IVM corredores v2 18-10-2011

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Institut pour la Ville en Mouvement Estudo da visão da mobilidade em grandes cidades Cidade: São Paulo, Brasil Tema: Transporte público – acesso e prioridade | 10-10-2011 Eduardo Alcântara de Vasconcellos Adolfo Mendonça

Coordenador: Eduardo Alcântara de Vasconcellos, Instituto Movimento

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Sumário 1. Oferta do transporte público no Brasil..................................................3 2. O acesso econômico ao transporte público............................................5 3. Oferta de transporte público na cidade de São Paulo............................6 4. A prioridade na circulação dos ônibus..................................................7 4.1. Brasil........................................................................................................................ 7 4.2. Região Metropolitana de São Paulo..........................................................................8

5. Visão dos “stakeholders”.......................................................................9 6. Visão do problema na mídia.................................................................11 7. Conclusões...........................................................................................12 Referências..............................................................................................14

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1. Oferta do transporte público no Brasil Apesar do sistema de transporte por ônibus ser regulamentado pelo estado, muitas cidades brasileiras têm serviços informais em operação cotidiana. Os dados gerais da oferta de transporte público nas suas várias formas (ônibus, vans, táxis) nas cidades brasileiras (e não apenas nas médias ou grandes) mostram que a informalidade está presente na maioria das cidades, em alguns casos de forma dominante no contexto local. A figura 1 resume a oferta em todos os municípios. Observa-se que o serviço mais ofertado (com um mínimo de 70% dos municípios) é o táxi e o menos ofertado (existente em poucas cidades) é o metrô. Nos maiores municípios a oferta de táxi é superior a 100% dos municípios, uma vez que alguns têm serviços formais e informais. As vans e o moto-táxi também têm presença significativa (maiores que a dos ônibus). Figura 1 Oferta de serviços de transporte público por classe de população, Brasil, 2005.

Fonte: IBGE, 2005.

A tabela 1 resume a oferta de modos por ordem decrescente. Pode-se ver que o táxi é a forma mais universal de transporte disponível ao público, embora seu preço seja muito mais elevado do que os demais sistemas. Vans e moto-táxis estão presentes, respectivamente, em 60% e 50% dos municípios brasileiros. Os ônibus – a principal forma de transporte público – estão presentes em 1407 municípios (25% do total), ao passo que os barcos atendem pessoas em 11% dos municípios. Os modos sobre trilhos são naturalmente mais restritos, embora no conjunto transportem uma quantidade elevada de passageiros.

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Tabela 1 Oferta de modos de transporte público, 2005 Modo Táxi Vans Moto-táxi Ônibus Barco Trem Metro

Municípios 4.476 3.288 2.770 1.407 616 105 11

% total 80,4 59,1 49,8 25,3 11,1 1,9 0,2

Fonte: IBGE, 2005.

Separando os modos coletivos vans e ônibus – que transportam a maior parte das pessoas – pode-se fazer uma análise mais acurada (figura 2). Pode-se verificar que as vans estão presentes em um número maior de municípios até a população de 100 mil pessoas, quando o ônibus passa a ser dominante. Figura 2 Oferta de serviços de vans e ônibus, Brasil, 2005.

Fonte: IBGE, 2005.

Informalidade no transporte público A porcentagem de municípios que têm algum serviço de transporte coletivo informal, ou seja, sem regulamentação, é elevada. A informalidade existe em todas as faixas de população, mas é maior na faixa entre 10 e 20 mil habitantes. Os serviços com maiores graus médios de informalidade são a moto-táxi e o táxi. Características do transporte público nas cidades médias e grandes A demanda do transporte público urbano no Brasil mostra tendências de queda a partir da década de 1990. A figura 3 mostra a queda nas viagens de ônibus de um conjunto de cidades médias e grandes do Brasil, no período entre 1992 e 1995. Na figura nota-se que a demanda real caiu, em 2005, a 92% da demanda de 1992. Se a taxa de viagens em ônibus por habitante verificada em 1992 fosse mantida nos anos seguintes, a demanda deveria subir para 118% da 4 / 14


demanda de1992 (para manter a participação relativa no mercado). Isto significa que a perda de demanda dos sistemas de ônibus destas cidades foi de 26%. Quando se considera o conjunto de cidades acima de 60 mil habitantes (conjunto considerado pelo sistema de informação da ANTP), isto significou uma perda acumulada no período de 16 bilhões de passageiros. Considerando a tarifa média atual destas cidades em 2009 (R$ 1,8) esta perda alcançou R$ 30 bilhões para o transporte por ônibus. Figura 3 Viagens de ônibus em cidades médias e grandes selecionadas, 1992-2005

Fonte: ANTP, 2007.

Outra forma de visualizar o fenômeno é comparar a distribuição modal das viagens nas metrópoles do Brasil, entre 1977 e 2007. A participação do transporte público no total de viagens motorizadas baixou de 67% em 1977 para 51% em 2005 (BARAT, 1978 e ANTP, 2007).

2. O acesso econômico ao transporte público A maioria dos usuários de ônibus no Brasil tem renda baixa. O usuário é, portanto, cativo desta forma de transporte. Com o período de altos índices de inflação da década de 1980 a necessidade de constante aumento nas tarifas tornou-se politicamente inviável, tendo surgido uma forma de aliviar o problema – o “vale transporte” (VT). O VT, implantado em 1985 em caráter facultativo foi tornado obrigatório em 1987. Ele obriga os empregadores a fornecer aos seus empregados os bilhetes necessários ao seu deslocamento, cobrando destes no máximo 6% do seu salário. Os sindicatos dos trabalhadores controlam a concessão do VT e, portanto, não há conflitos sérios a respeito do tema. O empregador, em troca, tem direito a descontos no seu imposto de renda. O VT vem sendo utilizado no Brasil por cerca de 40-50% dos usuários, o que significa que pelos menos metade dos usuários não tem o benefício e precisa pagar o valor total da tarifa.

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A criação do vale-transporte (VT) teve um grande impacto, após um começo tímido: implantado em 18 capitais, foram comercializados apenas 25 milhões de vales eram comercializados, dentro de uma demanda potencial de 450 milhões. Após a definição da sua obrigatoriedade a demanda subiu muito. A tabela 2 mostra os dados. Pode-se ver que o uso do VT cresceu bastante entre 1989 e 1992 e de forma mais comedida entre 1992 e 2005. Entre 2005 e 2010 houve tendência de queda no uso do VT. Ao mensurar o impacto entre os usuários deve ser considerado que uma parte dos que não usam o VT são estudantes – que têm desconto de 50% na maioria dos sistemas – idosos, que desde 1998 têm direito ao uso grátis do transporte coletivo urbano e outras pessoas em condições especiais, como os portadores de deficiência física, que têm descontos em algumas cidades. Assim, pode-se afirmar que cerca de 50% dos usuários ou não pagam ou têm descontos, o que mostra que 50% deles continua pagando o preço total da tarifa. Considerando o aumento das tarifas acima da inflação isto representa um grande peso no orçamento da maioria deles. Tabela 2 Uso do vale transporte em doze capitais brasileiras Capitais

% dos passageiros 1989

1992

2005

2010

Aracaju Belo Horizonte Curitiba Fortaleza Goiânia Porto Alegre Recife Salvador São Paulo Vitória

29 38 35 41 37 39 38 37 12 28

32 50 50 27 55 42 37 41 28 49

51 50 37 41 43 55 49 37 32 41

50 49 45 41 34 38 46 26 35 35

Média simples

33,2

41,8

43,9

39,9

Fonte: Cadaval, 1993 e NTU, 2010.

3. Oferta de transporte público na cidade de São Paulo Os serviços de ônibus na Região Metropolitana de São Paulo - RMSP são realizados por três grandes sistemas. O principal sistema funciona na cidade de São Paulo e em 2007 era composto por cerca de 12.000 ônibus e micro-ônibus. O segundo maior sistema realiza a interligação entre municípios, com cerca de 4.000 ônibus. O terceiro corresponde à soma de todos os sistemas de ônibus locais localizados fora da cidade de São Paulo, abrangendo 4.000 ônibus. Para os habitantes da periferia, que dependem deste transporte, as distâncias médias percorridas aumentaram, visto que o sistema de ônibus não se expandiu no mesmo ritmo. Ademais, controles tarifários rígidos e a inflação alta levaram os operadores a 6 / 14


constantemente adaptar a oferta para garantir os lucros, muitas vezes em detrimento da freqüência dos serviços e limitando o atendimento de áreas de baixa densidade. Assim, embora a oferta física seja quase universal, o sistema de ônibus é precário, caracterizado por serviços irregulares, pouco confiáveis e desconfortáveis, além de um número insuficiente de integrações. Além de problemas com a oferta dos serviços, os usuários passaram a enfrentar problemas no trânsito cada vez mais congestionado. As vias arteriais não possuíam nenhum aparato físico ou operacional que facilitasse a circulação de ônibus, tampouco uma gestão de trânsito especial para aprimorar sua operação. O contraste com o transporte privado tornou-se nítido, reforçando a imagem negativa do ônibus em contraposição à do automóvel. Em 1997, havia grande diferença de qualidade entre a viagem feita por meio do transporte público (tempo médio de 57 minutos) e aquela feita em automóveis (tempo médio de 27 minutos);

4. A prioridade na circulação dos ônibus 4.1. Brasil A tabela 3 mostra a extensão dos corredores existentes no Brasil em 1997 e sua relação com o sistema viário das cidades. Observa-se que os corredores (em sua totalidade) usavam apenas 0,7% do comprimento das vias das cidades. Considerando apenas as vias nas quais os ônibus circulam, o valor é de apenas 4,4% do comprimento disponível. Estes valores tornam claro que no Brasil não há um grande sistema de prioridade ao transporte público por ônibus. A imagem transmitida pelo país no plano internacional pode ser justificar apenas pelo caso de Curitiba. Tabela 3 Extensão dos corredores em relação ao sistema viário, 2007 Cidade

Extensão (Km)

% do sistema viário total

% das vias usadas pelo T. Público

Belo Horizonte Campinas Curitiba Fortaleza Goiânia Manaus Porto Alegre Recife Rio de Janeiro RMSP

32 18,8 72 4 15 34 46,5 10 15 139,7

0,8 0,8 1,7 0,1 0,6 1,0 1,5 0,3 0,2 0,7

4,5 4,6 9,8 0,5 3,3 5,7 8,5 1,7 1,0 4,0

Total ou média

387

0,7

4,4

Fonte: ANTP, 2007. 7 / 14


4.2. Região Metropolitana de São Paulo A região metropolitana de São Paulo, a maior do Brasil, teve um histórico rico relativo aos corredores de ônibus, que ao final gerou impactos muito pequenos. Já na década de 1970 a crise do petróleo contaminou os planos gerais de transporte, gerando uma série de recomendações para a garantia da circulação prioritária dos ônibus. Em 1980 ocorreu a primeira implantação, de um corredor relativamente curto (Paes de Barros), que fazia parte de uma infra-estrutura mais ambiciosa, que nunca se concretizou. O processo passou por um momento importante com a implantação em 1988 do corredor do ABD, cruzando os municípios de São Paulo, São Bernardo do Campo, Santo André e Diadema, e que até hoje é um dos melhores do Brasil. Na mesma época (1987) foi inaugurado o corredor 9 de Julho Santo Amaro, que gerou grande debate em função do seu possível impacto na deterioração do uso do solo lindeiro, tornando-se um exemplo negativo que esfriou o ânimo das autoridades para implantar novos corredores. Apenas na década de 2000 a prefeitura do município de São Paulo mudou o cenário, implantando grande quantidade de corredores, mas que ficaram limitados em seu potencial pela falta de espaço de ultrapassagem entre ônibus e de reorganização da oferta, ocasionando baixos níveis de produtividade. Pode-se concluir pela análise do caso que a política pública de priorização do transporte por ônibus na região mostrou-se ao final extremamente tímida, limitada pela oposição das elites e da classe média usuária de automóvel, pela oposição dos operadores temerosos de queda na sua lucratividade e pela falta de espaço físico para implantar esquemas de alta prioridade para os ônibus sem causar grandes prejuízos aos usuários de automóvel. A tabela 4 resume a história dos corredores.

Pass./ Dia útil

Pass./ Hora de pico

Ano

MSP

Paes de Barros 9 de Julho/Santo Amaro Cachoeirinha Itapecerica Pirituba/São João Guarapiranga Ibirapuera Rebouças Rio Bonito Expresso Tiradentes

1980 1987 1991 2000 2003 2004 2004 2004 2004 2007

4,0 14,5 12,5 8,4 15,0 8,2 4,3 10,3 26,8 10,5

9 58 44 32 58 43 42 58 65

122 888 560 457 860 682 677 790 974

70.000 470.000 200.000 140.000 230.000 250.000 250.000 470.000 460.000 30.000

5.600 19.500 9.400 8.600 10.100 13.300 17.200 15.600 11.700

RMSP

São Mateus/Jabaquara

1988

33,0

11

206

200.000

15.000

Fonte: SMT, 2004.

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Linhas

Corredor

Frota

(km)Extensão

Tabela 4 História dos corredores de ônibus na cidade de São Paulo e região


Dados de velocidade nos corredores mostram que o seu desempenho vem sendo medíocre, com valores em torno de 15 km/h, muito inferiores à faixa desejável de 20-25 km/h (figura 4). Figura 4 Alteração na velocidade de autos e ônibus, São Paulo, 1081-2005

Fonte: CET, 2007, adaptado pelo autor.

Isto decorre principalmente das limitações físicas (não há faixa de ultrapassagem) e da falta de reprogramação das linhas, que cria grandes filas de ônibus ao longo dos corredores. Este desempenho vem contribuindo muito para o descrédito desta solução junto à sociedade e vem dificultando a implantação de novos corredores. Recentemente, tem havido pressões nesta direção apenas na área sul da cidade, em que há enormes carências de transporte público. O corredor central desta área – avenida M´Boi Mirim – vem sendo alvo de protestos constantes dos usuários de ônibus e conseqüentemente conseguiu inserir o tema na agenda do poder público.

5. Visão dos “stakeholders” a. A.Usuários de ônibus: são os principais interessados no tema. Desde a década de 1950, quando se iniciou o processo acelerado de urbanização no Brasil, passaram a enfrentar dificuldades crescentes no acesso ao transporte público, tanto o acesso físico-temporal (oferta dos serviços no espaço) quanto o acesso econômico (custo). Dada sua condição de baixo nível de educação e organização política nunca conseguiram fazer valer seus interesses, tendo-se acomodado à situação, salvo em raras exceções em que houve movimentos de protestos (como nos “quebra-quebra” dos trens de subúrbios no Rio de Janeiro nas décadas de 1960 e 1970). O maior problema destes usuários do lado financeiro – o elevado valor das tarifas frente aos salários – foi resolvido com o Vale-transporte em 1987. No entanto, o VT valeu apenas para o mercado formal de trabalho, deixando cerca de 50% dos usuários fora do seu alcance.

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b. Empresários de ônibus: tiveram grande crescimento econômico com a urbanização no Brasil, pois passaram a contar com uma demanda cativa crescente, uma vez que não havia alternativa de transporte público para quem não estivesse contente com o serviço. Baseados em contratos assinados com o poder público, com garantia de exclusividade em uma determinada área por 20 ou 30 anos, os empresários passaram por um processo intenso de acumulação de capital e de diversificação das suas atividades – por exemplo, tornando-se donos de revendedoras de ônibus. Esta posição contratual permitiu que eles mantivessem laços estreitos com o poder público regulador e que, portanto, tivessem grande acesso às decisões sobre a oferta do transporte. Com o alívio trazido pelo valetransporte em 1987, a pressão sobre os custos frente à remuneração arrefeceu e o negócio ganhou uma condição excelente de continuidade, que só veio a ser ameaçada no meio da década de 1990, quando ocorreu um grande movimento de oferta de transporte público informal em pequenos veículos. No tocante à prioridade na circulação dos ônibus nas vias, o setor privado nunca desenvolveu nenhuma proposta ou exerceu qualquer forma de pressão mais objetiva sobre o poder público. Sua ação limitou-se ao uso da retórica a favor da prioridade para o transporte público. c. Setor privado que depende do transporte dos passageiros: o setor privado cujos trabalhadores são servidos pelo transporte público sempre participou do conflito entre valor da tarifa, inflação e salários, tendo que negociar permanentemente o valor da remuneração dos seus trabalhadores. Esta tensão foi permanente até 1978, quando o valetransporte foi aprovado. Embora o setor sempre tenha reclamado das dificuldades burocráticas para comprar e repassar os vales para seus empregados, ele se reprogramou e passou a fazer isto corretamente, porque os benefícios em termos de tranqüilidade nas relações de trabalho foram muito grandes. Também não há nenhum registro de alguma forma de pressão contundente ou também de organização de propostas concretas para melhorar as condições de transporte nas vias, sendo que a sua participação foi meramente retórica. d. Governo: as autoridades governamentais enfrentaram as tensões entre inflação e valor da tarifa por décadas e só conseguiram aliviá-la com o vale-transporte em 1987. Dado o modelo regulamentado brasileiro, o prefeito deve fazer um contrato com o operador de transporte público, na forma como achar mais adequado para a cidade. Assim, o prefeito tem uma enorme margem de manobra para negociar os termos do transporte, mas isto nunca foi feito na forma de um plano integral de organização, limitando-se à troca de veículos velhos por novos, que sempre tiveram grande repercussão política.

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6. Visão do problema na mídia A análise das matérias publicadas sobre o tema mostra que são dois os itens que aparecem com freqüência maior: a qualidade do transporte e a sua lentidão. Dadas as longas distâncias de percurso e as más condições das vias nas áreas mais periféricas onde estão os usuários mais pobres, sempre houve protestos e reclamações sobre os problemas, que em alguns casos tiveram repercussão na mídia. Falta de ônibus, longos tempos de espera nos pontos de parada e superlotação dos veículos são os temas mais recorrentes. Em relação à lentidão no trânsito, o problema enfrentado pelos ônibus não é tão aparente quando o enfrentado pelos automóveis, disto resultando uma exposição muito maior em relação ao congestionamento causado aos automóveis. Em um caso recente ocorrido na cidade de São Paulo houve uma mobilização de usuários incomum, frente ao elevadíssimo grau de lentidão no percurso entre as zonas sul e centro da cidade. O caso, ocorrido no corredor da Avenida M’Boi Mirim, começou em março de 2009, quando cerca de mil moradores bloquearam a via em protesto pelo congestionamento dos ônibus. É importante ressaltar que os moradores desta região haviam dado uma das menores notas registradas na pesquisa para o seu sistema de transporte, em levantamento feito por um instituto de pesquisa em toda a cidade em 2008. Frente aos crescentes protestos, a Prefeitura anunciou planos de melhoria e começou um estudo mais detalhado sobre uma tecnologia ainda inexistente na cidade – o “veículo leve sobre trilhos – VLT”, que dispensaria a construção de um corredor de ônibus na região, que tem vias de baixa capacidade. Enquanto o projeto não fica pronto, a prefeitura implantou uma faixa reversível para os ônibus em um trecho da Avenida M’Boi Mirim, que reduziu sensivelmente o tempo de percurso. Isto não impediu que a via fosse fechadas outras vezes por usuários descontentes com o serviço até inícios de 2011, quando cerca de 2 mil pessoas voltaram a parar o trânsito. Alguns comentários de usuários e especialistas podem ser vistos a seguir: Lentidão dos ônibus: O engenheiro de transportes Jaime Waisman, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, afirmou que "o ônibus é mais prejudicado pelo congestionamento. Tem percurso fixo, não pode escapar do trânsito. O carro pode buscar um caminho alternativo....o ônibus não tem sido atrativo em razão da baixa velocidade, do excesso de lotação, da viagem mais longa -o que explica por que tanta gente prefere automóvel" (18/5/2010). Situação crítica: Adriano Branco, que foi secretário dos Transportes do Estado de São Paulo, afirmou que “o transporte coletivo nunca esteve em situação tão crítica, não houve grande avanço recente e existe necessidade urgente de corredores de ônibus. Há visivelmente retrocesso na qualidade do transporte. O que a prefeitura pode fazer de mais eficaz são os corredores. Precisa de uma virada forte” (9/6/2010) 11 / 14


Crítica à troca do ônibus por monotrilho: matéria do jornal informa que as maiores críticas dos especialistas envolvem os corredores de ônibus e a troca de parte deles por monotrilhos. "O sistema de ônibus está sendo sucateado. O monotrilho é uma agressão e, quando as linhas estiverem prontas, já irão começar saturadas", diz Horácio Augusto Figueira, mestre em engenharia de transportes pela USP, que pede mais investimentos em corredores de ônibus (16/10/2010). Manifestação de usuários: o jornal informa que cerca de 400 manifestantes bloquearam parcialmente, por duas horas, a estrada do M'Boi Mirim (zona sul de SP). Seis pessoas foram detidas. O protesto começou às 6h15 no largo da Piraporinha e seguiu até a subprefeitura da região. Eles reivindicaram melhorias no transporte e no atendimento de saúde. Os engarrafamentos, os ônibus lotados e outros problemas de trânsito transformaram a estrada em palco de protestos nos últimos anos. O porteiro Jairo Batista Santos, 31, sai todos os dias às 4h de casa, no Jardim Vera Cruz (zona sul), para tentar chegar antes das 7h ao trabalho, em Santo Amaro. "Se eu sair depois das 4h30, demoro três horas e chego atrasado", diz. No ano passado, uma faixa reversível foi implantada e linhas foram alteradas, mas os problemas continuaram. No dia 11 de maio haverá uma reunião entre moradores e a prefeitura. Entre as reivindicações estão a continuação da linha 5-Lilás do metrô do Capão Redondo até o Jardim Ângela, o retorno de três linhas de ônibus e a criação de três linhas expressas ligando o Terminal Jardim Ângela a Pinheiros, Santo Amaro e largo São Francisco (29/4/2011).

7. Conclusões Os dados e informações analisadas permitem chegar a conclusões importantes sobre as vantagens e as limitações da política de transporte público urbano no Brasil. A regulamentação do transporte público no Brasil levou à criação de um setor empresarial amplo e dinâmico, que passou a adotar procedimentos avançados de organização administrativa e operacional. Incentivado pelo intenso crescimento da população urbana e acompanhado pelo crescimento da indústria nacional de ônibus, o setor atendeu a demandas crescentes. Na prática, as cidades médias e grandes passaram a contar com serviços com grande cobertura espacial e temporal, de confiabilidade média ou alta, com veículos de qualidade razoável para os países em desenvolvimento. No entanto, as formas de regulamentação, as características da demanda e a fragilidade do estado permitiram uma grande concentração de propriedade, havendo muitas empresas com mais de mil ônibus e várias com algumas de 10 mil ônibus, dentre os cerca de 120 mil utilizados em todo o sistema. Estas condições permitiram também a formação de monopólios geográficos, protegidos por contratos de longo prazo, com cláusulas de garantia do equilíbrio econômico-financeiro. 12 / 14


Os dados analisados permitem concluir que, salvo no caso de Curitiba, nenhuma cidade brasileira organizou um sistema integrado operando em corredores, de forma ampla. Nos outros casos – São Paulo, Belo Horizonte, Goiânia, Recife, Fortaleza, Campinas, Manaus – ocorreram implantações limitadas no espaço e com baixa produtividade. Se no período caracterizado pela crise do petróleo (décadas de 1970-80) foram implantados vários corredores, no período seguinte as implantações minguaram. Considerando as dimensões das cidades brasileiras e a demanda de passageiros de transporte público, o resultado final foi medíocre: em 2007 os corredores existentes não correspondiam a mais do que 3% das vias utilizadas pelos ônibus e o maior deles não chegava a transportar 200 mil passageiros por dia. Há vários motivos que podem estar relacionados a este resultado medíocre: - Um primeiro motivo pode ser identificado na saída do governo federal do tema do transporte público urbano, causada pela Constituição de 1992 e pela extinção da EBTU e do GEIPOT. Estas mudanças parecem ter afetado as cidades com menos recursos e que, a partir do fim do apoio federal, enfrentaram muitas dificuldades em implantar os projetos por conta própria. - Um segundo motivo está relacionado ao modelo brasileiro de regulamentação do transporte público. Se, por um lado, a regulamentação permitiu a profissionalização dos serviços, por outro lado deu aos operadores das grandes cidades condições legais de resistirem a alterações nas suas condições de operação. Esta capacidade de resistência parece ter sido um dos entraves mais relevantes para a integração dos sistemas e a implantação de corredores de ônibus. De fato, integrar sistemas de operar corredores altera as distâncias percorridas, a frota utilizada e a receita. Frente às incertezas sobre as conseqüências de alterações na operação na sua rentabilidade e posição de mercado os empresários tornaram-se adversários de muitos projetos, inviabilizando-os na prática. - Um terceiro motivo, mais indireto, refere-se às políticas de incentivo ao transporte individual por automóvel e, nos últimos anos, por motocicletas. As políticas de apoio ao automóvel, aplicadas ininterruptamente no período entre 1960 e 2008 (embora com níveis diferentes de apoio) e acompanhadas da precariedade do transporte por ônibus, ajudaram a minar crescentemente a imagem do transporte público, transformando-o em um uso “para quem ainda não conseguiu seu automóvel”. Adicionalmente, dado o crescimento do número de automóveis, sistemas de prioridade para ônibus passaram a ser vistos como impedimentos à sua fluidez, implicando em riscos políticos de conflitos com uma classe média cada vez mais influente nas decisões das políticas públicas. Neste aspecto, o caso da maior cidade do país é exemplar: após apoiar a implantação de um dos melhores corredores de ônibus do Brasil – o corredor ABD – nada mais de alta qualidade foi feito. A imagem negativa deixada pelo corredor Santo Amaro-9 de Julho, implantado em 1984, serviu de argumento para bloquear outras iniciativas, motivo este que passou a atuar juntamente com os demais já mencionados. Mesmo a implantação do “Passa-Rápido”, no início da década de 2000, não alterou o quadro, uma vez que se tratou de um projeto limitado, que não permitiu o salto de qualidade que poderia mudar a opinião pública. Considerando estes fatos e as tendências atuais de queda no uso do transporte público e 13 / 14


aumento no uso do transporte individual (automóveis e motocicletas), pode-se afirmar que a história dos corredores de ônibus do Brasil, após viver seu “clímax’ com o sistema de Curitiba (e de casos isolados de alguns corredores de boa qualidade em outras cidades), já está contada. A perspectiva de implantação de novos grandes projetos é cada vez menor.

Referências ANTP – Associação Nacional de Transportes Públicos (2005) Sistema de Informações da Mobilidade Urbana, São Paulo. _______ (2007) Sistema de Informações da Mobilidade Urbana, São Paulo. Barat, Joseph (1978) A evolução dos transportes no Brasil, IBGE, Brasília. Cadaval Maurício E. G. (1993) “Políticas tarifárias de ônibus urbanos nas capitais brasileiras”, Revista dos Transportes Públicos n° 58. CET – Cia de Engenharia de Tráfego (2007) Desempenho do Sistema Viário de São Paulo, São Paulo. IBGE ( 2005) Pesquisa de sistemas de transporte nos municípios brasileiros, Brasília. NTU – Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (2010) Pesquisa de Uso do Vale-Transporte, Brasília. STM – Secretaria Municipal de Transportes (2004) São Paulo Interligado – O plano de transporte público urbano implantado na gestão 2001-2004, São Paulo.

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