PREVENÇÃO COMBINADA + PRAZER A CAMISINHA NÃO É SUA ÚNICA ALIADA NA PREVENÇÃO, VIU, MONA?
ENTREVISTA COM ÉRIKA HILTON CONHEÇA UM POUCO DA ATUAÇÃO POLÍTICA NA PREVENÇÃO DA IST NA CIDADE DE SP
PROVOCAÇÕES
VOCÊ JÁ PAROU PRA PENSAR QUE, DE CERTA FORMA, NADA EM NOSSAS RELAÇÕES É NATURAL?
REALIZAÇÃO
Agência Educomunicativa PositHIVa
SAIBA MAIS SOBRE O PROGRAMA
OPra Brilhar é um programa da Viração Educomunicação em parceria com a Coordenadoria de IST/Aids da cidade de São Paulo, buscando dar respostas aos estigmas relacionados ao HIV e a Aids através da organização e atuação das juventudes LGBTQIAPN+, racializadas e periféricas da cidade, que representa um dos grupos que mais mostra novas infecções do vírus1. Desde 2018, o Pra Brilhar reuniu mais de 100 jovens, em mais de 200 horas de formação, para mobilizar elus por meio da educomunicação e ações de advocacy, a produzirem materiais de comunicação que pudessem materializar uma forma de fazer prevenção combinada que parte das vivências e demandas desse mesmo grupo.
1 Fonte: Boletim Epidemiológico de HIV/Aids da cidade de São Paulo (2023)
A
AGÊNCIA EDUCOMUNICATIVA
POSITHIVA PRA BRILHAR
AAgência
Pra Brilhar tem como missão contribuir para a promoção da saúde e demais direitos da população juvenil, em especial adolescentes e jovens vivendo com HIV, LGBTQIA+ e HSH, por meio de ações, processos e produtos de comunicação, mobilização social e advocacy que visem ao enfrentamento do estigma e preconceito relacionados ao HIV.
EXPEDIENTE
A produção desta edição foi financiada pela Coordenadoria de IST/Aids da cidade de São Paulo, por meio do Termo de Fomento Nº 07/SMS/2021.
COORDENAÇÃO TÉCNICA DA VIRAÇÃO EDUCOMUNICAÇÃO
COORDENAÇÃO EXECUTIVA
Ellen de Paula
COORDENAÇÃO DE PROJETOS
Jéssica Rezende
COORDENAÇÃO ADJUNTA
Vânia Correia
COORDENAÇÃO TÉCNICA DA COORDENADORIA DE IST/AIDS DA CIDADE DE SÃO PAULO
Celso Monteiro
Adriano Queiroz da Silva
Aline Pilon
EQUIPE DE FORMAÇÃO AGÊNCIA PRA BRILHAR VIRAÇÃO EDUCOMUNICAÇÃO
ANALISTA DE EDUCOMUNICAÇÃO
Mariano Figueira
Escaneie o QR Code e conheça o trabalho da Agência Educomunicativa PositHIVa Pra Brilhar
RG DA VIRA
ISSN 2236-6806
COORDENAÇÃO COLEGIADA
Ellen de Paula
Vania Correia
Paulo Lima
CONSELHO DELIBERATIVO
Aurea Lopes
Bruno Ferreira
Simone Nascimento
CONSELHO FISCAL
Marilda dos Santos
Rafael Alves da Silva
Vanessa Vieira Camargo
DIRETOR INTERNACIONAL
Paulo Lima
COORDENAÇÃO EXECUTIVA
Ellen de Paula
COORDENAÇÃO ADJUNTA
Vania Correia
EDUCOMUNICADORA
Núbia Verneck
COORDENAÇÃO EDITORIAL
Esta revista foi criada a partir de um processo educomunicativo facilitado pela VIração, organização social sem fins lucrativos que realiza processos e produtos de comunicação para a promoção dos direitos de adolescentes e jovens
EDIÇÃO EDUCOMUNICATIVA
Mariano Figuera e Núbia Verneck
REVISÃO
Fernanda Bueno
Gabriel Campbell
Lia Sala
DIAGRAMAÇÃO
Luíso Camargo
ILUSTRAÇÃO E ARTE DA CAPA
Iúna Mariá Herminio de Paula
EDIÇÃO
Mariano Figuera
Núbia Verneck
EQUIPE
Ana Paula da Silva, Camila Alves, Cleide Agostinho, Ellen de Paula, Jéssica Rezende, Juliane Cruz, Kalline Lima, Mariano Figuera, Monise Berno, Natalie Hornos, Núbia Verneck, Patrícia Cavalcanti, Ramona Azevedo, Rhafaela Resende, Tarcísio Camelo, Thaynara Floriano e Vania Correia
ENFRENTAR OS ESTIGMAS página 20 PODCAST DIZTRAVA página 27
ENSAIO AGÊNCIA página 22
CRIANÇAS LGBTQIAP+ EXISTEM? página 28
LOCO AFÁN: CRÔNICAS DE SIDARIO - PEDRO LEMEBEL página 30
O HIV NA CIDADE DE SÃO PAULO página 17
MAIS MACHO QUE MUITO HOMEM página 23
E O ARTHIVISMO? página 29
TERAPIA DUPLA EM UM COMPRIMIDO ÚNICO página 37
LUGARES DE PERTENCER: BRISANDO NA FAVELA LIGADAS NA PRE VENÇÃO página 36
COLA E LAMBE COMO FAZ LAMBES? página 39
MANDA VÊ
UMA RESPOSTA INDIVIDUAL PARA UMA
QUESTÃO COLETIVA
O que pessoas de gerações diferentes têm a dizer sobre como o HIV atravessa suas vidas?
O HIV tem a ver com você. Essa afirmação esbarra em diversas camadas de todas as pessoas. O quanto as pessoas sabem do que existe para cuidar da sua saúde sexual? Existem barreiras que dificultam o acesso aos serviços para pessoas LGBTQIAPN+, racializadas e de quebrada. Falar sobre HIV envolve discutir jeitos de transar e se relacionar, formas de prevenção, sexualidade, gênero, racialidade e a pouca quantidade de informação de qualidade e de linguagem acessível sobre o tema.
BEATRIZ MOREIRA, estudante 21 anos | São Paulo (SP)
“Eu tive um tio com HIV, que morreu da Aids.
O papel que teve por ter acompanhado todo esse processo foi de conscientização, mas é uma conversa que não é desenrolada o suficiente ainda pra mim.”
TEXTO NÚBIA VERNECK, EDUCOMUNICADORA EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM FREEPIK
Entender e enxergar os significados sobre os estigmas ligados ao HIV/Aids e vários outros temas escancaram como, mesmo sem saber, todos têm uma relação com o vírus. Pessoas muito diferentes pensam coisas parecidas ou não sobre o que o HIV tem a ver com elas? Por isso, a galera quer saber:
O que o HIV tem a ver comigo?
IZABEL,
aposentada e vendedora autônoma 62 anos | São Paulo (SP)
“O HIV pra mim deve ter sempre prevenção, que é o melhor remédio. Seja conhecendo mais ou deixando mais fácil o tratamento. “
ANDRÉ SOBREIRO, jornalista
40 anos | São Paulo (SP)
KAWAN FREITAS,
profissional da saúde
23 anos | São Paulo (SP)
“Eu sou o Kawan, tenho 23 anos, sou da Zona Sul de São Paulo, do Capão Redondo. Eu acho que o HIV tem a ver comigo porque é o role de autocuidado. Eu acho que não só de autocuidado mas também de amor ao próximo, respeito e cuidado. A partir do momento que eu cuido do próximo, eu cuido de mim. A partir do momento que o próximo cuida dele, ele cuida do outro também. É pra além de se cuidar, é passar informação do que é o HIV, como é o HIV, como é o tratamento. Quanto mais as pessoas saberem do HIV é melhor.”
“Vivo com HIV desde meus 29 anos. Descobrir o vírus em meu corpo, lá em 2012, foi um choque. Eu era bastante desinformado sobre o tema. Mas tratei de correr atrás e, com o tempo, fui entendendo que não tem nada de errado com isso. A gente não se envergonha de ter gripe, ou catapora, ou asma. Por que ter vergonha do HIV? A resposta não está em mim, mas sim no outro. Preconceito, desinformação e conceitos já mais que ultrapassados. Com cuidado - que nem é tão complexo assim - viver com HIV é perfeitamente normal.
E quem foi que disse o que
Oque te alimenta de vida? Achar a essência e objetivo da vida é uma questão atemporal. Esse problema também estava posto para as sociedades antigas. Contudo, a diferença entre elas está na maneira de explicar o mundo. As chuvas, por exemplo, eram explicadas nas divindades em diferentes regiões do continente africano. A chuva impactava diretamente a organização dessas sociedades, podendo representar a força dos líderes políticos e a proximidade com suas espiritualidades. Hoje, independente de características culturais, é comum saber que a chuva faz parte de um ciclo de renovação da água. O que explica esses acontecimentos é a ciência.
A organização do mundo se transforma a partir da ciência. Ela não é neutra, pois o método científico parte de contextos sociais e das pessoas que a fazem.
TEXTO NÚBIA VERNECK, EDUCOMUNICADORA EM SÃO PAULO/SP ILUSTRAÇÃO IÚNA MARIÁ
BRUNA LOPES, maquiadora
30 anos | São Paulo (SP)
“Moro aqui no Capão Redondo e o HIV tem muito a ver comigo porque além de travesti, eu sou uma travesti ex-profissional do sexo. Então, nessa fase que eu trabalhei na rua, eu estive em constante exposição de risco de infecção do HIV hoje em dia essa realidade não faz parte da minha vida. Hoje eu sou agente de prevenção, e toda a informação sobre HIV/Aids, ISTs, que eu recebia um tempo atrás, eu transmito hoje pra outras pessoas jovens e outras travestis também.”
A religião também é uma influência para a ciência. No contexto de disputa política no processo de colonização europeu, essa mudança na forma de organizar o mundo através do método científico e de forma racionalizada, também vinha do credo cristão e sua importância naquela sociedade. Isso implicava, no século XIV, normas sociais e religiosas rígidas, heterossexuais, brancas e teocentristas.
O problema é que essa forma foi empurrada goela a baixo, via escravização de populações originárias. Por fim, os efeitos do “progresso” ainda estão nas cicatrizes dos descendentes desses grupos. O que define as configurações de quem podemos ser, do que é ou não normal? Em nome do avanço nas bases da colonização europeia, o Brasil produziu 350 anos de escravização das populações originárias e negras. Nesse processo, apagou outras formas de estrutura de organização social, de gênero, sexualidade, divisão social do trabalho, tempo, vida e o sentido delas. A violência e controle foram os motores desse processo.
A morte e o silenciamento das pessoas e suas culturas parecem fazer naturalizar todas essas explicações de mundo colonizadas. Quando não se pode registrar uma outra versão dos fatos, fica muito mais fácil fazer parecer que foi sempre assim. Você já parou para pensar que, de certa forma, tudo o que acreditamos foi inventado e que nada em nossas relações é natural? Homem é mais forte que mulher? Cabelo liso é mais normal que crespo? Ser hétero é uma escolha? Magreza é sinônimo de saúde? O que é serviço de preto? Pênis é igual a homem e vagina igual a mulher? Você já imaginou que seu filho seria transmasculino?
SOBRE NÓS
AAgência PositHIVa Pra Brilhar é uma iniciativa da Viração Educomunicação em parceria com a Coordenadoria Municipal de IST/Aids da cidade de São Paulo. Atuamos desde 2022 com o objetivo primordial de contribuir para a redução da epidemia de HIV/Aids entre as juventudes LGBTQIAP+ da cidade de São Paulo, por meio da disseminação de informações produzidas entre pares através da educomunicação.
Nosso trabalho é baseado em uma abordagem centrada nas pessoas que vivem com HIV, valorizando seu bem-estar, suas histórias de vida e seus direitos. Reconhecemos a importância de considerar que estamos lidando com indivíduos que possuem identidades diversas, experiências únicas, emoções e necessidades plurais quando falamos sobre saúde sexual.
Temos como principal foco a divulgação de informações e dados sobre prevenção combinada, notícias sobre os avanços em relação ao tratamento do HIV/Aids e suas intersecções com a diversidade sexual, assim como também o direito à cidade e os direitos à comunicação entre as juventudes.
TEXTO MARIANO FIGUERA, ANALISTA DE EDUCOMUNICAÇÃO, EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM
GIVVA
Nossa equipe está constituída por jovens educomunicadores da cidade de São Paulo, que reinterpretam e propõem textos, conteúdos audiovisuais, podcasts e outros formatos midiáticos, embasados em artigos assinados por especialistas na área de saúde. Atualizando também conteúdos produzidos por e com pessoas que vivem com HIV/ Aids, além de dados sobre a evolução da epidemia no mundo e os resultados de pesquisas realizadas em estudos de gênero e diversidade.
Através dessas informações, nosso objetivo é proporcionar um espaço seguro e informativo para as juventudes pretas, periféricas e LGBTQIAP+, estimulando conversas importantes sobre prevenção, saúde, autocuidado e diversidade. Conheça a equipe da Agência Pra Brilhar, comprometida em promover uma abordagem jovem, crítica, inclusiva e respeitosa no combate aos estigmas e mitos relacionados ao HIV/Aids. Estamos aqui para brilhar juntos!
ANOS 20DE PREVENÇÃO
NoBrasil, o primeiro caso registrado de HIV foi em 1983, em São Paulo e, rapidamente, ficou mais necessária uma resposta para essa crise de saúde e social. Em 2023, a cidade de São Paulo notificou que 50.000 estão em tratamento de HIV. Também em 2022, a cidade continua em uma diminuição de novos casos, fato que acontece há seis anos, atingindo 45% a menos em novas infecções, segundo o boletim epidemiológico de 2023. Os dados mostram que pessoas entre 15 a 29 anos possuem o maior número de casos novos, mas hoje, nota-se uma queda de 49% dos casos, também no município.
Muitas pessoas começam a transar antes dos 18 anos e não têm informações seguras sobre prevenção por conta da repressão sexual, idade, sexualidade e outros fatores. Na maioria das vezes, a família cuida da saúde do jovem, o que dificulta a busca por um atendimento que fale das questões sexuais. Dados do projeto PrEP Adolescentes mostram que os jovens hoje têm a mesma quantidade de informações que seus avós sobre prevenção. A falta de informação e autonomia deixa os jovens mais vulneráveis a elas e aprofunda os estigmas.
Nos últimos 20 anos, a Viração tem mobilizado as juventudes de São Paulo a conhecer e exigir seus direitos sexuais, reprodutivos e de prevenção combinada. Será que muita coisa mudou de lá pra cá? O movimento das juventudes vivendo com HIV, nos anos 2000, apontava
TÁ NA MÃO
A Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) é um medicamento que cria um tipo de barreira contra o vírus do HIV usando antirretrovirais, seja diário, sob demanda ou injetável. O PrEP1519 é um estudo desenvolvido em três capitais brasileiras, Salvador (BA), Belo Horizonte (MG) e São Paulo (SP), entre adolescentes de 15 a 19 anos que se identifiquem como mulheres transexuais ou travestis ou como homens cisgêneros gays, bissexuais ou que fazem sexo com outros homens (HSH). O objetivo é avaliar a efetividade da Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP) nessa população e contribuir com a diminuição da incidência do HIV na população alvo do estudo. Fonte: https://prep1519.org/
que os estigmas sobre o vírus criavam barreiras para a garantia de direitos e cidadania dessas pessoas e denunciava a falta das juventudes compondo as políticas de saúde. Responder essas violências envolvia o desuso de termos pejorativos em relação ao HIV, fortalecimento dos grupos de apoio e conscientização da população em geral.
Em 2005 se lutava pela quebra da patente dos antirretrovirais (ARV), que consumia 80% do orçamento para essa pasta, tendo como tema para o 1º de Dezembro daquele ano como a aids e racismo. Em 2007 foi lançado o Projeto Saúde e Prevenção nas Escolas (PSE)1, com objetivo de formar os estudantes em ações de promoção da saúde e prevenção de doenças, com foco em crianças e jovens da rede pública de ensino. Também foi realizada a 1ª Mostra Nacional Saúde e Prevenção nas Escolas, em Brasília, com participação da Viração, para expor os trabalhos feitos pelos jovens.
Mas, em 2008, a criminalização da transmissão do HIV era uma pauta muito forte, o que se desdobra em uma frente parlamentar, em 2013, para debater o tema, pela então Deputada Erika Kokay e que, até hoje, é motivo de projetos de lei que visam criminalizar as pessoas vivendo com HIV.
Em 2012 os virajovens também cobriram o Congresso Internacional de prevenção, que discutiu a ampliação da distribuição de preservativos, testes e educação sexual para as juventudes, juntando cerca de cinco mil pessoas.
1 Programa Saúde na Escola - Saiba mais: https://shre.ink/rQHu
Agência Pra Brilhar; Marcele Selva; Samantha Almeida; Gabs Batista; Nubia Verneck; Mariano Figuera; Gabriel Assis.
TEXTO NÚBIA VERNECK, EDUCOMUNICADORA EM SÃO PAULO/SP
A participação social e foco na vida das pessoas foram tópicos importantes desse congresso. O ano de 2013 foi de muitas conquistas, porque os serviços de saúde especializada em IST e HIV/Aids foram regulamentados, aprovou-se enfermeiros realizarem testes para as IST, o Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DCCI) realiza a dispensação do tratamento para todas as pessoas com HIV. Essas medidas contribuem na melhora da qualidade de vida das pessoas vivendo com o vírus. E por conta disso, nesse ano se aprovam cinco pesquisas sobre PrEP no país, usando antirretrovirais para prevenção. Em 2014, foi aprovado o projeto sobre o sigilo da sorologia positiva para ISTs, uma medida que protege as pessoas vivendo com HIV de exposições criminosas do seu status.
A Profilaxia Pós-Exposição (PEP) está disponível no Brasil desde 2004, quando se começou a usar o ARV aos profissionais de saúde que sofressem acidentes com risco de infecção. Em 2010, ela foi adotada como prevenção da transmissão do HIV para a população. Em 2017, a PrEP foi incorporada no SUS e, desde 2018, os CTA e SAE passam a prescrever PrEP, tendo em 2020 a conquista da prescrição feita por enfermeiros, logo depois, por dentistas e farmacêuticos também, facilitando o acesso. Desde 2018 existem pesquisas em outras formas de uso da PrEP, como a sob demanda e a injetável e também o uso e adesão de diversas populações. A tecnologia avançou tanto que as testagens demoram cerca de 20 minutos para o resultado e são feitas diariamente.
Em 2023, a prevenção combinada dialoga melhor com as vivências de adolescentes e jovens. Mas não quer dizer que essas informações chegaram com qualidade e autonomia a todes. É muito importante que ações fora dos serviços de saúde também aconteçam. Esse é o caso do Pra Brilhar, que desde 2018 convida as juventudes racializadas e periféricas de São Paulo a dizerem o que pensam sobre o HIV. Nesses cinco anos, mais de 100 jovens se formaram no projeto, produzindo diversos cartazes, adesivos, reportagens, podcasts, saraus, mostras, lives, posts para as redes sociais, oficinas e esta revista, por exemplo. Para além desses produtos (e o que é importante) é que essas pessoas se tornaram educadores não só sobre a prevenção combinada e HIV/Aids, mas para discutir sobre sexo, saúde integral, afeto, disputa de poder, narrativas da violência e, acima de tudo sobre a vida. São as vidas que nos importam.
A luta registrada na história do movimento social e da Viração, em relação à Aids, é sobre a qualidade de vida das juventudes LGBTQIAPN+, racializadas e periféricas, que estão mais vulnerabilizadas para as IST. Será que para os próximos 20 anos, a cura do HIV será uma realidade? E as juventudes vão estar mais informadas? Responder os estigmas em relação ao HIV possibilita uma vida sexual mais livre para todes, não só em relação ao vírus, mas sobre o sexo, saúde e a vida como um todo. Sonhar alimenta a vida e as práticas dela.
TEXTO
MARCO TOLENTINO, PESQUISADOR E EDUCADOR DO ACERVO BAJUBÁ, EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM
ACERVO BAJUBÁ / MEMORIAL INCOMPLETO DA EPIDEMIA DE AIDS
O Acervo Bajubá é um projeto comunitário de registro de memórias das comunidades LGBT+ brasileiras. Ele possui uma coleção em catalogação de itens em materialidades diversas que registram a diversidade sexual e de identidades de gênero na história brasileira. Além disso, o Bajubá colabora com exposições, realiza capacitações e produz projetos de registo, mediação e circulação de histórias sobre pessoas LGBT+.
O caráter comunitário do projeto faz com que o Bajubá se preocupe não só em catalogar os registros do passado que compõem sua coleção, mas desenvolver projetos que abordem questões do presente no qual acessamos os documentos. Logo, a epidemia de HIV/Aids é um tema que
não podemos ignorar, por se tratar de uma experiência que constituiu - e ainda constitui - as subjetividades de pessoas LGBT+.
Em 2021, desenvolvemos o Memorial incompleto da epidemia de Aids, um projeto de pesquisa continuada de registro de memórias da epidemia de HIV/Aids no Brasil e seus impactos subjetivos, políticos e culturais.
Em sua primeira etapa online, reunimos áudios breves com lembranças de pessoas que conheciam alguém que vivia com HIV/Aids e que já faleceu, disponibilizando-os como breves episódios de podcast.
Essa primeira ativação nos fez compreender que era mais válido o esforço de fazer caber outras vivências na história da epidemia de HIV/Aids do que almejar buscar a sua completude.
Atualmente, o projeto é articulado por meio de oficinas, nas quais buscamos trabalhar as memórias e referências pessoais, de modo a demonstrar que
todo mundo tem uma história relacionada à epidemia de HIV/ Aids, independentemente de viver ou conviver com o vírus.
TÁ NA MÃO
Escaneie o QR Code e conheça o trabalho realizado pelo Acervo Bajubá
Marcos Tolentino é licenciado (2009) e mestre em História pela Universidade Estadual de Campinas (Unicam), onde atualmente desenvolve o seu doutorado no programa de Pós-Graduação em História. É pesquisador-colaborador no projeto História e memória LGBT+, na Universidade Federal do ABC (UFABC). É pesquisador e educador no Acervo Bajubá e no VoteLGBT. É integrante do Grupo de Pesquisa MP+ Diverso do Ministério Público da Bahia. Foi produtor e roteirista dos podcasts Passagem só de ida e Palanque. Vive com HIV/Aids há sete anos e, desde 2021, escreve e fala publicamente sobre o tema.
Fonte: Senado Brasileiro (Arquivo do Senado) https://shre.ink/rmGx
Fonte: Secretaria Municipal da Saúde (SP)
O PAPEL DO PODER PÚBLICO
NO ENFRENTAMENTO DA EPIDEMIA DE HIV/AIDS NA CIDADE DE SÃO PAULO
TEXTO
MARIAH EDUARDA SOARES SILVA, VITOR RANIERI
E SAMANTHA ALMEIDA, PARTICIPANTES DA TURMA I DO PROJETO, EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM
SAMANTHA ALMEIDA
Opoder público tem responsabilidade fundamental em criar e fazer cumprir políticas públicas para garantir acesso à saúde integral e saberes da prevenção combinada para todas as pessoas, em especial para as juventudes. Para conhecer o cenário dessa atuação na cidade de São Paulo, conversamos com a então vereadora - hoje deputada federal por São Paulo - Erika Hilton, no final de junho de 2022.
Sua atuação enquanto parlamentar, ativista do movimento negro, da causa LGBTQIAP+ e pelos direitos das pessoas periféricas desde a juventude, marcou a história da cidade e do Brasil. Em 2021, Erika se tornou presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Câmara de São Paulo e parte da atuação da parlamentar na Comissão de Direitos Humanos passou por promover discussões sobre o enfrentamento da epidemia de HIV na cidade. Em 2023, Erika Hilton assumiu a vicepresidência da Comissão de Direitos Humanos na Câmara dos Deputados.
REVISTA VIRAÇÃO - O que te motivou a seguir o caminho parlamentar?
Erika Hilton: Eu fui expulsa de casa muito cedo, tive que viver nas ruas, viver da prostituição, viver todas as questões sociais como um corpo negro, um corpo de uma travesti no Brasil. Vivendo essas realidades, começo a entender a negação de todos aqueles direitos que eu sofri, vou entendendo que era preciso a organização de uma luta. E aí, foi onde entrei na militância, no ativismo.
Eu entrei numa briga com uma empresa de ônibus na cidade de Itú, onde vivia, pelo reconhecimento do meu nome social no cartão de transporte escolar. A partir daquele momento, eu comecei um ativismo mais organizado.
Eu não achava que pudesse ser política ou que quisesse ser política, porque durante muito tempo pensei que meu ativismo era de ficar gritando... Mas fui amadurecendo e entendendo: eu não vou demolir o sistema, eu preciso entrar no sistema e, através desse hackeamento, posso ir mudando a realidade das pessoas, a minha realidade.
R.V. - Qual o histórico da atuação da câmara no enfrentamento da epidemia de HIV/Aids? Como a Câmara vê a relevância de você trazer essas pautas?
E.H.: A primeira coisa que a gente enfrenta é a questão do estigma e do desconhecimento. Estar em uma casa de leis onde tenha vereadores que tenham desconhecimento sobre a questão do HIV/Aids é algo absurdo, é chocante, porque nós estamos em 2022. O Brasil era referência no tratamento e agora a gente tem passado por uma série de obstáculos no que diz respeito à pauta do HIV/Aids. Essa é uma pauta que os movimentos de saúde já consolidaram informações muito precisas, que tiram qualquer
tipo de mistificação. Temos o desafio de lidar com o estigma, com essa ignorância por desprezo à pauta mesmo, porque acham que não tem que falar sobre HIV/Aids. Associam o vírus e a doença a uma questão moral, porque quando a gente quer falar de prevenção ao HIV/Aids, pensam que a gente quer ensinar as crianças a transar, fazer uma apologia ao sexo, símbolos sexuais, ditadura gayzista, travestista… sei lá o que eles pensam. Esse é um baita de um desafio.
R.V. - O que te chama a atenção na pauta da prevenção a ISTs em São Paulo?
E.H.: Precisamos de políticas públicas. Eu acho que a gente precisa ocupar a internet e os espaços todos para falar sobre HIV/Aids, hackear essa linguagem que acaba se tornando mais acessível para uma parcela maior de pessoas. A escuta faz com que a gente se sensibilize, a escuta faz com a gente tenha empatia.
Usar essas outras plataformas também é uma forma da gente conseguir dar conta daquilo que o Estado não está fazendo. É claro, com uma capacidade muito menor de atingir todo esse ecossistema, porque o Estado tem capacidade muito maior de conseguir alcançar as pessoas, mas essas são formas, subterfúgios para não deixar que a pauta morra.
TÁ NA MÃO
Leia a entrevista na íntegra, disponibilizada no site oficial do Pra Brilhar: https://shre.ink/rmu0
Ouça o podcast no canal Jovens Comunicadores, nos principais tocadores de áudio.
TEXTO NÚBIA VERNECK, EDUCOMUNICADORA EM SÃO PAULO/SP
e a prevenção combinada, sabia?!
ILUSTRAÇÃO
IÚNA
MARIÁ
A verdade é que ninguém transa para se prevenir das IST! Você quer se conectar, conversar, realizar desejos e gozar. Então, onde ficam as IST nisso? Existem várias formas de transar e elas estão conectadas ao nosso desejo. Com ou sem camisinha, a prevenção pode estar junta ao seu jeito de sentir prazer. Quando as pessoas exercem seus direitos sexuais e reprodutivos, já estão respondendo aos estigmas relacionados às IST, se afastando das ideias preconceituosas causadas por eles relacionadas às relações de pessoas dissidentes e trocando isso por um cuidado mais consciente de si e próximos dos serviços de saúde e tecnologias de prevenção disponíveis.
A prevenção combinada é o nome da estratégia de prevenção ao HIV/Aids. Ela combina diversos caminhos que se complementam tornando a saúde sexual mais acessível para todes, considerando a diversidade de gênero, afetiva, práticas sexuais, tecnologias de saúde disponíveis e a níveis individuais, em relação a parceires sexuais e no conjunto da sociedade.
Essa forma de pensar a prevenção das IST possibilita três frentes para pensar essas políticas: a primeira são as ações biomédicas. Os preservativos internos, externos, testagem e lubrificantes são os mais conhecidos. O tratamento antirretroviral (TARV) para todas as pessoas que vivem com HIV possibilita que elas fiquem com a carga viral indetectável, ou seja, intransmissíveis. Isso significa que a quantidade de HIV no sangue está tão baixa, que assim, não é mais transmitida na relação sexual. Estar indetectável impede a transmissão para parceires sexuais, diminui o risco de transmissão do vírus da pessoa que gesta para o bebê durante a gestação e parto (transmissão vertical) e mais que isso, traz qualidade de vida para as pessoas vivendo com HIV.
A partir do TARV, medicamentos antirretrovirais de prevenção passaram a existir. A PEP (Profilaxia Pós Exposição) consiste na tomada de dois comprimidos antirretrovirais em até 72 horas após relação sexual sem preservativos ou violência sexual, a PEP
deve ser tomada por 28 dias. Já a profilaxia pré-exposição (PrEP) consiste na tomada de antirretrovirais antes da relação sexual.
A PrEP pode ser usada de duas formas: Uso de 1 comprimido diário ou sob demanda - estratégia que não é recomendada para para pessoas com vagina ou que utilizam hormônios à base de estradiol. A forma de PrEP injetável ainda não está disponível pelo SUS, apenas em projeto de pesquisa, apesar de já estar aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Esses medicamentos são usados após um teste de HIV negativo, pois são formas de prevenção, não de tratamento e só previnem o HIV, nenhuma outra IST. Tudo isso pelo SUS viu?!
As intervenções estruturais buscam encontrar respostas aos valores socioculturais que contribuem para a vulnerabilidade de pessoas ou grupos em relação ao HIV. Responder estigmas em relação ao racismo, LGBTfobia e outras questões sociais contribuem para que todes tenham mais acesso aos direitos básicos como saúde. Grupos específicos foram culpabilizados pela epidemia do HIV e enfrentar essas condições sociais desmistifica que o HIV seja um problema só de algumas pessoas.
Por fim, as intervenções comportamentais conectam a prevenção como parte da vida sexual das pessoas, difundindo mais informações sobre o vírus e aumentando a percepção das pessoas sobre sua forma de transar e os cuidados com o HIV. O incentivo à testagem, o uso da camisinha, aproximação aos serviços de saúde, redução de danos e processos de educação e comunicação entre pares sobre esses temas são caminhos para tal.
trabal hadoras do sexo
pessoas privadas de l iberdade ga ys e ou tros hsh pessoas q ue usam al co ol /drogas pessoas trans popula
chav e Ál
Representação gráfica da Prevenção Combinada
Uma das maneiras de entender a prevenção combinada é através da mandala de prevenção. O princípio dessa estratégia baseia-se na livre conjugação dessas ações que podem estar combinadas de acordo com as características individuais e o momento de vida de cada pessoa. Como diria a cantora Leona Vingativa, “não pode esquecer o guanto”. Faz a phyna: desaquenda de toda essa desinformação e estigmas sobre sua própria saúde sexual e sai loka pra se informar mais sobre esses babados que estão no texto. Precisamos exigir que nossos direitos sejam garantidos para que a desinformação não continue sendo realidade entre os jovens racializades e periféricos e deixem de ser uma parte tão grande dos novos casos de HIV todo ano. A prevenção é uma responsabilidade de todes. Cuidar da saúde sexual, valorizar, cobrar o SUS e ter autonomia para transar com quem quiser da
forma mais segura são nossos direitos.
Em conclusão, a prevenção combinada é uma estratégia abrangente cujo principal objetivo é prevenir a transmissão do HIV e de outras IST. No SUS é implementado de forma eficaz por meio de diversas áreas de intervenção. Estas intervenções incluem a educação sexual, que procura fornecer aos jovens e adolescentes informações claras e precisas sobre como prevenir estas infecções e promover relações sexuais seguras tendo em vista o HIV, a aids e outras IST.
indígenas
popula ção negra popul açõ es priori tárias
ado lescentes e jo vens pessoas em si tuação d e rua
Além disso, é dada ênfase ao acesso gratuito ao preservativo externo em áreas de trânsito como o Metrô e CPTM de São Paulo, uma vez que o uso correto e constante é uma medidas eficaz e acessível para prevenir a transmissão do HIV, outras IST e evitar indesejadas gravidezes. Da mesma forma, são promovidos testes, o que permite identificar precocemente qualquer possível infecção e receber tratamento adequado.
É de extrema importância que todas as pessoas, principalmente os jovens e adolescentes que estão iniciando a vida sexual entendam a relevância da e como podem se beneficiar dela para proteger sua saúde. A prevenção combinada acaba abordando outros aspectos da saúde sexual e reprodutiva, de forma transversal. A partir da discussão e conhecimento dessas estratégias, incentiva-se a comunicação entre pares e as conversas sobre saúde sexual a partir de uma perspectiva científica e diversificada, o que ajuda mais pessoas a se educarem e a viverem sua sexualidade sem preconceitos ou complexos, além de terem uma vida sexual mais plena e consciente, serão capazes de tomar decisões informadas sobre os seus corpos.
TÁ NA MÃO
Onde encontrar a Prevenção Combinada para HIV/Aids em São Paulo?
Escaneie o QR Code e confira a localização dos equipamentos disponíveis
Essa
série de conteúdos produzidos por jovens participantes das turmas I e II do projeto, ao longo do ano de 2022, apresenta o resultado de uma incursão educomunicativa por organizações, movimentos sociais, projetos acadêmicos e equipamentos especializados na prevenção combinada, diagnóstico, tratamento e acompanhamento de pessoas que vivem com HIV. O objetivo foi entender o funcionamento desta rede que atua de forma diversa e há pelo menos 4 décadas no enfrentamento da epidemia da aids na capital paulista e produzir, de forma educomunicativa, uma série de textos em diversos formatos, e uma série de podcasts para outres jovens.
O HIV NA CIDADE DE SÃO PAULO
Panorama, acolhimento e prevenção combinada
Prevenção, Diagnóstico e Tratamento em São Pauloconhecendo serviços de atenção especializada ao HIV de São Paulo
Para entender, a partir do ponto de vista de quem faz parte dos serviços de atenção especializada em HIV/Aids e outras IST, como funcionam o dia a dia do fluxo de atendimento nos serviços e quais são as possibilidades de atendimento para a população de São Paulo, em especial as juventudes, nós fomos conhecer dois serviços atualmente em funcionamento na capital: projeto PrEP 15-19 e o CTA Henfil.
Por:
Marcele Selva e Khaleb Coelho
Como os estigmas impactam o acesso aos serviços de saúde?
Neste artigo, discutimos como as desigualdades estruturais atravessam o acesso das juventudes aos equipamentos de saúde na busca de prevenção e tratamento do HIV/Aids e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST).
Por:
Demetria Lima Santos, Ewerton Vicente de Melo Souza e Gustavo Mesquita Ribeiro
Acolhimento e a prevenção ao HIV para a população
LGBTQIAP+ de São Paulo: o caso do Centro de Referência e Defesa da Diversidade Brunna Valin
Como é feito o acolhimento da juventude que busca prevenção e tratamento do HIV/Aids e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST). Essa e outras perguntas estão no centro dos debates da Agência Pra Brilhar. Para entender como funciona essa rede de serviços, fomos conhecer a estrutura do Centro de Referência e Defesa da Diversidade Brunna Valin.
Por:
Demetria Lima Santos, Ewerton Vicente de Melo Souza e Gustavo Mesquita Ribeiro
Panorama de uma desinformação que silencia
Falar sobre educação sexual e prevenção em um país que sofre as mazelas da colonização é complexo. Mas aprender sobre nossos corpos e sobre prevenção ainda é o principal e melhor caminho para evitar os estigmas, a desinformação e enfrentar as ISTs.
Por: Vitor Ranieri
Podcast PodBrilhar
A série de 5 episódios reúne conversas cheias de informações valiosas sobre serviços de atenção especializada em HIV/Aids da cidade de São Paulo, sobre serviços de acolhimento e apoio disponíveis para a juventude e outros projetos que atuam na prevenção combinada, além de muito bate papo sobre saúde sexual, práticas de autoconhecimento e autocuidado, com participações de profissionais da rede especializada em HIV da cidade em entrevistas que trazem também informações sobre como funciona o sistema de saúde de São Paulo e sobre como estão distribuídas as diferentes estratégias de enfrentamento à epidemia de HIV.
Por:
Gabriel Ferreira De Assis Candido Da Silva, Raphael Isaac Ali Costa da Silva, Stefania da Silva Oliveira e Tifanny dos Santos Dias
ACESSE O EPISÓDIO PILOTO:
TESTES DE HIV E PREVENÇÃO COMBINADA NA ESTAÇÃO REPÚBLICA:
a Estação Prevenção - Jorge Beloqui
Acoordenadoria de IST/Aids inaugurou uma unidade de prevenção ao HIV, a Estação Prevenção – Jorge Beloqui. Inédito na saúde
Steve um acidente com material perfurocortante ou suspeita de uma IST, pode ir a um posto de saúde e fazer um teste de HIV rápido e gratuito pelo SUS. Se o teste der negativo, pode perguntar ao seu médico sobre “A Profilaxia Pós-Exposição (PEP) ao HIV que é de extrema urgência, pois deve-se começar a tomar o medicamento em até 72h após a exposição de risco, seja ela sexual ou por acidente com material perfurocortante. Como funciona o aplicativo E-Saúde para acessar a SPrEP - PrEP e PEP?
Também foi anunciado o lançamento do canal SPrEP (PrEP e PEP online) no aplicativo E-Saúde. Este novo serviço de acesso otimizado às profilaxias de prevenção ao HIV para pessoas
TEXTO MARIANO FIGUERA, ANALISTA DE EDUCOMUNICAÇÃO, EM SÃO PAULO/SP
parceria com o Metro de SP e fica na parte interna da estação República - Linha vermelha do metrô. Esta unidade se diferencia de todas as demais pelo horário de atendimento: das 17h às 23h, de terça-feira a sábado. O atendimento tem como foco a disponibilização das profilaxias Pré-Exposição
- PrEP - e Pós-Exposição - PEP, com fácil acesso, em local de grande circulação e em horários alternativos. A localização diferenciada possibilita que a população conte com o serviço em sua rotina de locomoção.
A Estação Prevenção é uma
Estação Prevenção Jorge Beloqui, Metrô República.
Reprodução Prefeitura de São Paulo | @prefsp
residentes na capital, por meio do Aplicativo E-Saúde. Para acessar a PrEP online, será necessário que a pessoa tenha um resultado de teste de HIV negativo com data de até 7 dias retroativos, que será solicitado, via imagem, para que seja direcionada a consulta.
Com apenas o celular, o município poderá entrar em contato com a médica de plantão e obter a receita e o encaminhamento para o endereço mais próximo dele para retirar a PEP ou PrEP”, enfatiza a Abbate. “Essa novidade inédita na saúde pública brasileira vem como ferramenta que poderá ser replicada em outros territórios, possibilitando a ampliação do acesso da população aos métodos preventivos ao HIV”. Fonte: Secretaria de Saúde - IST/Aids
homenagem a Jorge Adrian Beloqui (1949-2023), que foi pioneiro na luta por direitos humanos para a população LGBTQIA+ no Brasil. Professor do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (USP) e integrante da direção do Grupo de Incentivo à Vida (GIV), em São Paulo, Beloqui foi fundador da Rede Nacional de Pessoas Soropositivas (RNP+), onde era representante no Grupo Temático do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS).
Após a avaliação do profissional de saúde e envio da prescrição emitida por SMS, Whatsapp e/ou e-mail, a retirada do medicamento poderá ser realizada em algumas unidades básicas municipais de saúde, na rede Municipal Especializada em IST/Aids, inclusive na estação Prevenção Jorge Beloqui.
TÁ NA MÃO
Assista o depoimento de Jorge Beloqui para o Grupo de Incentivo à vida no “O Cartaz HIV Positivo”:
Baixe o APP E-SAÚDE
Jorge Beloqui Foto: Reprodução Internet
Em 1987, Avram Finkelstein, Brian Howard, Oliver Johnston, Charles Kreloff, Chris Lione e Jorge Socorrás fundaram o projeto Silence = Death (Silêncio = Morte, em tradução livre). O pôster se tornou um símbolo central do ativismo da Aids após ter sido adotado pelo grupo de defesa AIDS Coalition to Unleash Power (ACT UP). Fonte: https://shre.ink/rmi0
VIRAR A HISTÓRIA PARA ENFRENTAR OS ESTIGMAS
“SE O PRECONCEITO É UMA DOENÇA, A INFORMAÇÃO É A CURA.”
GIV GRUPO DE INCENTIVO À VIDA
Ofilme “Philadelphia” conta a história sobre um advogado bem-sucedido chamado Andrew, que era querido por todos e tinha uma vida boa. Até que é despedido por ser uma pessoa vivendo com HIV. É um dos primeiros filmes de Hollywood a falar abertamente sobre a aids, além de abordar com extrema sensibilidade o preconceito contra os homossexuais. Foi um filme que marcou minha adolescência; me perguntava então se eu teria o mesmo destino que o protagonista e se, por ser gay, meu destino também era morrer de Aids.
Essa paranóia foi alimentada pela televisão, pela escola e principalmente por minha família, que através do terror das palavras e os silêncios, me ensinaram que ser gay era isso, ter como destino morrer do vírus do HIV. Cresci como muitos jovens LGBT+, trancado no armário da culpa e escutando piadas homofóbicas em lugares que deveriam ser seguros. Ao final, não queria preocupar minha mãe com minha homossexualidade, “o que meu pai pensaria? E se meus amigos descobrirem, eles continuariam sendo meus amigos?”, questionava. Eu não queria ser associado a uma doença, não queria contrair o HIV e não queria morrer.
e viciados em drogas” como aqueles “com maior probabilidade de contrair o vírus”, nessa lista estava eu. Para responder a alguns estigmas, precisamos nos distanciar deles. Vêlos de longe nos ajuda a perceber o que geralmente são: desinformação.
Silêncio é igual a morte, então nos informar nos mantém vivos. Falar é um ato de resistência. O terror e o estigma sobre o HIV chegam cedo a pessoas LGBTQIAPN+, quando ouvimos familiares dizendo que “gays são pervertidos” e que “a aids é um castigo de Deus”. Logo pensava que morrer de Aids não era o problema, era ter que revelar numa cama de hospital, na frente de todo mundo, que era gay e ter que confirmar as teorias de minha família preconceituosa.
Silêncio = Morte (em Inglês Silence=Death) é um dos ícones políticos mais conhecidos da luta contra a Aids. O pôster Silêncio=Morte com o triângulo rosa foi criado em 1987 pelo coletivo Silence=Death Project, também utilizado pelo coletivo ACT UP como símbolo da luta contra a Aids.
falar sobre nossa saúde, sobre nossas vivências e sexualidade.
Conhecer mais sobre o HIV, de um jeito mais próximo me fez perceber que o medo e o preconceito estão baseados na ignorância. Em 40 anos de história da epidemia, avançamos nos tratamentos e no entendimento do vírus, permitindo que pessoas com HIV tenham vidas incríveis. A história da comunidade LGBT+ está intrinsecamente ligada à epidemia de HIV/Aids e à nossa resistência contra os estigmas sociais, que é usada politicamente para nos isolar e, porque não, nos exterminar.
TEXTO MARIANO FIGUERA, ANALISTA DE EDUCOMUNICAÇÃO, EM SÃO PAULO/SP
Na televisão, reportagens com músicas angustiantes alertavam sobre a Aids; alguns meios de comunicação a anunciavam como “câncer gay”. No noticiário, um “especialista”, quase sempre um homem branco e heterossexual, mencionava uma lista que incluía “gays, profissionais do sexo, travestis
Um dia, um amigo me contou que fez um teste de HIV e deu positivo. Meu amigo me disse: “Está tudo bem, já chorei muito, mas conversei com meu médico e estou mais tranquilo”, e lá, ele me contou tudo sobre o diagnóstico e como estava lidando com a notícia. Hoje, aquele amigo superou o estereótipo de gay com final trágico que narram os filmes de Hollywood. Essa história foi a primeira de muitas que realmente me ensinaram o quanto é importante
Embora a discriminação ainda exista, hoje sabemos que o HIV é menos letal do que o preconceito e a discriminação com relação a ele. Sentir-se acolhido, amado e aceito é uma poderosa forma de combater os estigmas relacionados à nossa identidade e sexualidade. Não se sinta culpado/a por amar. O autocuidado, a informação e a prevenção combinada são fundamentais para evitar novas infecções por HIV, mas se o teste der positivo, deve-se procurar um profissional de saúde, iniciar o tratamento e seguir vivendo. Falemos uns com outres, não esqueçamos que milhões de pessoas, ainda hoje, não sabem muito sobre o vírus, por tabu e também por falta de acesso à informação, muita gente tem medo, mas o conhecimento nos liberta desses estigmas e às vezes saber nos pode salvar.
MARS
MAIS MACHO QUE MUITO HOMEM
Cresci pelas ruas de São Paulo como homem preto, filho de mulheres pretas, pai de uma criança preta, multi-artista e outra infinidade de ideias, onde referências pretas prevalecem até hoje. Sem referências masculinas e morando numa casa com mulheres fortes, nunca me faltaram lições de amor, carinho, sensibilidade, companheirismo, mas ainda assim, tive e tenho através dessas lições de procurar compreender as complexidades da minha masculinidade, enquanto encaro várias outras questões que cercam a existência do meu corpo nesse espaço.
Homem bi, em uma sociedade que é violenta e se constrói com base numa ideia heteronormativa cisgênero branca capitalista, faz com que corpos interseccionados por diversas racialidades, crenças, corporalidades e, formas de amar, passem por processos muito violentos de desenvolvimento, seja acerca do cuidado para com a nossa saúde, com nossas relações familiares e afetivas, ou até mesmo para
TEXTO GABRIEL ASSIS, PARTICIPANTE DA TURMA II DO PROJETO, EM SÃO PAULO/SP
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GIVVA
PODCAST DIZTRAVA
TEXTO
SAMANTHA POPOVIC, PARTICIPANTE DA TURMA I DO PROJETO, EM SÃO PAULO/SP
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ACERVO AGÊNCIA PRA BRILHAR FREEPIK
O podcast Diztrava, idealizado e apresentado pela educomunicadora Samantha Almeida, também conhecida como Samantha Popovick, aborda as vivências das pessoas trans em uma série de bate papos. Contando com a participação de pessoas trans, travestis e não binárias, os temas discutidos incluem saúde integral e psicológica, HIV/AIDS, prevenção combinada, família, mercado de trabalho e os estigmas enraizados na sociedade que negam às pessoas trans e não binárias o direito de terem seus corpos humanizados.
Ao discutir a respeito de como o HIV se relaciona com as vivências dessas pessoas trans, discutimos sobre métodos de prevenção combinada e estigmas relacionados, acesso ao SUS em locais especializados em acolhimento e testagens como os
Serviço de Assistência especializada (SAE) e Centro de Testagem E Aconselhamento (CTA) encontrados nas Zona Norte, Leste, Oeste, Sul e centro é a melhor forma de se informar e de ter uma maior segurança e auto cuidado com nossa saúde e vida sexual, mesmo enfrentando questões desde o sair de casa e chegar no serviço até a adesão e retenção nos serviços.
Em meio a exclusão e a transfobia ainda enraizados na sociedade, muitas pessoas trans não têm acesso à saúde por motivos esses que privam e oprimem pessoas por serem quem são. As pessoas trans e travestis têm pouco acesso a hormonização, saúde sexual e integral. É através de redes sociais, grupos de conversa e aplicativos de comunicação que pessoas trans estão conseguindo informações para o autocuidado à saúde.
Ao final dessas discussões, foram compartilhados relatos de exclusão e rejeição dentro do núcleo familiar, bem como exclusão no mercado de trabalho, que têm um impacto significativo na vida dessas pessoas. Hoje, no SUS, é direito das pessoas trans e não-binárias, seguindo políticas LGBT+, como o uso do nome social nos serviços públicos. Falar sobre saúde sexual e HIV/ AIDS é extremamente importante para que todes possam se informar e se prevenir de maneira correta e eficaz, garantindo assim uma melhor
qualidade de vida e autonomia sobre nossos próprios corpos.
O podcast Diztrava oferece uma plataforma única para essas discussões, permitindo que vozes trans e não binárias sejam ouvidas e compartilhem suas experiências. Através dessas conversas, buscase combater a discriminação enfrentada por essas comunidades, fornecendo informações relevantes e encorajando o empoderamento. Junte-se a nós nessa jornada de ativismo e aprendizado, enquanto trabalhamos juntos para criar uma sociedade mais inclusiva e respeitosa para todos.
TÁ NA MÃO
Escaneie o QR Code e ouça o episódio de estreia do Podcast #DizTrava na íntegra.
Crianças LGBTQIAP+ existem?
TEXTO MARCELE SELVA,
PARTICIPANTE DA TURMA I E III DO PROJETO, EM SÃO PAULO/SP
e o artHIVismo?
Você já parou pra pensar que todos nós passamos pela infância, passamos pelo processo de chegar a esse mundo e aprender com nossos mais velhos como sobreviver? Nessa chegada, somos inseridos a norma binária e heterocisnormativa, que dita seu gênero a partir do seu sexo biológico, que dita como se deve andar, como e com quem brincar e por aí vai. A maior parte das pessoas LGBTQIAPN+ são apontadas e reprimidas por suas características e trejeitos já nessa fase da vida, e isso dita muito sobre como somos ensinados a lidar com a expressão de nosso corpo, gênero e sexualidade no mundo.
Os estigmas relacionados à sexualidade de pessoas LGBT+ perpassa a falta de acesso à educação e saúde sexual, numa sociedade LGBTfóbica, conservadora, que ainda trata a sexualidade por si só como tabu, é inevitável o cenário no qual a iniciação da vida sexual aconteça de modo despreparado, muitas vezes precoce e sem nenhuma ferramenta de prevenção.
Nessa jornada convidei algumas pessoas que lidam com as infâncias a fim de trocar sobre saúde integral, tendo a oportunidade de conversar com tutores, mães atípicas, famílias trans, e educadores, que puderam expor outras lógicas sobre o educar e acompanhar crianças LGBT+.
Qual potência mora no ecoar de histórias que se parecem com as nossas, mas não são tristes? A importância de ouvir que uma criança de oito anos passa pelo processo de transição de gênero com o apoio de sua família, que, por sua vez, se transforma a fim de acompanhá-la e protegê-la é por si só muito potente, pois cria novos imaginários nos quais
nossos corpos não estão sendo agredidos, e sim amados.
Ao reunir profissionais da saúde e da educação que atuam diretamente na garantia de direitos das crianças LGBT+ pude entender qual o valor de termos adultos que foram crianças viadas guiando as novas gerações. Crianças LGBT+ existem! A forma como a sociedade lida com a nossa existência pode ditar quanto de saúde e qualidade de vida teremos, mas não será o único marcador, a história LGBT+ sempre foi de muita luta e resistência, e hoje escolhemos resistir pelo amor.
um cenário no qual eu pudesse ser e existir plenamente em minha essência. Que cores predominariam?
Caminhando pelas ruas, alternando entre o som do fone de ouvido e os barulhos da cidade, deparo-me com rostos acolhedores, conversas envolventes e corpos em movimento. No entanto, no mesmo caminho, deparo-me com repulsa, violência e com a divisão desigual entre aqueles que podem ou não pertencer a essas vias públicas.
Nesses breves momentos, paro e me questiono sobre um cenário no qual eu pudesse ser e existir plenamente em minha essência. Que cores predominariam? Quais seriam os objetos, móveis e movimentos ao meu redor? Que tipos de luzes iluminariam o ambiente? Que sons ecoariam, talvez acompanhados por uma música alta ou de fundo? Que tipos de pessoas, com suas diversas apresentações, estariam
presentes? E se eu estivesse fazendo aquilo que mais amo, qual seria a receptividade dos olhares e interpretações para algo tão significativo?
Essas perguntas e cenários servem como ponto de partida para profundas reflexões sobre pertencimento. Ao conectarse com a importância das expressões artísticas e sua relação com a maneira de ser no mundo, este projeto, centrado na identidade, presença, relações e linguagens, e considerando a interseção com o HIV, procura ouvir, compreender e apresentar traços, cenários e agentes culturais que vivem além dos estigmas.
Sou Hbz ou Gabs, educomunicadore, poeta urbano, prete, periferique e neurodivergente e ao chegar
aqui, na Agência Pra Brilhar, com as vivências e trocas, encontrei uma rota para dimensionar um pouco (talvez muito) do que sou, e nessas leituras, o que é possível produzir com a minha e outras referências do que é existir nesse mundo.
TEXTO GABS BATISTA
PARTICIPANTE DA TURMA III DO PROJETO, EM SÃO PAULO/SP
RECOMENDAÇÃO
LITERÁRIA
LATINOAMERICANA
Loco Crônicasafán:de sidario
- Pedro Lemebel
“Talvez as pequenas histórias e as grandes épicas nunca sejam paralelas, os destinos das minorias continuam a ser escaldados pelas políticas de um mercado sempre à procura de qualquer fuga. E neste mapa ultra controlado do modernismo, as fissuras são detectadas e remendadas com o mesmo cimento, com a mesma mistura de cadáveres e sonhos que jazem sob os andaimes da pirâmide neoliberal.”
- Loco Afán, Pedro Lemebel, 1996.
TEXTO
MARIANO FIGUERA, ANALISTA DE EDUCOMUNICAÇÃO, EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM
REPRODUÇÃO
INTERNET
Loco Afán: Crônicas de Sidario, publicado originalmente em 1996, é o segundo livro do escritor e cronista chileno Pedro Lemebel, em que o autor reúne crônicas cujo denominador comum é a questão da Aids e da marginalidade homossexual e travesti. Tal como acontece com outras obras do Lemebel, o título do livro é uma citação de uma canção popular, neste caso um tango. Loco afán é o título de Lemebel que marcou o início da sua projeção internacional, ao ser republicado pela editora espanhola Anagrama.
A primeira edição do livro se divide em cinco capítulos que, em total, incluem trinta e um crônicas. Cada capítulo agrupa narrativas com certas temáticas em comum. Nas últimas edições deste livro se têm incluído outras crônicas não necessariamente vinculadas à história da Aids. Loco Afán é essencial para compreender a história da dissidência sexual e do
Pedro Lemebel em Performance durante a marcha Gay Pride em Nova York (1994), com a mensagem: «Chile devolve a AIDS»
movimento queer da América Latina, desde um olhar periférico, marginal e racializado latinoamericano.
Estas crônicas compiladas e narradas por Pedro Lemebel instalam a mortalidade da Aids como consequência das políticas fascistas e heteronormativas da ditadura, e também da posterior democracia chilena. Lemebel denúncia através da poesia a homotransfobia internalizada de políticos e da sociedade civil, e também descobre sua hipocrisia através do análisis críticos de instituições como a escola e a religião, é um dos primeiros artistas latinoamericanos em tomar partido na luta contra os estigmas ao HIV/Aids.
Em 1994, durante a Parada do Orgulho Gay de Nova York, Pedro Lemebel realizou uma performance na qual se apresentava usando uma auréola de seringas e carregando um banner com o texto “Chile Return Aids”, em inglês. A performance foi uma denúncia da evidente desigualdade social entre o Norte e o Sul global no enfrentamento da pandemia de HIV.1
Lemebel foi um artista multifacetado, escritor, cronista, ator, performer e todos seus rolês entrelaçados com o ativismo LGBT+. Nasceu em 21 de novembro de 1952 em um bairro marginal de Santiago, no Chile. Em suas próprias palavras, sua experiência como dissidente sexual formaria sua visão, já que para ele a marginalização, em um país tão “racista” e “desigual” como Chile durante a ditadura foi em dobro; “parece que não é nada simples, ser pobre e ser gay, ser um pobre gay ou ser um gay pobre”.
As crônicas trazem histórias sobre a Aids, histórias que falam sobre morte, funerais, amizades, contágios, baladas, maquiagem, prostituição, perigo, noite, marginalidade, arte, aventuras, humor, tragédia e felicidade, que falam sobre a vida de homossexuais e travestis que sobreviveram ou morreram durante as primeiras duas décadas da pandemia.
Lemebel foi um dos ativistas latinoamericanos mais atuantes na luta contra os estigmas sociais enfrentados pelas pessoas que vivem com o vírus. Ele defendia fervorosamente a vida daqueles que não tinham acesso aos tratamentos e medicamentos necessários. Pedro trabalhou incansavelmente na defesa dos direitos dos marginalizados, especialmente daqueles que não tinham acesso a informações ou recursos para viajar aos países desenvolvidos em busca de medicamentos que salvam vidas. Sua denúncia, sempre dirigida ao poder público e à classe dominante latinoamericana, visualizava como através da ironia
e da poesia o mundo poderia ser abalado e transformado.
Venâncio Cruz
TÁ NA MÃO
Escaneie o QR Code e conheça mais sobre o trabalho de Venâncio Cruz
PAULO/SP
IMAGEM ACERVO PESSOAL
Lemebel faleceu em 23 de janeiro de 2015, devido a um câncer de laringe. Para Pedro, não era necessário estar infectado pelo HIV para lutar pelos direitos das pessoas que vivem com o vírus. Essa consciência foi alimentada pelas suas próprias experiências, pois tinha perdido muitos amigos nas primeiras décadas da pandemia da Aids. Um exemplo de que não precisamos lutar apenas naquelas agendas que nos afetam diretamente, mas que também podemos ser aliados de outras lutas, como, por exemplo, lutas feministas, de gênero, queer, LGBT+, de mobilização contra o racismo, a discriminação étnica, religião ou classe e outras lutas contra a desigualdade. TEXTO
Venâncio Cruz é um multiartista nordestino que passeia entre o teatro, cinema, dramaturgia, performance e dança. É formado em educação circense infantil pelo Instituto Dom Fernando (GO) e Técnico em Artes Dramáticas pelo ITEGO BASILEU FRANÇA (GO) e cursou interpretação para cinema na Escola Darcy Ribeiro (RJ). Ele participou como bailarino no grupo PORQUÁ? de dança (GO) e atuou em diversas montagens teatrais. Integrou como ator no grupo do SESC Dramaturgia (RJ) 2019 com direção de Rodrigo Portela e investiga o lugar de ator como criador, entendendo e pesquisando a descolonização de corpos pretos no teatro brasileiro contemporâneo. Seus trabalhos abrangem temáticas múltiplas que se interseccionam como raça, gênero, política, educação sexual, entre outros. Ele se enxerga como um “artista confessional” que deseja os extremos que podem ser provocados para assim criar ficções.
É ator-pesquisador na Cia. Sacana (SP), gestor cultural no INSTITUTO AFROREC (SP) e dedica-se a escrita de sua trilogia teatral “Morte, Afeto e Tragédia” que tem como primeiro capítulo o espetáculo “FETO PRETO - um experimento de macumba para as nossas curas”. Nesse espetáculo-macumba o artista atua dando vida a um palhaço vingativo e sanguinário que se pinta de branco com cabelos loiros para expor ao vivo a brancura brasileira, criando paradoxos entre questões de raça no Brasil e a vulnerabilidade da branquitude. Venâncio Cruz se define como um “artista altamente viciado pelo teatro” que encontra nessa área artística uma forma de construir diálogos entre o Brasil e o seu corpo negro, gay e nordestino. Em seu ano de estreia (2023) o trabalho foi selecionado para o projeto “Performance Studio” do Brighton CCA, para a 24 edição do Festival SATYRIANAS e para duas apresentações no Teatro Galpão do Folias.
ASSIS, PARTICIPANTE DA TURMA II DO PROJETO, EM SÃO
FÊNIX NEGRA
ZION
A cultura Ballroom é uma expressão político-cultural das pessoas LGBTQIA+ negras, latinas e originárias. A ballroom surge na década de 70, pela revolta de Crystal LaBeija, mulher trans, negra e drag queen, que se indigna com as competições de drag da época, que forçavam a branquitude como padrão de beleza dentro desses concursos. Esse levante levou Crystal a criar a House of LaBeija, para celebrar as vidas e belezas de outras como ela e criar um espaço onde todas essas pessoas pudessem ser valiosas, em uma época de violência policial, leis contra LGBTQIAPN+ e a aids.
As houses eram casas que faziam acolhimento dessas pessoas, expulsas de casa, egressas do sistema penitenciário, vivendo com HIV, prostitutas, entre outras.
As houses caminhavam nas balls, bailes organizados por houses, ou casas. A primeira ball foi feita pela House of LaBeija, em 1972, em Nova Iorque. As balls são eventos que combinam performances de moda, estéticas, beleza e dança, criadas a partir das corporalidades e demandas dessas pessoas, para que pudessem inventar um mundo para falar sobre prosperidade e vida.
TEXTO NÚBIA VERNECK, EDUCOMUNICADORA EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM
MARCELA NICOLAS
ROGER SILVA
REPRODUÇÃO DA INTERNET
A ballroom foi uma das formas de se organizar politicamente que a pessoas LGBTQIAPN+ no ápice da epidemia do vírus. Essa cultura se espalha pelo mundo e, desde 2015, ela está presente no Brasil. Uma das maiores referências na produção de um outro mundo para as pessoas vivendo com HIV aqui é Fênix Zion, trailblazer (pioneire) da cultura ballroom no Brasil, graduade em dança e moda e overseer (responsável) da Casa de Mandacaru na cena ballroom de São Paulo. A convite da agência, Fênix conta um pouco da relação da ballroom com o HIV e sua vida.
“Não consigo dissociar minha relação com o HIV do momento que conheci a comunidade Ballroom.
Lembro-me que antes ir até o SAE para realizar os exames das ISTs, estava executando um projeto, no curso de dança da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) sobre a dança vogue. Um dos textos citava Willi Ninja, que além de ser considerado o padrinho do voguing, também atuava na luta pelos direitos das PVHA dentro da cena nova-iorquina. Ao ler a palavra “Aids”, algo me tocou profundamente.”
“Logo em seguida descobri o vírus em mim, aquele foi o primeiro momento que senti a Fênix queimar e me consumir. Depois de alguns anos já pertencendo a comunidade, a moda se tornou meu abrigo nos dias de desesperança. As imagens que decidi compartilhar estão em minha memória afetiva, como referência de conexão ancestral e cura, é minha visão sobre a potência da moda em movimento que emerge da cultura de baile desde sempre, que se une a técnica de pintura expressionista
dripping para reivindicar minha vez de brilhar.”
“Uns me chamam de Fênix Negra, outros de Fênix da Silva Leite. Eu me chamo de Fênix Zion, pioneire da cena alagoana/NoNe Ballroom/ Brasil, negre, primeira pessoa trans não-binárie retificada em Alagoas, nascide na terra dos povos indígenas Kaetés, do Quilombo dos Palmares, de sagitário, de Anúbis, de Ogum, membre da Iconic House of Zion e Casa de Mandacaru.”
TÁ NA MÃO
A Royal House of Labeija e Casa de Candaces contam suas experiências com a ballroom em suas cenas e com suas histórias.
CANDACE LABEIJA
LUGARES DE PERTENCER: BRISANDO NA FAVELA LIGADAS NA PREVENÇÃO
O Projeto de Prevenção Heliópolis Investindo na Vida tem como objetivo promover a educação e informação sobre a prevenção combinada da infecção por HIV e outras IST (Infecções Sexualmente Transmissíveis), além de abordar a prevenção da relação sexual desprotegida que expõe às IST/ Aids e à gravidez não desejada, tudo baseado em direitos humanos. O projeto visa beneficiar educadores, adolescentes e jovens residentes na favela de Heliópolis, disseminando informações para os pais, responsáveis e comunidade em geral. Através dessas ações, pretende-se estimular o acesso dos jovens aos recursos de prevenção, testagem e cuidados integrais de saúde disponíveis nos serviços de saúde da região.
TERAPIA DUPLA EM UM COMPRIMIDO ÚNICO
TEXTO MARIANO FIGUERA, ANALISTA DE EDUCOMUNICAÇÃO, EM SÃO PAULO/SP
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FREEPIK
TEXTO GUSTAVO MESQUITA, DO PROJETO HELIÓPOLIS
INVESTINDO NA VIDA, EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM ACERVO HELIÓPOLIS INVESTINDO NA VIDA
Com foco específico em adolescentes e jovens moradores da favela de Heliópolis, o projeto desenvolve atividades de prevenção, utilizando as redes sociais como meio de disseminação de conteúdos informativos. Por meio desses canais é possível encontrar informações sobre serviços de prevenção, bem como outros recursos relacionados ao autocuidado. A galera de Heliópolis Investindo na Vida está engajada ativamente na promoção da prevenção, e o projeto busca fortalecer esse comprometimento oferecendo informações relevantes e acessíveis para as juventudes.
TÁ NA MÃO
Escaneie o QR Code e acompanhe o trabalho do projeto Heliópolis Investindo na Vida.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acaba de aprovar um avanço significativo no tratamento do HIV/Aids. Trata-se de um medicamento que combina as substâncias lamivudina e dolutegravir sódico, utilizadas para controlar o vírus, em um único comprimido1
Essa nova opção terapêutica traz uma série de benefícios; a principal vantagem desse novo medicamento é a possibilidade de tomar apenas uma dose diária, simplificando e melhorando a adesão ao tratamento. Anteriormente, os pacientes precisavam fazer uso de duas medicações diferentes, o que exigia mais disciplina e poderia comprometer o seguimento correto das doses.
Agora, com a facilidade de um único comprimido, essa dificuldade é superada. Além de simplificar o tratamento, o medicamento também apresenta outros benefícios importantes. Ele reduz a quantidade do vírus HIV no organismo, o que ajuda a controlar a progressão da infecção. Além disso, fortalece o sistema imunológico, aumentando a
1 Fonte: Ministério da Saúdehttps://shre.ink/8CCS
contagem de células CD4, que são essenciais na defesa do organismo contra infecções.
O novo medicamento é indicado para adultos e adolescentes acima de 12 anos, representando um avanço significativo no tratamento do HIV nessa faixa etária. Essa aprovação é um reflexo do comprometimento do nosso sistema de saúde em buscar soluções inovadoras para o enfrentamento do HIV/Aids. Para entender melhor a importância desse novo avanço, conversamos com o médico Dyemison Pinheiro, infectologista formado pela UFAC e com residência médica no Instituto de Infectologia Emílio Ribas, que nos explicou: “um comprimido por dia facilita a adesão ao tratamento, reduz o risco de efeitos adversos e demonstra que estamos avançando muito no tratamento e também na garantia de qualidade de vida das pessoas que vivem com HIV.”
Esse novo avanço representa uma esperança para todas as pessoas que vivem com HIV, já que é um tratamento mais simples e eficaz. Com a aprovação desse medicamento, podemos vislumbrar um futuro promissor na luta contra o HIV. Cada passo dado na melhoria do tratamento e prevenção representa uma conquista importante. É fundamental continuar investindo em pesquisas e políticas públicas para garantir que todas as pessoas tenham acesso a tratamentos inovadores e eficientes, bem como a programas de prevenção.
É importante lembrar que a informação e o apoio são
fundamentais na luta contra o HIV. O acesso a serviços de saúde de qualidade, o incentivo ao diagnóstico precoce e o combate ao estigma e discriminação são pilares essenciais para enfrentarmos essa doença de forma eficaz. Juntos, podemos criar uma sociedade mais inclusiva e solidária, onde todas as pessoas tenham igualdade de oportunidades e cuidados de saúde adequados. Avançar no tratamento do HIV é um passo importante nessa direção, e devemos celebrar cada conquista. A esperança está presente, e lutaremos até alcançarmos uma realidade livre da Aids.
TEXTO
MARIANO FIGUERA,
ANALISTA DE EDUCOMUNICAÇÃO, EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM
REPRODUÇÃO DA INTERNET
Pessoas que vivem com HIV, comunidades LGBTQIAP+, movimentos sociais e grupos ativistas têm usado a arte como ferramenta para denunciar, construir, registrar e enunciar as memórias dissidentes e as histórias das quatro décadas da pandemia da aids. Isso porque a arte tem o potencial de comunicar, de tornar visível o invisível por meio das ficções. Assim, pode trazer à tona experiências lúdicas como sentimentos desconfortáveis, permitindo que estes apareçam na percepção de quem prefere ignorálos ou de quem não é capaz de percebê-los em sua cotidianidade. O trabalho do coletivo é muito importante para a conscientização e desmistificação do HIV/Aids na cidade de São Paulo. O Coletivo Contágio é formado por ativistas, artistas e comunicadores racializados, LGBT+ brasileiros que vivem com HIV, onde seus próprios biodados tornam-se meios políticos de criação artística, discursiva e estética.
Surge em 2019 com a intenção de “espalhar, propagar, exercer influenciar, afetar, atingir e contagiar” discussões sobre as cosmovisões e experiências das
“Somos uma legião de divindades gloriosas viralizando contágios para repensar, renovar e retirar do casulo as certezas ditas como verdade. Assim como as borboletas que só vivem 24 horas, como uma esperança que habita o altar entre o cérebro e o crânio, deuses morrem porque se renovam.”
- Coletivo Contágio
pessoas que vivem com HIV/ Aids através de seus processos e ações. Refletem sobre a memória, a diversidade e os estigmas que giram em torno do vírus. Um exemplo é a videoarte “Indetectável: deuses morrem porque se renovam”, produzida em 2023 e disponível no YouTube; onde a partir da metáfora das borboletas e sua metamorfose refletem sobre alguns estigmas que associam o HIV a morte. “Indetectável” é uma poesia visual, uma performance através das palavras e dos movimentos do voguing que trata sobre a resistência de nossas corporalidades às tensões estruturais da morte.
“Quais realidades podemos inventar no agora sobre o futuro?”.
TÁ NA MÃO
“Indetectável” foi um projeto realizado com apoio do Edital dos Coletivos - 1ª Edição, da Coordenadoria de IST/Aids de São Paulo, no ano de 2023. Escaneie o QR Code e assista à videoarte.
TEXTO
MARCELE SELVA E
GABS HBZ, PARTICIPANTES DA TURMA III DO PROJETO, EM SÃO PAULO/SP
IMAGEM
ACERVO AGÊNCIA PRA BRILHAR
COLA E LAMBE COMO FAZ LAMBE
Revistas, jornais, panfletos, ilustrações ou
Papel Canson ou qualquer outro que tenha
Escolha sobre o tema ou o universo da sua
Recorte imagens que se encaixem com o tema escolhido, . Selecione o que chama sua atenção - sempre pensando em formar camadas. Para isso, considere: BASEarranjo maior ou elemento maior, que deve ser o primeiro a ser colado, FUNDO - que ambientação vai considerar? Seja uma floresta, sala, ambiente abstrato, busque por elementos que reforcem isso, ELEMENTO ou personagem - que figuras,
pessoas, objetos estarão em evidência, e o que pode complementar a ideia que tem pra eles?
3. Prepare a base: escolha um papel mais firme como base para a colagem.
4. Organize as imagens: posicione as imagens no papel base para encontrar o layout desejado.
5. Cole as imagens: use cola para fixar as imagens na base.