O MORAR JAPONÊS E O MORAR BRASILEIRO

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o morar japonês e o morar brasileiro:

habitação e adaptação na são paulo contemporânea

veronica satie zukeran banca: myrna a. nascimento (orientadora) antonio gil da silva andrade luis antonio jorge tfg fau usp 2012


Para Tiotatsu, Edith, LetĂ­cia e Beatriz


agradecimentos

À Myrna, por aceitar me orientar, pelos conselhos que sempre me ajudaram a pensar fora da caixa e pelo otimismo durante todo o percurso. Aos professores Antonio Gil da Silva Andrade e Luis Antônio Jorge pelos comentários que trouxeram veracidade ao meu trabalho e por aceitarem fazer parte da banca. Ao meu pai Tiotatsu, por todas as caronas que me deu sem reclamar, por lavar a louça no meu lugar para que conseguisse terminar meu trabalho, por fazer o possível e o impossível pelas suas filhias. À minha mãe Edith, que sempre me fez sorrir mesmo quando eu não queria, pelas palavras de incentivo, por aguentar minhas manhas sempre com um sorriso no rosto. Às minhas irmãs Letícia e Beatriz por sempre acreditarem em mim, pelas conversas entre irmãs, pelas risadas que me ajudaram a relaxar nos momentos mais difíceis. Aos meus avós por me darem a oportunidade de concretizar de um sonho. Aos meus queridos amigos da 12D e agregados por tornarem esses anos na FAU tão agradáveis, pelas reuniões na cozinha, pelos chocolates, por me darem forças para continuar.



SUMÁRIO

1. JAPÃO   — 10

1.1 Geografia —   10 1.2 habitação —   11 2.1 Static Quarry - Ikimono Architects —   31 2.2 Moriyama House - Escritório de Ryue Nishizawa 3.1 público alvo —   43 3.2 localização —   45 3.3 terreno —   46 3.4 projeto —   47

4. Conclusão   — 74 5. Referências bibliográficas   — 76

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INTRODUÇÃO

A intenção deste trabalho foi propor a implantação de um projeto de habitação mínima na cidade de São Paulo, tomando como base alguns conceitos e partidos pensados e utilizados por arquitetos japoneses contemporâneos. O Japão foi o objeto de estudo escolhido, pois o país lida com a problemática da habitação mínima, pelo menos desde a era Heian (794~1192), na região onde viviam os pequenos comerciantes e artesão residentes na capital. Apesar de, nesse período, a questão da amplitude da habitação estar diretamente relacionada à hierarquia social do morador, atualmente ela está relacionada à limitação de território disponível para habitação em relação ao aumento da população. O Brasil e o Japão possuem muitas diferenças culturais que refletem diretamente na habitação e no modo de morar, mas tive a oportunidade de ex-

perienciar por um curto período como era morar numa habitação japonesa, denominada danchi - edifício de apartamentos de posse de fábricas e empresas, que as alugam para que seus funcionários possam morar com familiares, por um preço abaixo do mercado -, o modelo do apartamento era 2DK - o numero representa o número de dormitórios e a sigla DK significa dining kitchen, ou seja, cozinha e sala de jantar no mesmo ambiente. Apesar das diferenças culturais e ergonométricas existentes, a adaptação do morar não foi tão complicada, decobri alguns costumes e conceitos que se fossem adotados na minha rotina viriam acrescentar. Pela condição do Japão e pela experiência pessoal, optei por estudar a habitação japonesa, identificando conceitos e partidos e tentar adaptá-los para a cultura e normas brasileiras, propondo um outro modo de morar brasileiro. 8


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1. JAPÃO 1.1 Geografia

O Japão é um arquipélago localizado ao longo da costa leste asiática, banhado pelos Oceano Pacífico a leste e Mar do Japão a oeste. É composto por 4 principais ilhas: Honshu, Kyushu, Shikoku e Hokkaido e mais 6.848 pequenas ilhas. Seu território total é de aproximadamente 377,746 km², sendo que 75% dessa área é ocupada por montanhas, em sua maioria vulcânicas. A população corresponde a 127.687 milhões de habitantes, com densidade de 377 habitantes por m² ¹. Apesar de toda tecnologia disponível atualmente que possibilitam a ampliação de um território sobre o mar, como o aterro marítimo, para este país que encontra-se sobre a divisa de 3 placas tectônicas - razão pela qual a ocorrência terremotos é tão constante e explica também a porcentagem de área montanhosa no país -, não representa, exatamente, uma solução viável.

Fonte: Google Earth

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1.2 habitação

Exemplo de residência tradicional japonesa

habitação semelhante à oca brasileira na era Jomon fonte: Japanese home and lifestyles

1. Fontes: Geographical Survey Institute, Ministry of Construction, Hydrographic Department, Maritime Safety Agency, National Institute of Population and Social Security Research 2. Tatame, em japonês tatami, é feito originalmente a partir de palha de arroz prensada e revestida com uma esteira de palha. Essa “placa” de revestimento dos quartos tornou-se um tipo de módulo. Apesar de suas dimensões não serem iguais em todas as regiões do país, sua proporção é sempre a mesma 1/2. 3. Shoji é um painel com estrutura de madeira, revestido com papel translúcido feito de arroz, pode ser usado como porta ou divisória. 4. Fusuma é um painel como o shoji, porém revestido com papel opaco. 5. Sala em estilo japonês.

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Geralmente quando falamos de residência japonesa, logo imaginamos a moradia tradicional vista em filmes, amplas, feitas de madeira, com piso revestido de tatame² e divisórias móveis (shoji³ ou fusuma4) no lugar de paredes e portas. Mas as residências japonesas contemporâneas não são mais assim, principalmente as localizadas nas zonas urbanas. A maioria possui tatame apenas em alguns ambientes, denominados washitsu5, as portas e paredes são maciças, o shoji e fusuma são usados geralmente na washitsu, ou como portas de armários. E não são mais tão amplas, muitos apartamentos possuem por volta de 20~30 m². Pensando em como teriam ocorrido essas mudanças na quantidade de ambientes, se foi apenas um processo evolutivo, ou se houve alguma circunstância que forçou essa alteração, fiz uma pesquisa sobre a residência japonesa, que inicia-se na era Jomon (aproximadamente 10.000 A.C.) - que representa um marco no modo de viver dos japoneses -, até os dias atuais. O período Jomon (10.000 A.C. ~ 400 A.C.) foi marcado por uma mudança na moradia e no modo de viver dessa população que, apesar de ainda ser nômade, deixou de fazer das cavernas sua

moradia e passou a construi-las. Essas moradias eram muito semelhantes às ocas brasileiras, feitas com estruturas de madeira em formato de cone e revestidas com palha. Apesar dessa semelhança na forma e nos materiais utilizados, haviam diferenças construtivas entre os dois modelos. Nessa habitação japonesa, o nível do piso interno era um pouco mais baixo que o nível do piso externo. A terra retirada para produzir esse cova era colocada em toda volta, formando um morrinho no perímetro da moradia, onde apoiava-se a estrutura de madeira que sustentava a palha. Essa cova protegia seu morador da chuva e do vento, a terra ajudava a manter a temperatura interna estável, sem se influenciar muito pela temperatura externa. Essa moradia servia apenas para dormir, pois todas as outras atividades (caça, preparo de alimentos, etc.) eram feitas do lado de fora da moradia. Em meados da era Jomon, quando os japoneses passaram de nômades a sedentários, ocorreram mudanças nas moradias: a planta tornou-se mais ampla, pois outras atividades além de dormir passaram a ser realizadas no interior da casa, como por exemplo o preparo de alimentos; a profundidade


da cova que era feita para a acomodação da moradia aumentou, fazendo, consequentemente que o pé direito fosse mais alto, principalmente no centro onde localizava-se a fogueira - medida essa que visava evitar a ocorrência de incêndios - que, ao mesmo tempo que servia para cozinhar os alimentos, aquecia o ambiente e seus habitantes que dormiam ao redor dela. A era Yayoi (400 A.C. ~ 300 D.C.), foi marcada pelos primeiros registros do plantio de arroz em campos alagados. Essa técnica de cultivo, pela sua complexidade, necessitava da cooperação de muitas pessoas para que desse certo. Foi então, que as pessoas começaram a viver em grupos, dando início às primeiras vilas. A produção de arroz fez surgir a necessidade de construções como armazéns, com a única finalidade de estocar o arroz produzido. Esses armazéns foram feitos com técnicas bem diferentes das utilizadas nas habitações, eram construídos elevados do solo e não possuíam portas de acesso, a entrada correspondia ao vão entre a parede e o telhado de 2 águas. Esse acesso era coberto com uma espécie de cortina de palha que ao mesmo tempo que vedava o acesso de animais para dentro do

armazém, permitia a ventilação constante para melhor conservação dos grãos. A moradia da Era Yayoi, permaneceu idêntica à moradia da Era Jomon, tendo apenas algumas alterações na disposição de alguns equipamentos e funções no interior da habitação. Como, por exemplo, a fogueira que passou a localizar-se na região oposta à entrada, próximo aos alimentos. A parte central da casa era de terra batida, local onde a família ficava reunida e fazia as refeições; nas laterais revestiam o piso com palha ou esteiras e era utilizado quase que exclusivamente para dormir. Na Era Kofun (300 ~ 590), as vilas que foram formadas na Era Yayoi, consolidaram-se formando cidades. Essa nova conformação deu início às guerras pela dominação das cidades mais fracas pelas mais fortes. Surgiram diversos tipos de moradias nessa era , porém a mais comum continuava a ser aquele parcialmente enterrado da Era Yayoi. A alteração mais significativa da organização do espaço interno das habitações ocorreu em meados do período Kofun, com a criação do fogão de barro. O fogão ficava disposto no lado oposto à entrada, enterrado no chão, com um

era Jomon, quando os japoneses tornaram-se sedentários fonte: Japanese home and lifestyles

Armazém para guarda dos grãos fonte: Japanese home and lifestyles

Novo arranjo interno da habitação na Era Yayoi fonte: Japanese home and lifestyles

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Localização em planta e corte do fogão de barro fonte: Japanese home and lifestyles

Modelo de habitação de piso elevado da Era Kofun fonte: Japanese home and lifestyles

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túnel que conectava o fundo do fogão ao exterior, cuja função era eliminar a fumaça. Sobre o fogão ficava constantemente um jarro com água e sobre ele um utensílio para cozinhar o arroz à vapor. Ainda não haviam armários armazenar os mantimentos, por isso eram organizados em potes, que ficavam todos próximos ao fogão. As construções de piso elevado utilizadas apenas como armazéns na Era Yayoi, passaram a ser construídas com a finalidade de servir como moradia na Era Kofun. Nesse período começa a evidenciar a questão da hierarquia social na construção da habitação, a residência de piso elevado era destinada apenas aos líderes locais ou a pessoas que tinham algum prestígio dentro da comunidade. Na Era Asuka (590 ~ 710), uma das cidades tornou-se mais poderoso na região de Kinki, área centro-sul do Japão, a cidade de Yamato. Os líderes dessa cidade eram de origem coreana e passaram a introduzir e divulgar uma nova cultura aos japoneses, muito influenciada pelas culturas chinesa e coreana. Introduziram um sistema de Governo centralizado e estabeleceram um código, o ritsuryo. Esse código determinava que todas as pessoas que vivam sob

os domínios da cidade de Yamato deveriam ser cadastradas num banco de dados do Governo e que todas as terras de Yamato passariam a ser propriedades do Estado. O Estado por sua vez fornecia os campos de arroz para o cultivo de seus próprios alimentos e outros produtos que pudessem servir como troca, desde que fosse cumprida a condição de que fossem pagas taxas ao Estado em forma de trabalho e mercadorias. Foi nesse mesmo período que o governador supremo de Yamato passou a ser chamado de imperador. E para solidificar esse novo sistema, foram criadas 2 novas capitais que, seguindo os modelos das capitais da China e da Coréia, eram “permanentes” – diferentemente dos períodos anteriores que quando mudava o imperador, mudava-se também a capital -. As novas capitais chamavam-se Heijo e Heian, respectivamente, as atuais Nara e Kyoto. As moradias na Era Asuka fizeram a metamorfose das casas “escavadas” para as casas no nível do solo, passaram a utilizar técnicas construtivas como pilares, vigas, etc. Tendo sempre como matéria prima a madeira. A técnica desenvolvida permitia que as moradias fossem construídas apenas com


pilares externos, deixando o interior livre. Ao mesmo tempo que houve essa evolução na construção das habitações na região centro-sul do Japão, ela também ocorreu na região de Kanto (nordeste do Japão), que, mesmo sem ter contato com a região ao sul, começou a construir moradias ao nível do solo. As casas, geralmente, mediam 2x3, ou 3x4 “módulos”, que no caso era uma distância fixa entre os pilares, cuja medida variava de acordo com a região. A organização interna da moradia na Era Asuka ainda não está comprovada, mas acredita-se que a casa era dividida em dois ambientes, um com piso de terra batida (doma) e outro com o piso forrado com cascas de arroz ou palha e depois coberto com esteiras (doza). O fogão e os potes destinados ao armazenamento dos alimentos ficavam no doma, onde o piso era de terra batida. Com a fixação das capitais, sua população cresceu rapidamente. Além dos serviçais do imperador e dos aristocratas, pessoas pertencentes a outras “classes” também passaram a se fixar nas capitais, principalmente os artesãos e os comerciantes. As moradias das pessoas menos abastadas na capital Heian, na Era Heian (794~1192), eram divididas interna-

mente ao meio. Uma parte tinha o piso de terra batida, essa metade servia como passagem que atravessava a residência, conectando a rua frontal e a posterior. Próximo à porta dianteira ficava o estoque das mercadorias que o comerciante vendia (caso fosse um comerciante), próximo à porta traseira ficava o fogão, junto com os utensílios da cozinha e mantimentos. A outra metade da casa, próximo à rua frontal, tinha uma área com o piso elevado de assoalho de madeira, onde funcionava a loja, que era apenas uma janela com uma prateleira para mostrar os produtos; a parte posterior, onde o piso era revestido com esteiras de palha, era o espaço correspondente à sala e quarto do comerciante e sua família. Outro detalhe relevante desse sistema construtivo era o telhado, cuja inclinação possuía duas angulações diferentes, para que as extremidades da casa ficassem com pé-direito mais alto. Na Era Kamakura (1192~1333) um samurai Minamoto Yoritomo depôs a aristocracia e tomou o poder. Esse novo líder supremo passou a ser chamado Shogun e seu governo, Shogunato. Yoritomo decidiu tranferir a capital de Kyoto para Kamakura, uma vila localizada na atual província de Kanagawa.

Modelo de moradia dos pequenos comerciantes e artesãos na capital, na Era Heian fonte: Japanese home and lifestyles

Representação ilustrativa do construção do telhado. fonte: Japanese home and lifestyles

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Exemplo de residência rural de grande porte na era Kamakura fonte: Japanese home and lifestyles

Exemplo de residência urbana ne era Kamakura fonte: Japanese home and lifestyles

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Apesar da transferência da capital, Kyoto permaneceu como um pólo de referência econômico-cultural, os samurais de Kamakura logo adotaram um novo estilo de vida, que era uma mistura do estilo shinden - praticado pela aristocracia de Kyoto -, misturado ao estilo zen oriundo da China. Esse estilo era marcado por espaços destinados à recepção e entretenimento das visitas, como uma sala para a realização da cerimônia do chá, ornamentada com pinturas, escritos, obras de arte, sempre com vista para um belo jardim, etc. A Era Muromachi (1333~1573) foi marcada por muitas revoltas, uma delas ocorreu contra o próprio Shogun, quando dois de seus mais importantes vassalos rebelaram-se contra ele e tomaram o poder. Dois “sub-períodos” seguiram-se após a Era Muromachi, um foi o período Nanboku-co (13361392), quando duas linhagens imperiais começaram a brigar por legitimidade e poder. O outro foi o período Sengoku (1456~1573), quando os samurais da zona rural, denominados daimyo (senhores feudais), começaram a brigar uns com os outros e também contra o shogunato de Muromachi, pela posse do poder político. Esse período conturbado chegou ao fim quando

Oda Nobunaga derrotou o shogunato de Muromachi e tomou o controle do país, dando início ao período Momoyama (1573~1603). A arquitetura nesse período de Kamakura à Momoyama não tiveram grandes alterações, as residências rurais de um fazendeiro influente possuía em média três ambientes e, cada ambiente possuía um tipo de revestimento de piso que o diferenciava dos demais: a maior porção da casa era composta pelo doma (área de cozinha e serviços emgeral), cujo piso era de terra batida; um dos quartos localizados próximo ao doma, com piso de terra batida revestido com esteiras de palha, onde os membros da família conviviam e interagiam entre si; o terceiro ambiente era o nando, dormitório, com piso revestido com assoalho de madeira, ficava locado, geralmente, na parte posterior da residência. Além da função de “quarto de dormir”, o nando servia também como despensa para guardar utensílios domésticos. As residências urbanas dos pequenos comerciantes na era Kamakura eram construídas geminadas umas às outras, alinhadas em fileiras faceando duas ruas, a frontal (onde localizava-se a loja) e a posterior (onde ficava um pá-


tio comunitário). A organização interna desse tipo de residência consistia em duas partes, uma metade era um “corredor” de terra batida que atravessava a casa da entrada frontal à posterior, a outra metade era de piso elevado revestido com assoalho de madeira. No “corredor”, na área próximo à porta voltada para o pátio comunitário, ficava localizada a cozinha. No pátio comunitário que ficava nas costas das casas, havia um poço e um espaço para lavar roupas. A parte de assoalho de madeira sub-dividia-se em dois ambientes, a área frontal que servia como loja, e a área posterior que era a moradia propriamente dita, muito semelhante às residências urbanas de Kyoto. Quando os produtos vendidos na loja desses pequenos comerciantes eram baratos, havia apenas uma prateleira de exposição na frente da casa, porém, quando os produtos eram mais valiosos, eram expostos dentro da residência, nesses casos, o espaço destinado à moradia se tornava ainda mais reduzido no período diurno. O crescimento da zona urbana da, até então, capital Kamakura trouxe aos poucos novos tipos de comércio para a cidade, como por exemplo as casas

de banho. Nessa época, em Kamakura, as pessoas ainda não tinham o hábito de banhar-se diariamente, além disso, o banho era considerado um tipo de tratamento para pessoas enfermas. Nas antigas capitais, Kyoto e Nara, as pessoas já estavam mais acostumadas em frequentar as casas de banho, até as pessoas mais humildes iam banhar-se com frequência. Na era Muromachi (1333~1573) começou a surgir um novo estilo de residência de usufruto exclusivo dos samurais, denominado estilo Shoin. Sua principal característica foi determinar usos específicos para cada ambiente da casa, dando destaque às salas de visitas, que era ornada mais formalmente, com elementos decorativos no tokonoma. Com essa setorização mais definida, ficou evidente que, naquela época, a vida social possuía mais importância que a vida íntima familiar. Na organização dos ambientes internos, haviam mais quartos para recepcionar visitas do que quartos de dormir. O principal cômodo da casa chamava-se kokonoma (o prefixo “koko” vem de uma das leituras possíveis para o número 9 em japonês), possuía esse nome, pois o cômodo media 3x3 módulos, esse cômodo era utilizado para recepcionar pessoas

importantes. Haviam outros cômodos como o kaisho, que servia para entreter amigos mais próximos ou parentes, era comum haver mais de um kaisho numa casa. Outro ambiente característico das residências dos samurais, de influência dos templos zen budistas, é o zashiki, esse cômodo teve sua função muito alterada com o passar dos tempos, mas originalmente serviam para exposição e admiração de artigos, como livros, pinturas budistas ou com outros temas, instrumentos de escrita, utensílios para o chá, importados da China. Na era Edo (1603~1867) a capital é transferida para Edo, a atual Tóquio e o imperador perde seu poder administrativo e torna-se apenas representativo. Nesse período também todas as áreas da arte - artes plásticas, arquitetura, teatro, dança, música, literatura - no Japão ganham mais destaque. A sociedade passou a ser dividida em classes: a nobreza, os samurais, os agricultores, os artesãos e os comerciantes. O Shogun controlava em muitos aspectos a vida das pessoas, como por exemplo, determinava como deveria ser a arquitetura da residência, ou do comércio do comerciante dependendo da classe social a qual a pessoa se encontrava. Era determinado onde morar, como 16


Modelo de residência no estilo Shoin fonte: Japanese home and lifestyles

Tokonoma

fonte: arquivo pessoal

Zashiki

fonte: arquivo pessoal

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construir, que materiais utilizar, etc. Por exemplo, no comércio não era permitido que uma loja ostentasse mais que outra, era determinado que elas fossem construídas de forma simples, sem muitos ornamentos e com fachadas padronizadas. Mesmo na zona rural essa hierarquia residencial era seguida. As famílias mais abastadas construíam suas casas, geralmente, no estilo shoin (o mesmo estilo utilizado pelos samurais de alta patente), com o zashiki, alcovas decorativas (tokonoma), etc. As residências do estilo shoin são as que, atualmente, são denominadas residência tradicional japonesa, além de serem consideradas produtos do estilo de vida da era Edo. Atualmente ainda não existem dados suficientes que descrevam como ocorreu a evolução das residências da zona rural até a era Edo, nem qual era o método construtivo empregado, nem qual era a disposição interna dos ambientes. Cogita-se que a organização dos ambientes seguiam o estilo hiroma: com um quarto principal e amplo (hiroma) na área frontal, o zashiki (sala de visitas) e nando (quarto) aos fundos. Os registros mostram que na era Edo as residências na zona rural passaram por

vários momentos: • Sugoya (casa de planta retangular): haviam algumas pequenas diferenças nesse modelo de residência nas diversas regiões do Japão, mas a planta da casa de um fazendeiro comum, basicamente, era composta por 3 ambientes (hiroma, zashiki e nando). Em regiões como Kinai, algumas casa tinham mais um ambiente, para abrigar um maior número de visitantes, mas sempre mantendo o formato retangular da planta. Podemos observar, ao contar a quantidade de tatames, que o nando (dormitório) é um dos menores cômodos da casa, com 6 tatamis. É importante notar que existe apenas um nando, o que significa que provavelmente a família dormia toda junta nesse mesmo cômodo. • Residências com parede de palha: esse tipo de residência era típica de locais onde caía muita neve, pois a palha utilizada como revestimento da parede servia para reter o calor dentro da moradia e mantinha a neve e a chuva do lado de fora. Ao analisando a planta desse tipo de residência, é possível notar o surgimento de ambientes que não tinham sido vistos até então, como o banheiro e o estábulo que estão representados anexos à casa, provavelmente


Residência estilo sugoya

fonte: Japanese home and lifestyles

Residência com parede de palha

por conta do frio extremo. Há ainda a aparição de outro ambiente ao lado do nando (dormitório) que é o dei - um quarto de visitas, que servia tanto para recepcionar as pessoas, como abrigo para que as visitas pudessem pernoitar na casa. Comparando o nando e o dei, percebemod que o quarto de hóspedes (o dei) possuia área maior que o dormitório destinado a família, reforçando essa cultura de dar mais importância ao social que à família. • Magari-ya (literalmente: casa que vira, faz a curva. Casa com planta em L): a planta desse modelo é idêntica à sugoya, possui os mesmos ambientes com o acréscimo do estábulo integrado à construção principal, o que levou à adição de mais um ponto de entrada, pelo estábulo. Esse estilo de moradia era típico da região Norte do Japão. A magariya surgiu com a política dos feudos, pois cada daimyo (senhor feudal), assim como o shogun, ditava regras que determinavam como seus vassalos deviam morar e trabalhar. Uma dessas regras era a anexação do estábulo próximo ao doma para que enquando alguém estivesse lá fazendo suas atividades, pudesse, ao mesmo tempo ficar olhando os cavalos.

Residência estilo magari-ya fonte: Japanese home and lifestyles

fonte: Japanese home and lifestyles

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Residência estilo Chumon

fonte: Japanese home and lifestyles

Residência estilo Gassho

fonte: Japanese home and lifestyles

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• Planta no estilo chumon: esse estilo era mais comum na região oeste do Japão e parece ter sido desenvolvido para facilitar a entrada e saída dos moradores em regiões onde caia muita neve. A planta é semelhante à magariya, porém com formato em U. Haviam variações desse estilo, com o acréscimo de mais um cômodo na parte posterior, ou de outros estábulos. Ao analisar a planta desse modelo percebe-se duas entradas distintas que podemos classificar como entrada “social” e de “serviço”, pois diferentemente do que havia sido feito até então, é a primeira aparição de uma entrada direta por um cômodo mais nobre da casa, e não pelo doma, como era costume até então. • Estilo Gassho : o nome desse estilo foi dado devido ao formato do telhado, que parecem duas mãos justapostas, como quando rezamos. Esse tipo de habitação também era mais comum em regiões de muita neve. As duas características mais marcantes nesse modelo era o formato do telhado que permitia a criação do bicho-da-seda em seu sótão e a entrada social, feita diretamente por uma das salas. • Estilo Honmune: a principal característica desse estilo é a inclinação

suave do telhado revestido com telhas, essas por sua vez, eram seguras por pedras. Como no estilo gassho , também possui uma entrada pela fachada principal e uma pela cozinha. Como esse modelo de residência era apenas destinado aos líderes das vilas, possuía diferentes zashiki’s (salas para recepcionar visitas), cada um deles era utilizado de acordo com o status do visitante. • Estilo Tsuma-iri: apesar de terem existido algumas variações desse estilo (quantidade de cômodos), a principal característica era que uma metade da casa era ocupada pelo doma (cozinha + área de serviço), com piso de terra batida e na outra metade eram distribuídos os demais cômodos de piso elevado de assoalho ou revestido com tatame. • Estilo Takabei: a característica que deu nome ao estilo foi a altura da parede externa que, por ser reforçada com gesso, atingia altura maior qur uma parede comum. Internamente, a principal característica desse estilo era a setorização: ao adentrar a residência pela entrada principal, todos os cômodos à direita eram de uso íntimo, exclusivo da família, enquanto que os cômodos à esquerda eram sociais, exclusivos para entreter e receber os convidados.


Residência estilo honmune fonte: Japanese home and lifestyles

Residência estilo tsuma-iri

fonte: Japanese home and lifestyles

Residência estilo takabei

fonte: Japanese home and lifestyles

Esse estilo se destaca também pelo comprimento extenso da planta. • Estilo Bunto : esse estilo era típico da região sul e sudeste do Japão. Nesse modelo, o doma era separado fisicamente do restante da residência, havia um telhado que cobria o doma (cozinha + área de serviço) e um telhado que cobria todo o restante. O desenvolvimento dessa técnica ainda não é muito clara, mas cogita-se que a principal razão era que a região era muito atingida por tufões e, a fim de evitar que os possíveis incêndios provocados pela passagem deles, se espalhasse por toda residência, mantinha-se o doma separado. • Estilo Kudo: a primeira teoria sobre a criação desse estilo típico da região sul era de que, por conta dos tufões, desenvolveram esse telhado mais estreito, de oito ou mais águas, pois quanto menor a lagura, menor a inclinação e menor a resistência ao vento. Porém mais tarde descobriu-se que o verdadeiro motivo foi que inicialmente a planta da residência era retangular, mas com o acréscimo de novs cômodos como o zashiki, formou-se um L, depois veio o doma, formando um U. O telhado acabou acompanhando e formato assumido, pois o daimyo (senhor

Residência estilo bunto

fonte: Japanese home and lifestyles

Residência estilo kudo

fonte: Japanese home and lifestyles

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Planta de residência de grandes comerciantes na zona urbana fonte: Japanese home and lifestyles

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feudal) da região havia determinado que os telhados poderiam ter apenas distância de 1 bay (módulo que corresponde a uma certa distância entre pilares). Na capital Edo (atual Tóquio), não apenas era determinado o estilo de residência era permitido construir devido sua hierarquia na sociedade, como também em que região a pessoa deveria morar. Geralmente em volta dos castelos ficavam as casas dos nobres e samurais de alta patente, depois delas ficavam as casas/lojas dos artesãos, carpinteiros e outros comerciantes de prestígio. Mais distante do castelo ficavam os samurais de baixa patente e pequenos comerciantes/artesãos. Os comerciantes e artesãos ainda eram separados de acordo com o produto fabricado/vendido. Dessa setorização surgiram os nomes de muitos bairros e distritos de Tóquio: Daiku machi (distrito dos carpinteiros), Tatami machi (distrito dos tecedores de tatame), Nabe machi (distrito dos artesão que faziam panelas), etc. Os comerciantes de mais prestígios geralmente vinham de outras cidades, como das antigas capitais e vendiam artigos específicos de sua província natal. Eles se auto nomeavam os “for-

necedores do shogunato”. As suas lojas tinham a face voltada para a rua principal e, na parte posterior ficavam as residências desses comerciantes. As lojas/ casas na rua principal seguiam todas o mesmo estilo: o lote de frente estreita, mas era extenso no comprimento. E, se por ventura a frente do terreno era maior, era porque uma porção frontal era destinada a uma entrada direta para a residência aos fundos. A distribuição interna dos cômodos não era uniforme, apenas um cômodo era tratado de forma comum na maioria das residências, o zashiki. Ficava situado na área posterior da casa e que, como servia para entreter as visitas, dava vista para um belo jardim. As lojas/casas de dois pavimentos (sobrados), surgiram quando os espaços destinados para construção nas cidades tornaram-se escassos. A solução encontrada foi “empilhar” a casa sobre a loja. Os pequenos comerciantes, as pessoas que trabalhavam fora de casa, como diaristas, carpinteiros, moravam nas travessas ou ruas paralelas à rua principal. Suas moradias eram mais estreitas e assemelhavam-se aos cortiços (uradana). Esse tipo de construção era chamado de nagaya (literalmente, casa


comprida), pois as unidades eram enfileiradas uma após a outra, compartilhando o mesmo teto. Da mesma forma que as lojas na rua principal, a frente dessas casas, quando de comerciantes, era destinada à loja durante o dia. O acesso para as unidades da nagaya era feito por um portãozinho situado entre uma nagaya e outra que, através de um beco, conduzia a pessoa a um pátio comunitário que abrigava as entradas das unidades. Pelo meio desse pátio passava um duto que levava o esgoto - que na época consistia de água pluvial e água usada para higienização (pessoal ou de utensílios e roupas). No centro do pátio havia um poço, banheiros, lixeiras, tudo comunitário. Nas cidades existiam dois tipos de nagaya: de uma fileira e de duas fileiras. No de duas fileiras as moradias além de serem grudadas lateralmente, ainda grudavam poteriormente à outra fileira. As paredes nesse tipo de nagaya eram tão finas que era impossível não sentir o cheiro da comida preparada na casa ao lado, ou não ouvir a conversa dos vizinhos. As unidades eram semelhantes às moradias na zona urbana na era Heian quanto às condições de uso, mas a planta era um pouco diferente: na par-

Vista superior mostrando os dois tipos de nagaya fonte: Japanese home and lifestyles

Corte esquemático de nagaya fonte: Japanese home and lifestyles

te posterior ficava a cozinha cuja uma parte do piso era de terra batida e outra parte era de piso elevado de madeira. Essa parte elevada funcionava como um alçapão para guarda de utensílos. A parte frontal era o cômodo que servia como quarto na hora de dormir, como sala de jantar na hora das refeições e como local de trabalho durante o dia.

Vista do pátio comunitário complementar à nagaya fonte: Japanese home and lifestyles

Réplica de nagaya feita para gravação de um filme fonte: http://markystar.files.wordpress.com

planta de nagaya de uma fileira fonte: Japanese home and lifestyles

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Residência de samurai de “baixa patente” fonte: Japanese home and lifestyles

Residência de samurai de “média patente” fonte: Japanese home and lifestyles

6. INABA, Kazuya. Japanese home and lifestyles: an illustrated journey through history. Tokyo: Kodansha International, 2000.

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Os samurais de “baixa patente” moravam na periferia, em unidades da nagaya, próximo dos pequenos comerciantes e artesãos, porém suas unidades eram um pouco mais amplas, pois eles tinham que ter um ambiente para receber seus superiores em alguma eventualidade. A moradia de um samurai de baixa patente era dividida em quatro ambientes principais: chanoma e zashiki (para receber visitas), doma e nando, possuia também duas entradas distintas, uma principal que pelo chanoma e uma aos fundos pelo doma. Os samurais de “média patente”, moravam em unidades mais amplas, localizadas próximos à região onde viviam os grandes comerciantes, portanto em residências semelhantes, com ambientes internos mais amplos, mais de uma zashiki, e quintal.Já os samurais de elite, tinham suas residências construídas no estilo shoin e ficavam localizadas bem próximas ao castelo. Ao final da era Edo, aproximadamente em 1853, chega ao Japão o Comodoro Matthew Calbraith Perry, dos Estados Unidos. Esse encontro representou o primeiro contato dos japoneses com a tecnologia da industrialização à vapor e do armamento bélico. Nesse período o Japão ainda feudal, diante desse qua-

dro desfavorável, teve que abrir seus portos. Outros países, utilizando-se dessa mesma tática, forçou o shogun a abrir seus portos para eles também. Apesar da “liberação” do comércio com países estrangeiros, o shogun delimitou os portos de acesso: Edo, Osaka, Kobe, Niigata e Yokohama. Quando o shogun Tokugawa é deposto e o Imperador Meiji toma o poder, dá-se inicioa era Meiji (1868~1912). Nesse período nega-se tudo a respeito da era Edo: o Japão agrícola, o Japão feudal. Logo com o fim do feudalismo, houve um grande êxodo urbano, os habitantes de Edo começaram a voltar para as províncias de onde vieram. Visando a prosperidade, a modernização do país, a capital Edo passou a chamar-se Tóquio. A “nova” capital, as casas e edifícios construídos de acordo com o modelo ocidental, começaram a atrair os jovens, logo o êxodo ocorrido no fim do sistema feudal deu espaço para um crescimento anual de trinta mil novos habitantes. Em meados da década de 1880, a população de Tóquio passava de um milhão de habitantes, chegando a dois milhões no final da era Meiji. 6 Um marco importante e simbólico, foi a inauguração da primeira linha de trem


que ligava Tóquio à Yokohama – era utilizada principalmente pelos estrangeiros que iam trabalhar -, outro fato que marcou a capital, foi um incêndio que devastou aproximadamente noventa e cinco hectares, na área comercial de Nihonbashi. Esse incêndio foi uma oportunidade para a implementação de novos projetos urbanos. Haviam três frentes de projetos: uma que defendia a construção de edifícios monumentais, como nas capitais européias; outra proposta era voltada para interesses mercantilistas, defendendo a construção de um grande porto, visando tornar a cidade em um centro comercial internacional; por fim havia um grupo que propunha um novo plano urbanístico que atendesse as necessidades de uma capital moderna. No final, cada uma das propostas foram parcialmente aplicadas. No bairro de Guinza foram construídos edifícios de tijolo aparente influenciados pela arquitetura londrina, as ruas no entorno desses edifícios foram pavimentadas e foram construídas calçadas. A proposta relacionada ao porto, apesar de ter também ter sido aprovada pelo governo, não foi logo aplicada, muitas de suas propostas se fizeram presente em projetos posteriores. Os mesmos

comerciantes que propuseram o porto, fizeram uma segunda proposta: um edifício de escritórios no bairro de Marunouchi, ao lado do palácio imperial e foram atendidos. A proposta, a do plano urbanístico, demorou doze anos para ser implantada, e apenas propunha repensar a circulação e infra-estrutura, de modo funcional, além da construção de edifícios megalomaníacos. Esse plano não dizia nada a respeito de habitação. Acabou sendo aplicado apenas no início da era Taisho .7 Quanto às residências na era Meiji, passaram a ter a fachada e alguns cômodos construídos à moda do ocidente, mas no dia-a-dia, as pessoas habitavam os cômodos que ainda permaneciam no estilo oriental. Os cômodos à ocidental eram usados apenas quando recebia-se alguma visita, para recepcioná-la e ostentar algum status. No final da era Meiji e início da era Taisho , surgiu um novo modelo de casa, denominada nakaroka-shikijutaku, basicamente uma casa cujos ambientes eram ligados por um longo corredor central. As nagaya’s permaneceram praticamente as mesmas até meados de 1910, quando cômodos como banheiro fo-

Residência estilo nakarokafonte: Japanese home and lifestyles

7. INABA, Kazuya. Japanese home and lifestyles: an illustrated journey through history. Tokyo: Kodansha International, 2000.

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Uenoshita Apartments, único remanescente da série de edifícios construídos pela construtora Dojunkai. fonte: http://en.wikipedia.org. visitada em junho/2012

8. http://www.metro.tokyo.jp. visitado em junho/2012

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ram anexados à moradia, tornando-se privado para cada família. Outras mudanças foram: a redução de unidades sob um mesmo teto, as unidades passaram a ter água encanada, esgoto e gás e as cozinhas migraram para a parte posterior da casa, mais cômodos foram acrescidos nas unidades, fazendo com que muitas virassem sobrados e não mais térreas. Na era Taisho (1912~1926) o Japão estava passando por um período expansionista. Quanto à arquitetura, os japoneses estavam começando a se acostumar com o “modo ocidental” de viver, acostumaram-se a utilizar mesas e cadeiras nos escritórios, escolas, hospitais; a usar o gás, água encanada, eletricidade; acostumaram-se também às roupas e aos alimentos. Por volta de 1920, com o movimento moderno internacional, os novos arquitetos japoneses começaram a demonstrar sua insatisfação por esse tipo de construção híbrida, que misturava ambientes orientais e ocidentais. Então começaram a desenvolver um tipo de residência mais voltado para família, mais especificamente para a rotina da família e também, tomou-se consciência da necessidade da privacidade dos membros da família, as crianças passaram a dor-

mir em quartos separados do dos pais. Os primeiros experimentos dessa nova proposta de morar foram feitas em residências para os próprios arquitetos, ou para pessoas da classe alta, que podiam pagar por essa nova experiência. No ano de 1923, ocorreu um grande terremoto na região de Kanto (planície situada a leste do Japão, na qual está inserida a capital Tóquio) que atingir magnitude de 7,8 a 8,3 na escala Richter, deixando mais de 140 mil mortos e destruindo mais de 570 mil lares.8 Uma construtora chamada Dojunkai começou a construir nas áreas devastadas de Tóquio, prédios de apartamentos feitos de concreto reforçado (mais resistente a abalos sismicos e incêndio) para abrigar os refugiados que perderam suas casas no terremoto ou no incêndio que se seguiu depois e durou cerca de 2 dias até ser controlado. Mais tarde esse modelo de moradia foi adotado principalmente por fábricas e empresas que começaram a construí-los para oferecer moradia com aluguel mais barato que o do mercado (danchi) e também pelo governo após a II Guerra Mundial. Na era Showa (1926~1989), em 1945, após o final da II Guerra Mundial, o Japão estava devastado, 160 cidades


tinham mais de 50% de seu território destruído, mais de 2,1milhões de casas foram arrasadas pelo fogo, mais de 550 mil moradias foram destruídas para impedir que o fogo se alastrasse9. Para contornar o problema, desde 1941 estavam sendo construídas moradias de 21m² para abrigar famílias inteiras (danchi ou mansion), ou então, começaram a usar casas existentes, para abrigar por volta de três famílias ao mesmo tempo. Essas soluções serviam apenas para que a população tivesse onde dormir, pois as condições eram inumanas. Algumas pessoas se recusavam a morar nesses lugares e saíam pelas ruas procurando por materiais nos destroços, que poderiam ser usados para construir barracos. Toda essa situação fez com que algumas pessoas começassem a refletir sobre alguns assuntos a cerca da moradia de antes da guerra, como por exemplo: “como poderiam ser aproveitados de forma mais econômicas os materiais de construção?”, “como fazer para aproveitar melhor o espaço mínimo?”. Começou-se a refletir também, se as casas de antes da II Guerra Mundial não tinham sido construídas visando apenas o espaço social, se não tinha se dado muita importância para o entretenimento

alheio, ao invés de garantir o conforto dos próprios moradores. Em novembro de 1945, uma agência do governo responsável pela reconstrução de habitações nas cidades devastadas começou a construir novas residências para a população, mas por causa da falta de matéria-prima, não podiam ser construídas habitações com mais de 40m². E as casas para alugar fornecidas pelo governo, não passavam de 22m², aos poucos essa metragem foi aumentando para 30m² e 40m². Esse tipo de restrição durou até 1950, quando a crise começou a passar. Os arquitetos ficaram “animados” com o desafio que se levantava diante deles: pensar a arquitetura considerando o uso de pré-fabricados, produção em massa para redução de custos, moradias de no máximo 20m², garantir a privacidade dos moradores. Nos anos de 1950, depois do período de restrições, os arquitetos experimentaram e exploraram diversos tipos de materiais e arranjo interno. Os ambientes internos passaram a focar a família. Os ambientes de mais destaque passaram a ser a sala de jantar e a sala de estar, onde a família ficava toda reunida e também poderiam ser usadas para receber visitas. O dormitó-

Danchi ou mansion construída na era Showa em Aizuwakamatsu, Fukushima fonte: http://en.wikipedia.org. visitada em junho/2012

Exemplo de habitação priorizando o indivíduo e sua privacidade pavimento térreo fonte: Japanese home and lifestyles

Exemplo de habitação priorizando o indivíduo e sua privacidade primeiro pavimento fonte: Japanese home and lifestyles

9. INABA, Kazuya. Japanese home and lifestyles: an illustrated journey through history. Tokyo: Kodansha International, 2000.

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Exemplo de habitação priorizando o indivíduo e sua privacidade primeiro pavimento fonte: Japanese home and lifestyles

Nakagin Capsule Tower, arquiteto Kisho Kurokawa fontes: http://en.wikipedia.org - http://www.architonic.com

10. Tramontano, Marcelo. Novos modos de vida, novos espaços de morar. Paris, São Paulo, Tokyo. Uma reflexão sobre a habitação contemporânea. São Carlos, 1998.

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rio dos pais e das crianças passaram a ser separados e, a fim de garantir mais privacidade, a separação dos quartos passou a ser feita com paredes maciças e foram colocadas portas com fechadura. E a cozinha, passou a receber mais iluminação natural. Após o período de recessão do pós-guerra, aproximadamente à partir de 1955, começaram a ser construídos edifícios de apartamento que visava, principalmente, os trabalhadores e suas famílias, por isso muitos foram construídos perto de centros empresariais/comerciais, para facilitar a vida dos trabalhadores. O pavimento térreo desses novos modelos de edifícios de apartamentos era ocupado, geralmente, por algum tipo de comércio ou serviços, a fim de conseguir diante o Governo a permissão para construir acima do coeficiente de aproveitamento máximo determinado. Um novo modelo de residência denominado mansion passou a ser construído, por volta de 1960. Nessa época, eram consideradas habitações de alto padrão nos centros urbanos. Leis urbanas de 1962 e 1963 foram responsáveis pela “ploriferação” desse tipo de moradia nas zonas urbanas. A primeira lei permitia a divisão na posse do imó-

vel, gerando os condomínios; a segunda lei, de 1963, permitiu o aumento na altura e na área construída dos imóveis. Na verdade, “eram, em última instância, e desde os seus primórdios, simples edifícios de apartamentos de grande altura, de ocupação muito densa, oferecendo condições de vida sem nenhuma riqueza espacial em particular.”10. Esses apartamentos trouxeram uma nova organização interna do espaço, uma combinação entre a sala de jantar e a cozinha, geralmente abreviados DK (dining-kitchen). Com essa abertura na legislação e a boa aceitação pelos habitantes das mansions, os arquitetos começaram a experimentar novos modelos. Um exemplo bem conhecido dessa época, desenvolvido pelo arquiteto Kisho Kurokawa, é o Nakagin Capsule Tower. Nessa obra o arquiteto projetou unidades habitacionais que continham o que era considerado essencial em uma residência, cama, banheiro e cozinha, em peças pré-fabricadas de aproximadamente 2,5m x 4,0m. Cada unidade em forma de capsula encaixam-se uma nas outras, de forma que se alguma delas necessitasse de reparo poderia ser facilmente substituída. Essa obra refletia bem o pensamento dos arquitetos me-


tabolistas que buscavam pensar uma arquitetura que solucionasse os problemas urbanísticos pelos quais o país estava enfrentando. Uma das heranças deixadas pelos arquitetos do movimento metabolismo foram as soluções pensadas para driblar os fenômenos naturais que constantemente “atacam” o país. Graças a esses primeiros pensamentos é que atualmente diversas soluções para amenizar os efeitos do terremoto, por exemplo estão sendo desenvolvidas. Resumidamente pode-se dizer que após a II Guerra Mundial o Japão passou por várias fases de política habitacional. Do fim da guerra até 1970, a preocupação do Governo era sanar o déficit habitacional, provendo uma unidade habitacional para cada famlía. Depois dessa fase quantitativa, o planejamento focou na qualidade, aumentando as áreas mínimas a serem obedecidas por lei. À partir de 2001, a principal preocupação passou a ser as questões voltadas à segurança e qualidade ambiental. Como sistemas de prevenção e combate a incêndio e terremotos e sustentabilidade do edifício, economia energética, conforto ambiental e acessibilidade universal. Atualmente a preocupação continua sendo

as mesmas de 2001, com o acréscimo de adequar as habitações para o novo perfil da população japonesa (aumento do número de idosos e de pessoas que moram sozinhas). Segundo o professor Marcelo Tramontano, alguns países estão passando pelo chamado efeito doughnut, ou seja, o esvaziamento das áreas centrais e o adensamento das áreas periféricas, que está associado a movimentação dos jovens para a área central, para morar nos one-room mansion (equivalente às nossas quitenetes). Esses apartamentos também são chamados 1DK, que corresponde a um único cômodo, contendo: cozinha, quarto, sanitário e banheiro. Conheci uma intercambista japonesa, com quem tive a oportunidade de perguntar como era a vida dela no Japão. O nome dela é Ayaka Nakamura (28 anos), um caso que exemplifica o efeito doughnut anteriormente citado. Descobri que ela mora em uma one-room mansion, sozinha em Osaka. Como muitas pessoas que vivem nesse tipo de habitação – trabalhadores que deixam suas famílias no interior e vão trabalhar/morar na cidade, jovens trabalhadores, estudantes -, Ayaka mudou-se de Nagoya para Osaka, depois 28


Planta do apartamento 1DK no qual a Ayaka mora em Osaka, desenhado por ela na entrevista fonte: arquivo pessoal

Exemplo de arquitetura vernacular fonte: arquivo pessoal

Exemplo de arquitetura vernacular fonte: http://g1.globo.com

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de ter entrado na faculdade. O apartamento dela tem aproximadamente 18m², apesar da pouca área, Ayaka não sente necessidade de ter mais espaço. Ela disse que não tem o costume de acumular muitos pertences e também não tem muitos móveis, estes são facilmente enumerados: um sofá, um hack, um armário e uma mesa baixa com pernas retráteis (utilizada para fazer as refeições ou para estudar) e uma caixa (estilo baú). Na hora de dormir, ela estende o futon sobre o chão e, pela manhã o dobra e guarda no armário, tranformando o quarto numa sala de estar. Nota-se que em alguns tipos de habitação, esse costume de dar diferentes usos para o ambiente dependendo do período do dia permanece até os dias atuais. Existem ainda no Japão as casas de arquitetura vernacular. Já as residências de arquitetura vernacular acabam não tendo mais essa mobilidade funcional, pois os ambientes são separados por paredes maciças e os móveis são fixos e não “retráteis”.Os arquitetos japoneses contemporâneos como os do escritório SANAA, Sou Fujimoto, Atelier Bow Wow, Junya Ishigami e outros que estão em destaque na arquitetura contemporânea, demonstram ter quase que as mesmas preocupações ao

fazerem um projeto para o Japão, seja de uma residência, de um edifício público, ou de qualquer outra natureza. A primeira é a questão da iluminação natural, em qualquer obra, o modo como eles lidam com as aberturas é notável, principalmente em obras residenciais. Há obras do arquiteto Sou Fujimoto, ou Ryue Nishizawa, da Kazuyo Sejima que as paredes externas da residência são quase todas de vidro, ou possuem grandes aberturas, mesmo em ambientes mais íntimos como quarto e banheiros, que dão vista para a rua, ou para a janela do vizinho. Em uma palestra realizada na FAU USP, no ano de 2009, um dos arquitetos fundadores do Atelier Bow Wow, Yoshiharu Tsukamoto, mostrou uma foto de uma de suas obras, House & Atelier Bow Wow, na qual a parede de vidro da sala de estar estava a poucos metros da parede cheia de janelas do vizinho. Uma aluna da FAU o questionou sobre a legislação e sobre privacidade, Tsukamoto riu e disse que não tinha problema, que como no Japão a luz não é tão abundante como no Brasil, eles podiam fazer aberturas mesmo estando tão próximo à divisa do terreno, quanto à privacidade, ele repondeu que os japoneses não ficavam espionando a vida


Garden & House - Ryue Nishizawa fonte: Iwan Baan

House & Atelier Bow Wow fonte: Bow Wow

NA House - Sou Fujimoto fonte: Archdaily

dos outros, então que também não tinha problema! Brincadeiras à parte, como vimos na história da evolução das residências no Japão, até poucos anos atrás, a privacidade entre membros de uma mesma família era inexistente, já que dormiam todos no mesmo quarto, quanto a privacidade morador/

pedestre, geralmente existem cortinas que cobrem, mesmo que sejam paredes inteiras de vidro, deixando a critério do morador quando expor ou não sua casa. Outra questão recorrente é a relação interpessoal, a criação de espaços que incentivem a convivência e o conta-

to entre as pessoas, como ocorre nos estudos de caso que analisarei mais a frente, Static Quarry e Moriyama House. Semelhante a essa questão, temos a relação entre o indivíduo e a cidade, geralmente resolvem essa questão com as aberturas, que conectam o indivíduo com o exterior visualmente. 30


2. estudos de caso 2.1 Static Quarry - Ikimono Architects

2.1.1 Arquiteto Takashi Fujino

1975 1998 2000 2000 2001 2006 2009 2012 2012

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2.1.2 ficha técnica Static Quarry

Arquiteto: Takashi Fujino / Ikimono ArNasceu em Gunma, Japão Graduou-se em arquitetura na Uni- chitects Local: Gunma, Japão versidade de Tohoku Projeto: 2009~2010 Completou o mestrado pela Universi- Construção: 2010~2011 dade de Tohoku Estrutura: Concreto Trabalhou na Corporação Shimizu11 Área do terreno: 624.56 m² Trabalhou no Haryu Wood Studio Área construída: 329.92 m² Fundou o escritório Ikimono Archi- Área total: 554.23 m² tects Uso: Apartamento Fundou o escritório Ikubyobako12 Telhado: Concreto Professor na Universidade de Tohoku Exterior: Concreto Professor no Instituto de Tecnologia de Maebashi

11. Corporação fundada em 1804, na era Edo e ainda ativa nos dias atuais. Presta serviços de arquitetura, engenharia, design, construção, manutenção, etc. 12. Escritório de design de objetos.


2.1.3 obra Static Quarry “Entrando e saindo pelas cavidades e vãos , realmente espero que eles curtam a presença uns dos outros como um fenômeno natural. E, através dos vãos nas paredes de concreto, eu desejo que sua presença se funda com o entrono.” (Fujino Takahashi)

Como já foi comentado anteriormente, o perfil da população japonesa está mudando, o número de pessoas morando sozinha é cada vez maior. Mesmo vivendo sozinhas, as pessoas relacionam-se entre si no convivívio na cidade. Caminhando nessa mesma linha, a principal intenção do arquiteto foi fazer do edifício uma pequena cidade, tentando recriar e incentivar as relações interpessoais existentes na cidade. Ao primeiro olhar, o edifíco aparenta ser um bloco de concreto escavado, mas analisando mais de perto esse

edifício de 8 unidades entede-se como o arquiteto pensou o projeto. Olhando o prédio de fora, percebemos aberturas no piso térreo e no primeiro pavimento que tornam o edifício permeável e não uma barreira visual. As aberturas no pavimento térreo são espaços de estacionamento, existem um para cada unidade. Mas esse espaço não foi pensado para ter apenas essa função, foi pensado para ser um ambiente multifuncional, pode ser uma extensão da sala de estar, ou uma sala de jantar externa, ou apenas um depósito aberto, ou um estacionamento. O formato do edifício é retangular, com um buraco no meio. Nesse espaço central foi feito um jardim estilo zen, para contemplação, com janelas de todas as unidades voltadas para ele. Ao colocar

o jardim na parte central, Fujino criou uma sensação de distância entre as unidades opostas umas as outras. Cada uma das unidades possuem terraço. Esses terraços em níveis diferentes criam uma dinâmica entre os moradores, pois ao mesmo tempo que cada um está no seu terraço, é possível se comunicar com o vizinho que está no terraço dele sem dificuldade. Um detalhe interessante nesse projeto é que o arquiteto, que possui um escritório de design de móveis, pensou num sistema de aproveitamento da água da chuva também para fins estéticos. A água da chuva que é recolhida nos terraços cai por um cano de PVC formando uma pequena cachoeira que cai sobre as pedras do jardim zen (elementos típicos desse tipo de jardim), dando vida ao jardim. 32


Terraรงo

fonte:Ikimono Kenchiku

Jardim zen

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fonte:Ikimono Kenchiku


2.1.4 partidos identificados Ambientes multifuncionais: da mesma forma que nas casas tradicionais japonesas, ao deslizar (abrir) o shoji é possível integrar e ampliar ambientes, fazendo com que alguns cômodos tenham uma função durante o dia e outra durante a noite. Na Static Quarry, o arquiteto optou por adotar esses vãos que, além da permeabilidade visual através do edifício, permitem ao morador ocupar esse espaço de forma livre, seja como garagem, como sala de estar, sala de jantar, etc.

Não possui muitas paredes dividindo os espaços: como foi visto anteriormente, as residências japonesas não utilizavam paredes para subdividir o espaço interno, usavam os painéis (shoji ou fusuma), as paredes passaram a ser um elemento comum na arquitetura residencial após a década de 1920. Na Static Quarry manteve-se esta característica, sendo as únicas paredes internas são as do banheiro e cozinha. 34


Luz: na arquitetura tradicional japonesa, o uso do shoji (translúcido), ou do fusuma (opaco), tinham também a função estética de “brincar” com a luz, produzindo variadas sombras. Esta característica, como escreveu uma vez o escritor Junichiro Tanizaki, é responsável pela originalidade do espaço : “a beleza de um quarto japonês depende da variação de sombras, sombras ‘pesadas’ contra sombras ‘leves’. fonte:Ikimono Kenchiku

fonte:Ikimono Kenchiku

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Ausência de mobiliário: segundo o filósofo Lao Tse, a verdadeira beleza de um ambiente está no espaço delimitado pelo teto e a parede , ou seja, o ambiente deveria ter meramente uma sugestão de cor ou textura, para que a imaginação de cada pessoa (morador ou visitante), sugerisse o restante da imagem de acordo com seu humor no momento. Neste raciocínio, explica-se porque , no espaço oriental o mobiliário é menos valorizado, e, tradicionalmente, confere-se grande importância a o vazio.


Uso do terraço: nessa obra o arquiteto trabalha com dois terraços para cada unidade: um sobre o primeiro pavimento e o outro sobre o segundo pavimento. Ao mesmo tempo que o terraço mais baixo oferece certa privacidade ao morador, é possível se comunicar com alguém que estiver no terraço mais alto. fonte:Ikimono Kenchiku fonte:Ikimono Kenchiku

Jardim central: Todas as unidades possuem janelas voltadas para o jardim, para que ele seja admirado como se fosse uma pintura. É importante notar que as aberturas estão desalinhadas umas às outras, conferindo um caráter mais privativo à unidade.

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2.2 Moriyama House - Escritório de Ryue Nishizawa 2.2.1 Arquiteto Ryue Nishizawa Ryue Nishizawa, iniciou ainda como estagiário trabalhando no escritório de Toyo Ito, arquiteto que admirava muito. Nessa época, Toyo Ito já era famoso, em seu escritório trabalhavam aproximadamente 30 funcionários. Após conhecer a arquiteta Kazuyo Sejima que, como ex-funcionária de Ito ainda mantinha boas relações com o arquiteto - foi trabalhar com ela. Como o escritório de Sejima ainda estava no início e contava apenas com mais 1 funcionário, Nishizawa achou que conseguiria 1966 Nasceu em Tóquio, Japão 1990 Graduou-se pela Universidade Nacio- aprender mais pois teria mais oportunal de Yokohama, com mestrado em nidade de discutir sobre o projeto com o arquiteto responsável, coisa que, Arquitetura num escritório degrande porte como o 1995 Fundou SANAA em parceria com Ka- de Ito, tornou-se raro. Após se formar em 1990, continuou zuyo Sejima 1997 Fundou o Escritório de Ryue Nishiza- trabalhando como arquiteto no escritório de Sejima. Ao ganharem juntos wa o primeiro prêmio no concurso para o 2000 Foi professor convidado em Harvard Museu de Arte Contemporânea de SidGSD, Cambridge, EUA ney, foram convidados para participar 2001 Professor associado na Universidade de outros concursos internacionais. A Nacional de Yokohama, Japão partir daí decidiram criar o SANAA (Sejima and Nishizawa and Associates) em 1995, para participarem de concursos internacionais ou para realizarem 37

grandes projetos nacionais. Em 1997, Ryue Nishizawa fundou o seu próprio escritório. Apesar de cada um ter seu escritório, eles mantêm uma boa relação não apenas nos projetos que trabalham juntos sob o nome de SANAA, como também, constantemente Sejima pede a opinião de Nishizawa em alguns projetos de seu escritório e Nishizawa também consulta Sejima sobre seus projetos. O método de trabalho praticado por ele é baseado em muitos desenhos, manuais e no computador e modelos físicos. Na fase de estudo, ele discute com todos os arquitetos do escritório e geram o maior número de possibilidades para o projeto. A partir dos partidos são gerados desenhos e modelos físicos, para que cada alternativa seja analisada de vários ângulos diferentes. Uma característica de seus projetos é o interesse em estabelecer a relação entre o interior e o exterior da obra, em estabelecer a relação entre um espaço e outro. Por isso procura usar materiais que não separam os ambientes, como o vidro e outros materiais translúcidos, que dão a sensação de não se saber se


fonte: Amassing Design

está no interior ou exterior da obra, fazendo surgir uma continuidade entre o lado de fora e de dentro. Nishizawa afirma que: “Transparência significa criar relações. Não é preciso ver através. Transparência também significa claridade, não apenas visual, mas também conceitual.”. (EL CROQUIS, 121 – 2004) A luz é outro elemento muito importante em suas obras, assim como o vento e outros elementos provenientes da natureza. Sua arquitetura busca conciliar os elementos naturais e os artificiais no projeto. Apesar dos jardins e da luz serem elementos externos à arquitetu-

fonte: Amassing Design

ra, são considerados parte dela. Nishizawa costuma dizer que os edifícios possuem uma certa hierarquia espacial, ele explica essa hierarquia assim: um espaço geralmente torna-se escuro conforme adentramos um edifício, fazendo-se pensar em quais ambientes a luz natural se vê mais necessária, hierarquizando assim os espaços. Para que não haja essa hierarquização em suas obras, Nishizawa procura fazer com que a luz natural penetre até nos fundos do edifício. Fazendo com que a luz seja distribuída por toda a planta, faz com que a hierarquia não mais exista.

2.2.2 ficha técnica moriyama house Arquiteto: Ryue Nishizawa / Office of Ryue Nishizawa Local: Tóquio, Japão Construção: 2005 Estrutura: Concreto e aço Área do terreno: 290.00 m² Área construída: 130.109 m² Área total: 263.00 m² Uso: Apartamento Telhado: Concreto Exterior: Concreto Proprietário: Yasuo Moriyama 38


2.2.3 Obra moriyama house O proprietário, sr. Moriyama pediu ao arquiteto Ryue Nishizawa que projetasse um edifício com unidades de habitação, as quais ele poderia estar alugando, mas que futuramente poderia estar usufruindo todas ou algumas delas. O local do projeto foi um bairro residencial consolidado de Tóquio. A organização das quadras é de casas térreas, casas com 3 pavimentos e edifícios baixos de apartamentos (mansion) posicionados próximos uns aos outros. Se Ryue Nishizawa fosse seguir essa conformação do bairro, construindo um volume único, resultaria num bloco enorme que acabaria destoando das residências ao seu redor. Sendo assim, Nishizawa optou por espalhar o programa pelo lote para trabalhar com uni39

fonte: Amassing Design

dades de dimensões mais semelhante à malha urbana do bairro. Essa proposta de fragmentar o programa acabou gerando blocos de unidades independentes, com estruturas independentes, dimensões e formato variados. Nishizawa projetou no total 10 unidades com programas diferentes: existem unidades completas (com cozinha, banheiro, quarto, sala), unidades que são apenas quartos, unidades que são apenas “casa de banho”, unidades que são apenas cozinha, outras apenas sala de jantar, etc. Ao criar essas unidades incompletas, o arquiteto faz com que o morador tenha que se deslocar de uma unidade a outra, sentindo calor quando está sol, sentindo frio quando está frio, se molhando quando está chovendo. Esse foi o modo que

Nishizawa encontrou para que as pessoas saíssem das estufas climatizadas e interagissem com o exterior. Um outro tipo de interação foi a criação dos jardins e vielas de uso coletivo. A disposição das unidades no lote criaram pequenos jardins e vielas, que podem ser usados e cuidados por qualquer um dos moradores. A ideia por trás da criação dos jardins foi a de recriar espaços de convivência típicos de Tóquio, para reforçar que a vida de um indivíduo não ocorre sozinha em um quarto, ela vai além, se expande em direção dos jardins e vielas. Atualmente o sr. Moriyama vive em uma das unidades, a maior de todas e que comporta o programa de necessidades completo de uma residência. Todas as outras unidades com quarto ele aluga e as unidades com banheiro, cozinha, são de uso coletivo.


2.2.4 Partidos identificados

Possui ambientes multifuncionais: Especificamente, nesse projeto, essa unidade é uma sala de estra que o arquiteto Ryue Nishizawa deixou para que fosse usado de acordo com a vontade do proprietário, o sr. Moriyama, podendo se tornar uma unidade particular (sala durante o dia e quarto durante a noite), ou uma unidade comum a todos os inquilinos (como um ponto de encontro) fonte: amassing design

fonte: dwell

Apresenta unidades de banheiro externo: Aqui o arquiteto tem intenção de provocar a percepção dos moradores para a relação interior/exterior. Dentro das unidades projetadas, usufruindo do ar condicionado, o morador não tem muita noção de como está o clima do lado de fora, portanto a necessidade de sair para frequentar o banheiro faz com que o usuário possa entrar em contato com o exterior. 40


Possui ambientes coletivos: na era Edo, por exemplo, nas zonas urbanas, nos bairros onde moravam os pequenos comerciantes e artesãos, havia um pátio comunitário compartilhado por vários moradores. Eles dividiam o poço, os banheiros e, onde eles interagiam uns com os outros. Na Moriyama House, Ryue Nishizawa cria vários espaços entre as unidades, onde os moradores interagem entre si, evocando uma prática comum nas residências tradicionais japonesas.

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Não usa paredes para dividir os ambientes: nas casas tradicionais, os ambientes eram divididos por shoji ( elemento translúcido), ou fusuma (elemento opaco), que são divisórias deslizantes empregadas para conferir flexibilidade e alternativas de uso para os espaços projetados. Nessa foto, o recurso usado pelo arquiteto são as estantes móveis que dividem o ambiente, e acabam desempenhando papel semelhante ao das divisórias.


Uso do terraço: essa prática de usar o terraço como opção de espaço de lazer não é um costume da arquitetura tradicional japonesa. É uma prática mais contemporânea, geralmente em edifícios de hospitais, escolas e aos poucos está se tornando comum nas residências.

Visão do exterior como um quadro: normalmente as salas de chá nas casas tradicionais abriam-se para a melhor vista do jardim, como se enquanto as pessoas estavam apreciando o chá, pudessem também desfrutar de uma paisagem bonita, como se fosse um quadro. Do mesmo modo, essas grandes janelas espalhadas por todas as unidades, voltadas também para o jardim interno, remetem às tradicionais salas de chá.

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3. Projeto

3.1 público alvo

12. Tramontano, Marcelo. Habitações, metrópolis e modos de vida: por uma reflexão sobre a habitação contemporânea. 13. casais que não podem ter filhos.

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Segundo os dados do IBGE, o número de pessoas por família em São Paulo vem diminuindo desde 1981, cuja média era de 4,3 pessoas por família. No Censo realizado em 2010 esse número passou para 3,15 pessoas por família na zona urbana. Um dos principais motivos dessa redução no número de pessoas por família está diretamente relacionada com a queda de fecundidade. E “por trás da queda da fecundidade, encontra-se uma mulher que reinvindica, entre outras coisas, um lugar no mercado de trabalho, a liberdade de ter relações sexuais dissociadas da obrigatoriedade católica de procriação, o direito de escolher quando ter – ou não ter – filhos, o direito de separar-se do parceiro – ou parceira – sem ser por isso, estigmatizada pela sociedade.”12

Além dessa redução no número de pessoas por família, vê-se também uma mudança na organização familiar contemporânea brasileira. Desde 1945, ao final da II Guerra Mundial, o modelo de cultura e costumes norte-americano tornou-se referência para muitos países. A produção cinematográfica de Hollywood ajudou não apenas a divulgar, como também a ditar o modo de viver norte-americano, incluindo o modelo de família norte-americana: a família nuclear (composta por pai, mãe e filhos). Essa conformação familiar foi adotada, principalmente, pelos países industrializados, como o Brasil. Segundo dados do IBGE (ano 2000), esse modelo de família nuclear permanece sendo o mais comum no Brasil, porém novos arranjos familiares cotemporâ-


neos estão surgindo. Na pesquisa do professor doutor Marcelo Claudio Tramontano, esses grupos contemporâneos são classificados da seguinte forma: “famílias monoparentais, casais DINKs – Double Income No Kids13 -, uniões livres – incluindo casais homossexuais -, grupos coabitando sem laços conjugais ou de parentesco entre seus membros, e uma família nuclear renovada, ainda dominante nas estatísticas, mas com um enfraquecimento da autoridade dos pais em benefício de uma maior autonomia de cada um de seus membros.”14 Analisando essa pesquisa do Tramontano, optei por adotar alguns grupos desse arranjo familiar contemporâneo como público alvo para a minha proposta, são eles: casais DINKs, uniões livres, grupos que coabitam sem pos-

suir laços conjugais ou parentais, como estudantes que formam república, e pessoas que moram sozinhos. Esses grupos de pessoas são mais livres, predispostas a adaptar-se mais facilmente a diferentes situações. Situações estas, que eu poderia vir a propor no meu projeto, a começar pela habitação mínima. Uma família de quatro pessoas (pais e 2 filhos), por exemplo, se pudesse escolher, optaria por viver em uma casa de grande porte, onde cada um pode ter sua privacidade e onde caiba todos os pertences que acumularam, onde não se esbarre em alguém a cada dois passos dados. Mas um casal sem filhos, alguém que mora sozinho, talvez não se importasse em morar numa habitação de pequeno porte. Comecei a pensar assim depois que me inseri nesse novo arranjo de família contemporânea.

14. Tramontano, Marcelo. Habitações, metrópolis e modos de vida: por uma reflexão sobre a habitação contemporânea. 15. por fácil acesso estou considerando que hajam transportes públicos que atendam a essas regiões, sem considerar o transporte particular, que não é prioridade no projeto. 16. parâmetro não-oficial, adotado pelo escritório dos arquitetos Cândido Malta Campos Filho e Luiz Carlos Costa (Urbe Planjamento, Programação e Projetos). Atualmente parece não haver nenhuma norma nem lei que determine uma distância máxima confortável para percorrer à pé.

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3.2 localização A definição do público alvo foi decisivo para escolher o local de implantação do projeto. Considerando que estou propondo atender, de um modo geral, trabalhadores e estudantes, procurei uma região que fosse “bem servida” de transportes públicos e, que fosse próximo e de fácil acesso a instituições de ensino superior e centros financeiros. Sendo assim, optei por procurar um terreno na Zona Oeste que abriga o campus USP (Universidade se São Paulo) da capital, é atendida pelo metrô da linha 4 - amarela, que está interligada com outras linhas de trem e metrô, de fácil acesso15 à Av. Brigadeiro Faria Lima, à Av. Paulista e à Av. Engenheiro Luís Carlos Berrini (principais pólos empresariais de São Paulo). Para restringir a minha área de busca por um terreno, elenquei alguns critérios: primeiramente, considerei incenti45

var o uso do transporte público em detrimento ao particular, o melhor tipo de transporte para esse fim são os transportes de massa, sobre trilho e, dentre eles o metrô é o mais rápido. Portanto, adotando o metrô Butantã, linha 4 amarela, como ponto de referência, defini que o lote deveria estar localizado dentro de um raio de 800m de distância16 do metrô butantã, considerando essa a distância máxima confortável para se andar a pé. Com esses dois critérios foi possível delimitar um perímetro de busca por possíveis lotes. Quanto aos lotes, o primeiro critério utilizado foi identificar os que estivessem vazios, sem uso, estacionamentos, ou lotes à venda. identifiquei 10 lotes - entre estacionamentos e lotes vazios - dentro do perímetro de 800m de distância da estação de metrô Butantã. O

próximo passo foi verificar se o caminho percorrido à pé até a estação de metrô, atendia ao limite de 800m. Os que ultrapassaram esse limite foram eliminados, restaram 4 lotes. Os critérios finais para decidir qual lote seria o mais adequado foram alguns critérios de comodidade e segurança, como por exemplo, estar próximo a comércios de “primeiras necessidades” (farmácia, mercado, padaria, etc.) e que a variedade do comércio e serviços existentes que trouxessem movimentação de pessoas em vários períodos do dia, dando mais segurança aos moradores. Depois de analisados esses útimos critérios, o lote que mais se adequou foi um próximo ao encontro da Avenida Corifeu Marques, com a Avenida Vital Brasil.


fonte: Google Earth

3.3 terreno O terreno está situado a uma caminhada de 10 minutos da estação de metrô Butantã, nesse percurso há o Instituto Butantã, mercados, farmácias, padaria, restaurantes, postos de gasolina, uma unidade da Faculdade São Judas, bares, agencias bancárias, comércios diversos, etc. O acesso ao lote de transporte particular é dificultado. Apesar de estar situado na Avenida Corifeu Marques, só é possível chegar de carro pela pista no sentido bairro centro. Caso esteja vindo pelo sentido contrário, bairro-centro, o retorno mais próximo fica a uns 800m. Essa dificuldade, na minha opinião incentiva o uso do transporte público, o que era um parâmetro de projeto visa-

do desde o início. A área do lote é de aproximadamente 737,50m². Segundo a Legislação de Uso e Ocupação do solo, o terreno está situado numa ZER (zona exclusivamente residencial), com coeficiente de aproveitamento 1,0 e gabarito máximo de 10m. O uso permitido é: R1 (uma unidade habitacional por lote), R2h (conjunto de duas ou mais unidades habitacionais, agrupadas horizontalmente e/ou superpostas, e todas com entrada independente com frente para via oficial de acesso ou em condomínio - casas geminadas, casas superpostas, vilas, e conjunto residencial vila).17 Como foi citado acima, nesse local não

pode ser construído edifícios de apartamento, por isso optei por projetar uma vila. Para determinar quantas unidades seriam projetadas, fiz um cálculo estimado, subdividindo o terreno em lotes de 100m² para cada unidade. Descontando o recuo frontal - que segundo a lei nº 11.605 de 12 de julho de 1994, determina que apenas o recuo frontal (à partir do logradouro principal) deve ser respeitado, os demais recuos estão dispensados - de 5m, cheguei ao número de 6 unidades residenciais. A legislação exige que haja, pelo menos 1 vaga de estacionamento para cada unidade habitacional de até 200m². 46


3.4 projeto 3.4.1 Partido Implantação - opção 1 fonte: arquivo pessoal

Implantação - opção 2 fonte: arquivo pessoal

Implantação - opção 3 fonte: arquivo pessoal

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Depois de escolhido o terreno e definido que o projeto seria de habitação multifamiliar horizontal, conformando uma vila, o próximo passo foi, elencar quais partidos dos estudos de caso seriam considerados no projeto e propor alguns outros: - criação de espaços de convivência entre os moradores; - cultivo de pomar e horta como instrumentos de interação entre os moradores; - uso do terraço como espaço de lazer particular de cada unidade; - integração entre interior e exterior das unidades; - evitar segmentação dos espaços internos com paredes; - criação de programas diferentes para cada unidade; - criar meios de interação entre moradores de uma mesma unidade.

3.4.2 implantação Depois de estimado o número de unidades, comecei a fazer alguns estudos para determinar qual seria o melhor local para posicionar o estacionamento, de modo que proporcionasse mais espaço interno. Devo ressaltar que nessa fase de estudo, acabei desconsiderando o recuo frontal obrigatório. Desenvolvi 3 opções de estudo. A primeira simula como seria se cada unidade tivesse sua própria garagem. Como vemos na imagem, mesmo sem considerar o recuo frontal e a via interna não estar atendendo a exigência mínima de 6 m, perde-se muito espaço com as vias de circulação e, por conta disso, a implantação das unidades fica presa. Lembrando que quando fazemos via interna de veículos, exige-se via de pedestre! Na segunda opção, posicionei o estacionamento no fundo do terreno. Como no primeiro estudo, a via interna (que também não está atendendo às normas) ocupa muito espaço, restringindo a área de implantação das unidades. Se tivesse aplicado o recuo frontal nesse estudo, conseguiria locar apenas 3 unidades habitacionais. Talvez, se fosse permitido a construção de condo-


mínios verticalizados, essa solução não fosse tão ruim, poderia até ganhar um térreo livre para lazer. Na terceira opção, posiciono o estacionamento na área frontal do terreno, podendo aproveitar o espaço do recuo frontal de 5m. Essa opção é a mais viável nesse caso, pois não há perda com vias internas de automóveis, as unidades podem ser posicionadas de forma mais livre no terreno e, cada uma pode ter um formato diferente. Ficou definido então, que a melhor posição para o estacionamento é na parte frontal do lote, ocupando a faixa de recuo obrigatório, deixando o resto do terreno livre para implantar as 6 unidades habitacionais sugeridas. Enquanto fazia os estudos do estacionamento, percebi que defronte ao terreno há uma faixa de pedestres. E logo determinei que o portão para pedestres deveria ficar posicionado na direção do meio da faixa. Primeiro por uma questão lógica e prática, pois por exemplo, se um morador está saindo da vila para ir na farmácia que fica do outro lado da Avenida Corifeu, é muito mais simples se ele sair pelo portão e seguir em linha reta até a faixa de pedestre e atravessá-la. Segundo, para incentivar que as pessoas atravessem pela faixa

de pedestre, pois muitas se recusam a dar 5 passos a mais para atravessar em segurança. O fato mais interessante foi que ao ligar uma linha perpendicular à fachada do terreno, passando pelo ponto médio da faixa de pedestre, divido a fachada em duas partes desiguais, porém na parte maior cabem 6 espaçosas vagas de estacionamento. A posição do estacionamento após a faixa de pedestres e, con- Estudo de implantação fonte: arquivo pessoal sequentemente, após o semáforo, faz com que o morador saia com seu carro com mais segurança e sem atrapalhar o trânsito, ele só precisa esperar o semáforo fechar para sair. Quanto a implantação das unidades no terreno, comecei pensando-as de forma bem simples e primitiva, um quadrado. Um quadrado de 5,00m x 5,00m que poderia unir-se com outro formando um retângulo de 10,00m x Estudo de implantação 5,00m. Dessa vez fiz uma maquete com fonte: arquivo pessoal bloquinhos para poder estudar melhor a relação espacial entre uma unidade e outra. Ao posicionar os blocos no terreno, cheguei à conclusão de que 6 era a quantidade ideal de unidades, pois assim conseguiria trabalhar com unidades de formatos diferentes e ainda manter uma distância conveniente entre uma moradia e outra. 48


3.4.3 unidades

desenho do sistema de aquecimento solar à vácuo com boiler acoplado fonte: aquakent

B A C D

E F N

1

5

10

20

Localização dos lotes

18. latitude+10º, a latitude de São Paulo é -23° 32’ 51’’

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A solução construtiva será steel frame, com placas cimentícias para as paredes externas e drywall para as internas. A laje será de steel deck. O steel frame é muito utilizado no Japão, as placas cimentícias são bastante resistente a abalos sismicos e o preenchimento com lã de vidro ou lã de rocha garantem o isolamento acústico e térmico. A espessura final da parede é outra vantagem se comparada a uma parede de alvenaria e ainda suporta quase todos os tipos de revestimento. Outras vantagens no uso do steel frame ficam por conta da rapidez na montagem, da pouca produção de entulho ao final da obra, na facilidade de manutenção, etc. Esse sistema construtivo ainda não é muito utilizado no Brasil, com excessão do drywall, a existencia de fabricantes nacionais do produto, foi um fator decisivo para definir seu uso. Acompanhando essa solução sustentável na construção, adotei o sistema de aquecimento solar à vácuo, com boiler acoplado, tendo como apoio o aquecimento à gás. Optei por usar esse sistema (à vácuo e acoplado) para economizar espaço físico e também porque não exige que a caixa d’água esteja a uma

certa altura do boiler, criando um efeito estético indesejado no design final das unidades. Ainda por esse motivo, recorrerei ao uso de pressurizador, pois na maioria dos casos a caixa d’água não atinge nem 2 mca. Instalei os coletores voltados para o norte, com inclinação de aproximadamente 33°18. E a caixa d’água ficou num ambiente coberto e com ventilação permanente por causa do pressurizador. Gostaria de ressaltar que fiz uma breve pesquisa sobre as soluções empregadas para tornar o projeto verossímel, porém não entrarei no mérito de especificá-las e detalha-las, pois essa não é a proposta principal do trabalho. Como um dos partidos é criar unidades diferentes umas das outras, para ajudar a pensar no projeto de cada unidade, defini para cada uma o número de moradores: - Bloco A: 4 pessoas; - Bloco B: 2 pessoas; - Bloco C: 2 pessoas (casal); - Bloco D: 1 pessoal; - Bloco E: 2 pessoas; - Bloco F: 2 pessoas (casal).


bloco a

O bloco A possui aproximadamente 132m² e está posicionado na parte frontal do lote. Para entrar na vila, passamos por sob a projeção do primeiro pavimento dessa unidade. Entra-se na casa passando pela sala de jantar. O que divide a sala de jantar da cozinha é o balcão do fogão. A pia está no lado oposto ao lado da área de serviços. No 1º pavimento está o dormitório. Criei um quarto para cada pessoa, pois penso que às vezes um pouco de privacidade é necessário. Como elemento divisor utilizei o guarda-roupas e criei painéis deslizantes para completar o fechamento do quarto. Como esse bloco foi projetado pensando em uma república, fiz o banheiro todo separado para que 3 pessoas possam usá-lo ao mesmo tempo - enquanto uma pessoa toma banho, outra pode usar o banheiro e uma terceira pode escovar os dentes.

Localização do bloco A

PAVIMENTO TÉRREO ESCALA 1:100

1º PAVIMENTO ESCALA 1:100

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No segundo pavimento ficou a sala de estar e o terraço. Fiz a porta que divide um ambiente do outra o mais larga possível para que quando aberta pareça que há apenas um ambiente. Ao usar o mesmo material de revestimento de piso na sala e no terraço, ele se torna o principal elemento responsável pela integração. 2º PAVIMENTO ESCALA 1:100

Na cobertura ficam os equipamentos do sistema de aquecimento solar, com os coletores voltados para o norte. A caixa d’água está em um lugar coberto e com ventilação constante por causa do pressurizador que não pode estar exposto às intempéries. O acesso para esse pavimento é feito por uma escada tipo marinheiro, pois ela é bem discreta e ao longe ela se torna praticamente invisível.

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COBERTURA ESCALA 1:100


Nas janelas do primeiro e segundo pavimentos utilizei um sistema de paineis de venezianas com a principal função de permitir a ventilação do ambiente mesmo em dias chuvosos, sem que entre água no ambientes internos. Fiz trilhos em toda a extensão da fachada para que os painéis pudessem ser movimentados livremente, criando uma dinâmica, a fachada mudando durante todo o dia.

FACHADA LESTE ESCALA 1:125

FACHADA SUL ESCALA 1:125

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As escadas são de painéis madeira, com estrutura de metal, para darem um ar de leveza e transparência.

CORTE TRANSVERSAL ESCALA 1:125

CORTE LONGITUDINAL ESCALA 1:125

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bloco B Este bloco tem aproximadamente 105m² está posicionado na parte frontal do lote, com a fachada norte faceando o muro do estacionamento. O ângulo gerado entre a unidade e o muro lateral do terreno gerou um jardim particular para essa unidade. Projetei esse jardim com elementos que remetessem ao paisagismo japonês, como a pedra e o bambu. A porta de entrada está posicionada no centro da residência, criando um hall, dele é possível ir para a sala, cozinha, ou subir a escada para os outros pavimentos. Loquei no pavimento térreo o setor social, sala de estar, jantar e cozinha. Na sala de estar tem uma grande porta de vidro que emoldura a vista para o jardim.

Localização do bloco B

PAVIMENTO TÉRREO ESCALA 1:100

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No pavimento superior, estão os dormitórios e o terraço. Os dormitórios foram separados para dar mais privacidade aos moradores.

1º PAVIMENTO ESCALA 1:100

COBERTURA ESCALA 1:100

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Assim como no bloco A, os equipamentos de aquecimento solar são acessados através de uma escada tipo marinheiro.


FACHADA LESTE ESCALA 1:125

FACHADA SUL ESCALA 1:125

FACHADA NORTE ESCALA 1:125

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FACHADA OESTE ESCALA 1:125

Como o reservatório de água deve ficar em local coberto por causa do pressurizador, com ventilação permanente, criei paineis de venezianas. Repeti o uso desses paineis em várias outras ocasiões pela fachada em alguns locais específicos, com a principal função de permitir ventilação em dias chuvosos, por exemplo. Na fachada oeste utilizei o painel para preencher o dente criado pela implantação dos coletores solares, para que a fachada ficasse mais contínua, sem tantas quebras.

CORTE TRANSVERSAL ESCALA 1:125 CORTE LONGITUDINAL ESCALA 1:125

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Sob a escada que sobe para o primeiro pavimento, aproveitei esse espaço para fazer uma estante.


bloco C

Este bloco possui aproximadamente 80m² e está posicionado na parte central do terreno. Por ser a menor tipologia de unidade, acabei recorrendo a alguns artifícios para ampliar o ambiente , como por exemplo a mesa de jantar que se desdobra para fora da cozinha, ampliando a “sala de jantar”. O dormitório situado no primeiro pavimento pode ser totalmente fechado por um painel que corre por trás do guarda-roupas, direcionando a pessoa que estiver subindo, por exemplo, diretamente para o próximo pavimento

Localização do bloco B

Detalhe da opção de ampliação da sala de jantar ESCALA 1:100

PAVIMENTO TÉRREO ESCALA 1:100

1º PAVIMENTO ESCALA 1:100

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Esse próximo pavimento era para ser o terraço descoberto, mas foi necessária fazer uma cobertura para abrigar o sistema de aquecimento solar. Sendo assim, o terraço ganhou uma conformação diferenciada, uma espécia de ambiente híbrido: quando totalmente fechado, sala de estar, quando aberto, um terraço coberto. Nessa unidade, o acesso para o sistema de aquecimento solar é feito por uma escada retrátil.

2º PAVIMENTO ESCALA 1:100

O terraço é todo fechado por painéis que podem ser abertos, de forma que o próprio painel se torna o guarda-corpo. 59

COBERTURA ESCALA 1:100


FACHADA NORTE ESCALA 1:125

FACHADA LESTE ESCALA 1:125

FACHADA SUL ESCALA 1:125

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FACHADA OESTE ESCALA 1:125

CORTE AA ESCALA 1:125

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CORTE BB ESCALA 1:125


bloco d Essa unidade é muito parecida com o bloco C, porém possui aproximadamente 68m². No pavimento térreo temos 4 ambientes integrados: sala de estar, sala de jantar, cozinha e área de serviço. A mesa de jantar está posicionada na área central e, com um sistema de rotação, com o eixo no pilar, de modo que dependendo da sua posição pode ter uma função diferente. O dormitório e o banheiro estão localizados no mezanino. Para que não obstrua a visão, o armário foi posicionado no limite do pavimento, com a altura de um guarda-corpo, pois além de ser armário, recebeu as funções de guarda-corpo. Caso o morador esteja recebendo visitas, ele tem a opção de fechar o quarto com um painel.

Localização do bloco D

PAVIMENTO TÉRREO ESCALA 1:100

PAVIMENTO MEZANINO ESCALA 1:100

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2º PAVIMENTO ESCALA 1:100

COBERTURA ESCALA 1:100

Como ocorreu no bloco C, pela locação semelhante do sistema de aquecimento solar, o terraço ficou coberto, envolto pelo painel que, ao ser aberto se transforma no guarda corpo. O acesso para a laje dos equipamentos é feita por escada retrátil, com o alçapão dando para o reservatório.

FACHADA NORTE ESCALA 1:125

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FACHADA SUL ESCALA 1:125

CORTE AA ESCALA 1:125

FACHADA OESTE ESCALA 1:125

CORTE AA ESCALA 1:125

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bloco e

Essa unidade possui aproximadamente 93m². Seu principal partido é o uso do desnível como delimitador do ambiente. Fui distribuindo os ambientes em patamares com diferença de altura de 90cm, organizando-os partindo dos ambientes de caráter social, como sala de estar, sala de jantar, até chegar em ambientes de caráter mais privado, como os dormitórios. O fato de não possuir muitas paredes dividindo os ambientes faz com que haja permeabilidade visual mesmo dentro da unidade, de modo que um morador perceba a presença do outro mesmo que eles não estejam no mesmo ambiente.

Localização do bloco E

PAVIMENTO TÉRREO ESCALA 1:100

2º PAVIMENTO ESCALA 1:100

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PAVIMENTO Tร RREO ESCALA 1:100

2ยบ PAVIMENTO ESCALA 1:100

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Nessa unidade, o método de distribuição dos painéis de veneziana foi um pouco diferente, por causa dos meios níveis, em alguns casos um mesmo painel serve a duas janelas. Cosiderei essa opção possível, pois não apenas essa unidade, mas todas as unidades possuem os ambientes bem integrados, então mesmo que poucas janelas que estejam abertas, ainda mais se for em paredes opostas, podem gerar ventilação cruzada. Por isso as venezianas foram adotadas apenas em algumas janelas.

FACHADA SUL ESCALA 1:125

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FACHADA NORTE ESCALA 1:125

CORTE AA ESCALA 1:125


FACHADA LESTE ESCALA 1:125

CORTE AA ESCALA 1:125

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bloco f O bloco F possui aproximadamente 105m², está localizado no fundo do terreno, sua disposição em relação à quina do lote criou um jarim particular para essa unidade, assim como no bloco B. O jardim tem uma parte com deck de madeira e o restante foi criado remetendo ao jardim tradicional japonês. O piso do deck foi pensado adentrando a sala de estar, fazendo com que quando a porta da sala está aberta, ocorre a integração entre os dois ambientes. Da sala de estar para a cozinha há um desnível de 90cm. Para vencer esse desnível foi projetada a escada convencional e, ao lado degraus com espelhos mais altos que servem como estantes e pisadas mais largas onde as pessoas podem sentar. Pensando que o espaço de estar pudesse, eventualmente avançar para a sala de jantar, considerei utilizar uma mesa que poderia ser recolhida para compor o painel da bancada, enquanto que as cadeiras sendo reguláveis, podem ser ajustadas para serem usadas em conjunto com a bancada, criando mais espaço.

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Localização do bloco F

PAVIMENTO TÉRREO ESCALA 1:100


No pavimento superior, o terraço está 54cm acima do nível do dormitório. Aproveitei esse desnível para criar um banco em toda extensão da parede, que pode servir como báu para guarda de pertences. No lugar do guarda-roupas optei por usar cômoda, para que podesse abrir uma janela por onde pode-se contemplar todo o terreno.O sistema de aquecimento solar teve a mesma solução usada no bloco A, com acesso feito pela escada marinheiro.

1º PAVIMENTO ESCALA 1:100

COBERTURA ESCALA 1:100

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FACHADA LESTE ESCALA 1:125

FACHADA NORTE ESCALA 1:125

CORTE LONGITUDINAL ESCALA 1:125

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FACHADA SUL ESCALA 1:125

CORTE TRANSVERSAL ESCALA 1:125

FACHADA OESTE ESCALA 1:125

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3.4.4 paisagismo O paisagismo foi projetado pensando em como ele poderia contribuir para trabalhar a relação entre os moradores. Primeiro foram criados nichos de convivência, com bancos ou conjuntos de mesa e cadeira. Outro método foi usar árvores frutíferas, cujo fruto pode ser colhido e comido direto do pé: como jabuticaba, tangerina, acerola, cereja, lichia e manga. Apenas essa última não costumamos comer do pé, mas por ser muito saborosa não poderia faltar. Além do pomar, reservei um espaço para uma horta, onde as pessoas podem estar plantando os legumes, verduras e hortaliças que preferirem.Optei por deixar a horta na parte central do terreno de modo que várias unidades se voltassem para ela, para evitar que apenas uma pessoa se apropriasse dela.

Q

S E U

73

PAISAGISMO PLANTA ESCALA 1:200


4. Conclusão

No início, quando comecei a me interessar em arquitetura contemporânea japonesa - depois de uma palestra ministrada na FAUUSP, pelo arquiteto e professor Yoshiharu Tsukamoto (Atelier Bow Wow) - , li diversas revistas na biblioteca da faculdade, as soluções que os arquitetos japoneses encontravam para tratar a questão da habitação de pequeno porte me impressionavam. Principalmente a forma de trabalhar os desníveis, a permeabilidade visual que eles geravam ligando os ambientes internos entre si - muito parecido com o conceito utilizado na FAU, mas aplicado numa escala muito mais reduzida -, e também com o exterior. Ao propor a mim mesma gerar habitação de pequeno porte, baseada nos mesmos partidos utilizados pelos arquitetos japoneses, mas considerando

a nossa cultura, foi um grande desafio, ainda mais considerando que por ser descendente de japoneses e por ter morado lá por poucos meses, minha “percepção cultural” é bem miscigenada. Conforme foi correndo o projeto, lidar com a relação do vazio, da composição dos móveis com os ambientes, como pensa-los multifuncionais, como lidar com o coletivo e o privado, quais soluções eu poderia adotar que não fossem tão estranhas à nossa cultura. Várias questões foram sugindo e começaram a ser minimamente respondidas quando a realção arquitetura, mobiliário e ser humano começaram a ser pensadas conjuntamente, por isso há a sugestão de alguns móveis para alguns ambientes. E são esses móveis que acabam ditando a funcionalidade do espaço. 74


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5. Referências bibliográficas

Livros: - BLACK, Alexandra. The Japanese house: architecture and interiors. Boston: Tuttle Pub., 2000. - ENGEL, Heino. The Japanese house: a tradition for contemporary architecture. Rutland, Vt.: C.E. Tuttle Co., 1988. - INABA, Kazuya. Japanese home and lifestyles: an illustrated journey through history. Tokyo: Kodansha International, 2000. - INOUE, Mitsuo. Space in Japanese archtecture. New York: Weatherhill, 1985. - Kazuo, Nishi & Hozumi. What is japanese architecture? – A survey of traditional japanese architecture, with a list of sites and a map. Tokyo: Kodansha International, 2000. - Morse, Edward S. Japanese homes and their surroundings. Singapura: Tuttle Pub., 1972. - Tramontano, Marcelo. Novos modos de vida, novos espaços de morar. Paris, São Paulo, Tokyo. Uma reflexão sobre a habitação contemporânea. São Carlos, 1998. - Tramontano, Marcelo. Habitações, metróplois e modos de vida: por uma reflexão sobre a habitação contemporânea. Texto premiado no 3º Prêmio Jovens Arquitetos: Primeiro Lugar na categoria Ensaio Crítico. São Paulo: Instituto dos Arquitetos do Brasil – SP/ Secretaria de Estado da Cultura, 1998. - Filho, Cândido Malta Campos, Reinvente seu bairro – Caminhos para você participar do planejamento de sua cidade. São Paulo: Editora 34 Ltda., 2003. - KLICZKOWSKI, H.; Pequeños Espacios Urbanos. Barcelona: LOFT Publications, 2002 Periódicos: - GA Houses; - El Croquis; - JA Japan Architects; - Detail; - a+u; Sites: - www.archidaily.com.br Acesso: maio, 2012 - www.iwan.com Acesso: maio, 2012 - www.detail-online.com Acesso: maio, 2012 76


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