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mesa-redonda: SEGURANÇA NAS ESCOLAS

A psicopedagoga Isa Minatel e os representantes de quatro escolas da região falam sobre possíveis causas e soluções para um tema delicado e preocupante

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TEMOS OBSERVADO o aumento de episódios envolvendo violência dentro das escolas. Desde 2002, o Brasil registrou 23 ataques – destes, 10 nos últimos dois anos. Em 2023, a média é de um por mês (Dados de uma pesquisa da UNICAMP).

O último, em 27 de março, aconteceu em uma escola estadual em São Paulo, teve como vítima fatal uma professora, e mais outros quatro foram feridos. O ataque foi feito por um menino de apenas 13 anos. Passado isso, nas redes sociais, circulou uma ameaça de “massacre” no dia 20 de abril. As escolas de todo o país reforçaram a segurança e tiveram que acalmar pais e crianças com comunicados e reuniões sobre o assunto. Criou-se um verdadeiro “climão” no dia do possível ataque, e muitos alunos não compareceram às aulas. Esse cenário gerou insegurança não só para os gestores das escolas, como também para pais e alunos. Afinal, estamos enfrentando um novo tempo mais violento? Quais seriam os motivos? De quem é a culpa? Quais as soluções para transformar tudo isso?

A VERO realizou uma entrevista especial com a nossa colunista, psicopedagoga, escritora e palestrante Isa Minatel, e enviou as mesmas perguntas a quatro escolas da região, formando assim uma mesa-redonda. O resultado você confere a seguir.

VERO – Qual acha que é a causa desse aumento da violência dentro das escolas?

Isa Minatel – Estamos juntos, mas não estamos conectados. Vivemos juntos, mas não conhecemos nossos filhos. E quando acontecem essas situações, os pais se surpreendem, e é pouco provável que a criança não tenha dado sinais antes. São comportamentos, excessos, que passam despercebidos. Aí chega ao ponto extremo desse analfabetismo emocional. Não conseguimos ler os sinais que a criança dá.

Sandra Cordeiro Marino, Escola Vila Alpha – Após a pandemia, quando a sociedade se defrontou com uma situação global de alto estresse, aumentamos nossa vulnerabilidade psicológica e comportamental, e seus efeitos colaterais ainda se fazem sentir por todos.

Luciana Klauser Paschoal, Anglo Aldeia da Serra – Acreditamos que existem fatores que contribuem para essa mudança: pais ausentes; falta de limites; muito tempo de exposição a telas; e pais que não permitem que os filhos passem por frustrações. Isso pode gerar insegurança e comportamento agressivo. Nossa escola realiza momentos de conscientização com as famílias, interação entre os alunos e pais, abre espaço para ouvir e orientar alunos e trabalhar o aspecto socio- emocional, mantendo uma relação de confiança e parceria.

VERO – Quais são os sinais de que a criança não está bem psicologicamente?

Isa Minatel – Qualquer mudança brusca de comportamento da criança precisa ser investigada. Precisa observar. A criança está muito quieta? Crianças que começam a esconder o próprio corpo. Os casos de automutilação estão acontecendo cada vez mais precocemente. Como se o pequeno dissesse “eu não queria estar na minha pele”. Agressividade contra o pai e mãe é um sinal que diz “Aprenda a lidar comigo”! A estrutura do pai e da mãe são os parapeitos de uma ponte. É preciso dar amparo físico, emocional, espiritual, para a criança conseguir dar o passo firme.

Escola Vila Alpha – No caso das escolas, nota-se por condutas, diálogos, manifestações corporais e psicológicas, atos impulsivos, menor aceitação de frustrações e incapacidade de viver processos de mudança de forma resiliente.

VERO – Temos visto um aumento exponencial do uso das telas, e cada vez mais cedo. Quais as consequências?

Isa Minatel – Tenho casos de atendimento muito relevantes com pacientes depressivos, agressivos, em que oriento a diminuir o tempo de tela e o comportamento se estabiliza. Cientificamente não consigo explicar, mas há essa conexão. O nosso cérebro não foi feito para estar conectado o tempo todo.

Isa Minatel, psicopedagoga, escritora, palestrante e colunista da VERO

Graziella Matarazzo, Escola Castanheiras – Existem estudos que mostram diversas questões que envolvem os malefícios referentes ao uso desenfreado do tempo de tela, mas o mais preocupante nesse momento é trocar o tempo das atividades ativas, de socialização e convivência, inclusive familiar, que são essenciais para um crescimento saudável, por ficar em frente às telas.

Diamantino dos Santos Jr., Escola Morumbi Alphaville – Tanto a exposição às telas quanto aos conteúdos das redes sociais, não de forma exclusiva, certamente teve impacto significativo na propagação da violência. Pois elas podem desempenhar um papel tanto positivo quanto negativo quando se trata de violência nas escolas. Como aspectos positivos, temos a possibilidade de conscientização, disseminação de informações relevantes, criação de comunidades de apoio e promoção de uma cultura de respeito e inclusão. Por outro lado, há pontos negativos, como cyberbullying, desinformação e incitação à violência, exposição a conteúdos violentos e pressão social. Daí a importância de sua boa utilização.

VERO – Como fazer então em relação ao uso das telas?

Isa Minatel – O problema não é a ferramenta, é o uso que se faz dela. Alienar a criança também não é um caminho. Mas tem um jeito de deixar diferente? Meu filho era fã de um youtuber. Se eu dissesse para não assistir, ele iria no vizinho. Então fui assistir junto. Não falei mal, não proibi, mas trouxe elementos de realidade que o fizeram refletir. As pessoas querem resolver tudo em uma conversa, e é um processo. Não é só cuidar do tempo de exposição à tela. É fazer pensar. Pergunta faz pensar, já o sermão dá raiva. Assim se vai construindo a reflexão na criança pautada nos valores da família. As telas são um monitoramento constante. É um constante retomar de combinados. Trazer os fatos, fornecer dados, oferecer opções. Precisamos planejar mais os finais de semana, senão eles ficarão o tempo todo na tela. Procure passeios, praças, parques, outras atividades.

Escola Castanheiras – As famílias podem ajudar propondo outras atividades e interações entre a própria família, tendo em vista que os próprios pais também permanecem por muito tempo em frente às telas, transmitindo esse exemplo às crianças. É importante não apenas proibir ou regular o uso, mas propor atividades e soluções para a família, em conjunto, conseguir promover essa socialização de maneira saudá-

Diamantino dos Santos Jr., diretor e mantenedor da Escola

Morumbi de Alphaville

vel: negociar tempo de tela, propor momentos sem tela, como refeições, noites de jogos, convidar para visitas de amigos ou outras famílias, etc. É muito importante que as famílias supervisionem os conteúdos que as crianças estão consumindo. É essencial que os pais tenham essa consciência de não deixar os filhos sem supervisão na internet assim como não deixariam na “vida real”. Você deixaria seu filho andar sozinho e falar com estranhos na rua? Se ele não está pronto para isso, não está preparado para estar sozinho na internet.

VERO – Como a escola e o ensino podem reverter esse cenário?

Isa Minatel – De imediato tenho que conter a pessoa violenta, fora de si, doente. Em paralelo preciso oferecer tratamento e ajuda para todos, não é só um. Olhar para esses que fizeram ataques e entender quem está no mesmo caminho. E olhar para nós e ver quem está criando esses? Onde está a nossa participação nisso. De alguma maneira, qual a nossa parte nisso? Como estamos criando? O que precisa mudar na escola? Nos veículos de comunicação, na política pública? Sempre há o que fazer. Quando a gente veio do autoritarismo e percebeu o que o castigo causava na psique da criança, fomos para o outro extremo. No extremo oposto, do liberalismo, estamos criando gente fraca. Vivemos entre extremos. Precisamos abrir a consciência para chegar a um lugar que seja respeitoso sem ser mimimi, e firme sem ser autoritário. Estamos criando gente arrogante e insegura, damos a vez e a voz, mas não con- seguimos nos conectar. A conexão vem de um genuíno interesse pelo outro. Para isso preciso ter tempo. Tempo para entender a criança. O que ela está manifestando. A solução é a consciência, olhar para esses movimentos.

Escola Morumbi Alphaville – Com certeza, o desenvolvimento de um trabalho socioemocional com os alunos, para entender suas necessidades individuais, o que fazemos em nossa escola, desde os 4 anos de idade. Nesse sentido, é fundamental a parceria com a família, para que possamos juntos identificar, trabalhar e corrigir qualquer forma de violência, física ou mental. Para tanto, temos o RESPEITO como um de nossos pilares educacionais, e por conta disso, em cada sala de aula, temos afixada essa palavra.

Sandra Cordeiro Marino, assessora pedagógica da Escola Vila Alpha

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