Parque Minhocão Willian Chen Orientadora Prof Dra Helena Aparecida Ayoub Silva
Trabalho Final de Graduação FAU USP 2015/1
Sumário 01. Introdução // 11 02. Minhocão // 13 03. Eu e o Elevado // 30 04. Conhecendo o Elevado // 32 05. Pontos de Vista // 94 06. Prêmio Prestes Maia de Urbanismo 2006 // 108 07. Parque Minhocão // 120 08. Considerações Finais // 187 09. Referências Bibliográficas // 188 10. Crédito das Imagens // 190
Agradecimentos À minha Orientadora, professora Helena Aparecida Ayoub Silva, por ter cuidado de mim neste ano de TFG. Aos membros da banca, por aceitarem o convite e por terem sido fundamentais na minha formação: Ao professor Antonio Carlos Barossi, por me ensinar a projetar; e ao professor Paulo Eduardo Fonseca de Campos, por me ensinar a pesquisar. Ao professor Vicente Gil, pelos ensinamentos, pelas conversas descontraídas, e pela força nessa reta final. Aos amigos da FAU, pela experiência compartilhada durante todos estes anos. Principalmente ao Leo, que está me ajudando a fechar o caderno neste momento; e também a Kim Kim e a Júlia Lara. Aos amigos que se importaram e me apoiaram. À minha doce e amada namorada, Mari, que apesar de estar do outro lado do mundo, tem dado todo o apoio possível. À minha família, que ainda está tentando entender por que estou há tanto tempo nesta faculdade, mas mesmo assim apoia. E ao meu Senhor e Salvador, Jesus Cristo, pois sem Ele nada disto seria possível.
“Pois dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre! Amém.” Romanos 11:36 9
“A utopia não é senão nada além do que a realidade de amanhã e a realidade de hoje é a utopia de ontem.” Le Corbusier
11
1. Introdução O tema deste trabalho surge a partir do desejo de ilustrar a Cidade de São Paulo que a escola me ensinou a sonhar. É o diálogo entre a cidade em que vivo e minha formação como aluno da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Isto é feito através do Elevado Costa e Silva, o Minhocão, que curiosamente percebi ser um elemento urbano marcante para mim, desde sempre. Servindo de base para comparar o meu olhar sobre a cidade em diferentes etapas da vida.
13
14
2. Minhocão “O Elevado é uma duplicação. Uma via sobre a outra multiplicando a capacidade viária, a velocidade dos veículos, a superfície à disposição dos automóveis; chão artificial de asfalto, solo criado concretizado como estrutura ciclópica armada no espaço. Repleto de duplos sentidos: funcional e deselegante; moderno e anacrônico; supérfluo e necessário; inútil, mas indispensável 1.” Candido Malta Campos
1 CAMPOS, C. M. Caminhos do Elevado: Memória e Projetos. ARTIGAS, R. et al. (org.). São Paulo: Dipro, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2008, p. 19. 15
2.1. História Foi idealizado pelo arquiteto Luiz Carlos Gomes Cardim Sangirardi durante o mandato do prefeito José Vicente Faria Lima, 19651969, que imediatamente o recusou, conhecendo já os problemas causados em vias elevadas de outras cidades. Além de preferir o metrô como solução para a mobilidade urbana. A matéria do Jornal O Estado de São Paulo, de 01 de Dezembro de 1970, conta um pouco dessa história2:
O ELEVADO, triste futuro da avenida. O Estado de São Paulo. 01 dez. 1970. Disponível em: http://acervo.estadao.com.br/ pagina/#!/19701201-29342nac-23-999-23-not/. Acesso em: 17/06/2015.
2
16
17
18
19
Em 1969, com o Ato Institucional número 5 em vigor, o prefeito Paulo Maluf decide executar a obra do elevado, que se encontrava engavetada. Como visto na matéria, foi uma decisão vaidosa, com o interesse de apagar a imagem de Faria Lima, conhecido pela construção do metrô. A degradação e desvalorização da região já tinham começado durante as obras barulhentas e sujas, em turnos ininterruptos, do Minhocão. “E o inferno não foi apenas o intenso período de obras, em turnos ininterruptos, que durou cerca de 14 meses. O pior foi depois de pronto, quando o Elevado Costa e Silva passou a funcionar todos os dias, 24 horas por dia”3. Famílias já começam a morar debaixo do viaduto, mesmo antes da inauguração4. Em 1971, a obra é finalizada e batizada de “Elevado Arthur Costa e Silva”, em homenagem ao então presidente Artur da Costa e Silva, segundo da ditadura militar. As críticas ao Minhocão continuaram na véspera e depois de sua inalguração, como pode se ver no Jornal O Estado de São Paulo, de 14 de Janeiro de 1971: 20
NASCIMENTO, Douglas. Seja bem-vindo, Minhocão! São Paulo Antiga. 14 de Ago. 2014. Disponível em: http://www.saopauloantiga.com.br/propagandas-do-minhocao. Acesso em: 17/06/2015.
3
MARGINALIZADOS já se instalam no Minhocão. O Estado de São. Paulo. 14 de Jan. 1971. Disponível em: http://acervo.estadao.com. br/pagina/#!/19710114-29378nac-0021-999-21-not/busca/ Minhoc%C3%A3o. Acesso em: 17/06/2015.
4
21
(...)
22
Em 1976, passa a ser interditado à noite para evitar acidentes, que haviam se tornado corriqueiros, além da preocupação com a redução sonora5. Em 1989, o Minhocão passa a ser fechado à noite (21h30min às 6h30min) e aos domingos por iniciativa da prefeita Luiza Erundina. Em 2006, a Emurb (Empresa Municipal de Urbanização) anuncia o plano de demolição da via expressa. A proposta levantou uma série de discussões que culminaram com o lançamento da segunda edição do Prêmio Prestes Maia de Urbanismo, para gerar proposições e outras visões para a área. Em Maio de 2010, o prefeito Gilberto Kassab anuncia o plano de demolição do Minhocão como parte de novas operações urbanas. Uma nova via expressa seria criada sobre a linha de trem na região central, passando a ser a nova conexão viária Leste-Oeste6. Em fevereiro de 2014, o Projeto de Lei nº 01-00010/2014 é criado. Propõe o desligamento gradual do elevado para tráfego de automóveis e a criação do Parque Municipal do Minhocão. Em julho de 2014, o Plano Diretor de São Paulo entrega o destino do Minhocão nas mãos da sociedade. (Lei específica - audiên-
cias públicas, debate e pactuação na Câmara Municipal) .
ELEVADO Costa e Silva. Acervo Estadão. 28 de Nov. 2012. Disponível em: http://acervo. estadao.com.br/noticias/ lugares,minhocao,7920,0.htm . Acesso em: 17/06/2015.
5
BRANDALISE, VITOR HUGO. Kassab anuncia plano para demolir Minhocão. O Estado de São Paulo. 06 de mai. 2010. Disponível em: http://www. estadao.com.br/noticias/geral,kassab-anuncia-plano-para-demolir-minhocao,548002. Acesso em: 17/06/2015.
6
23
FIG.1. Praça Marechal Deodoro, em 1956
FIG.2. Rua Amaral Gurgel, antes da construção do elevado
FIG.3. Rua Amaral Gurgel, em 1966
24
FIG.4. Avenida São João em 1920
FIG.5. Eixo da Avenida São João. Cartão postal de 1962 25
FIG.6. Imagem do projeto da via elevada, em 1969
FIG.7. Perspectiva em escala do Elevado Presidente Arthur da Costa e Silva, em 1969
26
FIG.8. Construção do elevado Costa e Silva
FIG.9. Obras do elevado Costa e Silva
FIG.10. Obras do elevado Costa e Silva, ligação leste oeste, em 1970
27
FIG.11. Avenida S達o Jo達o, em 1970
FIG.12. Obras do elevado Costa e Silva, em 1970
28
FIG.13. Visita ao elevado em obras, em 1971
FIG.14. Obras do elevado Costa e Silva, em 1970 FIG.15. Inauguração do Elevado Presidente Arthur da Costa e Silva
29
FIG.16. Propaganda da Hidroservice com dados tĂŠcnicos do Elevado Costa e Silva
30
2.2. Projeto de Lei e Plano Diretor
PROJETO de Lei nº 0100010/2014. Camara Municipal SP. 05 de Fev. 2014.Disponível em: http://camaramunicipalsp. qaplaweb.com.br/iah/fulltext/ projeto/PL0010-2014.pdf. Acesso em: 20/06/2015.
7
Projeto de Lei nº 01-00010/2014
Lei nº 16.050, de 31 de Julho de 2014
Dos Vereadores José Police Neto (PSD), Nabil Bonduki (PT), Toninho Vespoli (PSOL), Ricardo Young (PPS), Goulart (PSD), Natalini (PV) e Floriano Pesaro (PSDB). É um projeto de lei que propõe o desligamento gradual do elevado para tráfego de automóveis e a criação do Parque Municipal do Minhocão. Este projeto antecede a aprovação do Plano Diretor Estratégico de 2014 e está sendo alvo de crítica pelo fato de aprovar o parque suspenso sem antes consultar a população.
Aprova a Política de Desenvolvimento Urbano e o Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo e revoga a Lei nº 13.430/2002. Neste novo plano existe no artigo 375, um parágrafo específico tratando do Elevado Costa e Silva, de forma mais aberta:
7
8
Parágrafo único. Lei específica deverá ser elaborada determinando a gradual restrição ao transporte individual motorizado no Elevado Costa e Silva, definindo prazos até sua completa desativação como via de tráfego, sua demolição ou transformação, parcial ou integral, em parque.
LEI nº 16.050. Prefeitura de São Paulo. 31 de Jul. 2014. Disponível em: http://gestaourbana. prefeitura.sp.gov.br/arquivos/ PDE-Suplemento-DOC/PDE_ SUPLEMENTO-DOC.pdf. Acesso em: 20/06/2015.
8
31
3. Eu e o Elevado Em 2013, comecei um TFG propondo apresentar uma cidade de São Paulo utópica através de uma história em quadrinhos. Julgava ser a forma mais interessante e imersiva para mostrar a cidade que idealizava. A história acompanharia um dia comum de alguns personagens no centro da cidade, que seria redesenhada, mantendo os edifícios icônicos e o relevo como referencia. Um destes cenários era o Parque Minhocão. O TFG não aconteceu, mas a ideia permaneceu. Um ano depois, no segundo semestre de 2014, voltei ao TFG com a proposta de trabalhar com o tema Parque Minhocão9, mas desta vez com o caráter de projeto. Comecei a fazer visitas de campo e levantamento de dados, percebi, então, que não era possível seguir com o plano que tinha em mente. Esta impossibilidade vinha do fato de não ter conseguido montar uma base satisfatória para trabalhar, e de não querer apenas tratar de um trecho isolado. A questão era que, tinha sensação de não conseguir apresentar a cidade que tinha em mente desta forma. Então minha orientadora, professora Helena Aparecida Ayoub Silva, me lembrou da possibilidade de usar o desenho. Decidi, então, ilustrar o Parque Minhocão, redesenhan32
do a paisagem urbana a partir de fotos. Segui este caminho por um tempo, mas ainda não era o suficiente. Na realidade, era, mas havia gastado muito tempo até descobrir como atingir o resultado esperado. O prazo estava chegando e não conseguiria fazer muitos outros desenhos. Neste ponto, o trabalho mudou novamente e começou a tomar sua forma final. Voltei a refletir a respeito da origem do interesse pelo Elevado Costa e Silva. Me lembrei, então, de uma palestra que havia assistido no começo do curso da FAU, e que me marcou muito. Descobri durante este trabalho que se tratava do projeto vencedor do Prêmio Prestes Maia de Urbanismo de 2006. E, puxando as lembranças mais antigas, vi que o Elevado havia marcado, também, a minha infância. Lembro bem de passar de carro sobre ele, e de como aquilo me chamava a atenção. Não entendia o que era, diferente de tudo que tinha visto na cidade. Parecia um cenário de fantasia, em que os prédios estavam afundados, ou algo do tipo. Me lembro bem das vezes que andei por lá. Percebi, então, que o Elevado poderia ser usado como uma fotografia, um registro do meu estado de maturidade em diferentes es-
O cenário em que o Parque Minhocão estava instalado, era uma cidade de São Paulo bem resolvida urbanisticamente e socialmente. Uma utopia.
9
tágios da vida. Em especial, do começo e do final da minha formação como aluno da FAU. FIG.17.
33
4. Conhecendo o Elevado O Elevado Costa e Silva estava presente na minha memória e era um tema que me atraía, mesmo sem perceber. Mas continuava sem saber o que era esse elemento urbanístico presente na cidade de São Paulo pelo fato de não morar nas proximidades e nem frequentar aquele espaço. Sua existência, aparentemente, não me afetava. As visitas e pesquisas, foram fundamentais para conhecer e entender o Minhocão. Para compreender seu papel na cidade, a sua relação com o entorno, e acompanhar o debate que vem sendo feito desde a sua construção, e assim, formar a minha própria opinião.
34
4.1 Visitas As visitas foram realizadas tanto aos finais de semana quanto em dias de semana. Até então, nunca havia caminhado sobre o Elevado e nem me forçado a ficar parado na parte inferior. Em minha primeira visita, vi como era fácil de se chegar na parte elevada do Minhocão, pelo fato das rampas de acesso estarem localizadas ao lado das estações de metrô. Ela oferece vistas para a paisagem urbana, impossibilitada no nível do chão. O fato de estar imerso na densa cidade sem ser interrompido pelos carros dá uma sensação de liberdade. E as janelas dos apartamentos trazem a sensação de segurança, de que é um espaço vigiado, de certa forma. Sua superfície se torna, literalmente, um parque de concreto. Pessoas fazendo piquenique, passeando, correndo, andando de bicicleta, patins, longboards e skates, jogando bola, brincando com cachorros, tomando sol, e outras atividades de lazer. Fora os eventos e feiras. Barracas de bebidas e salgadinhos se instalam para atender os usuários. O espaço é usado como área de lazer, mesmo sem infraestrutura nenhuma. A presença de banheiros públicos nas estações de metrô e terminais de ônibus ajudam a suprir
as necessidades básicas, apesar da distância. O mesmo ocorre diariamente, após a desativação do Minhocão, no período noturno. Vi pessoas aparecendo poucos minutos após o fechamento das vias. Isso reflete bem a carência por espaços de lazer na cidade. Também reparei na proximidade dos apartamentos em alguns trechos. A privacidade praticamente não existe nos apartamentos do primeiro andar. Muitos moradores do segundo andar observam a movimentação sobre o Elevado e alguns até interagem com os frequentadores. Mas imagino que nos outros dias da semana a realidade seja bem diferente. A realidade na parte inferior do Elevado já é totalmente outra. É escura, suja, barulhenta e degradada. Calçadas mal cuidadas e cheias de obstáculo. O fluxo intenso de carros gera desconforto pela proximidade e limita o passeio do pedestre. Principalmente quando se está preso no canteiro central. Este, é ilhado e abriga famílias em condições desumanas. É péssima a experiência de invadir a privacidade dessas pessoas ao ter que esperar para atravessar de um lado para o outro da rua, e desesperador quando 35
algum suspeito começa a andar em sua direção. Acabei não tirando muitas fotos por não me sentir à vontade de andar com uma câmera na mão. Para evitar ofender os moradores de rua e por segurança. É um espaço cheio de conflitos, tem um ar pesado e desagradável. Não teria ficado se não fosse para compreender melhor os efeitos causados pelo Elevado Costa e Silva na cidade.
36
4.2 Fotos das Visitas
37
38
Foto panor창mica no encontro com o Largo do Arouche.
39
O elevado oferece uma experiência singular de interação com a cidade.
Rampas próximas às estações de metrô.
41
Pessoas usando o Minhocão como espaço de lazer quando ele é desativado.
43
Eventos e feiras sobre o Minhoc達o ocorrem frenquentemente.
44
45
Vistas do eixo da avenida Pacaembu.
O Minhocão passa muito próximo de alguns prédios vizinhos.
Fachadas de prĂŠdios perdidas, apenas visĂveis sobre o elevado.
51
Após a lei “cidade limpa”, os outdoors foram removidos expondo as fachadas cegas dos edifícios. Muitas delas podem ser vistas do Minhocão.
53
Muitos terrenos livres.
54
55
Muitos postos de gasolina. Potenciais terrenos para intervenção.
56
Terrenos reservados para a construção e comercialização de novos empreendimentos. Resultado da valorização imobiliária ocorrida após decretado o fim do Minhocão. 57
Visita ao tĂşnel. Abrigo de algumas pessoas.
58
59
62
63
Visitas na parte inferior do Minhoc達o.
64
65
67
68
69
4.3 Workshop Tive a oportunidade de participar da oficina feita pelo arquiteto e professor Alexander Pilis, relacionada à 31a Bienal de Arte de São Paulo, com o tema “Olhar para não ver - Reprojetando o espaço público do Minhocão”. Era fim de semana de eleição. Por esta razão o Minhocão não havia sido desativado, então o passeio foi feito na parte inferior, nas proximidades da estação de metrô Marechal Deodoro. O passeio e as discussões me ajudaram a entender a relação do Minhocão com o chão da cidade. E que o Elevado deveria ser pensado em “cortes”, não desvinculando a parte superior da inferior e nem dos prédios vizinhos. A oficina terminou na sede da Associação Parque Minhocão, localizada em um apartamento no nível do Elevado. Vi que, apesar de entenderem as diferenças contextuais, usavam o High Line de Nova York como uma referencia de projeto para o Parque Minhocão. Disseram que era uma forma de abrir a mente das pessoas que não conseguiam enxergar outras possibilidades para o Minhocão, se não a total demolição. Esse fato alimentou o meu desejo de criar um cenário em 70
que o Minhocão fosse mantido como espaço de lazer. Isso foi se desenvolvendo durante o percurso, até chegar na proposta final.
Foto tirada durante o workshop: professor Alexander Pilis com os participantes do workshop.
4.4 Filme Elevado 3.510 É um documentário que mostra a história de algumas pessoas que moram em volta do Minhocão. Fundamental para entender como é a relação entre eles.
FIG.18. Capa do Filme Elevado 3.5 Elevado 3.5. 2010. BUHLER, M. et al. 60 min.
10
72
4.5 Levantamento de terrenos O levantamento foi feito durante as visitas e também com o auxilio do Google Street View. Durante as visitas, percebi que havia muitos terrenos vazios, edificações pouco adensadas e mal preservadas, estacionamentos e postos de gasolina, além de praças e áreas verdes. Nesta primeira etapa do trabalhdo, ainda estava levantando dados para definir o tipo de intervenção e pela área de projeto. O levantamento apresentado faz parte de um segundo levantamento, realizado depois que a proposta atual do TFG tomou forma, ampliando a seleção de terrenos para dentro das quadras.
Foto aĂŠrea do trecho trabalhado. 74
Elevado Costa e Silva
Cicatriz da linha fĂŠrrea 75
Estações de metrô 76
Estações de metrô
Foto tirada durante visita: Estação de metrô Marechal Deodoro.
Estação Marechal Deodoro e Estação Santa Cecília.
77
Praรงas e รกreas verdes 78
Praças e áreas verdes
Foto tirada durante visita: Praça Marechal Deodoro.
Praça Roosevelt, Praça Santa Cecília, Largo do Arouche, Praça Marechal Deorodo, Praça Antônio Cândido Camargo, Praça Dom Ernesto de Paula, canteiros e outras áreas verdes.
79
Lotes selecionados 80
Lotes selecionados
dominância de edifícios de baixa densidade, já pensando no projeto.
Foto tirada durante visita: Futuro empreedimento.
Estacionamentos, postos de gasolina, lotes vazios, terrenos reservados para a construção de empreendimentos futuros, edifícios de baixa densidade sem relevância arquitetônica, galpões e armazéns. Alguns edifícios foram selecionados por estarem localizadas em quadras desgradadas com pre81
Elevado Costa e Silva Estações de metrô Praças e áreas verdes Lotes selecionados 82
4.6 Desenhos O desenho teve um papel decisivo no processo do TFG. Boa parte do tempo foi gasto testando métodos de construção e soluções gráficas e mídias diferentes para representar a cidade que idealizo apenas com desenhos. Durante esse período o projeto foi amadurecendo e tomando forma. Percebi que não conseguia produzir as ilustrações sem um projeto razoavelmente definido, e ao projetar, que esta não poderia ser feita sem pensar na cidade. Foi um período de muita reflexão sobre o objeto de estudo e a minha formação. No fim, os desenhos acabaram não sendo o produto final, como planejado, mas foram determinantes para o desenvolvimento deste trabalho.
Desenhos e estudos feitos durante o processo de TFG
83
A ideia de manter a estrutura como vias e praças elevadas já estavam presentes. Torna o nível da cidade mais iluminada e ventilada, além de recuperar a vista para o céu e fachada dos prédios.
88
Estudos de perspectiva, baseado em fotografia, para a construção do Parque Minhocão.
Reconstruindo as fachadas que estavam cobertas pelo Elevado.
89
Testes de estilos e tĂŠcnicas diferentes. Na esquerda a realidade atual e na direita, a proposta.
90
91
Depois de decidir por trabalhar com desenhos, percebi a necessidade de projetar. Este desenho foi feito a partir dos primeiros projetos. Esta fase ajudou a enxergar melhor a proposta que tinha em mente. 92
Croquis da Praรงa Roosevelt
A planta foi importante para fazer o levantamento dos pilares dos trechos trabalhados e decidir que partes do MinhocĂŁo manter. Foi importante, tambĂŠm, para ver a viabilidade de certas idĂŠias que apareciam durante os desenhos. O trabalho foi se desenvolvendo e amadurecendo com este diĂĄlogo entre o desenho e o projeto.
Planta do projeto em desenvolvimento
93
4.7 Leitura e Pesquisa A leitura e a pesquisa me ajudaram a conhecer e entender: a história do Minhocão e, consequentemente, a história da cidade de São Paulo; sua relevância como eixo viário Leste-Oeste e o impacto gerado nos bairros em que passa; as leis e projetos envolvendo o destino do Elevado Costa e Silva; e as discussões de especialistas e formadores de opinião sobre o tema.
94
5. Posicionamentos e Referências Uma coisa é certa: o Minhocão foi um erro. Implantado de forma autoritária e violenta que, ainda por cima, leva o nome de um ditador militar, Marechal Arthur da Costa e Silva – sua presença degradou todo o entorno e atualmente não é mais tão relevante – como ferramenta de mobilidade urbana. A polêmica não está no seu estado atual, mas sim no seu destino. Para compreender melhor, coletei a opinião de especialistas, professores, e de formadores de opinião. Grande parte do material foi encontrada na internet. Um desses achados, em especial, foi a publicação do jornalista Julio Lamas (jornalista, colaborador do Planeta Sustentável e autor do Blog Urbanidades) no site EXAME.com11. Destaco esse texto pelo fato de conseguir identificar e expor as três principais linhas de pensamento. Segui a mesma estrutura para desenvolver esta parte do trabalho. A primeira delas defende a permanência do Elevado como um espaço de lazer, suprindo parte da demanda da cidade. A segunda, aparentemente a mais apoiada, defende a demolição total e a recuperação das ruas e praças destruídas por ele. A terceira, e menos expressiva, defende a demolição parcial, 96
o aproveitamento da estrutura para construção de equipamentos, agregando uma memória do erro que foi.
LAMAS, Julio. Afinal, o que será do Minhocão?. EXAME. 19 de Ago. 2014. Disponível em: http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/ afinal-o-que-sera-do-minhocao. Acesso em: 19/06/2015.
11
5.1 Manter o Minhocão como espaço de lazer Uma das principais vozes deste grupo é o professor da FAU-USP e vereador relator do antigo Plano Diretor, Nabil Bonduki. Para ele, o Minhocão está ganhando outro papel quando se fecha para o trafego de automóveis e se torna uma área de lazer para a população. Ele entende que a cidade de São Paulo é carente de áreas de lazer e vê o potencial da estrutura para atender a esta carência. Vê a construção de um parque como uma das possíveis soluções para a estrutura do elevado. Outro representante desse grupo é o Arquiteto Márcio Kogan, representante da Associação Parque Minhocão. Para ele, o impacto da obra é um fator importante e neste caso, a demolição seria bem mais agressiva para os moradores diante da possibilidade de se fazer um parque. Um parque linear de mais de três quilômetros é uma ideia divertida e seria um marco no urbanismo paulistano. Hoje temos vários exemplos de cidades que desativaram os seus elevados. E não apenas a High Line de Nova York, mas também em Chicago, Boston, Paris e Seul. Mas não se trata apenas de
plantar grama em cima do Minhocão, é preciso reurbanizar também o que está embaixo, no nível da rua. O parque é uma solução mista, melhoraria a qualidade de vida, mas também traria uma influência positiva para o centro expandido da cidade nos diversos pontos onde há cruzamentos12.
FIG.19. Ilustração do Parque Minhocão.
KOGAN, 2014. Disponível em: http://exame.abril.com.br/ brasil/noticias/afinal-o-que-sera-do-minhocao. Acesso em: 19/06/2015.
12
97
Referências: 5.1.1 Promenade Plantée (Paris, França) O terminal ferroviário foi construído em 1853 na praça Bastille. Desativado um século depois foi abandonado e se deteriorando. Este terminal deu lugar à Opera Bastille, e, inicialmente, com sua construção, a prefeitura de Paris pensou em demolir a antiga linha, mas a proposta de redesenho do elevado venceu, tornando-se, assim, o primeiro parque elevado do mundo em 199413.
FIG.20.
98
A parte superior do viaduto é conhecida como Promenade Plantée ou Coulée Verte, com quatro quilômetros e meio, começando na praça Bastille, atravessando o bairro 12ème e terminando no Jardim de Reuilly. Os arcos do nível inferior foram fechados e se transformaram em lojas ocupadas por artesãos de diversas áreas, e hoje se chama Viaduc des Arts14.
FIG.21.
MELLO, Cristina. Viaduct des Arts- (O Viaduto das Artes)La Promenade Plantée (La CouléeVerte)- as lojas e os cafés. 31 de Ago. 2012. Disponível em: http://www.cristinamello.com. br/?p=4120.
13
CONEXテグ Paris. Vocテェ conhece um jardim suspenso chamado Plomenade Plantテゥe?. 23 de Mai. 2014. Diponテュvel em: http://www. conexaoparis.com.br/2014/05/23/ voce-conhece-uma-jardim-suspenso-chamado-promenade-plantee/. Acesso em: 19/06/2014.
14
FIG.22.
FIG.23.
99
5.1.2 High Line(Nova Iorque, Estados Unidos da América) A antiga ferrovia elevada, de 2.3 quilômetros de extensão, começou a operar em 1934, transportando carnes e aves para o lado leste de Manhattan, e foi desativada em 198015. Em 1999 a CSX, recém proprietária, se apresenta disposta a considerar propostas de reutilização da linha, e aí é criada a ONG Friends of The High Line, formada por moradores da vizinhança. Estes que lutaram pela criação do parque16. Em 2006 começa a obra. A primeira parte foi aberta em 2009, a segunda em 2011, e a terceira e ultima em 201417. FIG.24.
VISITENOVAYORK. Disponível em: http://www.visitenovayork. com.br/high-line-park-em-novayork/. Acesso em: 19/06/2014. 16 DAVID, J. & HAMMOND, R. 2013: X-XI. 15
17 Ver: http://www.visitenovayork. com.br/high-line-park-em-novayork/. Acesso em: 19/06/2015.
100
FIG.25.
aisuhfiasuhfiuhsf iauhsdifuahsdifuah aisdfiuahsfiuahsfu
FIG.26.
FIG.27.
FIG.28. 101
5.2 Demolir o Minhocão Para Lúcio Gomes Machado, professor da FAU-USP, na época em que foi construída, parecia uma solução óbvia se fazer a ligação Leste-Oeste conectando a Radial Leste até a Francisco Matarazzo por dentro da cidade. Mas, hoje, não faz sentido manter a estrutura do Elevado, pois ela tem uma pequena capacidade para carros, além de não passar ônibus. Sua demolição seria barata e poderia render uma reciclagem nobre de materiais, por ser uma estrutura pré-fabricada. Além de trazer uma nova vida até 200 metros de cada lado, atualmente prejudicados. O Minhocão não se integra plenamente com as áreas de mais interesse urbanístico como a Praça Marechal Deodoro, que poderia voltar a sua antiga grandeza. Há prédios ali de Rino Levi, Franz Heep e Samuel Roder, criadores renomados, que são marcos da arquitetura Art Déco e poderiam ser revitalizados18. O urbanista Valter Caldana é outro que defende a demolição imediata do Minhocão. Diz que, hoje em dia, a ligação Leste-Oeste se dá de muitas outras maneiras. 102
MACHADO, L. G. Disponível em: http://exame.abril.com.br/ brasil/noticias/afinal-o-que-sera-do-minhocao. Acesso em: 19/06/2015.
18
O aumento de congestionamento de automóveis que sua demolição provocaria não chega a ser, estatisticamente, sequer significativo diante do volume de congestionamentos existentes na cidade nos horários de pico19. Para Caldana, o ponto central do problema é o estrago sistêmico que o Costa e Silva provoca no chão da cidade, no centro da cidade, na vida da cidade, inviabilizando seu uso pleno e sua apropriação pelo cidadão com qualidade funcional e ambiental, seja para os moradores, seja para os usuários permanentes ou temporários, seja para os transeuntes (idem). Ele é totalmente contra o projeto de parque elevado e afirma que a cidade não precisa desse espaço por conta deste problema no nível do chão. E diferente do professor Lúcio, diz que a degradação atinge pelo menos 500 metros para cada lado do Elevado. Marcelo Rubens Paiva, escritor e jornalista, em seu blog Pequenas Neuroses Contem-
CALDANA, Valter. abaixo o minhocão. DEBATE. 22 de Ago. 2014. Disponível em: http://debatendo. com.br/?p=764/. Acesso em: 19/06/2015.
19
porâneas, defende a demolição do Minhocão em seu post Por Que Derrubar o Minhocão20. Em sua opinião, o Elevado é uma das obras mais infelizes e horrorosas de São Paulo. Tem conhecimento das propostas de se fazer um parque suspenso, mas defende a demolição. Seu argumento é que o Minhocão des-
truiu os espaços que existiam embaixo dele, defende a recuperação da Praça Marechal Deodoro e a glamorosa Avenida São João. Assim como fora feito em muitas cidades em que os elevados mal planejados foram demolidos (Londres, San Francisco, Nova York, Paris, e até o Rio de Janeiro).
Disponível em: http://cultura.estadao.com.br/blogs/ marcelo-rubens-paiva/por-quederrubar-o-minhocao/?fb_action_ids=10201816575835885&fb_ action_types=og. comments&fb_source=aggregation&fb_aggregation_ id=288381481237582. Acesso em: 19/06/2015.
20
FIG.29. Propaganda de apartamentos dos Edifícios Porchat, obra do arquiteto Rino Levi. 103
Referências: 5.2.1 Big Dig (Boston, Estados Unidos da América) Considerado o maior, mais complexo e tecnologicamente desafiador projeto de vias na história dos Estados Unidos. A obra reduziu o congestionamento de uma das maiores cidades norte americanas e trouxe um ambiente mais agradável. O redesenho substituiu a via elevada de seis pistas (Central Artery, I-93) por oito/dez pistas enterradas, duas pontes sobre o rio Charles, e estendeu a via I-90 para o Aeroporto Internacional de Logan Boston, além de
criar 300 hectares de áreas livres. O projeto foi iniciado em 1982, aprovado pelo congresso em abril de 1987, a obra teve início em Setembro de 1991, e encerrada em dezembro de 2007. Com escândalos de corrupção, o custo inicial estimado em 6 bilhões de dólares se tornou 14.6 bilhões de dólares, no fim da obra21.
MASSDOT. The Central Artery/ Tunnel Project - The Big Dig. Disponível em: http://www.massdot. state.ma.us/highway/thebigdig. aspx. Acesso em 19/06/2015.
21
FIG.30. Central Artery antes do Big Dig.
104
FIG.31. Antes da obra FIG.32. Depois da obra FIG.33. Central Artery depois do Big Dig. 105
5.2.2 Cheong Gye Cheon Stream (Seoul, Coreia do Sul) Uma via elevada expressa de quase seis quilômetros passava por cima do córrego, coberto por outra via no nível da cidade, desde 1976. No início era considerado um símbolo do sucesso da industrialização, mas com o passar dos anos se tornou um símbolo de degradação. Um fato curioso foi que, em 1999, tiveram que fechar parte das vias e perceberam que o volume de viagem de carros caiu substancialmente. O resultado foi explicado pelo Paradoxo de Braess. O fechamento gerou um novo equilíbrio com melhor distribuição de rotas22. Elas foram removidas e o córrego foi revitalizado e transformado em um parque urbano linear de 5.8 quilômetros de extensão. Grande parte do material de demolição foi reciclada e usada na restauração do córrego. A obra começou em 1º de julho de 2003 e terminou em 30 de setembro de 200623. Segundo o Seoul Goes Local in Development, o projeto recebe aproximadamente 64.000 pessoas diariamente. Em 2010, cerca de 20% dos turistas vinham para conhecer o novo canal Cheonggyecheon. O custo final foi de 900 milhões de dólares24. 106
GIARETA, Rafael. UMA IMPRESSIONANTE RENOVAÇÃO URBANA EM SEUL. Portalarquitetonico. 13 de Mar. 2011. Disponível em: http://portalarquitetonico.com. br/uma-impressionante-renovacao-urbana-em-seul/. Acesso em 19/06/2015.
22
OPEN Urbanism. Cheonggyecheon Musem. 27 de Ago. 2012. Disponível em: http:// openurbanism.blogspot.com. br/2012_08_01_archive.html. Acesso em 19/06/2015.
23
FIG.34. Via expressa elevada corta a cidade
MANDAL, Sujoyini. Seoul Goes Local in Development. The World Bank. 18 de Nov. 2013. Disponível em: https://blogs.worldbank.org/ sustainablecities/seoul-goes-local-development. Acesso em 19/06/2015
24
FIG.36. Obra em andamento
FIG.37. Festival ocorrendo no Cheong Gye Cheon Stream FIG.35. Córrego revitalizado
5.3 SOLUÇÃO MISTA O arquiteto Lourenço Gimenes, do escritório FGMF (Forte, Gimenes & Marcondes Ferraz), e um dos autores do projeto premiado do concurso Prêmio Prestes Maia de Urbanismo de 2006, defende a solução com a demolição parcial e uso da estrutura remanescente como equipamento urbano. Para ele, embelezar a parte de cima com o parque não soluciona o verdadeiro problema, que está embaixo. Vai continuar escuro e barulhento, não cria uma cidade agradável no nível do chão. Ao mesmo tempo diz que, apenas demolir não ensina, é preciso manter viva a memória do que já foi tido como uma grande obra para a cidade. Em cinco ou seis pontos, onde não tenha ponto conflituoso com a cidade, pode-se manter parte da estrutura ao mesmo tempo em que se tem ventilação e iluminação. Aquilo que ficar pode dar lugar a um SESC, por exemplo, um equipamento recuperado e desejado do ponto de vista urbano.25 José Xaides de Sampaio Alves, especialista em planejamento urbano e regional, professor da FAU-UNESP, afirma que 108
Disponível em: http://exame. abril.com.br/brasil/noticias/ afinal-o-que-sera-do-minhocao. Acesso em: 19/06/2015.
25
por enquanto, não há estudos ou números que validem as duas soluções ou apontem seus impactos para a população e o fluxo de transporte da cidade. E talvez uma solução mista, entre parque e demolição parcial, possa ser melhor [...] Quanto ao parque, logicamente que um projeto dessa natureza vai gerar aspectos negativos e positivos, pois dentro de um ponto de vista da mobilidade ele teria que ser pensado dentro de um conjunto de soluções alternativas para o fluxo que ocorre durante a semana. A desativação dessa maneira só pode ser progressiva e fruto de participação popular (idem).
Referências: 5.3.1 Prêmio de menção honrosa do Prêmio Prestes Maia de Urbanismo de 2006 Projeto de Lourenço Urbano Gimenes. Propõe a demolição parcial do Elevado e reaproveitamento da estrutura para construir equipamentos para a cidade. Este projeto será melhor detalhado no próximo capítulo.
109
6. Prêmio Prestes Maia de Urbanismo 2006 Foi graças ao concurso Prêmio Prestes Maia de Urbanismo de 2006 que tive meu primeiro contato com a questão do Minhocão, como aluno da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Promovido pela Prefeitura de São Paulo, por intermédio da Secretaria Municipal de Planejamento, que premiou com R$ 100.000,00 (R$ 50.000,00 para o primeiro colocado, R$ 30.000,00 para o segundo e R$ 20.000,00 para o terceiro) os projetos que apresentaram as melhores propostas de solução para os problemas urbanísticos e ambientais provocados pela construção da Via Elevado Marechal Costa e Silva, conhecida como Minhocão26. Em 28 de Maio de 2010, os arquitetos José Alves e Juliana Corradini, ex-alunos da FAU-USP e sócios titulares do escritório de arquitetura FRENTES, vencedores do concurso, vieram para a FAU palestrar e mostrar a proposta que tinham para o Minhocão. Mesmo sem saber, este foi o momento que o Trabalho Final de Graduação começou a se desenvolver em minha mente. Lembro bem desse dia. Sentado na cadeira do auditório, assistindo atentamente e achando tudo genial, como alguém que nun110
ca tinha pensado em cursar a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e sem nenhum conhecimento na área, ainda estava tentando entender o que era “arquitetura”. Não esperava, depois de anos, voltar e trabalhar com este tema, tão marcante no meu percurso na faculdade, de me lembrar das impressões positivas que tive na fase inicial da graduação, podendo comparar com um olhar mais maduro, de quem está prestes a se formar. Nesta parte do trabalho apresento dois projetos do PPMU 2006, o primeiro colocado e a uma das menções honrosas. Os dois apresentam partidos totalmente opostos e refletem propostas de cidades totalmente diferentes. Analiso e comparo as duas, relacionando-as com meu desenvolvimento como estudante de arquitetura.
26 Disponível em: http://www. prefeitura.sp.gov.br/cidade/ secretarias/comunicacao/ noticias/?p=134034. Acesso em 17/06/2015.
6.1 1º Lugar - José Alves e Juliana Corradini27
Este projeto decide por manter o Minhocão com sua função de conexão viária Leste-Oeste. Ele é retrabalhado para agregar novos programas e se integra com a cidade através de edifícios de acesso. Para eles, o intenso tráfego de 80 mil veículos diários demonstra a sua importância na cidade, e por isso escolhem mantê-lo. Um invólucro metálico é projetado para fechar a via elevada a fim de solucionar os problemas causados às janelas mais próximas pertencentes aos edifícios do seu entorno. Permitindo, assim, seu funcionamento ininterrupto. O Elevado Costa e Silva passa em vários pontos muito próximo às janelas dos edifícios do seu entorno, gerando um nível de ruído muito alto. Projetamos um invólucro metálico de fechamento, transformando-o em um túnel. Desse modo, além da melhoria das condições ambientais para sua vizinhança, o Minhocão funcionará 24 horas como rota viária, desafogando o trânsito das avenidas São João e General Olímpio da Silveira, que já se mostram congestionadas após o horário de
Projeto disponível em: http://www.vitruvius.com. br/revistas/read/projetos/06.067/2689?page=3. Acesso em: 17/06/2015.
27
FIG.38. Parque elevado sobre o Minhocão
111
seu fechamento28. As vedações laterais do túnel terão opacidades variadas a fim de oferecer um trajeto mais interessante aos motoristas, além de enriquecer visualmente seu desenho na cidade. A equipe entende que “São Paulo é de modo geral carente de parques” (idem). E na região do Minhocão isso é mostrado pelo seu uso aos finais de semana, como espaço de lazer mesmo sem infraestrutura para tal. Cria-se um parque suspenso sobre o túnel, de programa variado: espaços de contemplação, mesas com jogos, playground, pistas de skate, ciclovias, espaços para apresentações e exposições ao ar livre, bancas de revistas, postos policiais e de informações turísticas, dentre outros (idem). Ele estará ligado a edifícios de acesso, que poderão abrigar: “cinemas, teatros, restaurantes, bibliotecas, escolas, galerias de arte, shoppings, livrarias, além de estacionamentos subterrâneos, incentivando a utilização deste espaço por visitantes de todas as 112
classes sociais” (idem). Seus quatro níveis de subsolo para estacionamento criarão o total de 2.505 vagas. Esses edifícios de acesso que se ligam com o parque e com as galerias estão localizados próximos às estações de metrô e vias importantes, tomando o lugar de terrenos subutilizados ou pouco construídos. Toda a infraestrutura necessária para o funcionamento do parque e das galerias estão conti
28 ALVES, J. & CORRADINI, J. (2006). Disponível em: http://www. vitruvius.com.br/revistas/read/ projetos/06.067/2689?page=3. Acesso em: 17/06/2015.
FIG.39. Corte do túnel elevado
FIG.40. Localização dos edifícios de acesso
das neles. Toda a circulação vertical (dentro do edifício e entre a galeria e o parque) está de acordo com a norma de acessibilidade NBR 9050. Galerias são anexadas às laterais do túnel. Isso acontece nos trechos com abertura visual junto aos largos e praças. Seu conforto térmico é garantido pela ventilação natural dos caixilhos, do seu pé direito elevado, e dos brises instalados conforme sua orientação. Elas são preparadas, também, para serem climatizadas caso seja necessário. Possuem rampas e escadas de acesso em suas extremidades que dão para o parque. Destinado para usos públicos e privados, sendo que o aluguel é revertido para os cofres da Prefeitura. Os painéis de fechamento de vidro externos também podem ser alugados para propagandas. É proposta a Operação Urbana Minhocão, nos moldes da Operação Urbana Centro, nos lotes lindeiros, visando o desenvolvimento da região. Destacando: coeficiente de aproveitamento máximo 6 para uso residencial e misto-residencial e não computação, para efeito de cálculo, de 113
Considerações coeficiente de aproveitamento para salões de festas, cinemas, teatros e anfiteatros, auditórios, museus, creches, educação/ cultural geral e garagens (ibidem). O projeto foi orçado em 86 milhões de reais com previsão de nove anos de obra. Uma receita anual e permanente de 6.5 milhões de reais é prevista, considerando o aluguel de galerias e estacionamentos.
114
Este projeto desconsidera totalmente o maior problema causado pelo Elevado, que é o chão da cidade. Ele continuará escuro, mal ventilado e mal utilizado. Os apartamentos que sofriam apenas com o barulho e a poluição ficarão, também, com a vista mais limitada ainda e menos privacidade. O barulho e a poluição continuarão se acomulando no nível inferior, onde o ar não circula. Esse tráfego nas ruas e avenidas inferiores vai continuar ilhando e limitando uso nos canteiros centrais. Provavelmente continuarão servindo de pontos de ônibus e moradia informal. A criação de 2.505 vagas para automóveis na área incentiva o uso da cidade como espaço de deslocamento e não de estar. O discurso da criação de um espaço para todas as classes sociais chega a ser cômico, uma vez que tal projeto tem caráter elitista. Com a criação de shoppings abarrotados de vagas para carros, acessos feitos por edifícios privados – sem contar que a provável valorização da região expulsará a população de baixa renda, que hoje frequenta o espaço.
6.2 Menção Honrosa - Fernando Forte, Lourenço Gimenes e Rodrigo Marcondes Ferraz29 O projeto trabalha a questão do Minhocão como parte de um projeto maior de requalificação no centro da cidade. Propõe transferir a via expressa Leste-Oeste para uma área mais adequada da cidade; demolir parcialmente o Minhocão e retrabalhar a área com áreas verdes; habitação; maior in-
tegração; permeabilizarão e integração do centro. A iniciativa de demolir parcialmente o Elevado vem do entendimento de sua péssima influência sobre os bairros a sua volta, tornando a área imediata num “grande subterrâneo soturno e insalubre30”; gerando
Projeto disponível em: http://www.vitruvius.com. br/revistas/read/projetos/06.067/2689?page=4. Acesso em 17/06/2015.
29
FORTE, F., GIMENES, L. & MARCONDES FERRAZ, R. (2006). Disponível em: http://www. vitruvius.com.br/revistas/read/ projetos/06.067/2689?page=4. Acesso em 17/06/2015.
30
FIG.41. Estrutura parcial do elevado servindo de equipamento público e praça suspensa
115
condições desumanas para se morar e trabalhar nos primeiros andares, com barulho, sujeita, falta de privacidade e até falta de iluminação natural em alguns casos; desvalorização dos imóveis, gerando má conservação e até subutilização. Trata-se de um divisor de bairros, interferindo na dinâmica entre os dois lados da cidade. Os trechos mantidos estão localizados estrategicamente em áreas afastadas dos edifícios: próximo a praças, largos e entroncamentos. Um dos objetivos da remoção do Minhocão é promover a ligação entre os dois lados da via. Eles abrigarão equipamentos públicos de forma a dialogar com as funções do entorno, complementando os equipamentos existentes, também servindo como praças elevadas. Funcionam como articuladores dos espaços verdes e equipamentos. São também a memória do viaduto. É um trabalho de evolução urbana que não nega o pré-existente, mas transforma o espaço urbano positivamente. Os trechos mantidos se transformam em equipamentos e permitem a leitura do antigo conjunto, mostrando para a Cidade que ela pode con116
viver de forma positiva com seus antigos fantasmas (ibidem). Um grande jardim linear será criado entre a Amaral Gurgel e o metrô Marechal Deodoro, de forma a conectar as áreas verdes existentes. Parte dos imóveis será demolida, mantendo apenas os maiores edifícios. A população retirada será transferia para novos imóveis propostos na área. Áreas de baixa densidade e subaproveitadas, encontradas a noroeste do jardim, darão lugar a conjuntos habitacionais, construídos por meio de licitações públicas. Habitações populares de uso misto também são previstas para áreas próximas ao Arouche. Alterações nos miolos de quadra são propostas na área de Operação Urbana, prevendo maior permeabilidade do solo e passagens verdes. Previstas para algumas áreas fora da OU também para integrar os espaços verdes e articular funções, como é o caso da Santa Casa, por exemplo. Outras diretrizes são dadas para dar condições para que a cidade se transforme sozinha e se recupere. A equipe reconhece a importância da via expressa no eixo Leste-Oeste, e considera
FIG.42. Mapa com zoneamentos
FIG.43. Mapa com detalhes dos zoneamentos
que ela poderia estar em outro lugar, uma vez que a ligação fosse mantida. Foi projetado como componente de um eixo metropolitano (Leste-Oeste), em escala alheia aos bairros. Há poucos acessos e sua interferência ambiental é notoriamente nociva às ruas e edifícios do entorno. Conclui-se, desta maneira, que sua localização é fruto de algum grau de arbitrariedade e que, preservada a função de ligação Leste-Oeste, essa via expressa poderia estar em outro local (ibidem). Propõe a transferência do luxo Leste-Oeste para junto da linha de trem, que é outra cicatriz urbana difícil de ser suprimida. A nova via poderia ser facilmente criada, uma vez que há espaços livres ou de uso obsoleto na orla ferroviária. Agrupando estes equipamentos mais agressivos em um lugar só, minimizando o impacto na cidade. A construção dessa nova via, ao longo da linha férrea, praticamente não causa transtornos à cidade.
117
A maior parte do fluxo de 80 mil carros diários, que apenas cruzam a cidade, será desviado para o novo caminho, deixando as avenidas sob o Minhocão com um fluxo de caráter mais integrado às funções e espaços locais. Outros pontos positivos da nova via: traçado mais longo que interliga vias expressas como a Marginal Tietê e a Avenida Alcântara Machado; proximidade e paralelismo com o atual eixo e com a Marginal Tietê, redistribuindo o tráfego; fácil conexão entre o velho e o novo trecho proposto. Indica que estudos detalhados sobre o fluxo Leste-Oeste teriam que ser feitos para determinar a dimensão desta via, e como trabalhar as conexões com as vias que cruzam com ela de forma a respeitar e se incorporar as características de cada bairro percorrido. Não repetindo o erro do Minhocão, implantado de forma alheia aos bairros. A previsão para a conclusão da obra é inicialmente de quatro a cinco anos.
FIG.44. Foto do Elevado Costa e Silva FIG.45. Montagem com a nova proposta
118
Considerações É um projeto sensível às questões urbanas e sociais. Trata a cicatriz que era o Minhocão e dá condições para que o centro da cidade consiga se recuperar sozinho. A nova via expressa será mais eficiente e minimizará o impacto na cidade. Com a remoção da via elevada, a qualidade de vida dos moradores melhora instantaneamente. A criação de áreas verdes que se conectam aos redesenhos de miolos de quadra, cria uma cidade mais permeável para o pedestre, e ajuda a reintegrar os dois lados da cicatriz. O uso da estrutua como equipamento público e praça elevada, ensina a cidade a aprender com seus erros, ao invés de se esquecer delas. Curioso que, apesar de não ser o projeto vencedor, uma proposta semelhante foi apresentada, em Maio de 2010, pelo, então prefeito, Gilberto Kassab31.
BALZA, Guilherme. Projeto premiado mostra como SP poderá ficar com a demolição do Minhocão. UOL notícioas. 09 de Mai. 2010. Disponível em: http:// noticias.uol.com.br/cotidiano/ ultimas-noticias/2010/05/09/ veja-como-sp-podera-ficar-com-a-demolicao-do-minhocao.htm. Acesso em 21/06/2015.
31
119
6.3 Reflexão Esses dois projetos representam bem duas fases do meu percurso na FAU, um no início e outro no fim. Num primeiro momento, o projeto do FRENTES é mais atraente. Apresenta uma solução esteticamente chamativa e impressionante. Oferece conforto para os usuários, facilitando o acesso com milhares de vagas de estacionamento em edifícios de acesso, que na verdade são shoppings, que se ligam com o parque suspenso. É um projeto que eu havia gostado na época que me foi apresentado, refletindo valores que eu carregava. Não entendia a cidade de São Paulo, principalmente o centro, sentia-me mais confortável passando por ela do que parado. Muito provavelmente teria proposto algo parecido com a maturidade que dispunha na época. O projeto vencedor parece sofrer com o “mal de querer agradar todas as partes”, parece que quer colocar todas as coisas no mesmo lugar, mesmo que isso interfira na harmonia do conjunto. Um defeito bastante comum quando se está começando a aprender projeto, um sinal de imaturidade. O projeto do Lourenço Urbano Gimenes já não chama muito a atenção. É um projeto 120
que parece se dissolver na cidade, deixando apenas algumas migalhas do que foi o Minhocão, uma lembrança. Sei que não teria a maturidade para entender a complexidade desta simples proposta. Eram questões que não me eram relevantes, como um passageiro alienado da cidade. Imaginando que estes projetos fossem realizados, sei que certamente conheceria os shoppings e o parque elevado, mas não saberia dizer se iria para conhecer os jardins lineares no centro da cidade. Atualmente meus valores são outros. Não consigo entender e aceitar que o projeto do túnel elevado tenha vencido o concurso, enquanto que o outro nem tenha sido premiado, apenas mencionado. Não consigo citar nenhuma qualidade no primeiro colocado. Já que não seria um lugar que me interessaria visitar, nem propõe uma cidade em que desejaria morar. Já no outro, não consigo achar defeitos, talvez ainda não tenha maturidade suficiente para isso. Concordo com a proposta, acho elegante e respeitosa com a cidade e seus habitantes.
FIG.46. Auditório da FAU USP: onde tudo começou
121
7. Proposta Baseado nestes anos de vivĂŞncia na FAU, venho apresentar a cidade que a escola me ensinou a ver e sonhar.
7.1 Introdução O Minhocão é conhecido como uma cicatriz urbana. Vejo mais como uma ferida aberta, que continua fazendo mal à cidade e às pessoas que nela vivem. Um corpo que é estranho ao seu entorno, e que cumpre apenas sua função: fazer a ligação Leste-Oeste. Este projeto mal planejado e que coloca o rodoviarismo acima da vida das pessoas tem degradado a região por onde passa há décadas. Torna o chão da cidade um lugar desagradável de se estar, tanto para pessoas quanto para os carros, tira a qualidade de vida dos moradores vizinhos, sendo uma barreira física e visual, que segrega os bairros e a integração da cidade e de seus equipamentos. Porém, essa ferida vem sendo tratada: houve a desativação do elevado no período da noite a partir de 1976, sua ampliação em 1989 e, agora, projetos de leis e planos para seu desligamento permanente e possível remoção. Mas a recuperação só ocorrerá quando ele for redesenhado e integrado à cidade, ou totalmente extinto, como parte de um plano urbano mais amplo. Simpatizo com a ideia de manter a estrutura do Minhocão como parte da história. Tornar este símbolo de autoritarismo polí126
tico, erro urbanístico, e décadas de degradação em um símbolo de superação e recomeço para a cidade. Que este espaço criado para os carros se torne um espaço para as pessoas. O novo espaço proposto será chamado de “Parque Minhocão”, pela força e pela familiaridade que o nome já tem na mente das pessoas. Mas ele não é apenas um parque, nem uma praça, nem um calçadão, nem uma área comum dos prédios. É uma junção de todas essas coisas, uma representação da cidade resultante de valores e crenças adquiridas nestes anos de graduação.
7.2 Considerações Iniciais O Parque Minhocão faz parte de uma Cidade de São Paulo quase utópica, urbanisticamente bem resolvida e socialmente mais igualitária. Com o desenvolver do trabalho, percebi que a questão não poderia ser pensada de forma pontual. O problema não é o minhocão, o problema é a cidade. Como estudante de arquitetura da FAU USP, não consigo deixar de relacionar o projeto com e a realidade que o cerca. Não é possível se projetar um prédio sem entender seus futuros usuários, os prédios vizinhos, a rua, o bairro, a cidade, a cultura e a legislação. Todas as coisas estão conectadas e se influenciam. Uma vez que a intervenção no Minhocão é de escala urbana, uma mudança levaria a outra. Então trabalho como se ela fosse parte de uma intervenção urbana maior, e utilizo este novo espaço proposto como a vitrine desta nova cidade, em que muitos outros “Parques Minhocão” estão presentes.
127
Cicatriz do Elevado Costa e Silva Estações de metrô Praças e áreas verdes Lotes selecionados 128
A
A - Centro Cultural Minhocão: aproveita a vista do eixo da avenida Pacaembu, se integra com os espaços verdes e praças, usa o espaço do túnel.
B
B - Creche e Escola Minhocão: instalado em quadras degradadas e subutilizadas. Próximo ao centro e à estação de metrô Marechal Deodoro. C - Nova Praça Roosevelt: Aproveita o destigamento de algumas vias para criar um espaço acolhedor e permeável, integrado com o Parque Minhocão.
C 129
7.3 “Fim do tráfego” na parte inferior O Minhocão é resultado de uma cultura rodoviarista que já se provou ineficiente. Numa cidade densa como São Paulo, o transporte individual não pode ter prioridade. O sistema viário já se mostra saturado há décadas, mas o estado continua investindo e alimentando tal cultura, ampliando o número de pistas e criando novas vias. Este trabalho considera uma cidade que não sofre mais desses problemas. Com o uso eficiente entre os tipos de transporte, tendo o transporte público como o principal no dia a dia. Sei que isso envolve muitos outros fatores, como a questão da criação de novos núcleos urbanos, o que tiraria a necessidade de deslocamentos desnecessários pela cidade, e uma melhor distribuição e integração das redes de transporte público de massas, desafogando os pontos de baldeação, por exemplo. Mas para fins acadêmicos, considero que essas questões estejam resolvidas nesta cidade utópica, e não serão todas desenvolvidas neste trabalho. No caso da ligação Leste-Oeste, ela é transferida para junto do eixo das linhas férreas da Central do Brasil, Sorocaba e Santos-Jundiaí, bifurcando da Radial Leste, altura da estação Belém, até o Pátio da Lapa. Solu130
ção aparentemente óbvia. Esse plano foi proposto e melhor aprofundado pelo escritório experimental de projetos, criado e liderado pela Professora Doutora Anne Marie Sumner32, arquiteta e urbanista, e professora da FAU-Mackenzie. O trabalho, inicialmente feito para o Prêmio Prestes Maia de Urbanismo, não foi entregue após o IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil) ter tirado seu apoio ao concurso33. Assim, o fluxo Leste-Oeste feito pelo centro, já consideravelmente reduzido, será redistribuído por outras vias alternativas, mudando o caráter do tráfego neste trecho da cidade. Isso é muito importante para o projeto, uma vez que a presença do tráfego congestionado e de passagem não combina com a cidade proposta. Vejo o Parque Minhocão como uma área residencial, o que combinaria mais como uma via local. Ela é praticamente toda rodeada por prédios habitacionais e pequenos estabelecimentos comerciais no térreo, que não justificam uma via movimentada. Esta transformação aumentaria a qualidade de vida dos moradores e usuários, e isso valorizaria mais a cidade. Esta solução é diretamente associada a
SUMMER, Anne. Projeto-ligação-leste-oeste. Disponível em: http://www.annemariesumner.arq.br/projeto/ ligacao-leste-oeste/. Acesso em 21/06/2015.
32
ALVES, Wellington. Prefeitura entrega prêmio a projetos com soluções para o Minhocão. Vivaocentro. 05 de Mai. 2006. Disponível em: http://www.vivaocentro.org. br/not%C3%ADcias-do-centro/ not%C3%ADcias/prefeitura-entrega-2%C2%BA-pr%C3%AAmio-prestes-maia-de-urbanismo. aspx. Acesso em 21/06/2015.
33
uma reestruturação do sistema de transporte público. Criando novas linhas metroviárias com novos pontos de baldeação, acompanhadas de um sistema de linhas de ônibus mais eficientes. O melhor uso e integração das modalidades de transporte de carga, incluindo o uso de canais urbanos e a integração e ampliação da malha ferroviária, diminuirão o uso de caminhões, aliviando ainda mais o siste-
ma viário. Esta questão tem que ser tratada a nível nacional. A proposta é mostrar o centro da cidade como um lugar para se ficar e apreciar, não para ser usado como uma rota de trânsito, um atalho (ou no caso atual, uma das únicas opções) para atravessar a cidade. Um lugar no qual as pessoas sejam valorizadas e possam aproveitar o espaço da cidade.
FIG.47. Projeto Ligação Leste-Oeste
Minhocão
131
7.4 Questão do transporte público O sistema de transporte público é muito mal articulado. E mesmo se a estrutura atual fosse otimizada, não solucionaria o problema de mobilidade urbana. Há outros fatores envolvidos, de caráter político, econômico, social e cultural. Todos precisam ser trabalhados simultaneamente e considerando um planejamento de longo prazo. A cidade necessita desesperadamente de transporte público de massas. O sistema atual de metrô e trem são insuficientes para suprir as carências. Isso pode ser amenizado com a implantação do sistema BRT (Bus Rapid Transit), encontrado em Curitiba e também em cidades internacionais. O BRT é comparado a um metrô de superfície, e de baixo custo. Ele trabalharia em conjunto com os outros sistemas (metrô, CPTM e ônibus circulares). Uma outra opção, que exige um investimento maior, é o VLT (veículo leve sobre trilhos, ou light rail). Outra coisa que pode ser feita é a ampliação da malha metroviária, atendendo as periferias, e a criação de linhas radiais com baldeações em pontos estratégicos, desafogando o centro e criando novos núcleos urbanos. 132
FIG.48. VLT de Houston, linha vermelha
133
7.5 Criação do calçadão Fala-se muito em demolir o Minhocão e recuperar as avenidas e praças que estão abaixo dele, de retomar seu caráter bulevaresco dos tempos áureos do centro histórico. Com a densidade do tráfego atual, é quase impossível criar um bulevar agradável ao pedestre. Mas a tentativa poderia ser feita com a demolição total do elevado, o alargamento da calçada, e a remoção do canteiro central. Esta não é uma escolha viável no cenário deste trabalho, uma vez que os pilares são mantidos. Para dar um uso decente ao canteiro, sua calçada teria que ser alargada, pois, por causa dos pilares, ela chega a ter menos de 0.5 metro de largura em alguns pontos. Sem dizer que os carros passam muito próximos em ambos os lados. Restaria, assim, espaço para uma via de automóvel de cada lado. Então, a opção mais interessante foi a de transformar toda a rua em um calçadão. Substituindo, assim, a tradicional via asfaltada por uma passagem implícita e fisicamente delimitada, que perderia a função de atravessar a cidade cortando-a pelo centro e passaria a ser usada apenas para acessar a quadra. Esse calçadão é interrompido pelas ruas 134
e avenidas transversais, que continuam a funcionar como vias de circulação para automóveis. O novo chão, arborizado e equipado com bancos e lixeiras, prioriza o pedestre e o uso do transporte público. É um espaço de lazer que atende a cidade, além de ser, também, a área comum dos prédios. Ele é bem servido pelo transporte público: estações de metrô da Santa Cecília e da Marechal Deodoro, e pelas inúmeras paradas de ônibus colocadas nela e nas proximidades. Seu passeio largo, arborizado e bem equipado, com estabelecimentos comerciais voltados para a via, variedade de serviços e equipamentos culturais, amplo horário de funcionamento (10h – 23h) e facilidade de acesso o tornam bastante frequentado e seguro. Ao mesmo tempo em que se torna um espaço de lazer para a cidade, é também uma grande área comum, que os moradores dos prédios nunca tiveram. Durante décadas foi necessário caminhar por ruas mal iluminadas e mal ventiladas, poluídas (em quesito visual, sonoro e atmosférico), e pouco ou mal frequentadas e preservadas.
FIG.49. Pitt Street Mall Public Domain / Tony Caro Architecture
7.6 Circulação de automóveis no calçadão O tráfego reduzido e local é feito em um espaço de quatro metros de largura, presente em ambos os lados. Ele é reservado para a eventual circulação de automóveis. Usado para embarque e desembarque de moradores e clientes/usuários, manutenção e casos emergenciais. Possui, também, áreas para manobras e paradas mais demoradas, previstas no desenho do calçadão. A área para automóveis é delimitada fisicamente pelos equipamentos (bancos, cestos de lixo, postes de segurança, postes de luz, e árvores). O ideal é que o uso do transporte público seja preferencial, tirando a necessidade do acesso veicular e tendo idealmente os idosos, gestantes, e deficientes físicos como os quase únicos a fazerem essa prática. A circulação é feita no sentido anti-horário, como já é feito convencionalmente (uso sempre da pista da direita). Ele deverá respeitar o horário de funcionamento, para que não haja conflito. Tendo um período do dia liberado para a manutenção, situação em que os automóveis precisarão de mais tempo. Carga e descarga de mercadorias, recolhimento de lixo e manutenção dos equipamentos, por exemplo. 136
Primeiro desenho: situação atual. Segundo desenho: criação do calçadão
Calçada
Edificações
Faixa de pedestre
Trafego no calçadão
Trafego mantido
137
7.7 Estrutura e o Entorno Os principais problemas desta estrutura indesejada, considerando já o fim do tráfego de automóveis na parte inferior, são: o ambiente mal iluminado e ventilado no nível da rua; a obstrução da vista das janelas de muitos apartamentos do primeiro andar dos edifícios adjacentes e a falta de privacidade de seus moradores; e a desvalorização da fachada dos prédios. Mas apesar disso, esta estrutura elevada proporciona um passeio contínuo pela cidade com vistas a paisagens urbanas impossibilitadas no nível da rua. É uma experiência única. Por esta razão a demolição proposta para a parte superior é parcial. Creio que, com um bom redesenho da via elevada, cada um desses problemas pode ser resolvido. Uma via elevada de passeio contínua será mantida por toda a extensão do antigo Minhocão, desde a Rua Augusta até a Avenida Francisco Matarazzo. Esta terá a largura mínima de cinco metros e estará apoiada no centro da estrutura já existente, cujos pilares serão mantidos. Assim, o chão da cidade ganha seis metros de céu e respiro, de cada lado da via. E os apartamento ficam seis metros mais afastados da estrutura. As vigas transversais de quase três me138
tros de largura, que apoiam a via elevada, abrigarão espaços de estar. Um canteiro verde com árvores de pequeno porte será colocado nas extremidades, junto com um banco voltado para a pista, um bebedouro e uma lixeira. Isso irá garantir a privacidade e dará a vista para um jardim suspenso para as janelas mais próximas e um lugar de repouso sombreado para os usuários do elevado. Em alguns trechos, o total da estrutura será mantida, dando lugar a praças suspensas.
Primeiro desenho: planta de estudo do espaço de estar nas vigas
Segundo desenho: corte de estudo da via elevada
3 metros
Primeiro desenho: corte mostrando a situação atual
140
Segundo desenho: corte mostrando o novo desenho
141
Primeiro desenho: sutuação atual
142
Segundo desenho: novo desenho
143
Primeiro desenho: sutuação atual
144
Segundo desenho: novo desenho
145
7.8 Praças suspensas A cidade possui espaços mais abertos no encontro de ruas e avenidas, e nestes pontos o elevado pode ser mantido sem afetar a qualidade dos apartamentos, tornando-se um espaço de praças suspensas. Estas oferecem vistas privilegiadas da cidade. Alguns exemplos de áreas abertas: cruzamento entre a Avenida São João com as ruas Helvétia e Ana Cintra; Avenida General Olímpio da Silveira com a Praça Antônio Candido de Camargo; e a Rua Amaral Gurgel com o Largo do Arouche. Essas praças são integradas a prédios de habitação e uso misto, por onde a circulação vertical é feita. Outro ponto em que elas ocorrem são: nos acessos das rampas de carro, por conta da estrutura; e nas estações de metrô, que passam a ser integradas ao elevado. Esses espaços abertos são equipados com bancos, pisos verdes com árvores de pequeno porte, e pequenos totens informativos sobre a cidade que apresentam os prédios icônicos existentes na paisagem vista daquele ponto. A área livre tem usos diversos como, por exemplo, eventos, exposições e feiras ao ar livre. Outras praças suspensas se encontram 146
em pontos em que sua presença não afeta a qualidade dos apartamentos mais próximos, e tem possibilidade de integração aos novos prédios habitacionais de uso misto, criando mais um ponto de circulação vertical. Neste caso, ela pode apenas estar ocupando um dos lados da via de passeio, mantendo, assim, uma boa distância da fachada dos prédios existentes.
147
7.9 Fachadas Cegas Com a Lei nº 14.223/2007, conhecida como a Lei Cidade Limpa, os outdoors foram extintos das fachadas cegas. Estes se tornarão espaços de exposição para grafiteiros e outros artistas urbanos. As fachadas próximas à via elevada podem ser usadas para projeções mapeadas ou de filmes no período noturno, sendo mais um evento para os usuários.
FIG.50. Eduardo Kobra presta homenagem a Oscar Niemeyer. Grafite em fachada cega. 148
FIG.51. Projeção no MASP. Aniversário de 50 anos da cidade de São Paulo.
149
7.10 Parte inferior da estrutura O antigo canteiro central, ilhado e abrigando pontos de ônibus e moradores de rua, é integrado ao calçadão de forma harmoniosa. A definição do uso é trabalhado levando em consideração o conjunto com a disposição dos térreos dos prédios, e faz parte do desenho paisagístico. A disposição de volumes e vazios entre os pilares do elevado, é feita de forma que a permeabilidade visual e física na calçada seja mantida. Esta deve sempre permitir a livre travessia do usuário de um extremo da calçada para o outro, de forma confortável. Nela são encontrados: banheiros e outros equipamentos públicos, serviços, comércio e áreas livres multifuncionais. O aluguel arrecadado nesse espaço é destinado aos cofres da prefeitura.
FIG.52. Restaurantes sob a estrutura do viaduto. Yakitori Alley, Yurakucho, Tokyo.
150
151
7.11 Conexão com o elevado É importante que a parte elevada seja bem integrada com a cidade, com acessibilidade universal. A circulação vertical é feita pelas estações de metrô Marechal Deodoro e Santa Cecília; e a integração com alguns dos novos prédios habitacionais de uso misto, e equipamentos urbanos. Todas atendem à norma de acessibilidade NBR9050.
152
7.12 Terrenos incorporados ao projeto Ao longo do Parque Minhocão são encontrados vários terrenos livres, estacionamentos, postos de gasolina, prédios de baixa densidade sem relevância histórica e arquitetônica, alguns galpões e terrenos reservados para a comercialização e construção de novos empreendimentos. Tais espaços são incorporados ao projeto. Alguns deles servirão como pequenos parques e playgrounds, dependendo da localização e dimensão do lote. Aumentam, assim, as áreas verdes da cidade e servem como um respiro dentro da volumetria da quadra. Prédios de habitação de uso misto serão construídos com a intenção de adensar a área trabalhada com qualidade urbana. Todos os moradores removidos serão realocados para as novas habitações construídas.
153
7.13 Preservação Ao longo do Parque Minhocão estão localizados alguns prédios de autoria de arquitetos importantes como: Rino Levi, Franz Heep e Samuel Roder, como já foi citado pelo professor Lúcio Gomes Machado. Muitos prédios do estilo art decó também estão nessa área (e estão tombados ou em processo de tombamento). Outros prédios relevantes para o patrimônio histórico podem estar perdidos dentro dos lotes selecionados como áreas de projeto. Um levantamento mais detalhado teria que ser realizado para que não haja prejuízo. Essas casas poderiam ser restauradas e usadas como pequenos equipamentos de cultura. Um exemplo é o famoso Castelinho da Rua Apa, 236, esquina com a São João, tombada em 2004. Sua estética excêntrica e a sua história marcante, a tornam um ícone na cidade e na mente das pessoas. Ele pode ser restaurado e se tornar um pequeno espaço de exposição e café, ou um museu contando a história local, por exemplo. Os lotes vizinhos darão lugar a um jardim, destacando a obra tombada e podendo ser usada para atividades ao ar livre. Outro exemplo é conhecido como, a ulti154
ma casa da avenida São João. Localizada no número 1767 da avenida São João.
FIG.53. Ultima casa da Avenida São João, 1952.
FIG.54. Ultima casa da Avenida São João, 1914.
155
7.14 Prédios habitacionais de uso misto Eles deverão ser recuados, criando praças no térreo e dando espaço de respiro entre o edifício e estrutura suspensa, amenizando a presença desta. As torres habitacionais, com jardins comunitários na cobertura, respeitarão não só o coeficiente de aproveitamento, mas também serão desenhados mantendo uma boa relação com os prédios vizinhos e o elevado. O objetivo é adensar o centro mantendo uma volumetria equilibrada e interessante. Tipo 1 • Normalmente implantados em lotes menores; • Possui o térreo comercial e a torre habitacional. Tipo 2 • Implantados em lotes que atravessam o miolo da quadra; • Os primeiros pavimentos são comerciais, desenhados para tornar a quadra permeável, com galerias e mezaninos aber156
tos; • A torre habitacional fica nos andares superiores, e tem o sistema de acesso e circulação independente e particular. Tipo 3 • Estes são prédios que possuem integração com as praças suspensas; • Ele é semelhante ao Tipo 2, mas o piso no nível da praça suspensa é integrada e passa a fazer parte dela, abrigando, fora os recintos comerciais, a parte infra estrutural; • A circulação vertical é aberta e pública, conectando a calçada e o elevado.
157
7.15 Habitação no Parque Minhocão A degradação causada pelo Minhocão atinge não só os imóveis adjacentes, mas avança algumas quadras adentro, gerando a perda de interesse imobiliário, que resulta em imóveis maltratados, baixa densidade, má conservação e usos em dissonância com a oferta de infraestrutura, como galpões industriais obsoletos ou subutilizados. Com o provável desligamento da via elevada e sua transformação em parque, ou alguma outra proposta, o interesse pelos imóveis da região voltou. Isso pode ser observado pelos terrenos comprados e reservados pelas construtoras para levantar e comercializar suas torres fortificadas. O problema é que na realidade atual, muito provavelmente os inquilinos, que sofreram décadas com a presença do Minhocão, não terão condições de permanecer onde moram. Serão expulsos para outras áreas desvalorizadas da cidade, onde o custo da moradia é mais baixo. Uma lei de proteção aos inquilinos deve ser criada. Seguem como exemplo alguns itens: 1 - O preço dos alugueis devem ser congelados, respeitando apenas o reajuste peri158
ódico convencional; 2 - Caso o proprietário resolva vender o imóvel, o inquilino deve ter prioridade sobre a compra; 3 - O preço do imóvel a ser vendido pode ter X vezes o valor, tendo como base seu valor na data Y; 4 - O governo deve financiar a compra destes apartamentos para os inquilinos que estão há mais de Z anos; 5 - (“X”, “Y “ e “Z” devem ser determinados após analisar detalhadamente o caso) Um estudo teria que ser realizado para decidir a proporção da lei aplicada. Por exemplo, a pessoa que mora há 40 anos na cobertura do prédio não deve ter os mesmos direitos de uma que morou por 40 anos no primeiro andar. Talvez após o estudo, seja decidido que a lei nem deva valer para os moradores de andares mais afastados, apesar de também terem sido afetados pelo erro cometido pelo Estado e mereçam alguma indenização.
Enfim, o objetivo é controlar o mercado imobiliário e criar uma cidade mais democrática. Alguns dos novos prédios habitacionais de uso misto construídos serão destinados a HIS (Habitação de Interesse Social). Um rigoroso cadastro terá que ser feito para que os apartamentos não sejam comercializados e mantenham seu caráter de HIS e não de mercadoria. Caso o proprietário resolva deixar o imóvel, este não poderá ser vendido por um preço maior do que aquele pago inicialmente. Neste caso o próximo da lista de famílias cadastradas recebe o apartamento.
159
7.16 Questão da moradia no centro O centro possui diversos edifícios ocupados por organizações e movimentos de moradia. Até antes de cursar a FAU, pensava que eram apenas meliantes invadindo propriedades alheias. Na primeira semana como calouro da FAU, os veteranos nos levaram para conhecer a famosa Ocupação Mauá, edifício próximo à estação da Luz, ocupada desde 2003. Vi que eram pessoas decentes e trabalhadoras, e que se tratava de um movimento organizado lutando pelo direito de moradia no centro. Também não sabia o que era o cortiço, concentrados em algumas áreas do centro. Achava que eram casas abandonadas ocupadas por várias famílias. Mas durante o curso, tive oportunidade de visitar e trabalhar com o tema dos cortiços. Entendi que aquelas pessoas poderiam estar morando em habitações melhores na periferia, mas escolheram morar no centro, de forma precária. O fato é que a ignorância e a alienação me impediam de olhar para a cidade, e esses anos de FAU me programaram para olhar e refletir. Já como um ser pensante, estagiei por um ano e meio na Fábrica Urbana, um escritório de assessoria técnica, que trabalha 160
junto com o Fórum de Cortiços e Moradores de Rua. Presenciei a dificuldade que é de se produzir HIS e HMP (Habitação de Mercado Popular) no centro da cidade. A especulação imobiliária tem sido o grande inimigo da moradia popular no centro, e o governo não tem criado mecanismos para controlar este mercado ou favorecer a criação destas habitações, na escala demandada. O centro é feito para as pessoas habitarem, não para servirem de especulação de preços. É onde se concentram os empregos, os equipamentos públicos, a rede de transportes públicos, e é onde as pessoas deveriam habitar. Porém, o jogo da especulação deixa muitos edifícios ociosos e impede o acesso das populações mais carentes, que são quem realmente precisa e que mais utiliza a infraestrutura urbana, concentrada no centro. Por isso, muitos preferem morar de forma precária e até ilegal, em vez de enfrentar e perder horas se deslocando da periferia para o centro, em um sistema precário e saturado de transporte público (que quanto mais afastado do centro pior é). Com o tempo e as experiências, passei
a entender melhor a dinâmica da cidade e a desejar que não fosse dessa forma. O trabalho não pretende discutir a questão com detalhes, apenas reconhecer a sua existência e propor uma situação mais humana e igualitária.
FIG.55. Sarau da Cooperifa na Ocupação Mauá. 16 de Set. 2012. 161
7.17 Praça Roosevelt A nova Praça Roosevelt é parte do Parque Minhocão. Ele é a porta de entrada para os usuários que se encontram do outro lado da Rua da Consolação. Com o desligamento das vias que faziam a conexão Leste-Oeste, parte das pistas que estava sob a Praça Roosevelt perdeu a sua função. Isto possibilitou a criação da nova praça no nível do túnel. A diferença de cota especulada é de seis metros. A transição entre o nível da rua para o nível do parque é feita de forma suave, através de um conjunto harmônico entre escadas generosamente largas (com patamares a cada 1.5 metros de altura), platôs com espaço para ficar e ver a praça e canteiros arborizados. A nova praça passa a ganhar “olhos” voltados para ela. Por estar em uma cota inferior em relação às ruas que a cercam, ela passa a ser vista da calçada. Ao mesmo tempo, ela oferece um espaço verde reservado e acolhedor. A criação de espaços verdes e arborizados cria um ambiente agradável, permeabiliza o solo e reduz a temperatura do local. Jardins verticais enfeitam os muros que cercam o espaço, escondendo o concreto. Todo esse 162
trabalho paisagístico cria um cenário que dá a sensação de que a cidade e a natureza estão em equilíbrio. O novo espaço possui estabelecimentos comerciais, espaços livres multifuncionais e é equipado com mesas, bancos, lixeiras e banheiros. Além do parque ser visto, ele tem que ter uma boa infraestrutura para atender e atrair mais usuários, garantindo que o espaço esteja sempre sendo usado e não deteriore. Um volume atravessa o vão, servindo de passarela para atravessar a quadra pelo meio, seguindo o eixo da Rua Gravataí. Ele possui, na parte superior, uma cobertura verde equipada com bancos, cestos de lixo e iluminação artificial, oferecendo um lugar para estar, com uma privilegiada e ampla vista para o Parque Minhocão e para o eixo do Viaduto Júlio de Mesquita Filho. Na parte debaixo, uma academia de ginástica de parceria público privada. A ligação entre os níveis e o parque é feita por rampas com 8% de inclinação. A via de acesso “Acesso a Rua da Consolação” pela Rua Augusta é um dos extremos da via elevada que atravessa todo o Parque Minhocão, tendo a Avenida Francisco Mata-
razzo no outro extremo. Não foi pensado em nenhuma relação direta com o Parque Augusta. Talvez os equi-
pamentos e atividades oferecidas por eles possam, de alguma forma, se complementar.
FIG.56. Lovejoy Plaza, Portland / Lawrence Halprin
163
Primeira versão da Praça Roosevelt no nível do túnel
164
165
166
167
7.18 Centro Cultural Minhocão O trecho no qual a Avenida General Olímpio da Silveira se sobrepõe à Avenida Pacaembu até o Largo Padre Péricles é transformado em um centro cultural. Este oferecerá salas de estudo e atividades de forma complementar aos do Memorial da América Latina. No trecho em que as avenidas se sobrepõem, é criado mais um nível em cima da estrutura elevada. Este se torna uma praça suspensa que oferece vista cruzada da cidade, através do eixo da Avenida Pacaembu e do eixo do Minhocão. Ele serve de cobertura para parte do centro cultural. O espaço de circulação da parte elevada é feito pelas laterais deste espaço. A circulação vertical é toda feita através de um prédio habitacional de uso misto, construído ao lado. Liga o nível da rua com o elevado, e este com a praça suspensa. No nível do chão, o paisagismo incorpora a Praça Dom Ernesto de Paula e outras áreas verdes no final da Avenida General Olímpio, pouco antes do túnel, tornando-se um espaço arborizado, agradável para repouso e leitura. O túnel é transformado num espaço para oficinas, palestras, apresentações e outras 168
atividades. É construído um edifício de acesso pela Avenida Francisco Matarazzo, de forma a possuir cobertura verde acessível, marcando um dos extremos do Parque Minhocão.
FIG.57. Centro Cultural São Paulo / Eurico Prado Lopes e Luiz Telles
169
170
171
172
7.19 Creche e Escola Minhocão Este complexo é localizado no Largo do Arouche, nas quadras adjacentes ao antigo terminal da Santa Cecília e ao lado da estação Santa Cecília de metrô. É pública e faz parte da rede de creches e escolas presentes na cidade e em outros pontos do Parque Minhocão. O terreno selecionado para a implantação do complexo é bastante amplo, possibilitando o desenho de edifícios baixos com a presença de amplos espaços abertos de recreação para as crianças. Ele é formado por edificações de, no máximo, quatro andares. Rodeado por áreas verdes, pátios e quadras. Estes espaços de lazer são abertos ao público nos finais de semana. Mantém relação com o Largo do Arouche, a Avenida São João, a Estação de Metrô e Praça da Santa Cecília, e o Parque Minhocão. A escola está localizada próxima do centro e do lado da estação de metrô. A sua localização é estratégica, facilitando para as famílias na hora de deixar e buscar suas crianças, antes e depois do trabalho.
173
7.20 Paisagismo O trabalho paisagístico feito tem o objetivo de criar espaços agradáveis e diversificados para os usuários, além de colocar mais áreas verdes e permeáveis na cidade. A vegetação usada é resistente às condições da cidade (criadas pelo nível de poluição, alteração da paisagem, edificações etc.). As espécies usadas na parte elevada são diferentes das usadas na parte inferior. Na parte superior são usadas plantas que necessitam de pouco substrato e pouca água (para não sobrecarregar a estrutura) e, na parte inferior, plantas com raízes mais profundas. As árvores usadas na parte superior são de pequeno porte. As colocadas sobre o solo são árvores de pequeno e médio porte. Ambas de tronco fino e copas pouco densas, criando um ambiente sombreado sem obstruir a vista, nem horizontal e nem vertical. Mantendo a transparência visual. Árvores de médio e grande porte já existentes serão mantidas e incorporadas ao novo desenho. O espaço criado na parte superior visa manter a privacidade dos apartamentos mais próximos, criar áreas sombreadas para descanso, e ajudar a baixar a temperatura da cidade. E, na parte inferior, permeabilizar o 174
solo urbano, criar áreas sombreadas para o passeio e descanso, e baixar a temperatura da cidade. O posicionamento de bancos e árvores no nível inferior não é repetitivo; apesar de manter a mesma linguagem, cria variações de sombreamento e lugares de repouso, dando a opção de ficar sentado no sol ou na sombra, por exemplo. O passeio linear pela calçada também se torna mais dinâmico. Os espaços mais abertos podem abrigar usos variados. Mesas e cadeiras podem ser colocadas, pequenas vendinhas podem ocorrer, ou alguma atividade espontânea criada pelos usuários, por exemplo. Pisos verdes são usados no chão da cidade de forma visualmente interessante para reduzir o acúmulo de calor e permeabilizar o solo urbano. A Praça Roosevelt apresenta jardins verticais e possui algumas árvores de grande porte.
FIG.58. Pocket Park. Paley Park, New York
7.21 Iluminação artificial A iluminação artificial é trabalhada pensando no uso noturno que o espaço vai oferecer sem agredir os moradores do entorno. Na parte superior de praças suspensas e vias de passeio, a iluminação é instalada na base do guarda corpo, iluminando apenas a pista, sem jogar luz direta para dentro dos apartamentos. Pequenos postes de luz são adicionados no meio das praças suspensas por serem espaços mais amplos. Na calçada, parte da iluminação vem dos térreos comerciais e de galerias. Na parte inferior do elevado, luzes são instaladas na base dos bancos, pequenos postes de luz, e no chão, apontando para cima, refletidos nas árvores e parte da estrutura. A intenção é criar um ambiente agradável para passear e estar. A calçada da Praça Roosevelt e as suas quadras possuem postes de iluminação.
176
7.22 Questão do Urbanismo Durante a semana de palestras organizada pelo Arq. Futuro (plataforma de discussão sobre o futuro das cidades) com o tema “A Cidade e a Água”, que ocorreu em Setembro de 2014, um dos convidados foi o arquiteto, urbanista e Professor Doutor Liu Thai Ker. Ele foi responsável por planejar várias grandes cidades da Ásia, tendo Singapura como o estudo de caso mais famoso e bem sucedido. Ele presta consultoria para o planejamento de muitas outras grandes cidades pelo mundo. Durante o bloco de perguntas e respostas, perguntaram-lhe sobre o que achava da Cidade de São Paulo, onde habitam mais de dez milhões de pessoas. Sem precisar pensar muito para responder, afirmou que esta cidade precisa ser planejada e administrada como se fossem múltiplas cidades. Diz que novos centros devem ser criados, com habitações, empregos, e infraestrutura urbana completa. O fluxo diário deve ocorrer em volta destes centros, e eventualmente de um para o outro. Uma cidade desta densidade não pode funcionar com um centro só. Este pensamento está presente nesta proposta de cidade. São verdades que aprendemos durante o curso, mas não sabe-
mos como podem ser aplicadas ou se vão ser aplicadas algum dia, de forma rigorosa. Tem a questão de interesse político, do mercado imobiliário, da cultura etc. Mesmo sendo tão complexo o contexto de São Paulo, este trabalho pretende trazer à vida algumas dessas ideias que restauram o bem-estar e a eficiência da cidade.
177
7.23 A Cidade Radiante de Le Corbusier Enquanto pensava no que estava propondo para o Parque Minhocão, percebi que estava aplicando ideias inspiradas nos ideais utópicos de cidade moderna de Le Corbusier. Tanto na forma, quanto na dinâmica da cidade. Suas ideias surgem a partir da crítica, do inconformismo com a realidade das cidades industriais. Ele propõe uma cidade com outros valores econômicos e sociais, onde as pessoas são valorizadas. Assim como a Cidade Radiante, o Parque Minhocão é uma utopia que surge de um descontentamento e crítica à cidade atual, e muita reflexão sobre o assunto. Corbusier propunha um esquema de cidade-parque. Torres adensadas implantados num vasto campo arborizado livre e com equipamentos de lazer. As torres teriam todos os serviços necessários para se habitar: escolas, creches, enfermarias, serviço de lavanderias, limpeza domiciliar, restaurantes etc. Enquanto as pessoas trabalhavam, suas casas eram arrumadas e limpas, suas roupas lavadas, suas crianças estavam nas creches e escolas (em algum andar do prédio), e sua comida sendo preparada. Ele estava criando 178
uma sociedade em que as pessoas não precisavam se preocupar com as necessidades básicas, elas vinham junto com o direito de habitar. Ele também desenha a cidade para que trajetos desnecessários não ocorram, otimizando o dia das pessoas e possibilitando mais tempo familiar e de lazer. Eram ideais comunistas. As pessoas trabalhariam sem se preocupar com seu bem estar, que já eram garantidos. Adoto a ideia de se ter esses serviços essenciais próximas à moradia. Escolas, creches, hospitais, mercados, restaurantes e o acesso fácil ao transporte público (cidade). Enquanto Corbusier reúne tudo em um arranha-céu, tento reunir ao longo do Parque Minhocão. A Creche e Escola Minhocão ilustram bem a dinâmica de poder deixar as crianças no caminho do trabalho. O fácil acesso entre a moradia e o trabalho ilustra a redução de trajetos desnecessários pela cidade, resultando em mais tempo livre. E o espaço do Parque Minhocão, que é um espaço de lazer, de livre circulação de pedestres, para os moradores da cidade.
FIG.59. Le Corbusier Atelier, 35 rue de Sèvres, Paris, Au tableau noir, la “Ville radieuse”(1949) 179
7.24 Dinâmica imaginada para o dia a dia O Parque Minhocão é um resumo da minha formação na FAU. Uma resposta para a cidade em que vivo, agregando todo o conhecimento adquirido durante estes anos de curso. Um espaço de multifuncional, vivo e dinâmico. Uma cidade que gostaria de ter e na qual gostaria de morar. Venho aqui para compartilhar como imagino ser um dia qualquer da semana neste lugar.
180
Um dia comum 06h – 07h30min
dios imediatos. O novo espaço é usado como parque linear.
O dia começa a clarear. O Parque Minhocão está calmo. Só se escuta o som dos poucos carros que passam pelas travessas, os pássaros, e alguma eventual janela emperrada sendo aberta. Pessoas indo comprar pão nas padarias locais, que começam a funcionar neste horário. Outras, já há algum tempo, estão fazendo exercícios matinais no parque. Correndo, caminhando, andando de bicicleta de um lado para o outro na via elevada. Grupos se juntando nos espaços abertos para praticarem alguma atividade de alongamento ou aeróbica. A Praça Roosevelt concentra um bom número de usuários por conta da academia de ginástica e equipamentos ao ar livre. Grande parte das pessoas presentes são moradores da região, não apenas dos pré-
Os estudantes e alguns outros funcionários estão saindo neste horário. Alguns caminham sozinhos e outros estão se agrupando conforme vão andando em direção à escola ou acessar algum transporte público. 08h – 10h O Parque Minhocão começa a ficar movimentado. Moradores estão indo para o trabalho e levando as crianças para a Creche e Escola Minhocão. O elevado fica consideravelmente cheio, por estar conectado a alguns prédios habitacionais, ter acesso direto às estações de metrô, e não serem interrompidas pela passagem de automóveis nas travessas. O nível da rua também está movimentado. No meio do fluxo de pedestres, alguns se encontram parados nos pontos de ônibus. 181
As entradas da creche e escola, localizadas ao lado da Estação Santa Cecília, se mantêm bastante ocupadas. Famílias chegando e partindo sem parar.
estão recolhendo as folhagens caídas e limpando os bancos do calçadão. Isso ocorre até as dez da manhã. 10h – 12h
Grande parte das pessoas trabalha no centro e vai andando ou pedalando. Isso otimiza a dinâmica da cidade, como se o combustível que faz o centro ligar e funcionar estivesse já dentro, simplesmente circulando e se esquentando. Outra parte pega o sistema metroviário ou espera nos pontos de ônibus circulares. A maioria delas chegará no trabalho em menos de meia hora. Esta proximidade da moradia com o trabalho e o lazer, melhoram muito a qualidade de vida. Os estabelecimentos comerciais do Parque Minhocão estão se preparando para começar o dia, repondo estoques e fazendo a limpeza. A maioria dos funcionários também é moradora da região central. É hora da manutenção. Alguns caminhões de transporte estão parados e sendo carregados ou descarregados. Funcionários 182
O Centro Cultural e a maioria das lojas e serviços começam a funcionar. Restaurantes ainda estão fechados, se preparando para o almoço. Caminhões param no espaço de manobra para entregas corriqueiras. A via elevada e as praças suspensas continuam movimentadas. Moradores da região continuam aparecendo para fazer seus exercícios do dia, ou apenas passar tempo. O afastamento das grandes vias tornam o local calmo e agradável. Muitos moradores dos prédios imediatos descem e aproveitam o espaço, como se fosse o grande condomínio deles. Mães com filhos pequenos, gestantes e pessoas idosas aproveitam para passar tempo ao ar livre, caminhar e tomar sol.
Alguns conhecidos da vizinhança se encontram por acaso e batem um papo. Cafés localizados nas praças suspensas abrem e colocam bancos e mesas sombreadas na praça, que já recebem alguns clientes conhecidos. É comum terem funcionários que moram nos arredores do Parque Minhocão e receberem seus vizinhos. Alguns jovens e adolescentes, sem aula no período manhã aproveitam para se encontrar e fazer alguma coisa: jogam bola nas quadras da Praça Roosevelt ou estudam e fazem lições nos espaços do Centro Cultural. Crianças da creche estão tendo atividades nas áreas abertas em volta do complexo e nas praças suspensas. 12h – 14h Calçadão cheio. Mesas e cadeiras (compradas em conjunto pelo grupo de restaurantes, lanchonetes, e cafés) são colocadas nos espaços mais abertos, transformando o lugar em uma grande
praça de alimentação. Estudantes, funcionários, moradores da região, visitantes de outras regiões e turistas aparecem para fazer refeições e passar o tempo. A variedade de serviços e atividades oferecidas ao longo do Parque Minhocão permite ao usuário aproveitar melhor o seu tempo de descanso, que pode dar uma caminhada, ler um livro, procurar um presente ou até ir ao banco, por exemplo. Cinemas e teatros começam suas atividades. A parte de cima do elevado já fica menos movimentada. Alunos voltam da aula, funcionários voltam para o trabalho. Pessoas sentadas ou deitadas nos bancos sombreados. De vez em quando passa alguém correndo ou andando de bicicleta. Os cafés em geral estão sendo bem frequentados (praças suspensas, antiga Praça Roosevelt, Centro Cultural Minhocão). 183
Com o Sol forte, a maioria das pessoas prefere se deslocar sob as sombras no nível inferior. 14h – 18h O espaço volta a acalmar. Restaurantes atendem seus últimos clientes antes de fechar e começar a se preparar para o turno da noite. Muitos turistas, visitantes de bairros mais distantes e outros clientes permanecem no parque. Não parecem ter pressa ou nada agendado para o dia. Muitas tribos urbanas encontraram o seu espaço no Parque Minhocão e o mantém frequentado, diminuindo os atos de vandalismo. Temos esqueitistas e patinadores, dançarinos, futeboleiros, jogadores de jogos de mesa/tabuleiro, casais, etc. Normalmente estudantes com as tardes livres (estas tribos tendem a influenciar na dinâmica do tipo de comércio presente no parque). Centro Cultural Minhocão está cheio de 184
pessoas lendo, fazendo tarefas e estudando em grupo, apreciando a vista e simplesmente passando o tempo. 18h – 19h Alunos e funcionários, moradores da região, estão retornando para as suas casas. Famílias buscam suas crianças na Creche e Escola Minhocão. Restaurantes estão prontos para o turno da noite. A iluminação artificial é ligada. 20h – 23h O Parque Minhocão volta a ficar movimentado. É um espaço de lazer da cidade. É um lugar que as pessoas vão para relaxar depois do dia de trabalho ou estudo. Muito grupos de amigos e colegas de trabalho se reúnem para comer e tomar alguma coisa.
Cinemas e teatros estão razoavelmente cheios.
Restam, enfim, apenas os vigias fazendo suas rondas. A maioria deles também mora nos prédios.
Muitos ciclistas aproveitam as ciclovias da cidade e passam pela via elevada. Muitos casais e amigos frequentam os bancos das praças suspensas e caminham pelas vias elevadas. Muitos estão usando o espaço elevado, pois a cidade fica bonita de ser vista de noite. 23h – Restaurantes e bares terminam de arrumar as coisas e se preparam para fechar. A coleta de lixo está sendo feita. Caminhões de lixo circulam pelo calçadão. Alguns grupos de pessoas ainda permanecem no local, conversando. Alunos e funcionários retornam para suas casas. Eventualmente algum carro ou taxi entra no calçadão para deixar pessoas. 185
8. Considerações Finais Até entrar na FAU, não queria ser arquiteto (no sentido mais amplo), desconhecia totalmente este ofício. Como disse no início do trabalho, entrei na escola por gostar de desenhar. Sabia que a grade de matérias incluía matérias de desenho industrial também. Fui começando a entender e apreciar arquitetura apenas nos últimos anos. A entende-la como uma forma de arte, esta que não se resume apenas a projeto de edificação, paisagismo, planejamento urbano etc. Engloba tudo isso e mais outras questões. O arquiteto tem uma sensibilidade característica, vê o mundo e produz de forma diferenciada. Sonhamos em mudar o mundo a nossa volta, a melhorar a vida das pessoas, em criar coisas que, além de funcionais, toquem o coração de alguma forma. Arquitetura é arte, assim como a música, o desenho, a poesia, a fotografia, a gastronomia etc. E com o tempo, passei a entender a arte como uma coisa só, pois através da arquitetura comecei a apreciar outras formas de arte, e a incorpora-las ao trabalho. E, também, a produzi-las como um arquiteto. Durante o processo de TFG percebi que, apesar de muitas vezes, não saber citar nomes de autores e teorias, tinha convicção
dos valores que tinha adquirido neste período na FAU. Não são apenas coisas que se aprende nas aulas, mas, também, no convívio com outros alunos e profissionais da área, nos debates e conversas, no trabalho, e com a própria arquitetura do prédio da FAU. Este TFG tomou forma nos últimos segundos do semestre, e por isso, se tornou um retrato honesto do aluno que a escola está formando. Não tinha mais tempo no momento em que entendi o que seria este trabalho. Então ele saiu como um puro reflexo do que já tinha dentro de mim. Diria que o trabalho ainda está em andamento. Terminamos apenas quando o tempo acaba, quando somos forçados a terminar, mas sempre tem algo para mudar. Se tivesse mais tempo, certamente aprofundaria mais as questões, detalharia mais o projeto e corrigiria alguns erros, que irei perceber depois mas serei forçado a deixar. Por fim, agradeço a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo por me dar as ferramentas necessárias para continuar me desenvolvendo intelectualmente e artisticamente, e por ensinar a ver e fazer arquitetura. 189
9. Referências Bibliográficas ARTIGAS, R.; MELLO, J.; CASTRO, A. C. (orgs). Caminhos do Elevado: Projetos e Memórias. São Paulo: Imprensa Oficial, 2008. 144p. JACOBS, Jane. Morte e Vida de Grandes Cidades. 2ª Edição. São Paulo: Martins Fontes, 2009. 510p. DAVID, J.; HAMMOND, R.. HIGH LINE: A história do parque suspenso de Nova York. São Paulo:BEI Comunicação, 2013. 340p. GUTKIN, Irina. The Cultural Origins of the Socialist Realist Aesthetic, 1890-1934. Northwestern University Press. 1999. 244p FISHMAN, R. Urban Utopias in the Twentieth Century: Ebenezer Howard, Frank Lloyd Wright, and Le Corbusier. Massachusetts Institute of Technology. 1982. Disponível em: http:// media.johnwiley.com.au/product_data/excerpt/02/14443308/1444330802-23.pdf. Acesso em: 22/06/2015. BÜHLER, M.; PASTORELO, P.; SODRÉ, J. Elevado 3.5. [Filme-video]. Produção de Matias Mariani, direção de Maíra Santi Bühler, Paulo Pastorelo e João Sodré. São Paulo, 2010. 60 min. Color. Son. WORKSHOP. Olhar para não ver: reprojetando o espaço público do Minhocão. 31a Bienal de Arte de São Paulo, outubro de 2014. VITRUVIUS. Prêmio Prestes Maia de Urbanismo / 2006. Disponível em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/06.067/2689?page=1.Acesso em 21/06/2015.
190
LAMAS, Julio. Afinal, o que será do Minhocão?. EXAME. 19 de Ago. 2014. Disponível em: http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/afinal-o-que-sera-do-minhocao. Acesso em: 19/06/2015. SUMMER, Anne. Projeto-ligação-leste-oeste. Disponível em: http://www.annemariesumner.arq.br/projeto/ligacao-leste-oeste/. Acesso em 21/06/2015. O ELEVADO, triste futuro da avenida. O Estado de São Paulo. 01 dez. 1970. Disponível em: http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19701201-29342-nac-23-999-23-not/. Acesso em: 17/06/2015. NASCIMENTO, Douglas. Seja bem-vindo, Minhocão! São Paulo Antiga. 14 de Ago. 2014. Disponível em: http://www.saopauloantiga.com.br/propagandas-do-minhocao. Acesso em: 17/06/2015.
191
10. Crédito das imagens DESENHO DA CAPA. Elaborado pelo autor. FOTOS DA PÁG. 2, 3. De TIPUANA FOTOS AEREAS. Disponível em: http://tipuanaimagens. com.br/portfolio/minhocao/. Acesso em 21/06/2015. FOTO AÉREA E MAPAS. Do Google, adaptado pelo autor. DESENHOS E FOTOS DE VISITA. Elaborado pelo autor. FIG.1. - FIG.3. Acervo de fotos do Folha de São Paulo: Acervo Minhocão - Elevado Costa e Silva. Disponível em: http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/10388-acervo-minhocao-elevado-costa-e-silva. Acesso em 21/06/2015. FIG.4. De Foto Bayer. Disponível em: https://sampahistorica.wordpress.com/2014/ page/4/. Acesso em 21/06/2015. FIG.5. Cartão Postal. Disponível em: https://quandoacidade.wordpress.com/page/28/. Acesso em 21/06/2015. FIG.6. - FIG.15. Acervo de fotos do Folha de São Paulo: Acervo Minhocão - Elevado Costa e Silva. Disponível em: http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/10388-acervo-minhocao-elevado-costa-e-silva. Acesso em 21/06/2015. FIG.16. De HIDROSERVICE. Disponível em: http://www.saopauloantiga.com.br/propagandas-do-minhocao/. Acesso em 21/06/2015. FIG.17. De TIPUANA FOTOS AEREAS. Disponível em: http://tipuanaimagens.com.br/portfolio/minhocao/. Acesso em 21/06/2015. 192
FIG.18. Capa do Filme Elevado 3.5. FIG.19. De Ciro Miguel e Bruna Canepa. FIG.20. - FIG.21.Disponível em: http://www.cristinamello.com.br/?p=4120. Acesso em 21/06/2015. FIG.22. De Le viaduc des arts. Disponível em: http://www.leviaducdesarts.com/en/361. html. Acesso em 21/06/2015. FIG.23. De Stephen Adjaidoo. Disponível em: http://www.stephenadjaidoo.com/france/. Acesso em 21/06/2015. FIG.24. Disponível em: https://wvartist.wordpress.com/2012/04/22/a-short-story-about-a-photo-album/nyc-highline-1920-972_4/. Acesso em 21/06/2015. FIG.25. Disonível em: http://goddensudik.blogspot.com.br/2012_04_01_archive.html. Acesso em 21/06/2015. FIG.26. Disponível em: http://www.fieldoperations.net/project-details/project/highline. html. Acesso em 21/06/2015. FIG.27. Disponível em: http://blog.sub-studio.com/2009/07/the-highline/. Acesso em 21/06/2015. FIG.28. Disponível em: http://www.dezeen.com/2014/09/22/high-line-park-phase-three-final-section-opens-new-york/. Acesso em 21/06/2015. 193
FIG.29. Disponível em: https://quandoacidade.wordpress.com/page/58/. Acesso em 21/06/2015. FIG.30. Disponível em: http://blog.rosekennedygreenway.org/2014/11/19/the-greenway-makes-history-in-the-boston-time-capsule/. Acesso em 21/06/2015. FIG.31. - FIG.32. De Boston Magazine. Disponível em: http://www.cnu.org/highways/boston . Acesso em 21/06/2015. FIG.33. De Alex S. MacLean. Disponível em: http://blog.rosekennedygreenway. org/2014/11/19/the-greenway-makes-history-in-the-boston-time-capsule/. Acesso em 21/06/2015. FIG.34. - FIG.35. Disponível em: http://www.nclurbandesign.org/uncategorised/cheonggyecheon-river-restoration-project-restoration-environmental-social-economic-seoul/. Acesso em 21/06/2015. FIG.36. Disponível em: http://land8.com/profiles/blogs/cheonggyecheon-park-breathes-life-and-greenery-into-the-heart-of-. Acesso em 21/06/2015. FIG.37. Disponível em: http://www.erzeki-korea.hu/setak/a-kiszabaditott-patak/. Acesso em 21/06/2015. FIG.38. - FIG.45. De 20 Prêmio Prestes Maia. 2006. FIG.46. De Acervo da FAU USP. 194
FIG.47. De Anne Marie Sumner - Arquitetura. Disponível em: http://www.annemariesumner.arq.br/projeto/ligacao-leste-oeste/. Acesso em 21/06/2015. FIG.48. Disponível em: https://keencosmopolitan.wordpress.com/page/15/. Acesso em 21/06/2015. FIG.49. De Brett Boardman. Disponível em: https://keencosmopolitan.wordpress.com/ page/15/. Acesso em 21/06/2015. FIG.50. De Alan Teixeira. Disponível em: http://www.huffingtonpost.com/jaime-rojo-steven-harrington/eduardo-kobra-pays-honor-to-oscar-niemeyer_b_2707936.html. Acesso em 21/06/2015. FIG.51. De Jornal Porta Leste. Disponível em: http://jornalportaleste.blogspot.com. br/2012/01/havaianas-comemora-seus-50-anos-com-um.html. Acesso em 21/06/2015. FIG.52. De The Robot Must Eat. Disponível em: http://therobotmusteat.com/2013/11/22/ yakitori-alley-yurakucho-tokyo/. Acesso em 21/06/2015. FIG.53. - FIG.54. De OldSP. Disponível em: http://oldsaopaulo.tumblr.com/ post/91472113510/we-found-it-sao-joao-avenue-in-1952-and-2014. Acesso em 21/06/2015. FIG.55. De Viviane de Paula. Disponível em: http://colecionadordepedras1.blogspot.com. br/2012/09/sarau-da-cooperifa-na-ocupacao-maua_16.html. Acesso em 21/06/2015. FIG.56. De Julian Raxworthy. Lovejoy Plaza, Portland by Lawrence Halprin. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/julian_raxworthy/7242788454. Acesso em 21/06/2015. 195
FIG.57. De Alice Vergueiro. CENTRO CULTURAL SÃO PAULO. Disponível em: https://alicevergueiro.wordpress.com/imagem-fotografica/arquitetura-urbanismo/centro-cultural-sao-paulo/. Acesso em 21/06/2015. FIG.58. De Aleksandr Zykov. Paley Park, New York. Disponível em: https://www.flickr.com/ photos/infanticida/8226510967. Acesso em 21/06/2015. FIG.59. De Willy Rizzo. Le Corbusier Atelier, 35 rue de Sèvres, Paris, Au tableau noir, la “Ville radieuse”. Disponível em: https://pleasurephoto.wordpress.com/2012/10/08/le-corbusier-atelier-35-rue-de-sevres-paris-au-tableau-noir-la-ville-radieuse-photo-willy-rizzo/. Acesso em 21/06/2015.
196