribuíram para um sagrado transià igreja está relacionada a diminuições CARACTERÍSTICAS COMUNS tório - em escalas diferentes dependendo da denominação: as históricas DE AUSTERIDADE E ICONO- no risco de morte e melhora na saúde. Algumas dessas influências parecem ser e pentecostais guardam uma certa CLASTIA DESDE OS PRIMÓRindiretas – por exemplo, aquelas pessoreverência enquanto que a neopente- DIOS DA SUA INSERÇÃO EM as que vão à igreja frequentemente são TERRITÓRIO NACIONAL. costal é totalmente despojada, quase em uma relação de clientela. Em todo o caso, a efemeridade do edifício dá uma desejada perspectiva de flexibilidade para o culto, do mesmo modo que, em muitos casos, cria espaços invisíveis, ilegíveis, para os não frequentadores do espaço religioso.

menos propensas a abusar de álcool e do cigarro – mas outras podem ser diretas – aquelas pessoas que frequentam igreja regularmente demonstram bem-estar subjetivo mais alto. Em outras palavras, elas simplesmente se sentem melhor. (PAPALIA, 2013, p. 523)

Diante deste contexto, podemos estabelecer as seguintes diretrizes projetuais para o templo pro4. Uma igreja para a cidade testante que se volta para a cidade: (1) Estar localizado em centros urbanos As instituições religiosas podem reforçar o (quando buscam atender a cidade e região) a fim bem estar social de um bairro, cidade ou região. Um de que seja de fácil acesso por diferentes modais de credo genuíno denuncia as injustiças sociais, acolhe transporte além de manter um diálogo direto com a pessoas vulneráveis socialmente e incentiva princícultura local; pios éticos e de cidadania. A psicóloga Diane Papalia (2) Relacionar-se com o (2013) discorre sobre o desenvolAS INSTITUIÇÕES RELIGIOSAS sagrado temporalmente; vimento humano em cada uma PODEM REFORÇAR O BEM ESTAR (3) Reconhecer a espadas fases ao longo da vida e as SOCIAL DE UM BAIRRO, CIDADE cialidade do sagrado em atividades influências comportamentais sobre OU REGIÃO. ordinárias; a saúde. Sobre a meia idade, ela (4) Permitir a construção à defende que a nutrição, tabagismo longo prazo bem como a desmontagem do edifício, e consumo de álcool e a atividade física continuam


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sua realocação ou transformação de programa. (5) Criar uma identidade da comunidade de fiéis com o edifício e o local; (6) Propiciar uma arquitetura que fale sobre a pluralidade do meio evangélico brasileiro bem como a necessidade de constante reforma e crítica teológica. 5. Referências programáticas Os templos a seguir foram usados como base para a formação do programa deste projeto. Apesar do seu porte médio, todos fazem do espaço religioso um espaço multifuncional em função da comunidade. Destacam-se os diversos espaços para aulas e atividades coletivas, inclusive atividades esportivas e de arte.


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Projeto referencial: Igreja Presbiteriana Coreana

- Localização: New Jersey, EUA; - Arquitetos: Arcari + lovino Architects; - Ano do projeto: 2013; - Capacidade: 380 pessoas; - Área construída: aproximadamente 3050m²; - Terreno: 24 hectares; O objetivo do edifício é servir a comunidade através do culto e estudo religioso, além de incentivar a recreação, arte, música e refeições. Por esse motivo, seu auditório principal foi projetado para receber recitais e apresentações musicais na mesma medida em que foram criados outros espaços multiusos adjacentes - uma quadra de basquete coberta e, a sua volta, um mezanino onde são expostas as obras de arte dos fiéis.


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Projeto referencial: Igreja Luterana da Esperança Localização: Iowa, EUA; Arquitetos: BNIM; Ano do projeto: 2015; Capacidade inicial: 700 pessoas; Terreno: 8 hectares; A igreja foi construída em um subúrbio residencial e se propõe a ser também um centro comunitário. A planta se articula ao longo de um eixo de circulação longitudinal e um secundário transversal. O projeto arquitetônico prevê a expansão do edifício bem como o estabelecimento de um parque memorial ao redor de um lago. Mesmo com um orçamento modesto, o programa arquitetônico consistia em diversos espaços multiuso como um espaço de encontro, café, creche, escritórios e salas para ensino, cozinha e fornecimento de alimentos para as pessoas mais carentes.


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Imagens disponíveis em: https://www.archdaily.com. br/br/797546/igreja-luterana-da-esperanca-ankeny-bnim/. Acesso 29 de Maio de 2018.


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Projeto referencial: Igreja Metodista do Norte - Localização: Christchurch, Nova Zelândia; - Arquitetos: Dalman architecture; - Ano do projeto: 2016; - Capacidade: aproximadamente 166 pessoas; - Área: 780m²; Buscou-se uma abordagem minimalista e austera. O espaço ganhou em força reforçando seu programa principal devido ao baixo orçamento para o projeto. Cada uma das fachadas foi pensada segundo as paisagens ao redor, ora criando um espaço convidativo, aberto e transparente ora incentivando o silêncio e a reflexão. A planta se organiza em volta de um foyer central de onde saem o auditório principal de um lado e os espaços comunitários do outro. Imagens disponíveis em: https:// www.archdaily.com.br/br/798675/igreja-metodista-do-norte-em-christchurch-dalman-architecture. Acesso 29 de Maio de 2018.


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PROGRAMA: CONCEITO

A. DESAFIOS TÉCNICOS: - GRANDES VÃOS; - ORGANIZAÇÃO DE FLUXOS; -TRABALHO COM MUITOS SISTEMAS (EST., ACÚST., ETC.); B. IMPACTOS SOCIAIS: -POSSIBILIDADE DE GRANDE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL; C. NECESSIDADE DE CONCEITUAÇÃO: - MUITAS CONSTRUÇÕES COM PROJETOS LIMITADOS; E SEM EXPRESSÃO DO CREDO; -DESCONHECIMENTO DO ESCOPO DO ARQUITETO;

CONTRIBUIÇÃO POSITIVA PARA A SOCIEDADADE

APRESENTA

É UMA EXPRESSÃO DE

REFLETE EM


TEMPLO PROTESTANTE

TEM A CARACTERÍSTICA DE

ESPAÇO NÃO É SAGRADO, MAS O TEMPO É. IGREJA INVISÍVEL DIFERENTE DE IGREJA VISÍVEL

TEM COMO PROPÓSITO

ADORAÇÃO A DEUS

PODE SER DEFINIDA COMO

“RENDIÇÃO À VONTADE DIVINA”, ACONTECE EM ATIVIDADES ORDINÁRIAS

CODUZ À ONDE PELA TEOLOGIA PROTESTANTE

ANUNCIAR JUSTIÇA E GRAÇA REFLETE EM

O ENCONTRO COM A DIVINDADE ACONTECE SOMENTE PELA FÉ FORTALECIMENTO DA COMUNIDADE DE FIÉIS Keller, 2013


CONTRIBUIÇÃO POSITIVA PARA A SOCIEDADADE

PÚBLICO

PROGRAMA: DIRETRIZES

A

CIDADE

A.1. IDENTIDADE. VALORIZAR A HISTÓRIA, CULTIURA E A MEMÓRIA LOCAL;

B

SOCIEDADE

B.1. JUSTIÇA. DENUNCIAR E LUTAR CONTRA AS INJUSTIÇAS SOCIAIS;

A.2. RESPEITO. INCENTIVAR O DEBATE, COMPARTILHAMENTO DE IDEIAS E PRODUÇÃO CULTURAL;

B.2. SOLIDARIEDADE. DISPONIBILIZAR ATENDIMENTOS DE SAÚDE, PSICOLÓGICO E SOCIAL EM TRABALHOS INDIVIDUAIS E COLETIVOS;

A.3. PAZ. PROMOVER LAZER, DESCANSO E CONTEMPLAÇÃO;

B.3. GRAÇA. SOCORRER PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RISCO;

A.4. CUIDADO. VALORIZAR E AGREGAR NOVAS HIERARQUIAS E LEITURAS URBANAS;

B.4. ALTRUÍSMO. PROMOVER MECANISMOS DE CAPACITAÇÃO;

A.5. PREENCHIMENTO. OCUPAR ÁREAS SUBUTILZADAS A PARTIR DE PARÂMETROS URBANOS;

B.5. COLETIVIDADE. CRIAR ESPAÇOS FLEXÍVEIS PARA ATIVIDADES COLETIVAS;


FORTALECIMENTO DA COMUNIDADE DE FIÉIS

COLETIVO C

ARQUITETURA

D

COMUNIDADE DE FIÉIS

C.1. INTIMIDADE. REFLETIR CONCEITOS TEOLÓGICOS COMO JUSTIÇA, GRAÇA E LIVRE ACESSO A DEUS BEM COMO OS DE COMUNHÃO E FRATERNIDADE;

D.1. FIDELIDADE. BUSCAR A CENTRALIDADE NA EXPOSIÇÃO DA BÍBLIA E DO ENSINO TEOLÓGICO;

C.2. LIBERDADE. PERMITIR DIFERENTES EXPRESSÕES DE CULTO (MÚSICAS, DANÇAS E APRESENTAÇÕES TEATRAIS, ETC.);

D.2. CUMPLICIDADE. PROMOVER A TROCA DE EXPERIÊNCIAS E O INCENTIVO MÚTUO;

C.3. FLEXIBILIDADE. FACILITAR DIFERENTES MEIOS DE EXPANSÕES E REFORMAS DO EDIFÍCIO BEM COMO CENÁRIOS DE DEMOLIÇÃO E SUBSTITUIÇÃO DO PROGRAMA PROGRAMA>EDIFÍCIO;

D.3 HUMILDADE. AFIRMAR A COLETIVIDADE NO TRABALHO E NA TOMADA DE DECISÕES;

C.4. INTEGRAÇÃO. INTEGRAR A LEITURA URBANA, A ESTRUTURA E EFICIÊNCIA ENERGÉTICA NA GERAÇÃO DA FORMA; C.5. EFICIÊNCIA. ALCANÇAR UMA EFICIÊNCIA ORÇAMENTÁRIA E DE CRONOGRAMA DE CONSTRUÇÃO PELA INOVAÇÃO DE TECNOLÓGICA E ABORDAGEM PROJETUAL;

D.4. SEGURANÇA. CONSOLIDAR A IDENTIDADE DA COMUNIDADE LOCAL; D.5. GENEROSIDADE. ATENDER E AGREGAR DIFERENTES GRUPOS SOCIAIS;


Fotografia da região da estão ferroviária de Jundiaí por volta da década de 1970. Na esquerda, a chaminé da antiga indústria de tecelagem Japy enquanto que a torre da igreja Nossa Senhora Conceição aparece na direita. Acervo prof. Maurício Ferreira/Sebo Jundiaí. Disponível em: https://www.facebook.com/professormauricioferreira/ acesso 29 de Maio de 2018.


PARTE III: MunicĂ­pio, bairro e terreno para o novo projeto


Da esquerda para a direita e de cima para baixo: as duas primeiras fotografias são do entorno da estação ferroviária na década de 1970 (local onde hoje está o terminal de ônibus Vila Arens); a terceira imagem é um panorama do bairro Vila Arens, sem ano. Acervo prof. Maurício Ferreira/Sebo Jundiaí. Disponível em: https://www.facebook.com/professormauricioferreira/ acesso 29 de Maio de 2018.


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 71

Aplicaremos os conceitos discutidos das duas primeiras seções nesta parte e na seguinte. De1. Panorama de formação histórica fendemos que a implantação e projeto arquitetônico O estabelecimento da cidade remonta ao têm as suas raízes na leitura urbana sendo impresinício do século XVII, decorrente das bandeiras paucindível a contextualização projetual. Assim, dedicalistas, as quais aconteciam na então capitania de São mos os próximos capítulos na exposição dos índices, Vicente. Muitos dos núcleos urbanos fundados neste formação histórica e dinâmicas urbanas. período, como é o caso de Jundiaí, foram estabeleciO projeto do novo templo protestante será dos em altos de morro e próximos de cursos de rios implantando em um corredor urbano no bairro Vila com o propósito de garantir a sobrevivência – tanto Arens - área central do município de Jundiaí, interior na defesa de ataques de índios quanto para a comudo Estado de São Paulo. Muitos dos fluxos diários nicação com outros núcleos (Marques, 2008). Nesse entre Jundiaí e as cidades vizinhas mesmo século, em 1655, Jundiaí reJUNDIAÍ ERA CONSIDERA- cebe o título de vila, e de cidade em passam pela Vila Arens. O terreno DA DURANTE O PERÍODO para o projeto conta com 24mil m² e 1865. Devido a sua posição estratéabrigava uma importante indústria de COLONIAL COMO UM POR- gica, ela era considerada durante o tecelagem fundada no século XIX. Por TO SECO, BEM COMO UMA período colonial como um porto seco, “PORTA PARA O SERTÃO” sua inserção estratégica, o programa bem como uma “porta para o sertão”, [...] do templo servirá mais do que um pois por muito tempo foi a última lugar de culto, mas como um centro cívico de lazer e cultura para a região, preservando a memória e identidade local. Premissas que reforçam o diálogo entre igreja e cidade o qual defendemos neste trabalho. A cidade tem uma grande expressividade econômica no Estado e está em uma posição estratégica entre a região metropolitana de Campinas e a Capital. No âmbito regional, atua como centro comercial e de serviços, visto que é a maior cidade de um aglomerado urbano de sete cidades (EMPLASA, 2018).

vila no caminho para Goiás (Makino, 1981). Sua economia serviu para a subsistência dos moradores, bandeirantes e tropeiros da sua fundação até o século XIX. Destaca-se, por exemplo, a produção de cana-de-açúcar para a fabricação de aguardente com amplo uso de mão de obra escrava indígena e de origem africana (PMJ, 2018). Podemos ver a importância da vila para a expansão territorial brasileira pela descrição de Spix e Martius, viajantes germânicos que estiveram em Jundiaí em 1818 (Marques, 2008, p.58): A Vila de Jundiaí, pequeno povoado em


72 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

uma colina baixa, é só importante por sua situação favorável para o comércio de sertão. Todas as tropas que partem da Capitania de São Paulo para Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Cuiabá, são aqui organizadas. Os habitantes possuem grandes manadas de mulas, que fazem essas viagens algumas vezes por ano. O fabrico de cangalhas, selas, ferraduras e tudo que é necessário para equipamento das tropas, assim como o incessante vaivém das caravanas, dá ao lugar feição de atividade e riqueza, e com razão dá-lhe o título de porto seco. Daqui partem as estradas trilhadas para as províncias citadas.

O final do século XIX trouxe diversas mudanças para a cidade com a expansão do café do Vale do Paraíba para a oeste paulista e, consequentemente, inseriu a ferrovia no município a fim de que a produ-

Vila Arens, por volta de 1900. Acervo prof. Maurício Ferreira/ Sebo Jundiaí. Disponível em: https://www.facebook.com/professormauricioferreira/ acesso 29 de Maio de 2018.

ção cafeeira pudesse escoar até o porto do Santos. Aproveitando a topografia favorável, os trilhos da São Paulo Railway percorreram o curso do rio Jundiaí até a estação – construída em 1867 no bairro que viria a ser chamado Vila Arens. Entre 1893 e 1896, funcionou um sistema de bonde por tração de mulas que descia do centro, atravessava o rio Guapeva por uma ponte totalmente feita de tijolos (atualmente chamada de ponte Torta), cortava o bairro e chegava até a estação. A cidade se torna um entroncamento de ferrovias pela chegada, posteriormente, da Companhia Paulista de Estradas de Ferro (1872) e da Companhia Ituana (1873) (Marques, 2008). Na segunda metade do século XIX, a escravidão entrou em declínio e houve o incentivo por parte do Governo Federal para a entrada de imigrantes para substituir a mão de obra escrava nas plantações. Assim, o mu-

Vila Arens, 1948. Ao fundo a r. J.J. Rodrigues. Foto Record. Acervo prof. Maurício Ferreira/Sebo Jundiaí. Disponível em: https://www.facebook.com/professormauricioferreira/ acesso 29 de Maio de 2018.


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 73

nicípio recebeu uma grande quantidade de famílias No primeiro caso, a cidade de Jundiaí, no final do séitalianas, das quais muitos conseguiram ascender soculo XIX e primeira metade do XX, possuía condições cialmente comprando pequenos lotes ou adquirindo favoráveis à industrialização. Primeiramente, detinha armazéns e semeando uma nova cultura agrícola: a capital proveniente das culturas cafeeiras, cujos Bauva. A economia se tornou mais diversificada, inclusirões do Café procuraram outros investimentos com ve aumentando o segmento de servio declínio da produção. Além disso, ços e investimentos em infraestrutura. apresentava mão de obra disponível O PRIMEIRO PROCESSO DE Por exemplo, foram implementados e barata dos imigrantes italianos e INDUSTRIALIZAÇÃO DA CIDAo abastecimento de água em 1881, condições topográficas receptíveis. DE INICIA-SE POR VOLTA DE energia elétrica em 1905 e telefone As indústrias se instalaram próximas 1875, ORIENTANDO-SE PARA em 1916 (PMJ, 2018) à linha férrea para facilitar o transporA FERROVIA [...] Segundo Marques (2008), o te de mercadorias e ao longo do rio primeiro processo de industrialização Guapeva, onde havia grande disponida cidade inicia-se por volta de 1875, bilidade de água e uma extensa área orientando-se para a ferrovia, e um segundo, a partir plana. Jundiaí, principalmente a região da Vila Arens, de 1940, com a construção da Rodovia Anhanguera apresentava o trinômio necessário para esta atividae instalação de novas indústrias ao longo do seu eixo. de. Marques (2008 p. 101) destaca a importância do

Av. Barão do Rio Branco, Vila Arens, sem data. Acervo prof. Maurício Ferreira/Sebo Jundiaí. Disponível em: https://www. facebook.com/professormauricioferreira/ acesso 29 de Maio de 2018.

Av. Dr. Olavo Guimarães, Vila Arens, sem data. Foto Record. Acervo prof. Maurício Ferreira/Sebo Jundiaí. Disponível em: https://www.facebook.com/professormauricioferreira/ acesso 29 de Maio de 2018.


74 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

(Marques,2008).

bairro: O bairro Vila Arens oferece todos estes requisitos: sendo entroncamento das ferrovias Santos – Jundiaí, Companhia Ituana (mais tarde ramal de Sorocabana) e Companhia Paulista, oferece terrenos planos e próximos da várzea do rio Jundiaí e de seu afluente Guapeva, que, aliás, desemboca no rio Jundiaí neste ponto, e consequentemente havendo abundância em recursos hídricos de interesse de desenvolvimento industrial, principalmente de indústrias têxteis; estas utilizam estes recursos na linha de produção de tecidos, o que explica o grande número de indústrias têxteis localizadas neste bairro: Cia Tecelagem São Bento, Argos Industrial S/A, Tecelagem Minani, Tecelagem Japy.

A partir da década de 1920, os imigrantes passaram a produzir vinho e a comercializar pequenos excedentes. Originavam-se, assim, novas indústrias como a Cereser S/A, Passarin S/A, Borin S/A e Belesso. Na mesma década, mas com maior expressividade duas décadas depois, foram criadas indústrias cerâmicas, explorando uma grande reserva de argila que o município contém. São elas: Cerâmica jundiaiense, fundada em 1920 e comprada no final da década de 1940 pela Duratex, pertencente ao grupo Deca; Cerâmica Colônia, de 1948; Centenário (1953); Windelin (1955); Cerâmica Brasão (1963); e Ideal Padrão (1964), além da instalação de outras como a Cidamar (1960), comprada em 1992 pela INCEPA

2. Dinâmicas regionais atuais Atualmente, a cidade mantém sua importância logística, pois está localizada em um importante eixo de urbanização paulista entre Santos (a 132km), a cidade de São Paulo (55km) e Campinas (45km). Possui uma área total de 432 km², sendo 112 km² de área urbana. Além disso a cidade possui uma grande área natural tombada, a Serra do Japi, com 91,4km² (Jundiaí em Números, PMJ, 2018). Em 2011, Jundiaí e outros seis municípios vizinhos - Cabreúva, Campo Limpo Paulista, Itupeva, Jarinu, Louveira e Várzea Paulista - foram institucionalizados como Aglomeração Urbana de Jundiaí (AUJ), primeira no Estado de São Paulo. A aglomeração possui um alto nível de industrialização, gerando, em 2015, 3,4% do Produto Interno Bruto estadual, sendo que mais de 60% é relativa ao município jundiaiense (AUJ, 2018). Vemos que a distribuição de serviços e riqueza não acontece de modo uniforme na região. Marques (2008) analisa as dinâmicas históricas e atuais entre Jundiaí e as cidades vizinhas, concluindo que: O fato de grande parte dos emigrantes se fixarem, a partir da década de 1970, nas cidades vizinhas a Jundiaí marcou o inicio da formação de uma rede urbana regional liderada pelo município de Jundiaí, pelo fato de ser este o que apresenta o maior crescimento econômico entre os municípios vizi-


ação ação a) a) -- 2010 2010 ação a) - 2010

POPULAÇÃO 370.126 370.126 hab. hab. POPULAÇÃO

ÁREA 431,99 431,99 km² km² ÁREA

370.126 hab.

431,99 km²

DENSIDADE 857,08 857,08 hab/km² hab/km² DENSIDADE

ÁREA URBANA 112 112 km² km² URBANA ÁREA

857,08 hab/km²

112 km²

COORDENADAS CENTRAIS 23º W 23º 11’ 11’ 20’’ 20’’ S S ee 46º 46º 53’ 53’ 01‘’ 01‘’ CENTRAIS W COORDENADAS 23º 11’ 20’’ S e 46º 53’ 01‘’ W

Fonte: Atlas Brasil, 2018; PMJ, 2018; iBGE, censo 2010 Fonte: Atlas Brasil, 2018; PMJ, 2018; iBGE, censo 2010

Fonte: Atlas Brasil, 2018; PMJ, 2018; iBGE, censo 2010

Índice Índice de de Desenvolcimento Desenvolcimento Humano Humano Municipal Municipal (IDHM), (IDHM), 2010 2010 Renda: 0,834 Longevidade: 0, 866 Educação: 0, 768 2010 0,822 Índice de Desenvolcimento Humano Municipal (IDHM), Renda: 0,834 Longevidade: 0, 866 Educação: 0, 768 0,822 Renda: 0,834

Longevidade: 0, 866 Educação: 0, 768 População População residente residente por por religião religião (pessoas) (pessoas)

250.000 250.000 200.000 250.000 200.000

Católica Católica apostólica apostólica romana romana (244.262) (244.262)

População residente por religião (pessoas)

Católica apostólica romana (244.262)

150.000 200.000 150.000 100.000 150.000 100.000

Evangélica Evangélica (75.387) (75.387)

50.000 100.000 50.000

Evangélica (75.387)

50.00000

Fonte: IBGE, CENSO 2010 Fonte: IBGE, CENSO 2010

0 Fonte: IBGE, CENSO 2010

Espírita Espírita (14.519) (14.519) Espírita (14.519)

0,822


76 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

nhos e se dirijam a Jundiaí para trabalhar, utilizar o comércio, utilizar os serviços de saúde e educação, etc. (MARQUES, 2008, p. 162)

mais um templo protestante que procura uma comunicação direta com a cidade. Assim, o novo projeto também busca atender a população regional.

O autor chega a este resultado analisando 3. Indicadores do município de Jundiaí a origem daqueles que usam o sistema de saúde, Segundo o censo de 2010 do Instituto Brasitransporte, o sistema educacional e comercial na cileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Jundiaí posdade jundiaiense. Os municípios de Várzea Paulista suía 370.126 habitantes e densidade demográfica de e Campo Limpo Paulista tiveram grande represen858,42 hab/km². Estima-se que em 2017 a população tatividade nos serviços analisados pois eles estão era de 409.497 pessoas. O Índice de Desenvolviconurbados com Jundiaí. Inclusive, a comunicação mento Humano (IDHM) era de 0,822 em 2010, um do seu centro com estas cidades passa pelo bairro alto índice que faz a cidade ocupar o Vila Arens. Várzea Paulista foi elevada a município em 1965, sendo sua HÁ EM JUNDIAÍ UM ENVE- 9º lugar no estado de São Paulo (Atlas principal atividade econômica o setor LHECIMENTO POPULACIO- Brasil, 2013). Ao olharmos para a pirâmide industrial. Entretanto, a cidade apre- NAL MAIS ACELERADO EM sentou um crescimento urbano desor- RELAÇÃO A OUTRAS CIDA- etária da cidade, percebemos um número menor de nascimentos ao mesdenado, com loteamentos irregulares, DES BRASILEIRAS. mo tempo que uma maior longevidade sem acesso a infraestrutura urbana para ambos os sexos - um envelheci– uma situação que permanece ainda mento populacional mais acelerado que em relação a hoje em muitos bairros. No mesmo ano, Campo Limoutras cidades brasileiras. po Paulista se desmembrou de Jundiaí e apresenta Quanto ao Trabalho e rendimento, o salário várias similaridades com Várzea: sua economia é médio mensal dos trabalhadores formais era de 3,5 basicamente industrial (sendo a principal indústria a salários mínimos. Segundo o Atlas Brasil (2013), a Krupp Campo limpo Ltda) e cresceu desornadamente renda média per capita de uma pessoa negra era em com loteamento irregulares, apesar de uma melhor organização urbana que a cidade vizinha (Marques, 2008). Deste modo, qualquer que fosse o projeto de uso coletivo na Vila Arens deveria olhar para a região – em especial estas duas cidades vizinhas – ainda

2010 de R$765, 61, enquanto de uma branca era de R$1.620,19. Já em relação à concentração de renda, 58,4% da população apresenta rendimento no 5º quinto, o mais alto. Aqueles que se autodeclararam evangélicos


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 77

Pirâmide etária de Jundiaí (IBGE, censo 2010) Pirâmide etária de Jundiaí (IBGE, censo 2010)

100 ou mais 100 95 a ou 99 mais 95 a 90 a 99 94 90 85 aa 94 89 85 80 aa 89 84 80 a 84 75 a 79 75 70 aa 79 74 70 65 aa 74 69 65 aa 64 69 60 60 a 64 55 a 59 55 50 aa 59 54 50 45 aa 54 49 45 40 aa 49 44 40 35 aa 44 39 35 30 aa 39 34 30 a 34 25 a 29 25 20 aa 29 24 20 15 aa 24 19 15 10 aa 19 14 10 a 14 5a9 50 aa 94 0a4 Brasil Brasil

Homens Homens

Escolaridade Escolaridade da da população população de de 25 anos ou mais 2010 25 anos ou mais - 2010

Mulheres Mulheres

Distribuição Distribuição de de renda renda por por quintos quintos da da população população (ordenada segundo a renda domiciliar per (ordenada segundo a renda domiciliar per capita) capita) -- 2010 2010 7,5% 7,5%

20,6% 20,6%

27,5% 27,5%

Fonte: Atlas Brasil, 2018 Fonte: Atlas Brasil, 2018

32,3 % 32,3 %

15,9% 15,9%

Fundamental incompleto e analfabeto Fundamental incompleto e analfabeto Fundamental completo e alfabetizado Fundamental completo e alfabetizado Fundamental completo e Fundamental completo e Médio incompleto Médio incompleto Médio completo e superior Médio completo e superior incompleto incompleto Superior completo Superior completo

5º Quinto 5º Quinto

11,6% 11,6%

18,5% 18,5%

4º Quinto 4º Quinto 58,4% 58,4%

3º Quinto 3º Quinto 2º Quinto 2º Quinto 1º Quinto 1º Quinto

Fonte: Atlas Brasil, 2018 Fonte: Atlas Brasil, 2018


78 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

Distribuição das religiões segundo o nível educacional no Brasil

Fonte: Estudo Eleitoral Brasileiro (ESEB) , 2002 apud Bohn, 2004 Distribuição dos evangélicos segundo o nível educacional no Brasil

Fonte: Estudo Eleitoral Brasileiro (ESEB) , 2002 apud Bohn, 2004


1. Percentual da distribuição de evangélicos por população residente e sexo em Jundiaí, amostra (IBGE, censo demográfico, 2010)*

2. Percentual da distribuição de evangélicos por população residente e cor em Jundiaí, amostra (IBGE, censo demográfico, 2010)* Amarela 11,25% Branca 18,79% Indígena 25,60%

19,07%

21,60%

Parda 25,65% Preta 27,80%

Percentual da distribuição de evangélicos por população de 25 anos ou mais de idade por nível de instrução, amostra (IBGE, censo demográfico, 2010)*

Percentual da distribuição de evangélicos por população residente e renda em Jundiaí, amostra (IBGE, censo demográfico, 2010)*

Superior completo 11,25%

Mais de 10 salários mínimos 21,60%

Médio completo ou superior incompleto 20,28%

Entre 5 e 10 salários mínimos 10,62%

Fundamental completo ou Ensino médio incompleto 22,86%

Entre 2 e 5 salários mínimos 14,96%

Sem instrução ou fundamental incompleto 19,85%

Entre 1 e 2 salários mínimos 22,19%

Não derminado 29,91%

Entre 1/2 e 1 salário mínimo 25,30%

*Os infográficos de 1 a 3 não fazem distinção entre sexo. As porcentagens são divididas por religião.


80 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

são por volta de 1/5 da população jundiaiense. Em gélicas. primeiro lugar, quando olhamos esta população mais Uma igreja protestante pode ter muitas conde perto, notamos que a maior parte deste grupo é tribuições em favor da justiça social. Fizemos um do sexo feminino; em seguida, analizando os índices recorte neste trabalho para abordar o tema violência amostrais de renda, escolaridade e cor, vemos que o (apesar desse também ser um tema abrangente do percentual de evangélicos é maior na faixa de renda qual deixaremos escapar muitas características e de até dois salários mínimos se comparado às faixas desdobramentos). salariais superiores dentro dessa mesma religião; os Analisando o Atlas da Violência no Brasil do índices de escolaridade decrescem a partir do Ensino Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Médio completo chegando à 11,16% de evangélicos uma matéria do Jundiaí Agora de 16 de Junho de que possuem o Ensino Superior com2017 defende que Jundiaí está longe pleto; quanto a cor, há um maior perde ser uma cidade pacífica, concluinPROPORCIONALMENTE, O centual dessa religião entre pessoas do após olhar dados dos últimos cinco PROTESTANTISMO É MAIS pretas se comparado relativamente anos que os índices de violência são ACEITO ENTRE PESSOAS às outras cores. Isso demonstra que, estáveis, afirmam: “2012 foi o que DO SEXO FEMININO, DE COR proporcionalmente, o protestantismo mais teve homicídios dolosos, 37 no PRETA, DE BAIXA RENDA E é mais aceito entre pessoas do sexo total, uma média de 3,08 assassinatos COM MENOR NÍVEL DE ESCOfeminino, de cor preta, de baixa renda por mês. Há três anos foram registraLARIDADE EM JUNDIAÍ. e com menor nível de escolaridade das 48 tentativas de assassinato, quaem Jundiaí. O que não difere muito da tro crimes deste tipo a cada 30 dias distribuição dos que se declaram católicos. Por outro ou, ainda, um por semana” (Jundiaí Agora, 2017). lado, as não pentecostais concentram escolaridade Um documento de 2006 intitulado “Jundiaí segura” mais alto (Bohn, 2004). do Plano Municipal de Prevenção da Violência e ProSe olharmos quantativamente as amostras, moção da Segurança Pública procurou identificar a o maior número de pessoas evangélicas continua dinâmica da violência e criminalidade da cidade. O sendo daquelas que recebem até 2 salários mínimos, estudo demonstra que apesar do número de homiporém o nível educacional fica como sem instrução cídios ser inferior ao do Estado é a segunda causa ou fundamental incompleto. Por outro lado, pela pode mortes violentas na cidade sendo 90% do sexo pulação jundiaiense ser de maioria branca, quantatimasculino entre 15 e 29 anos. Afirmam, ainda, que os vamente esse grupo é maior dentro das igrejas evanhomicídios não se distribuem de maneira uniforme,


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 81

inclusive sendo metade deles em bairros de classe média e alta ou não associadas ao tráfico de drogas. Do total, incluindo as tentativas de homicídio, 80% tiveram motivação por desentendimentos pessoais, vinganças, brigas em família ou brigas por dívidas (Jundiaí segura, 2006) – o que insere a Vila Arens nas ações preventivas contra a violência. Entre 2000 e 2005, houve o registro de 1553 ocorrências de lesões corporais sendo que 57% foram registrados na Delegacia de Defesa da Mulher. Quanto ao crime de violência sexual, as vitimas são predominantemente mulheres. A Assistência às Vítimas de Violência Sexual atendeu 316 casos nesse intervalo, “dos quais estupro e atentado violento ao pudor representam 83% , sendo a grande maioria das vítimas mulheres (90%)” (Plano Municipal de Segurança, 2006, p.7), sendo que, crianças e adolescentes representaram 69% das vítimas. Outro ponto de atenção é o consumo e tráfico de drogas, constituindo “um grande problema para o município, da perspectiva da população como dos profissionais da área da segurança” (Plano Municipal de Segurança, 2006, p.7). Segundo o documento, isto ocorre em diversas localidades da cidade incluindo escolas envolvendo crianças e adolescentes. Ao olharmos para Jundiaí por meio destes indicadores, percebemos o desenvolvimento social e econômico no município ao mesmo tempo que um envelhecimento da população. Entretanto, isso não acontece de maneira uniforme (PMJ, 2017). Primei-

Distribuição de faixa etária - Vila Arens e Vila Progresso (IBGE, 2000) 10,11% 70 anos ou mais 10,09% 60 a 69 anos 10,79% 50 a 59 anos 14,80% 40 a 49 anos 14,72% 30 aDistribuição 39 anos de faixa etária - Vila Arens e Vila Progresso (IBGE, 2000) 6,72% 25 a 29 anos 10,11% 70 20 anos ou anos mais 8,15% a 24 10,09% 60 6,78% 16 aa 69 19 anos anos 10,79% 50 8,49% 10 aa 59 15 anos anos 14,80% 40 5a a499 anos 5,10% anos 14,72% 30 0a a394 anos 4,26% anos 6,72% 25 a 29 anos Distribuição de faixa etária - Vila Arens e Vila Progresso (IBGE, 2000) 8,15% 20 a 24 anos 10,11% 70 anos ou mais 6,78% 16 a 19 anos Informações sobre rendimento considerando-se 10,09% as pessoas 60 a 69 anos 8,49% 10 a responsáveis 15 anos Vila Progresso (IBGE, 2000) 50 a 59 anos pelos domicílios - Vila Arens e10,79% 5,10% 5 aa949 anos 14,80% 40 anos Mais de 15 salários mínimos 20,95% 4,26% 0 aa439 anos 14,72% 30 anos Mais 25 de 10 a 15 salários mínimos 10,56% 6,72% a 29 anos 8,15% anossalários mínimos Mais20dea524a 10 30,88% Informações sobre rendimento considerando-se as pessoas 6,78% 16 a 19 anos Mais responsáveis de 3 a 5 salários mínimos 17,97% Vila Progresso (IBGE, 2000) 10 a 15 anos pelos domicílios - Vila Arens e8,49% Mais 5dea29aanos 3 salários mínimos 5,10% 6,79% Mais de 15 salários mínimos 20,95% 4,26% Mais 0dea14aanos 2 salários mínimos 6,08% Mais de 10 a 15 salários mínimos 10,56% 1 a 1 salário mínimo 6,71% Mais de 5 a 10 salários mínimos 30,88%

Informações sobre rendimento considerando-se as pessoas

Mais deresponsáveis 3 a 5 saláriospelos mínimos 17,97% domicílios - Vila Arens e Vila Progresso (IBGE, 2000)

Percentual de uso do solo - Vila Arens e Vila Progresso (PMJ, 2000)

Mais Mais de 2 de a 315salários saláriosmínimos mínimos Mais de de 10 1 aa215salários Mais saláriosmínimos mínimos 1 a 1 salário mínimo Mais de 5 a 10 salários mínimos Uso residencial Mais de 3 a 5 salários mínimos 58,5%

6,79% 20,95% 6,08% 10,56%

Uso industrial 6,71% 30,88% 13,91% Uso comercial e de17,97% serviços 20,84% Mais de 2 a 3 de salários 6,79% (PMJ, Percentual uso mínimos do solo - Vila Arens e Vila Progresso Uso2000) institucional 6,75% Mais de 1 a 2 salários mínimos 6,08% 1 a 1 salário mínimo

6,71%

Uso industrial 13,91% Uso comercial e de serviços Percentual de uso do solo - Vila Arens e Vila Progresso (PMJ, 2000) 20,84% Uso institucional 6,75% Uso residencial 58,5%

Uso residencial 58,5%

Uso comercial e de serviços 20,84%

Uso industrial 13,91% Uso institucional 6,75%


1

2 4

4

Fizemos um levantamento do uso e ocupação do entorno do terreno onde será desenvolvido o projeto. Para isso, estimamos as áreas e as alturas por meio de um sistema desenvolvido no Grasshopper por meio de programação visual. É notável a predominância de uso comercial com baixa densidade, alguns edifícios altos residenciais e poucos de uso misto.

Área total: 45.069m² Área útil total: 193.834m² Residencial (amarelo): 113.794m² Comércio (vermelho): 36.086m² Escritório (azul): 2.088m² Institucional (roxo): 11.941m² Uso misto (laranja): 29.925m²


Área total: 61.585m² Área útil total: 89.977m² Residencial (amarelo): 21.909m² Comércio (vermelho): 43.4250m² Escritório (azul): 1839m² Industrial (marrom): 2.052m² Institucional (roxo): 3.297m² Uso misto (laranja): 1.633m²

1

Área total: 29.073m² Área útil total: 41.324m² Residencial (amarelo): 8.164m² Comércio (vermelho): 20.629m² Institucional (roxo): 3.297m²

2

Área total: 41.236m² Área útil total: 49.516m² Residencial (amarelo): 19.126m² Comércio (vermelho): 17.580m² Industrial (marrom): 7.231m² Institucional (roxo): 5.417m²

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84 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

ramente, se compararmos os índices obtidos para pessoas negras com pessoas brancas, perceberemos que este grupo concentra a maior parte da riqueza e possui maior acesso a equipamentos de saúde e ao sistema de educação. Em segundo lugar, mesmo que a cidade tenha índices de violência e criminalidade menores que outros municípios brasileiros, ainda são problemas sociais que merecem atenção a gestão pública e da sociedade. Deste modo, a construção de um templo protestante, que se volta para a cidade, pode contribuir para uma maior comunicação entre diferentes classes sociais em uma cidade com altos índices de desenvolvimento; pode fortalecer laços interpessoais, principalmente para pessoas que são mais vulneráveis (como idosos e crianças); socorrer aquelas sofreram algum tipo de violência física ou psicológica, atender aquelas que precisam de reinserção social ou acolher aquelas que se encontram em situação de risco. 4. Indicadores do bairro Vila Arens O Bairro Vila Arens segue a tendência da cidade com bons índices sociais e econômicos que ocasionam um envelhecimento populacional. Há, além disso, uma predominância da população branca (todos os setores censitários ficaram entre 76% e 100% para este grupo - IBGE, CENSO 2010 Apud PMJ, 2017). Segundo a Prefeitura de Jundiaí, mais de

CENTRO IGREJA MATRIZ DE JUNDIAÍ Terreno escolhido O terreno para o projeto do templo protestante está em uma posição privilegiada no bairro Vila Arens. O novo edifício ganhará diferentes visuais proporcionando um novo marco local que valorizará o prédio fabril já existente, reorganizará o fluxo pedonal e servirá a sociedade ao mesmo tempo que articulará o mosaico de igrejas evangélicas já estabelecidas no local.


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TERMINAL DE ÔNIBUS URBANO ESTAÇÃO FERROVIÁRIA TERRENO PARA O PROJETO

Vila Arens VILA ARENS


86 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

adensada. O novo templo protestante na Vila Arens, além de promover o diálogo entre diferentes classes econômicas, pode dar maior atenção à crescente população idosa do bairro na mesma medida que pode lutar pela inclusão social e oferecer espaços para a construção de uma consciência cidadã, lazer e aprendizado não só na vizinhança, mas na cidade e região devido a sua posição central na cidade. 5. Dinâmicas do bairro Vila Arens Enquanto que Jundiaí é um corredor na escala estadual, a Vila Arens é um corredor entre os bairros jundiaienses e intermunicipalmente por onde milhares de pessoas passam diariamente. A sua posição próxima ao centro, o acesso aos transportes públicos, bem como os antigos galpões industriais subutilizados, tem atraído o mercado imobiliário para o bairro de modo que grandes condomínios verticais começaram a aparecem no bairro a partir da década passada. De fato, o Plano Diretor Municipal atribui boa parte do bairro como uma Zona de Corredor Urbano propicio para a verticalização devido o acesso à equipamentos e serviços2. Os antigos edifícios de valor tangível e in1 2

lei municipal nº 8.683, de 07 de Julho de 2016. Art. 29, Plano Diretor de Jundiaí, 2016.

Principais vias A Vila Arens é um corredor urbano por onde passam importantes vias de conexão entre os bairros de Jundiaí bem como do centro jundiaiense e as cidades vizinhas. Assim, o templo proposto no local atenderá não só a população do bairro mas da cidade e da região.

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50% dos edifícios são destinados a uso residencial e um pouco mais de 20% para uso comercial e de serviços. Devido sua localização estratégica regional, o Plano Diretor de Jundiaí1 prevê que essa região seja

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88 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

tangível para a cidade de Jundiaí estão sendo sistematicamente demolidos para dar lugar a construções que em nada dialogam com o bairro ou a cidade, mas antes são fruto de uma especulação imobiliária. As obras de infraestrutura realizadas no mesmo período como o alargamento da R. José Patrocínio, o restauro da Ponte Torta e remodelação da sua praça são pontuais e pouco servem à vivência do bairro. Diante deste contexto de adensamento da Vila Arens, o terreno no seu coração de 24mil m² da antiga fábrica Japy pode servir como um local para preservação da memória e identidade do bairro, além de oferecer espaços para culto, lazer, aprendizado, encontro de diferentes classes sociais, descanso e introspecção. Qualidades que acabam servindo a toda a cidade, devido a posição estratégica do terreno no encontro de corredores urbanos. Podemos olhar para o bairro buscando entender qual é a rotina do local e como o projeto arquitetônico pode ser um instrumento para melhorar a vida urbana daqueles que moram ou passam pelo bairro. A seguir faremos uma análise por dia e hora. De Segunda-feira a sexta-feira, o dia já começa às 3h da manhã com o ronco dos motores dos primeiros ônibus da viação Cometa que saem da garagem situada na rua de baixo do terreno para o projeto arquitetônico em direção à rodoviária de Jundiaí; muitos seguem para o Terminal Tietê em São Paulo ou a Barra Funda, também na cidade de São Paulo. Eles partem em intervalos variáveis de 15min à 1h

Circulação pedonal Há uma grande circulação de pedestres na av. Barão do Rio Branco pela existência de diferentes modais de transporte; o que também pode ser observado nas outras vias por causa do comércio popular e oferecimento de serviços. Devido ao tamanho e posição do terreno Japy, o projeto arquitetônico permitirá que as pessoas cruzem o terreno criando um novo eixo de circulação pedonal.

GERADOR DE FLUXO: PONTO DE ÔNIBUS INTERMUNICIPAL


PRINCIPAIS FLUXOS PEDONAIS FLUXO INTENSO FLUXO MÉDIO POUCO FLUXO GERADOR DE FLUXO

GERADOR DE FLUXO: TERMINAL DE ÔNIBUS URBANO

PRINCIPAIS FLUXOS PEDONAIS

GERADOR DE FLUXO: PONTO DE ÔNIBUS INTERMUNICIPAL

GERADOR DE FLUXO: ESTAÇÃO FERROVIÁRIA


90 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

pela rua Barão do Rio Branco, dobram a esquerda pela R. XV de Novembro – via que forma um eixo visual até a antiga chaminé da indústria - até pegarem a R. José do Patrocínio onde atravessam o rio Guapeva e seguem pela av. dr. Odil Campos de Sáes. Isso é feito até às 23h. Um pouco depois das 4h, os ônibus urbanos, de cor amarela, também despertam no terminal de ônibus Vila Arens - situado a poucos metros da antiga indústria Japy - e, ainda debaixo da iluminação pública na cor âmbar, começam a chegar e sair. Um fluxo intenso que durará todo o dia. Todos chegam pela R. Barão do Rio Branco provenientes da R. Vigário João José Rodrigues3 ou da Av. Dr. Olavo Guimarães; os ônibus também vêm pela R. Lacerda Franco – rua onde está a maior testada do terreno para intervenção - que desemboca no final da R. Barão do Rio Branco e, por último chegam ao terminal pela Av. União dos Ferroviários vindo do Centro. Por esta mesma avenida deixam o terminal bem como no sentido da r. Barão do Rio Branco enquanto ela é mão dupla, vão até entrar na Av. Dr. Cavalcanti. Outros ônibus e vans empresariais começam a sair da Av. União dos Ferroviários ou da R. XV de Novembro. Neste meio tempo, começam a circular os ônibus intermunicipais que saem do Centro em direção a Várzea Paulista e Campo Limpo Paulista. A única empresa que faz essa linha é a Rápido Luxo Campinas. Seus ônibus cinzas descem pela J.J. Ro3 Este é um caminho importante. Afirmado desde a inauguração da ferrovia no final no século XIX.

Circulação de ônibus urbanos A proximidade com o terminal de ônibus Vila Arens e pontos de parada permitirá que o templo seja de fácil acesso para toda a população, incentivando, inclusive, o uso de transporte público para chegar ao local.


PRINCIPAIS FLUXOS ÔNIBUS URBANO FLUXO INTENSO FLUXO MÉDIO POUCO FLUXO GERADOR DE FLUXO

TERMINAL DE ÔNIBUS URBANO VILA ARENS

PONTOS DE ÔNIBUS


92 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

drigues e fazem a primeira parada antes R. Moisés Abaid em frente de onde ficava uma grande loja de eletrodomésticos. Eles sobem a Av. Dr. Olavo Guimarães até chegar na R. Emile Pilon abaixo da Paróquia Nossa Senhora Conceição, em seguida continuam pela Av. Fernando Arens. Na volta começam a trazer os primeiros trabalhadores pela av. São Paulo, descem a Av. dr. Olavo Guimarães e fazem uma parada antes da avenida entrar na R. Barão do Rio Branco para que passageiros possam descer. Em seguida, eles dobram a Av. Dr. Cavalcanti rumo ao Centro. Muitos dos passageiros que desceram dos ônibus intermunicipais pela manhã caminharão pela calçada apertada e em más condições da R. Barão do Rio Branco – rua debaixo do terreno trabalhado até chegar no terminal de ônibus Vila Arens que nesta hora já recebe os primeiros passageiros provenientes da estação férrea. Os trens começaram a funcionar às 4h da manhã junto com os ônibus amarelos. Os passageiros vêm da linha 7 Rubi da CPTM, muitos de Várzea Paulista, Campo Limpo Paulista, Botujuru e Francisco Morato – percebemos, portanto, a direta relação do terreno com os municípios vizinhos. Outras pessoas começam a chegar ao bairro e os primeiros raios de sol não apontaram no céu. Elas vêm de carona, de ônibus ou deixam o carro em alguma rua próxima para pegar uns dos trens na estação que saem em intervalos entre 11min a 14min. Boa parte irá para São Paulo, assim fazem baldeação em Francisco Morato. No segundo trecho, até a esta-

Circulação de ônibus intermunicipais O entorno do terreno trabalhado é um importante local de passagem e parada para ônibus intermunicipais. Consequentemente, o templo pode servir os bairros vizinhos e até as cidades de Várzea Paulista e Campo Limpo Paulista.

PONTOS DE ÔNIBUS INTERMUNICIPAL


PRINCIPAIS FLUXOS ÔNIBUS INTERMUNICIPAIS FLUXO INTENSO FLUXO MÉDIO POUCO FLUXO GERADOR DE FLUXO

GARAGEM VIAÇÃO COMETA

PERCURSOS ÔNIBUS INTERMUNICIPAIS


94 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

ção Vila Clarice o trem receberá muitos outros passageiros - além da capacidade dos vagões. O trajeto até a Luz demorará mais ou menos de 2h à 2h30min (nos melhores dias e quando não há greve). Um percurso bem mais demorado do que aqueles que saíram de carro de um dos condomínios verticais de médio-alto padrão do bairro rumo à São Paulo ou Campinas. Em 2007, aqueles que fizeram esse trajeto de trem somaram 65.400 (Vila Arens – São Paulo) e 94.844 o fizeram por meio de automóveis (Jundiaí-São Paulo). Quando já amanheceu completamente, o Supermercado boa – o maior supermercado local e que se encontra adjacente ao terreno da proposta – abre às 7h, o mesmo horário em que as mães deixam os filhos no tradicional Colégio Divino Salvador – a uma quadras do que resta da fábrica Japy - vindo da Av. São Paulo e dobrando a R. Gen. Carneiro ou, para as crianças mais independentes, ficam na R. Moreira César. Outros comércios começam a abrir nas horas seguintes, são diversas drogarias, lojinhas de 1,99, pequenas lanchonetes, academias, óticas etc. Às 8h, por exemplo, começa a funcionar a loteria Expresso da Sorte na praça Quintino Boicaiuva - uma pracinha onde se reúnem alguns senhores idosos de frente de uma banca de jornal, mesmo local onde se pode pegar um taxi. Às 8h30 abre o 2º Cartório Registro Civil de Jundiaí na R. Lacerda Franco e, não tão cedo assim, já se pode ver um grupo de flanelinhas na rua – são adolescentes, mulheres e homens. Antes das 10h já se nota algumas filas na frente dos bancos,

Circulação de veículos particulares O bairro é marcado pela circulação intensa de veículos e, por consequência, de poluição do ar e sonora. Propomos que, associado ao programa religioso, haja um investimento generoso em áreas verdes a fim de melhorar a qualidade de vida daqueles que passam ou moram no bairro.


PRINCIPAIS FLUXOS PEDONAIS FLUXO INTENSO FLUXO MÉDIO POUCO FLUXO GERADOR DE FLUXO

GERADOR DE FLUXO: TERMINAL DE ÔNIBUS URBANO VILA ARENS


96 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

principalmente em dia de pagamento. Itaú, Caixa e Banco do Brasil estão na Av. dr. Olavo Guimarães e o Banco Santander atrás da Catedral. Ao longo do dia, há um intenso fluxo de veículos passando de um bairro para o outro, chegando ou saindo do centro, vindo ou indo de uma das cidades vizinhas. Muitos, porém, buscam uma das tracionais mecânicas, lojas de baterias ou de pneus do bairro que ou estão na J. J. Rodrigues ou a grande maioria na Av. Cavalcanti - mesma rua onde fica o 49º batalhão da Polícia Militar e a distribuidora da Ferráspari. Os carros que por ali passam podem ser abastecidos em um dos dois postos Ipiranga do local: um na R. Lacerda Franco outro entre a J.J. Rodrigues e a R. José Patrocínio. Outros vem ao bairro para comprar artigos de informática, elétrica, artigos religiosos, nordestinos, arrumar-se em um dos salões de cabelereiros, postar uma carta no correio ou prestar contas na Receita Federal. Enfim, há uma grande diversidade Comercial. O terreno da antiga indústria Japy está no centro no epicentro de intensos fluxos de automóveis, ônibus e pedestres. A abertura do terreno para a cidade, articulada com os lotes vizinhos, permitiria uma nova urbanidade para o local na medida que criaria novos percursos, apropriações. Há, também, quem chegue no bairro por transporte público rumo ao Complexo Educacional e Cultural Argos onde são oferecidos cursos de informática, línguas, supletivos ou treinamentos para professores da rede pública ou para buscar algum

Um lugar para potencial adensamento Devido à herança industrial do bairro e a sua proximidade com a estação ferroviária, há muitos terrenos vazios ou subutilizados bem como galpões em grandes lotes. Assim, muitos deles podem sofrer verticalização e adensamento. A destinação do terreno da antiga indústria Japy para o templo, além de ajudar a preservar o patrimônio industrial que existe nele, também ajudará a preservar a área de uma ocupação por um conjunto de torres residenciais, a exemplo do que vem acontecendo nas grandes glebas do bairro da Barra Funda em São Paulo, também de passado industrial. Portanto, diante desta possibilidade, devem ser preservados terrenos que sirvam de uso coletivo e comunitário.

ÁREAS DE POTENCIAL VERTICALIZAÇÃO


VAZIOS URBANOS


98 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

material na Biblioteca Municipal. Essas pessoas não encontram nenhuma inclinação topográfica que venha a dificultar a caminhada. A parte central do bairro está em uma área de várzea no encontro de três morros – um onde está o Centro, no outro a Vila Nambi e, no terceiro, o bairro continua – consequentemente há uma inclinação suave nessa região4. A igreja nossa Senhora Conceição, situada em um ponto mais alto, cria um ponto focal de quem desce a J.J. Rodrigues. Porém, outros elementos dificultam a circulação pedonal: a descontinuidade de piso da calçada, as grandes avenidas, a poluição sonora e visual e até mesmo um eventual risco de furto. Ao final da tarde, entre às 17h-19h30, o fluxo da manhã se inverte: o comércio fecha, os trabalhadores começam a retornar para as casas no próprio bairro ou por meio de trem, ônibus ou automóveis vão para outros bairros ou cidades. É um cenário caótico que pode se agrava dependendo da estação do ano. Jundiaí tem um clima mesotérmico seco ou tropical de altitude, isto é, invernos secos e verões úmidos5. 4 Outros dados físicos: Quanto as altitudes, o município tem uma média de 762m em relação ao nível do mar sendo a altitude máxima pertencente a Serra do Japi com 1290,6m e a menor com 673,6m no Rio Jundiaí na divisa com o município de Itupeva (Jundiaí em Números, PMJ, 2018). 5 Outros dados climáticos: o vento predominantemente é sudeste e precipitação anual de 1.385,2mm. Quanto as temperaturas, a máxima absoluta foi em 04 de Fevereiro de 1971 com 39,9°C e a mínima absoluta em 18 de Maio de 1968 com -3,1°C, a mínima média, porém, é de 14,3°C e a máxima média 27,5°C resultando em uma média anual de 20,9°C. A umidade relativa do ar/média anual é 70,7% e possui 2480 horas de insolação média anual (Instituto Agronômico de Campinas, 1996, Estação Experimental Jundiaí/IAC 1941 a 1995 Apud Jundiaí em Números, PMJ,

IGREJA EVANGÉLICA PRESBITERIANA Um centro religioso A Vila Arens possui inúmeros templos, sendo a grande maioria evangélica com orientação pentecostal. Devido à pluralidade do meio protestante brasileiro, não há uma sobreposição de programas. Há, por sua vez, uma complementação, pois atendem a públicos distintos. A escala regional, o grande número de modais de transportes e um fluxo de pessoas em situação de risco atrai templos religiosos para o bairro. Quase todos, entretanto, são espaços adaptados. O novo templo, entre outros objetivos, procura se articular com aqueles já existentes, pois não possuem espaços adequados para trabalhos sociais. Este projeto visa ser usado por vários grupos religiosos que não possuem instalações próprias ou que são limitados espacialmente para esta função.

IGREJA EVANGÉLICA PENTECOSTAL AVIVAMENTO BÍBLICO


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 99

IGREJA EVANGÉLICA PENTECOSTAL DEUS É AMOR

MESQUITA IGREJA EVANGÉLICA PENTECOSTAL O BRASIL PARA CRISTO IGREJA EVANGÉLICA NEOPENTECOSTAL RENASCER EM CRISTO

IGREJA EVANGÉLICA COMUNIDADE CRISTÃ

IGREJA EVANGÉLICA PENTECOSTAL CONGREGAÇÃO CRISTÃ

IGREJA EVANGÉLICA PENTECOSTAL QUADRANGULAR IGREJA EVANGÉLICA NEOPENTECOSTAL MUNDIAL DO PODER DE DEUS

IGREJA CATÓLICA APOSTÓLICA ROMANA NOSSA SENHORA CONCEIÇÃO


100 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

Templos nas proximidades A pluralidade das fechadas nos templos expressa a diversidade religiosa do bairro. Interessante notar que nenhum dos templos evangélicos possui torres, sinos ou corte basilical. Sendo a presbiteriana (igreja histórica) a única que apresenta uma cruz na fachada. Muitas delas passariam despercebidas na cidade, diferentemente da mesquita ou da Igreja católica. Igreja do Evangelho Quadrangular

Igreja Renascer em Cristo

Igreja Presbiteriana

Igreja O Brasil para Cristo

Igreja Mundial do poder de Deus


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 101

Igreja Comunidade Cristã

Igreja Deus é amor

Igreja Congregação Cristã

Igreja Avivamento Bíblico

Igreja Nossa Senhora Conceição

Mesquita


102 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

Quando é inverno, a falta de chuva faz com que se acumule no ar uma grande quantidade de partículas de poluição que associada ao baixo nível de umidade do ar, pode ocasionar problemas respiratórios. No verão, por outro lado, ao longo do dia, as altas temperaturas fazem com haja um alto nível de evaporação resultando em um alto índice de precipitação na hora do rush. É nesta estação, também, que devido às médias latitudes de Jundiaí6, há o horário de Verão. Logo ainda é dia quando as pessoas retornam para suas casas. Nas horas seguintes uma nova dinâmica acontece no bairro dependendo do dia: o movimento religioso. Somente entre o Perímetro da Av. Fernando Arens, R. Lacerda Franco, Av. União dos Ferroviários, R. José do Patrocínio e R. J.J. Rodrigues, há uma mesquita, um templo católico e três igrejas pentecostais, duas protestantes neopentecostais e uma evangélica que não identificamos a linha teológica. Como centro religioso, há uma nova movimentação de pessoas no local, muitas vindo de fora do bairro, dependendo das atividades religiosas. Por exemplo, todas as Quintas-feiras à noite a Congregação Cristã no Brasil, situada na esquina entre a R. Barão do Rio Branco e a R. XV de Novembro têm atividades. Isso cria um grande fluxo de veículos nessas ruas, muitos dos quais ficarão estacionados em toda a XV 2018). 6 Jundiaí tem latitude 23o 04’ 35’’S e 23o 19’ 34’’ S e longitude entre 46o 47’14’’W e 47o 01’ 43’’ W, sendo as coordenadas centrais 23o 11’ 20’’S e 46o 53’ 01’’ W (Jundiaí em Números, PMJ, 2018).

de Novembro ou em um terreno nessa mesma rua usado como estacionamento; isso acontece também nas sextas-feiras com a mesquita implantada na XV de Novembro e a R. José do Patrocínio bem como com os outros templos em dias de cultos ou outras atividades. Toda atividade, porém, cessa antes das 22h e mesmo antes acontece em edifícios fechados para a cidade, sem permeabilidade visual ou física, antes como fortalezas urbanas cercadas por muro e grades. Neste ponto, a nossa proposta de um novo Templo protestante no local visa a articulação entre estes templos que se encontram fechados para a cidade ao mesmo tempo que o novo edifício pode ser um espaço usado em mais dias da semana em diversos horários, inclusive depois das 22h. Depois das 22h, as ruas do bairro começam a sofrem um completo esvaziamento. Todo o comércio e templo permanecem fechados, exceto um restaurante fast food, uma farmácia 24h, um ponto de taxi e um “bar” - todos na J.J. Rodrigues. Não são raras as vezes ver neste horário pessoas em situação de rua ou usuários de drogas. Tanto que é servido um sopão debaixo do Viaduto Sperandio Pelliciarri (próximo ao terminal de ônibus) para atender essas pessoas, mas não sabemos em que dias da semana exatamente. Uma exceção são as sextas-feiras e os sábados onde o Rei da Noite e Clube Ipiranga, situados na Av. São Paulo atraem jovens de muitos bairros da região para shows e “baladas” durante a madrugada. Muitos chegam descendo no terminal de


PARÓQUIA NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO CONDOMÍNIOS CONSTRUÍDOS DEPOIS DE 2010 CENTRO

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104 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

ônibus e sobem a pé pela R. Lacerda Franco até eles. A garantia da permeabilidade da quadra onde se encontrará o novo templo e o funcionamento de outras atividades noturnas - seja em socorro às pessoas em situação de rua seja em diálogos com o público jovem a noite – criará novas dinâmicas no bairro. Aos sábados a rotina do bairro permanece com seu caráter de corredor urbano porém com menor intensidade que a semana. Alguns comércios fecham no meio da tarde, outros maiores, como o supermercado, e salões de cabeleireiros permanecem abertos o dia todo. À noite, há uma grande movimentação religiosa em boa parte dos templos. Do outro lado do bairro, ao longo da Av. Dr. Odil Campos de Sáes há restaurantes tradicionais da cidade bem como um pequeno mercado popular, muito utilizados nos finais de semana. No domingo, todo o comércio permanece fechado, com algumas exceções, há uma movimentação religiosa no período da manhã e a noite. Pela manhã, também, a uma feira livre que acontece na Av. União dos Ferroviários próxima a estação de trem. Muitos carros estacionam na R. Leonardo Scarpim com supervisão de inúmeros flanelinhas. Algumas vezes, nas antigas vilas industriais escondidas do ritmo e fluxos do bairro, é possível ver algumas senhoras sentadas em banquinhos conversando na calçada e olhando uma meia dúzia de crianças brincando – para todos aqueles que cortam caminho nas suas ruas, é possível que sejam interrompidos uma delas. No final de semana, o terreno agora su-

butilizado, poderá servir a população do bairro, dos bairros vizinhos e das cidades ao redor como espaço cívico, visto que a tanto o bairro, Jundiaí e região carecem destes espaços. Não há no bairro um terceiro lugar, isto é, um entre o privado e o público que proporcione a população vivenciar e criar uma identidade com a cidade, carece de urbanidade. Mesmo o que há hoje, como a feira livre, as vilas, os templos e o centro cultural Argos (justaposto ao bairro) são limitados a um determinado grupo, para um uso específico e e(ou) a um determinado tempo semanal. A Vila Arens tem adquirido uma característica de não-lugar com a especulação imobiliária vista na progressiva desconstrução do patrimônio industrial e verticalização o que cria um bairro inseguro, falta de espaços públicos generosos e atrativos. Não há espaços que reforcem o sentimento de comunidade, antes como um local de consumo segmentado em tribos. Consumo de produtos, de serviços, transporte, solo urbano e religião. As tribos dos condomínios, dos que passam pelo bairro, das vilas e dos templos. Se a arquitetura sempre revelará como uma comunidade de fiéis se relaciona com o sagrado, do mesmo modo a arquitetura do templo revela como os fiéis de uma religião relacionam com a cidade. No caso da Vila Arens, quando os templos apresentam recuos, em todas há algum tipo de barreira: são muros, cercas e escadarias que comprometem a permeabilidade da cidade e quando tem a testada colada na calçada ou intermediada por


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106 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

vagas de carros são espaços não convidativos e que não dialogam em nada com a cidade. Sem dúvida descosturas no tecido urbano. O nosso projeto neste trabalho procura reverter esta lógica programática por meio de um diálogo direto com a cidade. 6. A indústria de tecelagem Japy Descosturado do tecido urbano está o terreno da antiga indústria de fiação e tecelagem Japy cujo antigo galpão industrial se encontra 60% demolido em terreno de aproximadamente 16.500m² (porém se contarmos todo o terreno original adicionando uma parte que atualmente é utilizado como um estacionamento e carga e descarga de um supermercado, chegaremos a cerca de 24.000m²). A indústria foi fundada entre 1912 e 1914 pelo Senador Antônio de Lacerda Franco na rua que hoje recebe seu nome. Ela produzia sacos de estopa e viria a se tornou uma das mais importantes fábricas de tecidos durante o primeiro período de industrialização de Jundiaí onde muitas indústrias de fiação e tecelagem se instalaram próximo da estação de trem e do rio Guapeva, como falamos anteriormente (Kalman 2011; PMJ, 2018). Em 1948 a Fábrica foi vendida para J.J. Abdalla S/A, um dos acionistas com mais cotas. A partir de então, a má gestão fez a empresa acumular dívidas com a Receita Federal do mesmo modo as péssimas condições de trabalho levaram a uma movimentação operária por meio de greve e ações na justiça, inclusive com a criação do Sindi-

cato Têxtil, fundado por uma operária Hilda Latance. Por fim, a propriedade foi leiloada. O supermercado Pães Mendonça passou a ocupar o local de 1980 a 1995. Já em 2003, a N.R. Empreendimentos recebeu a propriedade dos então proprietários Russi Ltda e Nivoloni Cia Ltda e iniciou a demolição do edifício. Na década seguinte, houve um lançamento de um novo condomínio vertical residencial no terreno (Kalman, 2014; PMJ, 2018). A construção não foi iniciada e o empreendimento encerrado por não conformidades entre a construtora, a prefeitura e o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat), mesmo que o projeto não tenha sido barrado neste último órgão. O projeto consistia em um condomínio vertical com quatro torres de vinte andares! A chaminé e um trecho do galpão (que viria a ser doado para o município) seriam preservados do antigo edifício. Mesmo que todos os detalhes da questão não sejam claros, alguns documentos retratam a discussão entorno do monumento. A solicitação ao Condephaat pela responsável do empreendimento interessada na construção no local e o parecer da relatora Cristina Meneguelo se encontra disponível online: processo nº 66000/20127 cujo interessado PDG 7 Além desse processo, sobre a permissão de construção (nº 66000/2012), havia outros dois processos que tramitavam no Condephaat: um propunha o tombamento (nº 65641/2011) e outro a sua inclusão na envoltória da estação ferroviária (nº 69728/2013) – todos os três negados e arquivados conforme o Diário oficial do Estado de São Paulo de 20 de Novembro de 2013 (DOSP, 2013). O processo nº 65641/2011 contém um amplo levantamento histórico do edifício.


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 107

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108 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

Realty S.A. Emp. e Partic. Solicita: “aprovação de projeto de construção na área da antiga tecelagem Japi situada a Rua Lacerda Franco, S/Nº, no Município de Jundiaí” (Meneguelo, 2012). O relatório descreve que o imóvel original foi desmembrado em cinco lotes em 19 de Janeiro de 20128. Como a relatora descreve o projeto se propunha a: “Construção de quatro torres de apartamentos, cada uma delas com 20 pavimentos no lote 02, que continha parte do galpão [...], além de restauro dos dois módulos de sheds do galpão a partir da fachada para implantação de um equipamento público e da chaminé” (Meneguelo, 2012, p. 73). Importante dizer que a chaminé é a única construção tombada pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural (Compac) processo nº 3629/1990. Para o projeto do templo protestante no terreno da antiga indústria de tecelagem, podemos fazer uso da Carta de Veneza de 1964 e dos Princípios de La Valetta, 2011. A Carta de Veneza do II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos (ICOMOS) traz diretrizes internacionais para o patrimônio. Apesar do restante da antiga fá8 O relatório descreve que: “matrícula 124.993 – Lote 01, de 5.528,76m², que permaneceu como propriedade da N. R. Empreendimentos e Administração Ltda.; matrícula 124.994 – Lote 02, de 14.616,68m², comprado pela PDG Realty S. A. Empreendimentos e Participações (lote com a maior parte dos galpões da antiga Fábrica); matrícula 124.995 – terreno designado como “alargamento de via, de 355,02m², transmitido ao patrimônio Municipal; matrícula 124.996 – terreno designado como “área institucional”, de 1.186,50m², transmitido ao Patrimônio Municipal; e matrícula 124.997 – terreno designado como “área verde”, de 2.370,21m².” (Meneguelo, 2012, p. 70)

brica Japy ser uma sombra do que já foi no passado ou apenas um fragmento arquitetônico, ela continua portando a mensagem “espiritual do passado, [pois] as obras monumentais de cada povo perduram no presente como o testemunho vivo de suas tradições seculares” (Carta de Veneza, 1964, p.1) para a cidade jundiaiense. Sobre conservação pontuamos o seu Artigo 5º que afirma que “a conservação dos monumentos é sempre favorecida por sua destinação a uma função útil da sociedade; tal destinação é portanto, desejável, mas não pode nem deve alterar à disposição ou a decoração dos edifícios [...]”(Carta de Veneza, 1964, p.2). Como também, toda a intervenção e restauro, não visa a unidade de estilo ou reconstruir o que se perdeu (Art. 11º), mas antes “os elementos destinados a substituir as partes faltantes devem integrar-se harmonicamente ao conjunto, distinguindo-se, todavia, das partes originais [...]” (Carta de Veneza, 1964, p.3) como coloca o artigo 12º. Na mesma linha, podemos olhar para o que resta da fábrica na escala da cidade conforme os Princípios de La Valleta para a Salvaguarda e Gestão de Cidades e Conjuntos Urbanos Históricos adotados pela 17ª Assembleia do ICOMOS, Paris, em 2011. Há nesse documento uma preocupação pela manutenção da identidade local diante de tantas mudanças nas cidades que levam a segregação e desenraizamento social. Logo, o principal objetivo do documento é “propor princípios e estratégias aplicáveis a qualquer intervenção nas cidades e áreas urbanas históri-


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 109

TERMINAL DE ÔNIBUS VILA ARENS

IGREJAS DEUS É AMOR E O BRASIL PARA CRISTO

AV. U NI

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XV

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Fotografia: Edson Barcaro, 2018

IGREJA DO EVANGELHO QUADRANGULAR

CONGREGAÇÃO CRISTÃ

TERRENO PARA O PROJETO

VILA OPERÁRIA

N



Terreno para o novo templo protestante Atualmente, boa parte da antiga fábrica Japy se encontra demolida. O terreno está dividido entre diferentes donos - um trecho considerável, por exemplo, funciona como carga, descarga e estacionamento de um supermercado local. Neste trabalho, projetaremos sobre o conjunto. Do antigo edifício restam as ruínas do (1) prédio de produção, (2) o eixo de circulação e (3) antiga administração.

Fotografia: Edson Barcaro, 2018

3

2

1

Fotografia: Edson Barcaro, 2018




114 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

te e como dialogam com a cidade. O entendimento cas [...] [a fim de] salvaguardar os valores de cidades destes sistemas complexos acontece de baixo para históricas e as suas configurações, bem como a sua cima em uma: “orquestração entre todas as partes inintegração na vida social, cultural e econômica dos teressadas: autoridades eleitas, serviços municipais, nossos tempos” (Icomos, 2011, p. 2). Isto porque, administrações públicas, especialistas, organizações se as mudanças forem bem geridas pode ser uma profissionais, organizações de voluntários, universioportunidade para melhorar a qualidade de vida na dades, moradores, etc.” (Icomos, 2011, p. 8), isto é, cidade ao olhar para o processo histórico que a criou uma visão multidisciplinar e colaborativa. (Icomos, no presente, pois “as cidades históricas e as áreas 2011). urbanas são a prova viva do passado que as forPara a construção de novos mou” (Icomos, 2011, p. 2) sendo que É UMA SENSIBILIDADE FEedifícios ou adaptações o documento são providas não só de elementos NOMENOLÓGICA QUE TANGE estabelece que: tangíveis, como também intangíveis: “atividades, funções simbólicas e his- O ESPAÇO PÚBLICO ENTEN- [...] Perspectivas, pontos de vista, pontos tóricas, praticas culturais, tradições, DIDO MAIS DO QUE QUE UM focais e corredores visuais são partes inmemórias e referências culturais que ESPAÇO DE CIRCULAÇÃO E tegrantes da percepção dos espaços históricos. Devem ser respeitados em caso constituem a substância do seu valor CONSUMO, É UM LOCAL DE de novas intervenções. Antes de qualquer histórico” (Icomos, 2011, p. 2). As in- CONTEMPLAÇÃO, APRENDIintervenção, o contexto existente deve ser tervenções arquitetônicas devem ser ZAGEM, DIVERSÃO E ESSENcuidadosamente analisado e documentaCIAL PARA AS RELAÇÕES pensadas em continuidade do tecido do. As perspectivas, quer sobre quer a SOCIAIS. urbano, contexto e valores – uma partir de novas construções, devem ser abordagem que se aproxima muito do Landscape Urbanism – o documento de 2011 afirma:

identificadas, estudadas e organizadas (Icomos, 2011, p. 10)

Deve ser dada prioridade a uma continuidade da composição que não afete adversamente a arquitetura existente e, ao mesmo tempo, que permita uma criatividade exigente, abraçando o espírito do lugar. (Icomos, 2011, p.5)

É uma sensibilidade fenomenológica que tange o espaço público entendido mais do que que um espaço de circulação e consumo, é um local de contemplação, aprendizagem, diversão e essencial para as relações sociais. Deve sempre haver um equilíbrio entre os ambientes construídos e os espaços públicos. O espaço urbano não está desassociado

Uma continuidade que deve ser entendida ao não olhar para o monumento isoladamente, mas levando em consideração sua área envolven-


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 115

do tempo, da mudança geracional, das estruturas e transformações socioeconômicas: É importante reconhecer que o processo de envelhecimento da população surge do aumento de rendas e da deterioração do espaço público e das zonas residenciais da cidade ou área urbana. [...] [e que] pode afetar as comunidades e levar à perda de habitabilidade de um local e, em última análise, do seu caráter. A manutenção da diversidade tradicional cultural e econômica de cada lugar é essencial, especialmente quando é característica do lugar. (Icomos, 2011, pp.5 -6)

O documento propõe, também, que qualquer intervenção na cidade ou edifício construído seja mais sustentável ambientalmente ao melhorar a eficiência energética, utilizar menos recursos naturais e reduzir ilhas de calor urbanas. A memória e identidade de um local não são construídas somente na materialidade das paredes, detalhes esculpidos, esquadrias ou tesouras dos seus edifícios, mas na sua relação intangível com os moradores da cidade bem como seu diálogo com a cidade. 7. Um templo para a cidade Tendo em vista as considerações apresentadas acima, foram traçados os seguintes objetivos para este projeto: (1) Diminuir as barreiras sociais, incentivan-

do projetos com participação de diferentes classes sociais; (2) Reforçar o sentimento de vizinhança; (3) Preservar a memória e identidade do bairro; (4) Acolher pessoas em situação de risco e vítimas de violência; (5) Propiciar a inserção social de pessoas marginalizadas; (6) Ser um edifício multifuncional o quanto possível em diferentes horas do dia e da noite ao longo da semana; (7) Abrigar pequenos programas culturais, de aprendizagem e produtivos que atendam a demanda da comunidade regional; (8) Estabelecer percursos no miolo de quadra segundo os fluxos do bairro; (9) Criar espaços verdes para lazer, contemplação e atividades produtivas; (10) Articular os templos protestantes existentes; (11) Buscar o uso consciente dos recursos levando em conta a sustentabilidade na operação e manutenção do edifício.


116 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE


Município, bairro e terreno para o novo projeto | 117

Projeto referencial: Long Museum West Bund - Localização: Shanghai, China; - Arquitetos: Atelier Deshaus - Ano do projeto: 2014; - Área: 33.007m²; O museu foi construído em um antigo local de transporte de carvão. Nota-se o diálogo por contraste de escalas, texturas e hierarquia de circulação.

Este trabalho procura explorar estas relações com sensoriais entre o novo edifício e o existente no terreno. Imagens disponíveis em: https://www.archdaily. com/554661/long-museum-west-bund-atelier-deshaus. Acesso 29 de Maio de 2018.


Fotomontagem com a proposta


Parte IV: Proposta arquitetĂ´nica


120 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

1, Conceito e partido Após a introdução teórica dos capítulos anteriores e levantamento de informações sobre o local do projeto, esta seção apresenta uma proposta projetual. O templo deve ser sensível às transformações sociais, econômicas, urbanas e tecnológicas ao longo da passagem de gerações bem como abrigar outros programas com caráter comunitário a fim de que se reforce o sentimento de vizinhança, comunidade e identidade local. Assim, o projeto estabelece três esferas programáticas: o centro comunitário, o parque e o templo. Sendo o templo objeto de estudo deste trabalho. O templo foi desenvolvido de modo a permitir uma construção em etapas, uma vez que esse tipo de construção costuma ser financiada com recursos da comunidade, etc. Tendo em vista que a comunidade de fiéis, a sociedade, o bairro e a cidade mudam ao longo do tempo, e que não se pode ter certeza sobre o uso do edifício daqui a cinquenta ou cem anos, ele foi construído de maneira que grande parte de seus elementos podem ser desmontados e reaproveitados ou o próprio edifício pode passar a ter outros usos tirando ou adicionando partes específicas. Esses conceitos foram materializados estabelecendo uma base comum para o trabalho colaborativo entre arquitetura e engenharia de estruturas, conforme colocado por Oxman e Oxman (2010). O partido desta estruturação foi uma visão sistêmica do edifício, ou seja, subdividi-lo em partes, analisar cada

uma sistematicamente e depois inseri-las novamente ao todo (Kieran e Timberlake, 2002). Para viabilizar esta abordagem viabilizando o desempenho ambiental o projeto incorporou o conceito de box in box, isto é, um volume dentro de outro com certa independência entre eles. Isso permitiu que existissem três diferentes frentes de trabalho simultâneas: (1) auditório (representando a box interna), (2) foyer (interstício) e (3) envoltória (box externa). As questões de acústica e de visibilidade foram respondidas pela geometria do auditório cuja liberdade em relação ao foyer e à envoltória permitiu explorar possibilidades de layout. O mesmo ocorreu com a envoltória, porém, em relação ao ganho térmico por radiação direta. O interstício, por sua vez, espaço negativo das duas propostas, formou muito mais que um vazio. Originou um espaço que serve o auditório (núcleo) e o meio externo. Ele faz com que o programa se articule e o edifício funcione, assim como acontece com as organelas no citoplasma de uma célula ou o albúmen de um ovo de galinha. A base comum de trabalho foi implementada por meio de algoritmos construídos dentro do ambiente do Grasshopper e diversos add-ons como o Karamba (para análise estrutural), Ladybug e Honeybee (para análise energética). Assim, este trabalho não partiu de uma forma predefinida, mas de possibilidades, da exploração, de indagações como: como implementar um sistema automatizado para reduzir o ganho térmico do edifício? Como reduzir o ga-


Proposta arquitetônica | 121

Diagrama de implantação - O programa se divide em três grandes grupos: templo, centro comunitário e parque. Este projeto foca no projeto do templo. R.

BA

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BR

AN

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IMARÃ

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ACESSO ESTACIONAMENTO SUBSOLO

ACESSO SECUNDÁRIO AO PARQUE

PARQUE

R. LACERDA FRANCO

TEMPLO

C. COMUNITÁRIO

ACESSO AO PARQUE

N SEM ESCALA

ACESSO AO CENTRO COMUNITÁRIO

ACESSO PRINCIPAL AO TEMPLO


122 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

nho térmico ao mesmo tempo em que haja a redução da massa da estrutura? Como viabilizar o projeto e a construção de auditórios assimétricos e mais complexos? Uma discussão integrada com outras áreas como apontam Oxman e Oxman (2010). Assim, os caminhos para uma síntese foram explorados colaborativamente com o João Pedro Valente, graduando em Engenharia Civil na Unicamp. As discussões do grupo trouxeram resultados inesperados e instigantes.

Contrabalanceamento - No inicio do projeto, foi pensado um contrabalanceamento da galeria a fim de evitar a colocação de pilares dentro do auditório. O croqui acima procura articular este recurso com os espaços de circulação do foyer. Posteriormente, as galerias foram retiradas, pois a demanda de usuários foi atendida em um único pavimento.

Box in box- Neste croqui, um dos primeiras, já é possível notar o conceito do box in box que veio a fundamentar todo o trabalho.


Proposta arquitetônica | 123

OVO

BOX IN BOX

SERVIDO SERVE SERVIDO

Partido - Todo o desenvolvimento projetual se firmou sobre o conceito de box in box, isto é, um volume dentro do outro com certa independência entre ambos. Isso pode ser visto em inúmeros casos na natureza como em ovos, sementes e células. O espaço intermediário, o vazio, é apropriado com um programa que serve o auditório bem como os espaços externos adjacentes - a comunidade de fiéis e a sociedade.


124 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

4

3

2

1

2. Blocos e eixo - Um eixo central com pé-direito duplo e iluminação zenital percorria o edifício de produção da entrada até o bloco administrativo, hoje em ruínas.

1. Situação atual - Boa parte do antigo edifício industrial se encontra em ruínas. A parte existente do bloco de produção será restaurada e utilizada como centro comunitário (1). Bem como parte dos pilares que demarcavam o antigo eixo de circulação da fábrica (2) serão preservados e manterão a função de eixo principal de acesso, agora como percurso até o novo edifício do templo. O antigo bloco administrativo (3), que se encontra em ruínas, será demolido enquanto que a chaminé será mantida.

3. Hierarquia atual - Hoje o que resta do edifício de produção possui três acessos. Uma das entradas permanece alinhada com resquícios do antigo eixo. Pela parte posterior do terreno, o elevador dá acesso ao estacionamento.


Proposta arquitetônica | 125

4. Ponto - A chaminé, o único bem tombado do conjunto, se destaca na paisagem como um marco urbano e memória local.

5. Substituição - Parte do conjunto que se encontra em situação precária foi retirado. Foram preservados parte do edifício de produção, do eixo principal de circulação, o elevador e a chaminé.

6. Tensão e equilíbrio - O antigo eixo com pilares faz a comunicação entre os dois blocos, o antigo e o novo.


126 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

Memória e cidade O projeto propõe o restauro do antigo prédio de produção fabril e a sua apropriação por moradores da cidade como fator importante para a manutenção da memória local. A antiga fábrica com seus três sheds orientados para sul foram reinterpretados e, quando associados ao novo programa religioso, direcionaram o partido projetual. O novo edifício carrega semelhanças com a arquitetura industrial na materialidade, nas estratégias de abertura e nas faces oblíquas.

O templo possui ainda uma altura menor que a antiga chaminé da indústria. Esta diferença de gabarito preserva o skyline da cidade. Discretamente, porém, devido a topografia e a forma, o prédio se eleva no horizonte se diferenciando do entorno (característica desejada para templos). Persp. abaixo - Os sheds garantem iluminação e ventilação para edifícios industriais. No prédio do templo grandes aberturas foram orientadas para o sul para propiciar essas qualidades. Persp. direita - Fotomontagem com a inserção do projeto na cidade.


Proposta arquitetĂ´nica | 127


128 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

1. Construção dos pilares em concreto

DESMONTAGEM

MONTAGEM

2. Construção da cobertura treliçada

3. Construção do forro e do auditório

4. Construção dos espaços auxiliares sob o auditório

5. Construção dos espaços auxiliares no foyer Construção e demolição - O projeto foi pensado para uma implantação progressiva bem como uma demolição em etapas.


Proposta arquitetônica | 129

Croquis - De cima para baixo e da esquerda para direita - (1) Um dos primeiros croquis representando o foyer, feito com giz pastel seco. (2) Estudo de implantação - ao final foi escolhido o caso do templo alinhado com o antigo edifício industrial. (3) Estudo do processo construtivo - posteriormente foi decidido construir toda a cobertura primeiro e depois os espaços internos. (4) Estudo de conforto térmico passivo e criação de microclima entre o auditório e a casca


130 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

2. Programa Segundo a análise urbana e da aplicação em uso religioso protestante, o projeto se firmará em três núcleos: (I) o templo protestante que resulta em (II) espaços comunitários e (III) se costuram na malha urbana por meio de um parque no miolo de quadra. O projeto será instalado progressivamente no terreno onde permanecerá por algumas décadas. Após este tempo, as edificações e intervenções devem ser completamente removidas e responder coerentemente às demandas de modificações programáticas neste futuro. O edifício para o templo foi o objeto de estudo deste trabalho, assim seu programa e espaços foram elaboradas com mais detalhes. Tanto para o parque quanto para o centro comunitário foram pensadas diretrizes e atividades, mas a articulação dos espaços e a implantação do programa deve ser pensada em trabalhos futuros.

PARQUE E CENTRO COMUNITÁRIO ATIVIDADES

CONTEMPLAÇÃO DESCANSO ATIVIDADES ESPORTIVAS

PARQUE FEIRAS E EXPOSIÇÕES

APRENDIZADO EXPOSIÇÕES

ATIVIDADES RECREATIVAS

ATENDIMENTO PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RISCO

CENTRO COMUNITÁRIO

ATIVIDADES MANUAIS

ATIVIDADES RECREATIVAS

ATENDIMENTOS DE SÁUDE FÍSICO-MENTAL


Proposta arquitetônica | 131

CO

M

UN

ID

TEMPLO ESPAÇOS

AD

E SALA DE ORAÇÃO RECEPÇÃO

ESPAÇO MULTIUSO

FOYER

JARDIM CONTEMPLAÇÃO

TI CO

LE

CARGA E DESCARGA

VO

CAFÉ

BERÇARIO

BATISTÉRIO

AUDITÓRIO PRINCIPAL

SALAS DE AULA

ESPAÇOS DE APRENDIZAGEM

IA L

SANITÁRIOS

ÁREA TÉCNICA E DEPÓSITOS

SECRETARIAS

O IV

BIBLIOTECA COMUNITÁRIA

ADMINISTRAÇÃO

AT

SO C

ESTÚDIO DE GRAVAÇÃO

SALAS PASTORAIS

IV PR

SALAS ATENDIMENTOS DIVERSOS

SALA DE REUNIÃO

DEPÓSITO DE INSTRUMENTOS

SANITÁRIOS SALAS DE ENSAIO TEATRO E DANÇA

ÁREA TÉCNICA SONOPLASTIA, GRAVAÇÃO E ILUMINAÇÃO

Diagrama programático - Espaços categorizados e dispostos segundo os vetores de vocação. Mesmo que possa existir sobreposição das categorias, a principal característica foi destacada.


3. Estruturação colaborativa do projeto da cobertura

SIMULAÇÃO ENERGÉTICA OBJETIVO: REDUZIR GANHO TÉRMICO ANUAL DE RADIAÇÃO DIRETA E AUMENTAR FACES AUTO-SOMBREADAS

DEFINIÇÃO DE VARIÁVEIS COMUNS

PIOR ANÁLISE

SIMULAÇÃO ESTRUTURAL OBJETIVO: REDUZIR MASSA, DESLOCAMENTO, QUANT. BARRAS FORA DA NORMA

Ciclo de otimização energética e estrutural - Este diagrama sintetiza as ações conjuntas com João Pedro Valente, graduando em Engenharia Civil, encarregado do projeto estrutural. Conforme o pano de fundo teórico, a estrutura não veio após o projeto arquitetônico, mas foi desenvolvido colaborativamente com a arquitetura. Isso trouxe uma rica discussão e potencializou ambos os projetos.

SIMULAÇÃO ENERGÉTICA


DETALHAMENTO

MELHOR

DESENV. GERAL; ABERTURAS; PAREDES INTERNAS;

PROJETO FINAL

REFINAMENTO DA ESTRUTURA


GANHO ANUAL: 110x10^6KWH/m²

x x x

x

GANHO ANUAL: 78x10^6KWH/m²

y

y

y

REDUÇÃO EM 29%

y

x

x x

y

x

y

REDUÇÃO GANHO TÉRMICO

y

y

DEFINIÇÃO DE VARIÁVEIS COMUNS

ESTRUTURA: MASSA: 268T RAZÃO: 52Kg/m² ALTURA DA TRELIÇA: 0,5m NÍVEL SUBDIVISÃO: 8

MASSA: 152T RAZÃO: 29,4Kg/m² ALTURA DA TRELIÇA: 1,70m NÍVEL SUBDIVISÃO: 5

REDUÇÃO EM 43,2% REDUÇÃO MASSA ESTRUTURA


Proposta arquitetônica | 135

Simulações - Mediante a ausência de dados climáticos da cidade de Jundiaí, foram utilizados dados climáticos de Campinas. O algoritmo obteve uma redução das faces expostas à radiação solar direta, resultando em faces laterais quase que totalmente verticais quando não levemente inclinadas para dentro. Enquanto que o algoritmo para a estrutura reduziu a massa da estrutura alterando as quantidades, comprimentos e seções das barras metálicas.

PIOR

MELHOR

ANÁLISE

ANÁLISE TÉRMICA GANHO ANUAL: 73x10^6KWH/m²

REDUÇÃO EM 33%

FIM


1. Início com o perímetro do auditório

3. Criação de quatro regiões para garantir distribuição mais uniformes dos pontos de apoio

5. Aplicação da malha

2. Offset do perímetro do auditório

4. Intersecção entre as curvas e as quatro regiões

6. Extração dos pontos da malha nas regiões


x

x y y 7. Eliminação de pontos nas quatro regiões por uma x y porcentagem definida e geração de um perímetro convexo. x x

x

y

y

x

x

y

y x

x

x

y

y

x

y

x

x

y

x

y

x

y

x

y

y

y x

y

8. Deslocamento aleatório em Z dentro de um intervalo.

y

9. Deslocamento aleatório dos pontos em X e Y.

10. Triangulação inicial.

11. Inserção dos pilares internos no perímetro do auditório.

12. Triangulação final levando em conta os pilares mais altos gerando um sólido convexo.


138 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

Ciclo de otimização energética x x

x

y

y

x

y

x

x

y x

1. Deslocamento aleatório em z

x

y

y

x

y

y

2. Deslocamento aleatório em X e Y

y


Proposta arquitetônica | 139

Combinação das posições dos pontos em XYZ para redução de radiação direta. Algoritmos foram utilizados para aprimorar automaticamente a combinação das posições visando a redução do ganho térmico.

O Opossum testa as melhores combinações de parâmetros (genomas) por etapas (gerações), em um processo semelhante ao que acontece na seleção natural.

Para tanto, foi utilizado o Opossum dentro da plataforma do Grasshopper junto com o Ladybug e o Karamba.

Algoritmo para a “casca” Neste trecho do código é possível ver o processo generativo da casca e análise energética.


140 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

Corte longitudinal Jardim interno - No espaço posterior do templo foram criados um jardim e um café.


Proposta arquitetônica | 141

espacial colaborou para seu sombreamento. 3. Painéis de vedação com tonalidade clara – os painéis com tonalidade clara empregados no projeto refletem boa parte da radiação. 4. Isolamento térmico – A casca externa tem vedação leve com uma camada de lã de pet retardando a entrada de calor durante o dia. 5. Massa térmica – A estrutura interna em concreto e o piso frio do foyer, que apresentam grande massa, absorvem calor durante o dia.

4. Condicionamento térmico passivo Jundiaí apresenta um clima tropical de altitude com temperatura máxima média de 27,5°C e mínima média de 14,3°C, segundo o Instituto Agronômico de Campinas 1996, Estação experimental Jundiaí/ IAC 1941 a 1995. Assim, as seguintes estratégias foram empregadas para promover o conforto térmico passivo: 1. Adequação da geometria por algoritmos – O emprego de algoritmos facilitou a geração e manipulação da forma com o objetivo de reduzir o ganho energético por radiação direta ao longo do ano. 2. Orientação e sombreamento das aberturas – As maiores aberturas foram dispostas nas faces com menor ganho térmico e, por estarem recuadas em relação aos demais painéis de vedação, a treliça

6. Ventilação entreforro – O entreforro da casca possui ventilação natural cruzada com uma combinação de controle manual e automático. Isso favorece a retirada de calor durante a noite. 7. Vegetação e espelhos d’água – Pela cidade apresentar invernos secos, a vegetação e os espelhos d’água contribuem para a manutenção do conforto térmico ao manter a umidade do ar e promover o resfriamento evaporativo durante o dia. 8. Ar-condicionado – O auditório será resfriado artificialmente. A entrada de ar será feita pelo piso promovendo uma zona de conforto próxima dos espectadores.


142 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

5. Projeto estrutural por João Pedro Valente Em uma primeira análise da estrutura (com uma geometria qualquer gerada pelo modelo paramétrico), as barras foram consideradas com rigidez à flexão, e as cargas foram transferidas da superfície como carregamentos distribuídos na mesma. Entretanto, pelos resultados da análise estrutural logo se verificou a inviabilidade dessa solução: as barras possuíam cerca de 30m de comprimento, e mesmo utilizando o maior perfil comercial disponível, as deformações eram da ordem de 7m no meio do vão.

Seriam necessários perfis com mais de um metro de diâmetro para manter os deslocamentos na ordem de 18cm e a utilização das barras abaixo de 100%. Essa abordagem resultaria em uma massa de 5700 toneladas de aço para a estrutura. Modelo final Foram feitas simulações estruturais considerando os mais variados casos possíveis para essa geometria: ora foi fixado determinado nível de triangulação para otimizar apenas a altura da treliça, ora

Proposta estrutural inicial - Na proposta inicial, as barras estruturais foram dispostas nas arestas da volumetria


Proposta arquitetônica | 143

Aplicação de algoritmos - O uso de algoritmos na concepção do projeto facilitou explorar diferentes propostas bem como possibilitou o trabalho colaborativo.

Proposta estrutural final - Uma treliça espacial foi desenvolvida para a envoltória. Conta com perfis tubulares com seções de catálogos de fornecedores. O algoritmo estrutural tem como objetivo a redução da massa de aço.


144 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

foi modificada a função de otimização para que só a massa fosse otimizada e as implicações nos parâmetros pudessem ser analisadas, entre outros. Para efeito de comparação, foram gerados também modelos em que a superfície foi suavizada e suas bordas foram eliminadas. Basicamente, o processo consiste em identificar quais os valores de nível de subdivisão e altura de treliça que minimizam a função de adequação em cada caso. O valor resultante do modelo final obteve

taxa de aço, de 29,4kg/m², sendo condizente com os valores encontrados na literatura. Souza e Malite (2005), por exemplo, obtiveram resultados de 26,2kg/ m² a 33,9kg/m² analisando diferentes configurações de treliças espaciais, o que significa que, mesmo se tratando de uma geometria complexa, o valor obtido está muito próximo do que se considera aceitável. É importante lembrar que, neste caso, a treliça envolve também as laterais do edifício. A estrutura resultante, portanto, consiste em uma treliça espacial com vão

Jardim - Um jardim será criado no espaço de transição entre o centro comunitário e o templo. Neste trecho a treliça espacial ficará visível pelo lado de fora. Além de compor a fachada da edificação, faz sombreamento das aberturas e permite a ventilação do entreforro.


Proposta arquitetônica | 145

máximo de 61m, altura de 1,70m, composta por 5397 barras de diâmetros variáveis, conectadas por 1387 nós do tipo Mero, pesando 152 toneladas e cobrindo uma área em planta de 5161m². A descrição completa do projeto estrutural foi reunida no Trabalho Final de Curso intitulado “ O processo colaborativo entre engenheiros de estruturas e arquitetos na concepção e analise de estruturas paramétricas”.

Foyer principal - Do lado interno, por sua vez, o foyer permite diferentes apropriações programáticas. Quanto à estrutura, foram fixadas na treliça espacial um forro de fibras trançadas de bambu e a caixilharia dos panos de vidro.


146 | MECANISMOS DE ESTRUTURAÇÃO DA FORMA: APLICAÇÕES EM UM TEMPLO PROTESTANTE

6. Desenvolvimento da cobertura Paralelamente ao desenvolvimento do auditório, a cobertura do projeto recebeu especial atenção. Se o projeto do auditório esteve orientado para as questões de visibilidade e acústica, a “casca” buscou minimizar o ganho térmico por radiação direta e sombrear faces que poderiam receber aberturas, bem como encontrar uma solução estrutural viável e com a menor massa possível. Na construção do projeto, a casca será construída logo depois dos pilares internos, permitindo que o programa cresça paulatinamente no interior. Haverá, assim, melhores condições no canteiro de obras e crescimento do programa conforme as condições financeiras da comunidade. Quando o templo sair do local, cerca de um século depois do término da construção, a cobertura será a última a ser desmontada, facilitando o desmonte do programa. Por essa necessidade de montagem, desmontagem e leveza, ela foi projetada com uma treliça espacial utilizando perfis tubulares metálicos. Após a saída do programa religioso, suas peças podem ser reaproveitadas no local ou em outro. Muitas possibilidades foram exploradas para permitir a entrada de luz, ventilação, estanqueidade e isolamento térmico da vedação. Foram estudados desde o uso de painéis cimentícios fresados até o desenvolvimento de um novo emprego de telhas zipadas. Ao final, um sistema de junta invertida foi escolhido. Este sistema, patenteado pela Zahner, garante

a continuidade da fachada por painéis metálicos com juntas discretas. Por baixo há uma camada de isolamento térmico e não é necessária uma camada membrana hidrofugante, pois o sistema conta com calhas embutidas. Na sequência, encontra-se descrito o processo generativo da casca que deu liberdade da forma se alterar por algoritmos genéticos a fim de reduzir o ganho térmico e a massa da estrutura.

Inverted seam, Zahner - Disponível em: https://www. azahner.com/works/contemporary-jewish-museum

Inverted seam, Zahner Disponível em: https://www. azahner.com/works/contemporary-jewish-museum


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Croquis de detalhamento da vedação - Nesta série de croquis, diversas soluções de vedação foram exploradas. O detalhamento do projeto não foi entendido como uma etapa final do projeto, mas como algo que ocorre em paralelo com as outras atividades.


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Croquis “casca”- Alguns croquis do desenvolvimento da casca do templo. Inicialmente, foram exploradas soluções com prismas interseccionados e, posteriormente, uma forma convexa.


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Fachada O painel com junta invertida permite uma uniformidade e estanqueidade da cobertura. Nas regiões com grandes aberturas por sua vez, onde a treliça fica exposta, há uma sobreposição de camadas entre os painéis de vedação e os painéis de vidro. Essa diferença permite a ventilação dos ambientes internos. Parque - O parque ao redor do templo servirá ao bairro como local de descanso e contemplação.


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7. Auditório No projeto do auditório procurou-se, por um lado, obedecer às regras de acústica e de visibilidade e, por outro, obter maior dinamismo na planta, utilizando como referências a Filarmônica de Hamburgo, a Filarmônica de Paris e a Ópera de Guangzhou. Para que isso fosse possível, foi desenvolvido um

algoritmo que permitiu que se experimentasse diferentes alternativas de planta, enquanto ele se encarregava de garantir que a curva de visibilidade e as questões acústicas eram atendidas. Esse algoritmo foi implementado no software Rhinoceros por meio de sua ferramenta de programação visual e escrita, p Grasshopper.

Algoritmo em Grasshopper da primeira geração do auditório O código é iniciado pela valoração das variáveis, em seguida há a construção da geometria, locação das poltronas e por último análise dos resultados

Croqui do templo - O croqui esboça as primeiras ideias para o auditório - um auditório em leque, simétrico e com uma grande galeria.


Proposta arquitetônica | 151

1. Planta inicial

2. Rotação das paredes adjacentes ao palco

Em um templo protestante, os principais objetivos para o auditório são que os fiéis entendam claramente a exposição bíblica e cultuem com diferentes expressões artísticas (música, teatro, dança, etc.). Para ambos os casos, o sentimento nos fiéis de comunidade e igualdade perante o divino deve ser reforçado. Assim, o ponto de partida foi desenvolvimento de uma planta que favorecesse a proximidade e visibilidade entre as pessoas e do palco para o auditório, uma planta centrada, mais do que uma atividade coletiva, as pessoas veem umas às outras. 1. Planta inicial Uma primeira planta foi desenvolvida com um palco situado em uma das arestas de maior dimensão. Ela propiciou uma desejada proximidade entre o preletor e os fiéis. Porém, as primeiras fileiras ficaram com poucas cadeiras e aquelas próximas das paredes adjacentes ao palco tiveram a visibilidade prejudicada. palco

2. Rotação das paredes adjacentes ao

Um novo algoritmo foi desenvolvido no lugar do anterior para implementar uma setorização em leque a partir de subdivisões de um círculo.

3. Nova circulação

3. Formação do auditório em leque A fim de melhorar a visibilidade, um parâmetro de rotação das paredes adjacentes ao palco


foi acrescentado. Seu domínio variava de 15° a 60°. Entretanto, as cadeiras próximas aos cantos do auditório ficaram mais distantes do palco que as demais. Um corredor central foi acrescentado do qual seguiria uma nova divisão dos conjuntos de cadeiras do auditório. Deste modo, duas regras foram implementadas na setorização após o corredor central, se dobraria o número de setores, a fim de evitar fileiras muito compridas, isto é, com mais de dez cadeiras até um corredor.

Filarmônica de Hamburgo, Herzog & de Meuron

Resultados preliminares e um novo começo O algoritmo desenvolvido possibilitou explorar diferentes layouts (os inputs parametrizados e os resultados se encontram abaixo). Entretanto, até este momento, a estruturação do código não viabilizava explorar formas assimétricas e complexas. Foi necessário pensar em um novo caminho para o desenvolvimento.


Ópera de Guangzhou, Zaha Hadid Filarmônica de Paris, Jean Nouvel


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4. Criação de splines A exploração de novas possibilidades para o auditório começou com a criação de quatro círculos. Alguns dos pontos pertencentes às curvas foram extraídos e movidos aleatoriamente no plano xy dentro de um domínio pré-estabelecido. Esses pontos movidos foram interpolados, gerando quatro novas curvas.

externo, diminuiu os vãos internos para a estrutura e favoreceu a criação de nichos dentro do auditório, criando um espaço mais intimista.

5. Novo perímetro O retângulo que inicialmente formava o perímetro do auditório foi distorcido como se o palco atraísse suas arestas. Seu recorte assimétrico beneficiou o projeto na medita que separou ambientes no lado

7. Corte pelo perímetro Os pontos que dividiram as curvas na etapa anterior foram conectados segundo seus índices.

Segundo código para construção do auditório Curvas concêntricas interpoladas.

Croqui de processo construtivo Uma das orientação do projeto foi estudar a implementação do programa ao longo de um grande espaço de tempo, sua manutenção, demolição e apropriação de sistemas para um novo programa.

6. Interpolação das splines As splines criadas no inicio foram interpoladas, criando segmentos retos.


4. Criação de splines

5. Novo perímetro

6. Interpolação das splines

7. Corte pelo perímetro


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8. Criação dos corredores Corredores foram criados no perímetro e entre os setores. Todos tiveram suas dimensões maiores que 1,5m. Esta solução garantiu uma desejada assimetria no auditório.

8. Criação dos corredores

9. Aplicação de relações geométricas Nesta etapa, relações proporcionais foram estabelecidas com base em uma circunferência de 30m de raio. Também foram criados conjuntos de balcões. 10. Corte dos balcões Por fim, os balcões foram cortados pelo perímetro.

9. Aplicação de relações geométricas

10. Corte dos balcões

11. Novo caminho e personalização em massa Ao final da etapa anterior, era necessário atribuir as alturas dos patamares do auditório segundo a curva de visibilidade. Entretanto, não foi encontrada nenhuma solução viável para sua implementação mediante a estruturação do código até este momento. Assim, uma nova abordagem foi empregada. Nesta terceira e última geração do auditório, tudo foi feito em relação à curva de visibilidade desde o princípio, isto é, em função da visão dos espectadores para um ponto focal no palco. Um único código foi desenvolvido para oito


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perfis distintos colocados a cada 45°. Um mesmo algoritmo para diferentes casos permitiu economizar tempo de trabalho, facilitou o aprimoramento da forma, viabilizou análises e rápidas alterações da geometria. Há, portanto, uma aplicação da personalização em massa para viabilizar o projeto. 12. Centralização do palco A flexibilidade do algoritmo desenvolvido foi testada mediante a necessidade de mover o palco alguns metros para a esquerda. Neste momento, vários aspectos do auditório já haviam sido consolidados, inclusive sua volumetria e refletores acústicos. Por meio de metodologias tradicionais, qualquer mudança na posição do palco significaria refazer o projeto do zero. Entretanto, por ter sido empregada uma metodologia algorítmica, essa mudança não demorou muito mais do que o tempo de abrir o software. 13. Subdivisão O algoritmo criado permitiu a sobreposição de diversas curvas de visibilidade. Isso abriu a possibilidade de subdividir os setores do auditório, ligando suas partes em diferentes curvas de visibilidade. Essa solução arquitetônica garante a flexibilidade para o conjunto. Durante o uso do espaço, se houver um público menor, ele pode se concentrar nos setores centrais.

11. Novo caminho e personalização em massa

12. Centralização do palco

13. Subdivisão


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13. Setorização do auditório

14. Algoritmo de setor, personalização em massa

Oito perfis foram estabelecidos. Apesar do código ser o mesmo, ora recebeu os mesmos valores para as variáveis ora inputs diferentes.

O algoritmo base permitiu criar uma curva de visibilidade a partir de um ponto focal. Posteriormente essa curva foi corrigida para que os degraus de acesso tivessem as mesmas dimensões, bem como painéis refletores foram acrescentados na sequência.

Croquis do auditório - Da esquerda para direita - (1) Croqui representando o algoritmo final do auditório. É possível ver a setorização e os desníveis entre os balcões. Posteriormente os balcões foram retirados do projeto. (2) Croqui do auditório com planta centrada.


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15. Aplicação do algoritmo O código foi aplicado em oito posições. Cada um deles foi trabalhado separadamente para melhor visibilidade do palco e conforto acústico.

Algoritmo para criação do auditório - Este conjunto de componentes fica dentro de um cluster. Cada um dos oito perfis do auditório é composto por um cluster como este, além de outro para os refletores acústicos e outras transformações.


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1. Geração da curva de visibilidade

2. Avaliação da visibilidade

3. Construção dos patamares

4. Primeiro trecho dos refletores acústicos


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5. Segundo trecho dos refletores acústicos

6. Terceiro trecho dos refletores acústicos

7. Dimensionamento segundo a planta

8. Ajuste do cálculo dos refletores


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Perfis sobrepostos - Sobreposição dos oito perfis provenientes do algoritmo base.


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Últimos resultados do algoritmo A metodologia empregada viabilizou um auditório assimétrico e com maior complexidade a partir de um único conjunto de algoritmos. Foram implementados estudos de visibilidade e reflexão acústica. Em trabalhos futuros poderiam ser empregadas relações de materiais absorvedores e reflexivos em razão do volume e da área das superfícies, cálculos de tempo de reverberação, esquemas automatizados de circulação e acessos, etc.


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Perfil A

Perfil B


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Perfil C

Perfil D


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Perfil E

Perfil F


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Perfil G

Perfil H


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Resultados tridimensionais - Em conjunto com o desenvolvimento dos perfis, foi gerada a geometria em três dimensões. Isso possibilitou realizar simulações acústicas e de layout ainda nas fases iniciais do projeto.


Proposta arquitetônica | 169

Carvalho (2006) apresenta uma sequência de passos para o desenvolvimento de auditórios: 1. Verificação do ruído do entorno a título de se dimensionar o isolamento acústico necessário; 2. Buscar uma forma arquitetônica do ambiente interno que auxilie nas questões do condicionamento acústico, especificamente no que diz respeito à distribuição dos sons produzidos; 3. Na hipótese da geometria do volume interno do recinto previamente estabelecido por terceiros, observar a necessidade

de adoção de painéis refletores e/ou absorventes em tetos e paredes por questões exclusivamente técnicas. Não inserir no contexto elementos de conotação exclusivamente estética, sob pena de resultados insatisfatórios ou mesmo catastróficos; 4. Evitar superfícies paralelas e, quando isso não for possível, usar artifícios que possam combater ondas estacionárias via paredes, por exemplo, a inserção de elementos horizontais, ou verticais, ou inclinados, ou mistos, etc.; 5. Analisar o tempo de reverberação do recinto nesta primeira condição projetada,

Partes do auditório para fabricação - Por fim, o algoritmo gerou as partes do auditório como sólidos prontos para serem prototipados em máquinas de controle numérico.


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para corrigi-lo através da absorção acústica de suas superfícies componentes e demais elementos nele inseridos (pessoas, cadeiras, mesas, etc.) 6. Checar o tempo ótimo de reverberação no recinto; 7. Estabelecer a taxa e ocupação em função do volume interno; 8. Estabelecer o posicionamento correto dos acabamentos e do mobiliário (elementos absorventes); 9. Exercitar simulações de correção da geometria interna do recinto; 10. Exercitar simulações de correção do

tempo de reverberação do recinto, observando ainda taxas diferentes de ocupação. (CARVALHO, 2006, p. 142-145)

A estruturação do edifício como Box in box permitiu tanto o isolamento acústico quanto o desenvolvimento do auditório como um sistema independente. Para templos protestantes, o projeto de acústica fica entre um auditório para fala e música. Por apresentarem tempo de reverberação distintos, o projetista deve priorizar uma das duas funções.


Proposta arquitetônica | 171

Vazio do auditório com balcões - O código desenvolvido possibilita analisar o volume vazio do auditório. Essa etapa é fundamental para o cálculo do tempo de reverberação no projeto de acústica. Renders do auditório - Na sequência é possível ver quatro renders internos. O projeto buscou uma boa visibilidade e proximidade com o palco.


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Vazio do auditório sem balcões - Ao longo do desenvolvimento, percebeu-se que os balcões não seriam necessários para atingir a meta de capacidade de espectadores. Por isso, eles foram retirados e o volume recalculado.

Auditório final - Após testes e análises de diversas possibilidades, as geometrias foram importadas no Revit para detalhamento.


Proposta arquitetĂ´nica | 173


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Além da geometria do auditório, o projeto base. Foram consideradas paredes e teto de drywall levou em conta o2,00 isolamento e o tempo de reverberacom chapas de 25mm e espaçamento de 100mm, ção (TR) para um1,8bom desempenho acústico, Longe palco com assoalho de madeira e no restante do au1,6 trabalhos futuros podem aprode esgotar o assunto, ditório carpete colado sobre o piso. Obteve-se como 1,4 fundar no tema e trazer outras discussões. resultado os seguintes TRs: 2,5s para 125Hz, 4s 1,2 É importante que ruídos não entrem ou para 250Hz e 500Hz, 3,2s para 1000Hz e 2,2s para 1,0 saiam do auditório0,8e que os requisitos para atividades 2000Hz. Portanto, muito acimaDimensões do esperado. Em sedo auditório 0,6 sejam atendidos. Assim, estade fala e para música guida, outros tipos de materiais foram combinados Volume (m³): 23721 0,4 Área (m²): 6131 beleceu-se como meta um TR para música popular para melhorar o desempenho. Em 50% da área do 0,2 Área paredes (m²):espu1723 (entre 1,5s e 2,5s) por ser similar ao estilo musical teto e das paredes do fundo foi acrescentada 0 Área forro (m²): 1800 tocado neste caso. Ressalva-se que pelo volume ma de 20mm 125 250 500 do 1000 2000para absorver 4000 o som e na área restanauditório o TR ótimo estaria próximo de 2s. Mesmo Frequência (Hz)te das paredes foram colocados painéis de 4mm, a que ele possa estar acima do que é esperado para 20cm da parede, com 10cm lã de rocha e perfuração Painel perfurado um auditório para voz (de 1s a 1,5s, como afirmam em 0,79% com diferentes tamanhos (esses matepara diferentes Difusores Laminado de Cavanaugh, Tocci e Wilkes, 2010), essa diferença cooperam para o isolamento acústico frequências Carpete modular riais também acústicos madeira pode ser corrigida pelo sistema de amplificação. Esse do ambiente junto com portas e janelas acústicas). sistema eletrônico já se faz necessário pela capaciAlém disso, como o auditório é dividido em pequenos dade do auditório de 1500 pessoas e pelo seu tamasetores suas paredes internas laterais serviram para nho de dimensões médias próximas a um círculo de colocação de difusores. Ao final, o tempo de rever30m de raio. beração ficou dentro do intervalo esperado para as Paredes do fundo Piso e paredes Paredes laterais próximas Palco Inicialmente, foi realizada uma simulação frequências de 125Hz a 2000Hz. ao palco sem tratamento de materiais para obtenção do TR

TR60 (S)

TR60

Corte transversal


Proposta arquitetônica | 175

TR60

2,00 1,8

TR60 (S)

1,6 1,4 1,2 1,0

Dimensões do auditório Volume (m³): 23721 Área (m²): 6131 Área paredes (m²): 1723 Área forro (m²): 1800

0,8 0,6 0,4 0,2 0 125

250

500

1000

2000

4000

Frequência (Hz) Painel perfurado para diferentes frequências

Carpete modular

Paredes do fundo

Piso e paredes

Difusores acústicos

Paredes laterais próximas ao palco

Laminado de madeira

Palco



Implantação Sem escala

PLANTA PAV. TÉRREO 1:500


CORTE AA 1:500

CORTE BB 1:500

Det. 1



CORTE CC 1:500

CORTE DD 1:500



CORTE EE 1:500

ELEVAÇÃO FRONTAL 1:500




Det. 1 - cobertura 1:20

PLANTA ÚLTIMO PAVIMENTO 1:500


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Considerações finais Na mesma medida que a complexidade do ambiente construído tende a aumentar cada vez mais, cresce a demanda pela racionalização de processos, do uso consciente de recursos materiais e por uma visão integrada do edifício com a cidade e seus moradores. Em meio a tantas mudanças, engenheiros e arquitetos podem reavaliar seus papeis na construção, debruçando-se não só sobre a forma ou a estrutura, mas abrindo os olhos para a “metodologia de fabricação”. Neste cenário, arquitetos, engenheiros civis e engenheiros de materiais trabalham em conjunto e colaborativamente sobre processos. Um workflow descontínuo pode ser substituído por um desenvolvimento integrado desde as etapas iniciais do projeto no qual cada um contribui segundo a sua expertise. Logo, abrem-se novos caminhos a serem explorados partindo da definição dos materiais, seguida da sua melhor estruturação e que resulta em uma forma. Este trabalho final de graduação procurou desde a concepção firmar suas decisões projetuais em discussões integradas entre arquitetura e engenharia de estruturas. Para tanto, um campo comum de trabalho foi estabelecido por meio de algoritmos, o que facilitou idas e vindas de possíveis respostas para os problemas que surgiram no caminho. Resultados preliminares indicam o sucesso desta abordagem para geometrias complexas, como por exemplo

a redução da massa da estrutura e a redução do ganho térmico por radiação direta. Pensar o edifício como uma união de sistemas com certa independência entre si também favoreceu um processo colaborativo. Paralelamente ao desenvolvimento da cobertura do edifício houve o trabalho no auditório, sendo definidos os inputs e outputs de um sobre o outro ao longo do projeto. Posto o problema de viabilizar um auditório com cerca de mil e quinhentos lugares e assimétrico, as regras geométricas para boa visibilidade que normalmente são traçadas manualmente foram traduzidas para algoritmos. Essa abordagem permitiu que um único código criasse infinitas propostas, alcançando uma personalização em massa das arquibancadas. Consequentemente, foi possível explorar diversas conformações e analisar em tempo real sua eficiência. A aplicação em um templo protestante deu ao projeto uma grande liberdade de aplicar estes conceitos dentro das condicionantes programáticas. A proposta do templo buscou cobrir as características peculiares destes espaços e prover a estrutura para seu programa. Também, foi previsto que a sua construção seja feita em etapas segundo o tamanho e os recursos da comunidade de fiéis, sendo que, ao final do ciclo de vida, o edifício pode ser desmontado, o que é legítimo pela transitoriedade do sagrado e as mudanças nas configurações comunitárias e urbanas.


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Portanto, este trabalho fez uma prova de conceito da colaboração entre profissionais e emprego de algoritmos no projeto de novos edifícios. Os resultados obtidos reforçam que essa metodologia pode ser replicada em outros contextos e programas. Muitos dos temas abordados brevemente aqui podem ser aprofundados e explorados em trabalhos futuros. Um novo horizonte desponta no presente e caminhos se abrem nos quais a integração e colaboração são os principais mecanismos de estruturação da forma.

Parque, templo e centro comunitário


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