ANO 1/2022 - 14 DE JUNHO DE 2022
KIDS
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APRESENTAÇÃO Nossa revista Galileu, edição especial sobre crianças, foi pensada e realizada com muita pesquisa e dedicação. Foi organizada e planejada de modo que seja útil e interessante para aqueles que adquiriram e se interessaram pelos assuntos que vamos discutir. Esta edição foi feita para todos que têm suas vidas envolvidas por crianças, para aqueles que querem ter filhos, para os que perderam, para os que trabalham no ambiente infantil ou para aqueles que apenas se interessam. Nosso projeto tem como base a relação criança-pandemia, sabemos que a pandemia do COVID 19 abalou a todos e tornou o mundo de nossas crianças extremamente caótico, muito pela falta de compreensão da parte delas e por ser algo extremamente novo para todos nós, sejam adultos, idosos ou crianças. Por esse motivo, não termos tido nenhum tipo de planejamento dos acontecimentos que tomaram conta do nosso globo desde 2020, organizamos nossa edição de modo que possamos ajudar o planejamento dos próximos meses de suas crianças, na volta às aulas, nos impactos psicológicos da quarentena, entre outros assuntos que abordamos. Aqui vamos educar, inspirar, expor opiniões e esperamos, claro, auxiliar nesse momento pós pandemia e dar um certo apoio aqueles que estão passando por momentos delicados com suas crianças. Desde já, agradecemos o seu apoio para com a nossa revista e desejamos uma boa leitura.
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SUMÁRIO APRESENTAÇÃO........................................................................................................3 COLABORADORES................................................................................................6-7 O PERIGO NO USO (E ABUSO) DAS TELAS .................................................8-13 Saindo das telas .....................................................................................14-27 ATIVIDADES SENSORIAIS...........................................................................28-32 AINDA FALTA MUITO?.................................................................................35-39 NOTAS DO EDITOR...........................................................................................40
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COLABORADORES A ESCOLA PÚBLICA DE ONTEM E A REALIDADE DE HOJE - Jorge Lucena (Meu artigo - site Brasil Escola)
Para as pessoas que vivenciaram a escola de alguns anos atrás, e presenciam os atuais acontecimentos da escola pública no Brasil hoje, nota uma mudança catastrófica com relação ao comportamento dos alunos, falta de interesse pelo conteúdo e desrespeito pelos professores são apenas alguns dos problemas enfrentados em sala de aula, além desses uma série de problemas chegam a se somar tomando o efeito de uma bola de neve, onde o bullying e a violência torna-se o ponto mais crítico desse somatório de dificuldades. Mas onde estará o ponto chave dessa mudança de atitudes? Será que a escola é a única responsável por toda essa mudança? A essas indagações podemos colocar inúmeras outras. Os estudiosos das didáticas escolares propõem suas teorias até certo ponto magníficas nas suas apresentações teóricas, mas quando nós profissionais da educação tentamos colocá-las em prática no nosso dia a dia, ficamos com a perturbadora sensação que não funcionou como deveria, ou pelo menos como os especialistas achavam que funcionaria.
Nós sabemos que apesar dessa famigerada crise econômica que passa a nossa nação, o governo federal ainda continua a enviar recursos suficientes para a educação de todo País, mas que infelizmente nunca chegam à sua totalidade no objetivo a que foram direcionados. Mesmo assim os recursos são suficientes para ser feito um excelente trabalho dentro da escola pública, apesar dos descasos com a coisa pública pela grande maioria dos governantes. Se compararmos a escola pública de hoje com a de anos atrás, fica óbvia a estrtosférica diferença de qualidade, onde a quantidade de recursos era bem inferior, e mesmo assim a qualidade do ensino e do aprendizado dos alunos no tocante ao interesse era muito superior aos dos dias atuais. A educação é o ponto básico para estruturar toda uma sociedade, e isso não é novidade pra ninguém, porém a forma indiscriminada de tratamento dispensada aos professores, que tentam produzir e elevar a qualidade da educação em nosso País tem
mostrado o outro lado obscuro da nossa realidade educacional. Uma infeliz realidade que privilegia a quantidade e faz por desmerecer a qualidade, deixando de forma clara o reflexo de tudo isso, que pode ser constatado na qualidade limitada dos bons profissionais que existe hoje no mercado de trabalho. Só existe uma atitude real que pode mudar esse jogo, e essa atitude é a retomada do interesse familiar pelos alunos da escola pública, procurando incentiva-los e mostralos a verdadeira função da escola como meio de integração social, informando-os sobre a importância do respeito e da obediência dentro das unidades escolares, e que as lições de hoje, podem fazer uma grande diferença no futuro profissional e social de cada um deles amanhã. Somente dessa forma e com essa parceria entre escolas, educadores e familiares a mudança positiva poderá num futuro próximo brotar bons frutos.
Outro ponto extremamente negativo é esse terrível impasse salarial, e essa diferença salarial dos professores Brasil afora. O governo federal impõe suas formas de avaliar a educação pública a nível nacional, criticando e na maioria das vezes reduzindo recursos federais daquelas instituições que não atingiram tais metas, tudo isso de forma linear e de forma igualitária, no entanto, o governo federal e os nossos “representantes Parlamentares”, continuam contrários à federalização salarial dos professores, o que não deixa de ser uma controvérsia quando falamos em um mesmo objetivo a ser alcançado.
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O PERIGO NO USO (E ABUSO) DAS TELAS PELAS CRIANÇAS Especialistas alertam para os prejuízos físicos, psíquicos e sociais que celulares, computadores, videogames e afins podem causar. Hora de rever limites. Não é de hoje que pediatras, psicólogos e outros profissionais defendem mais cuidado e moderação com os meios eletrônicos na infância. Nos últimos tempos, porém, não só rolou uma avalanche de evidências científicas sobre as repercussões negativas desse estilo de vida vidrado nas telas como cresceu a preocupação com o uso cada vez mais precoce e intenso de computadores, smartphones e tablets. E, claro, a Covid-19 bagunçou tudo: com o isolamento social, os limites de tempo na frente das telinhas e telonas caíram por terra. Falo por experiência própria. Tenho gêmeos de 5 anos e ficamos meses dentro de um apartamento com opções de espaço e atividades restritas. O desafio era equilibrar uma rotina sem brincadeiras ao ar livre, com aulas online e os nossos próprios trabalhos e afazeres domésticos. Que atirem a primeira pedra os pais que, em condições parecidas, não liberaram horas a mais de TV ou celular. No fim das contas, quem se deu melhor foram as famílias que conseguiram flexibilizar o acesso à tecnologia sem deixar de lado a interação, o afeto e o
mundo fora das telas, retomando as rédeas da situação com a reabertura das escolas e dos espaços de lazer. Mas é inegável que a pandemia atropelou etapas e antecipou tendências. “Desde a entrada da internet discada no Brasil, estamos acompanhando a evolução do uso da tecnologia pelas pessoas. E o que esperávamos ver daqui a cinco ou dez anos aconteceu da noite para o dia”, observa Andrea Jotta, pesquisadora do Laboratório de Psicologia em Tecnologia, Informação e Comunicação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Tudo (ou quase tudo) migrou para o universo digital. E, para o bem e para o mal, nos tornamos ainda mais dependentes das telas, especialmente a nova geração. Na visão de Andrea, estávamos a caminho de uma educação digital, aprendendo a utilizar a internet e outros recursos de forma balanceada. Mas a Covid-19 desestruturou essa rota e criou novas dificuldades para controlar o tempo conectado e os conteúdos à disposição dos mais novos. “Crianças não estão no mercado de trabalho nem dependem socialmente 9
da internet. Vai do educador presente fazer valer essa distinção e deixá-la off, incentivando também outras atividades”, recomenda a psicóloga da PUC-SP. É nítido que a tecnologia já foi adotada como ferramenta pedagógica nas escolas e isso não deve voltar atrás, mas a grande questão (e preocupação) envolve o abuso para fins recreativos. Crianças e adolescentes estão cada vez mais confinados ao entretenimento digital. “O problema se dá quando esse comportamento concorre com outras atividades, se torna exagerado e ultrapassa os limites da nocividade”, pontua o psiquiatra Guilherme Polanczyk, professor do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). Para guiar os pais, entidades médicas mundo afora publicaram diretrizes a respeito. A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) orienta um limite de acordo com a idade e as etapas do desenvolvimento infantil. Para começar, nada de telas antes dos 2 anos. Evelyn Eisenstein, pediatra que coordena o Grupo de Trabalho de Saúde na Era Digital da SBP, explica que, nessa fase, a exposição a telas pode atrapalhar e atrasar processos mentais e cognitivos como a aquisição da linguagem. Nada substitui o contato humano cara a cara. De 2 a 5 anos, o limite para a SBP é de uma hora por dia, sempre sob
supervisão. Isso aumenta para até duas horas dos 6 aos 10, e, daí aos 18, chega a três horas diárias. O que entra na conta Os meios e recursos mais utilizados que fazem as crianças extrapolarem limites saudáveis: Celular e tablet: não são brinquedos nem deveriam ser dados de presente aos pequenos. O acesso exige regras e controle do conteúdo. Televisão: parece ser hoje o menor dos males e tem menos potencial viciante, desde que seja assistida de forma adequada e supervisionada. Videogame: os jogos são os mais associados à dependência eletrônica. Perda do sono, estresse e agressividade estão entre as consequências. Redes sociais: a promessa era aproximar as pessoas, só que o abuso isola, aumenta o risco de ansiedade e depressão e a exposição ao bullying. Há limites e limites Achou os limites da SBP rígidos demais considerando estes novos tempos? Há quem defenda medidas ainda mais radicais. O neurocientista Michel Desmurget, diretor de pesquisa do Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica da França, aconselha evitar as telas até os 6 anos de idade.
Em seu livro A Fábrica de Cretinos Digitais (clique aqui para comprar), ele expõe dados e argumentos que impressionam — todos baseados em sua experiência e em estudos que comprovam os perigos de tanta exposição a telas na infância. Em alguns lares, tem bebê assistindo a cerca de 50 minutos de desenhos animados por dia. Inofensivo? “Isso representa 8% da vigília dele, 15% de seu tempo livre, que deveria ser destinado a observação ativa do mundo, brincadeiras espontâneas, exploração motora e outras atividades. Em 24 meses de vida, são 600 horas gastas”, detalha Desmurget. A conta é ainda mais alarmante em relação às crianças mais velhas. Pesquisas feitas em países ocidentais apontam que, entre os 2 e os 8 anos, elas dedicam, em média, o equivalente a 1/5 do seu dia às telas. Entre 8 e 12 anos de idade, o tempo de uso recreativo aumenta para 1/3 do período de vigília. E, em meio aos adolescentes (13 a 18 anos), o consumo diário beira os 45%,
quase metade do tempo em que ficam acordados. Fazendo os cálculos, eles chegam a acumular, em média, 2 689 horas, ou 112 dias de um ano, grudados nas telas. Em outubro de 2021, o Lenstore Vision Hub, plataforma britânica da marca de lentes de contato Acuvue, publicou uma análise de quão dependentes tecnológicas se encontram as crianças de várias nações. Após revisar e cruzar índices como horas de internet por dia, grau de comportamento sedentário e prevalência de obesidade infantil, foi possível elaborar um ranking por país que dá uma noção de quanto os mais novos vivem frente às telas e os reflexos disso em sua saúde. O primeiro lugar da lista ficou com os Emirados Árabes Unidos, seguidos pelos Estados Unidos e, logo em terceiro, vem o Brasil, que lidera especificamente o quesito “tempo diário de internet” (mais de dez horas!) 11
O fato é que crianças e jovens nem sempre têm limites mesmo. “Até certa idade, o ser humano não tem formada uma região do cérebro que dá aquele aviso de que é preciso parar. Essa zona só estará madura entre 20 e 24 anos. Então até lá é preciso que os adultos responsáveis os ensinem e supervisionem”, esclarece Andrea. Só que a indústria de entretenimento eletrônico e as redes sociais não facilitam as coisas para os pais. A maioria dos programas e dos dispositivos hoje é extremamente intuitiva e envolvente. É fácil aprender a mexer e passar horas e horas conectado ali. Por isso, alguns especialistas defendem a introdução mais tardia das telas. Desmurget afirma que a exposição precoce pode fazer com que o pequeno se desvie de seus aprendizados essenciais, fechando janelas cerebrais que não se abrirão depois para capacidades como concentração, reflexão e interação social. “As telas podem privar as crianças de estímulos e experiências essenciais dificílimos de serem recuperados mais tarde”, escreve no livro. O neurocientista frisa que, salvo ferramentas educativas ou desenvolvidas para ajudar em tratamentos específicos, as pesquisas não comprovam que as habilidades adquiridas no meio virtual se estendam para a vida real. Ele exemplifica: um hábil jogador
que adquire uma incrível noção espacial dentro de um game não será, em função disso, alguém apto a se locomover melhor numa cidade ou a ter um bom desempenho em atividades do gênero fora das telas. Desmurget aproveita o ensejo para refutar o termo “nativos digitais”, a geração que seria hipercompetente com a tecnologia. Assim como qualquer adulto, as crianças de hoje precisam aprender a navegar pelo mundo virtual, e, sem instrução, não vão dominar conceitos e práticas básicas na informática. Mas essa torrente de estímulos não estaria mudando a anatomia do cérebro dos jovens superconectados? Pode até ser, mas o cientista francês faz questão de avisar: “Todo estado persistente e/ou toda atividade repetitiva modificam a arquitetura cerebral. Certas zonas se tornam mais espessas, outras mais delgadas; algumas vias de conexão se desenvolvem, outras se estreitam. Isso é próprio da plasticidade cerebral. Ou seja, pode haver ganhos mas também perdas nesse processo, e, o principal, esse fenômeno não tem ligação unívoca com os desempenhos cognitivos. Nesse sentido, Desmurget explica que, em muitos casos, um córtex (a camada superficial do cérebro) mais fino é funcionalmente mais eficiente. “O quociente de inteligência (QI)
do adolescente e do jovem adulto é desenvolvido em associação a um estreitamento progressivo do córtex em inúmeras zonas, especialmente as pré-frontais, que os estudos relativos à influência dos videogames descreveram como sendo mais espessas”, relata.
desempenho escolar). Tudo depende da idade e da exposição. E o preço que a saúde paga pode ser bem alto.
Sob esse ponto de vista, os games não tornam as crianças mais espertas — estaria mais para o oposto. Convém ressaltar que os prejuízos se acentuam à medida que aumentam as horas de tela. E englobam, além dos jogos eletrônicos, redes sociais, chats, vídeos… Há efeitos físicos (ganho de peso), psíquicos (ansiedade) e intelectuais (mau 13
Saindo das telas
12 atividades analógicas para crianças se divertirem sem usar o celular
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12 ATIVIDADE ANALÓGICAS PARA CRIANÇAS SE DIVERTIREM SEM CELULAR 17 agosto 2021 por Jader Pires
tSmartphone, tablet, TV, essas tecnologias ajudam os pais a distraírem as crianças no dia-a-dia, mas sabemos que muito tempo em frente às telas não faz bem. Aqui vão algumas alternativas para entreter os pequenos sem recorrer a vídeos e games. Computadores, celulares, televisões e a Internet são ferramentas proveitosas e fascinantes, e seus avanços são de fundamental importância para a humanidade. A utilização em excesso, a dependência e a substituição de processos naturais do desenvolvimento infantil pelo torpor de monitores trazem, também, riscos à saúde que podem precisar de melhores administrações do tempo e atenção dos filhos. Segundo o Manual de orientacão #Menos Telas #Mais Saúde da Sociedade brasileira de Pediatria, os primeiros
anos de vida são muito importantes para o desenvolvimento de qualquer criança. “São diferentes estruturas e regiões cerebrais que amadurecem e não só a nutrição/oral, mas todos os circuitos sensoriais”. A presença da mãe, do pai, enfim, da família, trabalha estímulos e cuidados do apego e que não podem ser substituídos por telas e tecnologias. Linguagem, sono, habilidades cognitivas e sociais são dificultados pela passividade da tela. De acordo com o ebook “Desafios da parentalidade e o bem-estar integral dos brasileirinhos”, que reúne 3 grandes estudos da Nestlé que visam avaliar e compreender a saúde das crianças, em uma perspectiva mais integrada e ampliada, nossas crianças
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estão mais sedentárias: 39.1% delas praticam pelo menos trinta minutos de atividade física por dia (menos da metade das crianças) Praticamente metade, 44.9%, jogam videogame por pelo menos trinta minutos, muitas vezes mais que isso, todos os dias. Eu conversei com a Gabriella Demarque, psicóloga formada pela PUC/SP e que trabalha com psicologia infantil, e ela me deu um panorama bem interessante: “Na infância a criança é como um órgão sensório. Os sentidos trazem as informações do mundo externo e essas informações vão preenchendo o mundo interno da criança, portanto tudo que elas vêem, ouvem, tocam e experimentam, tem um reflexo psíquico. A principal tarefa dos pais e da sociedade, nesse período, é mostrar para a criança que o mundo é bom: um lugar onde ela pode se expressar, confiar no processo de existência e agir com confiança, amor e autenticidade. E como fazemos isso? Precisamos saber que a criança aprende por meio da imitação e da repetição. Então, ela está aprendendo o tempo todo ao observar o ambiente e as pessoas ao seu redor. Ela repete, da sua maneira, com brincadeiras e, assim, vai elaborando as informações apreendidas”. A ideia de ter esta conversa não é a de vilanizar as telas, o celular, o computador, são todos progressos relevantes com ainda mais importância na pandemia, mas precisamos equilibrar essa exposição na rotina de crianças e jovens. É importante manter a supervisão de
um adulto, e tentar seguir algumas recomendações: não utilizar telas durante as refeições, desligá-las uma ou duas horas antes de dormir, evitar expor crianças com menos de 2 anos às telas, após os 2 anos tentar manter a média de 1 a duas horas por dia e, no caso dos pré-adolescentes e adolescentes, evitar o famoso “virar a noite”, priorizando a higiene do sono. Mas, sem as telas à disposição, o que fazer? Como entreter as crianças? Vamos propor algumas opções de atividades que complementam e estimulam outras áreas importantes do as áreas importantes do desenvolvimento: brincadeiras, mãona-massa, trabalhos de expressão corporal e artística que trabalhem a cognição para além das telas. Temos, aqui, cinco campos com ideias de brincadeiras que podem ser exploradas:. Brincadeiras de botar a mão na massa: Brincar com massinha, construir algo, fazer sujeira e ver materiais aglutinados virando algo palpável! Brincadeiras “mão na massa” promovem a exploração sensorial, que é uma das principais formas de aprendizagem das crianças pequenas. Algumas sugestões da Gabriella:
Cesto dos tesouros Convide a criança para reunir em um cesto de objetos com texturas diferentes, encontrados na sua casa ou na natureza (seguros para brincar). Por exemplo: pedaços de tecido, folhas e pinhas, utensílios seguros da cozinha (colher de pau, funil de silicone, buchas etc). Só não vale o que já é brinquedo! Em seguida, com imaginação, os objetos viram tesouros! Peça para sugerir o que cada uma das coisas podem ser e representar em diferentes brincadeiras.
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Cesto dos tesouros Durante o preparo das refeições, pegar um pedaço da massa de farinha e transformar em massinha já divertiu muitas gerações (e pode continuar entretendo). Para deixar a coisa mais interessante, você pode usar tintas naturais que vêm em pó, e só precisa adicionar água, ou utilizar gotas de corante comestível com farinha e água para brincar..
Carimbo de frutas e legumes Outra proposta divertida é pegar frutas e legumes, cortálos, passar um pouco de tinta e ver como ficam carimbados em papel, linhas e formas. Carambolas, uvas, morangos rendem bons formatos. Claro, a dica é utilizar alimentos que não serão mais utilizados para cozinhar
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brincar na água Quantas são as possibilidades de brincar sentado em uma bacia? (Sempre com supervisão). O contato com a água em si já é muito divertido para as crianças e ainda podemos estimular brincadeiras que diferenciam os movimentos que formam ondas, espirais, gotas, etc. Quanto mais texturas variadas e liberdade de movimento (com supervisão de adultos e uso de objetos seguros), melhor. O importante aqui é a criança ser o próprio brinquedo. Para movimentar! Brincar, correr, pular corda e se movimentar com liberdade permitem que a criança vivencie a sensação de sentir-se bem no próprio corpo, por meio da liberação de hormônios que também fortalecem o seu sistema imunológico.
Pique-esconde e pega-pega São clássicos da infância e não envelhecem. Mesmo que só com duas crianças ou entre pai e filho, incentive que essas brincadeiras aconteçam vez ou outra. Se faltar espaço, a caça ao tesouro (que nada mais é que um esconde, esconde de objetos) pode ser uma alternativa interessante.
Tocar bola ou jogar bolas pequenas um para o outro SAtividades que priorizam o movimento do corpo treinam equilíbrio, e contribuem para o desenvolvimento da cooperação e da parceria. Pode ser com bola de meia, de leite, de futebol, tênis, etc. Pode ser chutando de levinho ou jogando pelo ar sem deixar cair. Uma possível proposta é ver quanto tempo ou quantos passes conseguem dar sem que errem. A cada nova rodada tenta-se manter ou aumentar o recorde. Estimulando a imaginação e criatividade 23
Faz-de-conta Narrativas podem estimular a imaginação e podemos incentivar as crianças a fazer isso criando desenhos, contando histórias, inventando faz-de-conta com brinquedos, montando cabanas, entre outros. O universo da criança pequena é todo lúdico: é assim que ela compreende e vive o mundo. É importante demonstrar interesse pelas brincadeiras da criança, porém sem interferir desnecessariamente (a não ser que ela esteja em risco). Brincadeira não precisa ter uma função, objetivo ou resultado claro para o adulto. A criança, por vezes, repete a mesma brincadeira por bastante tempo, até encontrar ela mesma a “solução” ou a “finalidade” daquela brincadeira.
Ler livros e narrar histórias Fazer leituras para as crianças contribuem para a aquisição da linguagem, o fortalecimento do vínculo, além de aumentar o repertório cultural da criança.
Apresente brincadeiras de outras gerações:
Uma dica interessante para os pais é apresentar aos filhos uma brincadeira que gostava de fazer quando era criança! Além de ser um momento especial com os pequenos, é uma oportunidade de o adulto também brincar. A criança costuma gostar das histórias que os pais contam associadas às brincadeiras, e é uma forma de valorizar e dar continuidade à cultura da família e da região. Escorregar em papelão, brincar de queimada, mãe da rua, taco, brincadeiras de roda e cirandas, por exemplo. Divertindo com Arte Música, pintura, cantar. Como as artes ajudam no desenvolvimento infantil?
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Pintura Mais uma vez é importante a liberdade de movimento da criança pequena - pelo menos na primeira infância, a atividade deve ser feita sem finalidade ou resultado esperado, mas pela própria exploração sensorial. Isso contribui para a conquista posterior da habilidade de desenhar com intenção e escrever.
Ouvir música, cantar ou tocar São cada vez mais reconhecidos os benefícios da musicalização para bebês e crianças pequenas - conviver com a música e o canto permite que as conexões cerebrais aconteçam com maior facilidade, diminui os níveis de estresse, e permite o desenvolvimento da coordenação rítmica, entre outros benefícios. O bebê tende a se acalmar quando escuta músicas que ouvia durante a sua gestação.
Narrar os acontecimentos da rotina Incluir o bebê na rotina de cuidados através da narração das atividades, ou seja, contar para ele o que está acontecendo, ajuda na sensação de calma e organização interna do bebê - é uma forma do bebê passar a reconhecer e se antecipar para o que será feito. Cantar uma música pode contribuir para essa associação (a música do banho, a música da massagem) É importante pensar em momentos de descontração para todos da família - a situação atual já é suficientemente insegura e tensa para todos. Jogos, brincadeiras, cozinhar juntos, ver a criança brincar. Para a aprendizagem, também é importante observar processos, que tenham início, meio e fim (cozinhar, ver os pais fazendo as atividades da casa) para além de passarem os dias somente nas telas.
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ATIVIDADES SENSORIAIS: QUAL SEU PAPEL NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA? 22 novembro 2021 por Almog Griner
Nós, seres humanos, possuímos cinco sentidos que permitem a captação de imagens, sons, sabores, odores e toques: visão, audição, paladar, olfato e tato. É por meio dessas sensações que temos a percepção clara do ambiente em que estamos e como podemos lidar com ele. O nosso organismo capta os estímulos exteriores e, por meio de receptores sensoriais, transforma-os em impulsos que serão interpretados por nosso sistema nervoso. São os cinco sentidos que garantem a nossa sobrevivência desde sempre. Ainda no início da vida, dois dos sentidos são mais exercitados: a visão e a audição. Seja para identificar a figura da mãe e sua voz, além dos movimentos e sons ao redor. Com o passar do tempo, a percepção de outros sentidos vai se incorporando ao dia a dia da criança. No entanto, a visão e audição são os naturalmente mais desenvolvidos. Mas como aguçar ainda mais a consciência dos cinco sentidos? Como identificar os diferentes aromas trazidos pelo ar? E os sabores exóticos, desconhecidos no nosso dia a dia? E as sensações que podemos sentir com as mãos e até com os pés? E com o toque na pele? Por meio de atividades sensoriais, é possível estimular os pequenos a terem uma maior consciência sobre os sentidos e, ainda por cima, brincarem para valer. 29
O QUE SÃO ATIVIDADES SENSORIAIS? Atividades sensoriais são dinâmicas que, além de divertidas, estimulam os diferentes sentidos: olfato, paladar, audição, tato e visão. Com as crianças, estas brincadeiras desenvolvem mais do que habilidades físicas, mas também a criatividade, a capacidade de raciocínio e a coordenação motora. Percebe o mundo de possibilidades ao alcance das crianças e o quanto elas podem explorar com novas descobertas e experiências? Daí a importância de realizar ações que explorem os demais sentidos do corpo humano. E se forem exercitados em conexão, o potencial será ainda maior. QUANDO COMEÇAR? Não há uma idade específica para a prática de atividades deste tipo. De crianças a adultos, todos podem ser estimulados e terão ganhos com exercícios sensoriais. Contudo, a primeira infância é um excelente período para isso, pois é quando a mente das crianças está trabalhando especificamente para reter mais informações e fazer conexões de aprendizagem. Dessa forma, incentivar esse tipo de atividade é fundamental para ajudar no desenvolvimento cognitivo, linguístico, emocional e social desde cedo. Os ganhos não se restringem aos momentos de diversão. As atividades sensoriais incrementam o processo de aprendizagem através desses estímulos. As crianças conseguem aprender melhor quando o conhecimento atinge mais de um sentido em simultâneo.
As brincadeiras que envolvem os cinco sentidos instigam a investigação e a curiosidade das crianças, trazendo bons questionamentos e novos feitos, de maneira que os pequenos avancem em busca de mais conhecimento. Ah, e como são marcantes as lembranças provenientes dos sentidos! Sabia que a memória pode conectar sabores e aromas às recordações de determinados momentos? Como aquele delicioso bolo da vovó que perfuma a casa inteira e logo remete ao tempo de infância. USE E ABUSE DO CONTATO COM A NATUREZA A natureza nos oferta um verdadeiro arsenal de possibilidades para se estimular os diversos sentidos. Em uma ida à praia, por exemplo, podemos explorar a textura da areia, que pode ser mais grossa ou mais fina. Quando molhada, já tem um toque diferente. Nos pés se sente de uma forma, na mão já se sente diferente. E a própria areia serve para moldar com forminhas e baldes, fazer castelo, enterrar os pés, cavar buracos ou piscininhas. A areia pode ser mais clara ou mais escura também e ter temperaturas e odores diversos…. As possibilidades só com a areia já são diversas, só não deve ser confundida com farofa! Ainda na praia, é possível experimentar a água do mar, sentila no corpo, catar conchinhas, se deparar com animais. Não precisa de muito para se receber muito.
Um passeio a um parque, bosque ou até ao quintal também nos permite uma infinidade de possibilidades de exploração dos sentidos e o cenário e as possibilidades já se alteram se o ambiente for visitado em um dia de chuva ou mesmo um espaço que tem lama. Então, valorizem o que a natureza nos dá de graça. Mas como nem sempre explorações sensoriais ao ar livre são possíveis, trago a seguir algumas atividades de estímulo sensorial que podem ser realizadas em casa. IDEIAS DE ATIVIDADES SENSORIAIS PARA SEREM REALIZADAS COM AS CRIANÇAS EM CASA Caixas sensoriais: é uma boa brincadeira para estimular o conhecimento de diferentes formas e texturas. Basta uma caixa de papelão que pode ser enfeitada com papel colorido para ficar com melhor aparência, e feitos dois furos que dêem para passar os braços da criança. Na caixa podem ser colocados objetos para que a criança os adivinhe através do tato. Bonecos de bexiga: além de serem fofos e personalizáveis, os bonecos podem ser utilizados para a estimulação do tato, bem como para a percepção visual de cores, formas, tamanho e peso. Para a criação do brinquedo, basta encher uma garrafa pet de 500 ml até a metade com farinha. Após isto, encha a bexiga de ar e encaixe a bexiga na boca da garrafa para transferir a farinha para o balão. Depois de tudo despejado, dê um nó. Agora é só enfeitar à vontade, fazendo do boneco um personagem, e dar asas à
imaginação. Obs: faça em local que possa sujar, pois a farinha tende a não se conter nessas horas, principalmente se as crianças se envolverem no processo de produção. E lembre-se que é um brinquedo frágil que pode estourar durante a brincadeira. (Ouça a voz da experiência!) Massinha: brincar de massinha também é uma ótima pedida e as crianças adoram. Para incrementar a brincadeira, pode-se colocar glitter na massinha. Como também, utilizar materiais de apoio, como forma de gelo e de biscoitos, rolinho de massa, palitos e afins. “Afunda ou não afunda?”: basta uma bacia com água e objetos para colocar dentro e testar se afundam ou não. É uma atividade bem divertida e ótima para desenvolver a imaginação das crianças. Se quiser dar um plus, pode colocar um corante na água para também estimular a visão. Pintando com os pés: que tal enriquecermos a programação de atividades com uma que faz sujeira, mas arranca boas gargalhadas e desperta novos sentidos também? É o pintando com os pés. Em um lugar aberto, estenda um grande pedaço de papel ao chão e use tintas de cores diferentes para pintar com os pés. Descobrindo sons: essa brincadeira pode usar diversos materiais que façam barulhos diferentes, ou até uma música que tenha os sons da natureza, para que as crianças os identifiquem. Acrescente outros materiais aos seus jogos sensoriais e dê asas à imaginação junto com a meninada: 31
Areia Gelo Gelatina Livros coloridos e de diferentes texturas Grãos como arroz, feijão, macarrão e outros que você disponha em casa. Brincar é parte fundamental do processo de aprendizado e desenvolvimento da criança. Utilizando atividades que envolvam os sentidos é possível despertar maior interesse e garantir a diversão da criançada! Afinal, criar experiências sensoriais torna o aprendizado mais leve e divertido.
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ainda falta muito?
O QUE SÃO ATIVIDADES SENSORIAIS? O coronavírus e a infância: o que as crianças compreendem daquilo que ninguém entendeu ainda Ele pode ser verde, colorido, ter duas cabeças, cara de mau ou de bonachão: o fato é que o coronavírus está presente com força no imaginário das crianças, e agora aparece frequentemente nos desenhos delas no lugar dos monstros debaixo da cama. Feito a imagem de uma figura mítica que se fixa estereotipada na cabeça das pessoas, porque sempre se parecem na mentalidade popular, como o E.T. de Varginha ou o Bicho Papão, o coronavírus das crianças que ouvimos para essa reportagem são bolotas com espetos saindo de sua circunferência.
Alguns sorriem irônicos, e outros ameaçam um “vou te pegar!”, como na criação do Joaquim, paulistano de 7 anos. Será que esses desenhos nos ajudam a compreender a pergunta valiosa que se fazem os pedagogos e psicólogos? O que as crianças estão achando da pandemia? Será que estão tão angustiadas quanto nós, adultos? Entrevistamos treze crianças brasileiras com idades entre 2 e 11 anos, de diversas regiões do país e diferentes contextos sociais, para saber como elas enxergam a nova realidade. Se nem todas vivem a quarentena do mesmo jeito, há pelo menos um denominador comum: estão longe da escola. Perceber e acolher as dores das crianças é papel dos adultos, e muitas vezes sinônimo de lembrar que elas são seres em 35
formação que nem sempre sabem comunicar como e por que sofrem. Beto e Marcelino, os gatos A Juju (foto) mora em São Paulo, tem 7 anos e queria que essa “turbulência” passasse. Ela se desenhou olhando a rua, atrás do portão. Da mesma idade e com o mesmo nome, Júlia conta que conversa com seus gatos Beto e Marcelino na quarentena. “Qual foi o último dia em que você se sentiu feliz?”, perguntamos para ela. “Ontem. Assistindo ‘Carrossel’ e arrumando a casa, o que é muito legal. Ah, e também batendo na bunda do papai.” Ela acha chato falar sobre sentimentos, mas mesmo assim divide com a gente alguns pensamentos ruins que vêm à sua cabeça. “Eu não posso sair de casa. É tipo uma cadeia, mas uma cadeia legal, com um monte de coisas legais.” Seja como for, como disse a Alice, 5, de Brasília, o coronavírus ideal mesmo seria aquele que não tem mais poder de “fazer gripe nas pessoas”. No seu desenho, ela narra o vírus mergulhando em uma fonte de desejos e ficando bonzinho. E, se depender dela, a pandemia terá um desfecho, mas a má notícia é que ele ainda não está próximo: “faltam 1000 dias pro coronavírus ir embora”, diz. Educação afetiva Se educar uma criança nunca foi sinônimo de dar a ela respostas sobre todas as coisas, agora, enquanto vivemos a maior crise sanitária global do século, a impossibilidade de se ter certezas se intensificou. Não sabemos quando poderemos ver a família, os amigos, o parque do bairro, o próprio bairro. E são justamente essas as perguntas não só das crianças, mas também dos adultos.
Com as aulas interrompidas e a ausência da escola como primeiro espaço de socialização e aprendizagem, as referências de conduta das crianças não estão mais nos educadores e nos colegas, mas concentradas nas famílias que vivem com elas sob o mesmo teto. Para Regina Lopes, a transparência sobre a crise é o primeiro passo. “Dizer que está tudo bem não é a realidade, e falar sobre o que está lhe incomodando alivia as tensões”, explica. “É muito importante conversar com as crianças sobre o momento atual de uma forma que elas possam compreender, conforme a idade de cada uma. Quando elas mostrarem seus sentimentos é fundamental a conversa”, diz Regina. Boneco com coração “É um corpo que tem dentro o coronavírus. O corona dentro do corpo está feliz, é o boneco verde com coração. E do lado de fora é a pessoa triste que está doente e não usou máscara”, conta a mãe do pequeno Ifé, a jornalista e empreendedora Lorena Ifé. “Eu estou triste porque eu não posso mais ir pra escola, pro shopping. E eu estou triste porque eu não posso mais ir pra Cachoeira (BA), ver meu vô e minha vó”, diz ele. “Vou fazer um desenho agorinha!”, avisa. Ifé, 4 anos (Salvador, BA) Ver os amigos de novo “Quando eu não tô estudando, eu brinco”, diz a menina, que é filha de uma professora de biologia e tem a sorte de receber da família muitas informações de como se proteger.
Entre uma brincadeira e outra, ela conta que lava as mãos e toma vitamina C. “Estamos nos cuidando e respeitando todas as regras da OMS (Organização Mundial de Saúde).” Se ela sente medo, nós perguntamos. “Sinto um pouco de preocupação de quando tudo isso vai acabar. Eu quero ver meus amigos de novo, voltar a estudar. Então, eu fico preocupada, mas também fico achando que tudo vai passar logo.” E com os amigos, o assunto também é o coronavírus? “Não, a gente fala mais sobre brincadeiras pra se distrair”, conta. Eloah, 11 anos (Gandu, BA)
não atinjam diretamente a criança, vão inevitavelmente atingir seus cuidadores, que poderão reagir diante desta situação de diversas formas, dependendo do quanto se sentem capazes ou não de lidar com as ameaças: preocupação, estresse, desamparo. As crianças são muito perceptivas e tendem a se valer das emoções de seus cuidadores como “termômetro” para avaliar o grau de ameaça de determinada situação, e também tendem a espelhar os mecanismos de manejo que observam em seus cuidadores.
Muita TV “Quem lê tanta notícia?” O verso do cantor Caetano Veloso parece traduzir o que o pequeno Leo quis transmitir em seu desenho de como vê a sua casa neste momento. “O desenho mostra a hora em que os adultos veem TV. Ele não gosta, e se questiona por que os adultos veem tanta notícia sobre o coronavírus”, conta a mãe, Cinthia Rodrigues. Leo, 7 anos (São Paulo, SP)
Então, acho válido que os pais se observem e se fortaleçam, para poder transmitir para a criança tanto a preocupação necessária diante da pandemia (para que ela não se coloque em risco e entenda a necessidade do isolamento social), quanto o reasseguramento de que ela está sendo cuidada (novamente ressaltando a importância do isolamento social) e também, se possível, aproveitar o momento de crise não apenas para impedir o prejuízo emocional, mas também para fomentá-lo, construindo novos recursos psíquicos. Para conseguir fazer isso com a criança, é preciso que o adulto faça isso consigo mesmo. Ou seja, a melhor forma de cuidar da criança é cuidando primeiramente de si mesmo.
Observar e fortalecer Conversamos com a psicóloga Ana Carolina Del Nero que falou sobre como lidar com os filhos no momento Em termos de desenvolvimento emocional, as crianças podem ter prejuízos em função do isolamento social? O que nós estamos vivendo hoje é uma crise, então sim, pode haver prejuízos no desenvolvimento emocional da criança, não apenas em função do isolamento social, mas também das outras “crises dentro da crise”: da saúde, do medo, e até a financeira. Mesmo que
Durante o isolamento, as crianças também estão mais propensas a se expressarem de forma natural? Ana Carolina Del Nero: Apesar de as 37
crianças ainda serem mais espontâneas, mais genuínas que os adultos de forma geral, vivemos numa sociedade em que performances são cada vez mais cobradas das crianças — e as expectativas em relação a elas, mais rígidas. Então é possível que ela se permita “afrouxar” essa personagem, especialmente se os pais ou cuidadores também estiverem se permitindo agir de forma mais espontânea e autêntica. As crianças aprendem por modelo e tendem a espelhar o comportamento de seus cuidadores. Ou seja, se eles estiverem mais disponíveis, mais abertos a conversar sobre emoções, a desacelerar, a brincar com os filhos mais demoradamente, a tendência é que a criança replique este comportamento. Porém, não podemos nos esquecer que os pais também costumam ser as principais figuras de cobrança e exigência, o que significa que o convívio ininterrupto pode, ao contrário, intensificar a performance da criança de que está tudo bem, de que ela não pode demonstrar seus sentimentos (por acreditar que não será acolhida), ou até de se sentir no dever de cuidar de quem deveria cuidar dela.
bem, baseados no comportamento prévio da criança. Qualquer mudança já é um sinal de alerta: aumento ou diminuição de apetite e sono, dificuldade de concentração. Porém, estamos numa situação totalmente atípica, e os pais ou cuidadores estão mais ansiosos de forma geral, então é possível que algumas crianças se retraiam e escondam sua própria angústia. Por isso, é essencial que os pais saibam que essa situação também é muito dolorosa para as crianças, que elas provavelmente estão sofrendo, sem saber como lidar com um sofrimento tão grande e novo, e que deem espaço e abertura para que essas emoções apareçam e possam ser elaboradas, seja por meio de brincadeiras, de desenhos, de conversas, de contato físico (se possível). Para isso, não há nada melhor do que fazer perguntas, se envolver com as brincadeiras, estar junto. “A melhor solução costuma ser aquela que é co-construída. Assim, vai sendo criada uma nova rotina, mais adequada ao período do isolamento social.”
Os desenhos, as brincadeiras, a fala, o choro, até mesmo o silêncio e a introspecção: como identificar nas expressões das crianças sinais de sofrimento?
É frequente que os adultos confundam escutar as crianças como sinônimo de fazer todas as suas vontades. Como incentivar essas formas de expressão de um jeito saudável?
Ana Carolina Del Nero: Cada criança é única, e cada uma vai ter o seu jeito individual de lidar e de manifestar seu sofrimento. Antes de mais nada, é importante que os pais estejam atentos a sinais já conhecidos de que algo não está
Ana Carolina Del Nero: É preciso encontrar um equilíbrio. A criança, assim como todos nós, teve muitas perdas com a pandemia e o isolamento, então fazer algumas vontades, permitir algumas
compensações não é necessariamente negativo, e pode inclusive ser um momento compartilhado de prazer — por exemplo, ver um filme, tomar um sorvete. Temos de lembrar também que neste momento os adultos estão sobrecarregados não só de tarefas, mas emocionalmente, e controlar as crianças como era feito pré-pandemia (em termos de alimentação, tempo diante das telas, etc) talvez não seja possível e se torne mais uma fonte de cobrança e angústia. Ou seja, talvez uma maior liberdade neste sentido seja saudável neste período. Porém, novamente, é necessário equilíbrio. Se possível, é interessante que esse ajuste seja conversado entre pais e filhos, abrindo espaço para a expressão das emoções e o estreitamento do vínculo. Uma das perdas mais difíceis para todos, inclusive as crianças, é a da rotina, então cair na permissividade é tirar da criança qualquer previsibilidade e sensação de controle sobre seu ambiente, podendo provocar insegurança e aumentar o sofrimento.
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notas do editor É necessário mencionar que, na busca por nossos textos para criação de nossa revista, encontramos matérias super interessantes porém, com datas não próximas. Nossa edição seria uma Galileu sobre crianças de junho de 2022, entretanto, pode acontecer de as datas de algumas matérias não se adequarem. Porém, tendo em vista que estamos criando uma edição fictícia, quisemos manter nossas matérias assim por conta de seu conteúdo muito necessário e ainda assim, atual.
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ANO 1/2022 - 14 DE JUNHO DE 2022