Metodos de investigação

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M  todos de Investiga     o PEDRO FERREIRA

Da Interrogação à Descoberta Científica

Doutorada em Gestão pela Universidade de Glamorgan (Reino Unido). Actualmente é Directora da Faculdade de Ciências da Economia e Empresa da Universidade Lusíada do Porto e da Universidade Lusíada de Vila Nova de Famalicão. Já participou, como orientadora e como membro de júri, em inúmeras dissertações de mestrado e teses de doutoramento. É coordenadora da linha de investigação de Gestão Empresarial do CLEGI - Centro Lusíada de Investigação e Desenvolvimento em Engenharia e Gestão Industrial e investigadora da Society for Human Resources Management (Estados Unidos da América). Publica em revistas científicas e participa regularmente em conferências internacionais. Consultora de empresas colabora regularmente com a William Battle Learning (Reino Unido) e a Real Consulting (Angola). Desde 2012 já ministrou mais de uma dezena de cursos de investigação científica no Instituto Superior Técnico Militar em Angola.

Doutorado em Economia pela Universidade de Santiago de Compostela (Espanha). Actualmente é Professor da Universidade Lusíada de Vila Nova de Famalicão e do ISAG – European Business School. Colaborou com outras instituições de ensino superior como o IPAM – The Marketing School, tendo assumido cargos de direcção no IPAM Aveiro e Editor da Revista Portuguesa de Marketing.

A curiosidade é o motor da descoberta. Qualquer trabalho de pesquisa começa por uma pergunta para a qual se pretende obter uma resposta. A distância que separa a dúvida inicial da resposta final pode-se tornar um caminho tortuoso, repleto de obstáculos e armadilhas.

Já orientou inúmeras dissertações de mestrado e lecciona Metodologia de Investigação Científica há 15 anos. É investigador do CLEGI - Centro Lusíada de Investigação e Desenvolvimento em Engenharia e Gestão Industrial e da Society for Human Resources Management (Estados Unidos da América). Os seus interesses estão ligados ao marketing e à gestão de recursos humanos, áreas onde tem publicado e participado em conferências científicas.

Este livro, dirigido a todos os estudantes de licenciatura, mestrado e doutoramento, mas também a jovens investigadores, pretende guiar o explorador neste caminho, contornando os obstáculos e evitando as armadilhas, através da correcta utilização dos métodos e ferramentas de pesquisa científica. Com uma abordagem pragmática e uma vertente muito prática este livro permitirá concluir com sucesso um trabalho de pesquisa científica, seja na forma de um trabalho de fim de curso, uma dissertação de mestrado, uma tese de doutoramento ou um artigo científico. Os métodos e as ferramentas são explicados de forma simples apoiadas pelos recentes softwares e ferramentas de pesquisa, tornando o trabalho de pesquisa um desafio.

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ELIZABETH REAL DE OLIVEIRA

Elizabeth Real de Oliveira Pedro Ferreira

Elizabeth Real de Oliveira Pedro Ferreira

Inclui ficheiros de apoio online ISBN 978-989-768-053-3

www.vidaeconomica.pt livraria.vidaeconomica.pt ISBN: 978-989-768-053-3 Tire as suas dúvidas connosco: facebook.com/livrometodosinvestigacao

9 789897 680533

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ÍNDICE Prefácio ............................................................................................................11 1. Introdução ....................................................................................................19 2. A natureza do trabalho científico .................................................................21 2.1. Protocolo de investigação ....................................................................21 2.2. Competências para a investigação .......................................................25 2.3. Tipos e organização dos trabalhos.......................................................28 3. Do tema ao problema de investigação ..........................................................39 3.1. Definição do tema de investigação ......................................................40 3.2. O problema de pesquisa ......................................................................42 4. Revisão de literatura .....................................................................................47 4.1. Pesquisar, selecionar e analisar informação .........................................52 4.1.1. As equações de pesquisa ................................................................59 4.1.2. Normas de referenciação ..............................................................62 4.1.3. Organizar, gerir e utilizar referências bibliográficas .....................66 4.2. Redigir a revisão de literatura ..............................................................68 4.2.1. Anotar e resumir as referências ....................................................71 4.3. Qual a extensão da revisão da literatura?.............................................76 5. Modelo de análise: a resposta ao problema...................................................79 5.1. Desenho do modelo e identificação das variáveis ................................80 5.2. Hipóteses e proposições de investigação .............................................86 6. Métodos de pesquisa .....................................................................................89 6.1. Abordagens..........................................................................................89 6.2. Métodos de pesquisa ............................................................................94 6.2.1. Estudo de caso .............................................................................96


ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 - Protocolo de investigação científica .................................................23 Figura 2 – Competências de pesquisa ...............................................................26 Figura 3 – Capacidades pessoais .......................................................................28 Figura 4 – Exemplo de agradecimentos ............................................................30 Figura 5 – Exemplo de resumo.........................................................................31 Figura 6 – Exemplo de lista de referências bibliográficas .................................36 Figura 7 – Como definir um tema....................................................................40 Figura 8 – Os princípios de um problema / questão de partida .......................44 Figura 9 – Relação tema-problema ...................................................................45 Figura 10 – Do problema às palavras-chave .....................................................49 Figura 11 – Página inicial da web of knowledge .................................................53 Figura 12 – Pesquisa efetuada na web of knowledge ..........................................54 Figura 13 – Página inicial do directory of open access journals .......................55 Figura 14 – Exemplo de visualização de resultados no DOAJ .........................56 Figura 15 – Página inicial do google académico ...............................................57 Figura 16 – Exemplo de pesquisa no google académico ...................................58 Figura 17 - Exemplos de equações de pesquisa .................................................60 Figura 18 – Avaliação das fontes de informação ..............................................61 Figura 19 – Exemplos de citações bibliográficas...............................................63 Figura 20 – Exemplos de tipos de fontes (listagem bibliográfica) .....................64 Figura 21 – Sistemas de referenciação mais comuns .........................................65 Figura 22 – Aspeto geral do programa EndNote® ...........................................67 Figura 23 – Aspeto geral do programa Mendeley®...........................................68 Figura 24 – Checklist para a redação da revisão de literatura...........................70

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PREFÁCIO Este livro é dedicado aos nossos estudantes. Aqueles que nos fazem querer descobrir novas formas de ensinar, de conhecer e de aprender com eles. E porque é dedicado a eles, a melhor forma de começar é contando três histórias de estudantes em fases diferentes do seu percurso: o Pedro, que já terminou o mestrado e abraçou um novo projeto que é a realização do doutoramento; a Cidália, que terminou recentemente a dissertação de mestrado e, à data da escrita deste prefácio, estava a aguardar marcação da apresentação e defesa do seu trabalho; finalmente, o Hugo, que se encontra a meio do processo de realização da sua dissertação de mestrado. Três histórias, contadas na primeira pessoa, que pretendem ilustrar dois aspetos essenciais que são o leitmotiv desta publicação: (1) A realização de um trabalho científico obedece a um conjunto de princípios e métodos que devem ser observados, dominados e aplicados. Sem eles, o trabalho científico não existe, os seus resultados não são válidos. A destreza no domínio destes princípios e métodos é, em boa medida, a base para um percurso menos atribulado e mais motivador. E é essa destreza que pretendemos ajudar o leitor a conquistar. (2) A realização de uma pesquisa científica é um caminho que deve ser percorrido, pelo menos em parte, pelo investigador

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de forma individual. É um pouco como o atleta que corre uma maratona: apesar de poder treinar com outros atletas e de ter a orientação de um treinador, a prova é feita de forma individual, sem ajudas ou apoio de ninguém. E esta “maratona” que é realizar um trabalho de pesquisa científica é recheado de obstáculos e dificuldades que é preciso ultrapassar. É comum, por isso, que surja o desânimo e a frustração. É também para ajudar a reduzir o impacto deste sentimento que escrevemos este livro. Vamos então às histórias, contadas na primeira pessoa: Pedro (estudante de doutoramento) “A aventura de desenvolvimento de uma dissertação de mestrado ou tese de doutoramento é muitas vezes tomada como o momento mais alto, a fotografia que, numa imagem de um segundo, retratará umas férias de 30 dias, toda a emoção, sentimento, presente do primeiro ao último minuto. Para mim, a minha tese era isso mesmo, tudo em um. A minha emoção, sentimento e orgulho pelo conhecimento que estava a absorver era tão grande e abrangente que eu queria fazer tudo, perpetuando numa dissertação todo o conhecimento e espírito crítico absorvido, com a frequência do Mestrado. Nesses momentos, o meu ritmo cardíaco era mais elevado, o meu metabolismo mais acelerado, de mim emanava o calor de uma emoção positiva que ajudava o meu balão de ar quente a levantar voo e a voar cada vez mais alto. Recordo que quanto mais alto estava o meu balão, mais eu queria subir, porque via mais longe (ainda que com menor definição), mas tudo fazia cada vez mais sentido. Nesta fase, eu trabalhava sozinho, descobria as minhas motivações e interesses, bem como o fascínio por algumas temáticas que ajudavam a definir a direção que queria tomar no futuro.

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1. INTRODUÇÃO “Se os jovens não aprendem da forma como lhes ensinamos, talvez seja o momento de os ensinarmos da forma como eles aprendem” Ignacio Estrada

Da experiência dos autores e da relação com os seus estudantes sabemos que os primeiros passos no trabalho de investigação científica são difíceis, sobretudo porque a definição de um problema inicial, associada ao desconhecimento e prática das tarefas inerentes ao trabalho de pesquisa, contribuem para criar um sentimento de desorientação e paralisação que, embora não sendo problemático, cria dificuldades em avançar e ganhar a confiança necessária para as etapas seguintes. Por outro lado, o trabalho científico é mentalmente exigente, desenvolvido muitas vezes individualmente e até em algum isolamento. Este é o contexto ideal para gerar desmotivação, frustração e alguma desorientação. O início pode, por isso, ser muitas vezes difícil e pouco encorajador. Um pouco como a dificuldade com que os amantes da astronomia se deparam quando querem observar as estrelas, identificando-as, assim como às constelações. O céu está repleto de estrelas que, a olho nu, mais não parecem que pontos luminosos. A dificuldade enfrentada é a identificação de todas estas estrelas e constelações. Parece não haver forma de o fazer, e a tarefa de um

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2. A NATUREZA DO TRABALHO CIENTÍFICO O trabalho científico tem uma natureza própria, sendo que a sua grande distinção relativamente a outros tipos de trabalho é o método de abordagem. No contexto de pesquisa científica não existem opiniões, apenas factos; o investigador deve ser isento e objetivo. Mas, acima de tudo, deve seguir um protocolo. Independentemente de se tratar de uma dissertação de mestrado, tese de doutoramento ou de um artigo científico, os passos a serem dados devem respeitar um protocolo de investigação.

2.1. Protocolo de investigação A investigação científica é um processo de inquérito sistemático que visa fornecer informação para a resolução de um problema ou resposta a questões complexas. Para tal, os investigadores recorrem a um protocolo, composto por um conjunto de etapas sucessivas e interligadas, que permitem, a partir da definição de um problema de partida, desenvolver um conjunto de tarefas que visam chegar a conclusões sobre a questão inicialmente colocada. Este protocolo obedece a um conjunto de princípios, entre os quais se encontram os seguintes:

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- Natureza lógica: as etapas do protocolo têm uma sequência que deve ser observada; - Especificidade: cada etapa é composta por um conjunto de tarefas / atividades; - Caracter dinâmico: apesar de obedecer a uma lógica e especificidade, o espírito crítico do investigador deve permitir alguma flexibilidade, de modo a que a realização de cada etapa possa ser reavaliada se necessário. A elaboração de trabalhos académicos – trabalho curricular, monografia (trabalho ou relatório de fim de licenciatura), dissertação ou tese – constitui uma componente fundamental de qualquer programa de estudos que vise a obtenção de um grau académico (licenciatura, mestrado ou doutoramento). Deste modo, a aquisição de aptidões necessárias à realização de trabalhos académicos é essencial. Quando inicia o seu trabalho, o estudante é confrontado com o protocolo de investigação científica (ver figura 1), onde cada etapa representa um desafio e exige aquisição de novas competências.

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2. A natureza do trabalho científico

Figura 1 - Protocolo de investigação científica

Este protocolo pode ser entendido como uma escada de passos sequenciais que terão obrigatoriamente de ser dados na prossecução de determinado tipo de investigação. Alguns destes degraus serão mais aprofundados do que outros, dependendo do tipo de trabalho em causa. Pela sua complexidade, por vezes, nesta “escada” devemos voltar atrás, descendo um ou mais degraus, para podermos avançar. Isto aplica-se especialmente até ao terceiro degrau, onde se apresenta a potencial solução para o nosso problema (modelo de análise). A partir deste momento e quando se inicia a recolha de dados dificilmente poderemos voltar atrás, pois coloca-se em causa a própria metodologia adotada até ao momento.

1. Definição do problema O problema é o ponto de partida. Identifica claramente o que se pretende estudar. O problema consiste em apresentar aquilo a que

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3. DO TEMA AO PROBLEMA DE INVESTIGAÇÃO Quando não se sabe para se onde vai, nunca se vai muito longe

Goethe (escritor e pensador alemão)

A escolha do tema para uma dissertação ou tese é uma tarefa crucial, na medida em que vai determinar todo o percurso do trabalho de pesquisa. Deste modo, a escolha do tema não pode ser encarada de ânimo leve. É necessário dedicar-lhe tempo e alguma dedicação, pois decisões futuras, ao longo do processo de pesquisa, vão estar associadas a esta primeira escolha ou decisão. Por outro lado, há um equívoco recorrente relativamente à escolha do tema, que se traduz na confusão entre o tema e a definição do problema. Não raras vezes, a definição do tema dá a sensação que o problema está automaticamente definido, o que não é, de todo, verdadeiro. Pode-se dizer que o tema é a área, ou assunto, na qual se pretende desenvolver o estudo. O problema é o aspeto do tema que se pretende ver esclarecido. Deste modo, a definição do tema é apenas o primeiro passo para a definição do problema.

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3.1. Definição do tema de investigação Para identificar um tópico para a investigação, deve-se começar por pensar na área de interesse do investigador. De seguida, é importante refletir e explorar as diversas possibilidades dentro dessa área, recolher toda a informação que pareça interessante e útil e por fim listar e definir quais os conceitos chave associados. Na figura seguinte encontra-se uma sugestão dos passos a seguir para a definição do tema de investigação. Figura 7 – Como definir um tema Fase Ponto de partida

Objetivos

Tarefas

Identificar uma área Refletir e explorar possibilide investigação para o dades; trabalho científico. Falar com possíveis orientadores sobre as ideias que possui ou para obter sugestões; Levantamento de temas de relevo para a Faculdade/Centro de Investigação da área Interesses profissionais que o investigador possa ter.

Fontes e recursos de Identificar: informação - investigação teórica e empírica já realizada sobre o tema; - questões / hipóteses já formuladas sobre o tema; - os principais métodos utilizados para tratar o tema.

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Recolher bibliografia que possa parecer interessante ou útil; Listar e definir conceitos e palavras chave; Listar os métodos e instrumentos mais utilizados; Analisar as recomendações de trabalhos futuros na literatura sobre o tema.


4. REVISÃO DE LITERATURA A revisão da literatura apresenta uma análise crítica aos estudos e trabalhos que foram publicados ou disponibilizados sobre o tema específico da investigação. É o capítulo da tese, dissertação, relatório de projeto ou outro trabalho académico ou de investigação que: – sumaria, sintetiza e critica a literatura afim ao tema em estudo; – apresenta a génese e a evolução histórica do problema em foco, contextualiza os respetivos constructos teóricos e examina a investigação relacionada; – discute informação publicada sobre a área temática em que se insere a questão de estudo e/ou sobre a evolução dessa área ao longo de um determinado período de tempo. Os objetivos da revisão da literatura são: – Clarificação das ideias sobre tema; – Definição mais precisa do tema; – Identificação da relevância do tema para a comunidade científica; – Apresentação do estado da arte sobre o tema, principais autores e correntes de pensamento; – Identificação das variáveis fundamentais;

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– Perceção sobre se não se tratará de um tema já devidamente estudado. O conteúdo deste capítulo do trabalho da dissertação ou tese consiste na avaliação de vários textos científicos (fontes de informação), por exemplo, artigos, relatórios técnicos ou de investigação, ensaios ou monografias, entre outros, e envolve, habitualmente, a execução de duas tarefas: a elaboração da ficha de leitura e a avaliação crítica do material consultado. O levantamento bibliográfico começa com a seleção de palavras-chave, que são um conjunto de termos através dos quais o autor considera que pode encontrar as fontes que lhe interessam. O desenvolvimento da revisão de literatura é um processo dinâmico, envolvendo várias tarefas que, apesar de se realizarem sequencialmente, requerem constante reavaliação e, não raras vezes, repetição. O ponto de partida para uma revisão de literatura são a questão de investigação e os objetivos delineados. São estes que permitem definir os parâmetros de pesquisa bem como as palavras-chave que serão utilizados nos motores de pesquisa. Este processo, depois da obtenção e avaliação crítica dos primeiros resultados, deverá ser repetido. A partir dos resultados relevantes e da sua leitura poder-se-ão definir novos parâmetros e novas palavras-chave, com o objetivo de obter informação mais detalhada sobre os temas em estudo. A próxima figura apresenta de forma esquemática este processo. Uma revisão abrangente envolve essencialmente quatro passos: (1) Identificar palavras-chave. A primeira tarefa a realizar é elaborar uma lista de expressões ou palavras-chave relacionadas com o tópico da investigação que permitam a pesquisa nas bases de dados e nos motores de busca. Estas palavras-chave resultam habitualmente da análise e reflexão sobre o tema e o problema previamente definidos. Por exemplo:

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5. MODELO DE ANÁLISE: A RESPOSTA AO PROBLEMA Qualquer projeto de pesquisa, que se inicia com uma questão de partida, deverá chegar a uma resposta ou solução. O modelo de análise ou modelo conceptual representa essa solução. Na medida em que a pesquisa científica implica conhecer uma realidade para além do óbvio, o modelo de análise representa a complexidade das relações que se estabelecem entre as partes que constituem a solução do problema. O modelo de análise ou modelo conceptual é o esquema orientador da conceção teórica que identifica os aspetos que influenciam a situação que está a ser investigada. E organiza de forma lógica e integradora as diversas variáveis e a dinâmica da situação a ser investigada. Deste modo, o modelo de análise resulta do conhecimento adquirido pela consulta e exploração de trabalhos científicos anteriores, sendo sustentado nas descobertas e conclusões destes estudos científicos prévios. Finalmente, o modelo de análise tem igualmente uma função no processo de investigação. Se a questão de partida permitiu delimitar o tema em estudo, nomeadamente orientando a pesquisa bibliográfica de estudos científicos relacionados com o tema, o modelo de análise tem por função orientar as etapas seguintes do protocolo de pesquisa. Especificamente, o modelo de análise tem como função

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orientar a construção dos métodos e das técnicas de pesquisa e a recolha de dados, bem como orientar a forma como os dados serão analisados e interpretados.

5.1. Desenho do modelo e identificação das variáveis Na medida em que o modelo de análise representa de forma lógica e integrada as partes que compõem a resposta ao problema, é importante identificar as componentes constituintes do modelo, habitualmente conceitos ou variáveis. Uma variável é uma característica observável de um objeto ou indivíduo suscetível de adotar diferentes valores ou de ser expressa em categorias. A identificação das variáveis deve resultar da revisão de literatura efetuada no passo anterior. São os estudos analisados na revisão de literatura que permitem definir o modelo de análise, as suas partes constituintes, nomeadamente os conceitos ou variáveis. Qualquer modelo de análise deve apresentar uma representação gráfica. Mesmo não sendo apresentado em esquema, deve ser possível realizar essa representação a partir da sua descrição textual. Atente-se no seguinte exemplo: “O presente estudo visou investigar se fatores de personalidade (traço de ansiedade e padrão tipo A) e fatores da organização do trabalho (significado do trabalho, perceção de controle e suporte da chefia) são preditores do burnout e suas dimensões” (Souza e Silva, 2002). Este excerto do artigo “A influência de fatores de personalidade e de organização do trabalho no burnout em profissionais de saúde” (Souza e Silva, 2002) apresenta uma descrição do modelo de análise

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5. Modelo de análise: a resposta ao problema

que serviu de base ao estudo. Neste exemplo podemos identificar as principais variáveis (ou conceitos): “O presente estudo visou investigar se fatores de personalidade (traço de ansiedade e padrão tipo A) e fatores da organização do trabalho (significado do trabalho, perceção de controle e suporte da chefia) são preditores do burnout e suas dimensões” (Souza & Silva, 2002). Graficamente, este modelo poderia ser representado da seguinte forma: Figura 27 – Exemplo de modelo de análise

Fatores de personalidade Burnout Fatores da organização do trabalho Fonte: Adaptado de Souza e Silva (2002)

Contudo, se atentarmos na descrição do modelo, os fatores de personalidade e os fatores da organização do trabalho são subdivididos em vários elementos: “O presente estudo visou investigar se fatores de personalidade (traço de ansiedade e padrão tipo A) e fatores da organização do trabalho (significado do trabalho, perceção de controle e suporte da chefia) são preditores do burnout e suas dimensões” (Souza & Silva, 2002)

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6. MÉTODOS DE PESQUISA Os métodos de pesquisa são o conjunto de procedimentos lógicos da investigação empírica, envolvendo a seleção de técnicas de recolha e tratamento da informação adequadas, bem como o controlo da sua utilização.

6.1. Abordagens Em termos de abordagem ao problema e à realidade em estudo, numa pesquisa pode-se optar por três tipos de abordagem, que podem ser classificados de qualitativos, quantitativos ou mistos. A abordagem quantitativa, de origem positivista, define-se por favorecer o desenvolvimento de pesquisas orientadas para a procura de factos e/ou causas dos fenómenos; afirma-se, por isso, como uma abordagem objetiva. A abordagem quantitativa privilegia a dedução, isto é, a partir de pressupostos gerais aplica-os a uma realidade concreta e particular. O objetivo desta abordagem é estabelecer e provar relações entre variáveis que são definidas de forma operacional, isto é, de forma a poderem ser quantificadas direta ou indiretamente. Assim, a mensuração é uma característica fundamental da abordagem quantitativa. A mensuração é possível pela divisão da realidade em unidades passíveis de serem medidas e estudadas isoladamente.

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Deste modo, esta abordagem envolve manipulação de variáveis e até mesmo tratamento experimental. Neste contexto, os dados obtidos numa pesquisa quantitativa são habitualmente quantitativos e estruturados, ou seja, os resultados obedecem a um padrão previamente definido, quer pela operacionalização das variáveis, quer pelos instrumentos de pesquisa. Já a abordagem qualitativa, de origem construtivista, advoga que os fenómenos são melhor compreendidos quando enquadrados no contexto em que ocorrem. Deste modo, o foco incide na compreensão dos significados atribuídos pelos sujeitos às suas próprias ações. É, por isso, uma abordagem interpretativa e subjetiva, que privilegia a indução, ou seja, a explicação de fenómenos particulares como forma de perceber o geral. Neste tipo de abordagem, mais ajustado a questões sobre o “como” e o “porquê” das coisas, as questões de pesquisa são mais amplas porque a visão dos fenómenos é também mais holística. Quer isto dizer que este tipo de pesquisa tem em conta todos os componentes de uma situação ou fenómeno, suas interações e interinfluências, não compartimentando e isolando a realidade como é característico da abordagem quantitativa. Do ponto de vista da condução da pesquisa, a abordagem qualitativa não apresenta uma forma rígida e estruturada, obrigando a uma maior recolha de dados com formatos e origens diferentes. Os dados obtidos são qualitativos, semiestruturados ou mesmo não estruturados.

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7. TÉCNICAS DE RECOLHA DE DADOS O conhecimento científico constrói-se com base na realidade, nos factos. Qualquer problema é identificado e formulado tendo por referência a realidade. Do mesmo modo, qualquer solução deve ser testada e verificada na realidade pelos factos. Por isso, uma das fases imprescindíveis do processo de pesquisa, no caminho do problema à solução, é a recolha de dados. No entanto, o tipo de dados a recolher depende, em grande medida, dos métodos de pesquisa selecionados. O teste da solução avançada no modelo de análise faz-se através da observação. É aqui que se inicia o contacto direto com a realidade e com os factos: o trabalho de campo. A finalidade do trabalho de campo é recolher dados mediante a utilização de métodos e ferramentas de recolha de dados padronizados. O leque de ferramentas que permitem recolher dados da realidade é muito diverso. Uma classificação simples, proposta por Bravo (2001), divide as ferramentas em três grupos, como se apresenta de seguida:

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Figura 42 – Classificação das formas de observação Simples Observação Direta Experimental

Observação Documental

Entrevista Observação com recurso a inquérito

Questionário Focus Group

Fonte: adaptado de Bravo (2001)

Na observação direta, o investigador faz uso dos seus sentidos para apreender e registar a realidade. Se os acontecimentos espontâneos acontecem naturalmente, a observação é simples. Caso a observação seja condicionada ou provocada pela intervenção do investigador, a observação é experimental. Neste último caso, o acontecimento observado é artificial e exige alguma preparação e controlo das condições por parte do investigador. A observação documental baseia-se na análise de documentos, atuais ou históricos, de todo o género, desde que contenham informação, atual ou passada, sobre acontecimentos relevantes para a investigação.

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8. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOS Qualquer trabalho científico baseia-se na observação da realidade. É esta observação que permite recolher informação com vista a testar a potencial solução (modelo de análise) avançada como resolução do problema inicial. Deste modo, chega o momento em que é necessário apresentar a informação recolhida durante o trabalho de campo. Nesta fase, e depois de ter recolhido muita informação, é habitual gerar-se alguma desorientação e dificuldade em selecionar a informação e organizá-la para que a sua leitura seja percetível. Para evitar esta situação é fundamental seguir alguns passos.

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Figura 53 – Passos a seguir para definir o plano de análise de dados Passos

Descrição

Passo 1 Relembrar o problema e objetivo do trabalho

A primeira fonte de orientação da análise e interpretação dos dados é o motivo pelo qual se começou a fazer o trabalho. A análise e organização dos dados deve responder prioritariamente ao problema inicial.

Passo 2 Analisar o modelo de análise desenvolvido

O modelo de análise oferece a informação detalhada sobre as variáveis usadas, as relações criadas e a representação das hipóteses. É por isso uma fonte importante de hierarquização da informação que será necessário analisar e apresentar.

Passo 3 As hipóteses são um elemento fundamental da análise e interAnalisar as hipóteses pretação de dados, pois não só contêm as variáveis que deverão de investigação ser analisadas, como esclarecem a relação entre elas. Uma das funções das hipóteses é precisamente dar indícios das técnicas de análise de dados (nomeadamente técnicas estatísticas) a utilizar. Passo 4 Alinhar os dados com os métodos utilizados

Este passo é decisivo para idealizarmos a forma de apresentação dos dados. Por exemplo, se o trabalho de pesquisa seguiu uma abordagem extensiva e, por isso, quantitativa, será necessário usar elementos gráficos estatísticos (como gráficos e tabelas).

Passo 5 Nesta fase, e depois de passar pelos quatro passos anteriores, estão Desenvolver o plano reunidas as condições para planificar a organização e apresentação de análise de dados dos dados. O ideal é desenvolver um pequeno índice que estruture a sequência de apresentação e análise da informação. Este índice deve ser acompanhado por uma descrição tão detalhada quanto possível de cada um dos tópicos. Deve ainda incluir as especificações dos dados que serão utilizados em cada tópico e o formato em que vão ser apresentados.

8.1. Apresentação dos dados A apresentação dos dados depende do tipo de informação recolhida. Em estudos extensivos ou laboratoriais, onde os dados são sobretudo quantitativos e estatísticos, as tabelas e gráficos são os suportes mais usuais. Ao contrário, em estudos intensivos, que implica recorrer a dados e técnicas de recolha mais diversificadas, a diversidade dos formatos é a nota dominante. Estudos com uma orientação qualitativa fazem sobretudo uso de tabelas, esquemas e mapas. 128


9. CONSIDERAÇÕES FINAIS: DIMENSÃO ÉTICA DO TRABALHO CIENTÍFICO O trabalho de investigação científica segue um conjunto de pressupostos que foram expostos ao longo deste manual. Estes funcionam como base da produção de conhecimento no âmbito da ciência e traduzem-se no protocolo de pesquisa. A importância de seguir este protocolo é tal que a relevância e a qualidade de um trabalho científico são aferidas sobretudo pelo método seguido. O trabalho do investigador exige atenção a duas dimensões essenciais: a dimensão técnica e a dimensão ética. A primeira engloba todos os métodos e ferramentas à disposição do investigador para concretizar o trabalho de pesquisa científica. Foram estes métodos e ferramentas que foram abordados ao longo deste manual. A segunda, a dimensão ética, está essencialmente relacionada com a atitude, postura e comportamento do investigador face ao seu trabalho, às fontes que utiliza, aos dados que recolhe e às conclusões que formula. Exige-se ao investigador um apurado sentido ético e um cuidado na utilização dos métodos e ferramentas disponíveis. Esta honestidade intelectual e científica traduz-se na blindagem da investigação aos valores pessoais do investigador. Este princípio concretiza-se na prática da objetividade pela escolha dos métodos de investigação e

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pela forma como os dados são interpretados, de modo a não favorecer os seus valores ou tendência ideológica. Por outro lado, a honestidade intelectual e científica também se põe em prática pela clareza e transparência na utilização de fontes de informação. O trabalho científico, como ficou patente ao longo deste manual, baseia-se sempre no avanço do conhecimento alicerçado no conhecimento já existente. Deste modo, a referência a teoria e estudos publicados é uma constante, sobretudo na revisão da literatura, mas também na discussão dos dados. É por isto que a indicação das fontes e dos autores das ideias que servem de base a um trabalho de pesquisa são absolutamente fundamentais. Por um lado, permitem demonstrar a atualidade do conhecimento que serve de base ao trabalho de pesquisa; por outro, permite ao leitor retomar ou revisitar a informação na sua fonte original. A utilização de informação e fontes produzidas por terceiros sem a devida referenciação é denominada de plágio. Como em outros meios, esta prática é altamente penalizadora no contexto académico. Para além de existirem penalizações legais associadas a esta prática, a comunidade académica rejeita de forma veemente toda e qualquer prática de plágio. No contexto de trabalhos académicos, produzidos no âmbito das instituições de ensino superior, o plágio é penalizado com reprovação, processos disciplinares e mesmo expulsão da universidade. Muitas instituições chegam mesmo a acionar judicialmente os prevaricadores. Este problema tem sido encarado pelas universidades de forma muito séria, nomeadamente pelo investimento em programas informáticos de deteção de plágio e criação de comissões de ética e antiplágio, de modo a combater e prevenir este tipo de infração.

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BIBLIOGRAFIA

Baranano, A. M. (2004). Métodos e Técnicas de Investigação em Gestão. 1ª Edição. Lisboa: Edições Sílabo. Barcells, J. P. e Martin, J. L. F. (1985). Os métodos no ensino universitário. Lisboa: Livros Horizonte, Col. B.E.P. Brakus et al (2009) Brand Experience: What is it? How do we measure it? And does it affect loyalty?. Journal of Marketing, 73(3), 52-68. Branski, R. M., Franco, R. A.C., e Lima Jr, O. F. (2010). Metodologia de estudo de casos aplicada à logística. In XXIV Congresso de Pesquisa e Ensino em Transportes (XXIII ANPET). Bravo, M.P. e Eisman, L. (1998). Investigación Educativa. 3ª Ed. Sevilha: Ediciones Alfa. Bravo, R.S. (2001). Técnicas de Investigación Social. Teoria y Ejercicios, 14ª ed., Madrid: Thomson Learning. Brewer, J. e Hunter, A. (1989). Multimethod research: A Synthesis of styles. Newbury Park, CA: Sage. Carvalho, A. (2005) A Gestão da Flexibilidade no Emprego através da Gestão de Recursos Humanos: o caso das grandes consultoras de gestão, Universidade do Minho, Escola de Economia e Gestão (não publicado). 139


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Da Interrogação à Descoberta Científica

Doutorada em Gestão pela Universidade de Glamorgan (Reino Unido). Actualmente é Directora da Faculdade de Ciências da Economia e Empresa da Universidade Lusíada do Porto e da Universidade Lusíada de Vila Nova de Famalicão. Já participou, como orientadora e como membro de júri, em inúmeras dissertações de mestrado e teses de doutoramento. É coordenadora da linha de investigação de Gestão Empresarial do CLEGI - Centro Lusíada de Investigação e Desenvolvimento em Engenharia e Gestão Industrial e investigadora da Society for Human Resources Management (Estados Unidos da América). Publica em revistas científicas e participa regularmente em conferências internacionais. Consultora de empresas colabora regularmente com a William Battle Learning (Reino Unido) e a Real Consulting (Angola). Desde 2012 já ministrou mais de uma dezena de cursos de investigação científica no Instituto Superior Técnico Militar em Angola.

Doutorado em Economia pela Universidade de Santiago de Compostela (Espanha). Actualmente é Professor da Universidade Lusíada de Vila Nova de Famalicão e do ISAG – European Business School. Colaborou com outras instituições de ensino superior como o IPAM – The Marketing School, tendo assumido cargos de direcção no IPAM Aveiro e Editor da Revista Portuguesa de Marketing.

A curiosidade é o motor da descoberta. Qualquer trabalho de pesquisa começa por uma pergunta para a qual se pretende obter uma resposta. A distância que separa a dúvida inicial da resposta final pode-se tornar um caminho tortuoso, repleto de obstáculos e armadilhas.

Já orientou inúmeras dissertações de mestrado e lecciona Metodologia de Investigação Científica há 15 anos. É investigador do CLEGI - Centro Lusíada de Investigação e Desenvolvimento em Engenharia e Gestão Industrial e da Society for Human Resources Management (Estados Unidos da América). Os seus interesses estão ligados ao marketing e à gestão de recursos humanos, áreas onde tem publicado e participado em conferências científicas.

Este livro, dirigido a todos os estudantes de licenciatura, mestrado e doutoramento, mas também a jovens investigadores, pretende guiar o explorador neste caminho, contornando os obstáculos e evitando as armadilhas, através da correcta utilização dos métodos e ferramentas de pesquisa científica. Com uma abordagem pragmática e uma vertente muito prática este livro permitirá concluir com sucesso um trabalho de pesquisa científica, seja na forma de um trabalho de fim de curso, uma dissertação de mestrado, uma tese de doutoramento ou um artigo científico. Os métodos e as ferramentas são explicados de forma simples apoiadas pelos recentes softwares e ferramentas de pesquisa, tornando o trabalho de pesquisa um desafio.

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ELIZABETH REAL DE OLIVEIRA

Elizabeth Real de Oliveira Pedro Ferreira

Elizabeth Real de Oliveira Pedro Ferreira

Inclui ficheiros de apoio online ISBN 978-989-768-053-3

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