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2ª quinzena de agosto 2020 l JORNAL DO POVÃO
ARTIGOS OIPINIÃO
Das Minas de ouro à pandemia Orlando de Paiva Barros. Filiado à Abrajet (Associação Brasileira de Jornalistas e Escritores de Turismo)
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inas são várias. Desde Belo Horizonte, como o portal de negócios do Estado para receber seus visitantes, até as tradicionais cidades históricas de Mariana, Ouro Preto, Congonhas, São João del-Rei, Tiradentes, Catas Altas e Santa Bárbara, heranças do Brasil-Colônia. Foram construídas no apogeu da exploração do ouro e do diamante, que trouxe riqueza nos séculos XVII e XVIII com as igrejas e monumentos que são hoje o principal vetor de desenvolvimento do turismo mineiro. Mas a riqueza de Minas não fica só nisso. Tem o Circuito do Diamante, com destaque para a cidade de Diamantina, elevada a Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco, e os vários núcleos de ecoturismo. Esse turismo ecológico é mostrado pelas centenas de rios e cachoeiras espalhados por todo o Estado. A Serra do Cipó, a 100 km de Belo Ho-
rizonte, com sua fauna e flora típicas do cerrado mineiro e inúmeras cachoeiras, é considerada hoje o maior destino dos ecoturistas. Na mesma direção, com mais 60 km, em Conceição do Mato Dentro, a Cachoeira do Tabuleiro é a maior de Minas e talvez a maior do Brasil, com 273 metros de queda livre. Seu poço é ideal para mergulho e tem diversas piscinas naturais. O turismo rural, com suas fazendas centenárias e a apetitosa comida mineira, as grutas e cavernas são outros destinos procurados por quem visita Minas. As grutas de Maquiné, Lapinha e Rei do Mato são as mais conhecidas. E não se deve esquecer das estâncias hidrominerais do Estado, onde o lazer é total com as águas minerais de Araxá, Poços de Caldas, São Lourenço, Caxambu, Lambari, Cambuquira, Caldas (Pocinhos do Rio Verde), Pouso Alto e Passa Quatro. Barroco Mas são as obras do barroco, representado pelas cidades históricas e por seus escultores, pintores e arquitetos, o maior destaque do turismo mineiro. O escultor Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, e Manoel da Costa Athayde, o Mestre Athayde, com suas pinturas nas igrejas, são considerados os maiores artistas mineiros de todos os tempos. A Inconfidência Mineira, o movimento de rebeldia contra o domínio português, é um capítulo da História
EDUARDO COSTA
São milhares de turistas, estudantes e professores que vêm a Minas, em qualquer época do ano
pecuária de leite um celeiro de alimentos do Brasil. A implantação de grandes conglomerados industriais, comerciais e de agronegócios traça um novo perfil econômico. Belo Horizonte é a capital que concentra toda essa demanda de negócios. Inaugurada em 1897, hoje a cidade tem uma infra-estrutura hoteleira e de lazer que nada fica a dever a outras capitais brasileiras. Esses eventos representam 16% do PIB do município, com a criação de 200 mil empregos temporários. Em 2014, a rede hoteleira recebeu 1,6 milhão de hóspedes. Em 2001, pesquisa, encomendada pela Embratur e divulgada em 2002 pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo (Fipe/USP), indicou que 3,8 milhões de pessoas visitaram as várias Minas Gerais. Já em 2014, 13 anos depois, o Estado recebeu um fluxo significativo de 24,4 milhões de turistas com uma receita de R$ 17,1 bilhões, conforme estudos do Observatório do Turismo da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo. O turismo mineiro continuou a crescer pelas ações desenvolvidas pelos governos estaduais, principalmente por Aureliano Chaves, que deu início à arrancada em 1979, passou pelos governos Francelino Pereira Tancredo e Aécio Neves. Crescimentos que consolidam a posição de Minas no ranking nacional como um dos destinos mais procurados mas ainda inexpressivo frente aos 6 milhões de pessoas que visitaram, em 2018, somente a cidade gaúcha de Gramado. Este é o cenário de Minas, antes da pandemia, exposto nas feiras, congressos e seminários realizados no Brasil e no Exterior e que, agora, vai precisar de ser transformado e readaptado com a união de governos e da iniciativa privada. Se quiser sobreviver dentro desses novos tempos.
FORMADO EM JORNALISMO PELO UNI-BH, PÓS-GRADUADO EM VALORES HUMANOS PELA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS, MBA EXECUTIVO NA OHIO UNIVERSITY, MESTRE EM CIÊNCIAS SOCIAIS PELA PONTÍFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Benditas câmeras de celular Assistia filme sobre a luta de um homem contra o racismo no Sul dos Estados Unidos do século 19 com minha filha caçula que, a certa altura, indignada, desabafou: “Só queria saber como começou isso, quer dizer, quando foi que alguém decretou ou decidiu que a cor da pele faz a pessoa mais ou menos importante”. Fiquei sem resposta. Fui dormir.
do Brasil, registrado principalmente em Ouro Preto, a antiga Vila Rica, principal cenário das conspirações. São milhares de turistas, estudantes e professores que vêm a Minas, em qualquer época do ano, para ver o palco onde aconteceu o movimento. E o cenário não fica restrito a Ouro Preto. As cidades de Mariana, Congonhas, São João del-Rei e Tiradentes foram locais de intensa conspiração contra os altos impostos cobrados pelo governo português em cima da riqueza maior que era o ouro. Então, não há como separar o barroco dos fatos históricos. Eles caminham juntos e vão continuar juntos para mostrar aos brasileiros de hoje a real importância desses movimentos que começaram e se desenvolveram em Minas com a exploração do ouro e do diamante. Ouro Preto tem o Museu da Inconfidência, antiga prisão dos rebelados, tem as igrejas barrocas com suas imagens esculpidas nos séculos passados. A igreja de São Francisco de Assis é considerada a obra-prima projetada por Aleijadinho e o painel no teto é do Mestre Athayde. Mariana foi a primeira vila surgida com a exploração do ouro. Ali não faltam igrejas e monumentos que lembram a época áurea e a História de Minas. São João del-Rei e Tiradentes não ficam atrás. Em seus casarões e túneis ligados a igrejas, para os rebelados fugirem dos opressores portugueses, ainda há mar-
cas daqueles que conviveram com o movimento separatista. A Casa de Bárbara Heliodora, em São João del-Rei, está fincada no imponente Largo de São Francisco. Foi ela, ‘Bárbara Bela’, que resistiu e fez os outros resistirem às torturas de seus opressores. Na terra de Tancredo Neves, tem ainda as igrejas barrocas de São Francisco de Assis, Nossa Senhora do Carmo, Nossa Senhora do Rosário e a magnífica Catedral de Nossa Senhora do Pilar. Visitas obrigatórias são o Museu de Arte Sacra e o passeio no trem Maria Fumaça, que liga as duas cidades, além de participar da encenação de Lendas Sanjoanenses no Largo do Rosário. No Museu do Padre Toledo, na cidade de Tiradentes, um pouco dos fatos que antecederam à Inconfidência é mostrado solenemente aos turistas. E por aí a história continua até esbarrar na Fazenda do Pombal, em Ritápolis, a 14 km de São João del-Rei, onde nasceu Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, o herói, o mártir de todo esse movimento libertário. Em Congonhas, o santuário da igreja do Senhor Bom Jesus do Matozinhos, com os profetas em pedra-sabão e as imagens em madeira da Via Sacra, esculpidas por Aleijadinho, foi transformado pela Unesco em Patrimônio Mundial da Humanidade. Negócios Mas Minas não vive só do passado. Hoje, o Estado faz de sua agricultura e de sua
De manhã, ao conferir um site de notícias duas das principais manchetes eram sobre o sucesso da cantora Tereza Cristina e a volta da NBA. As frases que ilustravam as reportagens eram “ninguém tolerava menina preta tirar nota boa na escola”, referindo-se à cantora e a lembrança de que um vândalo racista já invadiu a casa do maior astro da famosa liga de basquete
norte-americana e defecou na cama dele. Lembrei-me da inquietação de minha filha e fiquei alguns minutos tentando assimilar por que tem de ser assim, alguém sempre fazendo questão de espezinhar o outro. Por ódio ou doença, sei lá. Lembrei-me então do Pelé, saudoso colega de manhãs na Record que costumava dizer ao estimado Luisão: “Deus deu uma vida prá cada um, prá que cada um cuide da sua”. Mas, as pessoas querem um mundo só para elas e, de preferência, que os outros façam o que mandarem, estejam a seu serviço, silenciosas e obedientes. Será por causa disso que mais e mais pessoas querem ter cães e gatos no lugar de filhos? Ai, inevitável lembrar do desembargador Eduardo Siqueira e seu grotesco espetáculo de Brasil real, no qual quem tem um pouco mais de dinheiro na conta ou diploma na parede se julga superior e no direito de humilhar os outros. Descumpriu um decreto municipal da Prefeitura de Santos, rasgou a multa, jogou os pedaços no chão, humilhou o guarda, ligou para o chefe dele e, depois, em nota, ainda ameaçou res-
Deus é tão bom que nos deu esses aparelhos, através dos quais pessoas arrogantes são flagradas em seus delírios de prepotência
ponsabilizar os que o fizeram “cair numa armadilha”. Ele ainda acha que é vítima. É claro que não vai ter punição nenhuma. É claro que o guarda está machucado para sempre, aliás, a filha dele chorou vendo o vídeo. Deus é tão bom que, sabedor do quanto ainda estamos longe de um país mais justo, mais humano e decente, nos deu as câmeras de celular, através das quais arrogantes como o desembargador são flagrados em seu delírio de prepotência. E, aí, não adianta negar, a vergonha é garantida!