HABITAR O PATRIMÔNIO PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO
Vinicius Silva Nascimento
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
Maceió 2018
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VINICIUS SILVA NASCIMENTO
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
Trabalho final de graduação apresentado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas, campus A. C. Simões, para obtenção de título em bacharel em Arquitetura e Urbanismo Orientador(a): Profª Drª Lúcia Tone Ferreira Hidaka
Maceió 2018
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FOLHA DE APROVAÇÃO
AUTOR: VINICIUS SILVA NASCIMENTO
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
Trabalho final de graduação submetido ao corpo docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas e aprovado em ___ de __________ 2018.
____________________________________________________________ Profª Drª Lúcia Tone Ferreira Hidaka - UFAL (orientadora)
Banca Examinadora
____________________________________________________________ Prof. Drª. Débora de Barros Cavalcanti Fonseca - UFAL (Examinadora Interna)
____________________________________________________________ Prof. Dr. Fernando de Melo Sá Cavalcanti - UFAL (Examinador Interno)
____________________________________________________________ Profª Me Edler Oliveira Santos – UFAL Arapiraca (Examinador Externo)
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À minha família, pai, mãe, irmã e irmão... por acreditarem sempre em mim e no meu potencial.
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AGRADECIMENTOS Ao fim dessa longa jornada é preciso agradecer... O percurso até aqui jamais poderia ter sido realizado sozinho e por isso me sinto muito abençoado. Um agradecimento especial à minha querida orientadora, Lúcia Hidaka, pelas incontáveis horas de troca, de aprendizado e de muita compreensão e paciência. Se ao longo do curso não nos encontramos em disciplinas, ao final dele não poderia ter escolhido pessoa melhor para me acompanhar nessa etapa. Posso dizer que o #TeamHidaka só enriqueceu o meu trabalho em todos os assessoramentos coletivos com a Gabi e a Sarah. Ao PET Arquitetura e a todos os integrantes que por lá dividiram comigo os perrengues e alegrias dessa graduação. Mais do que um programa de tutoria, aquela salinha despretensiosa no fim do corredor, foi por dois anos minha segunda casa e onde eu pude crescer como pessoa e como profissional. Aos amigos de sempre e aos que fiz durante a graduação (Luiz, Débora, Luan, Gabriele, Karina, Mariana, Paulinha, Hedhy , Tuanne, Poli e tantos outros), sem eles a jornada com certeza teria sido mais doída e menos divertida. Obrigado pelas risadas, choros, brigas, mas pri ncipalmente pela amizade. Mais um agradecimento especial para aqueles que contribuíram diretamente para a construção do trabalho, à Paula por ter compartilhado seu olhar fotográfico e seu tempo em vários passeios vespertinos pelo bairro junto comigo. À Luan e Anne, pela disposição em puxar trena nesse sol de Maceió. À Alê pelas horas de trabalho compartilhado nas correrias com o prazo e pelos assessoramentos de projeto , à Mirella pelas diversas consultorias nas madrugadas. Por fim, aos poucos professores que se fizeram presente, dentro e fora da sala de aula, sempre com palavras de incentivo e dedicação à formação dos alunos .
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RESUMO Este trabalho, intitu lado “Habitar o Patrimôni o: Propos ta de Habitação de Interesse Social par a o Trapiche Jaraguá em Maceió/AL” tem como objetiv o de senvolver um projeto arquitetônico de habitação de in teresse social para a reabilitação de um monumento his tórico em processo de arruinamento , levan do em consideração a busca por soluções técnicas (infraestrutura, ventilação, iluminação, estrutural e estética) que dialoguem com o e difício histórico em questão, visando a qualidade d os espaços comuns e de moradia . Tal proposta torna -se relevante pela necessidade de conservação do valor histórico, ar quitetônico e patrimonial dos sítios para a sociedade, da mesma maneira que traz à tona relevância social na proposição da solu ção para os imóveis subutilizados destina n do-os para Habitação de In teresse Social. Para a construção do trabalho adotou-se algu mas etapas, como : a re visão bibliográfica de temas como, a problemática da moradia em áreas urbanas centrais e suas abordagens em propostas de intervenção urbanís tica, a ssim como o conceito de reabilitação urbana ; a caracterização territoria l e socioecon ômica da população que se pretende para o bairro ; e ainda, análise arquite tônica , compreendendo a parte de levantamento cadastral, fotográfico e do estado de conservação da edificação. Para o projeto adotou -se como posturas, a não alteração da visão do conjunto urban o, assim como aliar o us o residencial ao monumento através de estratégias , como a mínima alteração internas e a racionalidade nas soluções estruturais. Por fim, espera-se que este trabalho contribua com reflexões acerca dos desafi os de intervenções arquitetôni cas contemporâneas em edificações históri cas, mas também demonstr e como é possível pensar o patrimônio cultural, inserido nas questões urbanas atuais.
Palavras-chave: Reabilitação, habitação de interesse social, intervenções arquitetônicas em monu mentos, zona especial de preservação, Trapiche Jaraguá.
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ABSTRACT This research paper titled “Inhabit heritage lan dmarks: Social Housing Proposal for Trapiche Jaraguá in Maceió / AL" aims to develop an architectural proj ect of social housing for a his torical monument rehabilitation that is in process of ruin ing. It will be taking in considerati on the search for te chnical soluti ons (infrastructure, ventilati on, lightin g, stru ctural and esthetics) that dialogue with the historic buildin g, targeting the quality of common spaces and the housings. That proposal be comes relevant by the necessity of histori cal, architectural an d patrimonial preservation of the sites for all society . In the same way, it brings into soci al relevan ce proposin g solutions for immovable property underutilized destined to Social Housin g. To develop this research, some ste ps were adopte d, such as the bibli ographi c review of themes about the housing pr oblem in urban central areas and their urban intervetion proposals, as well the con cept of urban rehabilitation; the territorial and socioe con omic characte rization of the population that is intended to live in the neighborhood; in addition, an ar chite ctural analysis was made, in cluding some registrers, photographic recor ds and con dition of the building. For the architectural project was adopte d the stance to do not change the urban set, just as combine the residential use and mon ument use through strategies as minimal intern al chan ge and rationality in stru ctural solutions.Finally, i t is ex pected that this work wi ll con tribute with reflections on the challenges of contemporary archite ctural in terventions in historical buildings an d Landmarks, but als o de monstrate how it is pos sible to think about the cu ltural heritage, inserted in the curre nt urban issues.
Key words: historical monument rehabilitation, s ocial housin g, architectural interventions in monume nts, special area of pres ervation, Trapi che Jaraguá.
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LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Las Ramblas em Barcelona ................................................................................................ 22 Figura 2 - Piccadilly Circus em Londres .............................................................................................. 22 Figura 3 - Ghirardelli Square: exemplo de reutilização de edifício para uso comercial .............................. 23 Figura 4 - Edificações demolidas para dar lugar à Av. Central, Rio de Janeiro ........................................ 24 Figura 5 - Cortiços encontrados na região central do Rio de Janeiro .................................................... 24 Figura 6 - Pier 17 em South Street Seaport, Nova York ..................................................................... 25 Figura 7 - Edifícios históricos no bairro do SoHo, Nova York ................................................................ 25 Figura 8 - Deterioração física dos imóveis e do espaço urbano do Pelourinho em 1980 .......................... 26 Figura 9 - Aspecto de abandono e insegurança no espaço urbano do Pelourinho .................................... 26 Figura 10 - Complexo cultural e turístico Estação das Docas, Belém .................................................... 28 Figura 11 - Instalação elétrica exposta e infiltração no teto da Ocupação Prestes Maia ......................... 40 Figura 12 - Fachada Principal do Edifício da Ocupação Prestes Maia ..................................................... 40 Figura 13 - Entorno imediato do antigo prédio do INSS ....................................................................... 41 Figura 14 - Fachada vista da Rua do Comércio ................................................................................... 41 Figura 15 - Infraestrutura inadequada em uma das circulações do prédio do INSS ................................. 41 Figura 16 - Um dos cômodos improvisados pelas famílias da ocupação.................................................. 41 Figura 17 - Lixo acumulado no pátio central do antigo prédio do INSS .................................................. 41 Figura 18 - O acúmulo de lixo na ocupação do antigo prédio do INSS .................................................... 41 Figura 19 - Sobrados da Rua Sá e Albuquerque .................................................................................. 53 Figura 20 - Construção do Cais do Porto em 1940 ............................................................................ 53 Figura 21 - Perímetro de tombamento estadual do Jaraguá ................................................................ 54 Figura 22 - Antiga sede da Faculdade Estácio/FAL ............................................................................... 57 Figura 23 - Prédio da Escola Estadual Ladislau Neto............................................................................ 57 Figura 24 - Mapa de Uso do solo ...................................................................................................... 59 Figura 25 - Distribuição espacial das faixas de renda em 2010 ............................................................ 61 Figura 26 - Mapa ZEP 01/Jaraguá .................................................................................................... 64 Figura 27 - Vista para paisagem da enseada do Jaraguá ..................................................................... 65 Figura 28 - Arruamento da Rua Sá e Albuquerque .............................................................................. 65 Figura 29 - Planta da povoação de Jaraguá, 1841.............................................................................. 66 Figura 30 - Localização dos Trapiches e seus pontilhões em 1932 ........................................................ 67 Figura 31 - Pontilhão Trapiche Jaraguá em 1919 ............................................................................... 68 Figura 32 - Dependência do Consulado Britânico ................................................................................ 68 Figura 33 - Face de quadra do Trapiche Jaraguá ................................................................................ 69 Figura 34 - Planta Baixa atual do Trapiche Jaraguá ............................................................................ 69 Figura 35 - Elementos de Fachada visto da Rua Sá e Albuquerque ........................................................ 70 Figura 36 - Elementos de Fachada visto da Av. da Paz ........................................................................ 71 Figura 37 - Mancha de umidade na platibanda da fachada frontal ......................................................... 72 Figura 38 - Mancha de umidade e desagregação do reboco na fachada lateral ...................................... 72 Figura 39 - Platibanda com presença de umidade na fachada posterior ................................................. 73 Figura 40 - Crescimento de vegetação no piso ................................................................................... 73 Figura 41 - Paredes internas do galpão 03 manchadas pelo escorrimento da água da chuva e escurecimento da superfície próximo ao piso ..................................................................................... 73 Figura 42 - Desagregação do reboco em parede do galpão 03 ............................................................. 74 Figura 43 - Desagregação do reboco em parede do galpão 04 ............................................................. 74
9 Figura 44 - Descamação da pintura em parede do galpão 03 ............................................................... 74 Figura 45 - Descamação da pintura em parede do galpão 05 ............................................................... 74 Figura 46 - Degradação do piso, galpão 04 ........................................................................................ 75 Figura 47 - Vegetação arbórea, galpão 05 ......................................................................................... 75 Figura 48 - Planta de Situação e fotos do entorno imediato do Trapiche Jaraguá ................................... 81 Figura 49 - Vazio Galpão 02 ............................................................................................................. 82 Figura 50 - Vazio Galpão 03 ............................................................................................................. 82 Figura 51 - Fachada do Colégio do Santuário do Caraça ...................................................................... 82 Figura 52 - Sistema Estrutural em concreto justaposto as paredes originais em pedra .......................... 82 Figura 53 - Planta de layout com demarcação dos vazios (iluminação e ventilação). Imóvel à Rua João Alvares, n°18, projeto referente ao Programa Novas Alternativas no RJ. ............................................. 83 Figura 54 - Planta de layout com demarcação dos vazios (iluminação e ventilação). Imóvel à Rua Visconde do Rio Branco, n°19, projeto elaborado pelo Laboratório de Habitação da UFRJ. ................................... 84 Figura 55 - Conjunto de casas geminadas à rua Rocha Cavalcante ....................................................... 85 Figura 56 - Conjunto de casas descaracterizadas à rua Rocha Cavalcante ............................................ 85 Figura 57 - Conjunto de casas à rua Barão de Jaraguá ....................................................................... 85 Figura 58 - Edifício de apartamentos na Travessa dos Artistas ............................................................ 85 Figura 59 - Proposta para o Trapiche Jaraguá visto do alto ................................................................. 86 Figura 60 - Paleta de cores da fachada com base no Manual de cores de Marechal Deodoro .................. 89 Figura 61 - Fachada à Rua Sá e Albuquerque ..................................................................................... 89 Figura 62 - Diagrama de ocupação .................................................................................................... 90 Figura 63 - Pátio............................................................................................................................. 91 Figura 64 - Vista interna unidade Tipo 02 .......................................................................................... 92 Figura 65 - Perfil "I"......................................................................................................................... 94 Figura 66 - Perfil laje Steel deck ....................................................................................................... 94 Figura 67 - Sistema construtivo: paredes.......................................................................................... 95 Figura 68 - Placas cimentícias .......................................................................................................... 95 Figura 69 - Telha fibrocimento na cor cerâmica .................................................................................. 95 Figura 70 - Piso drenante na cor bege .............................................................................................. 96 Figura 71 - Painel metálico perfurado ................................................................................................ 96 Figura 72 - Corredor Central............................................................................................................ 97 Figura 73 - Pátio Galpão 04 ............................................................................................................. 98
LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Evolução Comparativa do preço do m² dos imóveis no Jaraguá por estado de conservação ...... 56 Tabela 2 - Dimensionamento das Unidade Habitacionais ...................................................................... 93
LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Evolução Populacional Jaraguá ......................................................................................... 58 Gráfico 2 - Evolução Populacional Maceió .......................................................................................... 58 Gráfico 3 - População e Domicílios em 2010 ...................................................................................... 61 Gráfico 4 - Proporção por sexo em 2010 .......................................................................................... 61
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SUMÁRIO [1.] INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 14 [1.1.]
Objetivos...................................................................................................................... 16
Objetivo Geral............................................................................................................................ 16 Objetivos Específicos .................................................................................................................. 16
[2.] HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL: UM USO NEGLIGENCIADO EM CENTROS URBANOS ......................................................................................................... 20 [2.1.] Intervenções Em Centros Urbanos: Um Panorama Histórico...................................................... 20 [2.1.1.] Renovação Urbana (1950 a 1970) ................................................................................. 21 [2.1.2.] Preservação Urbana (1970 a 1990) ............................................................................... 24 [2.1.3.] Reinvenção Urbana (1990 até os dias atuais) .................................................................. 27 [2.2.] Lidando com Preexistências: A Reabilitação em favor das Intervenções em Áreas Centrais ........... 29 [2.3.] A problemática por trás da moradia em centros urbanos .......................................................... 34 [2.3.1.] existente
Os modos de morar no Centro e sua relação com o déficit habitacional e o estoque imobiliário .................................................................................................................................. 37
[3.] CONHECENDO O TERRITÓRIO: O JARAGUÁ ENQUANTO SÍTIO HISTÓRICO URBANO EM MACEIÓ ........................................................................................................ 52 [3.1.] O bairro do Jaraguá e seu processo de revitalização: Os desdobramentos atuais ........................ 52 [3.2.] O sítio histórico e seus aspectos legais ................................................................................... 62 [3.3.] O sítio e seus monumentos históricos: o Trapiche Jaraguá ....................................................... 65
[4.] HABITAR O PATRIMÔNIO .................................................................................... 80 [4.1.] Postura Projetual ................................................................................................................. 80 [4.2.] O projeto ............................................................................................................................. 85 [4.2.1.] A Consolidação do edifício histórico ............................................................................... 86 [4.2.2.] O novo objeto arquitetônico.......................................................................................... 89
[5.] CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 106 [6.] REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 108
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[1.]
INTRODUÇÃO
A discussão do esvaziamento dos centros urbanos ganha notoriedade no Brasil a partir da década de 1980, com o desenvolvimento do pensamento preservacionista e a busca pela construção de uma cidade mais humanizada. Como consequência, inúmeros projetos de intervenção urbanística foram sendo construídos nas cidades brasileiras. Rio de Janeiro e São Luís foram as pioneiras na construção dessas novas propostas, os projetos “Corredor Cultural” e “Reviver”, foram respectivamente, as primeiras experiências ocorridas no país. (SIMÕES JR., 1994, p.6). Impulsionadas por essa conjuntura, outras capitais aderiram à ideia e promoveram propostas para os seus centros históricos a exemplo de Salvador, Recife e São Paulo. Assim como em outras cidades do Brasil, o centro histórico de Jaraguá, em Maceió, passou por um processo de esvaziamento e desvalorização. Até o início dos anos 1990, a região apresentava características de decadência, mantendo, entretanto, sua dinâmica econômica própria. Em vista disso, no ano de 1994 começam a serem desenvolvidos os primeiros projetos de reestruturação urbana do bairro. (PADILHA, 2006). O Plano de Revitalização do Jaraguá de 1994 envolveu os governos municipal e estadual, em parceria com instituições financeiras e tinha por objetivo propor diretrizes e parâmetros para a reestruturação urbana por meio de adequações físicas e de infraestrutura, incentivo a novos usos, ênfase às potencialidades turísticas, históricas e culturais viabilizando a atração de investimentos da iniciativa privada. Tanto em Maceió, quanto em outras cidades do Brasil, tais intervenções parecem ter sido pautadas pelo incentivo ao turismo, lazer e atividades culturais, sofrendo influência das orientações do “city marketing”1. Em decorrência disso, mais uma vez, o centro histórico ficou distanciado do cotidiano das cidades. Estas áreas passaram a conformar cenários imagéticos e os usos, até então incentivados, resultaram na permanência temporária dos usuários. O processo de esvaziamento dos centros gera um estoque de edifícios vazios ou subutilizados considerável. Esta situação se revela como um risco à degradação do patrimônio edificado e à memória da cidade, uma vez que essas estruturas se apresentam abandonadas ou em ruínas. Nestas circunstâncias, os imóveis deixam de cumprir sua função social, se comportando
City marketing: Política que busca transformar os espaços públicos, reinventando-os como lugar de mercado. No caso, os sítios históricos degradados transformam-se em áreas de consumo, entretenimento e fruição turística. (LEITE, 2004 apud VASCONCELOS; ARAÚJO, 2014). 1
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como espaços ociosos mesmo inseridos num local com grandes potencialidades como, por exemplo, a sua localização e infraestrutura já instalada. Enquanto isso, a demanda por espaços de moradia, especialmente aquela voltada para a população mais vulnerável, torna-se uma questão prioritária em virtude do rápido processo de urbanização o qual estiveram sujeitas as cidades brasileiras após a década de 1960. O modo como as cidades foram sendo construídas favoreceu a especulação imobiliária e, por conseguinte dificultou o acesso dessa parcela da população ao que chamamos de cidade formal. Como consequência, a moradia popular foi sendo implantada nas zonas periféricas das cidades, em locais carentes de infraestrutura e distantes do centro, ou ainda em áreas ambientalmente impróprias para urbanização. Diferentemente dos mais pobres, aqueles que podem pagar ocupam as áreas urbanas melhor localizadas (mais centrais), onde se concentram os investimentos de melhoria dos espaços públicos (TSUKUMO, 2007). Essa dualidade marca o cenário desigual de ocupação no espaço intraurbano brasileiro e tem raízes no modelo de desenvolvimento econômico praticado no país. Portanto, democratizar o acesso à cidade formal para a camada mais vulnerável da população é fundamental para garantir a qualidade na vida urbana, mas também uma forma de otimizar os espaços ociosos em áreas centrais. Para tanto, a reutilização dos imóveis vazios ou subutilizados encontrados em áreas centrais pode ser uma saída para a redução do déficit habitacional no Brasil. Reabilitá-los significa, entre outros aspectos, ter a população se apropriando e percebendo com outros olhos o valor patrimonial dessas edificações e ambiências urbanas, sendo um grande passo para a preservação da história e da memória desses lugares. Diante do exposto, a investigação da temática do esvaziamento dos centros históricos se justifica pela necessidade de conservação do valor histórico, arquitetônico e patrimonial desses sítios para a sociedade, da mesma maneira que traz à tona relevância social na proposição da solução para os imóveis subutilizados destinando-os para a Habitação de Interesse Social.
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[1.1.] Objetivos Objetivo Geral Desenvolver projeto arquitetônico de habitação de interesse social para a reabilitação de um monumento histórico - Trapiche Jaraguá – em processo de arruinamento, contribuindo para as reflexões sobre os desafios de intervenções arquitetônicas contemporâneas em edificações históricas; Objetivos Específicos - Refletir acerca da problemática da moradia nas áreas centrais, a partir do conceito de reabilitação urbana e as abordagens sobre as propostas de intervenção urbanística em centros urbanos, após 1950. - Caracterizar o perfil socioeconômico, ocupação e uso do solo, bem como legislação patrimonial e urbanística do bairro, apontando os seus condicionantes locais para intervenção projetual; - Identificar solução técnica (infraestrutura, ventilação, iluminação, estrutural e estética) compatíveis aos espaços comuns e de moradia de uma habitação de interesse social em edificação histórica em arruinamento;
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[2.]
HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL: UM USO NEGLIGENCIADO EM CENTROS URBANOS
Historicamente, os Centros Históricos correspondem ao local de maior concentração e fluxo de pessoas, sendo marcados por fortes atividades comerciais, institucionais, e de gestão pública, além das interações sociais e cívicas. Mais recentemente, as áreas centrais das cidades, em especial os centros históricos, adquiriram o papel de lugar simbólico, pois guardam em seu tecido urbano a história e a memória do lugar. Segundo afirma Silva (2014), estes locais tornaram-se
“palco privilegiado do enredo citadino”, pois dão margem a diversas formas de análise, principalmente através da observação do conjunto de características que marcam aquele espaço. No entanto, com o crescimento acelerado das cidades, principalmente após a segunda metade do século XX, e graças a uma política urbana de desenvolvimento baseada nos interesses econômicos das classes sociais dominantes os centros históricos conheceram seu período de decadência. Diversos autores, como Silva (2014), Clemente (2012) e Bernardino (2011), identificam alguns motivos para o começo desse processo. As alterações no espaço intraurbano da cidade, ligadas ao fenômeno da especulação imobiliária, promovem a formação das novas centralidades, assim o centro tradicional começa a compartilhar o seu papel de importância dentro da dinâmica da urbe. Outros fatores podem ser identificados no processo de decadência dos centros como, a expansão da malha urbana, o incremento da produção e aquisição de automóveis, a busca por novas formas de morar, tanto daqueles da mais alta renda, quanto daqueles de menor renda à custa dos programas de financiamento habitacionais do governo, como os promovidos pelo Banco Nacional de Habitação iniciado em 1964. Conforme essas novas dinâmicas se consolidavam, os centros históricos começaram a apresentar sinais de decadência que culminou num processo de degradação que se intensificou após os anos de 1950. Desde então, os centros adquiriram uma imagem “associada à perda de sua
função, ao dano ou à ruína das estruturas físicas, ou rebaixamento do nível do valor das transações econômicas de determinado lugar” (VARGAS; CASTILHO, 2015, p.03). [2.1.] Intervenções Em Centros Urbanos: Um Panorama Histórico Diante desse cenário, as áreas centrais passaram a ser alvo de propostas de intervenção urbana que buscavam reverter esse processo de degradação. No entanto, os projetos realizados ao longo dos anos apresentam características e estratégias diferentes, cujos resultados demonstram
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o pensamento intervencionista naquele dado momento (VARGAS; CASTILHO, 2015). Ainda segundo as autoras, as intervenções nas áreas urbanas centrais podem ser orientadas em três momentos principais, são eles Renovação Urbana (1950 a 1970), Preservação Urbana (1970 a 1990) e Reinvenção Urbana que surge no início da década de 1990 e se prolongam até os dias atuais. A seguir será apresentada uma síntese desses três momentos, discutindo seus, objetivos, características, estratégias e resultados, observando dentro disso como a questão da habitação em áreas centrais foi trabalhada, aspecto chave deste trabalho.
[2.1.1.] Renovação Urbana (1950 a 1970) As ações de Renovação Urbana aconteceram simultaneamente à consolidação do Movimento Moderno no mundo. Nessa época, as intervenções urbanísticas eram balizadas pelos pressupostos da Carta de Atenas de 1933, documento no qual se discutiu as principais diretrizes do urbanismo moderno. A principal característica deste período era a preferência pelo novo, ou seja,
“demolir e construir para renovar viria a ser o propósito daquela geração” (VARGAS; CASTILHO, 2015, p.07). Para dar forma às novas ideias de cidade, o capital da elite fora fundamental, pois era essa camada social que se privilegiava com as transformações. Na Europa, as intervenções estiveram focadas em soluções de mobilidade e para a reconstrução das cidades no período pós-guerra, naquele momento o espaço público ganhou destaque nas discussões tornando-se um espaço supervalorizado, a exemplo das Ramblas, em Barcelona e do Piccadilly Circus, em Londres (ver figura 1 e 2). Nos Estados Unidos, o processo de renovação vinha em contraposição ao fenômeno da suburbanização das metrópoles americanas, não havia preocupação com a preservação dos tecidos urbanos existentes, “o propósito era eliminar o
congestionamento das áreas centrais, com a criação de grandes espaços para vias amplas, estacionamentos, instituições culturais” (VARGAS; CASTILHO, 2015, p.08). Frieden e Sagalyn, afirmam ainda que: A lé m de ss a s tr an sf or ma çõe s , de v e ria traz e r a na tu rez a d e vol ta e ntre o s e dif íci os [. . . ]. I nd ú str ia s e arm az é n s ce de ria m se u s l ug are s p ara tor re s de e s crit ório s, b an co s, agê n cia s do go ve rn o, ho téi s, re st au ra nte s, e loj as de de p ar tam e n to, p r ep ar an do - se p ar a se r o e sp a ço das a rte s, da e d u ca ção e da re cre aç ão, e p a r a gr up os de m or ado res que de sf rut ari am a v id a cul tu ral e e du ca cio nal do ce ntr o. (F R IEDE N; SA GA LY N , 1 9 91 ap ud VA RGA S; C A STI L HO, 2 01 5, p.0 8 , grif o no sso ).
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Percebe-se que a ideia posta em prática pelos norte-americanos prezava, aparentemente, pelas mudanças de uso do solo, principalmente àqueles ligados ao comércio e serviços. Essa ideologia significava um prejuízo ao patrimônio edificado existente, bem como a expulsão de famílias que já residiam no local. Figura 1 - Las Ramblas em Barcelona
Fonte: Disponível em:<goo.gl/RQgn3K> Acesso: 04 out. 2017
Figura 2 - Piccadilly Circus em Londres
Fonte: Disponível em:<goo.gl/DSXyV8 > Acesso: 04 out. 2017
Estrategicamente as intervenções urbanas nesse período se valeram da legitimidade do estado, assim como das alianças entre os diversos grupos de interesse privado juntamente com o poder público local. Segundo Vargas e Castilho (2015), essa conjuntura política assegurou diversas obras e intervenções urbanas, à custa de isenção fiscal e grandes desapropriações. As primeiras críticas à renovação urbana surgiram na década de 1970, aquelas propostas postas em prática não garantiram uma vitalidade urbana desejada, no entanto, o sucesso dos
shoppings centers do subúrbio acabou sendo replicado nas áreas centrais, principalmente nos Estados Unidos. Nesse momento, começou-se a discutir sobre a reutilização de edifícios antigos (fábricas, armazéns, etc) como espaços de consumo na tentativa de atração da população de volta ao centro (VARGAS; CASTILHO, 2015). O Ghirardelli Square em São Francisco (ver figura 3), construído em 1964, é um dos exemplos paradigmáticos de reaproveitamento; este complexo comercial, com lojas e restaurantes ocupa as edificações uma antiga fábrica de chocolate do século XIX. A busca pela transformação dos usos causou um considerável impacto nas áreas urbanas centrais, a grande oferta de escritórios, quadras demolidas que permaneceram vazias por falta de investimento e a expulsão dos moradores locais substituídos por outros de maior renda (gentrificação), são alguns dos resultados deste período. Frieden e Sagalyn (1991 apud VARGAS; CASTILHO, 2015, p. 14) declaram que, “esses programas de renovação e de reestruturação viária
desalojaram mais de 700 mil famílias e eliminaram empregos e pequenos negócios”.
H.I.S.: Um uso negligenciado em Centros Urbanos | 23 Figura 3 - Ghirardelli Square: exemplo de reutilização de edifício para uso comercial
Fonte: Disponível em:<goo.gl/TvNNU3> Acesso: 04 out. 2017
No Brasil, o processo de renovação urbana foi semelhante ao ocorrido na Europa e nos Estados Unidos, principalmente nas grandes cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, que ao longo do século XX passaram por uma intensa transformação graças ao redesenho do tecido urbano da área central. O principal objetivo era alcançar a modernidade, trazendo para essa região os órgãos públicos, centros financeiros e de negócios, comércios e serviços; segundo Bonduki (2010), o uso residencial não era apreciado, chegando a surgir legislações que coibiam habitações coletivas e cortiços nas áreas centrais, “como se possível eliminar a pobreza por decreto” (BONDUKI, 2010, p.320). O principal exemplo de renovação urbana ocorrido no Brasil foi a construção da Avenida Central no Rio de Janeiro (ver figura 4 e 5), durante a gestão do prefeito Pereira Passos na primeira metade do século XX. O projeto envolveu a demolição de centenas de edificações que serviam de moradia (cortiços) para população de menor renda, este processo está relacionado ao surgimento das favelas na capital carioca. Outros casos brasileiros também podem ser citados como: a renovação do bairro do Recife; o desmonte do morro do Castelo e Santo Antônio, no Rio de Janeiro, e sua reurbanização, os alargamentos de avenidas e praças no centro de Salvador nos 1930; a abertura da Praça da Sé e, posteriormente, a implantação do Plano de Avenidas em São Paulo. (BONDUKI, 2010).
24 | H.I.S.: Um uso negligenciado em Centros Urbanos Figura 4 - Edificações demolidas para dar lugar à Av. Central, Rio de Janeiro
Fonte: Disponível em:< goo.gl/FH9mGU> Acesso: 04 de out. 2017
Figura 5 - Cortiços encontrados na região central do Rio de Janeiro
Fonte: Disponível em:< goo.gl/FH9mGU> Acesso: 04 de out. 2017
Observa-se assim, que as intervenções nos centros históricos brasileiros prezaram pelo embelezamento urbano e pela renovação e estiveram intimamente ligadas a uma transformação de usos do solo, além da expulsão da população moradora que ali vivia. Vale ressaltar, que essa postura segregadora tem sido uma das características da política urbana no Brasil e que ainda continua sendo praticada até os dias atuais.
[2.1.2.] Preservação Urbana (1970 a 1990) O período da Preservação Urbana veio em oposição ao pensamento moderno da época das intervenções de renovação e inseriu dentro das suas posturas a valorização e preservação de edifícios históricos como “novos símbolos de status e distinção” (VARGAS; CASTILHO, 2015, p.15). Nesse momento, a elite cultural e a população local tornaram-se protagonistas no discurso de salvaguardar a cultura e a memória; os projetos de intervenção transformaram antigas fábricas, armazéns, mercados, em espaços de comércio, serviços, lazer e cultura, inaugurando o que Huyssen (2000 apud VARGAS; CASTILHO, 2015, p. 15) chamou de restauração historicizante de velhos centros urbanos. Cabe ressaltar ainda, que nesse período houve a preocupação em se criar legislações e normatizações com o objetivo de preservar os centros históricos. De acordo com Vargas e Castilho (2015), essas orientações normativas trouxeram os sítios históricos para o plano do planejamento urbano, entendendo-os como parte integrante do cotidiano das cidades e testemunho histórico da sociedade. Compreendido como espaços essenciais na vida urbana, as regiões centrais passaram a ser alvo de empreendimentos imobiliários diferenciados por parte do setor privado, enquanto que o
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setor público viu nesses locais a oportunidade de por em prática projetos de apelo popular, tornando-se coadjuvantes na qualidade de gestores urbanos. (VARGAS; CASTILHO, 2015). As autoras complementam ainda que: F or ta lece u - se , dessa f orm a, a r e l aç ão de pa rce ria e n tre os seto res p ú blic o e pr i va do , com a f in ali da de de res po nde r à s crí tic as e st abele cid a s no pe río do a nte rior po r me io d e proje to s viá ve is p ar a a ec onom ia urb a na e par a o s ne gó cio s e m pre s aria is, c o nt a nd o c om o e n vol vi me nto d a c om u nid a de pa ra le giti má -lo s (VA RGA S; C A ST IL HO, 20 15 , p. 17 , gr if o no sso ).
Para garantir a atração da população de volta ao centro, foram estabelecidas três ações estratégicas: intervenção física por meio de projetos arquitetônicos; estabelecimento de políticas urbanas; e a implementação de programas de gestão compartilhada (VARGAS; CASTILHO, 2015). Nos Estados Unidos, os bairros nova-iorquinos South Street Seaport e SoHo (ver figura 6 e 7), tiveram projetos marcantes já nos anos 1970, as edificações portuárias, como Pier 17, e os prédios do século XIX que incorporam o ferro fundido, são exemplos de reutilização para uso comercial, lazer e residencial de alto padrão. Figura 6 - Pier 17 em South Street Seaport, Nova York
Fonte: Disponível em < goo.gl/Dzm6YS> Acesso: 04 out. 2017
Figura 7 - Edifícios históricos no bairro do SoHo, Nova York
Fonte: Disponível em < goo.gl/Dzm6YS> Acesso: 04 out. 2017
No que diz respeito a políticas urbanas, a Europa se destaca graças ao maior controle do estado no desenvolvimento das cidades. “As intervenções incluíram não apenas o comércio central,
mas a habitações de baixa renda, o sistema de transporte, os espaços públicos e o ambiente urbano” (VARGAS; CASTILHO, p. 23). A cidade de Bolonha, na Itália, tornou-se referência internacional com
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Plano de Edificação Econômica e Popular (Peep)2. Já na América Latina, as políticas urbanas se concentraram em ações normativas e na criação de instituições de salvaguarda dos bens culturais nos três âmbitos de atuação pública. Em 1979, surge no Brasil, a Secretaria de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e a Fundação Pró-memória que anos mais tarde se transformaram no IPHAN. Exemplo importante, a recuperação do Centro Histórico de Salvador (Pelourinho-Maciel), na década de 1990, configura-se como um exemplo de intervenção equivocada. Apesar do estado de degradação física acentuado em que o bairro se encontrava (ver figura 8 e 9) havia um movimento de ocupação (das edificações e dos espaços públicos) significativo por parte das populações de baixa renda e grupos culturais de orientação afro. Para Bonduki (2010), o projeto do governo da Bahia foi polêmico ao desconsiderar a população moradora existente, financiando usos voltados para o lazer e o turismo, descaracterizou o tecido social do lugar. Figura 8 - Deterioração física dos imóveis e do espaço urbano do Pelourinho em 1980
Figura 9 - Aspecto de abandono e insegurança no espaço urbano do Pelourinho
Fonte: BONDUKI, 2010
Fonte: BONDUKI, 2010
Como resultado, o período da preservação urbana trouxe como aspecto positivo o debate sobre as motivações e os tipos de intervenções nos centros urbanos. Porém, percebe-se ainda um predomínio da criação de espaços elitizados, voltados para o lazer e o consumo. Acerca dessa questão, Vargas e Castilho (2015), aborda que: Se g ui ndo n a mes ma di re ç ão , a co ntri b uiç ão da pr e se rv açã o d a hi stó ria se r á mui to limi ta da p ara c ida de como um to do se a inte r ve n ção no s ce n tro s f or so men te f ís ic a e dire ci on ad a ao t uri sm o. Ess a pre se r v aç ão não s e rá h is tóri ca, poi s r efle tir á some n te a arq ui tet ur a e n ão o amb ie nte u r ba no o u a su a me mór ia (VA RGA S; C A ST IL HO, 2 01 5, p. 2 9 , gr ifo n os so ).
Inserido dentro do Plano de Conservação Integrada do centro histórico de Bolonha, o PEEP tinha como meta manter os habitantes em edifícios recuperados em tipologias que variavam de 30 a 90m². (SAMPAIO, 2017, p.50).
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No Brasil, as ações voltadas a trazer vitalidade para os centros de 1960 a 1990, foram pontuais e desarticuladas, resultando em respostas tímidas. Em sua maioria culminaram em “ações
normativas, discursos políticos e intervenções isoladas, voltadas na maioria das vezes, à exclusiva restauração das edificações” (VARGAS; CASTILHO, 2015, p.30). Ou seja, é nesse momento em que se inaugura um pensamento de preservação do patrimônio histórico e cultural das cidades.
[2.1.3.] Reinvenção Urbana (1990 até os dias atuais) O fim do século XX é marcado por uma forte transformação da sociedade, o processo de globalização, o desenvolvimento de tecnologias e o rápido fluxo de informações modificaram até mesmo as relações sociais ocorridas no território urbano. Nessa conjuntura, a cidade se estabelece como local de consumo para investidores, turistas e principalmente para usuários com mais alta renda. Conforme aponta Vargas e Castilho (2015), a aliança entre o poder público e o capital privado, através do planejamento de mercado e de técnicas de marketing urbano (city marketing) torna-se essencial para as ações de intervenção urbana nesse período. O objetivo dessas ações visava à recuperação da economia urbana, gerando emprego e renda, bem como a reinvenção de novas áreas da cidade, além da região central. Consequentemente, os novos projetos arquitetônicos e urbanísticos transformaram-se em objeto de promoção política. Nesse sentido, “dá-se ênfase a gestão urbana, assumida como uma política
de governo e ao grande projeto urbanístico como elemento catalisador” (VARGAS; CASTILHO, 2015, p.32). Em termos estratégicos não houve inovações em relação aos dois momentos anteriores, o que se destaca nesse período são a dimensões dos projetos implementados e a forma de gestão. Ressalta-se que outras regiões da cidade, como áreas portuárias, ferroviárias, orlas marítimas, fluviais e ainda antigas estruturas industriais ganharam espaço no leque de intervenções, tornandose alvo de inovações arquitetônicas e urbanísticas (VARGAS; CASTILHO, 2015). Observa-se no Brasil, uma preocupação da sociedade com o retorno de atividades funcionais ao centro. No ano de 1991 é criada em São Paulo a Associação Viva o Centro, organização que uniu a sociedade civil, instituições financeiras, comerciantes entre outros com o intuito de realizar ações de conscientização acerca da importância da área central. Na esfera pública, surge em 1999 o Programa Monumenta graças a uma ação conjunta do Ministério da Cultura e do Banco Interamericano de Desenvolvimento, visando a preservação do patrimônio histórico e cultural. (VARGAS; CASTILHO, 2015).
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No âmbito dos projetos, se originaram nesse período várias propostas de intervenção em centros históricos brasileiros como: Projeto de Revitalização do Centro Histórico de Recife/Olinda; o Projeto Praia Grande, em São Luiz; o Corredor Cultural, no Rio de Janeiro; Feliz Lusitânia, Estação das Docas e Projeto Ver-o-Peso em Belém são alguns dos exemplos mais marcantes (ver figura 10). Figura 10 - Complexo cultural e turístico Estação das Docas, Belém
Fonte: Disponível em: <goo.gl/PwYa67> Acesso: 04 out. 2017
O que se apreende das intervenções do período de reinvenção urbana é a crescente preocupação com a melhoria da imagem dos centros urbanos. Vargas e Castilho (2015) analisam que: Á re a s f orte me nte d es v alor iz a d as vê m a ser al vo d as ate nç ões do pode r pú bli co, q ue se ali a ao c ap ital imo bili ário, in ici an do d e ss a f o rma u m a re co nq ui s ta d aq ue le e sp aç o . [... ] Es sa s a ções s u gerem q ue a arq ui tet ur a e o plane jam en to ur ba no t a mbé m vier am a ser regi do s por e s tra tégi as de mar ke ti ng, de sti n ad as a e s tru tu ra r a m u d a n ça da e con om ia ur ba n a d e b a se p ro d uti v a pa ra a b a se d o co ns u mo (VA RGA S; C A ST I LH O, 20 1 5, p. 42 , grif o nos so ) .
No entanto, essa crescente valorização veio camuflada pelos interesses do capital externo encarada na tentativa de superar a forte competição urbana que se instaura a partir dos anos 1990. Carrion (1998 apud VARGAS; CASTILHO, 2012, p. 43) complementa afirmando que “a
cidade, que outrora refletiu o contexto social, agora valoriza exacerbadamente a imagem, a estética e a maquilagem”. Os efeitos da gentrificação tornaram-se coadjuvantes nesse processo, pois os projetos de requalificação simularam um ambiente urbano notável mascarando os conflitos urbanos inerentes a estas propostas (VARGAS; CASTILHO, 2015). Vale a pena ressaltar que o estabelecimento de parcerias entre o setor público e o privado é um ganho para a realização das propostas ocorridas em centros urbanos. No entanto, é preciso uma “reflexão sobre os limites dessa parceria e sobre a forma de controle dessas intervenções
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urbanas” (VARGAS; CASTILHO, 2015, p.44), afinal a melhoria das áreas urbanas centrais deve ser construída para os cidadãos e com sua participação.
[2.2.] Lidando com Preexistências: A Reabilitação em favor das Intervenções em Áreas Centrais Conforme foi visto anteriormente, as intervenções em centros urbanos se intensificaram no mundo a partir da segunda metade do século XX, graças ao cenário de degradação o qual estavam sujeitas várias regiões centrais. Especialmente após a década de 1960, quando as ações reconheceram o valor histórico e cultural do tecido urbano preexistente é que surgem várias terminologias para definir os planos urbanísticos. Revitalização, requalificação, reabilitação, são alguma das expressões utilizadas nas discussões teóricas, nota-se que na maioria delas, o uso do prefixo “re” transmite uma postura de resgate daquilo que, em um dado momento, viveu seu ápice, ao mesmo tempo em que demonstra a superação das práticas precedentes de demolição de extensas áreas da cidade (renovação urbana). No entanto, cada terno adquiriu uma conotação diferente dentro das práticas urbanas, para tanto, “investigar suas origens e significados no tempo são questões relevantes para a compreensão
do modo como essas diversas intervenções vêm sendo aplicadas” (VASCONCELLOS; MELLO, 2015, p.61). Nesse sentido, busca-se neste momento, entender o significado dos termos e suas variantes como estratégia de recuperação de centros históricos. Seguindo na contramão das práticas mais comuns àquela época, a reabilitação urbana surge como uma forma de intervenção urbanística que se contrapõe às práticas de revitalização, requalificação e renovação. Enquanto a revitalização visa a melhoria das dinâmicas socioeconômicas, favorecendo os proprietários imobiliários privados e estabelecendo uma dinâmica de mercado, a reabilitação prioriza os interesses das populações residentes e usuários locais, sobrepondo suas necessidades e desejos aos ganhos do mercado privado. Sendo assim, a reabilitação urbana aparece como uma postura de intervenção urbana mais acertada quando o que se busca é a manutenção de um ambiente construído e uma transformação na qualidade de vida da população local. Sob a ótica das Cartas Patrimoniais, que são utilizadas como referência conceitual para as práticas de preservação do patrimônio material no mundo, o significado do termo reabilitação urbana
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aparece em destaque na Carta de Lisboa3 de 1995. O principal objetivo deste documento é estabelecer um conceito comum, além de nortear os grandes princípios deste tipo de intervenção, conforme consta no artigo 1° tem-se que reabilitação: É um a e s tr até g ia de ge st ão ur ba n a que proc ur a re q u alif ic ar a ci da de e xis te n te a tr av és de i nte r v ençõe s mú lti pla s des ti na da s a v alor iz ar a s pote nci ali da de s so ciai s, e c onóm ic as e f un cio na is a fi m de me l hor ar a qu ali da de de vi da da s p o p ula çõe s re si de nte s ; isso e xige o me lh ora me n to da s co n diçõ e s f í sic a s do par q ue co n str uí do p e la s u a rea bili ta ção e in sta la ção de e q uip ame nt o s, i nf r a -e s tr ut ura s (si c) , e sp aço s pú bli co s, ma nte ndo a i de nti da de e a s car ac te rí sti ca s d a á re a da ci da de a qu e diz e m re s pe ito (C A RTA DE L IS B OA , 19 9 5, p. 0 1 , g rif o no sso ).
Como é possível perceber, a construção do conceito de reabilitação urbana expresso na carta leva em consideração três aspectos essenciais: I – está inserida dentro de um viés político, pois se caracteriza como sendo uma estratégia de gestão urbana, e como tal deve estar incluída no processo de planejamento das cidades; II – leva em consideração ações variadas, sejam elas de cunho social ou econômico, percebendo um contexto local particular, não priorizando apenas o lazer ou o consumo; e III – enxerga o cidadão, especialmente aqueles mais vulneráveis economicamente, como principal centro das ações, visando a melhoria da qualidade de vida “utilizando a conservação
e preservação do edificado como instrumento desse objetivo” (CARTA DE LISBOA, 1995, p.02). Pensando no aproveitamento do estoque construído, a Carta de Lisboa expressa ainda o conceito de ‘reabilitação de edifícios’, que são “obras que tem por fim a recuperação e beneficiação
de uma construção, [...] procedendo a uma modernização que melhore o seu desempenho até próximo dos atuais níveis de exigência” (CARTA DE LISBOA, 1995, p.02). A preocupação com estoque construído é um dos aspectos essenciais dentro de entendimento do conceito de ‘reabilitação urbana’, esta é uma estratégia importante para evitar a decadência dos centros históricos, uma vez que abre espaço para a transformação das edificações através de novos usos que favoreçam a vitalidade urbana, em especial o uso residencial. Observa-se, no entanto, que a ideia da reutilização de edifícios não deve ser utilizada como pretexto para legitimação dos processos de exclusão social. Afinal, pensar os novos usos para uma população mais vulnerável, significa modificar a lógica de construção das cidades brasileiras que é marcada por desigualdades sociais, econômicas, territoriais, entre outras.
Carta de Reabilitação Urbana Integrada - Carta de Lisboa. Documento aprovado por aclamação, no 1º Encontro LusoBrasileiro de Reabilitação Urbana de Centros Históricos, realizado Outubro de 1995, em Portugal. (GALIZA, 2009, p. 24).
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Ainda sobre o conceito de reabilitação urbana, as reflexões feitas por Maricato (2002), apontam para uma consolidação deste termo. Para a autora, o conceito de reabilitação consiste em: A ção q ue pre ser v a , o mais po ssí vel , o am bie nte co n st r uído e xi st en te (pe q ue na s pro prie da de s, f ragme n ta ção no p arc ela men to do solo, e dif ic açõ e s a ntig a s) e d e s s a form a ta mbé m o s u sos e a po pu la ção m ora do ra . A re f orma ne ce ss ária n a i nf ra -e str u tu ra ( si c ) e xis te nte p ar a ad apt á -la a n o va s ne ce ssi d ade s pr oc ur a n ão de sc ar ac t eriz ar o am bie nte con st ru ído her da do. No s e dif ício s b u sca - se f az er “i nter ve nçõe s m ín ima s ” ind is pe ns á ve i s pa ra g ar an t ir o co nf ort o am bie nt al, a ces si bili da de e se g ur an ça e st ru tu ral (MA RIC A TO, 2 0 0 2, p. 1 26 , grif o no s s o).
Maricato (2002) argumenta ainda que, as intervenções em centros urbanos em dado momento consideraram importante a preservação do patrimônio histórico construído, no entanto, o que as diferencia da reabilitação urbana são os interesses que estavam por trás daquelas ações. Nos processos de renovação (entendidos aqui como aqueles descritos no tópico anterior) o favorecimento do capital imobiliário ganha destaque, porém quando se pensa numa estratégia de reabilitação, o interesse estará voltado para o melhoramento da dinâmica urbana existente, demonstrando que os ganhos à sociedade são maiores que o de mercado. Para a autora, o processo de reabilitação urbana perpassa inúmeros desafios, como: investimento público muitas vezes equivocado, o desequilíbrio no acesso à terra urbana, os fenômenos da especulação imobiliária, mas principalmente, como garantir que as transformações pretendidas não favoreçam a remoção das populações mais tradicionais que já residem no centro? Nesse sentido, Maricato (2002) traz à discussão a importância dos programas de moradia social, pois eles podem frear o processo de valorização imobiliária e apontar para construção de um mix social desejável tanto para as operações de reabilitação, quanto para as cidades. No âmbito institucional brasileiro, a discussão acerca da reabilitação urbana aparece pela primeira vez em 2003, quando o Ministério das Cidades lança o Programa de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais. Muito influenciado pelos debates teóricos e adotando diversos pontos discutidos até aqui, entende-se, nesse contexto, a reabilitação urbana como sendo: O proce s so de re c u pera ção e ada pt açã o de áre as urb a n as co n soli da da s su b util iz a da s, de gra d ad as ou em pro ces so de de gr a daç ão a fim de re in te g rá -l as à di nâ mic a u r ba n a , crian do co ndi çõe s e i n str ume n tos ne ce s sár ios pa ra c o n ter o s p roc e s so s de e s v az i ame nto de f unç ões e ati vi da de s ( M I NI STÉ RI O DA S C IDA DE S , 20 0 8, p. 1 4 1 , gr if o no ss o ).
Observa-se então que o conceito adotado pelo Ministério das Cidades (2008) encara a reabilitação urbana, principalmente, como uma estratégia de reversão do processo de degradação
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e esvaziamento funcional das quais estavam sujeitas as áreas centrais das cidades brasileiras. Ainda segundo esta instituição, a reabilitação aparece como uma opção promissora, visto que, pode promover a diversidade social e a vitalidade econômica local. Para isso, indica a reutilização dos imóveis vazios/ociosos como forma de contribuir para a redução do quadro de déficit habitacional, bem como, equilibrar os custos com novas urbanizações em áreas de expansão urbana, uma vez que o centro já possui uma infraestrutura consolidada. Sabendo de alguns efeitos negativos das intervenções em centros urbanos no Brasil, principalmente àqueles relacionados à “expulsão branca”, o Plano Nacional de Reabilitação reconhece que a diversidade social é essencial para o êxito das propostas. É comum que dentro de ações urbanísticas as melhorias advindas dos investimentos, sejam públicos ou privados, atraiam moradores e consumidores mais privilegiados, e consequentemente, expulsem as populações mais pobres das áreas urbanas centrais. (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2008). Nesse sentido, lança-se mão da utilização dos instrumentos do Estatuto da cidade, além do incentivo e disseminação de projetos voltados à habitação de interesse social como forma de garantir o direito à cidade. Para alcançar tais objetivos, uma das estratégias previstas no Programa de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais, é a disponibilização de imóveis públicos para reutilização. Muitos desses imóveis já são alvos de ocupações por parte de movimentos sociais de luta por moradia, que pressionam o poder público para que estes sejam destinados à produção de moradias para famílias de baixa renda. Como é possível perceber, dentro do conceito de reabilitação dois aspectos estão intrinsecamente relacionados, são eles: a preservação das características de um tecido urbano existente, juntamente com a manutenção das particularidades sociais, culturais, econômica e ambientais locais que se desenvolvem nas áreas centrais. Para Marques (2013) a reabilitação consiste em: A re abi lit aç ão q ue se a pli c a (o u de ve r ia apli ca r) nos n úcle o s ur ba no s an tigo s co ns ide r a, n ã o s ó a q ue st ão d a reco n st ru çã o e re c uper aç ão do s e dif íci os e m si, m a s t am bém a q ue st ão so cia l e cu lt ur al como e s se n ci ais no pr oce sso , um a ve z qu e recon st ru ir por re co ns tr uir não faz sen tid o, poi s mai s i mpo rta n te que a s pe d ras são a s pes so as . ( MA R QU E S, 2 01 3, p. 5 1 , grif o nos so ) .
Sob o ponto de vista de salvaguarda dos sítios históricos, a reabilitação se enquadra satisfatoriamente, pois procura integrar estas áreas à nova dinâmica das cidades contemporâneas, valorizando a memória e o patrimônio construído, reduzindo as desigualdades sociais e promovendo a participação dos cidadãos. Para Marques (2013), o processo de reabilitação difere de uma
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reconstrução ou restauro, pois a premissa de reutilização de um edifício requer o emprego de materiais e técnicas atuais “integrando-os numa linguagem harmoniosa, respeitando o traçado
original distinguindo, em simultâneo, o progresso que influenciou a sua transformação”.
Considerações Parciais Após essa breve síntese dos momentos históricos, percebe-se que as intervenções urbanas em áreas centrais foi uma linha de ação política priorizada nas cidades a partir da segunda metade do século XX, em virtude do processo de esvaziamento populacional e desvalorização as quais estavam sujeitas essas áreas. O reconhecimento do papel estratégico de renovação destas regiões dentro da dinâmica urbana foi essencial, pois trouxe o centro de volta à pauta do planejamento urbano. Todavia, existem dificuldades que precisam ser trabalhadas, especialmente no que tange às intenções dos projetos. Encarar as ações como parte integrante dentro de um sistema de desenvolvimento urbano é fundamental para alcançar uma efetivação das propostas, no sentido da reversibilidade do abandono dessas áreas. Para isso, é preciso levar em consideração as relações intrínsecas entre as diversas atividades no centro e seus agentes envolvidos, quer seja a população de menor renda quer seja o mercado imobiliário. A gestão dessas áreas é um desafio complexo, para tanto, antes de tudo é necessário um conhecimento aprofundado acerca das necessidades da região e de suas problemáticas, sejam elas econômicas, políticas ou sociais, a fim de embasar boas propostas de intervenção. Nesse contexto, cabe ainda observar, as questões que envolvem as populações com menor poder aquisitivo e ainda o potencial construtivo do patrimônio edificado existente, pois se pensados de forma indissociável, podem concretizar uma integridade social e física para essas áreas. Observa-se ainda que nos três momentos de intervenções urbanas apresentadas, as intenções privilegiaram os interesses do capital imobiliário e turístico através de parcerias com o setor público, mudanças de uso do solo e criação de espaços imagéticos voltados para o consumo e lazer de parcelas da população com renda mais elevada. Desse modo, o uso habitacional, notadamente a habitação de interesse social, teve papel coadjuvante dentro das estratégias de intervenção, com exceção do caso de Bolonha, na Itália. A análise das intervenções em centros urbanos sob a perspectiva histórica demonstra o quão distantes estão as propostas em relação à demanda da maioria dos cidadãos com renda mais baixa.
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Consequentemente, acentua-se um contexto geral de exclusão social dessa parcela da sociedade e, por conseguinte legitima os problemas da habitação e da segregação socioespacial que estão no cerne dos conflitos urbanos das cidades contemporâneas. No que tange a discussão dos termos, observa-se que a ação de reabilitação urbana se apresenta como uma postura intervencionista mais coerente com a necessidade das cidades contemporâneas, se comparadas às experiências descritas anteriormente. Encarar os centros urbanos como um local que carece de transformações é fundamental para garantir a sustentabilidade urbana, no entanto, modificá-los à luz do capital imobiliário, visando apenas o desenvolvimento econômico e distante da realidade local da população é acentuar conflitos urbanos que muitas vezes ficam disfarçados pela sociedade na qual vivemos. Compreende-se que as discussões dos conceitos trazidas até aqui estão limitadas ao campo teórico de análise, pois na prática, as decisões políticas e econômicas interferem no momento de propor uma intervenção urbana. Questões importantes, como as da propriedade da terra e do capital nem sempre são equacionadas de forma justa, e desse modo, acabam interferindo na exequibilidade dos projetos. Por fim, a título de compreensão deste trabalho, entende-se o termo reabilitação como sendo uma ação que pretende transformação, seja ela em escala urbana, ou apenas ao nível do edifício, no entanto, essas mudanças devem estar em harmonia com um contexto local de preexistências tanto do patrimônio edificado, quanto de populações tradicionais. Estes dois aspectos pensados juntos podem garantir a permanência dos centros urbanos dentro da dinâmica atual das cidades contemporâneas, e por sua vez, a salvaguarda do patrimônio cultural e arquitetônico, bem como promover uma coesão social e territorial.
[2.3.] A problemática por trás da moradia em centros urbanos A moradia é um direito fundamental garantido em várias instâncias políticas e jurídicas. Desde 1948 que a Organização das Nações Unidas, através da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o considera essencial dentro dos padrões de uma qualidade de vida adequada para as pessoas (NAÇÕES UNIDAS, 1948). A própria Constituição Brasileira, em seu artigo 6°, cita o direito à moradia como um dos elementos fundamentais para os cidadãos, que juntamente com o trabalho, lazer, educação, entre outros, cumprem as condições básicas para uma vida digna em sociedade. (BRASIL, 1988).
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No entanto, para a garantia do acesso a esse direito é preciso que se satisfaçam alguns critérios como: segurança jurídica de posse; acesso a serviços de infraestrutura e equipamentos públicos; acessibilidade; habitabilidade; localização apropriada; adequação cultural; além do que, os custos com a casa não devem comprometer a renda familiar (NAÇÕES UNIDAS, 1992 apud BERNADINO, 2011). Como é possível perceber, garantir a efetivação desse direito é um desafio complexo, uma vez que a maioria desses critérios se relacionam diretamente na forma como construímos as nossas cidades, sendo assim, a produção habitacional é uma questão que precisa ser repensada diante dos modelos atuais das cidades contemporâneas. Num primeiro momento, a questão habitacional tornou-se prioritária para as cidades europeias em meados do século XVIII e início do XIX. O fenômeno da Revolução Industrial acarretou uma série de transformações, quer seja ela na estrutura urbana e nas formas de ocupação da cidade, ou da estrutura social com o fortalecimento da economia capitalista. Engels já afirmava em 1872 que “o problema da moradia é parte da estrutura do sistema econômico capitalista, que se
baseia na propriedade privada do solo e na exploração da força de trabalho” (ENGELS, 1872 apud MONTANER; MUXÍ, 2014). A produção dos espaços de moradia está intrinsicamente relacionada com a propriedade privada, segundo já assinalava Engels no século XIX. Desse modo, a habitação, e, por conseguinte, o solo urbano tornou-se objeto de mercadoria, consumo, e como tal passou a ser regido pelo mercado imobiliário que dita, entre outras coisas, quem pode acessá-la. Este aspecto fundamental da questão habitacional acentua a desigualdade social, pois traz à tona as diferenças entre a localização e os tipos de moradia que encontramos nas cidades. Vale ressaltar, que a questão habitacional deve ser analisada de acordo com a conjuntura política e econômica que se encontra aquela sociedade na época. Desse modo, os problemas de moradia só ganham relevância no Brasil quando as cidades brasileiras passaram por um acelerado processo de urbanização, por volta de 1960. A inversão da distribuição populacional entre a zona rural e a zona urbana, demandou uma rápida adaptação espacial, a produção dos espaços de habitação acentuaram o caráter excludente e antidemocrático que rege a lógica da política urbana no Brasil. Para suprir as necessidades de moradia, assim como de trabalho, saneamento, mobilidade, lazer etc. advindos do acelerado fenômeno de urbanização, as cidades brasileiras precisaram passar por um verdadeiro movimento de “construção”, onde intervir no espaço tornou-se essencial dentro dessa nova conjuntura. No entanto, o rumo do crescimento urbano não ocorreu de maneira
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satisfatória, o território passou a ser ocupado, em grande parte, de maneira improvisada. Com isso, as cidades vivenciaram conflitos que até hoje carecem de uma resposta mais assertiva, tanto por parte dos agentes públicos, quanto por parte dos agentes privados (MARICATO, 2002). Em virtude do modelo de desenvolvimento econômico exercido no país, baseado principalmente no poder político relacionado à propriedade privada, as intervenções no tecido urbano sempre tiveram uma dependência por parte do mercado. Os investimentos públicos, invariavelmente favorecem a especulação imobiliária em detrimento da democratização do acesso à cidade. Essa lógica de interdependência entre os agentes público e privado, acaba por ditar o desenvolvimento urbano, Maricato (2002) afirma ainda que: A de te r ior açã o de de te rmi n ado s te rri tório s ur ba no s e a valo riz a ção de out ros re spo n dem a um a co n ju nç ão de i nte re s se s q ue b u sc am a ca pt açã o de re nd a imo bil iári a e do l ucr o de co ns tr uç ão (e ste e spe cia lme nte na s obra s de co n str u ção pe sa da). O s go ver no s e st ad u ai s e mu nici pa is, cap t ura do s po r e sse s age nt es, ori en ta m a di nâ mic a u rb an a p or mei o de obra s que n ão obe de ce m a n e n hu m pl a no ex plíci to. E s s a é a m arc a de u m “ de se n vol v ime nt o” u rb an o do mi na do pe lo s i nte re s se s pri v ado s re n ti st as e l uc ra ti vo s, de um l ad o, e p ela i g nor ân ci a e m re l aç ão a o a s sen ta me nto d a m aio r pa rte da pop ul aç ão, de o utro (MA RIC A T O , 2 0 0 2, p. 13 4, gr if o no sso ).
À custa dessas ações, novas áreas urbanas acabam por se valorizar, tornando-se melhor localizadas, providas de infraestrutura, suscetível ao processo de verticalização e local de moradia das classes médias e altas. Para Tsukumo (2007) estas são as principais características da chamada cidade formal. Em contrapartida, a periferia torna-se a alternativa de ocupação das camadas mais populares, localizam-se geralmente em regiões com infraestrutura precária, distantes do centro, parte dela é resultado da conversão do solo rural em urbano, conformando assim o que se pode chamar de cidade informal (TSUKUMO, 2007). Ainda em se tratando da cidade informal, a falta de acesso a terra força a maioria da população a ocupar áreas inadequadas da cidade, especialmente aquelas ambientalmente frágeis como: beira de córregos, várzeas, mangues e encostas íngremes. A não observância das legislações de uso e ocupação do solo e a consolidação de assentamentos nesses locais geram problemas sociais e ambientais graves como: erosão do solo, poluição e assoreamento de cursos d’águas. Outro aspecto que merece destaque no cenário de produção da cidade formal versus a cidade informal é o processo de autoconstrução4. Enquanto na primeira, a construção e aquisição das moradias acontecem mediante ao atendimento dos parâmetros urbanísticos, na segunda a
Entende-se por autoconstrução a autopromoção de moradias realizada pela população de baixa renda em assentamentos informais das metrópoles brasileiras (SÁ, 2009, p.27).
4
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moradia é produzida sem acompanhamento técnico, fora da lei e em sua maioria desprovida de financiamentos. Em pesquisa recente5, realizada pelo CAU/BR, constatou-se que 85% dos brasileiros constroem sem auxílio de profissionais, sejam eles arquitetos ou engenheiros. Segundo Maricato (2002) e Sá (2009), esse quadro revela a deficiência da ação estatal quanto ao planejamento e ordenação dos espaços públicos nessas áreas, mas principalmente a ineficácia dos planos governamentais na provisão habitacional, pelo menos para a população com renda mensal abaixo de três salários mínimos. Esta faixa de renda “compõe a grande maioria do
déficit habitacional brasileiro e tem sido um recorte muito usual no desenho das políticas públicas de habitação”. (SÁ, 2009, p.28). Observa-se assim, que áreas urbanas, especialmente aquelas mais centrais, que passaram por um processo de valorização adquiriram ao longo dos anos um alto valor de mercado, em virtude das melhorias que aconteceram como resposta ao crescimento da cidade, mas também à especulação imobiliária que, por sua vez, inviabilizou o acesso formal a moradia por parte da população de baixa renda. Desse modo, é preciso salientar a necessidade de uma nova postura em relação à política fundiária habitacional. Garantir o direito a habitação para a parcela da população mais vulnerável é essencial para reverter as desigualdades sociais associadas ao crescimento urbano acelerado, nesse sentido, os programas de moradia em áreas urbanas centrais tem papel extremamente relevante e os movimentos de luta por moradia no centro já levantam essa questão há algum tempo.
[2.3.1.]
Déficit habitacional, estoque imobiliário existente e as ocupações em centros urbanos
Como visto anteriormente, a urbanização acelerada após a segunda metade do século XX, intensificou um processo de esvaziamento e decadência nas áreas centrais. A consolidação de novas centralidades, os efeitos ligados à especulação imobiliária, além da expansão horizontal das cidades alteraram as dinâmicas no espaço intraurbano e dessa forma os centros, notadamente os mais tradicionais, começaram a partilhar sua importância dentro da dinâmica da urbe. Para Bonduki (2010), ao mesmo tempo em que essas novas centralidades se tornavam o local para os mais privilegiados e para investimentos do mercado imobiliário, as áreas centrais atraíram uma quantidade significativa de famílias com renda média/baixa. Segundo o autor, a falta Disponível em:< http://www.caubr.gov.br/pesquisa-caubr-datafolha-revela-visoes-da-sociedade-sobre-arquitetura-eurbanismo/> Acesso em: Janeiro de 2018. 5
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de condições econômicas, as relações sociais, e as facilidades de acesso de que o centro oferece foram os fatores preponderantes para a manutenção desses habitantes. Desde então, a deterioração física do lugar juntamente com a permanência dessa parcela da população se transformara em sinônimo de marginalidade e decadência que supostamente existia nas áreas centrais. Em virtude dessa imagem que se construiu para os centros urbanos, e ainda devido ao reconhecimento das diversas potencialidades dessa região, propostas de intervenções urbanísticas se intensificaram para essas áreas a partir dos anos de 1970 (SIMÕES JR., 1994). Esse ideário por mudanças acabou por consolidar o pensamento hegemônico de que era preciso intervir nas áreas centrais, e assim, as primeiras ações se aproximaram das posturas de renovação/revitalização que estavam em voga nas experiências internacionais. Segundo Tskumo (2007), a reflexão acerca das experiências de intervenção internacionais abriu espaço para a discussão sobre a necessidade de mecanismos que evitassem as consequências do fenômeno da gentrificação, bem como de políticas para habitação de interesse social. No entanto, a questão habitacional não obteve relevância suficiente dentro das propostas nacionais, estando sempre subordinada à reabilitação das áreas centrais, que tinham como plano de ação principal o incentivo a novos usos, notadamente comércio e serviços voltados ao turismo e lazer. A con st ru ção te óri ca da de f esa da ha bi taç ão soc ial n o C ent ro se mp re ma nte ve a q ues tão s ub ordi n ad a à d a re abi lit aç ão d a ár e a. N ão h á te xto s que me ncio ne m a de f e s a da polít ica h abi ta cio nal na áre a ce nt ral de s vi n cul ad a da ne ce ssi da de de re abil ita çã o. P a re ce q ue as d u as q ue s tõe s e s tão i mb ric ad a s, u m a es tim ul a nd o o f ort ale cim e n to d a o utr a: p oi s se a re ab ilit aç ão ne ce ssi ta, n o s eu p rojet o eli ti st a, da li mpez a so cial , o di sc ur so e a s a çõe s ne s se se nti do pro vo ca m a re a ção d os mo vi me nto s s oc iai s do C e nt ro, f o rta lece n d o a l u ta pe l a ha bit aç ão e pelo dire i to de p erm a ne ce r na áre a . (TSUKUMO , 2 00 7, p. 53, grifo no ss o ).
É nesse contexto que os movimentos sociais de luta por moradia ganham força no Brasil, principalmente em São Paulo, onde tal cenário impulsionou ainda outras organizações sociais de resistência como: comerciantes de rua (camelôs), catadores de materiais recicláveis, e trabalhadores do sexo. Estes se somaram a lutam por uma reabilitação com participação e inclusão social (TSKUMO, 2007). Outro aspecto fundamental para o crescimento das lutas sociais por habitação, representado pelas ocupações, está relacionado aos problemas dos programas habitacionais do governo que, por exemplo, intensificam a segregação socioespacial, priorizando a construção de conjuntos nas franjas urbanas, em locais carentes de infraestrutura adequada. Ressalta-se também
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a dificuldade dessa parcela da população em se inserir no mercado formal de aquisição ou de aluguéis, graças aos altos preços praticados pelo mercado imobiliário. De acordo no Neuhold (2009), as ocupações em São Paulo têm como principais integrantes famílias sem-teto e moradores de cortiços ameaçados de despejo. Comumente são formados por
“uma população empobrecida, no geral migrante, com vínculos empregatícios instáveis e baixa escolaridade, que comprometia parte significativa da renda pagando altos aluguéis nos cortiços da área central.” (NEUHOLD, 2009 p.78). Vale destacar também a expressiva presença de mulheres participando destas organizações. De acordo com os depoimentos das líderes do Movimento SemTeto do Centro-SP (MSTC) o gênero feminino sempre foi a maioria nos grupos de discussões, embora esse quadro venha se modificando (NEUHOLD,2009). Apesar dos ganhos da construção coletiva advindas da vida em comunidade, as famílias convivem diariamente com problemas na infraestrutura geral dos edifícios, e especialmente pelo risco iminente das reintegrações de posse. Encontrados em péssimas condições, os prédios ocupados apresentam diversos problemas graças aos anos em desuso. Instalações hidráulicas deficientes, rede elétrica desgastada e sobrecarregada, problemas na superestrutura com ferragens expostas e oxidadas, além do acúmulo de lixo/entulho abandonado. Outro aspecto enfrentado pelos moradores é a adaptação de imóveis que originalmente não foram pensados para o uso residencial (NEUHOLD, 2009). O u so di sti n to da que le pre vi sto no se u pro jeto orig in al e xigi u a da pt aç õ es [ no pré dio da R u a do Ou vi do r, ocu pa do pelo M MC ] q ue , d ian te da f a lta d e re c urs os e d a u rgê nci a de s ua imp leme nt aç ão, re s ult ar a m e m a m b ie nte s i n sal u bre s , de limita do s po r mate riai s i nf l am áv e is ou at é tóxic os, e q ue n ã o re spo n dem s ati sf ator iam en te à de ma n d a dos mor a do re s. [... ] Nos p a vime nt os, a oc u paç ão é c aóti ca, co m un id a de s h ab ita cio na is de vá rio s t am an ho s e q ue nã o gu ar da m q u alq uer rel aç ão com o n ú mero de mora dore s. A s ro ta s de c irc ula ção são ape r ta da s, conf u sa s e mal ilum in ad a s. Es sa oc u pa ção i rreg ul a r pro pici a o ap are cim ento d e e sp aç os ocio sos, e n qu a nto a s pr ópr ia s mor adi a s sã o peq ue na s. A s v ári a s fu n çõe s d e uma c as a se mi s tu ra m n o m es mo e sp aç o e , m ui ta s vez e s, o s c ômo do s s ão se pa ra do s p or c orti n a s. Tam an h a é a exig ui da de do e sp aço que v ara is são e rg uido s no s co rre dore s e na s va ra nd a s. O s b an he i ro s s ão i n suf i cie nte s e há f i la s p ara u tiliz ar o s ch u ve ir os. A s it ua ção é ag r av ad a pela exi stê nc ia de v a sos s a nit ário s e pon to s de ág ua que br ado s. É nos b a nhe iro s q ue as ro u pa s e louç a s sã o la va da s. A pe sa r d a f alt a de esp aço, du a s áre as g ra nde s, no seg u ndo e no qu art o an da res , f oram re s erv ad as par a a s ati vi da de s cole t iv a s do s ocu pa nt e s e m cla ra si naliz a ção d a im por tâ nci a de ma nt er a org an iz a ção con st ru íd a no mo vime nt o d e lu ta po r mo ra dia ( SA NT OS et al , 20 0 2 apud NEUHOLD, 2009, p. 85 , grifo nosso ).
A caracterização feita por Santos et al (2002) para o prédio da Rua do Ouvidor em São Paulo, assemelha-se às diversas adaptações em outras ocupações tanto na capital paulista, quanto
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em outras cidades. Na ocupação Prestes Maia, segunda maior da América Latina, diversos problemas são encontrados. Segundo Cruz (2015), o não funcionamento do elevador dificulta a mobilidade dos moradores, os banheiros e a lavanderia são coletivos criando filas de espera, o mofo e o bolor são recorrentes devido às infiltrações. Numa das análises do Corpo de Bombeiros foi constatado o risco de incêndio devido a instalação elétrica exposta, botijões de gás confinados, e divisórias em material inflamável (madeira). A falta de extintores e de rotas de fugas seguras corrobora para esse cenário. Figura 11 - Instalação elétrica exposta e infiltração no teto da Ocupação Prestes Maia
Fonte: CAMARGO, 2010
Figura 12 - Fachada Principal do Edifício da Ocupação Prestes Maia
Fonte: SOUZA, 2017
De acordo com Souza (2017), o antigo prédio da Companhia Nacional de Tecidos, abriga hoje aproximadamente 470 famílias e acumula uma dívida de IPTU de aproximadamente R$ 9,1 milhões. Recentemente, na gestão de Fernando Haddad, a propriedade foi desapropriada e a Prefeitura Municipal de São Paulo buscou viabilizar juntamente com os moradores a reforma do prédio para conversão em habitação de interesse social. Assim como em São Paulo, a Ocupação Chico Mendes em Maceió ocorreu em um edifício vertical abandonado. A propriedade em questão trata-se da antiga agência do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) localizada na Rua do Comércio, às margens da Praça Palmares (ver figura 13 e 14). O prédio foi ocupado num primeiro momento em 2006, e abrigou em média 280 famílias de origem rural que tinha uma relação direta com a vida no campo. A dificuldade em se adaptar à convivência condominial, foi um dos complicadores enfrentados pelos ocupantes àquela época. (NOBRE, 2009).
H.I.S.: Um uso negligenciado em Centros Urbanos | 41 Figura 13 - Entorno imediato do antigo prédio do INSS
Fonte: GOOGLE STREET VIEW (adaptado pelo autor), 2017
Figura 14 - Fachada vista da Rua do Comércio
Fonte: MACÁRIO, 2013
Anos mais tarde, mais precisamente em junho de 2013, o edifício abandonado voltou a ser alvo de ocupação, dessa vez por famílias despejadas de uma favela no bairro da Santa Lúcia. De acordo com Madeiro, em 2015, as 120 famílias sofriam com a precariedade das instalações prediais, a falta de segurança e a insalubridade devido ao acúmulo de lixo no local. Não havia banheiros nem abastecimento de água, as paredes estavam danificadas, os fios da iluminação clandestina aumentavam o risco de incêndio e a presença de animais peçonhentos era constante. (MADEIRO, 2015). Figura 15 - Infraestrutura inadequada em uma das circulações do prédio do INSS
Fonte: MACÁRIO, 2013 Figura 17 - Lixo acumulado no pátio central do antigo prédio do INSS
Fonte: MACÁRIO, 2013
Figura 16 - Um dos cômodos improvisados pelas famílias da ocupação
Fonte: MACÁRIO, 2013 Figura 18 - O acúmulo de lixo na ocupação do antigo prédio do INSS
Fonte: MACÁRIO, 2013
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A situação precária em que se encontrava a ocupação do antigo prédio do INSS em Maceió e a ocupação Prestes Maia na capital paulista, demostram a realidade de inúmeras famílias que habitam nos centros urbanos brasileiros. Assim como nas áreas centrais, as problemáticas com moradia extrapolam esses limites e são recorrentes em todo território urbano, resultado de um modelo de desenvolvimento econômico e político desigual. Dados do último censo demográfico comprovam o acelerado crescimento da população em favelas, pois entre 2000 e 2010 a população nessas áreas cresceu 75%, enquanto que a população brasileira aumentou apenas 12,3%. (IBGE, 2010 apud POLIS, 2012). Em vista dessa questão, há alguns anos é estimado no Brasil o déficit habitacional, indicador que mede as necessidades habitacionais da população brasileira a fim de se construir políticas públicas voltadas para essa questão. De acordo com a Fundação João Pinheiro6, órgão oficial que levanta os dados para o governo federal, o déficit pode ser entendido de duas maneiras: a
“necessidade de construção de novas moradias para a solução de problemas sociais e específicos de habitação detectados em certo momento”, e ainda, a inadequação de moradias que, “reflete problemas na qualidade de vida dos moradores: não está relacionada ao dimensionamento do estoque de habitações e sim às suas especificidades internas.” (FJP, 2017, p.10). Para o ano de 2015, os resultados preliminares da FJP mostram que o déficit habitacional no Brasil chega a 6.186.503 domicílios, sendo o Sudeste e o Nordeste as regiões que mais se destacam nacionalmente. Entre os itens que compõem o indicador, o ônus excessivo com aluguel7 e a coabitação familiar8 são os que apresentam maiores percentuais de participação (FJP, 2017). Em se tratando de Alagoas, a condição habitacional é semelhante à conjuntura no Brasil, onde o elevado custo mensal com moradia e a existência de famílias conviventes representam 49,5% e 33,3%, respectivamente. No estado ainda, o déficit habitacional urbano representa o número de 78.675 domicílios, enquanto na área rural, esse número chega aos 16.667, perfazendo um total de 95.342 em todo estado. Como é possível observar, o custo com a moradia no Brasil é um fator preponderante quando se trata de habitação. Não é por acaso, que parte das famílias que vivem em ocupações nos centros urbanos encontrou nesse modo de morar “improvisado” uma forma de superar os custos
Entidade do governo de Minas Gerais que produz dados estatísticos e indicadores econômicos, financeiros, demográficos e sociais voltados o desenvolvimento do estado e do país. 7 Famílias com renda de até três salários mínimos que despendem 30% ou mais da sua renda com aluguel (FJP, 2017). 8 Compreende a soma das famílias conviventes secundárias (apenas aquelas que têm intenção de constituir domicílio exclusivo são consideradas déficit habitacional) e das que vivem em domicílios localizados em cômodos – exceto os cedidos por empregador. (FJP, 2017) 6
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excessivos com o aluguel. De acordo com os dados da FJP, as famílias que possuem renda de até três salários mínimos são aquelas mais atingidas pelo déficit. No ano de 2014, por exemplo, 83,9% do total do déficit habitacional urbano estavam concentrados nessa faixa de renda (FJP, 2016). Outro aspecto observado, tanto nos estudos da Fundação João Pinheiro, quanto no último censo demográfico, é o número expressivo de domicílios vagos no país. Em 2010, o IBGE contabilizou 6,07 milhões de domicílios vazios, número próximo ao déficit habitacional naquele mesmo ano (6,490 milhões de unidades). Ainda em 2014, o cenário se manteve pois, das 7,241 milhões de habitações sem uso no Brasil, 6,354 milhões tinham condições de serem ocupadas. Analisando-se tais resultados, verifica-se um paradoxo, se há tantos imóveis vazios porque não os ocupar? A resposta a este questionamento não é tão simples, primeiramente é necessário um aprofundamento na caracterização desses imóveis visando compreender sua tipologia, e, sobretudo identificar qual parcela da população poderia ser direcionada para suprir essa demanda. Especulase ainda, que uma quantidade relevante desse montante seja voltada ao mercado imobiliário, para um consumidor com poder aquisitivo que consiga se inserir no mercado formal de habitação. Sendo assim, as famílias com renda média mensal de até três salários mínimos, aquelas mais atingidas pelo déficit habitacional, não se enquadram no perfil (FJP, 2016). Entretanto, a quantidade de imóveis que se encontram em desuso, vazios e/ou abandonados nas áreas centrais é relevante. Na área central da cidade de São Paulo são contabilizados mais de 200 prédios inteiramente vagos, alguns deles pertencentes a empresas e fundos públicos. Em outras capitais como Recife e Rio de Janeiro os imóveis vagos representam 18% total de domicílios da área urbana. (MINSTÉRIO DAS CIDADES, 2008). Entre os patrimônios privados, que em sua maioria são objeto de especulação imobiliária, as edificações abandonadas apresentam-se em disputa na justiça ou com dívidas em impostos, como o IPTU. Segundo o Ministério das Cidades (2008), existem também edifícios abandonados pertencentes ao Governo Federal em várias capitais, a maioria é propriedade do Fundo Geral da Previdência Social (FGPS), do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), do Patrimônio da União (SPU) e à extinta Rede Ferroviária Federal (RFFSA). Todos construídos entre as décadas de 1940 e 1960 que se encontram sem função nos dias atuais. Essa condição de abandono está em descumprimento àquilo que está previsto no Estatuto da Cidade (Lei n°10.257, 2001), que define que toda propriedade deve desempenhar sua função social. Através dos Planos Diretores, os municípios devem prever e implementar instrumentos urbanísticos (utilização compulsória, IPTU progressivo no tempo e desapropriação) que induzam ao
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proprietário a dar uso ao seu patrimônio, fazendo assim a gestão do solo urbano e impedindo que haja tantos imóveis abandonados à espera de valorização. Visando contribuir para a reutilização desses imóveis ociosos, o governo federal através do Ministério das Cidades firmou parceiras com instituições públicas como a RFFSA e o INSS para permitir a alienação de edifícios vazios ou subutilizados para programas de regularização fundiária e de provisão de habitação de interesse social. Dessa forma, tais propriedades deixam de onerar o setor público e passam a cumprir a sua função social, garantindo o direito à cidade àqueles menos privilegiados. Outro fator que tem contribuído para implementação de projetos de habitação de interesse social nas áreas centrais está na ação dos movimentos de luta por moradia, mas também graças ao trabalho das assessorias técnicas que buscam realizar estudos que auxiliem a execução de projetos autogestionários (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2008). Considerações Parciais Entende-se que as questões relacionadas à habitação social nas áreas centrais vai além do debate abordado neste tópico, entretanto foi possível elucidar questões cruciais para este trabalho a exemplo da forma como gerimos o solo urbano, a maneira em que ocorre as ocupações, como vivem as famílias que lutam por uma moradia digna no centro, o conflito existente entre déficit habitacional diante do número relevante de imóveis em abandono, e principalmente a demanda projetos habitacionais adequados para essa camada da população. A princípio, compreende-se que a vida nas grandes metrópoles tem demandado necessidades próprias do ambiente urbano, ao longo dos anos estas demandas vêm transformando o modo como construímos as cidades e principalmente como a ocupamos. A moradia tornou-se alvo de discussão quando houve um acelerado processo de urbanização, e o contingente populacional que chegou às áreas urbanas em busca de melhores condições de vida e trabalho precisaram de local para se abrigar. Desde então, a forma como moramos está intimamente ligada à estrutura social daquele lugar e especialmente na forma como intervimos nas cidades. Desde que foi reconhecido como um direito fundamental, a habitação sempre foi um desafio para aqueles que pensam a cidade. Imbricada de fatores variados, a produção da moradia sempre esteve relacionada com a propriedade privada da terra. Além disso, a interdependência entre alguns atores que intervêm nas áreas urbanas (poder público e poder privado) privilegiam algumas regiões das cidades e um tipo de mercado que impossibilita o acesso daqueles com renda mensal abaixo de
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três salários mínimos. Como consequência, existe o fortalecimento da especulação imobiliária em detrimento da democratização do acesso à cidade, constituindo assim, o cenário de desenvolvimento das grandes metrópoles nacionais. Em contraponto a esse cenário, a construção coletiva empreendida pelos movimentos de luta por moradia no centro visa subverter essa lógica de desigualdade. As ocupações nas áreas centrais acontecem, entre outras razões, não só para mostrar a ineficiência de programas habitacionais para populações de baixa renda, mas sobretudo puderam denunciar o número expressivo de imóveis que não cumprem sua função social e que poderiam ser convertidos em unidades habitacionais no centro. Outro aspecto que deve ser ressaltado acerca dos movimentos sociais é consciência coletiva de que os centros urbanos, principalmente aqueles em decadência, devem também ser locais de moradia digna para àqueles menos favorecidos. Tal pensamento, modifica um paradigma histórico das políticas habitacionais que buscam nas zonas periféricas a produção de moradias para a população de baixa renda. Considerando que nas cidades contemporâneas existe uma concentração de investimentos, infraestrutura e capital em determinadas regiões, conformando aquilo que Neuhold (2009) chama de “ordem urbana com possibilidades díspares”, as famílias que vivem em ocupações transformam-se em atores protagonistas na construção de uma cidade menos desigual, buscando reverter essa ordem urbana em voga. Apesar da legitimidade das populações de baixa renda habitarem as regiões centrais, os levantamentos mais recentes acerca dos domicílios vagos comprovam a quantidade expressiva do estoque imobiliário em desuso nestas áreas. Diversos autores como: Bonduki (2010), Maricato (2002), Milano e Bonadio (2013) afirmam que a reabilitação das áreas centrais é uma estratégia oportuna para a gestão das cidades, pois o incentivo ao uso habitacional nos centros produz uma ocupação urbana mais democrática e sustentável. Já Cardoso (2012), apresenta uma justificativa mais técnica. Sob o viés preservacionista, a manutenção e o estímulo de moradias em centros históricos são essenciais no processo de sua preservação, sendo uma ação recomendada expressamente nas Cartas Patrimoniais9. Além disso, a reutilização dos imóveis vazios/ociosos contribui para a redução do quadro de déficit habitacional, sendo o ônus excessivo com o aluguel e a coabitação familiar, os indicadores que mais precisam ser
São documentos doutrinários produzidos por especialistas em patrimônio que contém diretrizes, conceitos e ações administrativas voltadas a preservação, conservação e restauro de bens histórico, artístico e culturais.
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trabalhados quando se pensa nas necessidades habitacionais dos brasileiros que possuem renda entre um a três salários mínimos. Isto posto, encarar a reabilitação das áreas centrais como uma das formas de trabalhar as questões da habitação social é uma realidade. Entretanto, antes de qualquer ação por parte dos planejadores, é preciso que se adote uma nova postura em relação à questão fundiária urbana, visando atingir a diminuição da injustiça social no território. Além disso, o processo de reabilitação, entendido como uma estratégia de gestão, pressupões lidar com certas complexidades. Ao longo desta pesquisa, foi possível elencar quatro variáveis que estão associadas às barreiras para efetivação de projetos, são elas: a variável política, a variável humana, a variável externa e a variável projetual. Na variável política, as dificuldades relacionam-se à falta de interlocução das três esferas de poder, impedido uma articulação entre os programas habitacionais e os projetos de reabilitação, bem como as dificuldades com os meios técnicos e financeiros que impedem os governos de assumirem a responsabilidade pelas intervenções nos imóveis, sendo necessária a participação dos agentes privados. Ressalta-se que, o principal programa habitacional em esfera federal está voltado essencialmente para a construção de novas moradias, em detrimento do melhoramento do estoque imobiliário ocioso existente. Dessa forma, criar linhas de financiamento específica para a aquisição de imóveis sem uso e para projetos de reforma em prédios já ocupados por movimentos sociais são fundamentais para o êxito de planos de reabilitação em áreas centrais. Consequentemente, incentiva-se a criação de outros projetos de habitação de interesse social. Há ainda as variáveis externas, que se referem a aspectos indiretos inerentes aos planos de reabilitação, a exemplo da especulação imobiliária e dos processos de enobrecimento a que estão associadas as grandes intervenções urbanas. Denominado de gentrificação, esse fenômeno ocasiona uma transformação física, econômica, social e cultural em áreas sujeitas a projetos urbanísticos, havendo consequentemente uma valorização no mercado fundiário e imobiliário que promove a exclusão social daqueles menos favorecidos, mas principalmente a expulsão de populações que porventura já ocupavam estas áreas. No intuito de evitar a exclusão social e, por conseguinte o fenômeno da gentrificação, os projetos de reabilitação devem incorporar em suas diretrizes a utilização de instrumentos urbanísticos do Estatuto da Cidade (Lei n°10.257, 2001) que regulem o uso das terras urbanas em benefício da sociedade, dessa forma é possível haver a recuperação de mais-valias fundiárias, além de equilibrar os ônus e os bônus advindos das urbanizações. Outros limites dentro dessa variável
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relacionam-se à propriedade dos imóveis, que na maioria dos casos são privados e os proprietários não se preocupam com a sua conservação. Os limites que se referem às variáveis projetuais dizem respeito aos custos elevados de aquisição e recuperação dos imóveis; à dificuldade em se adequar às legislações vigentes, uma vez que as recomendações contidas nelas são previstas, em sua maioria, para novas construções; em áreas de preservação rigorosa existem ainda as restrições voltadas à proteção do patrimônio como critérios construtivos, limites de gabarito e respeito à volumetria original (CONDER/BA, 2014). Além disso, a configuração espacial e as tipologias arquitetônicas, em alguns casos não se adequam aos critérios atuais de conforto ambiental (ventilação e iluminação), acessibilidade, dimensionamento de circulação e segurança. Zmitrowicz e Bomfim (2007) acrescentam quem este tipo de intervenção exige uma série de etapas10 precedentes ao desenvolvimento do projeto, bem como a qualificação profissional e um apuro tecnológico na escolha dos materiais e na adoção de soluções técnicas, visando projetos menos invasivos, mais duráveis e mais adequados a intervenções em imóveis existentes. Hoje, estas áreas congregam uma grande diversidade de perfis de moradores, notadamente aquelas que vivem em ocupações em prédios abandonados, a falta de conhecimento acerca da forma como esses grupos vivem e o não reconhecimento do direito à cidade para esta população por parte daqueles que intervêm no espaço urbano representa um paradoxo sob o ponto de vista de uma cidade mais sustentável. Sendo assim, é imprescindível que os planos incluam a participação social através de conselhos gestores, uma vez que o espaço urbano é construído de significados culturais, sociais e históricos que devem ser trabalhados em favor da coletividade. Todos estes aspectos estes aspectos estão relacionados à variável humana. Portanto, para administrar as questões da moradia social no centro é preciso, superar o paradigma da desigualdade na ocupação urbana e proporcionar o direito à cidade à população mais pobre. Sabe-se que é um desafio conciliar os ganhos dos investimentos econômicos e a retomada do interesse das pessoas em ocupar estas áreas sem transformá-las em locais de exclusão social e especulação imobiliária. Dessa forma, o uso habitacional, principalmente aquele voltado para população de baixa renda, deve ter papel de destaque dentro dos planos de reabilitação urbana, pois estes têm o poder de frear o processo de valorização que gera especulação (MARICATO, 2002).
Diagnóstico das condições físicas, jurídicas e financeiras, levantamento de parâmetros legislativos, recomendações e exigências dos órgãos financiadores (ZMITROWICZ; BOMFIM, 2007, p. 75)
10
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Enfim, entende-se que no Brasil a construção de novas moradias ainda é uma situação inevitável, chegando a ser um aspecto cultural da nossa população diante do processo de urbanização que ainda acontece no país. Porém, o cenário de esvaziamento dos centros e o estoque imobiliário ocioso são indicadores de grande potencial para a reabilitação urbana, mas sobretudo uma maneira de incentivar a habitação social nos centros metropolitanos. Por fim, entende-se que os processos analisados até aqui são complexos e envolvem diversos atores e contextos, sejam eles políticos ou culturais, no entanto, o conhecimento dessas variáveis já é um avanço considerando a necessidade de elaboração de projetos arquitetônicos voltados para os centros urbanos. Tendo em vista o elenco dessas variáveis, a elaboração da proposta de reabilitação do Trapiche Jaraguá não tem a pretensão de transpor todas elas, e sim lidar com os aspectos da variável humana, no que tange ao perfil de moradores, bem como os aspectos da variável projetual, relacionados à legislação que incide sobre a área e das soluções técnicas que se adequem ao perfil de habitação social e ao monumento histórico.
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[3.]
CONHECENDO O TERRITÓRIO: O JARAGUÁ ENQUANTO SÍTIO HISTÓRICO URBANO EM MACEIÓ
Diante do exposto no capítulo anterior, compreende-se que as temáticas relacionadas à habitação de interesse social e à decadência de centros históricos são questões latentes para as cidades. Em Maceió não é diferente, no ano de 2010 o déficit habitacional na capital representava a ordem de 42.261 unidades (FJP, 2010), enquanto isso, as áreas históricas mais representativas (Centro e Jaraguá) sofrem com a desvalorização e descaracterização do seu patrimônio construído. Como o objetivo geral desse trabalho é aliar habitação de interesse social em áreas centrais históricas, convencionou-se escolher a ZEP-01 – Jaraguá por alguns motivos. O primeiro deles é pelo bairro já ter sofrido um processo de intervenção urbanística nos anos 1990, que priorizou os usos voltados para o lazer e turismo, e não obteve êxito a longo prazo, sujeitando o bairro a um novo momento de esvaziamento e decadência. O segundo relaciona-se ao atual estado de conservação do sítio histórico urbano, uma vez que Jaraguá apresenta sua paisagem menos descaracterizada comparado às outras ZEP’s de Maceió. E por fim, a localização estratégica dentro da dinâmica urbana atual habilita o bairro a ser local de moradia tanto pela disponibilidade de infraestrutura instalada, quanto pela facilidade de acessos. Sendo assim, neste capítulo busca-se abordar questões relativas ao território, desde seu processo de formação, passando pelo período de revitalização, assim como aspectos legais/normativos, e principalmente a significância cultural dos monumentos que compõem o sítio histórico. Pretende-se a partir daqui, entender como o processo de intervenção consolidou um novo momento de decadência no bairro, bem como construir um perfil socioeconômico da população local. Além disso, objetiva-se ainda a estruturação de um referencial teórico para características de funcionalidade e estética necessárias ao projeto, apreensão das limitações de legislação da zona ZEP-01 e o estado de conservação atual do Trapiche Jaraguá. [3.1.] O bairro do Jaraguá e seu processo de revitalização: Os desdobramentos atuais O caráter portuário do bairro Jaraguá é uma herança advinda desde os primórdios de formação do sítio. A atividade comercial, os fluxos de trocas e de pessoas começaram a ocorrer no século XIX e se intensificaram até a década de 1950, nesse período a área se consolidou como uma centralidade, fazendo parte da dinâmica urbana e sendo responsável pelo progresso maceioense. Apesar do desenvolvimento econômico, o século XX é marcado pela precariedade da infraestrutura,
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“não era por mais nem por menos que Jaraguá tinha um aspecto desagradável. Muito progresso muita gente trabalhando junta e confinada [...], querendo viver o início do século [...]” (PEDROSA, 1998, p. 70). Além da deficiência na infraestrutura, o pensamento higienista que dominava a capital alagoana entre o fim do século XIX e início do XX afastou as famílias mais abastadas que habitavam o Jaraguá (ver figura 19), estas foram em direção aos novos bairros da cidade, notadamente aqueles mais afastados do mar. Naturalmente, o desinteresse dos mais ricos em ocupar estas áreas abriu espaço para usos menos valorizados, principalmente para as moradias populares daqueles que tinham relação direta com o bairro (SOUZA, 2016). No ano de 1940 é dado início a construção do Cais do Porto (ver figura 20), essa nova construção trouxe impactos significativos na dinâmica local. A ponte de embarque e desembarque foi desativada e os trapiches, edificações que marcavam a paisagem do lugar, adquiriram novos usos, funcionando como grandes depósitos, estacionamentos e mais futuramente como agências bancárias (OLIVEIRA, 2009). Figura 19 - Sobrados da Rua Sá e Albuquerque
Fonte: Acervo fotográfico do MISA
Figura 20 - Construção do Cais do Porto em 1940
Fonte: Acervo fotográfico do MISA
Para Oliveira (2009) e Souza (2016), a inauguração do Cais do Porto em 1942 garantiu algumas melhorias sob o ponto de vista de infraestrutura, no entanto, marca a saída das famílias mais abastadas que ainda habitavam a área. É nesse momento que o Jaraguá se torna o local da boemia em Maceió. Em virtude dessa nova conjuntura, a área demonstra os primeiros sinais de decadência, transformando-se num lugar de passagem e de negócios em função do comércio e do porto instalado. Após a década de 1950, as novas centralidades que começaram a se estabelecer em Maceió trouxeram para o bairro o período de estagnação, “Jaraguá que um dia foi palco do
progresso, das famílias ricas, e até mesmo da vida boêmia, parecia definhar.” (SOUZA, 2016, p.
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30). Seu tecido urbano passou por um processo de degradação, alguns prédios foram descaracterizados e outros demolidos, como o Trapiche Faustino, demolido em 1979 e que atualmente abriga uma das agências do banco Bradesco (OLIVEIRA, 2009). Em face daquela condição de degradação progressiva em que se encontrava e por abrigar a história do desenvolvimento da cidade, no ano de 1984, o bairro foi tombado pelo governo estadual sob o decreto nº 6.061 como patrimônio histórico, artístico e natural. Tal ação vem com o propósito de preservar as características do espaço urbano, dos monumentos, dos bens imóveis e das áreas verdes, bem como seu acervo cultural. O polígono de tombamento é delimitado por um perímetro que compreende a Rua do Uruguai, a Av. Maceió, passando pela Travessa dos Guajararas e Rua Epaminondas Gracindo, se estendendo pelo Oceano Atlântico até encontrar o prolongamento da Rua do Uruguai, abrangendo boa parte dos limites do bairro (ALAGOAS, 1984) Figura 21 - Perímetro de tombamento estadual do Jaraguá
Fonte: SEMPLA, 2011 (Adaptado pelo autor)
Apesar da ação de tombamento, o processo de degradação do bairro continuou. A consolidação de novas centralidades na planície litorânea, como Pajuçara e Ponta Verde, e a falta de ações institucionais que aportem recursos para preservação do Jaraguá, após ação de tombamento podem explicar a sua subutilização. Dessa maneira, em 1993, é dado início a parceria entre município e estado de Alagoas através do PRODETUR/NE11 com o objetivo de capitalizar recursos para futura intervenção. PRODETUR: Programa do Ministério do Turismo que busca organizar as intervenções públicas para o desenvolvimento da atividade turística, através do planejamento das regiões turísticas. O Banco Interamericano de Desenvolvimento
11
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Para guiar as ações no bairro, a Prefeitura Municipal contratou a elaboração do Plano Setorial de Desenvolvimento Urbano (1995), cuja finalidade era caracterizar a área de intervenção e estabelecer diretrizes e parâmetros para a reestruturação urbana do Jaraguá, visando a maximização das suas potencialidades enquanto local de interesse cultural, histórico e turístico em Maceió. O PSDU foi construído em três etapas, a primeira delas consistiu do levantamento de dados físico territoriais e socioeconômicos objetivando a produção do diagnóstico referente a estrutura urbana da área. Na segunda etapa, a análise dos dados foi substancial para a determinação das potencialidades e fraquezas que precisavam ser trabalhadas. Por fim, a terceira etapa consistiu nas proposições referentes aos problemas encontrados, sendo que as diretrizes construídas seriam incorporadas como leis ou decretos na legislação vigente daquela época (PSDU, 1995). Após a elaboração do plano, as intervenções no bairro começaram a ser realizadas em 1996 sob a responsabilidade da UEM (Unidade Executora Municipal), órgão ligado à Secretaria de Planejamento que coordenava e executava o Projeto de Revitalização do Jaraguá. Dentre as ações postas em prática destacam-se a restauração dos monumentos mais marcantes (MISA e Associação Comercial), o melhoramento na infraestrutura como a recuperação de pavimentos e calçadas, o enterramento da rede elétrica na Rua Sá e Albuquerque, além da recuperação dos espaços públicos como a Praça Dois Leões. O incentivo fiscal previsto na lei n° 4.545 de 1996 estimulou ainda o aparecimento de novos usos, especialmente aqueles voltados para o lazer como restaurantes, bares e casas de festa, resgatando assim a vida noturna no Jaraguá. A escolha do bairro do Jaraguá como local de concentração dos investimentos do PRODETUR/NE tinha como principal argumento a dinamização da economia por meio do turismo. O setor agroindustrial baseado na monocultura da cana-de-açúcar, marca da economia alagoana, caracteriza-se pela alta concentração de renda e pela pouca geração de atividades produtivas, para superar esse caráter e ampliar o mercado de trabalho, gerando emprego e renda, a Prefeitura Municipal vislumbrou no patrimônio histórico e cultural do Jaraguá uma forma de dinamizar a economia local (PSDU, 1995). Ma ce ió p os s ui co n diçõ e s e x t r ema men te f a vo rá vei s p ar a o inc reme nto do tur is mo, f ato q ue ve m se ndo com pro v ado pe lo c res ce nte din ami s mo des te se to r no M u nicí pio e no re sta nte do E sta do. Tal a ti vi da de , e n tre t a nto, te m sid o p au ta da f u nd ame nt alme nte no s ri co s rec ur so s na tu ra is de q ue d is põ e a ci da de , e m detr ime nto da i nco rpo raç ão do p o te nc ial amb ie nt al ex pre s so (BID) é uma das instituições que atuam como financiadores internacionais. Fonte: Site oficial do Ministério do Turismo. Disponível em: < http://www.turismo.gov.br/programas/5066-prodetur.html> Acesso em: 01 de abr. 2017.
56 | Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano p elo p at rimô ni o edifi ca do d o Bai rro d o J ar ag uá e d o C en tr o, q ue po deri am a t ua r com o at ra ção tu rí stic a, ofe re ce n do ao s vi sit a nt es um a op çã o c ul t ur al de e n tre te n ime nt o e , ao m es mo te mp o, p ro ven d o u m re tor no s u b st a nti vo pa ra u ma ad min i str aç ão a uto s su s te n tá ve l . (PS DU, 1 99 5, p. 09 - 1 0, grif o n os so).
Como é possível constatar, o discurso trazido no Plano Setorial de Desenvolvimento Urbano do Jaraguá assemelha-se às posturas intervencionistas de Reinvenção Urbana que ocorreram no início dos anos 1990. Sob essa perspectiva, entende-se que a revitalização desse sítio histórico foi orientado pelas ações do planejamento de mercado e de técnicas de marketing urbano que visavam sobretudo, a recuperação da economia urbana, bem como a reinvenção de áreas da cidade como local de consumo para investidores, turistas e usuários de mais alta renda. Num primeiro momento, os resultados da revitalização do bairro se mostraram satisfatórios para cidade. Segundo dados obtidos com Unidade Executora Municipal (1996 apud ABREU, 2005, p. 146), os investimentos do programa proporcionaram a criação de aproximadamente oito mil empregos formais e informais durante o período das obras de construção civil e após a conclusão houve o incremento de 41 novos empreendimentos privados, mas nenhum deles para o uso habitacional. Outro aspecto que merece ser apontado (como positivo à luz da reinvenção urbana) é o aumento no preço do metro quadrado dos imóveis do bairro. Curiosamente os imóveis considerados ruins sob o ponto de vista do estado de conservação tiveram uma taxa de crescimento de aproximadamente 27% (ABREU, 2005). Tabela 1 - Evolução Comparativa do preço do m² dos imóveis no Jaraguá por estado de conservação
1998
2000
Taxa de crescimento (%) 1998/2000
Bom
R$ 171,58
R$ 210,48
10,76%
Regular
R$ 120,23
R$ 150,89
12,03%
Ruim
R$ 55,84
R$ 89,67
26,72%
Estado de Conservação
Valor do m² a preço de liquidez
Fonte: Plano de Desenvolvimento do Turismo Integrado e Sustentável – Polo Costa dos Corais, 2002 apud ABREU, 2005.
Contudo, as iniciativas postas em prática no Jaraguá não foram suficientes para manter a atratividade do local. Anos mais tarde foi possível identificar um período de estagnação dos investimentos privados e uma mudança de usos no perfil de ocupação dos imóveis. “Os usos
noturnos cedem lugar ao uso diurno e vespertino, e os estabelecimentos festivos de
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entretenimento, ao fecharem, abriram espaço para escritórios e estabelecimentos comerciais e de serviço” (MEDEIROS, 2011 apud SOUZA, 2016, p. 32). Em virtude desse novo cenário, o fluxo de turistas e da população decaiu juntamente com o movimento de pessoas que se restringiu aos horários comerciais inaugurando mais um processo de decadência e desvalorização no bairro. Visando reverter esse processo, a Prefeitura de Maceió, por meio da Secretaria Municipal de Turismo, lançou em 2016 o projeto Jaraguá Vivo na tentativa de atrair tanto turistas, quanto maceioenses. A criação de um roteiro cultural pelo sítio histórico tinha como propósito dar mais vitalidade ao bairro, proporcionando o resgate cultural através da visitação aos principais museus, bem como a realização de apresentações folclóricas nos espaços públicos. As ações do projeto aconteceram no período noturno, inicialmente às terças-feiras, em seguida passaram a ocorrer às sextas-feiras devido à baixa temporada de turistas e deixou de acontecer no fim daquele mesmo ano. Recentemente, parte do território do Jaraguá vem sendo estudado com vistas a elaboração de um dossiê solicitando o seu tombamento em esfera nacional. O processo de levantamento foi executado pelo corpo técnico do IPHAN/AL juntamente com graduandos do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFAL que em seus resultados constataram a continuidade do processo de esvaziamento e subutilização dos bens imóveis. Como exemplos, pode-se citar o fechamento de duas instituições educacionais: a Faculdade Estácio/FAL (ver figura 22) na Rua Sá e Albuquerque e a Escola Estadual Ladislau Neto (ver figura 23) na Rua Barão de Jaraguá. Figura 22 - Antiga sede da Faculdade Estácio/FAL
Fonte: Disponível em:<goo.gl/TdCNTp> Acesso em: 10 de fev. 2017
Figura 23 - Prédio da Escola Estadual Ladislau Neto
Fonte: Disponível em:<goo.gl/6Mgq3D> Acesso em: 10 de fev. 2017
Observa-se, que ações para revitalização do bairro, a longo prazo, não lograram sucesso
“pelo fato do programa não ter se concentrado em recuperar a área no sentido de oferecer novos usos que se relacionassem à realidade da população local (...)” (ATAÍDE, 2015, p.74). A falta do incentivo ao uso residencial constitui-se como fator fundamental para o seu esvaziamento,
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distanciando os usuários e influenciando em sua dinamicidade (SOUZA, 2016). Para Abreu (2005), o alto custo associado aos usos turísticos afastou a população local, pois estes não puderam nem usufruir nem investir nesta atividade. Encarar a atividade turística como única forma de desenvolvimento econômico e de preservação do patrimônio histórico e cultural é, de certa forma, insustentável. Os territórios que se submeteram a esse modelo de revitalização, cujo enfoque se deu no sentido da criação de cenários destinados a fruição turística, cultural e de lazer distanciaram esses espaços cada vez mais da dinâmica da cidade. Além da degradação física dos imóveis e dos espaços públicos, o Jaraguá apresenta ainda uma tendência de esvaziamento populacional, que segundo Vargas e Castilho (2015), é um processo comum associado aos centros antigos após a década de 1950 em virtude da expansão urbana e das novas formas de ocupação da cidade. Os dados dos últimos três Censos Demográficos do IBGE (ver Gráfico 01) demonstram esse movimento de evasão populacional do bairro. Entre 2000 e 2010, a população que residia no Jaraguá diminuiu 22%. Fazendo-se uma comparação com a cidade de Maceió (ver Gráfico 02), percebe-se que enquanto a população maceioense cresceu nos últimos 19 anos, a população residente do Jaraguá decresceu. Gráfico 1 - Evolução Populacional Jaraguá
Gráfico 2 - Evolução Populacional Maceió
3817
Maceió
4166 3211
1 1991
2 2000
3 2010
Ano Fonte: IBGE (Adaptado pelo autor), 2018
N° de Habitantes
N° de habitantes
Jaraguá
932.748 797.759 583.343 1 1991
2 2000
3 2010
Ano Fonte: IBGE (Adaptado pelo autor), 2018
O esvaziamento populacional pode estar associado ainda a alguns outros motivos. Após as intervenções sofridas ao longo dos anos, o bairro adquiriu um caráter comercial e de serviços, principalmente aqueles voltados às atividades do porto, tais características desestimulam a moradia na região. O padrão urbanístico herdado do passado, com lotes estreitos e compridos não favorecem a ocupação de algumas tipologias mais comuns atualmente, como os edifícios verticais. E, os problemas decorrentes da violência urbana também são apontados pelos próprios moradores do bairro, como um aspecto negativo que afasta novos moradores (ATAÍDE, 2015).
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Por meio da análise do mapa de uso do solo (ver figura 24), observa-se espacialmente, como se distribuem os imóveis subutilizados e qual a predominância dos tipos de uso. A Rua Sá e Albuquerque e a Rua Barão de Jaraguá são as que concentram o maior número de lotes sem uso, caracterizados por suas grandes dimensões. Na porção mais a oeste do bairro tem-se a maior concentração de lotes residenciais, no entanto, os usos institucionais e de serviços são os que mais predominam, juntamente com os vazios urbanos. Figura 24 - Mapa de Uso do solo
Fonte: BITENCOURT, 2017 (Adaptado pelo autor)
O perfil socioeconômico da população de HIS Em contrapartida, os assentamentos precários são uma realidade na capital alagoana, ressalta-se que o incremento populacional ocorrido após a década de 1960 se deve, sobretudo, à migração rural-urbana. As pessoas que vieram morar na cidade, por falta de condições tiveram que ocupar outras áreas do território urbano, ao invés daquelas já existentes e melhor localizadas como no caso do Jaraguá. Hoje, esses assentamentos chegam a somar 275 comunidades (SEMPLA, 2016
apud CAVALCANTI, 2017), configurando o cenário habitacional complexo de Maceió. Em 2004, os assentamentos precários da cidade foram objeto de uma pesquisa cujo intuito era conhecer o perfil socioeconômico e as condições de habitabilidade das famílias que moram nessas áreas. Comprovou-se que uma parcela significativa da população maceioense vivia em condições
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precárias, desse conjunto os homens representavam 43% e as mulheres 57% do total de entrevistados. Dentre eles havia uma ligeira predominância dos maiores de 65 anos, no entanto, verificou-se que a maioria da população era adulta. O nível de escolaridade era baixo e mais da metade (59,1%) é originário do interior do estado (IBAM/DUMA, 2005). No que diz respeito à situação de renda e trabalho, 23% declararam estar numa condição de assalariado12. Outra parcela da população (42%) declarou trabalhar como autônomo ou biscateiro e 17,5% são aposentados ou pensionistas. Para os autores, a proporção de pessoas sem vínculo empregatício é uma tendência que comprova o crescimento do trabalho informal nas cidades (IBAM/DUMA, 2005). Do total de entrevistados, a maioria (55%) declarou obter uma renda média mensal familiar entre um a três salários mínimos, enquanto que 32,3% das famílias vivem com menos de um salário. Acerca das condições de habitabilidade verificou-se que a maioria da população morava em casa própria quitada (66,2%), entretanto, uma parcela considerável pagava aluguel (17,8%) o que comprometia ainda mais a renda familiar que já era escassa. As casas abrigavam em média de quatro a seis pessoas, sendo as famílias compostas por três integrantes a maior incidência (19,1%) (IBAM/DUMA, 2005). A forma de acesso à moradia mais comum é através da autoconstrução, semelhante ao cenário nacional de produção das cidades informais. Quanto à condição física da habitação, observou-se que, mesmo as casas construídas em alvenaria, estavam em condições insatisfatórias, apresentando espaços pequenos cujos quartos abrigavam em médias três ou mais pessoas por cômodo (IBAM/DUMA, 2005). Os resultados da pesquisa realizada em 2004, puderam comprovar as más condições de vida das populações que habitam os assentamentos precários em Maceió. Nos resultados chama atenção os baixos níveis e instabilidade de renda, assim como as condições inadequadas das moradias. No Jaraguá o cenário socioeconômico e habitacional assemelha-se ao da capital maceioense, de acordo com os dados do censo demográfico do IBGE, em 2010 o bairro apresentava uma população 3.211 habitantes distribuídos em 1.305 domicílios. Existia uma leve predominância do sexo feminino (53,6%) em relação ao masculino (46,1%) e, no que diz respeito à faixa etária prevalecia um conjunto de indivíduos adultos, variando de 15 a 35 anos (ver Gráfico 3 e 4).
Entre as ocupações mais comuns estão as de serviços domésticos, atividades na área de comércio, construção civil e serviços gerais (IBAM/DUMA, 2005).
12
Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano | 61 Gráfico 3 - População e Domicílios em 2010
População Domicílios 0
1000
2000
3000
Fonte: IBGE (Adaptado pelo autor), 2018
Gráfico 4 - Proporção por sexo em 2010
Mulheres 54%
Homens 46%
4000
Fonte: IBGE (Adaptado pelo autor), 2018
A média do número de moradores por domicílio também se aproxima da situação na cidade, entre os setores censitários existia uma variação de 2,79 a 3,37 moradores por casa. No que diz respeito à condição de renda13, o bairro apresenta alguns desequilíbrios em seu território (ver figura 25). A parte mais a oeste possuía uma renda média domiciliar que ultrapassava oito salários mínimos mensais (R$4.311,53). A outra porção do bairro, aquela que engloba o patrimônio tombado, inclusive a antiga Vila dos Pescadores, possuía uma renda muito inferior, alcançando apenas R$910,23 por mês, o que correspondia a aproximadamente dois salários mínimos. Figura 25 - Distribuição espacial das faixas de renda em 2010
Fonte: SEMPLA, 2011 (Adaptado pelo autor)
Para a elaboração desses dados, levou-se em consideração o cruzamento de dois levantamentos. O primeiro corresponde à renda média per capita nas UDH’s (Unidades de Desenvolvimento Humano) constantes no Atlas de Desenvolvimento Humano, já o segundo refere-se a média de moradores por domicílio dos setores censitários do Censo Demográfico. Ambos os dados são referentes ao ano de 2010. 13
62 | Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano
A partir da análise dos dados socioeconômicos referentes à população que vive em assentamentos precários, pôde-se compreender e traçar um perfil das famílias que se encaixam nos pressupostos dos programas de habitação de interesse social. Os resultados obtidos para a cidade de Maceió em 2004 se assemelham aos do Jaraguá em 2010, dessa forma é possível considerar que o local em estudo se configura como sendo um local relevante para o exercício proposto nesse trabalho. Sendo assim, o perfil ao qual este trabalho pretende atingir caracteriza-se por possuir uma renda média mensal familiar entre zero a três salários mínimos, constitui-se de uma população adulta feminina, com tendência ao envelhecimento e são formadas em média por três integrantes. Vale destacar que atualmente a composição familiar no Brasil apresenta outras variações, além daquela nuclear formada por pai, mãe e filhos, como a monoparental (formada apenas por pai ou mãe com filhos) essa nova característica das famílias abre espaço para outros tipos de arranjo interno nas habitações.
[3.2.] O sítio histórico e seus aspectos legais A instituição de marcos legais é de extrema importância para a gestão e conservação dos sítios históricos, através deles é possível determinar os limites das ações que são possíveis de serem feitas, tanto nas edificações, quanto no espaço urbano. Além disso, as legislações previstas nesses documentos contêm diretrizes e ordenamentos que visam a manutenção e permanência do patrimônio cultural de determinado lugar. Compreender essas determinações é fundamental para alcançar o objetivo do qual este trabalho se propõe, uma vez que a intervenção irá acontecer num bem patrimonial. Considerando o Jaraguá como um dos núcleos primários de formação de Maceió, as primeiras legislações incidentes sobre o bairro foram elaboradas na década de 1980, quando o local passava por um processo de deterioração. Atualmente existem dois níveis de regulamentação incidentes sobre área, o estadual (Decreto n° 6.061) e o municipal (Lei n°4.545; Plano Diretor e Código Municipal de Urbanismo e Edificações) e serão melhores analisados a seguir. Publicado em 1984, o decreto estadual nº 6.061 estabelece resoluções de proteção referentes às edificações, aos logradouros públicos e ao meio ambiente no Jaraguá. Enquanto resoluções gerais, esta lei estabelece as seguintes diretrizes: proibição de obras ou atividades que comprometam ou modifiquem os bens culturais e naturais, construções que alterem a ambiência, ou seja, relação de volume e cor original, e atividades e armazenamento de produtos nocivos ao
Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano | 63
patrimônio (ALAGOAS, 1984). No que diz respeito às edificações tem-se como resoluções principais as listadas a seguir: c. Os e dif ício s de re c on he cido val or ar qu ite tô ni co n ã o p ode rão sofre r m odif ic açõe s q ue a ltere m s e u a s pe c to ex te r no, po den d o, e ntre ta n to, s ofrê -l a s i n ter na me nte, de v e nd o ser a nal is ado s em co n diçõe s es peci ai s sob [... ] pare cer té c nic o d a SP HA N ou do ór gão e st a du al comp ete nte. d. Se rão e f e t ua da s ob ra s de con st ru ção e m te rre no s vaz i os o nde n ão haj a le gisl aç ão e m co n trá rio. Ne ste ca so, o o bjeti v o ser á de in tegr a ção ao c on ju n to o bse r va n do a s se gu i nte s nor ma s: - v o l ume tri a, e sc ala, e s qu ad ri as e a rel aç ão d e c heio s e vaz io s para a abe r tu ra de vão s, c o ere n tes c om as co n str u çõe s do e n torn o ; - a i mpl a nta çã o, f orm a e i nt en sid ade de oc u pa ção de ve r ão se gu ir a f o rma pre d omi na nt e no en tor no; - o s li mite s de g ab ari to dev er ão sempre qu e pos sí vel re spe it ar os j á e x is te nte s n o e n tor no , não pode ndo, e ntre ta nt o ul tra pa s sar o m áxi mo de 8, 00 m; - co be rt a e m tel ha s cer âmi ca s, ti po c an al c om a i n cli na ção mí nim a de 25 %; - mat e ri al da s f ac h ad a s e m alve na ria co m ma s sa cor ri da n ão de ve ndo jam ais se r pi nt ad a co m ti nt a a óleo; - a co n str u ção n ão po de r á e m ne n h um ca so imi tar o u cop ia r ed ific aç õe s a n tig a s , de ve nd o re t rat ar a su a é poc a de co ns tr uç ão; - a s i ns ta la çõe s de ág ua s pl u vi ais, e sgot os e t u bu laç õe s d e u m mo do ge r al s e r ão se m pre e m bu ti da s na s p ar ede s , inclu si ve n as f a ch a da s se c u nd ári as e e mpe na s (A LA G OA S, 1 9 8 4, p. 0 3 , g rif o no sso ).
No âmbito da regulamentação municipal, a primeira lei elaborada para o patrimônio cultural é datada de 1996 (Lei n° 4.545) e consiste da instituição das Zonas Especiais de Preservação14 (ZEP), cujo objetivo é definir parâmetros especiais em relação à legislação urbanística do restante da cidade, além da criação de benefícios fiscais para a estimulação de atividades turísticas e de preservação (MACEIÓ, 1996). Com a obrigatoriedade da elaboração de Planos Diretores municipais em 2001, após o Estatuto da Cidade, a lei das ZEP’s foi revisada e incorporada ao Plano de Maceió em 2005, dessa forma, a cidade hoje possui cinco zonas de preservação do patrimônio cultural que incluem os bairros Jaraguá, Centro, Bebedouro, Pontal e Fernão Velho. A ZEP-01, que corresponde ao bairro estudado, subdivide-se em dois tipos de setor, Setor de Preservação Rigorosa, onde o controle das intervenções urbanas e edilícias são mais restritivas, e Setor de Preservação de Entorno, como próprio nome diz, refere-se a região ao redor que serve de amortecimento aos impactos de urbanizações visando a menor interferência na paisagem (ver figura 26).
14
São áreas de relevante interesse cultural por constituírem expressões arquitetônicas ou históricas do patrimônio cultural edificado, compostas por conjuntos de edificações e edificações isoladas; e suporte físico de manifestações culturais e de tradições populares, especialmente a música e a dança folclórica, a culinária e o artesanato (MACEIÓ, 2005).
64 | Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano Figura 26 - Mapa ZEP 01/Jaraguá
Fonte: SEMPLA, 2011 (Adaptado pelo autor)
Como o objeto de intervenção desse trabalho (Trapiche Jaraguá) está inserido na SPR-1, a pesquisa focou em conhecer as diretrizes e parâmetros que são permitidos em projetos arquitetônicos nesse perímetro. De maneira geral, as recomendações contidas, tanto no Plano Diretor, quanto no Código de Edificações se assemelham à lei de tombamento estadual (Decreto n° 6.061 de 1984) e ao decreto municipal (Lei n° 4.545 de 1996) e dizem respeito essencialmente à manutenção da volumetria original, das características arquitetônicas da época e da relação do monumento com a paisagem do conjunto urbano remanescente. Entretanto, comprova-se que ao longo dos anos não houve uma revisão sistemática desses parâmetros urbanísticos, por isso, é comum identificar nos sítios históricos da cidade constantes descaracterizações do patrimônio atestando a ineficiência da gestão dessas áreas. Para Hobson (2004 apud OLIVEIRA, 2017, p. 08) é imprescindível integrar as políticas de conservação ao planejamento urbano dos municípios, pois estes desempenham papeis cruciais relacionados ao uso do solo, bem como sobre a utilização dos edifícios, que apresentam potenciais de aproveitamento para a cidade.
Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano | 65
[3.3.] O sítio e seus monumentos históricos: o Trapiche Jaraguá A história do desenvolvimento do bairro do Jaraguá está intimamente ligada ao desenvolvimento de Maceió, o tecido urbano remanescente é testemunho de um período histórico e social marcante, dessa forma, preservar essa paisagem significa perpetuar a memória e valorizar a identidade local. Em virtude do seu reconhecido valor patrimonial, a construção de uma declaração de significância é etapa essencial para a adoção de uma política de conservação e gestão adequada às necessidades do sítio histórico. Segundo a declaração de significância produzida por Souza (2014), o Jaraguá carrega quatro valores excepcionais reconhecidos pelos seus atributos materiais e imateriais. O valor histórico relaciona-se ao fato da área ter sido importante economicamente para a construção da cidade. O valor paisagístico consiste na conjunção do ambiente natural com a morfologia do ambiente construído compondo um cenário peculiar (ver figura 27). O valor cultural e social refere-se ao fato do bairro abrigar inúmeras manifestações populares e costumes tradicionais. E por fim, o valor arquitetônico que é aquele expresso pelo tecido urbano, com as suas ruas estreitas e casarios de gabarito padrão (ver figura 28), e pela estética dos edifícios monumentais do século XIX e XX, entre eles os trapiches. Cabe aqui acrescentar, com vistas ao objetivo desse trabalho, o valor urbanístico, sob o ponto de vista da infraestrutura instalada oriunda do processo de revitalização que ampara a proposta de habitação para o bairro. Figura 27 - Vista para paisagem da enseada do Jaraguá
Figura 28 - Arruamento da Rua Sá e Albuquerque
Fonte: Disponível em: <goo.gl/6xckqs> Acesso em: 14 fev. 2018
Fonte: Disponível em: <goo.gl/aSx3Bg> Acesso em: 14 fev. 2018
Entre os atributos citados na declaração de significância de Souza (2014), destaca-se o conjunto edificado e o traçado da Rua Sá e Albuquerque. Segundo a autora, a paisagem dos “[...]
sobrados, armazéns e residências dialogam com a estreita via em paralelepípedo e com os largos e
66 | Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano
becos que culminam nas expressões arquiteturais de maior imponência: os monumentos.” (SOUZA, 2014, p. 10). O desenho desse arruado já pode ser identificado desde os primeiros registros cartográficos do bairro, no mapa do engenheiro Carlos Mornay (ver figura 29) de 1841 é possível visualizar as primeiras construções em alvenaria e telha, e entre elas aparecem dois trapiches, o Trapiche Novo e o Trapiche Velho. Figura 29 - Planta da povoação de Jaraguá, 1841. LEGENDA: 1 – Bateria de São Pedro 2 e 3 – Primeiros Trapiche e Pontes 4 – Igreja Nossa Senhora da Conceição 5 – Igreja Nossa Senhora Mãe do Povo 6 – Atual Av. da Paz 7 – Cemitério dos Ingleses 8 – Primeira e segunda ponte ligando Jaraguá ao centro de Maceió
Fonte: PEDROSA, 1998
A planta de povoação feita por Mornay, já demostrava a representatividade das edificações do tipo trapiche. Essa tipologia apareceu em diversos registros feitos sobre o bairro ao longo da segunda metade do século XIX, se destacando em gravuras de navegantes franceses e ingleses. Estima-se que as primeiras edificações tenham sido construídas em 1820, mas só com o advento da revolução industrial na Europa o comércio internacional se fortaleceu em Maceió e assim os trapiches passaram a dominar a paisagem daquela enseada marítima (PEDROSA, 1998). O início do século XX pode ser considerado o auge da economia e da era dos trapiches no Jaraguá. Em cinco anos houve o surgimento de cinco edifícios desse tipo, totalizando 10 trapiches entre 1897 e 1902. Num mapa de 1932 (ver figura 30), é possível identificar a localização das pontes e armazéns, bem como observar como a face sul da rua Sá e Albuquerque era dominada por estas tipologias arquitetônicas. “Os trapiches e pontes marcaram cento e cinquenta anos a
paisagem de Jaraguá, no desfolhar interminável do calendário” (PEDROSA, 1998, p. 81).
Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano | 67 Figura 30 - Localização dos Trapiches e seus pontilhões em 1932
Fonte: PEDROSA, 1998 apud BITENCOURT, 2017 (Adaptado pelo autor)
Verifica-se ainda, que no mapa de 1932 todos trapiches registrados foram edificados seguindo o alinhamento da enseada do Jaraguá. Tal conformação dificultou a circulação pela orla, em virtude da presença das pontes que conectavam os armazéns ao mar, assim os novos lotes se voltaram para dentro, consolidando o desenho atual da rua Sá e Albuquerque, onde na face norte encontram-se os sobrados e edifícios comerciais. Estima-se que o prédio do Trapiche Jaraguá, objeto de intervenção deste trabalho, tenha sido construído na década de 1890, e destacava-se pelo seu pontilhão (ver figura 31), acerca dessas pontes Pedrosa comenta: “As maiores chegavam a ser imponentes como a do Trapiche
Jaraguá dos Leões, a primeira de todas, vista de longe, coberta, alta, larga e comprida, no tope da hierarquia” (PEDROSA, 1998, p.73). Para Dantas, Tenório e Menezes (2011), o edifício chamava atenção pela solidez e imponência, reflexo do poderio econômico dos seus proprietários. No conjunto há ainda uma dependência de dois pavimentos, que de acordo com Pedrosa (1998), funcionavam as instalações do Consulado Britânico (ver figura 32).
68 | Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano Figura 31 - Pontilhão Trapiche Jaraguá em 1919
Figura 32 - Dependência do Consulado Britânico
Fonte: PEDROSA, 1998
Fonte: Acervo Arquivo Público, s.d.
O monumento localiza-se ao final da Rua Sá e Albuquerque, próximo à atual Praça Marcílio Dias. Na quadra em que se insere o prédio há mais um armazém, o Trapiche Segundo, cujo estado de preservação encontra-se em arruinamento, assim como o seu vizinho. Observando o cotidiano atual da rua, verificasse-se que esse trecho final é o que mais sofre com processo de esvaziamento, o número de prédios subutilizados e os poucos usos, que se restringem ao horário comercial, caracterizam essa parte da rua como local de passagem. Dessa forma, inserir um uso residencial nessa quadra vem como intuito também de dinamizar e equilibrar os movimentos na rua. Ao longo da pesquisa não foram encontradas definições precisas acerca das características funcionais e tipológicas dos trapiches apenas que eram grandes armazéns que estocavam mercadorias. Essa não definição tipológica se torna um potencial para criação projetual, pois confere liberdade de intervenção no espaço interno, ao contrário dos limitadores de manutenção da volumetria original e material da cobertura do monumento segundo com a legislação da zona de preservação rigorosa. Para Chagas (2013 apud COSTA, 2013, p.91) os trapiches são caracterizados pelos altos telhados em madeira com assoalho suspenso para armazenagem dos produtos sem riscos de contato com a umidade do solo. O historiador local Félix Lima Júnior, já nos apresenta um ponto de vista diferente, onde os pontilhões surgem como elemento completar ao armazém. “Os trapiches
eram construídos de taipa ou de alvenaria de tijolos, cobertos com telha fabricadas do Siri, no Rio Morto, nas proximidades de Satuba. Suas pontes avançavam mar a dentro [...]” (JÚNIOR, 1976, p. 133).
Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano | 69
Apesar do estado de conservação crítico em que se encontra atualmente, pode-se afirmar que estilisticamente enquanto fachada o trapiche apresenta traços de caráter Neoclássico15. Analisando-se o conjunto do Trapiche Jaraguá, percebe-se a simplicidade do objeto, a maior parte dele corresponde a um bloco linear térreo, que possivelmente foi o local de armazenagem das mercadorias, sendo interrompido apenas por um volume lateral de dois pavimentos, onde funcionou o antigo Consulado Britânico (ver figura 33). Figura 33 - Face de quadra do Trapiche Jaraguá
Fonte: FREITAS et al, 2016 (Adaptado pelo autor)
Devido a impossibilidade de acesso16 à totalidade do edifício, o levantamento feito ao longo da pesquisa se ateve apenas a uma das partes do trapiche, mais especificamente aquela que se encontra descoberta (ver figura 33). Internamente o Trapiche Jaraguá é dividido em cinco galpões de tamanhos variados, reforçando a hipótese de que estas estruturas serviam como espaço de armazenamento de mercadorias. (ver figura 34). As paredes internas são demarcadas por portais em arco pleno, no entanto todos estão vedados, havendo apenas uma circulação central. O alinhamento dos pilares ao centro, correspondem à divisão da cobertura em dois telhados de duas águas, com estrutura de madeira que se prolonga no sentido longitudinal. Figura 34 - Planta Baixa atual do Trapiche Jaraguá Lote vizinho
Fonte: Elaboração do autor, 2017 Esse estilo se consolidou no Brasil a partir do século XIX e tem como principal característica a clareza formal (SOUSA, 1994) 16 O volume onde funcionou o Consulado Britânico e os outros galpões do Trapiche Jaraguá encontram-se bastante deteriorados, há um acúmulo de lixo e entulho considerável que impossibilitou o levantamento completo do prédio. 15
70 | Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano
No que diz respeito às fachadas, a maior delas, aquela voltada para rua Sá e Albuquerque, os elementos que mais se destacam são os vinte vãos em arco pleno emoldurados com cercadura em argamassa distribuídos ao longo da sua extensão, acima dos arcos se se sobrepõem três níveis de cimalha adornando a platibanda (ver figura 35). Na face voltada para Av. da Paz surgem novos componentes que remetem ao estilo neoclássico. A platibanda é intersecionada por dois frontões triangulares com óculos centrais, três pseudo-colunas e dois portais também em arco pleno, emoldurados com cercadura em argamassa e decorados com fechos simples demarcando essa fachada (ver figura 35). Na posterior, voltada para um lote vazio, em virtude de sucessivas adaptações, os elementos arquitetônicos encontram-se bastante deteriorados, não sendo possível identificar as aberturas em arcos e as cimalhas da platibanda apresentam-se descaracterizadas. Figura 35 - Elementos de Fachada visto da Rua Sá e Albuquerque
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano | 71 Figura 36 - Elementos de Fachada visto da Av. da Paz
Fonte: Elaboração do autor, 2017
O estado de conservação do Trapiche Jaraguá Os anos em desuso e a falta de manutenção dão mostras de que o conjunto foi edificado em alvenaria de tijolo do tipo adobe, cujo acabamento das paredes é feito com reboco pintado com tinta branca a base de cal. A estrutura em madeira do telhado possivelmente abrigou telhas de barro capa e canal, porém no prédio é possível identificar apenas alguns trechos cobertos com telha metálica. Atualmente o Trapiche Jaraguá apresenta uma condição ruim sob o ponto de vista do seu estado de conservação. Naturalmente, esse processo potencializou a origem das manifestações patológicas, que basicamente são os “sintomas” apresentados pela edificação, e entre outros motivos, estão associados ao acentuado envelhecimento dos materiais, bem como a perda da sua funcionalidade. Considerando que o objeto em estudo se caracteriza por ser um monumento histórico, os problemas decorrentes das patologias são maiores em virtude do seu elevado tempo de vida útil. Nas visitas realizadas para elaboração do levantamento arquitetônico, foi possível verificar diversos fenômenos patológicos no edifício. Dentre os problemas encontrados, a maior parte deles se relaciona à umidade, que se manifesta de formas variadas. Além disso, verifica-se também a deterioração das alvenarias através da desagregação do reboco e da pintura, a presença de agentes biológicos como fungos e bolores, bem como agentes agressivos do meio ambiente a exemplo da temperatura, salinidade e poluição do ar.
72 | Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano
Na fachada frontal, voltada para rua Sá e Albuquerque, e na fachada lateral é possível verificar em toda extensão da platibanda e do frontão manchas de umidade em virtude da precipitação, causando assim o escurecimento das cimalhas e a proliferação de algumas vegetações (ver figura 37). Nota-se ainda, diversos pontos de desagregação do reboco, sendo muito recorrente entre os arcos plenos e na base das paredes (ver figura 38), as causas para aparecimento desse fenômeno estão relacionadas à ação de agentes climáticos, associados à alternância de calor e frio, que provoca contrações e expansões sucessivas gerando tensões e, por conseguinte, o descolamento do material. É perceptível também, diversos pontos com desgaste e descascamento da pintura pelo desgaste do tempo e ação das intempéries. Figura 37 - Mancha de umidade na platibanda da fachada frontal
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Figura 38 - Mancha de umidade e desagregação do reboco na fachada lateral
Fonte: Elaboração do autor, 2017
A fachada posterior (ver figura 39), por ter sofrido sucessivas intervenções é a que se encontra mais deteriorada. A mancha escura nos elementos da platibanda estabelece um estado avançado de deterioração. A umidade ascendente, oriunda do contato das paredes com água que infiltra por capilaridades, proporcionou o crescimento de vegetação nas bases da alvenaria e no piso (ver figura 40). As portas em ficha que dão acesso ao lote dos fundos também se encontram bastante danificadas, carcomidas nas partes de baixo e possivelmente infestada por cupins.
Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano | 73 Figura 39 - Platibanda com presença de umidade na fachada posterior
Figura 40 - Crescimento de vegetação no piso
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Na parte interna do prédio os problemas se repetem, devido ao destelhamento os elementos internos ficaram expostos a ação das intempéries, consequentemente à falta de manutenção, potencializou-se o aparecimento das manifestações patológicas. Nas paredes as manchas de umidade predominam, em todos os galpões é possível perceber o escorrimento da água da chuva nas proximidades da estrutura do telhado, e o escurecimento da superfície nas bases, graças ao baixo escoamento superficial da água que se acumula no piso (ver figura 41). Figura 41 - Paredes internas do galpão 03 manchadas pelo escorrimento da água da chuva e escurecimento da superfície próximo ao piso
Fonte: Elaboração do autor, 2017
74 | Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano
Outra manifestação patológica recorrente nas paredes internas do trapiche é a desagregação das superfícies e o desgaste da pintura. As principais causas para ocorrência do descolamento do reboco estão relacionadas à aplicação de camadas muito grossas de argamassa, ou ainda, a grandes variações de temperatura. Na figura 42 e 43 é possível verificar que a desagregação está associada a presença de umidade e de fissuração nas quinas da parede. No que diz respeito à pintura, observa-se no geral, a descamação do material, devido à ação do tempo e ao enrugamento da superfície, que ocorre quando a camada de tinta é exposta a uma umidade muito alta, como no caso em estudo (ver figura 44 e 45). Figura 42 - Desagregação do reboco em parede do galpão 03
Fonte: Elaboração do autor, 2017 Figura 44 - Descamação da pintura em parede do galpão 03
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Figura 43 - Desagregação do reboco em parede do galpão 04
Fonte: Elaboração do autor, 2017 Figura 45 - Descamação da pintura em parede do galpão 05
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Nos quatro galpões analisados há uma diferenciação nos tipos de pisos, há os de pedra natural, de bloco cerâmico, e ainda partes revestidas em cimento. A exposição ao sol e a umidade ocasionaram nesses materiais diferenciação na coloração, até manchas de umidade (ver figura 46); o acúmulo de água favoreceu também o surgimento de diversas vegetações, algumas delas com tamanho considerável (ver figura 47). Já o madeiramento do telhado, último elemento remanescente a ser analisado, apesar da exposição ao ambiente externo se apresenta,
Conhecendo o território: o Jaraguá enquanto sítio histórico urbano | 75
aparentemente, em estado de conservação regular. Foram identificadas apenas algumas peças que precisam ser substituídas, bem como as ferragens que sustentam a calha. Figura 46 - Degradação do piso, galpão 04
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Figura 47 - Vegetação arbórea, galpão 05
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Tendo como base a análise visual do estado de conservação do Trapiche Jaraguá, fica claro que a falta de manutenção do prédio, associado ao destelhamento potencializou o aparecimento das manifestações patológicas, especialmente daquelas decorridas da ação da umidade. A localização litorânea (salinidade e umidade) e a exposição ao grande fluxo de veículos também pode ter contribuído para o agravamento destes fenômenos. Sendo assim, a identificação e correção destes “sintomas” se constitui como um dos procedimentos essenciais para a preservação de um bem patrimonial, pois através do diagnóstico é possível prever o uso de novos materiais e técnicas construtivas adequadas à reconstituição do bem. Nos mapeamentos apresentados a seguir, realizados após o levantamento no local, é possível se ter uma noção geral do estado de conservação do edifício, tanto das fachadas, quanto do espaço interno. No levantamento interno, foram utilizadas marcações em planta baixa para identificar o ponto fotográfico em cada galpão, as imagens se dividem em fotos em perspectiva, fotos de detalhes nas paredes ou próximas ao piso, além daquelas voltas para a cobertura. Para as fachadas foram demarcadas as principais manifestações patológicas e identificadas em cada uma das faces com texturas e cores específicas.
REGISTRO FOTOGRÁFICO
3.81
7.18
3.99
1.21
3.88
4.04
3.81
7.97
G03_E
.70 13.45
3.82
.32
8.99
10.17
.69
G01_A
G02_A
G02_B
G02_C
G02_D
G02_E
G02_F
G02_G
G02_H
G02_I
G03_A
G03_B
G03_ C
G03_ D
G03_ E
G03_ F
G03_ G
G03_ H
G03_ I
G04_ A
G04_ B
G04_ C
G04_ D
G04_ E
G04_ F
G04_ G
G04_ H
G05_ A
G05_ B
G05_ C
G05_ D
G05_ E
G05_ F
G05_ G
G05_ H
G05_ I
G02_F
G02_G
G03_F G03_I
10.57
G03_B
G02_I
G02_B
11.90
10.39
10.86
10.38
G04_B 10.45
.52
.46
G04_G
G05_B
.70
.60
.64
5.20
10.42
6.76
.70
.98
.42
G01_A
G05_E G05_A G04_C
22.53
G02_D
G05_I
.86
22.61
2.13
2.01
G04_H
2.15
2.00
2.32
G05_H
1.98
G03_G
G02_E
G04_D
AV. DA PAZ
G05_C
G03_A
10.37
10.48
G04_A
10.53
G05_G G03_D
GALPÃO 03
G03_H
GALPÃO 02
G03_C
GALPÃO 01
G02_H
.68
15.48
.52
26.57
.69
.70
.46
13.07 .34
1.20 .73
21.43
G02_A
G04_E
.68
G04_F
GALPÃO 04
.68
GALPÃO 05
9.69
.71
10.45
10.25
10.11
G05_F
10.61
G02_C G05_D
RUA SÁ E ALBUQUERQUE
PLANTA BAIXA - DETALHE 01
LEGENDA
U
Nas visitas realizadas ao Trapiche Jaraguá foi possível constatar a condição precária em que se encontra o edifício. Entre as manifestações patológicas mais recorrentes estão as manchas de umidade nas proximidades da estrutura do telhado e na superfície mais próxima ao chão, a desagregação do reboco, o desgaste da pintura e o surgimento de vegetações rasteiras, sendo estas observadas nas fotografias ao lado.
DETALH
13°42'0"
E 01
PLANTA DE SITUAÇÃO ESCALA: 1/2000
FOTOS EM PERSPECTIVA FOTOS EM ÁREAS PRÓXIMAS AO PISO OU DETALHES
ESCALA: 1/200
N
FOTOS PRÓXIMAS A COBERTURA
OBSERVAÇÃO:
Não foi possível realizar o levantamento do galpão 01, pois o espaço encontrava-se fechado como a imagem G01_A. Não há ainda a comunicação interna entre os galpões 01 e 02.
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
LEVANTAMENTO FOTOGRÁFICO E CADASTRAL
01
FACHADA NORTE ESCALA: 1/150
FACHADA SUL ESCALA: 1/150
FACHADA OESTE ESCALA: 1/150
LEGENDA
DESAGREGAÇÃO DO REBOCO
DESGASTE PINTURA
PIXAÇÃO
COBERTURA INEXISTENTE
ESQUADRIA DE METAL OXIDADA
GRAFITE
MANCHA DE UMIDADE
ORNATO DEGRADADO
VEGETAÇÃO
ESQUADRIA DE MADEIRA DEGRADADA
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
LEVANTAMENTO DE DANOS FACHADAS
02
78 | Habitar o PatrimĂ´nio
Habitar o PatrimĂ´nio | 79
80 | Habitar o Patrimônio
[4.]
HABITAR O PATRIMÔNIO
O processo de reabilitação de um edifício histórico envolve a conjunção de múltiplos aspectos, sejam eles sociais, políticos, culturais, ou ainda aqueles relacionados ao ambiente construído. A materialização do tecido urbano no qual ele está inserido envolveu a sobreposição de várias práticas sociais ao longo dos anos, dessa forma, intervir nesses locais é também levar em consideração as diferentes apropriações e metamorfoses ao qual esteve sujeito o espaço urbano durante a formação da cidade. Isto posto, a reabilitação do Trapiche Jaraguá é uma tarefa com demasiada complexidade, pois tem como pano de fundo duas problemáticas relevantes. A primeira delas relaciona-se a ampliação do acesso à terra urbana, rompendo com as diversas práticas de intervenção que ocorreram na segunda metade do século XX e foram sinônimo de exclusão de populações mais vulneráveis. Por outro lado, intervir numa edificação considerada patrimônio cultural de alagoas e classificada como um monumento histórico pelo Plano Diretor municipal vigente demanda estratégias e ações condizentes com a seu papel enquanto objeto construído num sítio histórico urbano. Sendo assim, o referencial teórico trazido até aqui acerca da habitação de interesse social e áreas urbanas centrais, juntamente como o levantamento dos processos de intervenção ocorridos no bairro, a análise dos parâmetros construtivos nas legislações vigentes, além do diagnóstico do estado de conservação do Trapiche Jaraguá, foi possível criar um arcabouço de informações que puderam substanciar a elaboração da proposta que será apresentada a seguir.
[4.1.] Postura Projetual Tendo em vista as problemáticas abordadas até aqui, a proposta de intervenção do Trapiche seguirá basicamente duas posturas projetuais: I – Não alterar a visão de conjunto urbano: Entende-se que a preservação das qualidades originais do prédio são uma forma de salvaguardar os valores histórico, paisagístico, cultural, arquitetônico e urbanístico referentes aos atributos do bairro, sendo uma forma de intervenção coerente com o conceito de reabilitação, que prima pela harmonia com um contexto local de preexistências tanto do patrimônio edificado, quanto das dinâmicas locais. Portanto, o objeto existente deverá ser consolidado segundo os parâmetros estabelecidos na Resolução do Conselho Estadual de Cultura e de Preservação do Patrimônio Histórico, Artístico
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e Natural (Decreto n° 6.061 de 1984) e do Código de Urbanismo e Edificações do município de Maceió que estabelece variadas resoluções acerca da preservação da ambiência local (ver figura 48). Sendo assim, a recuperação da fachada e da estrutura interna manterá as relações volumétricas, estéticas, cheios e vazios, materiais empregados, entre outros. Figura 48 - Planta de Situação e fotos do entorno imediato do Trapiche Jaraguá
Fonte: Elaboração do autor, 2018
Como é possível visualizar pelas imagens, o conjunto histórico urbano do bairro apresenta características que devem sem mantidas, e que foram ressaltadas na sua declaração de significância17, como por exemplo o traçado urbano, a homogeneidade das fachadas com um gabarito padrão, as casas geminadas, e principalmente a estética dos edifícios monumentais, como no caso dos trapiches. II – Aliar o uso residencial para população de interesse social ao monumento histórico: Para tanto tem-se como principais estratégias, a apropriação do vazio com mínimas alterações internas, racionalidade nas soluções estruturais, a otimização do conforto ambiental, bem como a busca por uma releitura de um jeito antigo de morar, característico do bairro do Jaraguá. A seguir serão justificadas as principais estratégias, acompanhadas com o repertório de inspirações. - Mínimas alterações internas Levando em consideração o pressuposto da preservação da visão de conjunto histórico urbano, o espaço interno do Trapiche Jaraguá é que será o alvo da proposta deste trabalho. Os
Produto final da pesquisa intitulada A declaração da significância cultural da Zona Especial de Preservação 1 - Jaraguá (ZEP1) em Maceió-AL, produzido por Souza, B. M. e HIDAKA, L. F. em 2014. 17
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cincos galpões, que hoje encontram-se vazios (ver figura 49 e 50), constitui-se uma potencialidade à luz da reabilitação pois permitirá uma maior liberdade de intervenção projetual. Dessa forma, prevê-se alterações mínimas nas paredes internas existentes, realizando a consolidação da estrutura do monumento, associado a apropriação dos vazios para organização dos novos usos. Figura 49 - Vazio Galpão 02
Figura 50 - Vazio Galpão 03
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Fonte: Elaboração do autor, 2017
Tal estratégia pode ser observada, num dos projetos brasileiros mais emblemáticos no que se refere “criação de novos objetos arquitetônicos a partir das ruínas de construções ou áreas
urbanas remanescentes”, como argumentam Baeta e Nery (2017). O Colégio, pertencente ao Santuário do Caraça em Minas Gerais (ver figura 51), foi alvo de uma intervenção pelos arquitetos Rodrigo Meniconi e Maria Edwiges Leal entre os anos de 1986 e 1989, no qual os remanescentes mais íntegros em pedra de uma das partes do complexo foram repensados para abrigar um programa que contava com espaços para recepção, eventos, biblioteca e auditório. Figura 51 - Fachada do Colégio do Santuário do Caraça
Fonte: BAETA, 2014
Figura 52 - Sistema Estrutural em concreto justaposto as paredes originais em pedra
Fonte: BAETA, 2014
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Para tanto, os arquitetos buscaram acomodar uma nova estrutura em concreto armado, com três pavimentos justaposta as paredes remanescentes (ver figura 52), criando um contraste entre a estrutura antiga e a nova produzindo uma obra arquitetônica que se apropria do existente para potencializar um uso contemporâneo. Do mesmo modo, espera-se que a associação entre as unidades habitacionais e as partes remanescentes do Trapiche Jaraguá se complementem, criando uma estética pitoresca e que modifiquem a imagem degrada que hoje está relacionada ao patrimônio histórico do bairro. - Estratégias de ventilação e iluminação Como destacado anteriormente, um dos limites da variável projetual que dificultam as propostas de reabilitação de edifícios é a adequação aos critérios atuais de conforto, no que diz respeito a ventilação e iluminação. Para o Trapiche Jaraguá, estas questões são primordiais, pois o edifício é geminado e as condições climáticas de Maceió são rigorosas, sendo recomendado como principais estratégias de conforto a priorização da ventilação natural e o sombreamento. Para tanto, a forma de ocupação das unidades habitacionais será um fator relevante para a garantia desses aspectos, pretende-se, a partir para a criação de vazios intersticiais, a melhor distribuição das casas para que estas possam ter pequenos pátios que contribuam para ventilação e iluminação naturais. Este tipo de estratégia é comum a projetos de adaptação de edificações históricas para habitação de interesse social e pode ser identificado em alguns projetos do programa carioca Novas Alternativas na região do Porto Maravilha (ver figura 53), e também em propostas feitas pelo Laboratório de Habitação da UFRJ (ver figura 54) no âmbito das pesquisas do grupo em parceria com entidades públicas. Ao analisarmos as plantas baixas dos imóveis da Rua João Alvares e da Rua Visconde do Rio Branco, percebe-se a adoção dos vazios funcionam como suporte na ventilação e iluminação natural, principalmente nas áreas de serviço como a cozinha e os banheiros. Figura 53 - Planta de layout com demarcação dos vazios (iluminação e ventilação). Imóvel à Rua João Alvares, n°18, projeto referente ao Programa Novas Alternativas no RJ.
Fonte: FEIJÓ, 2012
84 | Habitar o Patrimônio Figura 54 - Planta de layout com demarcação dos vazios (iluminação e ventilação). Imóvel à Rua Visconde do Rio Branco, n°19, projeto elaborado pelo Laboratório de Habitação da UFRJ.
Fonte: SANTOS et al, 2012
- Racionalidade nas soluções estruturais Por se tratar de um projeto de habitação de interesse social, as soluções estruturais e de infraestrutura são aspecto fundamentais para a viabilidade e manutenção do edifício. Busca-se como prioridade a adoção de um sistema que permita a flexibilidade nos arranjos espaciais, mas ao mesmo tempo represente um ganho econômico sob o ponto de vista da durabilidade e de fácil execução. Dessa forma, pretende-se utilizar estrutura metálica e elementos pré-fabricados, pois estes garantem rapidez na execução das moradias, racionalização no desperdício de materiais e mão-deobra, além de permitir adaptações, ampliações, reformas e mudança no espaço interno das unidades. Naturalmente a adoção de núcleos hidráulicos, local onde estará concentrada a totalidade das instalações de cozinha, banheiros e área de serviço, torna-se fundamental para a distribuição dos outros cômodos. Esta é uma estratégia comum a projetos de habitação de interesse social, pois confere economia no uso de materiais e encanamentos.
- Releitura de um jeito antigo de morar Pensando sobre a dinâmica atual do bairro e das características das residências atuais, propõe-se para o arranjo das unidades habitacionais do novo Trapiche Jaraguá a releitura de um jeito antigo de morar, das vilas e casas geminadas. Ao caminharmos pelas ruas do bairro hoje, é possível distinguir em meio às descaracterizações e ao abandono as feições de casas simples que seguem uma repetição estilística particular e que conferem singularidade e identidade a área, a exemplo dos conjuntos da rua Rocha Cavalcante (ver figura 55 e 56), Rua Barão de Jaraguá (ver figura 57) e Travessa dos Artistas (ver figura 58).
Habitar o Patrimônio | 85 Figura 55 - Conjunto de casas geminadas à rua Rocha Cavalcante
Fonte: Elaboração autoral, 2018 Figura 57 - Conjunto de casas à rua Barão de Jaraguá
Fonte: Elaboração autoral, 2018
Figura 56 - Conjunto de casas descaracterizadas à rua Rocha Cavalcante
Fonte: Elaboração autoral, 2018 Figura 58 - Edifício de apartamentos na Travessa dos Artistas
Fonte: Elaboração autoral, 2018
A releitura desse padrão de ocupação em forma de Vila tem como intenções também a geração de um espaço que se adequa a poucos grupos familiares, privilegiando o indivíduo, estimulando a apropriação e a interação nas áreas de convívio comum. A partir daí, espera-se que se estabeleça uma vitalidade oportuna e uma conexão com o patrimônio edificado no sentido de reconhecimento do valor histórico, cultural e arquitetônico dos trapiches.
[4.2.] O projeto Como visto anteriormente, as posturas projetuais serão norteadoras para as decisões tanto do monumento histórico, quanto para o novo uso – residencial. Reforça-se aqui que por se tratar de um bairro no qual está estabelecido um perímetro de proteção rigorosa, necessita-se prestar atenção em como as ações irão interferir ou não na visão do conjunto histórico urbano. Partindo desse pressuposto, será apresentado e justificado a seguir as propostas enquanto projeto para o monumento histórico e sua relação com o entorno, assim como as soluções para as unidades habitacionais.
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[4.2.1.] A Consolidação do edifício histórico Seguindo a lógica das posturas projetuais apresentadas, a primeira ação de projeto centrase na preservação das qualidades originais do prédio. Tal conduta tem como objetivo respeitar a legislação específica que incide sobre o bairro e consequentemente sobre o objeto, mas sobretudo visa garantir a salvaguarda do monumento, testemunho histórico da formação social e econômica de Maceió. Para tanto, o reconhecimento das manifestações patológicas e suas prováveis causas, realizado na etapa de levantamento, juntamente com a correta intervenção preventiva poderão proporcionar um maior tempo de vida útil ao Trapiche Jaraguá, uma vez que um novo uso demanda essa preocupação. Dentro da proposta adotou-se a consolidar o edifício da forma como ele encontra-se atualmente, descoberto, pois o novo uso acarretará numa nova configuração interna que não dialoga mais com a solução de cobertura original do prédio. No entanto, as soluções da nova coberta em nada prejudicarão a leitura visual do conjunto visto do alto, uma vez que a materialidade e a inclinação no novo telhado serão semelhantes àquelas existentes no bairro (ver figura 59). Figura 59 - Proposta para o Trapiche Jaraguá visto do alto
Fonte: Elaboração autoral, 2018
Mantê-lo sob essa condição implica em alguns cuidados específicos que estão relacionados principalmente às manifestações patológicas encontradas no local. Sendo assim, serão apresentadas a seguir recomendações de correção dos problemas tanto das paredes internas,
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quanto das fachadas, encontradas no Manual de Conservação Preventiva para Edificações (1999) e na publicação Metodologia e Tecnologia na área de Manutenção e Conservação de bens edificados – O caso do Núcleo Arquitetônico Histórico de Manguinhos (2009). De modo geral, a grande causa do aparecimento das manifestações patológicas no Trapiche é decorrente da umidade. Segundo Kluppel e Santana (1999), evitar a umidade é uma tarefa difícil, uma vez que, demanda um trabalho de investigação minuciosa da sua fonte. Considerada um problema de grande importância nas construções, ela pode se manifestar de diversas formas, e causar danos como: diminuição da resistência dos materiais, potencializar o crescimento de fungos, mofos e vegetações, provocar a desagregação dos materiais pela movimentação no interior da parede, entre outros. Boa parte dos exemplos citados acima foram identificados na edificação em estudo, no entanto, esta pesquisa não se aterá às soluções em específico de cada problema, e sim elucidar de forma abrangente algumas medidas que devem ser tomadas para contornar tais questões. De acordo com as recomendações de Kluppel e Santanta (1999), para as manchas de umidade associadas ao crescimento de vegetação, fungo e mofos, encontradas nas paredes internas e principalmente dos elementos decorativos das fachadas, recomenda-se a limpeza das superfícies por meio de escovação e imunização. Deverão ser utilizadas soluções à base de hipoclorito de sódio (10%) e água, juntamente com aplicação de produtos fungicidas. Após a secagem completa (3 dias) e a retirada da camada do fungicida aplicado é que será possível a reaplicação da pintura. Para aquelas partes em que haja a desagregação do reboco é preciso atentar-se para a possibilidade da presença de sais solúveis oriundo do aerossol marinho, água da chuva ou umidade ascendente, ressalta-se que a localização do Trapiche próxima ao mar reforça a hipótese da presença de tais substâncias. Nesses casos recomenda-se a substituição das partes de reboco e argamassa salinizadas e a sua substituição por novo material adequado (KLUPPEL; SANTANA, 1999). Para a recomposição do reboco é necessário a utilização de massas a base de cal, pois aquelas compostas de cimento podem ser nocivas em alvenarias antigas, uma vez que estes podem
“transmitir sais solúveis ao material, devido à sua baixa porosidade, impedir a evaporação ou devido à sua densidade e condutividade térmica, favorecer a condensação.” (KLUPPEL; SANTANA, 1999). No que diz respeito aos procedimentos, os autores recomendam algumas precauções antes da aplicação da massa:
88 | Habitar o Patrimônio I - Re mo ção de tod a s as p ar te s sol ta s e se m ade rê n cia por meio de um a e sco v aç ão vigo ros a, c om e s cov a de ce r da s du ra s; I I - A s j un ta s de ve m se r co r tad a s a um a prof u nd id ade d e pelo me no s 1,6 cm, pa ra se ob ter a derê nci a suf icie nte . A s upe rf ície d a a l ven ari a de ve , e nt ão, s e r u me d e ci da par a red uz ir a s uc ção, e m es p ecial no s cli ma s que nt e s . Ne st a e t ap a ai nd a é po ssí ve l a u tiliz aç ão de im perme abi liz a nt es par a s e la r a s j un ta s ; I II - A plic a -se p rimei ro um a ca ma da de em boç o de tra ç o, em ar ga ma ss a de c al e a re ia gr os sa, no t r aço 1: 2 o u 2, 5 q ue de ve ser text ur iz a da co m um a de se m pe n ade ira den ta d a, pa ra q ue haj a me l hor a de rê n cia d o re bo co de ac a bame n to. O re bo co se r á u ma arg ama s sa de c al e a r e ia f i na de tr aço 1: 3 . (KLU PPEL; SA N TA NA , 1 9 99 , p. 1 21 ).
Nos elementos da fachada (cercaduras e cimalhas) a reconstituição dos pedaços deverá ser feita com moldes de madeira confeccionados a partir dos desenhos originais utilizando argamassa com composição e traço compatíveis com o existente, garantindo forma e textura. Antes da aplicação da massa é necessário a remoção das sujidades úmidas, poeira, gorduras, etc. com soluções de água e detergente neutro, bem como a remoção de fragmentos com trincha seca (PINHEIRO et al, 2009). Feito as recomposições e limpezas necessárias é possível proceder a etapa de pintura. Segundo Kluppel e Santana (1999) a “caiação” consiste da melhor técnica a ser aplicada, pois a cal permite a “respiração” e transpiração” da parede, ao contrário das tintas sintéticas que, quando aplicados em fachadas antigas provocam bolhas, desgaste da película e descolamento das camadas dos agregados. Além disso, as tintas à base de cal eram utilizadas nos antigos rebocos e paredes de alvenaria originais. Para a sua aplicação as superfícies devem estar limpas, secas e livres de poeiras, o produto deverá ser feito à base de pasta de cal e pigmentados com uma proporção que não exceda 15% do volume total da tinta. Devido a incerteza de identificação acerca cor original do prédio, convencionou-se adotar as recomendações encontradas no manual de cores para a cidade de Marechal Deodoro, elaborado no âmbito da superintendência regional do IPHAN em Alagoas. Segundo a publicação, as edificações do estilo neoclássico deverão combinar paredes em tons mais escuros e ornatos, como cercaduras e cimalhas, em tons mais claros. Para o Trapiche Jaraguá será utilizada uma paleta de cores que siga esse padrão buscando os tons complementares de azul e laranja, associado ao branco (ver figura 60). Nas paredes da parte internas predominará a cor branca em oposição as cores mais escuras dos novos materiais das unidades habitacionais.
Habitar o Patrimônio | 89 Figura 60 - Paleta de cores da fachada com base no Manual de cores de Marechal Deodoro
Fonte: Elaboração autoral, 2018
Em se tratando das novas intervenções, a reabertura dos vãos em arco pleno constitui uma das modificações nas fachadas. Serão mantidas todas as aberturas existentes, utilizando como fechamento um material contemporâneo, a escolha dos painéis metálicos perfurados na cor azul tem como intuito garantir a comunicação da entre o interior e exterior, sem prejudicar a leitura da visão de conjunto urbano no bairro (ver figura 61). Tal escolha permitiu manter a estética original do prédio, os cheios e os vazios, ao mesmo tempo em que cria uma nova atmosfera para o local, demostrando que aquele objeto sofreu uma intervenção arquitetônica recente, ganhando um novo uso. Figura 61 - Fachada à Rua Sá e Albuquerque
Fonte: Elaboração autoral, 2018
[4.2.2.] O novo objeto arquitetônico Como proposta para o espaço interno do Trapiche, um dos desafios foi conciliar a melhor distribuição das unidades habitacionais considerando a postura de mínimas intervenções internas. Isto posto, a apropriação dos cinco galpões existentes, preservando a circulação central (ver figura
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62) foi a premissa inicial do projeto. Esta distribuição espacial longitudinalmente das unidades surge como opção mais lógica e viável, pois além de ser favorável sob o ponto de visa da orientação solar, quantidade de habitações e dimensões internas, remete ao possível desenho original do prédio, onde todos os espaços se comunicavam por meio das aberturas em arco. Dessa forma, escolheu-se preservar essa lógica para uma possível leitura do que já foi este espaço de armazenamento no passado. Figura 62 - Diagrama de ocupação
Fonte: Elaboração autoral, 2018
Para as residências resolveu adotar-se a solução de unidades sobrepostas, ou seja, habitações multifamiliares de pequeno porte (térreo + 1° pavimento) possuindo isolamento funcional e com acessos independentes. Cada agrupamento de casas é coberto com telhado em duas águas, seguindo a inclinação comum no restante do conjunto e contornado por platibanda. Entende-se que tal arranjo está em consonância com as características urbanísticas e arquitetônicas do bairro de Jaraguá, onde predomina na paisagem as casas geminadas, de feições simples e repetição estilística, remetendo a ideia de vila. Tal disposição privilegia o indivíduo como protagonista do seu espaço, ao mesmo tempo que potencializa o convívio social a partir das áreas comum geradas, assim como demonstra a possibilidade de morar numa parte do território nunca antes pensado para se ter uma habitação de interesse social. Para fazer funcionar tal distribuição, foi preciso lançar mão de pequenos recuos nas faces posterior, lateral e frontal do edifício original que funcionam como pequenos quintais para auxiliar na ventilação e iluminação natural das unidades. Essa conformação, além de gerar espaços semiprivados que potencializam as relações com os vizinhos funcionam como ventilação cruzada nos
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cômodos considerados de permanência prolongada em relação ao corredor central que também é descoberto. Pensando sobre os fluxos internos e os acessos do prédio que se relacionam com a Rua Sá e Albuquerque, resolveu-se suprimir o conjunto de unidades na parte inferior dos galpões 02 e 04 para criar áreas livres semipúblicas de convivência que funcionassem como extensão da calçada, e contribuíssem com a entrada de luz e vento (ver figura 62). Em cada um desses pátios haverá funcionalidades diversas, em comum os dois compartilharão a presença da circulação vertical, composta pela escada em dois lances que dá acesso ao primeiro pavimento, além de vagas para motocicletas e bicicletas. Para proteção da escada utilizou-se o mesmo material da fachada na cor azul para criar um volume que se destaca pelos seus cheios e vazios. Figura 63 – Pátio Galpão 02
Fonte: Elaboração autoral, 2018
Já no galpão 01 tem-se como proposta dedicar este espaço a um uso comercial ou de serviço. Considerando a necessidade de eventuais manutenções tanto das áreas comuns quanto do edifício histórico, a arrecadação com o aluguel destes espaços à iniciativa privada pode gerar um fluxo de caixa que se destinará para essa aplicação. A área abrigará quatro lojas, acessadas somente pela Av. da Paz, rua que concentra o maior fluxo de veículos, e contará com banheiros acessíveis, assim como um terraço descoberto com vista para a enseada do Jaraguá. A proximidade com a Praça Marcílio Dias e o estacionamento do Jaraguá constitui-se uma das potencialidades de se ter estes espaços nessa localização. Espera-se que com essa espécie de fachada ativa, juntamente com o uso habitacional, proporcione a este trecho da Rua Sá e Albuquerque mais movimento durante o dia e também a noite, pois como foi constado nos estudos
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para o tombamento da rua e no mapa de uso do solo, essa é umas das áreas com mais abandono dentro do Setor de Preservação Rigorosa. Caso o uso comercial não se estabeleça conforme a proposta para o Galpão 1, ainda é possível que este seja ocupado com mais unidades habitacionais seguindo a mesma lógica do restante do prédio. Neste caso, seria necessária a abertura do vão de comunicação com os outros galpões. - O programa e a unidade habitacional O programa de necessidades das unidades habitacionais foi determinado a partir das demandas mais básicas de uma casa, e se define pelos cômodos da área social (sala de estar/jantar), íntima (quartos) e de serviço (cozinha/serviço e banheiro). Visando atingir um maior número de composições familiares, tendência apontada nos últimos censos, tem-se como estratégia a adoção de três tipologias arquitetônicas distintas (ver pranchas), diferenciando-se entre si apenas pela quantidade de quartos, que varia 1 a 3. Dentro desta mesma lógica, que objetiva o direito à habitação de forma igualitária, reservou-se um percentual de unidades adaptadas a pessoas com deficiência (PcD’s), tomando-se como referência a lei estadual n° 10.844/01 de São Paulo que estabelece destinação de 7% das unidades para este perfil de usuário. Figura 64 - Vista interna unidade Tipo 02
Fonte: Elaboração autoral, 2018
No que diz respeito ao zoneamento, todos os cômodos da unidade possuem aberturas para a área externa, voltados ora para a fachada norte, ora pra fachada sul, proporcionando assim a entrada de iluminação e ventilação. No caso dos banheiros, adotou-se como solução a utilização de shafts conjugados para cumprir esta função.
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Ainda em se tratando das áreas de serviço, pensando sobre o aspecto construtivo, sempre que possível agrupou-se a cozinha/serviço e banheiro para a criação de núcleos hidráulicos. Tal solução alcança uma maior racionalidade nas soluções estruturais e permite maior flexibilidade no arranjo do layout da área social. O dimensionamento dos cômodos teve como referência o tamanho dos mobiliários mais comuns encontrados no mercado, dessa forma, foi possível prever a organização dos espaços considerando a melhor disposição para os móveis. Na tabela abaixo, estão listados o quantitativo de áreas por ambiente e por tipologia. Ressalta-se que para garantir o dimensionamento das moradias acessíveis foi necessário o incremento de área construída. Tabela 2 - Dimensionamento das Unidade Habitacionais
AMBIENTES Estar/Jantar Cozinha/Serviço Banheiro Quarto 01 Quarto 02 Quarto 03 Área total da unidade
TIPO 01 11,46 m² 5,97 m² 3,75 m² 10,25 m² --32,90 m²
TIPO 02 14,70 m² 5,21 m² 2,74 m² 7,65 m² 7,65 m² -39,85 m²
TIPOLOGIAS TIPO 02 (PcD) 19,19 m² 6,39 m² 4,12 m² 7,93 m² 8,71 m² -48,53 m²
TIPO 03 16,56 m² 4,95 m² 2,75 m² 10,20 m² 11,10 m² 6,52 m² 54,96 m²
TIPO 03 (PcD) 17,37 m² 5,58 m² 4,12 m² 11,10 m² 8,72 m² 7,95 m² 58,00 m²
Fonte: Elaboração autoral, 2018
No total, considerando os dois pavimentos (térreo + 1° pavimento) atingiu-se um quantitativo de 40 unidades habitacionais, das quais 08 são de um quarto, 20 são de dois quartos e 12 são de três quartos, desse total 4 unidades são adaptadas e se localizam no andar térreo para facilitar a acessibilidade, uma vez que não seria viável a instalação de rampas ou elevadores. Essa proporção entre as unidades representa um reflexo do número médio de integrantes por família no bairro, que atinge uma média de três pessoas, sendo os núcleos familiares mais diversos composto por pai, mãe e filho, ou ainda, avó, mãe e neto. - Estrutura e Materialidade Como abordado anteriormente, a construção das novas unidades habitacionais deverá estar em consonância com a ideia de mínimas intervenções nas paredes remanescentes do Trapiche Jaraguá. Sendo assim, pretende-se como solução laçar mão de uma estrutura nova, independente, justaposta à antiga. Portanto, a superestrutura dos blocos utilizará vigas e pilares metálico com
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seção “I” (ver figura 65). Ainda que o uso desse material não seja a mais usual no Brasil, a escolha da estrutura metálica se justifica sob alguns argumentos. As estruturas metálicas representam uma maior produtividade e velocidade aos projetos, se comparado aos sistemas construtivos mais convencionais como alvenaria. Por ser um elemento pré-fabricado, esta solução racionaliza os processos na obra, evita desperdícios de materiais e reduz a quantidade de mão de obra e as necessidades de um canteiro convencional no local, uma vez que o Trapiche apresenta dimensões reduzidas para essa finalidade. Sabe-se, no entanto, que apesar de apresentar um custo inicial mais elevado em relação aos sistemas convencionais, os custos-benefícios do aço são maiores. Atualmente no Brasil existe uma tendência na busca por soluções estruturais mais sustentáveis e industrializadas face a demanda pela construção de habitação de interesse social. Figura 65 - Perfil "I"
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/12pEJM> Acesso: 24 jul. 2018
Figura 66 - Perfil laje Steel deck
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/M7FmLN> Acesso: 24 jul. 2018
Associado à estrutura metálica os fechamentos e a laje também seguirão a lógica da préfabricação. Nas lajes pretende-se o uso do sistema steel deck (ver figura 66) ou também conhecido como laje mista, que consiste de uma chapa de aço galvanizado em formato trapezoidal que tem dupla função, funciona como fôrma no momento da execução da laje e como armadura após a secagem do concreto. A fim de garantir o melhor desempenho deste tipo de sistema recomenda-se a previsão de armaduras para ampliar a sua resistência. Para as paredes propõe-se a utilização de um sistema misto, onde alguns componentes constituirão as superfícies, para tanto, serão utilizados perfis de aço galvanizado de 90mm no qual serão parafusadas placas de gesso acartonado em ambos os lados com aplicação de massa corrida e pintura (ver figura 67). No interior das paredes recomenda-se o seu preenchimento com lã de vidro ou mineral, para auxiliar no conforto térmico e acústico. Já nas paredes voltadas para o exterior, pretende a utilização do mesmo sistema, porém substituindo os fechamentos por placas
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cimentícias em seu acabamento original, cujo desempenho em áreas externas é melhor se comparado ao gesso sob o ponto de vista da manutenção e durabilidade. A aplicação das placas cimentícias, juntamente com os pilares metálicos aparentes, darão pistas do novo objeto arquitetônico e proporcionarão o contraste com as paredes originais do prédio que permanecerão na cor branca. Espera que a associação entre estes elementos contemporâneos e antigos evidenciem as partes remanescentes do Trapiche, de modo que um e outro se complementam, criando uma estética pitoresca e que modifiquem a imagem de estrutura degradada que hoje está associada ao patrimônio do bairro. Figura 67 - Sistema construtivo: paredes
Figura 68 - Placas cimentícias
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/kS1jP8> Acesso: 24 jul. 2018
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/hJwz55> Acesso: 24 jul. 2018
Em se tratando das coberturas, a legislação do Setor de Preservação Rigorosa, exige a manutenção da forma e inclinação da coberta, bem como a materialidade a ser empregada dialogue com o conjunto urbano do bairro. Desse modo, pretende-se a utilização de uma telha mais durável e com fácil manutenção do que as do tipo capa/canal. Assim adotou-se como solução a telha de fibrocimento na cor cerâmica (ver figura 69), ideal por se assemelhar à estética do bairro do Jaraguá. Para a cobertura da escada e da passarela que proporciona o acesso as residências no 1° pavimento empregou-se o uso de um pergolado metálico coberto com placas de policarbonato transparente. Figura 69 - Telha fibrocimento na cor cerâmica
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/UTohwh> Acesso: 24 jul. 2018
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Nas áreas comuns, a utilização de materiais mais duráveis e que exigem pouca manutenção se mantém. No piso, adotou-se como material um pavimento drenante de concreto de 50x50cm na cor bege (ver figura 70) substituindo os variados acabamentos existentes e conferindo unidades aos galpões. Este material tem como principal função drenar a água da chuva, contribuindo para o escoamento superficial e evitando o acumulo de poças d’água nestes espaços. Já para os mobiliários, pretende-se usar como acabamento a madeira plástica, e concreto aparente, e nos guarda-corpos e nos arcos da fachada um painel metálico perfurado (ver figura 71) pintado na cor azul. Figura 70 - Piso drenante na cor bege
Figura 71 - Painel metálico perfurado
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/J2Wz47> Acesso: 24 jul. 2018
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/922x4R> Acesso: 24 jul. 2018
- Infraestrutura De um modo geral, após o processo de revitalização do bairro, o Jaraguá passou por um melhoramento da sua infraestrutura, como a expansão do sistema de abastecimento de água e esgotamento sanitário, coleta de lixo, enterramento da rede elétrica e de telefonia, etc. Sendo assim, tais aspectos conferem à área a capacidade abrigar o uso habitacional proposto sem maiores intervenções no sentido da instalação de infraestrutura básica. No que diz respeito às soluções de infraestrutura para o novo objeto, destaca-se que todas as unidades habitacionais têm seu abastecimento realizado de forma individual, permitindo que cada família pague somente pelo valor que consumiu. A solução formal da cobertura proporcionou a distribuição dos reservatórios ao longo do seu interior evitando a sua visualização externa quando vista do alto, fato que poderia interferir na visão do conjunto urbano. Ainda na coberta sugere-se a instalação de placas solares fotovoltaicas, com intuito de contribuir na geração de energia elétrica para as unidades. Esta estratégia visa a economicidade na conta de luz das famílias, que já possuem uma renda mensal limitada, assim como permite que o excedente gerado pelo sistema seja redistribuído para a concessionária municipal.
Habitar o Patrimônio | 97
- Áreas Livres comuns As áreas livres comuns são um aspecto chave na resolução desse projeto, pois permitem a delimitação dos fluxos internos no condomínio, ao mesmo tempo que cria o que se pode chamar de espaços “conectores”, pois além de fazer a interligação entre os espaços, propicia as relações sociais entre os moradores. Interconectados entre sim, eles oferecem diferentes opções de acesso e percursos. Por serem abertos, tanto os dois pátios, quando os espaços dos corredores (térreo + 1° pavimento) são favorecidos pela iluminação e ventilação naturais. No corredor central (ver figura 72) estão dispostos mobiliários versáteis, que permitem diversas apropriações, seja assento (em suas variadas alturas) ou espaço para trabalho. A presença da vegetação também cumpre o seu papel ao tornar esse longo alinhamento num local agradável, e a propicia cultivo de diversas espécies de planta em meia sombra. Ressalta-se que a utilização de jardineiras tem o propósito de diminuir a necessidade de manutenções frequentes e possibilita a flexibilização no uso do espaço. Outra proposta para este espaço é a utilização dos pilares de madeira remanescentes para servir de apoio a redes remetendo a ideia das varandas tradicionais no Nordeste. Figura 72 - Corredor Central
Fonte: Elaboração autoral, 2018
Nos pátios centrais os usos pensados relacionam-se diretamente com a distribuição dos mobiliários, aquele mais vazio onde predomina mais a vegetação e a área livre destinam-se ao encontro das crianças mais novas, permitindo as brincadeiras ao ar livre como corridas, cirandas, amarelinha, etc. Já no outro pátio (ver figura 73) a presença de mobiliários com mesas, propicia a ocupação da faixa etária mais jovem, bem como os mais velhos onde os espaços de sentar estimulam
98 | Habitar o Patrimônio
as conversas e jogos de mesa como dama, xadrez, dominó. Ainda a presença da mini arquibancada em madeira evoca diversas apropriações pelos usuários, tornando-se um mobiliário orgânico que pode ser convertido em assentos quando houverem reuniões ou ainda a projeção de filmes e documentários ao ar livre. Figura 73 - Pátio Galpão 04
Fonte: Elaboração autoral, 2018 Figura 74 – Projeção documentário no pátio
Fonte: Elaboração autoral, 2018
d
d
d
N e
g
g
e
e
e
b
e
e g e
g
GALPÃO 05
g
GALPÃO 04
a
a
g
GALPÃO 03
e
g
a
GALPÃO 02
a
e
GALPÃO 01
e
g
c
e
e
g
e
e f
e
f
AV. DA PAZ
f
PLANTA BAIXA
b
c
c
b
c
b
c
b
b
ESCALA: 1/125
RUA SÁ E ALBUQUERQUE
LEGENDA
Alvenaria existente à manter
Alvenaria existente à demolir
Jardins - solo natural
Demolir pisos e nivelar
Fechar e nivelar vãos em alvenaria
Fechar e nivelar vãos em alvenaria
a
Recuperar bases em alvenaria, aplicando nova pintura a base de cal e realizar descupinização e preenchimento de fissuras e pequenos buracos nos pilares de madeira.
b
Demolir trecho em alvenaria, mantendo a forma de arco da abertura e substituindo por fechamento em painel metálico perfurando na cor azul.
c
Realizar reparos na fachada (limpeza, recomposição de ornatos e reboco, manchas de umidade, etc.) e aplicar nova pintura à base de cal cor salmão para o fundo e branca para os ornatos.
d
Remover portas de ficha carcomidas e fechar vão com alvenaria utilizando argamassa de cal e areia.
e
Remover e nivelar piso, substituindo-os por piso drenante de 50x50cm na cor bege.
f
Realizar reparos nas paredes internas (limpeza, recomposição de e reboco, remoção de manchas de umidade) e aplicar nova pintura à base de cal na cor branca.
g
Construir novas unidades e lojas em estrutura metálica com acabamento externo em placas cimentícias.
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
PLANTA BAIXA - CONSTRUIR/DEMOLIR
03
09
09
09
09
N 07
01
03
03
01
03
03
07 06
02
Proj. circulação 1°pav.
07
Proj. circulação 1°pav.
02
Proj. circulação 1°pav.
07
sobe
07
02
sobe
07
10
11
sobe
02
Proj. viga
Proj. circulação 1°pav.
02
Proj. viga
02
Proj. viga
02
ACESSO PEDESTRE
06
07
11
10
02
05
05
01
07
12
01
04
04
12 07
08
06
ACESSO PEDESTRE
06
09
09
PLANTA BAIXA - PAV. TÉRREO
ACESSO MORADORES
AV. DA PAZ
08
09
ACESSO MORADORES
ESCALA: 1/125
RUA SÁ E ALBUQUERQUE
LEGENDA
01 Unidade TIPO 01 (1 quarto)
03 Unidade TIPO 03 (3 quartos)
05 Unidade TIPO 02 PcD (2 quartos)
07 Corredor Central
09 Quintais
11 Vaga para motos
02 Unidade TIPO 02 (2 quartos)
04 Unidade TIPO 03 PcD (3 quartos)
06 Lojas/Serviços
08 Pátios
10 Bicicletário
12 Jardim
ÁREAS TOTAIS:
Área Construída: 2.576,06 m²
Área dos Espaços Livres Privados: 192,74 m²
Área da Coberta: 1.288,03 m²
Área dos Espaços Livres Comuns: 643,95 m²
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
PLANTA BAIXA - PAVIMENTO TÉRREO
04
01
06
06
03
06
03
02
01
02
02
03
02
04
Proj. viga
Proj. viga
Proj. viga
02
04 04
desce
02
03
02
04 04
N
desce
04
07
desce
desce
06
02
02
02
01
01
08
03
03
08
05
06
06
AV. DA PAZ
05
06
PLANTA BAIXA - 1° PAV. ESCALA: 1/125
RUA SÁ E ALBUQUERQUE
LEGENDA
01 Unidade TIPO 01 (1 quarto)
03 Unidade TIPO 03 (3 quartos)
05 Pátios
07 Terraço Descoberto
02 Unidade TIPO 02 (2 quartos)
04 Circulação Passarela
06 Quintais
08 Jardim
ÁREAS TOTAIS:
Área Construída: 2.576,06 m²
Área dos Espaços Livres Privados: 192,74 m²
Área da Coberta: 1.288,03 m²
Área dos Espaços Livres Comuns: 643,95 m²
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
PLANTA BAIXA - 1° PAVIMENTO
05
02
02
02
calha
calha
calha
Telha Fibrocimento i=30%
Telha Fibrocimento i=30%
i=30%
N
calha
rufo
Telha Fibrocimento i=30%
02
i=30%
rufo
calha
Telha Fibrocimento i=30%
Telha Fibrocimento i=30%
i=30%
Telha Fibrocimento i=30%
Telha Fibrocimento i=30%
Telha Fibrocimento i=30%
i=30%
rufo rufo
rufo
rufo
calha
calha
calha Pergolado metálico com cobertura em policarbonato
Pergolado metálico com cobertura em policarbonato
Pergolado metálico com cobertura em policarbonato
Pergolado metálico com cobertura em policarbonato
Pergolado metálico com cobertura em policarbonato calha
calha
rufo rufo
Telha Fibrocimento i=30%
i=30%
desce
03
rufo
rufo
04
i=30%
calha
Telha Fibrocimento i=30%
Telha Fibrocimento i=30%
04
Telha Fibrocimento i=30%
01 rufo
calha calha
calha
calha
02
rufo
01 calha
AV. DA PAZ
calha
02
02
PLANTA DE COBERTA ESCALA: 1/125
RUA SÁ E ALBUQUERQUE
LEGENDA
01 Pátios
03 Terraço Descoberto
02 Quintais
04 Jardim
ÁREAS TOTAIS:
Área Construída: 2.576,06 m²
Área dos Espaços Livres Privados: 192,74 m²
Área da Coberta: 1.288,03 m²
Área dos Espaços Livres Comuns: 643,95 m²
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
PLANTA DE COBERTA
06
Linha de Sessão forro
forro
forro
ESTAR
W.C.
W.C.
forro
forro
forro
ESTAR
W.C.
W.C.
forro
ESTAR forro
ESTAR
forro
ESTAR forro
ESTAR
forro
forro
W.C.
W.C.
forro
forro
W.C.
W.C.
forro
forro
ESTAR
forro
ESTAR
forro
forro
ESTAR
PÁTIO
W.C. forro
ESTAR
forro
forro
W.C. forro
W.C.
forro
forro
ESTAR forro
ESTAR forro
ESTAR
forro
forro
PÁTIO
W.C. forro
ESTAR
W.C.
forro
W.C.
forro
forro
ESTAR
forro
W.C.
TERRAÇ0
forro
ESTAR
forro
W.C.
LOJA
CALÇADA
CORTE AA’ Linha de Sessão
ESCALA: 1/125
forro
forro
QUARTO forro
forro
W.C. forro
QUARTO forro
CIRC. forro
ESC.
W.C.
QUARTO
CIRC.
PÁTIO
CALÇADA
CORTE BB’
FACHADA OESTE
ESCALA: 1/125
ESCALA: 1/125
FACHADA OESTE ESCALA: 1/125
ÁREAS TOTAIS:
Área Construída: 2.576,06 m²
Área dos Espaços Livres Privados: 192,74 m²
Área da Coberta: 1.288,03 m²
Área dos Espaços Livres Comuns: 643,95 m²
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
CORTES E FACHADAS
07
05
04 04 04
04
05
05
04
05
03 03
03
03
03 01 01
01
01 01
06 02
02
06 02
02
02
PLANTA BAIXA-UNIDADE TIPO 01
PLANTA BAIXA-UNIDADE TIPO 02
PLANTA BAIXA-UNIDADE TIPO 02 PcD
PLANTA BAIXA-UNIDADE TIPO 03
PLANTA BAIXA-UNIDADE TIPO 03 PcD
ESCALA: 1/50 Área: 32,90m²
ESCALA: 1/50 Área: 39,85m²
ESCALA: 1/50 Área: 48,53m²
ESCALA: 1/50 Área: 54,96m²
ESCALA: 1/50 Área: 58,00m²
LEGENDA
01 Estar/Jantar
03 Banheiro
05 Quarto 02
HABITAR O PATRIMÔNIO: PROPOSTA DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA O TRAPICHE JARAGUÁ EM MACEIÓ/AL
02 Cozinha/Serviço
04 Quarto 01
06 Quarto 03
DETALHE UNIDADES HABITACIONAIS
08
104 | Considerações Finais
Considerações Finais | 105
106 | Considerações Finais
[5.]
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Aqui podia morar gente.” Esta frase, estampada em inúmeros imóveis pelo Centro Histórico de Salvador, foi o monte inicial que deu ânimo para a elaboração deste trabalho. A iniciativa dos moradores do bairro de Santo Antônio na capital baiana aponta para a seguinte reflexão... como é injusta e desigual a forma como se distribui a moradia no território das cidades atualmente; como as áreas urbanas centrais, especialmente os sítios históricos urbanos, tem o potencial de poder abrigar tantas famílias num patrimônio já edificado. Partido desses questionamentos, a busca num referencial teórico permitiu elucidar perguntas como: Por que as áreas centrais, em muitos casos, não são encaradas pelos planejadores como local das habitações populares? Por que algumas intervenções urbanísticas deixaram de lado essa parcela da população? Não é possível haver um processo de transformação que seja condizente com as necessidades destas pessoas nas áreas centrais, bem como das cidades contemporâneas? Como foi possível perceber as respostas a estes questionamentos estão expressas na ideia de diversos autores, assim como está registrada em vários âmbitos legais, como o Estatuto da Cidade. Porém, para além do discurso, tais entendimentos não se expressam na realidade, fortalecendo um cenário de contradições urbanas, com a falta de moradia, imóveis abandonados e esvaziamento dos centros. Fazendo um paralelo com o cenário local, na cidade de Maceió/AL e no Jaraguá, é possível enxergar as marcas dessas contradições urbanas. O bairro que já foi palco do desenvolvimento econômico no século XIX e XX, passou por diversos momentos e por ser considerado uma centralidade histórica, acumula em seu tecido urbano um patrimônio cultural e arquitetônico de inestimável valor. Entretanto, vem correndo perigo em virtude de algumas posturas intervencionistas equivocadas. Sob essa lógica, trazer a habitação para esse sítio histórico tem como intuito, romper com os paradigmas urbanos em voga e demonstrar que é possível e necessário alcançar um modelo de cidade mais justo, democrático e sustentável. Isto posto, ao analisarmos o patrimônio edificado do bairro percebe-se na paisagem a marca dos antigos armazéns, denominados Trapiches, que no passado dominaram a perspectiva da Rua Sá e Albuquerque e da enseada natural do porto. Dentre aqueles que se mantiveram com o passar dos anos, chama atenção pelo seu péssimo estado de conservação o Trapiche Jaraguá. Sabe-se que a
Considerações Finais | 107
pelo menos uma década este imóvel não possui um uso e vem sofrendo com o processo de degradação e “esquecimento” pelos proprietários. É nesse ponto que reside a contribuição desde trabalho, pois visualizou-se a possibilidade de responder a dois problemas: I – a demanda por espaços de moradia, especialmente aquela voltada para as populações mais vulneráveis e II – como promover a função social, por meio da reabilitação, de um edifício abandonado, objeto arquitetônico com valor cultural. Para tanto, conhecer o território sob seus diversos aspectos, assim como a população ao qual se destina esta proposta foram cruciais para as decisões projetuais expressas no tópico anterior. Sendo assim, o projeto de reabilitação do Trapiche Jaraguá buscou equacionar algumas questões como: a melhor forma de consolidar um edifício histórico, respeitando seus condicionantes legais enquanto objeto arquitetônico inserido num sítio histórico urbano, bem como a melhor solução técnica para viabilizar a inserção de unidades habitacionais, preocupando-se com a estética, durabilidade, adequação e qualidade nos espaços comuns e de moradia. É preciso destacar que a proposta apresentada deve ser interpretada como um exercício de projeto, no qual a intenção é demonstrar como é possível pensar o patrimônio cultural, inserido nas questões urbanas atuais. Desse modo, espera-se que esta pesquisa abra margens para novas interpretações de como solucionar o esvaziamento e decadência do Jaraguá, proporcionando ao bairro uma nova vitalidade, bem como trabalhar os temas relacionados ao déficit habitacional que marca o cenário da moradia em Maceió. Por fim, aponta-se como principais desafios para a construção deste trabalho a falta de informações e de referencias que tratem do Trapiche Jaraguá, assim como a escassez de repertório de projetos arquitetônicos voltados para habitação em centros históricos. No entanto, apesar das dificuldades, as questões levantadas até aqui abrem espaço para novas reflexões capazes de gerar outras linhas de pesquisa, a exemplo da melhor forma de financiamento e gestão das unidades, ou ainda a que custo final alcançaria cada residência.
108 | Referências
[6.] REFERÊNCIAS ABREU, Luciano Muniz. Territórios turísticos e o desenho da paisagem urbana litorânea no nordeste brasileiro: uma análise de projetos de urbanização financiados no âmbito do Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste do Brasil (PRODETUR/NE). 2005. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo – PROARQ) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005. ALAGOAS. Lei n. 6.061, de 19 de novembro de 1984. Homologa resolução do conselho Estadual de Cultura e de Preservação do patrimônio Histórico, artístico e natural. Disponível em: <http://www.cultura.al.gov.br/politicas-e-acoes/patrimonio-cultural/principal/legislacoes/decretono-6061-1984> Acesso em: 27 jan. 2018. ATAÍDE, Débora Lucena. Jaraguá ontem e hoje: Um lugar sob a ótica dos idosos. 2015. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo – DEHA) – Universidade Federal de Alagoas, Maceió, 2015. BAETA, R. E.; NERY, J. C. reflexões sobre intervenções arquitetônicas contemporâneas em ruínas. Oculum ensaios – Revista de Arquitetura e Urbanismo, Campinas, v.14, n.2, p. 217-240, maioagosto 2017. BAHIA. CONDER. Companhia de Desenvolvimento Urbano do estado da Bahia. Centro Antigo de Salvador; Plano de Reabilitação Participativo: Avanços. Salvador, 2014. BERNARDINO, Iana Ludemir. Para morar no centro histórico: Condições de habitabilidade no Sítio Histórico da Boa Vista no Recife. 2011. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Urbano) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011. BITENCOURT, Gabriela Campelo Aragão. Repensando o Jaraguá: Zoneamento, diretrizes e proposta de intervenção na paisagem histórica-urbana. Trabalho Final de Graduação. (Graduação em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Federal de Alagoas, Maceió, 2017. BONDUKI, Nabil. Intervenções urbanas na recuperação de centros históricos. Brasília: Iphan / Programa Monumenta, 2010. BRASIL, Ministério das Cidades; Agência Espanhola de Cooperação Internacional, AECI. Manual de Reabilitação de Áreas Urbanas Centrais. Brasília: Ministério das Cidades, 2008.
Referências | 109
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Portal
CAU/BR.
Brasília,
12
out.
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<
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110 | Referências
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Disponível
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<http://www.maceio.al.gov.br/wp-
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