Lua Nova Coleção Associação Lua Nova Volume 2
ACOLHER E SER ACOLHIDO
Presidenta da República Dilma Vana Rousseff Vice-Presidente da República Michel Miguel Elias Temer Lulia Ministro da Justiça e Presidente do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas José Eduardo Martins Cardozo Secretário Nacional de Políticas sobre Drogas Vitore André Zílio Maximiniano Revisão de Conteúdo Equipe Técnica – Senad Diretoria de Articulação e Coordenação de Políticas sobre Drogas Coordenação Geral de Políticas de Prevenção, Tratamento e Reinserção Social
O conteúdo intelectual dos textos é de responsabilidade dos organizadores e representantes da Associação de Formação e Reeducação Lua Nova e não expressa, necessariamente, a posição da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas. Venda Proibida. Todos os direitos desta edição reservados à SECRETARIA NACIONAL DE POLÍTICAS SOBRE DROGAS (SENAD). Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida ou gravada, por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Secretaria Nacional sobre Drogas. Direitos exclusivos para esta edição: Secretaria Nacional sobre Drogas – Senad Esplanada dos Ministérios Ministério da Justiça Bloco T, Edifício Sede. 2º Andar, Sala 208 Brasília – DF, CEP 70.064-900
Associação Lua Nova COORDENAÇÃO GERAL Raquel Barros PRODUÇÃO DE CONTEÚDO Maysa Mazzon Mariana Jabur Gustavo Dordetto Leicia Firmino Yame Vieira EDIÇÃO GERAL E REDAÇÃO Cinthia Azir Iza Justino Silvina Mojana REVISÃO Lívia Gusmão PROJETO E EDITORAÇÃO GRÁFICA Silvina Mojana Melina Gutierrez IMAGENS Silvina Mojana Antonello Veneri AGRADECIMENTOS Edith di Giorgi, por caminhar conosco ISBN: 978-85-69408-02-4
PREFÁCIO A Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad) é o órgão do Governo Federal responsável pela articulação de políticas públicas de prevenção, tratamento e reinserção social de usuários e dependentes de drogas. Essa missão exige um esforço conjunto, no qual todos os agentes governamentais ou não governamentais podem - e muito - contribuir. No Brasil, muitas iniciativas para prevenção, tratamento e integração social de usuários e dependentes de drogas merecem destaque, e a Senad vem buscando identificar boas práticas, investir no estudo e registro para sistematizálas e possibilitar que sejam referência em outras localidades. Esforços advindos de diferentes setores da sociedade estão envolvidos na atenção ao uso abusivo de drogas, empregando pesquisas, recursos e operações, visando eliminar as situações de vulnerabilidade causadas por elas. São escassas as iniciativas voltadas para as pessoas que fazem uso, ou na relação que desenvolvem no processo de vinculação com as drogas. Nesse diapasão, os agentes de transformação ganham cada vez mais espaço para uma melhor abordagem junto ao usuário, apresentando caminhos possíveis que nascem do encontro com ele, promovendo diálogos pouco abordados e explorados. Nos espaços voltados para cuidado e atenção ao usuário de drogas, o olhar e as práticas sobre este clamam por transformações - desde
mudanças nas metodologias e ferramentas de intervenção junto ao indivíduo e sua comunidade, como a mudança no próprio objeto da intervenção. Desse modo, o foco, antes apenas no usuário, passa a abranger a comunidade na qual ele vive e estabelece diversas relações, buscando oferecer as mais variadas e ricas oportunidades de interações, ampliando sua rede. A Experiência da Lua Nova, sistematizada nestes quatro volumes e em sua segunda edição, nos convida a mergulhar nesse olhar e, sobretudo, nos instiga e prepara para disseminar essa visão em espaços que desejam assim fazê-lo. Afinal, desenvolver a metodologia da Lua Nova não implica ter um prédio ou uma estrutura para acolher jovens mulheres usuárias de drogas, e seus filhos, e sim estabelecer relações de parceria e troca com essas jovens, focando em suas potencialidades e brilhos. A leitura da sistematização das experiências da Lua Nova nos empresta as “lentes da inclusão” para que possamos desenvolver e praticar novos olhares baseados no estabelecimento de relações nas redes, nas trocas de potenciais e saberes e na participação como principal instrumento de intervenção. O livro é dinâmico, complexo, recheado de possibilidades a serem empregadas em contextos de vida de pessoas em sofrimento social, que vivenciam questões como pobreza, injustiça social, prostituição ou abuso sexual -
embora tais temas não ocupem o centro do trabalho na Lua Nova. As pessoas são o foco principal; as vulnerabilidades assumem o pano de fundo da história. Portanto, profissionais em busca de estratégias mais inovadoras e metodologias mais sensíveis para estes contextos encontrarão inspiração nestes livros. Equipes de trabalho de diferentes políticas públicas que buscam caminhos para garantir a participação e a adesão dos usuários nos serviços para eles voltados também encontrarão possibilidades nestes livros. Pessoas que já estiveram em situação de risco, usaram drogas e vivenciaram ou vivenciam situações de sofrimento social também podem mergulhar no livro e encontrar motivação para buscar seu brilho - que, às vezes, parece apagado, mas que está apenas adormecido, necessitando de oportunidades. Gestores públicos à frente de estratégias e planos integrados voltados para atenção ao usuário de drogas encontrarão, nestes livros, propostas interessantes e caminhos instigantes. Organizações não Governamentais, Associações comunitárias, enfim, diferentes atores que buscam usar as “lentes da inclusão” encontrarão diálogos possíveis nestes livros. Boa leitura! Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas
SUMÁRIO Introdução..................................................................................................................................................8 Ficha de primeiro contato..............................................................................................................24 Processo de Acolhimento..............................................................................................................30 Eu e a Casa.............................................................................................................................................36 Eu e eu mesma.....................................................................................................................................41 Grupos de Aprendizagem.............................................................................................................47 Eu e meu filho.......................................................................................................................................52 Eu e o trabalho.....................................................................................................................................57 Redução de Danos Tratamento Comunitário......................................................................59
Lua Nova Dando forรงas para quem tem vontade www.luanova.org.br
INTRODUÇÃO A Associação Lua Nova tem como missão “resgatar a autoestima, a cidadania, o espaço social, a autossustentabilidade e o direito à maternidade de jovens mães em situações de risco, possibilitando a vivência prazerosa do papel materno e a formação de crianças saudáveis”. Conforme apontamos no volume 1, reforçamos aqui que a metodologia da Lua Nova enfatiza a quebra do isolamento e propõe o enfrentamento da realidade e do entorno social. O objetivo é mobilizar os jovens para que enfrentem a vida cotidiana de modo responsável, assumam as dificuldades e convivam com as contradições, sem fugir ou se submeter passivamente ou responder a ela com violência. O desafio de viabilizar este objetivo na nossa realidade social e cultural, na qual as condições de vida das jovens e o acesso a serviços são precários, tem exigido a busca criativa por novas soluções e estratégias. Nossa pretensão é criar propostas inovadoras que abranjam, em sua complexidade, as questões de vulnerabilidade, como saúde, educação, profissionalização, geração de emprego e renda, sensibilização e inserção social efetiva na comunidade e moradia. A Lua Nova atua no sentido de reforçar a autoestima do seu público-alvo, apoiando as jovens a reconquistarem seu espaço social e exercerem seus direitos de cidadania. A Organização cria oportunidades para que as jovens desenvolvam competências, bem como influências políticas públicas municipais, estaduais e nacionais, sensibilizando atores institucionais, convidando-os a uma reflexão sobre as condições desta população e as possíveis estratégias de melhoria das redes de assistência.
A Lua Nova desenvolveu também centros de profissionalização e geração de renda oficina Criando Arte, Padaria Lua Crescente e Empreiteira Escola - e sempre procura trabalhar com propostas inovadoras como teatro, vídeos e dança, atuando como agentes de prevenção e de acolhimento. As metodologias são de valorização e empoderamento, desenvolvendo intervenções diferenciadas nas questões relacionadas ao uso de drogas, AIDS, exploração sexual, prostituição e gravidez na adolescência.
Dentre as atividades realizadas junto às meninas, as ações de organização contribuem para uma mudança de cultura, status social e desenvolvimento de potencialidades de jovens e mães em situação de risco social, através de proposta concreta de geração de renda e de inclusão social. Assim, essas jovens passam de assistidas a formadoras e multiplicadoras de tecnologias que poderão aumentar sua renda mensal e sua autoestima, facilitando, consequentemente, a inserção laboral dessas mulheres.
ACOLHER Chegar a uma nova residência. Chegar, muitas vezes, trazendo experiências negativas de outras instituições ou vivendo há algum tempo na rua. Chegar contrariada, por ordem do juiz, com as dúvidas de uma primeira gravidez ou, ainda, trazendo o sofrimento do uso de drogas ou de outras situações de violência. Certamente, não é fácil chegar.
Nesse processo de acolhimento, entre novas possibilidades, descobertas e dificuldades, descobrimos que o maior problema vem dos caminhos percorridos por elas até acontecer esse encontro com uma instituição que as olhe de uma forma diferente, entendendo que suas qualidades superam as dificuldades vividas até então - e que tudo pode ser transformado a partir do desejo de cada uma -, sendo a Lua Nova uma parceira no acompanhamento do desenvolvimento de cada uma dessas mulheres, jovens mães, e seus filhos. O principal foco de atuação da Lua Nova é o vínculo da jovem com seu filho. Esse é um dos maiores suportes para a mudança e melhoria de vida dessas mães. A relação mãe e filho é uma das questões trabalhadas no acolhimento da jovem. Quando o acolhimento é feito, ou seja, a mulher chega até a Casa de Acolhimento da Lua Nova, entendemos que, de acordo com o histórico de cada uma dessas jovens, existe a dificuldade de ter um vínculo materno, pois em alguns dos casos, ou em sua grande maioria, não existiu uma referência de maternidade positiva. Muitas vezes, a dificuldade de ter um vínculo materno se torna um ciclo. Por isso, é necessário mudar de rumo, focando não apenas no problema, mas em soluções e formas de melhoria da situação.
Instrumentalização
relatórios
prontuários
ética
Acompanhamento
lei
PLANO DE ATENDAMENTO
COMUNITÁRIA CONDIÇÕES
JOVEM PROJETO DE VIDA
PUBLICOS SAÚDE
DIÁLOGO
DINAMICAS
JUDICIARIO
julgar
direitos
constranger
promessas
interesses
Ética Assistencialismo
Profissional
desestimulo
Acolher é... Não acolher é... Preocupar-se em se aproximar da jovem antes de entrar na residência, com ações de aproximação na rua, em espaços de triagem, albergues, entre outros. Criar um “rito de passagem”. Por exemplo, visitar a jovem antes de sua entrada a fim de facilitar a transferência de vínculo da instituição encaminhadora para a Lua Nova. Oferecer à jovem opções na rede de atendimento. Na residência, criar um clima de acolhida aconchegante. Envolver as outras residentes no acolhimento para que a jovem possa ter um “par” que a ajude a entender a Lua Nova, fortaleça a sua decisão de mudança e transmita confiança no novo ambiente.
Desrespeitar e não ouvir a jovem. Tratá-la como mais um “caso” e não como “sujeito”. Alimentar a angústia de “se livrar” da jovem. Criar visão da residência como “pronto-socorro”. Não garantir que o Conselho Tutelar conheça o papel da residência. Negociar com a instituição solicitante de forma inadequada na frente da jovem. Ceder em pontos considerados essenciais. Não haver alinhamento entre todos os envolvidos sobre o que é “situação de risco” e como lidar com ela. Não se preparar para lidar com situações de emergência, trabalhar sozinho, sem compartilhar o processo de atenção e proteção com outras pessoas e instituições.
O que caracteriza o acolhimento é a forma de se relacionar com o outro, é o estabelecimento de uma parceria, a troca de experiências e o rompimento com a lógica de “paciente” ou “assistido”. O acolhimento significa, para as jovens atendidas, ter pessoas em quem confiar e a possibilidade de entender a importância que isso faz na sua vida, passando a acolher também quando outra mãe chega ao local. O acolhimento pode ser manifestado por meio de gestos simples, como escutar a jovem debaixo da sombra de uma árvore, conduzi-la ao dentista ou médico, oferecer um pedaço de doce para tentar amenizar os sintomas da abstinência do uso de drogas, e muitos outros. A cada ação da jovem, oferecemos uma reação, baseada na valorização das habilidades, do saber e experiências de vida que ela traz. Neste momento, estabelece-se a parceria. Ao tratar as jovens com a escuta, superamos o olhar diagnóstico sobre a questão da vulnerabilidade, focando na potencialidade que o outro tem, propondonos a dialogar com seus brilhos e talentos. Utilizamos uma boneca nua feita no Criando Arte, representando como as jovens chegam fragilizadas aos nossos serviços e como estamos habituados a olhar para ela -
não enxergando nada!! -, e depois convidamos os participantes a vestir a boneca com seus olhares. Nesta oficina, provocamos os participantes acerca do olhar técnico, treinado a diagnosticar as vulnerabilidades em detrimento dos brilhos. Questionamos quantas habilidades, limitações, vulnerabilidades e brilhos conseguimos ver nesta jovem, a partir das definições a seguir:
Após esta reflexão, desenhamos um gráfico matemático, que forma um mapa. O mapa consiste em contar quantas habilidades, brilhos e limitações foram numeradas, para fazer um exercício de olhar: o que enxergamos com mais facilidade? O que temos mais dificuldades de encontrar?
oficina do brilho As equipes aprendem a apurar o olhar e enxergam o brilho com muita reflexão e diversão.
Este processo acontece na Lua Nova, nos espaços de Acolhimento - não deve ser confundido com Acolhimento Institucional, descrito no Estatuto da Criança e do Adolescente como uma medida de proteção provisória e excepcional, aplicada diante à violação de direito de pessoas em condições peculiares de desenvolvimento humano. O Acolhimento, para a Lua Nova, independe do prédio institucional e é a forma de se relacionar com a jovem. Precisa ter frequência, espaço-tempo afetivo, ritmo e intensidade. A pessoa acolhida tem que saber que o acolhimento terá continuidade, independente de sua etapa no tratamento - recaída, aumento no uso da substância e abstinência são alguns exemplos. A parceria, por sua vez, só se estabelece se reconhecemos alguns direitos fundamentais do acolhido e de quem acolhe, implícito nos seguintes passos: escutar, olhar, descoberta de potencialidades e brilhos, troca e rede.
tratamento convencional
unidade de acolhimento
O "tratamento" convencional considera o indivíduo como incapaz, sendo o assistencialismo um dos métodos de tratamento e acompanhamento da pessoa. Esse modelo de "tratamento" torna os resultados lentos e ineficientes por entender o usuário de drogas como doente, dependente de ajuda, focando nas dificuldades e fraquezas do indivíduo. Nesse tipo de tratamento, o usuário é isolado do convívio com a comunidade e passa a ser assistido, adotando uma rotina diferente repentinamente: interrompe o uso habitual da droga para substitui-la por remédios - ou seja, outro tipo de droga. Na abordagem metodológica convencional, a finalização do tratamento se torna difícil e demorada. Entende-se que, ao sair do local de tratamento, o indivíduo fica exposto e vulnerável ao uso da droga. É como se houvesse o perigo de ele usar a mesma quantidade ou uma quantidade maior que a usada anteriormente.
PH Antonello Veneri
Já o método baseado no acolhimento considera o indivíduo capaz de assumir responsabilidades, recebendo e oferecendo assistência aos demais que estão em condições de vida semelhante. No acolhimento, há momentos de escuta, independendo de acontecer em uma sala fechada ou em um local diferenciado, como numa ida ao mercado ou debaixo de uma árvore. O indivíduo não fica privado de participar da comunidade e não usa algum tipo de droga para substituir a droga habitual. A equipe trabalha em conjunto com as pessoas participantes dos projetos e todos focam na potencialidade do indivíduo, como um ser que tem habilidades e ideais. A relação da equipe com o usuário de drogas é uma relação de igualdade. As ações são desenvolvidas em parceria com os dispositivos da rede de serviços, como CAPS, Unidade Básica de Saúde, Casa de Acolhimento Transitório, entre outros. Apresentamos aqui a história de uma das nossas parceiras para que o entendimento do tratamento baseado no acolhimento seja mais claro e específico:
PH Antonello Veneri
VIDA DA BIANCA “Nasci na Bahia, no dia 5 de dezembro de 1980. Permaneci dois dias com minha mãe, Malvina, que queria me dar para qualquer um que quisesse. Sabendo disso, minha avó, a quem chamei de mãe a vida toda, e a minha tia Berenice foram me buscar. Fiquei morando em Pernambuco com a minha avó a quem chamo de mãe - e a tia Berenice, numa casa bem humilde. Meu pai era pedreiro e pescador, morava na mesma cidade, mas nunca convivemos juntos…” A família caracteriza-se como a menor unidade da sociedade, sendo considerado o primeiro, mais longo e estável grupo social. Neste contexto, o papel dos pais consiste em prover bens, sustento dos filhos, educação informal e preparo à educação formal, além de transmitir valores culturais de diversas naturezas. A estrutura familiar representa, ainda, função de proteção e construção da identidade e individualidade do indivíduo. “…Aos três anos de idade, Malvina reapareceu para me conhecer, mas não ficou na cidade, não voltei a vê-la durante muito tempo. Frequentei o primário, onde era uma boa aluna, e cursei o ginásio com habilitação para o magistério, mas não concluí o curso por causa das drogas. A tia Berenice sempre espancava a mim e aos meus irmãos, às vezes sem motivo…”.
A cada dia, 129 casos de violência psicóloga e física, incluindo a sexual, e negligência contra crianças e adolescentes são reportados, em média, ao Disque Denúncia 100. Esse número é considerado mediante a quantidade de denúncia feita diariamente, o que quer dizer que, a cada hora, cinco casos de violência contra meninas e meninos são registrados no país. Esse quadro pode ser ainda mais grave se levarmos em consideração que muitos desses crimes nunca chegam a ser denunciados. (UNICEF BRASIL, 2012)
(1)Disque
Denúncia Nacional de Abuso e Exploração contra Crianças e Adolescentes. www.disque100.gov.br
“... Certa vez, ela chegou a rasgar minha roupa em frente da escola, aos 9 anos de idade, o que me levou a procurar pela primeira vez Malvina, que estava morando em Petrolândia, casada e com outros 4 filhos. Contei à Malvina o que Berenice havia feito, mostrei a roupa rasgada, chorando. Ela me deixou passar o dia em sua casa junto com o meu irmão Marcos, que sempre me protegia da tia. O marido, que era alcoólatra, entrou numa discussão com Malvina por nossa causa. Então, escutei o marido dela dizer que ela devia escolher entre nós ou ele, ouvi também quando ela decidiu ficar com o marido. Chorei, e Malvina veio dizer que seria melhor que a gente ficasse na casa da avó, que lá era melhor. Então, eu e meu irmão voltamos sozinhos para casa. Chegando lá, Berenice disse que éramos tão ruins que nem nossa própria mãe queria ficar com a gente. Sem ter pra onde ir, ficamos por lá mesmo. Nesse período, minha irmã mais velha, Márcia, teve a ideia de fugirmos. Como Marcos e eu não concordamos com a ideia, Márcia seguiu sozinha, desde então nunca mais a encontrei. Um dia, Marcos, numa tentativa de me defender da Berenice, foi jogado contra a parede, o que lhe causou um ferimento na cabeça. Assustada, bati em Berenice com um pedaço de pau, ela ficou furiosa e me bateu mais ainda. Malvina chegou a saber do que aconteceu, mas não fez nada. Quando Malvina teve o quinto filho, solicitou que eu ficasse na casa dela para
ajudá-la nos afazeres, mas nessa época eu já não queria ficar com ela, porque não gostava da casa, nem dela. Eu me sentia muito mal em ser tratada como empregada e não como filha. Malvina era manicure. Eu cuidava das 4 crianças da casa. Em um Dia das Crianças, Malvina veio com presentes para todos os filhos, menos para mim. Nunca tive uma bonequinha para brincar, nem festa de aniversário, nem Dia das Crianças ou Natal. Tive uma vez, uma surpresa na escola sempre pensava e esperava que Malvina fosse aparecer numa dessas ocasiões, mas nunca apareceu. Terminei o serviço doméstico e fui até Malvina, que estava pintando as unhas de uma mulher, e disse que tinha terminado. Curiosa, a mulher perguntou de quem eu era filha. Sem receio, Malvina respondeu que eu era filha de uma conhecida. Magoada, fui embora e nunca mais a procurei. Aos 11 anos de idade comecei a namorar João, primeiro e único namorado de verdade. Apresentei-o para a família, meu irmão Marcos, muito ciumento, era contra o namoro. Algum tempo depois Berenice se casou e foi embora da casa, restando apenas Marcos, a avó e eu. Em uma das ocasiões que a avó foi para São Paulo, me deixou sozinha com Marcos em casa, ele abusou de mim...”
PH Antonello Veneri
Índice de violência sexual 0 a 9 anos – 35%, 10 a 14 anos – 10,5%, 15 a 19 anos – 5,2%. (RONDÔNIA, 2013)
“… Fiquei calada durante um ano, sob ameaças. Então, nossa convivência em casa tornou-se ruim e com muitas brigas. Comecei a beber e conheci Lurdes, uma prima distante que era dona de uma “boca de droga”. Comecei usando maconha e logo usei cocaína cheirada e depois o baque…” “... Nesse meio tempo, me prostituí, assaltei e participei do tráfico. Comecei aos 14 anos passando droga na escola, tudo longe dos olhos da minha família, que sempre me achou quieta e “esquisitona” e, mesmo sob alerta de outras pessoas, não acreditavam que eu levasse essa vida…”
A sociedade, ainda hoje, idealiza uma criança que corresponda a todas as expectativas de um tempo passado, e aquelas que não respondem adequadamente são avaliadas negativamente.
“… Fomos levar armas e drogas ao Recife, minha amiga Ana e eu, numa das entregas em uma boate. Eu não entreguei a quantidade certa da droga. Usei uma parte, e então, quando voltei ao condomínio onde estávamos hospedados, fui espancada pelos traficantes. Chorei e disse à minha amiga Ana que um dia eu sairia do tráfico. Minha amiga disse que isso nunca aconteceria porque estávamos numa ‘barra pesada’, Ana foi assassinada em 1997. Procurei ajuda para sair das drogas, em uma quinta-feira santa. Um jovem me fez um convite para ir à igreja, fui drogada até lá e conheci a irmã Simone. Após um tempo, Mônica, uma colega de sala, me convidou para ir à missa, fui e revi a irmã Simone. Foi quando conversamos um pouco, então outro dia a procurei e contei que queria parar de usar drogas, mas não conseguia. Então, ela propôs uma clínica de recuperarão por dois meses. As primeiras tentativas foram frustradas, só com o passar do tempo que comecei a usar drogas esporadicamente. Então, a irmã veio conversar novamente comigo e me perguntou se eu realmente queria ajuda. Respondendo afirmativamente, fui para Salvador com ela visitar uma clínica. Precisando comunicar meus pais sobre minha decisão, marquei um encontro com meu pai na casa das freiras. Contei tudo ao meu pai e pedi ajuda para ir até a clínica. Ele simplesmente se levantou da cadeira e foi embora, nem me deu tchau, nunca mais eu o vi. Alegando não ter tempo, Malvina não foi ao encontro. Fui para a clínica com a irmã Simone e fiquei lá por três meses, os quais foram muito difíceis. Certo dia, recebi uma ligação de
irmã Simone dizendo que os traficantes descobriram, através de Malvina, o endereço da clínica e queriam invadi-la. Por esse motivo, fui transferida de cidade. Fui para São Paulo, onde passei alguns dias na casa dos meus irmãos enquanto negociava com meu tio João, irmão de Malvina, a minha estadia por lá. Por fim, passei sete meses na casa dele em Diadema, longe das drogas. Então, conheci Pedro, sócio do meu tio. Foi quando engravidei. Quando descobri que estava grávida, não acreditei, fiquei desesperada e com muito medo, então resolvi procurar Pedro, que, por sua vez, não acreditou que poderia ser o pai da criança. Nesse momento, não sabia o que fazer, pois ele era casado e um grande amigo do meu tio. Pensei em várias coisas, uma delas é que não queria aquele filho, chorei muito. Minha tia já estava desconfiada, pois comecei a ter enjoos. Ela me perguntou e eu não tive coragem de contar, pois não queria
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confusão. Quando me perguntou quem era o pai, fiquei com medo e falei que não sabia, menti. Porém, meu tio descobriu e me mandou de volta para Pernambuco…”
A gravidez precoce, por interromper a vida cotidiana de uma adolescente, se caracteriza como um momento peculiar. Isto acontece tanto pelos recursos limitados que a jovem possui para lidar com tal situação, quanto pela família que se forma (mãe e filho), que tem alterada sua dinâmica habitual, e pelas próprias dificuldades apresentadas frente a estressante condição. É frequente a presença de acometimentos emocionais que trazem consigo o sentimento de culpa. A este sentimento se soma ainda, muitas vezes, a raiva da mãe pelo filho por perceber tal criança como vítima de um abuso ou violência, ou até mesmo o não planejamento de determinada situação. “...Naquele momento, pensei na minha infância, sem carinho, uma infância de rejeição. Depois de algum tempo, parei e pensei comigo: ‘Bianca, você é forte, já enfrentou muitas barras, você vai ter seu filho e vai dar a ele todo carinho que nunca teve da sua mãe’. Voltei para o Norte e minha avó me recebeu bem, mas minha tia e Malvina me condenaram. O que mais me doeu foi quando a maldita ‘Malvina’ olhou para mim e disse: ‘Além de traficante e drogada, ainda é mãe solteira’ e saiu rindo. Foi muito difícil levar a gravidez. Os traficantes me perseguiram e me torturaram. Quando estava no 3° mês de gravidez, eles me violentaram. Minha família nunca interveio. Fui internada porque minha gravidez se tornou de risco. Poderia perder o Paulo ou tê-lo prematuramente. Aos meus dezessete anos de idade, dei à luz depois de nove meses. No dia 09/11/2001, Paulo nasceu. Ele era lindo, carequinha, nasceu com 3,3 kg, 56 cm e muito saudável…” O país registra anualmente o nascimento de 300 mil crianças que são filhos e filhas de mães adolescentes. (UNICEF BRASIL, 2012)
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“… Quando peguei meu filho pela primeira vez, eu fixei meu olhar para ele e não falei nada, apenas pensei ‘E agora? O que é que vai acontecer?’ Eu não deixaria que nada acontecesse com ele. Com o nascimento do meu filho, eu me senti mais fortalecida para lutar contra os traficantes e para não voltar mais ao uso de drogas, pois ele precisava de mim. Mas três meses depois, os traficantes voltaram a me perseguir e torturar. Pensei, por muitas vezes, em voltar ao tráfico, pois não aguentava mais. Eles me queimavam com cigarro, me batiam, me violentavam e me cortavam. Quando perguntava por que não me matavam logo, eles não respondiam. Desejei muitas vezes me suicidar e tirar a vida do meu filho, afinal eu não tinha uma família de verdade. Dentro de casa, havia sempre brigas com meu irmão e fora a perseguição dos traficantes. Fui então passar alguns dias na casa das irmãs, quando, dia 29 de abril, as irmãs conseguiram, através de um seminarista, meu acolhimento. Lá, passei quatro meses junto com meu filho. Foi uma fase temporária até encontrar, com ajuda das irmãs, um lugar mais adequado para vivermos. Assim, encontramos a Lua Nova através da irmã Jane. Ela me ligou e disse que eu deveria ligar na Lua Nova ainda naquela noite e falar com Raquel Barros. Então, liguei às 20 horas para Raquel, que me fez algumas perguntas sobre minha vida e meus objetivos e pretensões…”
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Primeiro contato: momento de percepção da demanda, conhecimento da situação atual da futura jovem acolhida, conhecimento de perspectiva e do caso geral. Utilizar a ficha de primeiro contato como instrumento (modelo 01).
MODELO 01 - Ficha de Primeiro Contato 1 - PRIMEIRO CONTATO 2 - Data do primeiro contato 3 - Hora do primeiro contato Das 8:01 até 11:00 Das 11:01 até 14:00 Das 14:01 até 17:00 Das 17:01 até 20:00 Das 20:01 até 23:00 Das 23:01 até 02:00 Das 02:01 até 05:00 Das 05:01 até 07:59
DADOS DO PARCEIRO 8 - Nome do paciente: ______________________________ 9 - Sobrenome do paciente: _________________________ 10 - Data de nacimento: ____________________________ 11 - Gênero: ______________________________________ 12 - Endereço: ____________________________________ 13 - Cidade: ______________________________________ 14 - CEP: ________________________________________ 15 - País: ________________________________________ 15.1 - Telefone: ___________________________________
4 - Nome da Instituição 5 - Tipo de serviço Centro Residencial Centro não Residencial Unidade da rua Outro Outro
16 - É um paciente novo 17 - Precedentes tratam, por uso drogas (número)
6 - Como se estabeleceu o primeiro contato Por telefone Na estrutura da organização Na rua Na casa da pessoa Em outras instituiçoes Em estrutura movel Outro 7 - Nome da Fonte da informação telefone da fonte Idade da fonte Gênero da fonte 7.1 - Tipología da fonte Uma pessoa / individual Uma organização/Grupo/institução Outro 7.2 - Como a fonte soube da Organização Por si mesma Através de um amigo Através de um membro da familia Através de um conhecido Através de outra institução Outro Através da institução
18 - Lugar dos precedentes tratam, por uso de drogas Aqui Em outro lugar 19 - Estado Civil Solteiro/a Casado/a Separado/a Viúvo/a Divorciado/a Poligamia União Estável Outro 19.1 -Se esta casado Primeiro Matrimônio Segundo Matrimônio Terceiro Matrimônio Outros 19.2 - Se é esposo/esposa Primeiro esposo/esposa Segundo esposo/esposa Terceiro esposo/esposa Outros 20 - Estrutura familiar Vive só Vive só / com filhos Família sem matrimônio formal Outro Companheira sem matrimônio
21 - Escolaridade Ensino Fundamental Ensino Médio Ensino Superior Outro Anexo de estudos completos Sabe escrever Sabe ler Sabe somar Sabe subtrair Sabe multiplicar Sabe calcular divisões Sabe calcular medidas Sabe calcular porcentagem Usa computador 22 - Número de filhos Mulheres 23 - Grupo étnico 24 - Religião 25 - Pessoa de apoio (nome) 26 - Pessoa de apoio (telefone)
27 - EMPREGO Altos executivos, donos de grandes empresas Gerência, profissionais como: enfermeiras, professores, trabalhadores sociais Pessoal Administrativo, gerentes de produção, pequenas empresas Trabalhadores de oficina e vendedores técnicos, trabalhadores de comércios pequenos Técnicos em treinamento prévio (padeiro, barbeiro, chef de cozinha, eletricista, bombeiro) Semi-técnico (auxiliar de enfermagem, garçom, motorista de ônibus) Trabalhadores nao técnicos (trabalhadores de serviços domésticos, ajudante de construção, obreiro) Remuneração Estudantes, pessoas com incapacidades, pessoas sem profissão Sem emprego nunca empregou-se Outros 28 - CONDIÇOES DO PRIMEIRO CONTATO Substâncias/ Álcool Condutas antisociais Psiquiátricos Conduta Relacionamentos
Violência Intrafamiliar Violência Trabalho sexual Legal Gravidez/Parto Enfermidades Pobreza extrema Vida na rua Apoio Econômico Escolares Exclusão grave Violência intracomunitária
Redes Internas Crise Psicológica Capacitação e Formação Organização e Planejamento HIV DSTs AIDS Sem trabalho TB - tuberculosis Problemas familiares TEP-LT TEP-ST Problemas sexuais Violaçao Outras dependências Uso de drogas intravenosa Outros Hepatitis 29 – PETIÇÃO Apoio Econômico Atenção ao parto Encaminhamento Conversas Conselho/ Orientação Serviços legais Fiança Formação/ Capacitação Creche Internação Informação Integração Comunitária Organização e planejamento Internação forçada Recuperação escolar Serviço social Terapia Visita Familiar Exames/ cuidados médicos Alimento Ocupação/ Trabalho Medicamentos Burocrático Outros
30 - RESPOSTAS Marca um encontro Dá-se informação Conselho/ Orientação Encaminhamento Escuta imediata/ manejo de crise Indicações/ sugestões Acompanhamento Outro Cuidados médicos Higiene/ Roupa limpa Acolhida (dia e noite) Outros 31 - RESULTADOS Apresentação ao encontro Seguir em contato Interrompeu o contato Inicia um programa na Instituição Outros Inclusão em atividades externas Outros 32 - USO DE DROGAS Álcool Opiáceos Barbitúricos Sedativos Cocaína Amfetaminas Cannabis Alucinógenos Inalantes Antidepressivo Comentários:
Objetivos e pretensões É essencial que haja uma escolha recíproca. Nossa proposta é construir um trabalho transformador em parceria – algo impossível de acontecer se a jovem não decidir tentar. Se avaliarmos que a proposta da Lua Nova é adequada para a jovem naquele momento de sua vida, e se ela demonstrar interesse em participar do programa, damos uma previsão de sua entrada. Triagem: na adequação ou não da menina aos objetivos da Lua Nova, é oferecida uma previsão para a entrada da mesma ao programa. É feito o cadastro, o prontuário do caso e a avaliação de recursos familiares e sociais. Desse processo participam educador, psicóloga e assistente social. É necessário fazer um relatório com as informações coletadas durante a entrevista (cronograma 01).
“… Marcamos então uma provável data para ir para a Lua Nova, que seria algumas semanas depois, e combinamos de acertar os detalhes por meio de uma ligação telefônica. Confesso que fiquei com muito medo e muito insegura, pois estava saindo de minha terra natal, apenas com meu filho, para morar num lugar distante. Embora soubesse que era uma comunidade para mães e filhos, o medo predominava, não podia imaginar o que isso significava realmente. A vontade de sair daquela vida e cuidar do meu filho era tanta, que decidi ir...”
Cronograma 01 – Triagem de entrada INICIO Recebe solicitação da vaga. Marca data de triagem. Participa da triagem: Educador social, técnico e jovem moradora. Será necessário ter em mãos: Livro de triagem e ficha de primeiro contato. Livro de triagem: Livro no qual é anotado as informações colhidas durante a triagem - nome, idade, endereço, contato, o motivo do acolhimento e o que for necessário. Ficha de primeiro contato: De acordo com o procedimento de preenchimento da ficha, a mesma deve ser preenchida logo após o primeiro contato com a pessoa que será atendida, independendo da demanda e de ser acolhida ou não, a ficha não deve ser preenchida na frente da pessoa atendida ou junto com ela. Há a necessidade de verificar se o pedido de acolhimento vem de ordem judicial, demanda espontânea ou outro encaminhamento. Realiza roteiro de triagem A candidata está apta a entrar? A candidata quer entrar na Lua Nova? Existe vaga? SIM Agenda data de entrada. Informa a data de entrada ao solicitante. Solicita lista de documentos. Envia ofício de comunicação ao Fórum com protocolo. Realiza o cadastro da nova residente e filhos. Insere informações no sistema de dados – Banco de Talentos documentos da residente.
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e arquiva, no prontuário (pasta), os
NÃO Insere na lista de espera. Informa o solicitante, especificando os motivos. Insere informações no sistema de dados: Banco de Talentos. O acompanhamento pode ser feito através de outros dispositivos da rede. O sistema de dados – Banco de Talentos – deve ser atualizado periodicamente, com informações atualizadas da jovem e seu filho, podendo ser inseridos relatórios, informações pessoais, acompanhamento de atividades, entre outros. O preenchimento deve ser feito por coordenador, técnicos e educadores, assim, as informações se complementam e o acompanhamento se torna mais fácil quando a jovem estiver no período de reinserção.
Encaminhamentos de chegada As jovens e seus filhos são encaminhados pelo Poder Judiciário, Conselhos Tutelares ou outras instituições. Algumas vezes, elas vêm espontaneamente por indicação de amigos ou educadores. Chegam de várias regiões de São Paulo e até mesmo de outros Estados. Para que sejam recebidas, consideramos três critérios iniciais quanto ao perfil da jovem: • Acolhemos jovens mães com 13 anos ou mais, já que a proposta pressupõe a atenção a todas as jovens que são mães e estão em um contexto de risco para que exerçam a sua maternidade; • De preferência, jovens residentes no Estado de São Paulo, pois existe uma previsão de visitas domiciliares e finais de semana na casa de parentes ou amigos; • Jovens sem problemas psiquiátricos graves, pois o projeto não conta com educadores para as crianças e as mães têm que ter condições mínimas para cuidar dos filhos. “… Retornei a ligação para Raquel e falei que chegaria no dia 20 de agosto, às 12 horas, no aeroporto de Guarulhos. Combinamos que, para eu reconhecê-la, ela vestiria uma camiseta com o símbolo da Lua Nova. Chegando ao aeroporto de Guarulhos, fiquei decepcionada, pois não encontrei ninguém com a camiseta da Lua Nova. Mas,
no meio das pessoas, havia alguém acenando que se aproximou e perguntou se eu era Bianca. Aliviada, respondi que sim. Era a Raquel. Passei o dia com ela e com a assistente social, Rosângela, em São Paulo. À noite, fomos para a Casa de Acolhimento Lua Nova. Fiquei impressionada com o barulho de crianças e com a quantidade de pessoas que lá viviam…”
Durante esta etapa do acolhimento, formalizamos nossa relação com a instituição que encaminhou a jovem, propondo uma Carta de Parceria (modelo 02). Se a resposta da jovem for negativa, também fazemos uma comunicação por escrito, na qual descrevemos o processo recíproco de triagem e a decisão da jovem em não participar da proposta oferecida pela instituição. Ao chegar à Lua Nova, a jovem viverá um período experimental de acolhimento. Só depois, podemos confirmar a inserção definitiva da jovem no programa.
MODELO 02 - TERMO DE PARCERIA Eu ______________________________________________________firmo hoje um compromisso de estabelecer com a Associação Lua Nova, uma relação de parceria. A Associação Lua Nova compromete-se em acolher a jovem: _____________________________________________________________________ nascida em ____/____/_____ na cidade de _____________________ - ___________ No período de ______/_____/______ a ______/_____/______. E seus(as) filhos(as): __________________________________________________ data nasc:___/___/____ __________________________________________________ data nasc.:___/___/____ __________________________________________________ data nasc.:___/___/____ __________________________________________________ data nasc.:___/___/____ Dispomo-nos a acompanhar o processo educativo e terapêutico da jovem e seus(as) filhos(as), mantendo um contato ao final do primeiro mês para fins avaliativos, e posteriormente, contatos mensais com a equipe da Associação Lua Nova. Comprometemo-nos a oferecer um apoio no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) mensais durante os meses de permanência da jovem e seu(s) filho (s) a fim de contribuir para a realização de um trabalho integral para acolhimento e futura reinserção social dos mesmos. Comprometemo-nos ainda, a jovem e seu(s) filho(s) nesta Associação, se esta manifestar o desejo de retornar ao local de proveniência ou não estiver apta a assumir a proposta oferecida. Araçoiaba da Serra, _____ de __________________________________de ________. Instituição Parceira:______________________________________________________ Endereço:____________________________________________________________ Cidade:_____________________________ Estado:_______ Tel:___________________ Nome do Parceiro responsável:_____________________________________________ Telefone:___________________________ E-mail:____________________________ RG:________________________________ CPF:_____________________________ _ _ _ _ _ _ __________________________ Parceiro Responsável
______________________________ Associação Lua Nova
LISTA DE DOCUMENTOS Os seguintes documentos foram entregues na entrada: Jovem ( ) Histórico Escolar ( ) RG ( ) CPF ( ) Certidão de Nascimento ( ) Certidão de Casamento ( ) Cartão SUS ( ) Carteira de Vacinação ( ) Carteira de Trabalho ( ) Título de Eleitor ( ) INSS ( ) PIS Filho ( ) Certidão de Nascimento ( ) Carteira de Vacinação ( ) Cartão SUS ( ) RG OBSERVAÇÃO: Não sendo entregues todos os documentos listados, o parceiro se compromete a encaminhá-los no prazo de ______ dias.
________________________________ Parceiro Responsável
____________________________ Associação Lua Nova
Processo de acolhimento Ingresso da jovem Estudo do caso pela equipe
Proposta de tratamento com metas
Avaliação conjunta das metas e desenvolvimento do programa
Reinserção Social
"… Fui recebida pelo educador André, que me apresentou naquele dia todas as regras da comunidade. Fiquei muito incomodada, pois toda a minha vida foi isenta de regras e, agora, eu me deparava com diversas regras, sendo difícil a minha adaptação...”. Todos os educadores estão preparados para realizar o acolhimento, pois, no momento em que a residente ingressa na Lua Nova, inicia-se esse processo. Além disso, as residentes o acompanham em conjunto com o educador. O processo de acolhimento permanece por toda estadia na Lua Nova, assumindo diferentes formas no decorrer do tempo. O momento de passar as regras está dentro do processo acolhimento. A forma como elas serão passadas influenciarão na adesão ou não da residente a elas. Dessa forma, nesse momento, participam o educador e uma residente da comissão de acolhimento, a fim de criar um clima mais descontraído, possibilitando que a residente esclareça as possíveis dúvidas, não se restringindo apenas à leitura das regras. Certifica-se de que a residente compreendeu o funcionamento geral da instituição, perguntando sobre suas dúvidas e as dificuldades que acha que encontrará. O momento de transmissão das regras não se restringe a isso; acompanhar a residente durante o dia, relembrar os horários das atividades durante a rotina também são fundamentais. E a forma como tudo isso é transmitido facilita o trabalho do educador e de toda equipe, pois acelera o processo de adaptação da residente à Lua Nova.
Faz parte do acolhimento a apresentação oficial da nova residente e seu(s) filho(s) para todas as pessoas da casa. Nesse encontro, as demais jovens recebem a nova residente. Cada uma conta um pouco de si, do que gosta de fazer, de seu jeito de ser e da sua história dentro da casa.
SOBRE AS REGRAS Além da leitura das regras, cria-se um espaço para esclarecer dúvidas e conversar sobre o que foi proposto. É importante se certificar de que a residente compreendeu o funcionamento geral da instituição, desfazer as fantasias, como o medo de perder o filho, a ideia de que vai trabalhar de graça, passar fome, bem como pensamentos equivocados, como de que a Lua Nova “é um hotel cinco estrelas”, “é um lugar onde posso ficar sem ter um projeto futuro”.
QUAIS SÃO AS REGRAS? Quanto à organização da casa: Tratar com respeito e educação todas as pessoas: profissionais, residentes e visitantes. Respeitar e tentar compreender o outro. Participar das atividades propostas. Cumprir os horários estabelecidos. Não usar drogas. Não consumir bebidas alcoólicas. As refeições devem ser feitas com todos juntos, sentados no refeitório.
Quanto às atitudes: Não brigar. Falar baixo. Não falar palavrão. Ter sinceridade. Não agredir verbal ou fisicamente outra pessoa. Não usar ou pegar coisas de outra pessoa sem pedir emprestado. Não entrar no quarto das outras residentes sem pedir permissão.
Não deixar objetos perigosos ao alcance das crianças. Jogar o lixo no lixo. Manter a casa limpa. Cada residente é responsável por manter limpas suas roupas e de seus filhos. Respeitar os horários das refeições
Rompeu as regras? Perde o direito de ter rádio no quarto. Perde o direito de telefonemas e passeios. Limpa a casa, lava as panelas ou limpa os vidros. Carrega telhas, varre a rua, cuida do jardim. * A perda de direitos são propostas pelas jovens moradoras e validadas
MODELO O3 – CADASTRO ENTRADA ____/_____/_____ SAÍDA ____/_____/_____ NOME:______________________________________________________________________ DATA DE NASCIMENTO:___/____/____ IDADE:______ NATURAL DE: ________ ESTADO:_____ ESTÁ ESTUDANDO ( )SIM ( ) SÉRIE ______ ESCOLA: ___________________________
Uso de drogas O não uso de drogas é uma regra combinada com todas as jovens residentes. Caso a jovem opte por usar, é discutido como fica a relação dela com o filho e coloca-se que ela terá que fazer opções. Ninguém faz as escolhas pelas residentes. Repetimos nosso lema de que não queremos mudar sua vida, mas cuidar dela. Geralmente, as jovens já chegam desintoxicadas e, se não, são atendidas pelo CAPS AD (Centro de Atenção Psico Social para Álcool e Drogas), rede parceira da Lua Nova. Caso haja uma recaída, todo suporte é garantido pela equipe e pelas demais jovens parceiras. O problema é conversado em grupo, que atua de maneira significativa na busca de soluções. “… Após a minha chegada, conhecimento do local e regras, passei pelo procedimento de entrega e preenchimento de cadastro, para que tivessem os meus dados…”
DOCUMENTOS RG:_____________________________________ CPF:_________________________________ CARTEIRA DE TRABALHO: _______________________ SÉRIE: _________________ TÍTULO DE ELEITOR: _________________________________________________ CERTIDÃO DE NASCIMENTO Nº___________ LIVRO ___________________FLS______ CARTÃO SUS:__________________________________________________________ TRANSFERENCIA ESCOLAR: ( )SIM ( )NÃO NOME DO PAI: __________________________________________________________ ENDEREÇO:_________________________________________________________________ CIDADE:_________________________ESTADO:___________ TELEFONE: (___)_______ NOME DA MÃE: ________________________________________________________ ENDEREÇO:__________________________________________________________________ CIDADE:_________________________ESTADO:___________ TELEFONE: (___)_______ ESTÁ GRÁVIDA ( )SIM ( )NÃO QUANTOS MESES ______ FAZ PRÉ-NATAL ( )SIM ( )NÃO POR QUÊ? ___________________________________________________________________ FAZ ALGUM TRATAMENTO ( )SIM ( )NÃO TROUXE RECEITA MÉDICA? ( )SIM ( )NÃO TROUXE EXAMES ( )SIM ( )NÃO QUAL ENFERMIDADE? ___________________________________________________ QUE REMÉDIOS USA:_____________________________________________________ QUAIS EXAMES:__________________________________________________________ TEM ALGUM PROCESSO JUDICIAL ( )SIM ( )NÃO QUAL?______________________________________________________________________ TEM ALGUMA DOCUMENTAÇÃO OU INFORMAÇÃO ( )SIM ( )NÃO QUAL?______________________________________________________________________ INSTITUIÇÃO SOLICITANTE:__________________________________________ ENDEREÇO:__________________________________________________________________ CIDADE:__________________________________ TELEFONE ( )_____________________ CONTATO:________________________________ CELULAR ( )______________________ PESSOAS QUE TEM VÍNCULOS: NOME:______________________________________________________________________ ENDEREÇO:__________________________________________________________________ CIDADE:_____________________________________ TELEFONE ( )__________________ NOME:______________________________________________________________________ ENDEREÇO:__________________________________________________________________ CIDADE:____________________________________ TELEFONE ( )___________________ NOME:______________________________________________________________________ ENDEREÇO:__________________________________________________________________ CIDADE:______________________________________ TELEFONE ( )______ _________
FILHOS: NOME:______________________________________________________________________ DATA DE NASCIMENTO:___/____/____ IDADE:______ NATURAL DE: ________ ESTADO:_____ ESTÁ ESTUDANDO ( )SIM ( ) SÉRIE ______ ESCOLA: ___________________________ RG:_____________________________________ CPF:_________________________________ CARTEIRA DE TRABALHO: _________________________________ SÉRIE: ___________ TÍTULO DE ELEITOR: _____________________________________________________ CERTIDÃO DE NASCIMENTO Nº___________ LIVRO ___________________ FLS______ CARTÃO SUS:_______________________________________________________________ TRANSFERENCIA ESCOLAR: ( )SIM ( )NÃO FAZ ALGUM TRATAMENTO ( )SIM ( )NÃO TROUXE RECEITA MÉDICA? ( )SIM ( )NÃO TROUXE EXAMES ( )SIM ( )NÃO QUAL ENFERMIDADE? _______________________________________________________ QUE REMÉDIOS USA:_________________________________________________________ QUAIS EXAMES:____________________________________________________________ NOME:______________________________________________________________________ DATA DE NASCIMENTO:___/____/____ IDADE:__ NATURAL DE: ______ESTADO:_____ ESTÁ ESTUDANDO ( )SIM ( ) SÉRIE ______ ESCOLA: ___________________________ RG:_____________________________________ CPF:_________________________________ CARTEIRA DE TRABALHO: __________________________ SÉRIE: _________________ TÍTULO DE ELEITOR: _________________________________________________________ CERTIDÃO DE NASCIMENTO Nº___________ LIVRO ___________________ FLS______ CARTÃO SUS:___________________________________________________________ TRANSFERENCIA ESCOLAR: ( )SIM ( )NÃO FAZ ALGUM TRATAMENTO ( )SIM ( )NÃO TROUXE RECEITA MÉDICA? ( )SIM ( )NÃO TROUXE EXAMES ( )SIM ( )NÃO QUAL ENFERMIDADE? ______________________________________________________ QUE REMÉDIOS USA:_________________________________________________________ QUAIS EXAMES:_____________________________________________________________ NOME:_____________________________________________________________________ DATA DE NASCIMENTO:___/____/____ IDADE:______ NATURAL DE: ____ ESTADO:__ ESTÁ ESTUDANDO ( )SIM ( ) SÉRIE ______ ESCOLA: ___________________________ RG:_____________________________________ CPF:_________________________________ CARTEIRA DE TRABALHO: ____________________________ SÉRIE: ________________ TÍTULO DE ELEITOR: _________________________________________________________ CERTIDÃO DE NASCIMENTO Nº___________ LIVRO ___________________ FLS______ CARTÃO SUS:________________________________________________________________ TRANSFERENCIA ESCOLAR: ( )SIM ( )NÃO FAZ ALGUM TRATAMENTO ( )SIM ( )NÃO TROUXE RECEITA MÉDICA? ( )SIM ( )NÃO TROUXE EXAMES ( )SIM ( )NÃO QUAL ENFERMIDADE? _______________________________________________________ QUE REMÉDIOS USA:_________________________________________________________ QUAIS EXAMES:_____________________________________________________________
INFORMAÇÕES QUE DEVEM SER COLHIDAS: SITUAÇÃO PROBLEMA __________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ FILHOS: (ATITUDE FRENTE AO PROBLEMA DA MÃE, RELACIONAMENTO MÃE E FILHO) __________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ HISTÓRICO FAMILIAR: (AMBIENTE FAMILIAR, HISTÓRICO DE DEPENDÊNCIA QUÍMICA NA FAMÍLIA, ATITUDE DA FAMÍLIA FRENTE AO SEU COMPORTAMENTO) __________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ HISTÓRICO PESSOAL: (INFÂNCIA, ADOLESCÊNCIA, ESCOLARIZAÇÃO) __________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ HISTÓRICO SEXUAL: (PARCEIROS, QUALIDADE DE RELACIONAMENTO) __________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ HISTÓRICO DE USO DE DROGAS (USA DROGA OU NÃO, QUAL (S) DROGA (S), PADRÃO DE USO) __________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ OBSERVAÇÕES ADICIONAIS: __________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________
Vínculos Redes Subjetivas
liação
ava Abaixo seguem os exercícios que nos ajudam a fazer esta
TAREFA N° 1 A REDE SUBJETIVA LISTA DE “AMIGOS” DE CADA JOVEM Na Lua Nova o grande termômetro para avaliar o processo de mudança de cada jovem é avaliar como esta sua rede subjetiva. A rede subjetiva de uma jovem esta composta por : (i) todas as pessoas que o parceiro considera ser seus amigos, (ii) as relações de amizade entre todas elas. Se entende que a rede subjetiva das jovens é essencialmente uma rede de amigos que, se espera, tem também relações de amizade entre eles. Avaliamos a rede subjetiva que a jovem tem quando chega, durante o processo e ao final dele. Quanto mais relações ela passa a ter, mais segura e protegida entendemos que ela esta e mais integrada ela esta
Tarefa N°1 Escreva os nomes das pessoas com as quais vocês têm uma relação de amizade.
TAREFA N° 2 #
Nome (Ego)
Gênero Idade
Papel Social(1) Papel Social(2)
Relação
Parentesco
REPRESENTAÇÃO GRÁFICA Coloque agora aquelas que estão mais próximas de você no centro do círculo, aquelas menos próximas no círculo mais afastado e as mais afastadas no mais externo. Após incluir os nomes, agora mostre quais destas pessoas se relacionam entre si.
TAREFA N° 3 Redes Subjetivas
As redes vão ser parecidas com esta abaixo: Jussara
Ribeiro
Ana LuiXa Angelica
Bruno Luciene Robson Paulo
Lino Santos
Mirela
Augusta Priscila Monica Luana
TAREFA N° 3
Redes Subjetivas
REPRESENTAÇÃO GRÁFICA Fazemos este exercícios quando a jovem chega, medimos as características da sua rede, tamanho, heterogeneidade, qualidade das relações, durante o seu processo na Lua Nova vamos acrescentando e retirando pessoas quando necessário e a cada 4 meses fazemos uma nova avaliação. Esta avaliação a cada 4 meses da uma nocão de como estão as relações das jovens, e se estas estão distribuídas por todos os setores eixos da lua nova: trabalho, educação, terapia, lazer, família, amigos etc. E um bom modo de vericar onde é mais importante a jovem estar investindo mais antes de sua saída.
“… Algum tempo depois, a Solange viria a ser a minha educadora de referência…” O educador de referência das residentes é escolhido antes da chegada das mesmas. Dessa forma, prepara o quarto em que esta ficará, fará um primeiro contato com ela, explicando-lhe o funcionamento e as regras da Lua Nova. Com isso, espera-se criar uma relação mais próxima entre o educador de referência e a residente. O educador de referência acompanha todo o “projeto de vida” junto à residente. “... Logo quando cheguei à Lua Nova, eu pensei que o educador fosse um policial, que ficasse distante apenas controlando. Mas não demorou muito e eu percebi que eles eram amigos, irmãos a quem, muitas vezes, eu procurava para colo, ombro e conselhos. Todas as vezes que procurei, encontrei...” O educador tem como função acompanhar o dia a dia das jovens, monitorando e orientando sobre regras, deveres, procedimentos e direitos. Administra horários e cronogramas estabelecidos pela organização, controlando e executando atividades e d u c a c i o n a i s , d e l a z e r, c u l t u r a , entretenimento e saúde. Verifica se as normas e procedimentos estabelecidos estão sendo cumpridos por todos, realiza relatórios diários da evolução e projeto de vida das atendidas. Acompanha os projetos executados dentro da comunidade Lua Nova.
“… No dia seguinte, conheci a casa, que tinha suas tarefas divididas entre as residentes, que era limpar e cozinhar…” É responsabilidade das residentes a manutenção e tarefas da casa. Essas atividades são divididas semanalmente na forma de tarefas específicas, ou rodízio de acordo com a capacidade e potencialidade de cada residente. “… A mim coube ficar responsável por limpar a varanda e o refeitório. Assim, fui conhecendo as meninas e fazendo amizade…”
50% das meninas fazem novos amigos em casa, e muitas só ficam em contato com velhos amigos que têm uma influência positiva sobre a sua recuperação. (PLANETE D'ENTREPRENEURS, 2013)
2. Comer bem “… Demorei para me adaptar com o horário de despertar, que era às 6h30 da manhã. Levantávamos e fazíamos nossas tarefas para, em seguida, participar dos grupos com a psicóloga Flávia. Nesse grupo, falávamos sobre cuidados com o filho, educação do filho, higiene, maternidade, etc…”
Eu e a casa A relação com a casa – meu lugar de comer, dormir, descansar, conviver com meus filhos – estabelece-se a partir de uma rotina que ajuda a organizar o tempo e as responsabilidades. O cumprimento da rotina, com o apoio do educador, tem um papel pedagógico importante quanto ao conhecer e respeitar regras.
1. Desafio da higiene Há uma dificuldade em conseguir que as jovens cuidem da sua higiene pessoal e de seus filhos, bem como mantenham a casa, a cozinha e os quartos limpos. Empregamos algumas estratégias para conseguir melhores resultados, como convidar especialistas para falarem da importância da higiene para o bem-estar e a saúde de todos, criar regras e horários para esses cuidados. Também tem ajudado adotar alternativas mais lúdicas, como o Projeto “A Lua no Brilho”, quando organizamos mutirões de limpeza da casa.
Criar uma rotina de alimentação equilibrada e saudável também tem exigido um esforço e criatividade redobrada da equipe da Lua Nova. Nesse sentido, elaboramos o Projeto “O Gosto da Lua”. As residentes fazem um curso de culinária e, na sequência, são abertas inscrições para um concurso de pratos salgados e doces, degustados e votados pelas próprias jovens. Na hora da votação, contam ponto a criatividade no aproveitamento de alimentos, a limpeza da cozinha, beleza e cuidados à mesa, bem como a participação das outras residentes. O prêmio pode ser, por exemplo, um jantar em uma churrascaria, com direito a levar o filho e mais um acompanhante.
3. Morar bem Ter um lugar bonito e gostoso para morar faz diferença na rotina das jovens. Também é importante garantir que cada jovem possa deixar a sua marca, sentindo que tem um cantinho com a “cara dela”. Nesse sentido, foi criado o Projeto “Minha Casa, Minha Lua”. Com a colaboração voluntária de um artista, um arquiteto e um coordenador do projeto da comunidade - aquela pessoa que faz a gestão das questões relacionadas à estética e à necessidade de viver em ambiente agradável -, a equipe e as jovens reformaram e personalizaram cada uma o seu quarto e participaram dessa mesma tarefa nos espaços comunitários da Lua Nova, como a cozinha e o refeitório. Para começar, foi feito um planejamento das etapas do trabalho com participação da equipe, das jovens e gestores de outras áreas da Lua Nova, quando necessário. Definiu-se uma fase de desenho, orçamento, busca de doações, execução do projeto, finalização, registro e acabamento.
Ao final, foram premiados os três melhores trabalhos seguindo os quesitos: melhor trabalho, maior dedicação, resultado final (praticidade e beleza) e durabilidade. O primeiro prêmio foi o pagamento do aluguel na fase de reinserção por quatro meses. A segunda colocada ganhou dois colchões para a fase de reinserção, e a terceira, toalhas de banho e de mesa.
4. Manutenção Percebemos que é necessário fazer, regularmente, um inventário de todos os bens móveis e imóveis do projeto. Além de ajudar na organização do espaço, esse levantamento indica o que está faltando, o que pode ser otimizado e até mesmo doado para terceiros. Por outro lado, continuamente, precisamos cultivar o cuidado e a preservação dos móveis e equipamentos – especialmente os de uso comum - como a televisão, o som e o sofá.
“Acordar às seis horas, fazer minha higiene e de meu filho e tomar café até às sete horas. Às vezes, vou fumar um cigarro na varanda. Vou, então, limpar e arrumar o meu quarto e uma parte da casa, dividida entre todas. Depois, vou levar meu filho para creche. Às oito horas, saio para o trabalho que pode ser dentro da Lua Nova com os biscoitos, em Araçoiaba da Serra, com a produção das bonecas, na construção civil perto da creche ou nos bairros de Márcia Mendes, Sabiá e Nova Esperança, em Sorocaba. Algumas almoçam no trabalho, eu volto para a Lua Nova. O almoço, na casa, é servido ao meio-dia. Depois, mais um cigarrinho na varanda. Quem não volta para trabalhar, cuida da organização da dispensa, ajuda a arrumar a cozinha e a fazer o lanche da tarde. Eu volto mais ou menos às cinco horas, com meu filho. Na parte da manhã e da tarde, quem fica em casa tem aconselhamento com o educador de referência. Tomamos lanche e vamos completar a limpeza e arrumação. Tomo banho, dou banho no meu filho e ainda ficamos juntos, brincando até a hora do jantar. Antes do banho, tem uma atividade com o coordenador e um educador. Às sete horas, jantamos todo mundo junto e depois fazemos uma reunião entre todas nós, as residentes. Depois, temos tempo livre. Às vezes, vemos televisão, outras vezes, ficamos ouvindo música, dançando, cantando, conversando. Dez horas da noite é hora de dormir”. (Residente da Lua Nova)
5. Compras Existe um setor responsável pelo planejamento, orçamento e execução de todas as compras da Lua Nova, tanto a compra de alimentos, quanto de produtos de limpeza, equipamentos ou móveis. A necessidade do entendimento de todos sobre o planejamento financeiro da instituição é muito importante na vida pessoal e institucional. Não adianta querer comprar tudo, pois sempre dependemos de verba. O melhor é planejar e não desperdiçar. PH Antonello Veneri
CONFIRMANDO A ESCOLHA Semanalmente, o educador de referência se reúne com a nova residente para conversar sobre sua adaptação, dificuldades, descobertas, registrando o que achar relevante para compartilhar com a equipe. A partir desse acompanhamento, podemos confirmar se a residente permanecerá ou não na Lua Nova. Por isso, é tão importante acompanhar de perto e ajudar a jovem a entender a proposta da residência.
Atividades de acolhimento Na primeira semana, diariamente, o educador de referência conversa com a nova residente a fim de esclarecer suas dúvidas, compreender melhor sua história de vida, falar sobre suas descobertas e dificuldades, avaliar seu desenvolvimento, o cumprimento de regras, bem como fazer encaminhamentos para outros profissionais da equipe. Na segunda semana, uma residente da comissão de acolhimento mostra os diferentes projetos de geração de trabalho e renda, o seu objetivo e funcionamento geral. Na terceira semana, uma residente da comissão de acolhimento sai com a jovem para mostrar os arredores da Lua Nova, incluindo
espaços importantes da comunidade do entorno, como o posto de saúde, a creche, a igreja e os espaços de lazer. As quatro semanas do acolhimento também são o período para retomar com a jovem as regras da casa. Na realidade, ao escolher ficar na Lua Nova, a jovem já decidiu aceitar as regras apresentadas na entrevista inicial. De qualquer maneira, é importante retomá-las de forma clara. Essa comunicação facilita o trabalho do educador e de toda equipe, pois acelera o processo de adaptação da residente à Lua Nova, influenciando na sua adesão ou não. Há uma conversa envolvendo o educador de referência e uma residente da comissão de acolhimento, a fim de criar um clima mais descontraído. Falam sobre a vida em comunidade, sobre as perspectivas futuras, o relacionamento com o filho e histórias divertidas.
PH Antonello Veneri
PH Antonello Veneri
A partir desse acompanhamento, podemos confirmar se a residente permanecerá ou não na Lua Nova. Por isso, é tão importante acompanhar de perto e ajudar a jovem a entender a proposta da residência. Ao final das quatro semanas, a comissão de acolhimento se reúne com a coordenação, e juntos avaliam a inserção da jovem no programa, observando diferentes critérios construídos no decorrer da experiência da Lua Nova. Critérios para permanência: Compreensão dos objetivos do projeto. Consonância desses objetivos com as expectativas da jovem. Adaptação da jovem às regras do projeto. Dificuldades e possibilidades de superação. Participação nas atividades. Relacionamento com a equipe e residentes. Um fator decisivo é a opção da própria jovem em permanecer na Lua Nova, especialmente em caso de medida judicial, pois não há muros ou vigias para obrigá-la a ficar.
Eu e eu mesma A maneira de olhar para sua história, entender quem é, perceber seus talentos e possibilidades de futuro vão se transformando dentro de cada jovem. Assim, a relação dela com ela mesma também se reconstrói. No dia a dia, criamos momentos específicos para facilitar essa percepção e reflexão.
MODELO 04 – Linha do tempo
1. Linha do tempo Em encontros individuais com o terapeuta, com a participação do educador de referência, a jovem elabora sua história de vida, traçando uma linha do tempo (modelo 04) com marcos positivos e negativos da sua trajetória pessoal. O ponto de partida é um convite para a jovem escolher os principais acontecimentos da sua vida e desenhar uma cronologia. Na parte de cima da linha, ela coloca os marcos positivos, e na parte de baixo, os negativos. Em alguns momentos, ela para, fica indecisa e faz as mudanças necessárias. Em seguida, conta sua história, explica porque considera algumas situações positivas e outras negativas, fala também da maneira como ela vê sua linha e como foi desenvolvê-la. É uma linguagem simbólica: com a linha do tempo, ela faz um desenho da sua vida, que pode continuar e vai depender de como ela quer ser daqui para frente. É um instrumento de vinculação e criação de uma cumplicidade. A jovem percebe que sua história não é só uma tragédia.
Nascimento
Hoje Data__/__/__
2. Projeto de vida Pensar sobre o futuro, sobre a vida que deseja para si e seu filho, sonhar com mudanças, tentar caminhos. O projeto de vida de cada jovem é iniciado no momento em que ingressa na Lua Nova. Desde a etapa de acolhimento, tentamos observar seus objetivos, motivações e potencialidades. Com apoio da equipe, ela deve ser estimulada a planejar e viabilizar seu projeto de futuro com seu filho. Para qualquer um de nós, assim como para as jovens que vivem em situação de acolhimento, um projeto de vida só pode ser efetivado se conseguirmos identificar as capacidades de cada indivíduo, valorizando não somente seus sonhos, mas também suas capacidades transformando-os em talentos. A Lua Nova acredita na existência de talentos em toda pessoa, por isso, estrutura seu projeto na parceria com suas residentes a fim de auxiliálas para a (re) descoberta de seus valores de moral, ética e cidadania. O desafio é intenso. Como desenvolver o protagonismo, a autonomia e a consciência de deveres e direitos? Como promover a visão de processo e não a de produto? Fazer a reflexão sobre: Qual foi sua história? Qual a sua percepção do presente? Quais as perspectivas para o futuro? Como facilitar um planejamento conjunto valorizando ativos? Como criar espaços para mostrar habilidades e desejos? Como respeitar as escolhas, trabalhar com a realidade e a concretização?
MODELO 05 - PROJETO DE VIDA MODELO 05 – PROJETO DE VIDA NOME: EDUCADOR (A): PREVISÃO DE MINHA REINSERÇÃO: ____/____/____ METAS: 1ª ____________________________________________________________________ Para realizá-la eu preciso: ____________________________________________________________________ Quando vou realizá-la? ____/____/____ 2ª ____________________________________________________________________ Para realizá-la eu preciso: ____________________________________________________________________ Quando vou realizá-la? ____/____/____ 3ª ____________________________________________________________________ Para realizá-la eu preciso: ____________________________________________________________________ Quando vou realizá-la? ____/____/____ 4ª ____________________________________________________________________ Para realizá-la eu preciso: ____________________________________________________________________ Quando vou realizá-la? ____/____/____ 5ª ___________________________________________________________________ Para realizá-la eu preciso: ____________________________________________________________________ Quando vou realizá-la? ____/____/____ Observações gerais ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________
3. Etapas O processo de construção do projeto de vida costuma caminhar por três diferentes etapas: • Descoberta de potenciais: durante o período de adaptação, é necessário verificar as potencialidades da jovem mãe e observar sua rotina de lazer. Dessa observação, programar, no mínimo, um passeio mensal. Em paralelo, a assistente social, psicólogo e educador de referência buscam planejar com ela suas atividades dentro da Lua Nova, incluindo as responsabilidades a serem assumidas. Se possível, também resgatar o vínculo familiar. • Relação com a comunidade: o trabalho voluntário na comunidade deve ser planejado com o incentivo da assistente social, psicólogo e educador de referência. Iniciar um trabalho de planejamento de custos para a reinserção social. Se há vínculo familiar, fortalecê-lo. • Renda e trabalho: efetivar a reinserção social, auxiliar na busca de emprego e moradia, considerando que o local, o bairro escolhido deve ter uma rede de recursos posto de saúde, escola, creche, trabalho que possibilitem qualidade de vida.
4. Articulação e acompanhamento Para a concretização do projeto de vida, é muito valiosa a conquista de parceiros pessoas, instituições, empresas - que auxiliem no processo de reinserção da dupla mãe/filho. Podem colaborar, por exemplo,
investindo na capacitação educacional e profissional, promovendo oportunidades de trabalho, entre outras formas. Também percebemos ser necessária uma avaliação periódica do desenvolvimento do projeto de vida e do percurso terapêutico. Realizamos encontros mensais com os educadores, nos quais são considerados os seguintes pontos: escolarização, profissionalização, lazer, gestão do próprio dinheiro, relação mãe/filho e relação com a família.
5. Projeto Maternidade Percebemos ser valiosa a garantia de um espaço para falar sobre a maternidade, dividir inquietações sobre o filho, questionar e compartilhar dúvidas sobre cuidados e afetividade. Organizamos, assim, as reuniões do Projeto Maternidade. Com a participação dos educadores, psicólogos e assistentes sociais, as jovens são incentivadas a discutir, repensar e refletir sobre suas posturas, receios e desejos, a fim de favorecer o estabelecimento de comportamentos saudáveis entre mães e filhos. São realizadas dinâmicas de grupo e discussões orientadas. Ao final de cada tema, as jovens são convidadas a fazer uma produção concreta sobre o que foi conversado, envolvendo jogos, brincadeiras, histórias, músicas, atividades artísticas, culinárias, artesanais ou de educação ambiental. O objetivo é estabelecer um comportamento diferenciado, mesmo que de forma lúdica ou verbal. Tudo acontece em um ambiente previamente organizado para o mundo da fantasia e da imaginação, estruturado a partir do princípio da busca da interação entre mães e filhos. As reflexões e vivências abordam quatro eixos temáticos principais: maternidade, cidadania, sexualidade e drogas. Em cada eixo, por sua vez, são trabalhados quatro temas estruturantes: respeito, regras, responsabilidade, direitos e deveres.
CONSTRUINDO VÍNCULOS Ao ficar na Lua Nova, a jovem é convidada a se tornar parceira do programa. É numa relação de troca e apoio mútuo com as outras residentes e com a equipe que a jovem constrói um novo projeto para sua vida com seu filho. De um lado, mãe e criança têm assegurado na residência seu direito à moradia, alimentação, assistência médica, psicológica e educacional. Mas, de outro, a jovem tem que assumir seus deveres: cuidar do filho, de si mesma, colaborar com o trabalho doméstico, trabalhar, participar das atividades terapêuticas e pedagógicas, respeitar as regras de convivência combinadas. O tempo médio de permanência das jovens na residência é de oito a doze meses, quando começam a participar do projeto de inserção social. Durante a moradia na residência, buscamos trabalhar o fortalecimento de identidade, autoestima e autonomia, bem como valorizar as competências e o planejamento de futuro das jovens. A base do trabalho é incentivar que a jovem construa novas relações consigo mesma, com seu filho e as demais pessoas com quem convive. Tudo isto acontece de forma singular para cada jovem, num ritmo próprio. Ela vai tecendo diferentes relações, que interagem entre si. São relações interdependentes, muitas vezes, simultâneas, que podem ser organizadas da seguinte maneira:
Estratégias que facilitam a construção de vínculos Vivência cotidiana – Diariamente, as jovens realizam tarefas “de mãe”, além d e d i v e rs o s t ra ba lhos d e rot i n a doméstica, de limpeza, cozinha e jardinagem. Acreditamos que a vivência cotidiana é uma oportunidade privilegiada para compreender e modificar comportamentos, bem como para desenvolver um projeto pessoal de vida. Reflexões e vivências grupais – As jovens participam de reflexões e vivências em grupo com o objetivo de adquirir instrumentos para lidar com seus problemas atuais, identificando aspectos de suas personalidades que necessitam de maior autorregulação. O trabalho em grupo facilita a socialização e a percepção das questões internas a partir dos problemas comuns, além de possibilitar maior agilidade no processo pedagógico. Interação com a comunidade – Sentir-se “pertencer”, “ter um lugar”, “fazer parte” de uma comunidade é um ponto essencial no processo de construção de novos vínculos. Para a Lua Nova, a comunidade é uma parceira imprescindível para a inserção social da jovem e seu filho. A inserção social é trabalhada desde o primeiro momento que a jovem chega à residência. A valorização da comunidade e do bairro tem, também, permitido a discussão sobre os preconceitos existentes em relação às jovens. Superar o preconceito é um trabalho lento
e, muitas vezes, só é conquistado na convivência cotidiana. Construção de Projeto de Vida – Discutir, planejar e começar a concretizar um projeto de vida com seu filho é uma ferramenta essencial do percurso da jovem na residência. O processo se inicia na primeira conversa de acolhida da jovem e é assunto norteador do trabalho terapêutico e educativo.
Eu e as outras residentes A relação de parceria é incentivada não somente no tocante à equipe, mas também às outras jovens residentes. É com elas que cada uma compartilha espaços, rotinas, regras, dificuldades, experiências e projetos. Construir esse convívio é um desafio concreto. Além das relações de amizade, busca-se criar um senso de grupo. Nesse sentido, a gestão participativa tem se revelado uma estratégia essencial para favorecer um espaço coletivo de negociação, tomada de decisões e elaboração de projetos comuns. 1. Assembleia Acontece semanalmente, com a participação de todas as jovens e a equipe presente na casa. Nela, são discutidos todos os problemas da casa e as relações entre elas. Mas, não é um espaço de queixas e, sim, de propostas. As próprias jovens devem dar soluções ou sugestões de encaminhamento para os assuntos abordados. 2. Eleição As meninas se candidatam à função de gestão de várias atividades dentro da casa, como cozinhar, controlar a dispensa, cuidar do jardim, da lavanderia, ir ao banco etc. A eleição é feita após as candidaturas. Assim
que empossadas, as jovens eleitas assumem a gestão por um mês. 3. Mural de comunicação No saguão de entrada da casa, há um grande mural, no qual são divulgadas notícias, escalas de tarefas, regras da casa. Todo mundo participa, tanto as jovens, quanto a equipe. 4. Vivência das regras As normas e regras da casa são consideradas o diferencial entre a vida que as jovens estão construindo e o mundo que deixaram. Cada uma das questões propostas para o desenvolvimento das jovens traz em si regras próprias: como estabelecer vínculos, como viver em grupo, como participar da comunidade, como lidar com o filho. Entretanto, não basta o conhecimento da regra para que sejam criadas soluções concretas para os problemas enfrentados. É necessário estabelecer procedimentos que ajudem a interiorizar as regras e tragam resultados. Resultados que, ao serem revistos e refletidos pelas próprias jovens, sustentem as mudanças desejadas e promovam uma atitude autônoma diante da vida. Buscamos, portanto, estabelecer regras claras, pontuadas e viáveis. De qualquer
forma, elas motivam constante negociação com as próprias jovens. Estabelecê-las exige critério e capacidade de equilibrá-las com as possibilidades concretas das jovens se adaptarem. Negociar as regras significa garantir que elas sejam adotadas pelo grupo. Cada um se torna responsável por sua execução, sem que o educador deixe de assumir sua responsabilidade em cobrá-las em prática. Mas, para que possa fazê-lo com clareza, ele deve participar do processo de elaboração das regras e compreender sua motivação. Na experiência da Lua Nova, o trabalho com as regras claras também ajuda a diluir as principais fantasias e medos trazidos pelas jovens, quando chegam à associação. Ter clareza sobre o funcionamento da casa, por exemplo, permite desmontar o recorrente medo de perder o filho, trabalhar de graça, passar fome, entre outros. Ao mesmo tempo, a discussão dos limites desencadeia conteúdos fundamentais, como a vivência anterior em outras instituições, a proposta de relação com o filho, a autorresponsabilização, a compreensão do papel de cada um, o caminho para a conquista da independência e autonomia.\
GRUPOS DE APRENDIZAGEM E PARCERIA Foram eleitos os cinco eixos básicos considerados fundamentais para o trabalho de reeducação e de estruturação de um projeto de vida para a população atendida pela Associação: CIDADANIA, MATERNIDADE, SEXUALIDADE, DROGAS e CRIANÇA. Dentro de cada eixo, são trabalhados quatro temas estruturantes: Respeito, Regras, Responsabilidade e Direitos/Deveres. O eixo CRIANÇA permeia todo o trabalho, uma vez que esta é o principal ator do novo projeto de vida de sua mãe. Cada eixo é discutido semanalmente, e os temas estruturantes são enfocados mensalmente dentro dos eixos. Portanto, diariamente realizam-se discussões semi dirigidas acerca da temática eleita. O grupo é composto por coordenador, educadores, psicólogo e assistente social.
EQUIPE Com perfis, trajetórias e formação variadas, os funcionários e colaboradores da Lua Nova compõem uma equipe diversa e, por isso, complementar, com quem a jovem estabelece relações diferenciadas e significativas. São médicos - psiquiatras, infectologistas, pediatras -, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, artistas, comunicadores, administradores, advogados, estudantes universitários, educadores de rua, educadores comunitários, professores, jovens ex-residentes, profissionais do sexo, usuários e ex-usuários de drogas.
Eu e a equipe Construir um vínculo com os educadores, os técnicos e os demais profissionais da Lua Nova é a base para todo o trabalho pedagógico terapêutico desenvolvido junto com a jovem. Ao experimentar uma relação de confiança, respeito e apoio mútuo com a equipe, a jovem poderá conquistar uma nova postura diante de si, dos outros e do mundo. Esse vínculo se constrói num processo, que – apesar de ter fases comuns – evolui de forma única em cada história. 1. Primeiro contato O relacionamento com a equipe começa na primeira entrevista, sempre marcada pelo medo do novo e uma grande desconfiança. A equipe busca sempre entender como a parceria pode ser estabelecida, buscando conhecer não somente a história de vida da jovem, como também seus potenciais e habilidades. Essa busca causa estranheza à jovem; mas, ao mesmo tempo, cria interesse e curiosidade. É estimulante ser vista pelo seu lado positivo. O relacionamento vai assim se construindo com base na curiosidade e na vontade – mesmo que não explícita – de mudança. Muitas vezes, os educadores e técnicos são entendidos como os “salvadores da pátria”, que vão resolver seus problemas atuais de falta de moradia e de perda do filho - pois, uma vez em situação de risco, as mães podem perder seus filhos e estes podem ir para acolhimento institucional. Os educadores e técnicos não sãs vistos como pessoas com as quais podem se
relacionar, mas são entendidos como misturados com a instituição e significam a resolução imediata dos problemas das jovens. 2. Conhecendo e testando As primeiras semanas são tensas. A jovem está reconhecendo seus espaços e possibilidades. A comparação com o contexto de onde veio ainda é grande, então passa a pensar nos antigos colegas, educadores e pessoas da rua como os grandes amigos. Essa é uma reação normal, pois, no momento em que começam a vivenciar a Lua Nova, têm medo de perder a identidade anterior. Assim, testam infinitamente o limite da nova equipe, deixando de cumprir regras
PH Antonello Veneri
simples, fazendo comparações com as pessoas com quem se relacionavam e desafiando, mesmo que indiretamente, o educador e seu papel. Nesse momento, o educador precisa assumir duas funções simultâneas: acolher e ao mesmo tempo ser firme nas decisões. Ele mostra que para estar com a jovem não precisa ser igual aos outros ou ao que ela idealiza. Deve ser ele próprio e agir como sempre agiu, pois conhece seu papel e sua importância na vida de cada uma delas. São comuns longas discussões, geralmente sobre a vontade de ir embora, de não querer ficar, tentando assim desvalorizar a pessoa que está acolhendo e, ao mesmo tempo, pedindo silenciosamente que a equipe não aceite essa decisão. 3. Limites e acordos Apesar dos desejos das jovens, a equipe vai explicitando os limites da instituição – até onde se pode ir. A jovem, mesmo oferecendo resistência, vai se inserindo nesse novo modo de viver e de estar com os outros e com seu filho. Os limites concretos e os acordos vão sendo estabelecidos e discutidos com elas, o que ajuda na reflexão e numa melhor aceitação. Nesse momento, ela já consegue ver a equipe composta de pessoas capazes de gerar vínculos e, principalmente, de trocar. As primeiras “confidências” e histórias sobre sua vida acontecem nessa fase. A equipe começa a sonhar junto com a jovem e seu filho. Nesse momento, estabelece-se uma relação mais profunda entre educador e jovem e, em sinergia, passam a descobrir e a buscar os objetivos para aquela jovem. 4. Talentos e potenciais Ao compartilhar a história já vivida e a perspectiva de uma nova história, muitas ideias e sonhos vão surgindo. A equipe acompanha a jovem nas suas “viagens”.
Estimula, busca concretizar e trazer para a realidade sem fazer perder a vontade de sonhar. Então, a jovem e a equipe estão cúmplices em função de uma ideia e de uma transformação. Muito do que a equipe almeja para o trabalho com a jovem – e vice-versa – é colocado nesse momento. O trabalho dá significado à relação, cada um percebe o quanto vale a pena continuar. 5. Transgredir os limites Com medo de não conseguir atingir seus sonhos e objetivos, com a sensação de que frustrará a equipe e mais uma vez irá se sentir fracassada, a jovem inicia um processo de transgressão e boicote de suas capacidades. É uma fase de grandes transgressões em relação aos horários, as regras e combinados. Necessário, mas delicado, este momento exige que o vínculo tenha sido estabelecido de forma verdadeira e espontânea. Somente assim, a equipe e a jovem conseguem retomar e reestruturar as funções e motivações dela para continuar. É nessa hora que o educador deve acreditar nos potenciais despertados na jovem e nele próprio para que a relação não se acabe. PH Antonello Veneri
6. Cumplicidade no projeto de vida Superada a crise, começam a concretização e a estruturação das reais perspectivas de vida futura – é a construção do projeto de vida. Até então, a jovem já experimentou diferentes propostas de trabalho, internas e externas à Lua Nova, já verificou suas relações com a comunidade e passa, então, a desenhar com a equipe seu processo de saída. É um momento de muita proximidade entre a jovem e a equipe. Se surge a ideia de um curso de artes, por exemplo, a jovem vai às possíveis escolas com o educador e, durante o caminho, discutem, imaginam e refletem sobre a proposta e suas implicações. No momento de traçar novas possibilidades, a jovem solicita sempre a presença e o apoio da equipe. Continuamente, o desenho do projeto de vida é organizado e redimensionado. A articulação e a relação entre equipe e jovem o tornam cada vez mais concreto e mais factível.
8. Pontos críticos Diante das dificuldades, a jovem tende a se recolher e desistir. Mas é importante insistir na conversa e reflexão conjuntas. A ideia é persistir no sonho, mas desenhar outras formas de concretizá-lo. E isso requer flexibilidade e habilidade. Aos poucos, jovens e equipe vão chegando a novas conclusões e propostas, reiniciando a tentativa de adequar o sonho à realidade. 9. Rumo à autonomia A hora da saída é um momento crucial. Torna-se necessário ter paciência e pró-atividade. Muitas vezes, nesse momento, a jovem tenta mostrar de todos os modos que não está pronta, volta a ter comportamentos como no início do processo, transgride, tenta comprovar que ainda depende da equipe e que não vai conseguir sem ela.
7. Compartilhando as dificuldades Ao experimentar as primeiras propostas para seu projeto de vida, as jovens e a equipe começam a perceber as dificuldades, limitações e barreiras que deverão ser transpostas. A espontaneidade e a transparência são fundamentais. Muitas vezes, a jovem percebe que não vai ser fácil e que necessita de “uma força” da equipe, porém uma “força” honesta. Não adianta insistir no que se revela impossível. Isso deve ser dito, deve ser sentido e deve ser comunicado. Aceitar as dificuldades e limitações é um grande passo para que o projeto se concretize.
PH Antonello Veneri
Na equipe, por sua vez, o primeiro sentimento que aparece é o de proteção, além de raiva e uma sensação de ter falhado. Mas, cada vez que a jovem insiste na sua incapacidade, tentamos manter a proposta e o projeto desenhado, valorizando, assim, os momentos de reflexão, de tentativa e de reorganização. Essa postura nos requer a consciência de que o espaço Lua Nova não é para sempre, como também de que não somos onipotentes. Para transformar, dependemos do querer do outro, do nosso querer, do novo contexto em que a jovem vai se inserir com seu filho e das condições sociais, econômicas e emocionais presentes no histórico dela e da equipe. Este é um processo de busca de autonomia conjunta: ela deve ir e a equipe deve deixar que ela vá. A separação gera dor, mas a dor gera crescimento e amadurecimento. “...Com a ajuda da equipe da Lua Nova, eu aprendi a demonstrar para o Paulo, meu filho, o carinho e a importância que ele tinha para mim...” A Lua Nova busca valorizar a maternidade e transformar a percepção da gravidez na adolescência de problema para possibilidade de superação da exclusão. A vivência de experiências que possibilitem a descoberta do filho, e viceversa, contribui para a superação dos conflitos e rejeições ligados à gravidez e promovem a reconstrução do vínculo, considerando a maternidade uma força de transformação.
“...Eu não o rejeitava, mas não sabia dar carinho, dar amor a ele. Não que eu não quisesse, pois não conseguia mesmo, não tinha muita paciência. Então, percebi que estava sendo como a Malvina. Foi muito difícil para mim, mas isso me ajudou a perceber muitas coisas. Foi muito importante parar para pensar sobre meu filho, sobre a minha relação com ele, sobre o fato de eu ser mãe. Logo, com a ajuda dos psicólogos e educadores, passei a dar mais atenção e até mesmo a brincar com meu filho. Eles me ajudaram a aprender a cuidar dele, com ajuda da coordenadora, inscrevi meu filho na creche para que pudesse trabalhar no Criando Arte...”
PH Antonello Veneri
É responsabilidade do educador a co m p a n h a r a e s co l a r i za çã o d a residente e de seus filhos, verificando as dificuldades e realizando ações para ajudá-la a superá-las. O educador deverá saber sobre o rendimento escolar da residente e de seus filhos, assim como se responsabilizar pela frequência às aulas, provas e demais atividades escolares. Deverá organizar os históricos e matrículas das residentes e de seus filhos.
“...Todo mundo, acho, pensa que ser mãe adolescente é quase um castigo, ou burrice; descobri que, na verdade, pra mim era bem diferente. Quando ganhei o Paulo, apesar das crises, dos medos e das mágoas, comecei a dar mais valor pra vida, a querer uma vida melhor. No começo, só não queria que ele tivesse uma vida como a minha, mas depois vi que eu também não queria ter aquela vida e isso me deu mais força para tentar mudar. Meu filho foi um presente e não um castigo; um presente que pede que eu cresça a cada dia, que me faz caminhar para tentar ser uma pessoa melhor. A gravidez da adolescente, por mais difícil que seja, vale a pena. É muito gratificante ouvir seu filho dizer ‘mamãe’…”
Eu e meu filho
A maternidade tem papel central na construção do projeto do presente e futuro de cada jovem parceira. O vínculo com a criança torna-se estratégia valiosa para nova percepção de si mesma, do seu lugar no mundo e perspectiva de vida. Mais uma vez, o vínculo da jovem com a criança não é imediato, nem segue um padrão. Além do mais, não é homogêneo ou contínuo. É uma relação que se transforma. 1. Viver juntos No dia a dia da casa, há um modelo familiar: as mães, acompanhadas dos educadores, dedicam-se a cuidar dos filhos e da rotina doméstica. A relação mãe-filho marca a rotina e as regras da residência. É no dia a dia que mãe e filho se vinculam. Cabe à jovem alimentar, brincar, dar banho, cuidar da roupa, colocar para dormir, levar para a creche – sempre com o incentivo e apoio da equipe. Dinâmicas de grupo são utilizadas para a compreensão e a mudança de comportamento individual ou para o desenvolvimento de um projeto pessoal de vida.
2. Ritmo próprio A construção desse vínculo só acontece em harmonia com a disponibilidade interna de cada mãe. Muitas jovens aprenderam na vida a se defender das relações, pois nunca puderam contar com elas. Para que as meninas se aproximem dos filhos, algumas vezes, é preciso que um dos educadores fique muito perto delas. Quando chegam, precisam confiar, sentirem a presença permanente do educador para, depois, poderem acreditar em si e na sua relação com o filho. Compreender as dificuldades não como falta de desejo de vínculo, mas sim como impossibilidade interna é a principal tarefa de quem se propõe a ajudar na construção cotidiana dessa relação. Para encontrar o melhor caminho, temos que observar e respeitar o tempo da jovem e estarmos sempre dispostos a rever as propostas feitas. 3. Início frágil A história da jovem – quase sempre marcada por abandono familiar precoce, abuso e negligência e uma rede social degradada – interfere no início do contato com seu filho. Percebe-se que a jovem tenta evitar ou limitar a relação com a criança. Nesse momento, a criança ainda significa perda ou falta de algo, como os sonhos da adolescência, o ritmo de vida que tinha antes do filho nascer, entre outros. O contato com a criança é superficial e prevalece a sensação de que, sem ela, a sua vida seria melhor. A relação entre mãe e criança é de extrema incerteza e
fragilidade. As crianças, por sua vez, mostram-se muito autônomas, frias e distanciadas nos episódios de separação da mãe. Logo, demonstram capacidade de adaptação ao ambiente. No decorrer dos meses, entretanto, o comportamento e o estado emotivo das crianças vão mudando. Começam a manifestar emoções muito fortes com relação a eventos aparentemente banais, como se jogar ao chão ou atirar a comida fora se a mãe não está na hora do almoço.
4. “Concretude” e afeto A maior parte das jovens chegam à Lua Nova por medo de que o filho seja dado a outros e, frequentemente, muitas resistem ao projeto terapêutico inicial. Essa resistência incide nas primeiras relações entre mãe e filho. É comum que as jovens não confiem nos técnicos e encubram suas dificuldades por medo de serem consideradas despreparadas e, assim, perderem o filho. A dificuldade das mães em relação aos seus filhos se revela inicialmente pela incapacidade de decodificar, mentalizar e verbalizar o que elas estão sentindo. Muitas vezes, durante o almoço ou o jantar, percebemos que se sentem inadequadas, incapazes de se sentirem como mães que nutrem. Deixam para a equipe a preparação dos alimentos. Não conseguem simplesmente parar e brincar com as crianças. Mas, na medida em que vão se sentindo mais acolhidas e quebrando a resistência ao apoio, passam a vivenciar o vínculo de forma concreta: alimentam bem o filho, aprendem a cozinhar para ele, trocam a roupa, dão os medicamentos. Essas ações passam a ser declaração de amor destas mães a seus filhos. Aos poucos, ganha espaço o afeto. Surge um apego emocional entre mãe e filhos, principalmente quando a identidade e a função de cada um passam a ser clara e a vivência dessa função e identidade são compartilhadas em grupo.
A intervenção da equipe tenta restabelecer a integridade da jovem, uma vez que a desestruturação parece ser a principal dificuldade. Mas, paralelamente, a observação cotidiana da interação mãe e filho permite monitorar o desenvolvimento da criança. Acompanhamos os problemas e a rotina da dupla com o objetivo principal de proteção e prevenção. Assim, com os anos, tivemos que redimensionar nossa rotina pelas exigências das crianças. Alteramos regras, horários e espaços, buscando construir um ambiente adequado para a vida das crianças. 6. Estrelas Coloridas Além do cuidado e da proteção essencial, ficou clara a importância de favorecer
5. As crianças Um dos objetivos principais da Lua Nova é construir uma continuidade para o projeto de vida das mães e restabelecer uma relação mãe e filho que possa ser uma base segura para a criança, atendendo seus direitos e necessidades. PH Antonello Veneri
momentos para que as mães simplesmente brinquem e se divirtam com seus filhos. Nesse sentido, temos o Programa Estrelas Coloridas, que trabalha pela melhoria da qualidade de vida de crianças que residem na Lua Nova e nas comunidades vizinhas. Brincando, a criança experimenta, descobre, inventa, exercita e confere suas habilidades. Aprende a se relacionar com o outro, possibilitando um vínculo maior com a mãe. A participação da jovem no jogo, na brincadeira, permite que a mãe e a criança se aproximem, conheçam-se, interajam, relacionem-se com prazer e construam uma relação baseada no respeito mútuo e afeto. Nesse sentido, são organizadas diferentes oficinas culturais, semanais, com duração de duas horas. Há atividades só para as crianças, só para mães e para os dois grupos juntos.
Oficina de dança e corpo Contribui para que mãe e filho, juntos, expressem sua criatividade e fortaleçam sua comunicação. Aprendem a dançar diferentes ritmos (de danças de roda ao break).
Oficina da palavra Desenvolve a capacidade de escuta, entendimento e expressão. São valorizadas narrativas que fazem parte de mitos e lendas da cultura popular. Juntos, produzem textos e desenhos para compor um “livro” ao final.
“… Algum tempo depois, mais adaptada à Lua Nova, iniciei atividades no Criando Arte…”
A Oficina Criando Arte é como uma das veias da instituição Lua Nova, tendo caráter educativo e profissionalizante. Objetiva a geração de renda e a reinserção social das jovens mães. Por meio desse projeto, a Lua Nova desenvolve os talentos e habilidades das jovens. Todos os produtos são criados e confeccionados na própria oficina através da dedicação das jovens artesãs.
Oficina de teatro Possibilita a manifestação do imaginário, sua percepção e análise, assim como estimula o desenvolvimento da sensibilidade e do colocar-se no lugar do outro - indispensável para a construção da relação mãe e filho. A oficina inclui jogos simbólicos e narrações, jogos de fantasias e dramatizações.
Oficina da Imagem Amadurece a capacidade perceptiva da dupla - visualizar-se e visualizar o outro. Também estimula a fantasia e a criatividade. Entre outras atividades, são feitos exercícios de observação, confecção e uso de caixas fotográficas, bem como gravações em vídeo.
PH Antonello Veneri
“… No início, recebíamos um kit prêmio pelo trabalho e, depois de passada a fase de experiência, uma bolsa-auxílio. Comecei no setor de enchimento de bonecas, fiz centopeias e, hoje, faço parte do acabamento, colocando cabelo nas bonecas e fazendo bolsas de fuxico. Evoluí muito dentro da confecção, fui até secretária do Criando Arte. Essa experiência foi muito boa. Cheguei lá sem saber o que era trabalho…” 65% das mulheres que trabalham durante a sua estada na Lua Nova, no Programa de Geração de Renda, economizam alguma parte do dinheiro que ganham. Depois de deixar a Lua Nova, a porcentagem de mulheres que guardam cai significativamente. A grande maioria das meninas mostram compromisso com o seu trabalho e raramente perdem seu emprego. No entanto, 1/3 das meninas vão para o trabalho porque são obrigadas ou não têm mais nada para fazer. “… Aliás, participamos da elaboração e do andamento de todas as atividades e decisões na Lua Nova. Ajudamos a administrá-la…” Um dos princípios fundamentais do trabalho da Lua Nova é a participação ativa e o empoderamento das adolescentes com relação à instituição. Acreditamos que somente através do protagonismo e da gestão participativa institucional é possível que as adolescentes exercitem a capacidade de fazer escolhas, tomar decisões que auxiliem no seu desenvolvimento pessoal e social, minimizando riscos e aumentando fatores de proteção para sua vida. Finalmente, queremos, com esta prática, que elas sejam agentes transformadoras da sua própria vida.
PH Antonello Veneri
Eu e o trabalho A jovem precisa encontrar oportunidade de trilhar um caminho próprio no mundo do trabalho, descobrir possibilidades de sustentar a si própria e seu filho. O vínculo com o trabalho é ingrediente fundamental na construção do projeto de vida. Além de gerar a renda necessária para a viabilização de planos, como morar sozinha com sua filha, a educação para o trabalho promove a percepção de seus talentos, a satisfação do aprendizado, o fortalecimento da confiança e estima por si mesma. Nesse sentido, a Lua Nova busca constantemente alternativas para o grupo. Entre outras iniciativas, destacam-se o “Criando Arte” (criação, confecção e comercialização de bonecas e outras peças de pano), a “Empreiteira Escola” (produção alternativa de tijolos e construção de casas) e a “Panificadora Lua Crescente” (produção de pães e doces).
“… Além dessas atividades, eu tinha minha terapia semanal com psicólogo. Foi engraçado, pois eu não sabia o que era terapia ou psicólogo. A psicóloga Marina me explicou o que era tudo isso e para que servia. A terapia me ajudou a conviver melhor com o passado. Eu não conseguia dormir logo que entrei na Lua Nova, pois ainda estava presa às más lembranças. Passei a confiar muito na Marina, me senti melhor e encontrei muitas respostas para perguntas que fiz a vida toda. Me ajudou a pensar o que eu queria da minha vida e comecei a aprender a planejar um pouco meu futuro…” O objetivo final do trabalho é a conquista da autonomia. Por autonomia, entendemos a capacidade de decisão individual, resultante de uma análise onde as potencialidades e os riscos de cada escolha são refletidos, gerando assim uma maior responsabilização pelas consequências das escolhas realizadas. Acreditamos ser a autonomia um processo gradual que deve estar presente em todas as ações da instituição. Plano de futuro: Antes de Lua Nova, 50%, depois 90%.
“… Eu tinha que pensar numa nova vida, pois, além de tudo, estava longe de todos os que eu conhecia, num lugar novo. Na Lua Nova, embora tenha passado dificuldade com a saudade de casa, encontrei amigos, carinho e atenção. Para mim, a comunidade se transformou na família que eu jamais tive…”. A principal intervenção a ser feita é a busca pelo desenvolvimento do sentimento de “pertencer”, ou seja, a conquista da apropriação individual do grupo e da comunidade. Trata-se da transição entre a rede de sistemas locais (sociedade) e os indivíduos, e desenvolve métodos de intervenção que procuram melhor adaptar a pessoa ao ambiente, planejando novos sistemas de integração e aumentando por esta via a oportunidade psicossocial do indivíduo. “… Sabia que podia contar com os educadores, psicólogos e a coordenadora Dora, a qual hoje eu chamo e tenho como mãe. Eu costumo falar que a minha família é a Lua Nova, uma família que me recebeu de braços abertos, que me acolheu com todos os problemas que eu tinha. Uma família que eu não tive. Na Lua Nova, eu recebi carinho, broncas quando foi preciso, conselhos e amigos no momento de solidão. É importante a gente criar relação com as pessoas, uma relação boa com as pessoas que a gente convive, pois sozinho a gente nunca vai muito longe; na Lua Nova aprendi também isso, que a gente pode ter relações boas e de confiança…”.
São os vínculos que estruturam os processos de desenvolvimento das pessoas. É possível o estabelecimento de dinâmicas e situações de aprendizagem, nas quais estas relações podem ser construídas. “… Existe, junto com a Lua Nova, o projeto de Multiplicadores, do qual eu faço parte. Conheci um pouco sobre multiplicadores com a psicóloga Maria Ísis, que realizava um encontro com as residentes para falar de temas sobre Drogas, DSTs, AIDS e prevenção...”
O projeto “mulheres multiplicadoras”, uma parceria entre a Lua Nova e o Projeto de Redução de Danos de Sorocaba, oferece a possibilidade às meninas atendidas na Associação de serem reinseridas na sociedade, assumindo um papel social de multiplicadoras de informações, além de atuarem como agentes de prevenção na comunidade. “… Um dia, eu fui convidada para participar de um mutirão de prevenção no bairro Novo Mundo. A partir disso, comecei a participar como multiplicadora, participando do projeto como redutora de danos no Tratamento Comunitário dentro da Lua Nova.
Redução de Danos – Tratamento Comunitário Ser Agente Multiplicadora me ajudou muito porque, com a minha formação e com um pouco da minha história, eu estou ajudando outras pessoas a superarem suas dificuldades. O melhor que me aconteceu foi quando me convidaram para dar uma palestra sobre o uso de drogas numa escola estadual. Senti que, com o meu depoimento, muitos que me ouviam, de uma certa forma, foram ajudados. O que me aconteceu foi um pouco do que eu queria, minha vontade era passar para as mais jovens, que estavam na mesma situação que a minha, o que é realmente a droga, o que ela lhe tira…”
Eu e a comunidade Certamente, não conseguimos garantir sozinhos todos os direitos e oportunidades necessárias para o desenvolvimento das mães e suas crianças. É necessário articular com os serviços públicos locais, com organizações sociais, bem como com empresas e instituições para buscar alternativas de renda, trabalho, saúde, educação, moradia e, especialmente, de apoio e proteção social. Nesse sentido, a matrícula na escola, cada ida ao posto de saúde ou atividade cultural no bairro é entendida como estratégia de interação com as pessoas e instituições do bairro. No sentido inverso, também se revela fundamental trabalhar a comunidade para que inclua as jovens e seus filhos no momento de saída da residência. É enorme o preconceito social em relação às adolescentes que são mães e usuárias de drogas e/ou profissionais do sexo. Há um misto de compaixão, raiva e ódio. Assim, o maior desafio do trabalho da Lua Nova é mostrar quanto é possível existirem, nessas jovens, talentos, potenciais e capacidade de desenvolver propostas construtivas para a própria comunidade. Apesar da dificuldade em transformar o preconceito em admiração, elaboramos junto com as jovens várias ações que ajudam a desmistificar essas mães e propiciam um olhar mais atencioso para com elas. Sentir-se acolhida e pertencente a um grupo é imprescindível para a realização do projeto de vida da jovem.
1. Acompanhamento médico Já no primeiro mês, o educador levanta as necessidades médicas e odontológicas da residente e de seu filho. E, em conjunto com a assistente social, busca viabilizar os encaminhamentos e atendimentos nos serviços locais. Essa atenção se estende por todo o período de permanência da jovem na Lua Nova. Cada acompanhamento é registrado pelo educador. 2. Vida escolar Cada nova residente e seu filho são matriculados em uma escola da rede pública da região. A frequência às aulas, as provas e demais atividades são entendidas como oportunidades importantes de interação social e desenvolvimento pessoal. Cabe ao educador acompanhar o rendimento escolar de cada uma, e o de seu filho, a fim de verificar suas dificuldades e realizar ações para ajudá-los a superá-las. 3. Compras e tarefas Os cuidados com os filhos e a casa propiciam oportunidades rotineiras de interação e convivência com a vizinhança. Cada ida ao supermercado pode ser entendida como um estímulo à autonomia e inserção da jovem. 4. Cultura e lazer Pelo menos uma vez ao mês, as jovens participam de um passeio ou atividade cultural organizada pelos educadores. Elas vão ao cinema ou teatro ou, então, fazem um passeio pelo parque ou clube. Essas ações são alternativas de convivência entre as jovens, elas e seus filhos, bem como com outras pessoas da comunidade.
5. Namoros Envolvimentos amorosos são considerados positivos e importantes durante a estadia da jovem na Lua Nova. Trabalhamos essa questão de maneira transparente, deixando espaço aberto para discussão e reflexão do significado daquela outra pessoa na vida da jovem. Há horários para namoros e lembramos que o vínculo com o filho é a nossa prioridade, e sempre trabalharemos para que o relacionamento amoroso não o prejudique. Muitas são as questões que levam a uma relação de afeto mais significativa com as companheiras da própria Lua Nova. A equipe acredita ser de extrema importância entender e avaliar com as jovens o significado do relacionamento entre elas. Somente após esse processo, é que a equipe se posiciona, discutindo junto às outras residentes as consequências dessa parceria para o grupo, para o casal e, principalmente, para as crianças. 6. Trabalho comunitário Junto com as jovens, organizamos ações voluntárias na comunidade dos arredores, assim como em bairros carentes da cidade de Sorocaba/SP. O objetivo é contribuir com uma mudança de cultura e, ao mesmo tempo, fortalecer o desenvolvimento de potencialidades das jovens. De “assistidas” passam a formadoras e multiplicadoras de ideias, serviços, técnicas, utilizando sua experiência do passado com uma finalidade positiva e útil para a sociedade como um todo. Passamos, então, a perceber o quanto essas jovens tinham potencial e capacidade de oferecer a outros jovens o seu conhecimento a fim de prevenir o que aconteceu com elas. A partir desse momento, os convites para palestras em escolas, centros de saúde que chegavam à Lua Nova passaram a ser assumidos pelas jovens. Com atividades de teatro, vídeo, música, tornaram-se agentes multiplicadoras preventivas. Além de compartilhar seu conhecimento com outros jovens, começaram a frequentar locais onde antes não eram bem-aceitas. Estavam agora nesses lugares como parceiras e detentoras de saberes e experiências. Ações de Voluntariado – Sempre acreditamos que, ao desenvolver ações em benefício de outros, as jovens teriam uma rara oportunidade de aprender a lógica da parceria: é necessária uma troca, tudo o que se recebe deve ser retribuído. Resolvemos, então, aproveitar os aprendizados adquiridos a partir da experiência com o “Buffet-Escola”, projeto profissionalizante que auxiliou as jovens a atuarem gratuitamente em jantares beneficentes, para auxiliar em chás e coffee break de seminários de outras entidades não-governamentais da região. Essa é outra maneira das jovens desenvolverem habilidades e uma oportunidade para elas perceberem que não somente necessitam de ajuda, mas também podem ajudar.
Ações de Voluntariado - Sempre acreditamos que, ao desenvolver ações em benefício de outros, as jovens teriam uma rara oportunidade de aprender a lógica da parceria: é necessária uma troca, tudo o que se recebe deve ser retribuído .Resolvemos, então, aproveitar os aprendizados adquiridos a partir da experiência com o "Buffet-Escola", projeto profissionalizante que auxiliou as jovens a atuarem, gratuitamente, em jantares beneficentes, para auxiliar em chás e coffee break de seminários de outras entidades nãogovernamentais da região. Essa é outra maneira das jovens desenvolverem habilidades e uma oportunidade para elas perceberem que não somente necessitam de ajuda, mas também podem ajudar. PH Antonello Veneri
7. Vínculos anteriores Diante do perfil do público atendido pela Lua Nova, é muito difícil o resgate da família ou de alguma referência adulta anterior. Na maioria das histórias, essas referências são pessoas que estabeleceram um vínculo de exploração, abuso ou de negação da jovem e/ou das crianças. Assim, partimos do pressuposto de que cada jovem que chega com seu filho é uma família que deve trabalhar sua autonomia e sustentabilidade, inicialmente, contando consigo mesma. Acreditamos que é muito difícil tentar resgatar como prioridade, no projeto de vida da jovem, um contato familiar positivo. Apostamos, portanto, no fortalecimento da jovem e de seu filho, incentivando-a a buscar a autonomia com o apoio da equipe Lua Nova e das outras residentes. Após este processo, é então possível que se retome o contato com seus vínculos anteriores. Isso não quer dizer, porém, que desde um primeiro momento ela não encontre seus familiares, amigos ou outras referências passadas. Apenas não conta com elas para poder desenvolver e transformar a sua vida logo de início.
Através de cursos profissionalizantes oferecidos pela comunidade, as residentes, com ajuda da equipe de reinserção e educador de referência, buscam sua capacitação profissional após investigar suas potencialidades e pretensões. “… Muitos que não conhecem a Lua Nova acham que é uma casa fechada, mas, pelo contrário, a casa é aberta, os portões estão sempre abertos e também temos momentos de passeios e de lazer…”
“… O legal da Lua Nova é que, além dos grupos, afazeres e trabalho, podíamos fazer cursos fora de lá também e, assim, conhecer pessoas diferentes…”
PH Antonello Veneri
O espaço físico da comunidade Lua Nova permite o desenvolvimento da percepção de liberdade de escolha e responsabilidade, pois a proposta educativa e terapêutica se estrutura a partir da concepção de que as jovens mulheres e seus filhos, ainda que excluídas do sistema de garantia de direitos, são portadoras dos mesmos, têm conhecimento prévio sobre a realidade e a vida, com capacidade para pensar sobre ela e desenvolver sua autonomia. Além disso, vivem um período de vida com todas as características normais da adolescência e juventude, gostam de namorar, de passear, etc. “…Durante este ano, junto com a psicóloga Bárbara, minha educadora Solange e a Ivana, assistente social, desenhamos o meu projeto de vida (modelo 05)...”
PROJETO DE VIDA O projeto de vida da jovem deve acontecer em harmonia com a disponibilidade interna de cada mãe. A principal tarefa de quem se propõe a ajudar na construção do projeto de vida da jovem é compreender, quando ela se mostra resistente, que não se trata de falta de intenção ou desejo da jovem em planejar seu Projeto de Vida, mas sim de impossibilidade interna. Observar, respeitar o tempo de cada jovem, rever propostas são posturas que ajudam a perceber qual é o melhor caminho para cada uma das famílias.
“... Discutimos muito sobre todas as possibilidades e, finalmente, chegou a hora da reinserção. Fiquei muito assustada, com medo e chorava, pois para sair da Lua Nova era muito difícil, eu já havia criado vínculos. Imaginava que, quando saísse da Lua Nova, eu fosse ficar sozinha, mas a assistente social Ivana e a psicóloga Bárbara me mostraram que eu não iria ficar sozinha. Eu não acreditava nisso, tinha medo de não conseguir me virar sozinha com meu filho. Mas, alguns meses depois, eu aceitei a ideia e vi que o “bicho não tinha sete cabeças”. Aluguei minha casa e hoje moro lá com meu filho Paulo. Os móveis, consegui através de doações pelas amizades que fiz dentro e fora da Lua Nova…” Reinserção – após o contrato de experiência de 1 mês e confirmação da continuidade da residente no programa de atendimento oferecido pela Lua Nova, a equipe faz sua primeira intervenção: entrevista para identificação da residente, apresentação da equipe e levantamento dos dados para a elaboração do Projeto de Vida, m a p e a n d o o s s o n h o s , p r o j eto s , competências, recursos individuais/sociais e análise das reais possibilidades da residente. Assim, a jovem, com apoio da equipe, faz um planejamento que reúne as atividades necessárias, durante o programa da Lua Nova, para uma efetiva reinserção social, de forma bem estruturada.
PH Antonello Veneri
INSERIR A conquista de uma vida nova para si mesma e seu filho está inevitavelmente ligada à inserção da jovem na sociedade, que começa desde o primeiro momento, quando chega à Associação. Morar na Lua Nova não significa ficar alheia à “vida lá fora”. Ao contrário: é uma busca constante de novas interações com a família, a comunidade e a sociedade em geral. Intensa e positiva, a experiência na Lua Nova busca abrir novas possibilidades de futuro. Acreditamos que a inserção social somente se efetiva se precedida de proposta educativa e produtiva. Portanto, todo trabalho de construção de vínculos, incluindo a geração de renda e trabalho, está essencialmente ligado à inserção. Mas, não adianta a jovem querer se inserir se a sociedade não quiser incluí-la. O “lado de lá” – família, comunidade, empresariado, governo, sociedade em geral – também precisa se responsabilizar. Muitas vezes, no momento da saída da Lua Nova, as jovens enfrentam a falta de perspectivas. As maiores dificuldades para o sucesso de programas de atenção a adolescentes e jovens, em situação de risco, dizem respeito justamente à inexistência das condições sociais para uma efetiva inclusão das jovens com suas crianças.
Ampliando a rede SUBJETIVA 1. Envolvimento da comunidade Sabemos que nenhum programa de inserção surte efeitos sem a parceria de uma rede de apoio. Nesse sentido, revela-se essencial o trabalho na comunidade, uma vez que é ela a mais próxima da residente no processo de inserção, podendo interferir tanto positivamente quanto negativamente. A comunidade tem que ser chamada a conhecer, reconhecer e participar da solução e dificuldades que atingem essas jovens. Quanto maior o envolvimento, maior a chance da comunidade em aceitar e acolher as jovens com seus filhos. 2. Rede social É essencial desenvolver parcerias com: – o Poder Público, representado por seus diversos serviços e programas - saúde, educação, habitação, assistência social, Poder Judiciário etc; – a comunidade, por meio de associações, cooperativas e grupos organizados; – o empresariado; – as fundações e institutos; – os sindicatos e demais organismos vinculados à área social e econômica.
3. Vínculo familiar (Re) criar o vínculo com a família é uma possibilidade importante para a jovem, mas certamente não é a única, nem obrigatória. De qualquer forma, é importante rever e ampliar a percepção de família. Também deve ser estimulada a autonomia familiar. A geração de renda propicia estabilidade, permitindo, inclusive, agregar a ela novos elementos como o conhecimento de novas capacidades, novas pessoas e estilos de vida diferenciados dos vividos até então.
Movimento de inserção O processo de inserção social que, no dia a dia, não é homogêneo, nem linear, pode ser organizado em diferentes fases. 1. Residência Lua Nova Iniciada no momento de acolhimento da jovem, a construção do projeto de vida já
tem em vista sua inserção social. Da mesma forma, o programa de geração de renda e trabalho busca criar condições concretas para esse processo ocorrer. 2. Lua Crescente – residência assistida Etapa seguinte do programa de inserção social das jovens, fomentando o planejamento da futura “vida em família” e encorajando os primeiros passos para a independência socioeconômica das residentes. Neste estágio, as jovens deixam a Comunidade Lua Nova e se mudam para suas casas, em geral, alugadas. Então, tornam-se responsáveis pela sua manutenção. São assistidas pela equipe técnica da organização, enquanto trabalham em projetos de geração de renda. Com frequência, recebem visitas dos técnicos e educadores, sempre atentos à relação da jovem com seu filho e a comunidade. 3. Desligamento da instituição e acompanhamento da situação social e psicológica Após avaliação de todo o processo terapêutico - como chegou e como está
saindo, aspectos a serem aprimorados - e conquistadas condições concretas de vida autônoma, a jovem e a equipe concluem, conjuntamente, que é hora de encerrar a parceria. O vínculo com a equipe, entretanto, nunca acaba. Após seis meses da saída, a menina continua sendo acompanhada com seu filho, ou através de contatos telefônicos ou visitas. Mesmo finalizado esse período, a Lua Nova mantém suas portas abertas para conversar, apoiar e até mesmo uma nova acolhida, sempre que necessário. 4. Avaliação A cada dois anos, a Lua Nova realiza uma pesquisa para avaliar como estão as jovens que já passaram pelo processo. A equipe, junto à jovem, busca saber como estão os novos vínculos construídos por ela, bem como sua situação de saúde, renda, trabalho e moradia. Para nós, o sucesso significa a vinculação da jovem e seu filho com o mundo. Observar que estão vivenciando alternativas para seguirem juntos, buscando ser felizes, como todas as pessoas.
“… Estou há três meses fora da Lua Nova, continuo trabalhando no Criando Arte, faço visitas na Lua Nova, participo dos Multiplicadores e, o melhor, ainda tenho ajuda da minha psicóloga Marina. No início, quando mudei para minha casa, foi muito difícil, pois, por mais amigos que eu tivesse, me senti sozinha. Tentei me segurar ao máximo, mas acabei recaindo e usei drogas, esporadicamente, durante três semanas. O motivo, eu não sei muito bem qual é. Talvez tenha sido solidão, talvez tenha sido a vontade mesmo. Logo após, percebi o que tinha feito e resolvi procurar ajuda com a minha psicóloga. O retorno foi bom, ela me deu uma bronca, mas me compreendeu, sei que foi uma decepção. Ao mesmo tempo que, eu me decepcionei, eu decepcionei outras pessoas. Quando contei a ela, fiquei com medo da Raquel saber. Pensei muito em falar com ela, mas talvez o medo de decepcioná-la fez com que eu não contasse, e sim que ela ficasse sabendo por outros. O dia que eu decidi lhe contar, ela já estava sabendo. Foi muito difícil, pois eu sabia que ela confiava em mim, mas talvez, após isso, ela não confiasse mais. Conversamos e me senti aliviada. A recaída de certa forma foi legal, porque me fez descobrir que eu sou humana, que tenho os momentos frágeis, mas que posso contar com a força da Raquel, da psicóloga e a minha mesma, o que é mais importante. Porque, para me reerguer, eu tenho que querer. Hoje eu estou firme e forte…”.
PH Antonello Veneri
ALGUMAS MULHERES QUE PASSARAM PELA LUA NOVA AGORA EMERGEM COMO LÍDERES NA ORGANIZAÇÃO AJUDANDO OUTRAS MULHERES Este relato foi feito por uma jovem mãe que veio do Recife, onde se prostituía para usar drogas, engravidou de um homem mais velho e teve que fugir com seu filho, pois estava sendo torturada pelos traficantes. Hoje, ela trabalha como assistente pedagógica e ganha R$ 500,00 por mês, continua com seu único filho e possui uma rede social diversificada que a acolhe e apoia em seus diversos momentos. Esses trechos do depoimento foram retirados da publicação “Pela Lente do Amor”. "… O mais importante que vivi durante este ano, na Lua Nova, e que me i m p r e s s i o n o u f o i a q u e stã o d a confiança. Foi o único lugar onde eu não senti que tivessem medo de mim ou dos meus atos. Isto ajudou muito a me aproximar dos educadores e a mim mesma." "Hoje meu filho tem dois anos e, a cada dia, eu descubro e escuto coisas diferentes dele. A cada dia, eu o amo mais. Hoje meu maior medo é perdê-lo. A gente brinca muito. Uma das coisas que ele mais gosta é jogar bola. Vejo que valeu a pena passar tudo o que eu passei e ouvir dele: ‘mamãe, te amo’."
PH Antonello Veneri
Referências bibliográficas PLANETE D'ENTREPRENEURS. 2013. Avaliação de Impacto Associação Lua Nova 2013. Manuscrito não publicado. RONDÔNIA. Secretaria de Estado da Saúde. Crianças: Abuso sexual é o segundo maior tipo de violência. Porto Velho: Portal Rondônia, 2012. Disponível em: <http://www.sesau.ro.gov.br/?p=1610>. Acesso em: 03 mar. 2013. UNICEF Brasil. Nossas Prioridades - Infância e adolescência no Brasil. Brasília, DF: UNICEF, 2 0 1 2 . D i s p o n í v e l e m : <http://www.unicef.org/brazil/pt/activities_9381.htm?gclid=cktqo9ec57gcfejm7aodvta afq>. Acesso em: 02 fev. 2013.
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