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As Mães de Santa Rita Tudo começou com Ferdinand e sua mãe, Rita, em uma aldeia, às margens do lago Victoria, no Quênia. Ambos morreram de Aids, mas antes da morte de Ferdinand, o menino tinha sugerido que um grupo se unisse para ajudar as crianças que tivessem ficado órfãs por causa da Aids. O grupo se chamaria Mães de Santa Rita, em homenagem à sua mãe. Apesar de serem pobres, as vinte mães de Santa Rita vêm trabalhando arduamente há sete anos, para ajudar as crianças órfãs.

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uando Ferdinad nasceu, já era portador do vírus HIV. Quando os pais morreram, vítimas do HIV/ Aids, a tia Bernadette passou a cuidar dele. Ela tinha prometido à Rita, a mãe de Ferdinand, que cuidaria dele. Ferdinand se mudou para a casa da tia e se Ferdinand

Eles conversavam muito sobre a doença e sobre a sua mãe, Rita. Ferdinand pensava nela com freqüência e, às vezes, ficava muito triste. Ao mesmo tempo, sentia-se tão feliz pelo fato da tia cuidar dele, que passou a chamá-la de mãe. O menino insistia na idéia de que deveriam tentar ajudar outras crianças, cujos pais também houvessem morrido de HIV/Aids. Desta maneira, elas também teriam as mesmas chances de sobrevivência que ele tinha tido.

tornou um membro da família. – Eu queria dar a Ferdinand uma vida tão normal quanto fosse possível. Ele ia à escola e eu o amava como se fosse meu próprio filho. Com o passar dos anos, Ferdinand foi ficando cada vez mais doente. Ele era internado com freqüência e as doses de medicamentos caros aumentavam. – Fui obrigada a vender quase tudo que possuía para mantê-lo vivo. Meu carro, o vídeo, o toca-fitas e até a torradeira elétrica, Bernadette recorda.

Por que as mães de Santa Rita são nomeadas? As 20 mães de Santa Rita são nomeadas ao WCPRC 2005 por sua árdua luta não remunerada, para ajudar crianças cujos pais morreram vítimas do HIV/Aids, nas aldeias da periferia de Kisumu, no Quênia. Sem o apoio que recebem, essas crianças viveriam nas ruas, envolvidas com drogas, criminalidade e prostituição. As mães lutam pelos direitos das crianças órfãs e para que tenham as mesmas possibilidades na vida que todas as crianças. Apesar de viverem, em sua grande maioria, com poucos recursos, as mães fornecem comida, roupas, tratamento médico, escola, um lar, novas famílias e amor a 43 órfãos. Nem o governo, nem qualquer outra organização, oferece qualquer tipo de apoio econômico a elas.

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Rita

SU

D

Ã

O

ETIÓPIA

QUÊNIA

UGANDA

Dunga Nanga Kapuothe

SOMÁLIA

TEXTO: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

NOMEADAS

Kisumu

Lago Victória NAIRÓBI

TANZÂNIA

Oceano Indico

Origem de Santa Rita Bernadette gostou muito da idéia e um dia decidiu contar às amigas. – Cada vez mais crianças eram deixadas sozinhas, quando os pais morriam de Aids, e muitas delas eram obrigadas a abandonar a escola, pois não tinham recursos para continuar. Muitas acabaram nas ruas de Kisumu, por não terem outra


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forma de sobreviver além de pedir esmolas. Como eu e minhas amigas somos todas mães, achávamos horrível ver essas crianças sofrendo. Queríamos ajudá-las de alguma maneira. – Passamos a percorrer as aldeias para conversar com outras mulheres. Enfim, reunimos vinte mães que decidiram ajudar o maior número possível de órfãos. Não tínhamos dinheiro nenhum, mas mesmo assim iniciamos nosso trabalho. Quando Bernadette voltou para casa e contou a novidade, Ferdinand ficou muito feliz. Ele perguntou à tia se ele poderia escolher o

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mos como fazer, já que não tínhamos dinheiro. Algumas de nós começaram a fazer pães e bolos para vender na cidade. Outras vendiam verduras e legumes que plantavam. Depois de um tempo, juntamos dinheiro suficiente para comprar uma vaca. Então, passamos a vender leite também. Em seguida, decidimos que, no primeiro

nome do grupo. E ela prontamente concordou. – Ferdinand queria que o grupo se chamasse Santa Rita, como o nome da mãe, pois assim nos lembraríamos sempre dela. Achei uma idéia muito bonita, e desde então usamos esse nome. Ele queria muito participar e contribuir com as mães de Santa Rita, mas não foi possível. Ferdinand morreu quando estava na sexta série. Todos ajudam Já no primeiro dia, um grupo de órfãos que não tinha comida, roupas, uniforme escolar e nem lugar para morar, formou-se do lado de fora da casa de Bernadette. – A princípio não sabía-

Pede esmolas pelas crianças ”Eu percorro diversos escritórios da cidade, pedindo esmolas e comida para nossas crianças. Peço ajuda a organizações filantrópicas, a autoridades públicas e a pessoas ricas. No início, eu não gostava de pedir esmolas, mas como as crianças precisam de toda ajuda possível, já não me importo mais. Raramente tenho recursos para tomar um táxi ou um ônibus, por isso costumo ir a pé. Também faço bolos, que Seraphine vende no trabalho.”

Vende os bolos de Bernadette ” Eu trabalho como telefonista, na cidade. Na hora do almoço, vendo os bolos que Bernadette faz. Trabalho também na plantação de verduras e legumes de Santa Rita. Uma parte da colheita, vendemos para arrecadar dinheiro para as crianças, outra parte é usada para alimentá-las.”

Vende peixe Mary Okinda

Seraphine Auma

Bernadette Otieno

Trabalha como caixa e doa dinheiro para as crianças Jane Okuto

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Visita as crianças ”Eu percorro as aldeias e visito as crianças que ajudamos. Trato de conversar com elas e de fazer com que se sintam bem. Se elas precisam de alguma coisa, discutimos as demandas nas reuniões, e tentamos ajudar na medida do possível. Eu também sou mãe, por isso me sinto mal ao ver uma criança sofrendo. Às vezes, levo um pouco de comida de casa, mas é comum que eu mesma não tenha o suficiente. Como muitas crianças viveram coisas terríveis, acredito que o mais importante é dar-lhes amor e mostrar a elas que eu me importo. Enfim, dar-lhes esperanças.” Judith Kondiek

TEXTO: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

Ajuda três meninos Lucia Auma Okore

Limpa, lava e faz comida Pamela Achieng

Ordenha Rainbow ” Eu tomo conta da Rainbow, a vaca das mães de Santa Rita. Todas nós, as mães, demos uma pequena quantia em dinheiro para comprá-la. Eu vendo o leite e o dinheiro vai para as crianças órfãs. Se Rainbow tiver uma bezerra, vamos mantê-la para dar leite às crianças. Margret Agalla

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sábado de cada mês, todas as mães doariam no mínimo 200 shillings (US$ 2,68) para ajudar as crianças. Muitas mães são viúvas, desempregadas e precisam cuidar dos próprios filhos. Para elas, 200 shillings é muito dinheiro. Contudo, todas deram o que podiam, e aquelas que não podiam ajudar com dinheiro, ajudavam de outras maneiras. Algumas lavavam as roupas e faziam a comida das crianças. Outras se tornaram mães postiças e permitiram que algumas crianças se mudassem para suas casas. O mais importante para as mães é dar às crianças um lugar onde morar. – Como mães, somos da opinião de que as crianças devem morar em família, não em um orfanato. Queremos que tenham a vida mais normal possível e que se integrem à vida comunitária das aldeias. Sempre tentamos encontrar novas famílias para as crianças que perderam os pais. Porém, a grande maioria das pessoas nas aldeias é

pobre e não tem recursos para cuidar de mais crianças, mesmo com nossa ajuda econômica, diz Bernadette. O direito de toda criança Há sete anos, as mães de Santa Rita têm trabalhado arduamente para dar às crianças órfãs uma vida melhor. Atualmente, 43 crianças recebem comida, roupas, tratamento médico, escola, um lar, novas famílias e amor. – É muito duro, mas não temos escolha. Nós acreditamos que todas as crianças têm o direito de serem amadas. Se não as ajudarmos, elas acabarão nas ruas da cidade, envolvidas com drogas, criminalidade e prostituição. Não poderão ir à escola e, com isso, não terão um futuro melhor. As crianças são da nossa aldeia, por isso somos nós os responsáveis pelo bem estar delas. Se não fizermos nada por elas, quem fará?, pergunta Bernadette.

Doa dinheiro todos os meses

Colhe papiro para vender

Ruth Ocholla

Birgita Were Mbola


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Cuida de três irmãos Mary Awino

Informa sobre a Aids Rose Otieno

Cuida de dois meninos Rose Obondo

As mães não recebem nenhum apoio econômico do governo, nem de qualquer outra organização. – Nós fazemos o melhor que podemos, mas faríamos muito mais se tivéssemos recursos. Gostaríamos, por exemplo, de dar a todas as crianças um almoço de verdade todos os dias, assim elas poderiam ter pelo menos uma refeição nutritiva por dia. Segundo as últimas pesquisas que fizemos, há, atualmente, 1.500 órfãos na nossa comunidade. Se tivéssemos condições, cuidaríamos de todos eles. Sonham com a cura – Nosso maior sonho é que um dia encontrem uma cura para a Aids, para que assim, muitas crianças possam continuar a viver com seus próprios pais. Então, já não pre-

“Se as crianças estão bem, eu estou bem!” Mary Angechi

Dá apoio às crianças Margret Akumu Otieno

cisariam mais de nosso trabalho. Porém, não passa uma semana sem que novas crianças batam em nossas portas pedindo ajuda. Sempre tentamos ajudar, mesmo com poucos recursos. Nunca mandamos uma criança embora. E enquanto houver crianças que precisem de ajuda batendo em nossas portas, continuaremos lutando para que tenham uma vida melhor! São necessárias muitas mães, como as de Santa Rita. Na África, há 43 milhões de crianças órfãs. 12 milhões delas perderam os pais vítimas do HIV/Aids. O Quênia é um dos países mais atingidos. Acredita-se que lá, há 1,3 milhões de crianças órfãs do HIV/Aids. A região mais atingida está no oeste do Quênia, ao redor do grande lago Victoria, onde a aldeia Dunga está situada.

Faz pães e conversa com as crianças

Cuida de cinco crianças Jerusa Ade Yogo

Brinca e conversa com as crianças Rose Adhiambo

Faz pães e bolos

Martha Adhiambo

”Eu faço pães e bolos para vender na cidade. O lucro vai para nossas crianças órfãs. Eu sempre levo pães e bolos para as crianças também.” Roselyn Ogolla

Cuida de uma menina Ruth Akinyiluya

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Vi har fått hjälp av S:t Mamãe contava histórias “Eu era tão pequeno quando meu pai morreu que quase não me lembro dele. Mas me lembro nitidamente da mamãe, pois quando ela morreu, eu tinha dez anos. Ela tecia tapetes de papiro e os vendia. Enquanto trabalhava, contava histórias pra mim e meus irmãos. Nós ríamos muito e eu sinto muitas saudades daqueles momentos. Penso muito nas difículdades por que passamos e às vezes fico doente de tanto pensar e me preocupar. O pior é quando estou sozinho. Todos os pensamentos vêm à tona e fico triste. Se pudesse dizer alguma coisa à minha mãe, diria que gostaria que ela estivesse aqui, assim poderíamos conversar um pouco. Então, eu lhe diria que a amo e que sinto falta dela.” ERICK ODHIAMBO, 14

Futebol com papai “Mamãe morreu quando eu tinha 11 anos e papai, quando eu tinha 12. Quando mamãe estava viva íamos ao mercado juntos. Eu queria ajudar e sempre carregava a cesta de tomates, cebolas e outras verduras que ela comprava. Papai me levava aos jogos de futebol na cidade quase todos os sábados. Esses foram os melhores momentos da minha vida. Minha melhor recordação foi o dia em que meu time favorito, o Gor Mayia, ganhou do Telecom por 2 a 1. Papai tinha uma bicicleta e me levava na garupa até a cidade todas as vezes que havia jogo. Eu nunca mais fui a um jogo desde que meu pai morreu. Não tenho nem bicicleta nem dinheiro para tomar ônibus ou táxibicicleta até o estádio. Tomar um táxi-bicicleta até a cidade custa 25 shillings quenianos (US$ 0,30). É caro demais para mim. Eu ganhei esta blusa do papai. É a única lembrança que tenho dele. Quando estou com ela penso nele.” DENNIS OTIENO, 14

Papai comprava chocolate

“Meu pai morreu quando eu tinha dez anos e estava na quarta-série. Mamãe morreu quando eu ia começar a quinta-série. Quando eles estavam vivos costumávamos ir à cidade nos fins de semana. Papai sempre comprava chocolates. Eu adorava! Às vezes ele até comprava um vestido ou umas calças jeans para mim. Íamos ao restaurante comer carne e beber refrigerante. Eu era tão feliz! Tomávamos um táxi-bicicleta ou um ônibus da nossa aldeia para a cidade. Hoje em dia, se tenho que ir à cidade, sou obrigada a andar, pois o ônibus é muito caro. São mais de quatro horas de caminhada, ida e volta. Eu tenho algumas peças de roupa da mamãe de recordação. Olho para as roupas e me lembro dela. Sinto mais falta da mamãe e do papai quando alguém é rude comigo. Se eu pudesse falar com a mamãe, diria que voltasse para tomar conta de mim. Então, minha vida seria muito mais fácil e feliz do que é agora.” WINNIE ANYANGO, 13

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Ritas mammor Mamãe, como é o céu? Sem ajuda com as lições

Rita me ajudam a comprar o uniforme escolar e os livros, assim posso ir à escola, e que também me dão comida sempre que preciso.” WINNIE AWINO, 9

“ Mamãe morreu quando eu era pequena, por isso não me lembro bem dela. Já o papai, morreu no ano passado e tenho muitas saudades dele. Adorava estudar com o papai. Ele me ajudava com os deveres, especialmente de matemática. Era muito bom para explicar coisas complicadas de uma forma que eu entendesse. Agora, ninguém me ajuda, por isso tenho dificuldade em acompanhar as aulas e fico atrasada em relação aos meus colegas. Não tenho nenhum objeto de recordação dos meus pais, o que é uma pena. Adoraria ter alguma lembrança, mas a mulher do papai levou tudo que era dele. A mesa, as cadeiras, as ferramentas, tudo...” MARITHA AWUOR, 13

Papai era meu melhor amigo “Papai morreu quando eu tinha nove anos, mas às vezes ainda choro quando vejo sua fotografia. Tenho muitas saudades dele. Juntos, nós plantávamos milho, cana-de-acúcar e outros vegetais. Conversávamos muito enquanto trabalhávamos. Se eu tinha algum problema na escola, sempre podia contar para ele e logo me sentia melhor. Depois de trabalhar na plantação costumávamos ir até o lago nadar. Era super divertido! Eu tenho tantas saudades. Papai era meu melhor amigo. Minha mãe está viva, mas está quase sempre doente. Tenho muito medo de que ela também morra e eu e meus irmãos fiquemos sozinhos no mundo...” VICTOR OTIENO, 14

TEXTO: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

“Papai morreu antes de eu nascer e mamãe, quando eu tinha quatro anos. Já faz tanto tempo, que se não houvesse uma fotografia não me lembraria de como ela era. A foto é da minha tia, mas eu posso olhá-la de vez em quando. Eu e minha mãe somos muito parecidas e me sinto bem com isso, pois ela era muito bonita. Mamãe deixou alguns vestidos dela para mim. Não vejo a hora de poder usá-los. Gosto de ter alguma coisa que tenha sido da minha mãe, mas ao mesmo tempo acho triste. Eu acredito que a mamãe esteja bem lá no céu. Tento falar com ela quando eu rezo e sonho com o dia em que nós vamos nos encontrar novamente. O primeiro que eu vou dizer é “Jambo!” (Oi). Depois vou perguntar como ela está. Também vou lhe contar que sinto muitas saudades dela, mas que apesar de tudo vivo bastante bem. Vou lhe contar que as mães em Santa


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Steven é chamado de lixo pelos adultos Há três anos, os pais de Steven morreram deixando-o sozinho. Desde então ele vive nas ruas de Kisumu. Alguns adultos o chamam de “lixo”. Muitas crianças órfãs, que não têm a ajuda das mães de Santa Rita, vivem como Steven.

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á passam das nove horas da noite em Kisumu e Steven, 12 anos, caminha para o terreno baldio atrás de um supermercado. Todas as noites ele faz o mesmo. Enquanto caminha, come apressadamente o pão 18

que encontrou. Se os outros garotos de rua descobrem que ele tem comida pode acabar tendo problemas. Todos estão famintos e é comum haver briga pela pouca comida que encontram. Quando Steven chega já

encontra alguns amigos. Eles procuram caixas velhas, sacos plásticos e outras coisas que possam ser usados numa fogueira. A maioria deles cheirou cola ou fumou maconha e vagam pela escuridão, entorpecidos. A forte chuva que caiu à tarde faz com que o mau cheiro tome conta do lugar quando o lixo é revirado. A umidade faz com que o fogo demore a queimar. A alguns metros da foguei-

ra, vêem-se os ônibus noturnos que vão para a capital Nairobi. Os viajantes olham de cima para Steven e os outros meninos esfarrapados. Alguns apontam e riem. Mas Steven já está acostumado. – Muita gente nos chama de ”chokora”, que quer dizer “lixo”. Isso me dá uma raiva! Como alguém pode chamar um outro ser humano de lixo? Às vezes eu choro quando alguém grita “cho-


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TEXTO: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

– Às vezes, quando pergunto a algum adulto se pode me dar comida, ele diz assim: “O que você está fazendo na rua?” Volte para casa dos seus pais.”Então eu fico muito triste, porque os meus pais já não existem mais. Mas, às vezes eu respondo:“Tudo bem, se você não quiser me ver nas ruas, então me leva pra sua casa e me ajuda”. Mas ninguém nunca quis me ajudar.

meninos de rua. Durante o dia, pedia esmolas e comida na porta dos restaurantes e hotéis. De vez em quando tinha sorte, mas na maioria das vezes vagava pelas ruas triste e faminto. Passou a cheirar cola para se esquecer de tudo. Agora, três anos depois, ele ainda vive nas ruas e não tem idéia de como mudar sua situação. A única certeza que tem é de que a vida nas ruas não é boa para uma criança.

kora” para mim. Eles não têm a mínima idéia de o que me obrigou a viver assim, diz Steven. Mamãe e papai morreram Quando Steven tinha nove anos, sua vida se transformou radicalmente. – Minha família era pobre, mas nós tínhamos pelo menos comida e meus pais cuidavam de mim. Mas um dia meus pais ficaram doentes. Foram emagrecendo mais e mais até que minha mãe morreu. Logo depois morreu o papai também. De repente, fiquei sozinho e nin-

guém na aldeia podia tomar conta de mim. Um dia, Steven conseguiu roubar 100 shillings (US$ 1,34) de um vizinho que tinha sido mau com ele. Com o dinheiro, ele fugiu para Kisumu. – Eu sabia que havia escolas e trabalho e tudo mais que se pode imaginar na cidade, então achei que minha vida melhoraria assim que eu chegasse lá. Já na primeira noite Steven percebeu que as coisas não eram tão fáceis como tinha imaginado. Ele foi obrigado a dormir na rua com outros

Crianças desaparecem – É um perigo. Uma vez um grupo de meninos de rua mais velhos achou que eu tinha dinheiro escondido. Não era verdade, mas eles me bateram de qualquer jeito. Alguns deles tinham uns facões e disseram que me matariam se eu não entregasse o dinheiro. Fiquei apavorado, pois sei que alguns meninos são mortos e desaparecem de repente. Eu não queria morrer. De alguma maneira consegui me livrar e comecei a correr como um louco. A turma toda corria atrás de mim e eu caí várias vezes no asfalto, esfolando as mãos e as pernas. Por fim não agüentei mais me levantar. Escutei quando eles se aproximavam de mim e achei que estava perdido. Mas tive sorte, quando eles viram todo aquele sangue escorren-

do, me deixaram em paz. Os meninos mais velhos não são o único perigo. Os adultos também batem nas crianças de rua. – Todas as vezes que alguma coisa acontece na cidade, nós levamos a culpa. Há quatro noites, um grupo de policiais veio até aqui e começou a nos bater. Disseram que um homem tinha sido esfaqueado e que nós éramos os culpados. Eu consegui fugir, mas outros dez meninos foram presos. Não temos a mínima idéia do que aconteceu com eles. Acho que a polícia está errada. Eles deviam cuidar de nós ao invés de nos maltratar. Aliás, algum adulto devia

Steven Omondi, 12 Mora: Nas ruas de Kisumu. Adora: Jogar futebol. Odeia: Roubar. O melhor que lhe aconteceu: Quando ganhei um presente de natal. Deseja: Trabalhar em um escritório. Sonha: Em ir à escola e aprender a ler.

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Edward mora debaixo de um banco Edward cuidou da mãe e do pai sozinho. Quando morreram, ninguém na aldeia quis tomar conta do garoto. – Eu já não me sentia bem-vindo na aldeia. Agora moro debaixo de um banco na estação rodoviária.

Q TEXTO: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

uando eu era pequeno, ia à escola e brincava com meus amigos. Mas quando eu tinha nove anos, papai e mamãe ficaram doentes e fracos. Então, a minha vida mudou. Eu acordava às cinco da manhã e ia fazer fogo, buscava água no rio e voltava correndo para preparar o mingau. Quando a comida estava pronta, ajudava meus pais a saírem para o quintal e depois, tomávamos o café da manhã juntos. Eles sentiam muito frio, por isso era importante que ficassem ao sol. Meus pais quase nunca chegavam ao banheiro a tempo e eu era obrigado a lavar as roupas e os lençóis deles, todos os dias. Eu também lhes dava

cuidar de nós de qualquer maneira, assim poderíamos morar em uma casa de verdade e ir à escola como qualquer criança. Então não precisaríamos pedir esmolas e nem roubar para sobreviver. Odeia roubar Já é tarde e o fogo quase se apagou. Os meninos se dividem em diferentes grupos, que desaparecem na escuridão da noite. Cada um tem seu lugar especial, no qual 20

banho. Depois preparava o almoço. Ninguém na aldeia me ajudava, por isso fui obrigado a abandonar a escola.” Só queria desaparecer Eu chorava muito, mas meus pais me consolavam e diziam que tudo acabaria bem. Eu e papai dormíamos na mesma cama. Em uma manhã quando acordei, ele estava paralisado e não emitia nenhum som. Estava morto. Fiquei apavorado e, chorando muito, saí correndo. Uma semana depois, minha mãe não me chamou como costumava fazer de manhã. Eu lhe disse baixinho: ”Mamãe, mamãe”, mas ela não respondeu. Seu coração tinha parado de bater. Corri para a floresta chorando e, quando cheguei a um rio, tive vontade de pular e desaparecer para sempre. Fiquei parado por muito tempo pensando se ia ou não me matar. Decidi não pular. Queria pelo menos enterrar minha mãe e meu pai primeiro. Ninguém me ajudou Aqui, quando uma criança

costuma dormir. Steven desaparece com alguns de seus amigos. Eles dormem em grupo para se protegerem uns aos outros. – Às vezes, durante a noite, os meninos maiores abusam sexualmente de algum de nós, menores. Vivemos sempre com medo, mas até agora eu tive sorte. Steven se cobre com um saco fino de pano e se deita na calçada. Ele sabe que se não conseguir que alguém

perde os pais deve raspar a cabeça. A segunda mulher do meu pai deveria ter raspado a minha, mas se recusou. Ao invés disso, ela me deu dez shillings (US$ 0,13) para eu ir ao cabeleireiro. Eu me senti muito mal por não ter seguido nossos costumes. Acho que ela estava com medo de que eu também estivesse doente e fosse contagiá-la. Muitos na aldeia desconfiavam que meus pais tivessem morrido de Aids. Acho que todos estavam com medo, porque ninguém veio nos visitar quando eles estavam doentes, e ninguém quis me ajudar quando fiquei sozinho. Então, eu decidi tentar sobreviver nas ruas da cidade. Mas não gosto de viver assim. Há muita violência e drogas e estou sempre com fome. E também não posso ir à escola. Tenho muitas saudades do papai e da mamãe e estou sempre triste. Meu maior desejo é ser aceito na minha aldeia e poder voltar para casa e para a escola. Mas acho que eles ainda têm medo de mim e que ninguém vai me ajudar.”

lhe dê comida amanhã, vai ter que roubar um abacate ou outra fruta qualquer na feira. Ele odeia roubar, mas ficar com fome é ainda pior. Steven não gosta da vida que leva. Ele gostaria muito que tudo fosse diferente. Que o pai e a mãe estivessem vivos, e que ele pudesse ir à escola. Finalmente, Steven adormece. Em seu sonho, ele terminou a escola e conseguiu emprego em um escritório. Ele trabalha duro e economi-

za quase todo o salário. Um dia já tem dinheiro suficiente para comprar sua própria casa. Uma casa pequena, mas toda dele. – Sai da frente, Chokora! Você está no meu caminho! Steven acorda assustado e olha para cima. A mulher que gritou com ele já passou apressada. Ele volta a se encolher contra a parede o máximo que pode e tenta retornar ao mundo dos sonhos.


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Edward Odhiambo, 12 Mora: Nas ruas de Kisumu. Adora: Ler. Odeia: A morte. Tem medo: Dos meninos de rua mais velhos e da polícia. Quer ser: Motorista de ônibus Sonha: Em morar em uma casa.

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O que é HIV/Aids? O HIV é um vírus que destrói as defesas do corpo humano. Com o sistema imunológico destruído, se torna mais fácil contrair infecções e ficar doente. O HIV pode enfraquecer o sistema imunológico a tal ponto que a infecção acaba se transformando em Aids. Como o HIV/ Aids é transmitido? O HIV é transmitido, principalmente, através do leite materno, do sêmen e do sangue. A transmissão ocorre quando os fluídos corporais de um portador do HIV entram em contato com a mucosa ou com alguma ferida aberta de outra pessoa. A contaminação é mais comum nos seguintes casos: Relações sexuais (a melhor proteção é o uso de camisinha), transfusões de sangue (se o sangue do doador estiver contaminado com o HIV), nos partos e na amamentação (se a mãe estiver contaminada o risco de contaminação do bebê é grande). O HIV não é transmitido através de abraços ou de apertos de mão. Talheres, comida ou bebida também não transmitem o vírus. Do mesmo modo, a transmissão não ocorre se alguém tomar banho na mesma piscina ou usar o mesmo banheiro que uma pessoa contaminada. Há algum remédio contra HIV/Aids? Não há cura para o HIV/Aids. A maioria daqueles que sofre da Aids morre da

doença. Contudo, há remédios que permitem ao paciente viver com o HIV. Nos países ricos, muitas pessoas fazem o tratamento contra o HIV. Porém, a maior parte das pessoas contaminadas, vive em países pobres. No Quênia, há dois milhões e duzentas pessoas portadoras do vírus HIV/Aids, dentre as quais apenas entre 10 e 15 mil pacientes têm condições de comprar os remédios para o tratamento. Para que pobres e ricos tenham as mesmas chances de sobreviver, é preciso que os medicamentos sejam mais baratos. Se uma mulher grávida, portadora de HIV, tomar esses medicamentos pouco antes do parto, as chances de o bebê nascer sadio se duplicarão.

Aids faz muitas vítimas Mortos por Aids: Adultos: 21,8 milhões Crianças: 4,3 milhões Portadores do HIV/Aids: No mundo: 38 milhões África subsaariana: 25 milhões Ásia: 7,4 milhões América Latina: 1,6 milhão Europa Oriental: 1,3 milhão América do Norte: 1 milhão Europa Ocidental: 580 mil Demais países: 1,1 milhão Quantas pessoas são contaminadas? No mundo: 15 mil pessoas por dia.

Órfãos da Aids: No mundo: 15 milhões de crianças África subsaariana: 12,3 milhões de crianças Demais países: 2,7 milhões de crianças Estima-se que 25 milhões de crianças ficarão órfãs em conseqüência da Aids até 2010. Quênia gravemente afetado: Total de pessoas infectadas: 2,2 milhões Total de crianças infectadas: 220 mil Mortos por Aids: 1,5 milhão Crianças órfãs em conseqüência da Aids: 1,3 milhão de crianças

Crianças com HIV/Aids: No mundo: 2,7 milhões África subsaariana: 2,4 milhões Demais países: 300 mil

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Steven foi salvo pela – Adoro a escola e se eu for um bom aluno, talvez possa ser médico quando crescer. Eu tenho muita sorte por poder contar com as mães de Santa Rita que me ajudam a ir à escola. Muitas crianças órfãs acabam nas ruas e não têm para onde ir.

– Se as mães de Santa Rita não tivessem me ajudado eu estaria nas ruas e nunca teria tido a chance de ir à escola, conta Steven, 12 anos. Ele, o irmão mais velho Martin e a cadela Rainbow são agora uma pequena família, que recebe a ajuda das mães.

S TEXT0: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

teven tenta dormir no seu quarto em Santa Rita, mas não consegue. Ele se revira na cama enquanto pensa na ocasião em que ele e o irmão se aproximaram da casa da família, na aldeia onde viviam. Sentada do lado de fora, a primeira mulher do pai deles estava bêbada, como de costume. Ela tinha desaparecido havia muitos anos, mas voltou quando o pai e a mãe morreram. Os dois sabiam que ela não era uma boa pessoa. Já os tinha expulsado de casa várias vezes, e na verdade, Steven e Martin não estavam com a mínima vontade 22

de lhe pedir para voltar, mas não tinham escolha. Os dois moraram com um tio por um tempo. Mas, um dia, ele lhes disse que era pobre demais para criar mais duas crianças. Provavelmente, o tio tinha medo de ser contagiado, pois Steven e o irmão não podiam usar os mesmos talheres que o resto da família. Por isso, ali estavam eles outra vez, diante da mulher, que ficou furiosa quando os viu. – Sumam daqui! Não quero vê-los nunca mais, escutaram?, gritava enquanto atirava pedras nos meninos. Martin conseguiu fugir a

tempo, mas o pequeno Steven, que não era tão rápido, foi atingido na perna e caiu no chão. Quando tocou na perna, notou que tinha as mãos sujas de sangue. Ele nunca vai se esquecer de como se sentiu quando todos os adultos lhe viraram as costas e ninguém quis ajudá-lo. Todo dia é de pesca Na manhã seguinte, o sol brilha e Steven se sente melhor. Como é sábado, ele reúne seu material de pesca depois do café da manhã. Em seguida, caminha até o lago Vitória com Martin. Logo atrás deles, vem a cadela Rainbow, que o segue por toda parte. Na praia, algumas mulheres fazem a limpeza do pescado. Como de costume, Steven e Rainbow estão prontos e se põem a pescar

– Fico sempre feliz em ver o Martin. Todos os outros da nossa família já morreram, por isso ele é muito importante para mim. Quando o vejo, sei que não estou sozinho

nas águas turvas. De vez em quando, o menino se abaixa para pegar algum resto de peixe deixado pelas mulheres. Ele os usa como isca. Steven afasta-se um pouco para colocar a isca no anzol e depois atira a linha. De repente, sente um puxão: um peixe ”Opato” mordeu a isca. Em seguida, outro peixe.


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las mães Steven Odhiambo, 12 Mora: Em Santa Rita, em Dunga. Adora: A escola. Odeia: Que algumas crianças não possam ir à escola.

O pior que lhe aconteceu: A morte de meus pais. Admira: As mães de Santa Rita. Gosta: De jogar futebol. Quer ser: Médico. Sonho: Que todas as crianças tenham pais.

Rainbow balança a cauda, pois também gosta de peixe. Steven e Martin espetam os peixes em um graveto e colocam-nos na água para que não se estraguem no calor. – Pescamos todos os sábados e também aos domingos, depois da missa. E depois da escola também, antes de fazer os deveres de casa. Não porque seja divertido, mas porque precisamos, diz Steven. Houve um tempo em que os meninos nunca precisavam procurar comida, pois a mãe e o pai cuidavam deles. Mas parece que isso foi há muito tempo, como se tivesse ocorrido em uma outra vida. Papai morreu só – Mamãe morreu quando eu tinha dois anos e minha irmã mais velha, quando eu tinha sete. Depois disso a segunda esposa do papai passou a tomar conta de nós, mas aca-

bou morrendo um ano depois da minha irmã. Só sobramos eu, o Martin e o papai. Um ano depois, o papai também morreu, conta Steven, enquanto olha fixamente para o chão. – Eu me lembro da noite em que o papai morreu. Ele estava doente há muito tempo e, justamente naquela noite, nos deu dinheiro para irmos assistir a um filme numa casa de vídeos. Quando chegamos em casa papai estava morto. Acho que ele sentiu que estava morrendo e não queria que nós o víssemos sofrer. Mas eu preferiria ter ficado ao seu lado naquele momento do que ter visto um vídeo. Acho horrível que tenha morrido sozinho. Salvos pelo Santa Rita De repente, Steven e Martin ficaram totalmente sozinhos.

Nenhum parente quis tomar conta deles. Os dois meninos não sabiam o que fazer ou como se sustentar. Steven se lembrou que tinha escutado falar de um lugar chamado Santa Rita, onde algumas mães cuidavam de crianças órfãs. – Parecia que aquela era a nossa última chance. Quando chegamos aqui, as mães de Santa Rita nos receberam e disseram que poderiam nos ajudar. Contaram que não tinham muito din-

heiro, mas que fariam o melhor possível. Elas nos deram um quarto pequeno e voltamos a freqüentar a escola. Desde então, moramos aqui em Santa Rita. A mães compram nossos uniformes escolares, e se ficamos doentes, compram os remédios ou nos levam ao médico. Elas nos ajudam em tudo, mas o dinheiro não é suficiente para a comida. Nas aldeias, há muitas crianças que precisam da ajuda delas. Por isso, pescamos muito. Mas isso não me incomoda. Se elas não tivessem nos ajudado, estaríamos nas ruas e nunca teríamos a chance de ir à escola outra vez. E o mais importante é que elas nos dão amor e se preocupam conosco. Somos uma família Depois de pescarem quatro peixes “Opaco” e um peixe 23


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Adultos decepcionam, mas Rainbow não – Encontrei a Rainbow, um dia, quando caminhava. Ela era ainda um filhotinho. Desde então, ela me segue por toda parte: quando vou pescar, nadar ou jogar bola. Até para a escola ela quer ir junto! À noite, ela faz guarda do lado de fora da casa e eu me sinto mais seguro. Eu a adoro. Brincando com a Rainbow consigo me esquecer de muitas coisas ruins que me aconteceram.

“Fulu”, Steven e Martin ficam satisfeitos e resolvem voltar para casa. Ao chegarem, acendem o fogo e

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começam a preparar o jantar: sopa de peixe e “ugali”(mingau de milho). Steven vai até a roça, que as mães lhes aju-

daram a plantar, e colhe algumas verduras. Lambendo o focinho, Rainbow olha para Steven, enquanto ele mexe a comida no fogo. Ela está com fome. – Agora, eu, Martin e Rainbow somos uma família, por isso sempre cozinhamos para três. Rainbow adora peixe com ugali! Depois do jantar, os meninos lavam os pratos, varrem a casa, regam a plantação e depois estudam. Quando a noite cai, Steven e Martin costumam se sentar do lado de fora para conversar um pouco. Eles falam sobre tudo, mas principalmente sobre os pais, para não se esquecerem deles. Rainbow está deitada aos pés de Steven, ela adora quando ele a acaricia das orelhas. Enquanto conversam, chega

Bernadette, uma das mães de Santa Rita. Como quase todas as noites, ela se senta por alguns instantes. – Vocês estão bem? Precisam de alguma coisa? – Tudo bem, mamãe, respondem os meninos ao mesmo tempo. – Vocês comeram? – Comemos, sim. – Então, boa noite. – Boa noite, até amanhã.

No quarto à direita moram Steven e Martin.


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Bem-vindos ao Prêmio das Crianças do Mundo pelos Direitos da Criança! Waruakou e nyasi makwako piny ngima mar chiwo mich ne nyithindo e bwo tipo moyiedho kendo mogeno migap nyathi edongruok mar ngima nyathi! Em luo

Karibuni kwa ulimwengu wa zawadi za watoto Kuhusu haki za watoto!

Conte até dez em luo e swahili! No Quênia, há mais de 40 etnias e línguas. A língua oficial é o swahili, mas as crianças sobre as quais você leu fazem parte da etnia luo e falam a língua luo. Aprenda a contar até dez em luo e swahili.

Em swahili 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10.

Qual é o seu nome em luo? A maioria das crianças que mora em aldeias nos arredores de Kisumu, no oeste do Quênia, faz parte da etnia luo. Elas sempre recebem um segundo nome, que lhes revela quando nasceram. Se você souber a que horas nasceu, poderá olhar na lista abaixo que nome você receberia se nascesse em uma aldeia luo! QUANDO NASCEU?

MENINA

MENINO

De manhã cedo

Amondi

Omondi

Antes do meio-dia

Anyango

Onyango

À noite

Adhiambo

Odhiambo

De madrugada

Atieno

Otieno

Quando o sol está mais quente

Achieng

Ochieng

Quando chove

Akoth

Okoth

Se nasceram gêmeos

Apiyo (nr 1) Adongo (nr 2)

Opiyo (nr 1) Odongo (nr 2)

SWAHILI Moja Mbili Tatu Nne Tano Sita Saba Nane Tisa Kumi

Escute as crianças contarem em luo e swahili em www.childrensworld.org

Dennis, da aldeia Nanga, no Quênia, propõe uma adivinhação: “O que é, o que é, uma casa que não tem portas nem janelas?”

Escute a adivinhação de Dennis em www.childrensworld.org

Resposta: Um ovo!

Escute as crianças darem boas vindas ao WCPRC em luo e swahili em www.childrensworld.org

LUO Achiel Ariyo Adek Ang’wen Abich Auchiel Abiryo Aboro Ochiko Apar

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Washington é castigado por não ter sapatos – Eu acho que a escola é o mais importante que há para uma criança, e tanto ricos como pobres, têm o direito de aprender. Mas, no Quênia, há regras que dificultam a vida das crianças mais pobres. Somos castigados e mandados para casa, conta Washington Osonde, 14 anos. Ele é um dos órfãos ajudados pelas mães de Santa Rita.

TEXTO: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

Washington Osonde, 14 Adora: A escola. Odeia: Que a vida seja tão difícil.

A pior coisa que lhe aconteceu: Quando mamãe morreu. A melhor coisa que lhe aconteceu: A ajuda das mães de Santa Rita. Gosta: De jogar futebol e escrever poemas. Quer ser: Piloto. Sonha: Que todas as crianças tivessem pais.

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Na segunda-feira começam as aulas outra vez e isso, para mim, é uma eterna fonte de preocupação. Na verdade, eu deveria achar muito divertido, pois adoro ir à escola. Porém, como sou pobre, sei que vou ter problemas. No Quênia, a escola é gratuita, mas temos que comprar uniforme, sapatos, pasta, canetas, lápis e livros. Meu uniforme já está gasto e uso sandálias em vez de sapatos. Como não tenho condições de comprar uma pasta nova, levo os livros em uma sacola plástica. As mães de Santa Rita já pediram ao diretor, que desse a todos os órfãos um pouco mais de tempo para conseguir o dinheiro necessário para a compra de novos uniformes. Todos os semestres elas fazem esse pedido, e eu sei que fazem o melhor que podem. Contudo, somos muitos os que necessitamos de ajuda. Se não conseguirmos uniformes novos, os

– Eu não acho que o mais importante na escola seja o uniforme, as pastas e os sapatos. O principal é poder aprender coisas, diz Washington.

professores nos expulsarão das salas de aula e depois, se voltarmos sem o uniforme completo, seremos punidos fisicamente. Uma vez, aos dez anos, eu e mais seis colegas fomos obrigados a nos deitar no chão e os professores nos bateram com varas de bambu diante de toda a classe, só porque não tínhamos o uniforme completo. Foi terrível.

No mesmo ano, fui mandado para casa um pouco antes de terminar a terceira série por não ter sapatos apropriados. A professora brigou comigo diante de toda a classe. Senti-me ridicularizado e comecei a chorar. Gostaria de ter dito a ela que achava o tratamento injusto e que não era minha culpa não ter sapatos novos, mas não tive coragem. Ela estava possessa. Duas semanas depois, quando voltei, estava atrasado em todas as matérias e tive que repetir a terceira série inteira. Este ano houve uma competição na escola, em que devíamos escrever um poema sobre nós mesmos. Escrevi sobre todos os problemas que nós, as crianças pobres, enfrentamos na escola. Recitei-o para todos os alunos e professores. Todos me aplaudiram muito, até os professores, o que me fez sentir muito orgulho. Por algum tempo pensei que tudo mudaria, já que todos aplaudiram tanto. Mas nada aconteceu. Desde então, já fui mandado de volta para casa três vezes por não ter meias nem sapatos. Atualmente, tenho muito medo de não poder completar meus estudos e me formar. Quero ser piloto quando crescer, mas se não completar os estudos nunca poderei ser piloto e ter uma vida feliz.”

Quanto custa o uniforme? Blusa: 650 shillings Camisa: 250 shillings Bermudas: 250 shillings Meias: 35 shillings Sapatos: 800 shillings Pasta: 300 shillings ------------------------------------Total: 2285 shillings (US$30,47)


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Escute o poema de Washington em www.childrensworld.org

Dorothy trabalha entre

Será que passarei de ano?

pítons e crocodilos

De manhã bem cedo Tiro o pó da minha bolsa. Visto meu uniforme surrado, E com um grande bocejo Para a escola eu vou. De estômago vazio Percorro dez quilômetros. Chego tarde como sempre. O professor cruel me aguarda: – Por que tão tarde!?, ele grita. Começo a suar e a tremer, Mas ele não tem pena de mim. Sem uniforme, Matrícula atrasada, O diretor me manda para casa. Duas semanas depois volto à escola, A classe já está mais adiantada.

As mães de Santa Rita tentam ajudar As mães de Santa Rita ajudam, atualmente, 43 órfãos a freqüentarem a escola. Porém, elas têm grandes dificuldades em comprar todo o material escolar. Recentemente, elas fizeram uma manifestação em Kisumu pelo direito das crianças órfãs a irem à escola. Washington também estava lá: – Vários adultos da cidade prometeram ajudar, mas até agora não vimos dinheiro nenhum. Acho isso muito triste!

– Eu sei que os animais selvagens são perigosos, mas não costumo me preocupar com isso. O que realmente me apavora é que minha mãe esteja tão doente, diz Dorothy Awuor.

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orothy e sua mãe Rose penetram cada vez mais no lago Victoria. Cada uma leva um facão “panga” à mão para colher papiros. Para conseguirem os melhores papiros, elas têm que se afastar muito da margem e contornar o cabo. A água já chega até quase aos ombros de Dorothy. Só então ela começa a penetrar por entre a densa trama de cipós, com golpes de facão. A lama escorre por entre os dedos dos pés, quando ela pisa no fundo lodoso. – É repugnante, pois nunca sei em que estou pisando. Há peixes venenosos escondidos no lodo, que

podem me morder a qualquer momento! Dorothy abre picadas com o facão no bosque de papiro. Lá dentro, há mais perigos à sua espera. – Há pítons, crocodilos e hipopótamos. Se eles se sentem ameaçados, atacam. Os hipopótamos com filhotes são os mais perigosos. Se eles acharem que os filhotes estão em perigo, atacam diretamente. Se um hipopótamo atacar, não há a mínima chance, ele o mata em segundos. – Uma vez, encontrei um píton enorme bem em cima de uma pilha de papiros que eu ia carregar para casa. Saí correndo e gri-

tando, apavorada. Mas parece que a cobra ficou tão assustada quanto eu, pois saiu arrastando-se rapidamente na outra direção! A pior doença Dorothy e Rose juntam o papiro que colheram em grandes pilhas. Os papiros serão usados para tecer tapetes, que depois serão postos à venda. Já é meio-dia e faz mais de 30 graus à sombra. Gotas de suor escorrem pela testa de Dorothy. De repente, a menina se corta no papiro afiado e o sangue brota das pontas dos dedos. O trabalho é duro, mas a família não tem outro meio de sobreviver. Dorothy ajuda a mãe todos os fins de semana e nas


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Dorothy Awuor, 14 Mora: Na aldeia Kapuothe. Adora: Ler. Odeia: Que a mãe esteja doente.

Tem medo: De que a mãe morra. Gosta: De jogar futebol e escutar música.

Quer ser: Presidente. Sonho: Que todas as crianças do mundo tivessem pais.

Uma mãe de Santa Rita Rose não é apenas a mãe de Dorothy, ela também é uma das mães de Santa Rita. – Sou pobre demais para doar dinheiro, mas costumo falar sobre a Aids nas aldeias. Às vezes conto sobre minha própria vida e sobre como é viver com a Aids, mas nem sempre. Há muita gente aqui que tem medo da Aids, e por isso tenho que ser cuidadosa. Não tenho medo de que alguma coisa aconteça comigo, mas penso nos meus filhos. De repente pode acontecer que ninguém queira brincar com eles ou que o povo da aldeia nos marginalize, o que, por sinal, está muito errado. Por isso é tão importante dar informações sobre a Aids às pessoas. Poder explicar-lhes que tanto eu, que tenho Aids, como meus filhos precisamos de amor e carinho.

Mães se ajudam Rose e outra mãe de Santa Rita, que também se chama Rose, ajudam-se na tecelagem dos tapetes de papiro. É preciso que o papiro tenha estado secando por no mínimo três dias antes de se começar a tecer os tapetes. Em um dia de sorte, elas podem vender um tapete por até 30 shillings (US$ 0,40)

Conselhos de Dorothy! Se você for perseguido por um hipopótamo: – Corra em ziguezague. Se você corre em linha reta ele o alcança e o mata em segundos!

➼ TEXTO: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

férias trabalha todos os dias. Como o trabalho é perigoso é melhor estar acompanhada. Mas, atualmente, ela trabalha quase sempre sozinha. Rose está cada vez mais fraca e quase nunca tem forças para acompanhá-la. Hoje, porém, as duas estão juntas. Dorothy observa a mãe com atenção, pois teme que ela não consiga continuar. Dorothy não pode esquecer a noite em que a mãe lhe contou que estava doente, que tinha contraído a doença mais perigosa que existe. – Eu tinha doze anos e notei que minha mãe estava 28

magra e cansada. Eu entendi logo que havia alguma coisa errada com ela. Uma noite, pouco antes de nos deitar, mamãe quis conversar comigo. Ela me contou que tinha ido ao hospital e que o médico tinha lhe dito que tinha Aids. Fiquei apavorada. Eu sabia que quem contrai essa doença morre, mas não queria mostrar à minha mãe que estava com medo e fiz força para não chorar. Eu lhe disse que tudo se resolveria. Mas, quando fiquei sozinha, comecei a chorar. O papai tinha morrido quando eu era pequena. Como seria a vida

para mim e meus irmãos se mamãe também morresse? As mães ajudam Já se passaram dois anos desde aquela noite e Rose ainda está viva. Dorothy e seus irmãos fizeram testes no hospital e nenhum deles tem Aids. – A vida já era difícil mesmo antes de a minha mãe ficar doente, mas agora é ainda pior. Além de cortar papiro e tecer tapetes, tenho que cozinhar, lavar os pratos e as roupas. Mamãe sempre se esforçou para que eu e meus irmãos tivéssemos uma

vida melhor, por isso quero ajudá-la o máximo possível agora. Eu tenho muita dificuldade em me concentrar na escola, vivo preocupada com ela. Contudo, Dorothy não está completamente sozinha. – No mesmo ano em que minha mãe me contou que estava doente, as mães de Santa Rita decidiram nos ajudar. se não temos comida, elas nos dão milho e feijão. Elas nos fornecem o uniforme escolar e outras roupas também. Sem as mães, eu não teria a mínima chance, diz Dorothy.


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Quer ser a primeira mulher presidente do Quênia! – Gostaria de ser a primeira presidenta do Quênia. Ajudaria todas as crianças órfãs. Elas teriam um lar, o suficiente para comer e poderiam ir à escola. Eu também ajudaria os portadores do vírus HIV/ Aids a receberem os remédios e o tratamento médico que precisam.

Rose concorda com a filha: – Aqui há muita gente que tem medo de quem tem Aids, mas as mães dão a mim e aos meus filhos amor e apoio. Eu sei que não tenho muito tempo de vida, mas me sinto feliz em saber que elas tomarão conta dos meus filhos quando eu morrer. Dorothy nunca vai precisar viver nas ruas. Adora rádio Depois de quatro horas de

trabalho pesado, Rose e Dorothy voltam para casa. Elas levam na cabeça pesados fardos de papiro. Dorothy está faminta, pois o único que tinham levado era uma garrafa de água. Assim que chegam em casa, a menina começa a preparar o mingau do jantar. Depois de comer, descansa um pouco e, em seguida, põe-se a tecer tapetes. À noite, Dorothy tem finalmente um momento

livre e resolve ligar o rádio. Ela adora escutar música e essa noite está tocando, justamente, sua artista favorita, Princess Jully. – Suas músicas tratam freqüentemente da Aids. Eu acho que as pessoas escutam quando ela canta. É importante começar a escutar, senão o Quênia inteiro vai morrer de Aids. Lá fora está escuro e silencioso. Dorothy desliga o rádio e se encolhe junto à

Escute a Princess Jully em www.childrensworld.org

mãe e aos irmãos menores, Isau e Jacobo. Ela ama sua família e, naquele momento, quando todos estão deitados juntos, ela se sente segura.


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Apesar de Penina sentir muitas saudades da mãe e de pensar nela todos os dias, sente-se feliz com a ajuda das mães de Santa Rita. Graças a elas, a menina e os irmãos podem morar juntos e ir à escola.

Penina Awino, 12 Mora: Com meus irmãos. Adora: Ler. Odeia: Cobras. O pior que lhe aconteceu: Quando mamãe, papai e minha irmã morreram.

O melhor que lhe aconteceu: Quando meu irmão mais velho me comprou sapatos novos. Admira: Meu irmão e as mães de Santa Rita. Quer ser: Piloto. Tem esperanças que: Em breve haja uma cura para a Aids. Sonha: Que nenhuma criança pequena perca os pais.

D

a janela, Penina olha para fora. Algumas mulheres lavam roupas enquanto as crianças correm e brincam no quintal. Em seus pensamentos, porém, Penina está muito distante. Ela entoa uma canção que sua mãe, Josephine, costumava cantar para ela. Penina gosta de estar só com freqüência para pensar na mãe. As duas eram grandes amigas e a menina sente sua falta todos os dias. – Como meu pai vivia com sua segunda mulher, nós nos

ajudávamos muito, mamãe e eu. Se ela cozinhava, eu a ajudava a lavar a louça, ou corria até a mercearia para comprar alguma coisa. À noite, ela costumava cantar ou contar histórias para mim e meus irmãos. Não tínhamos muito dinheiro, mas éramos uma família unida. Mãe da própria mãe – Quando eu estava na segunda série, minha vida mudou totalmente. Mamãe adoeceu. Às vezes, eu era obrigada a faltar à escola por

muitas semanas e acabava ficando atrasada em relação aos meus colegas. Aos oito anos, fui obrigada a cuidar da mamãe. Eu cozinhava, lavava roupa e limpava a casa. Dava banho na mamãe, penteava seus cabelos e tinha que levá-la ao banheiro várias vezes por dia. – Dormíamos na mesma cama e ela me acordava no meio da noite quando tinha sede. Muitas vezes tive que consolá-la. Apesar de também estar muito triste, tinha que me controlar para não

Penina quer

as mães de Santa Táxi caro Uma viagem de Matatutaxi até o hospital da mãe custava 50 shillings (US$ 0,67). Por isso, Penina não pôde visitá-la tanto quanto desejara.

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preocupá-la. Só chorava quando mamãe não estava presente. Mamãe morreu A mãe de Penina piorou muito e foi internada no hospital. – Quando eu a visitava, sempre levava mingau de milho e roupas limpas para ela. As roupas sujas, eu trazia para casa e lavava. Eu gostaria de poder ter levado comida e roupas limpas todos os dias para a mamãe, mas não tinha condições. O hospital ficava muito longe da aldeia e uma viagem de táxi até lá custava 50 shillings (US$ 0,67), era caro demais. Eu me sentia muito

Sida 31

mal nos dias em que não podia visitá-la. Tinha medo de que ela não tivesse nada para comer e que estivesse totalmente sozinha. A mãe de Penina morreu em um dos dias que a menina não pôde visitá-la. Penina nunca poderá se esquecer disso. – Naquela noite, eu e meus irmãos nos sentamos do lado de fora de casa e choramos muito. Eric, o meu irmão mais velho, tentava, em vão, nos consolar. Penina sentia uma falta terrível da mãe. De madrugada, ao invés de ir dormir, ela se sentava fora de casa e fitava, apática, o infinito.

er ser como ta Rita

Novos pesadelos Algumas semanas depois, Penina voltou a freqüentar a escola. A princípio, sentia dificuldades em se concentrar, mas com o tempo foi melhorando. Eric, o irmão mais velho, pescava e tentava conseguir o maior número possível de trabalhos para sustentar os irmãos. Às vezes, Jhon, o pai deles, contribuía com um pouco de dinheiro. Beatrice, a irmã mais velha de Penina, que já era casada e morava em uma aldeia longe dali, foi visitá-los para o sepultamento da mãe. Um dia, ela lhes contou que também estava doente. Não demorou muito até que o pai também revelasse que sofria

da mesma doença. O pai morreu um ano depois da morte da mãe de Penina. Após alguns meses, era a vez da irmã morrer. Penina e seus irmãos ficaram completamente sós. Eric sabia que era impossível sustentar sozinho os seis irmãos menores. A salvação Outras crianças da aldeia contaram à Penina que estavam sendo ajudadas pelas mães de Santa Rita. Um dia, quando Bernadette, uma das mães, passava pela casa de Penina, a menina tomou coragem e pediu-lhe ajuda. Desde então, Penina e seus irmãos vêm recebendo auxí-

Adora nadar Sempre depois da escola, Penina vai ao lago Victoria nadar com os amigos. Em luo, a língua de Penina, o lago Victoria se chama Nam Lolwe.

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Queimado! De tarde, Penina brinca com os irmãos e os amigos de um jogo parecido ao queimado. Eles fazem uma bola de meia, recheada de sacos plásticos. Duas crianças se põem a uma distância de quinze metros e jogam a bola uma para a outra. Entre as duas, estão as outras crianças. Em um determinado momento, as arremessadoras decidem jogar a bola para acertar as crianças do meio, que não podem ser “queimadas” pela bola. Se uma das crianças é acertada, sai do jogo.

Bola de meia Encha uma meia com sacos plásticos e depois jogue queimado ou futebol com a bola.

➼ TEXTO: ANDREAS LÖNN FOTO: PAUL BLOMGREN

lio para quase tudo o que necessitam. O irmão Eric, de 25 anos, ainda trabalha duro para sustentar os irmãos menores, mas sem a ajuda das mães isso não seria possível. – Todos nós estamos na escola e se nos falta comida, recebemos ajuda. Se precisamos de remédios contra a malária ou outra doença podemos buscá-los na farmácia, que as mães pagam. Porém, o mais importante é que, com o apoio das mães, Penina e seus irmãos podem 32

continuar morando juntos em sua aldeia natal. – É importante nos mantermos unidos agora que perdemos mãe e pai. Não estaríamos tão bem se estivéssemos em um orfanato. Aqui, ainda somos uma família. – Adoro as mães e, atualmente, chamo todas de “mamães”. Gosto muito de poder chamar alguém de mãe outra vez. Quando eu ficar mais velha, quero ser uma mãe de Santa Rita para ajudar outras crianças órfãs.

Crianças precisam de família As mães de Santa Rita acham que as crianças devem viver em família, não em orfanatos. Elas desejam que as crianças tenham uma vida o mais normal possível, e que façam parte da vida comunitária da aldeia. Elas não têm condições de cuidar de todas as crianças órfãs e, por isso, procuram novas famílias para elas. Porém, a grande maioria dos moradores das aldeias é pobre e não tem condições de adotar uma criança.


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Sida 33

Escute Penina cantar a canção da mãe em www.childrensworld.org Mamãe deveria ter recebido remédios gratuitos!

O segredo de Penina – A princípio, eu não sabia de que doença meus pais e minha irmã tinham morrido. Agora sei que morreram de Aids. Quando meu irmão mais velho me contou, me senti muito mal. Não tive coragem de contar a ninguém a causa da morte deles. Tenho medo de que ninguém queira brincar comigo, por achar que eu também tenho Aids.

– Mamãe recebeu uma receita com remédios que não tínhamos condições de comprar. Acho uma injustiça! Os pobres deveriam receber remédios gratuitos ou pelo menos mais baratos. Sei que há remédios que permitem aos ricos com HIV/Aids ter uma vida longa. Se mamãe tivesse tomado esses remédios, talvez ainda estivesse aqui conosco.

Vender o próprio corpo – Se não tivéssemos a ajuda das mães, provavelmente estaríamos nas ruas, onde a vida é muito dura. Talvez,para os meninos não seja tão difícil, mas para nós, meninas, viver nas ruas é muito perigoso. Muitas meninas vendem o próprio corpo para sobreviver, conta Penina.


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