Livro Forma Tipografia e Gestalt

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tipografia e gestalt


Em Forma & Caractere - Leitura Visual dos Caracteres pelas Leis da Gestalt, foi selecionado textos e projetos de especialistas a fim de traçar relações sobre os aspectos formais, sujetivos e mesmo científico desse campo da tipografia. Apresentando uma linha lógica que vai de legibilidade, leitura dos caracteres, para a gestalt-terapia, o leitor terá em mãos estudos que agregarão repertório ao seu conhecimento sobre os tipos.

tipografia e gestalt


TIPOGRAFIA E GESTALT



FORMA TIPOGRAFIA E GESTALT

Leitura visual dos caracteres pelas leis da Gestalt

Fabio Kenji Geysa Gabrielle Kimberly Oliveira Mariane Santos Matheus Bernardo

Editora Designtype São Paulo, 2016 1ª Edição


Biblioteca Nacional, 2016 Copyright © 2016, Designtype, Editora Ltda São Paulo 1ª Edição agosto de 2016 Textos adaptados Revisão de trabalho 1 Produção Gráfica : Yakissoba de Miojo Capa: Yakissoba de Miojo

Dados Internacionais de Catalogação da Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil.) Yakissoba de Miojo Forma, Tipografia e Gestalt, Yakissoba de Miojo - São Paulo: Designtype, 2016 54-0590 CDD-590.13 Todos direitos reservados à Designtype Editora Ltda. Rua Roque Petroni, 275 01325-000, Sãp Paulo, SP - Brasil e-mail: yakissobademiojo@gmail.com


SUMÁRIO Introdução

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Legibilidade

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Leis da Gestalt

18

A Legibilidade do ponto de vista humano

22

A Legibilidade do ponto de vista do computador

27

A Legibilidade e Tipografia

34 36

Unidades

44

Segregação

48

Unificação

52

Fechamento

56

Continuidade

60

Proximidade

64

Semelhança

68

Pregnância da Forma


Gestalt-Terapia

76

GESTALT À LUZ DA NEUROCIÊNCIA

84

Alfabetismo Visual

forma das letras

91

O sentido dos sentidos

96

Sentidos em todos os sentidos

97

Gestalt, um software de código aberto?

98

O significado de gestalt-categorias e princípios

106 110

Uma abordagem do alfabetismo visual

112

Algumas características das mensagens visuais

118 120

O humanismo e o corpo

122

Iluminismo e abstração

124

Fontes monstruosas

125

Reforma e revolução

127

Tipografia como programa

128

Tipografia como narrativa

129

De volta ao trabalho

131

Classificação

132

Grandes famílias


134

Projetando fontes

135

Logotipo

137

Fontes em bitmap

138

Design de tipos

139

Formatos de fontes

140

Fontes na tela

141

Lettering

142

Pontuação

143

Numerais

145

Misturando tipos

146

Famílias tipográficas

148

Escala

Índice remissivo

150

Glossário

152

Bibliografia

154


Introdução

Este livro propõe uma leitura visual dos caracteres tipográficos apoiado nas seis principais leis da Gestalt, criando uma linguagem gráfica de análise e apreciação da composição da forma em seus fundamentos. Os caracteres utilizados como referência são oriundo de projetos independentes de designers, que analogamente a proposta da publicação, trabalham com o conceito da forma como eixo. Desviando das fontes tidas como clássicas e tradicionais desenvolvidas para serem identificadas como partes de um todo, a preocupação é voltada em ampliar os estudos experimentais em tipografia, propondo discussões sobre a busca por novas soluções tipográficas. Apresentamos ainda estudos e discursos de sobre a legibilidade contrapondo-se a leiturabilidade dos caracteres, e até que ponto isso é engessado como norma, essencial ao bom design. Pois muito mais que uma ferramenta, a tipografia aparece como elemento gráfico, dotado de suas próprias características, que por novas percepções e uso contribuirá ainda mais com o projeto. Embora existam inúmeros livros voltados a tipografia, há poucas publicações que tange a Gestalt ao design, e ainda exclusivamente a Gestalt como ferramenta para a interpretação do caractere tipográfico. Pensando nisso, o livro é destinado a profissionais e estudantes de design com interesse em estudos da tipografia com o foco principalmente em sua forma quanto a construção dos caracteres.

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A FORMA ACOMPANHA A FUNÇÃO

Louis Sullivan

F Q 3Z9 6 U L S R

B 1 G L 2


LEG IBIL IDA DE

Por Priscila Farias



U

Um dos primeiros testes sobre a legibilidade da tipografia foi um experimento conduzido na França, em 1790, por Jean Anisson, então chefe da Imprimerie Nationale. Ele apresentou duas páginas impressas, uma com tipos ‘modernos’ (a fonte Didot) e outra com tipos ‘antigos’ (uma versão da fonte original de Garamond) a um grupo de especialistas. Pediu então que estes especialistas lessem o texto a partir de distâncias cada vez maiores, e concluiu que os tipos serifados ‘antigos’ eram mais legíveis do que os ‘modernos’ porque podiam ser lidos de distâncias maiores. Entre as primeiras pesquisas cientificamente controladas sobre a legibilidade destaca-se os experimentos do oftalmologista francês Emile Javal, a partir de 1879. Javal foi o primeiro a demonstrar que a metade superior de uma palavra é lida muito mais facilmente do que sua metade inferior. Os experimentos de Javal e seus contemporâneos apontavam para o uso de uma tipografia ‘compacta’, onde letras com ascendentes e descendentes reduzidos deveriam ser diagramadas com um mínimo de espaço entre elas, economizando papel e talvez até metal. Embora a metodologia deste tipo de experimento tenha sofrido diversas modificações com o passar dos anos, pesquisas sobre a legibilidade são frequentemente vistas com desconfiança por designers gráficos e tipógrafos. Isso se deve, em grande medida, à suspeita de que, ao focar unicamente valores funcionais, os resultados desse tipo de pesquisa venham a colocar limites em uma prática que se quer criativa.

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1


A fonte Bodoni, que possui caracterĂ­sticas similares aos tipos de Didot: Contraste acentuado, ĂŞnfase vertical e serifas retas e finas.

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A fonte Berkeley, que conserva diversas características dos tipos ‘antigos’como contraste discreto, ênfase inclinada e serifas com apoio.

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Se, por um lado, muitos tipógrafos preferem contar unicamente com a intuição e o bom senso para resolver seus problemas práticos, por outro, muitos dos pesquisadores em legibilidade (oftalmologistas, fisiologistas, psicólogos, cientistas da computação, etc) tendem a dividir opiniões e resultados unicamente com suas próprias comunidades científicas. Devido a esta situação, a colaboração entre os tipógrafos e estes pesquisadores tem sido extremamente rara. Uma das poucas exceções foi o célebre colaboração entre o tipógrafo Adrian Frutiger e os técnicos da European Computer Manufacturers Association na criação da fonte OCR-B em 1960. A despeito desta primeira e promissora colaboração, as suspeitas dos designers em relação às pesquisas sobre reconhecimento de caracteres por meios informáticos são ainda maiores, por sugerirem uma tipografia eficiente e legível, não somente do ponto de vista humano, quanto do ponto de vista, em boa medida mais limitado, do computador. A partir do levantamento de alguns dos principais resultados de pesquisas sobre legibilidade e reconhecimento de caracteres, podemos compreender de que forma outros campos de pesquisa analisam a tipografia. Informados por estes resultados, poderemos então reavaliar alguns dos pressupostos nos quais se baseiam as discussões contemporâneas a respeito de legibilidade no campo do design tipográfico.

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Livreto experimental composto pela fonte OCR-B do designer Adrian Frutiger.

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A Legibilidade do ponto de vista humano

Desde seus primórdios, no final do século xix, a psicologia tem se preocupado com as questões envolvidas no processo de leitura. Através de uma série de estudos científicos sobre legibilidade conduzidos entre 1885 e 1886, James McKeen Cattell demonstrou, entre outras coisas, que o aparato visual humano pode identificar uma palavra inteira tão rápido quanto uma letra, e que um texto coerente e lido com muito mais rapidez do que uma série de palavras combinadas ao acaso. Em uma pesquisa publicada em 1898, Erdmann e Dodge confirmaram o ponto de vista de Cattel a respeito da informação contida nas palavras. Eles identificaram que as pessoas são capazes de reconhecer palavras impressas com letras em corpos pequenos demais para serem identificadas e, com base em numerosos experimentos, concluíram que, durante a leitura, as proporções familiares e os contornos característicos de uma palavra são mais importantes do que seus componentes. Eles também constataram que palavras longas, em especial aquelas com formas peculiares, são mais facilmente reconhecidas do que palavras curtas, e que a percepção de palavras e letras ocorre somente durante as pausas de fixação que se alternam à movimentação de nossos olhos ao longo de um texto. Já em nosso século, a partir da década de 80, modelos de reconhecimento que não incluíam a detecção de características além do nível das letras foram propostos, e investigações da psicologia experimental sugeriram que o reconhecimento de palavras é mediado pela identificação de seus componentes (caracteres). Outros estudos, porém, mostraram que as formas das palavras podem ser úteis para a facilitação da leitura, quando em presença de outras informações vindas do contexto ortográfico, sintático ou semântico de texto.

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Em 1992, Healy e Cunningham publicaram o resultado de uma série de experimentos a respeito do papel da forma das palavras em seu reconhecimento, nos quais encontraram evidências de que a forma das palavras é uma variável importante no reconhecimento de palavras


familiares, mesmo para leitores muito jovens. A tarefa proposta nestes experimentos foi a revisão de textos onde as letras ‘s’, ‘c’, ‘k’ e ‘p’ haviam sido suprimidas em algumas palavras. Os pesquisadores constaram que a capacidade de detectar estes erros crescia proporcionalmente à idade e habilidade de leitura, e mesmo assim todos os leitores falhavam mais frequentemente ao detectar a supressão de letras sem ascendente ou descendente (‘s’ e ‘c’), e esta falha era muito mais comum em textos impressos em caixa baixa. Este tipo de constatação sugere que todos os leitores são sensíveis às mudanças nos contornos das palavras, formados pela sucessão de letras e suas formas características. Em todos estes experimentos, o processo de percepção de letras ou palavras é compreendido como algo que envolve o reconhecimento e identificação de padrões visuais. Segundo o neurocientista Stephen Kosslyn, o reconhecimento de algo ‘ocorre quando um dado novo se equipara com um dado da memória perceptiva, e assim sabemos que o objeto nos é familiar’, já é a identificação. ‘ocorre quando um dado tem acesso a representações em um depósito de memória multi modal, ‘conceitual’, acessando, assim, uma vasta gama de informações a respeito do objeto. … Quando um objeto é identificado, sabemos mais sobre ele do que é aparente pelos dados sensórios imediatos’(Kosslyn 1995:72).

Kosslyn também salienta que tarefas de reconhecimento distintas requerem sistemas de codificação diferentes: reconhecer um estímulo como um elemento específico (por exemplo, um caractere específico de uma fonte específica) depende de informações que distinguam um objeto (por exemplo, o ‘a’ da Helvetica) dos outros de uma mesma classe (os outros caracteres desta e de outras fontes). Já o reconhecimento de um estímulo como membro de uma categoria (o mesmo ‘a’ como representante da categoria de letra ‘a’) requer o descarte de características distintivas e idiossincráticas. Embora diversos resultados não controversos da neuropsicologia corroborem a hipótese de que a linguagem é processada de modo mais efetivo no hemisfério esquerdo do cérebro, a busca por uma evidência da superioridade de um dos hemisférios na identificação de letras produziu resultados díspares. Kosslyn sugere que o hemisfério direito talvez monitore neurônios com campos respectivos maiores, capazes de codificar informações com maior resolução, estando portanto mais aptos a reconhecer aspectos individuais de padrões visuais. O hemisfério esquerdo, por sua vez, monitoraria neurônios com campos receptivos

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menores, com menos resolução, mais eficientes no reconhecimento de um padrão enquanto membro de uma categoria. (cf. Kosslyn 1995:182-184). Das afirmações de Kosslyn podemos concluir que, para o reconhecimento de uma letra (ou forma de palavra) que seja um membro ‘forte’ de sua categoria, a atuação de neurônios com campos receptivos menores (monitorados pelo hemisfério esquerdo) talvez seja suficiente. Por outro lado, o reconhecimento e identificação de formas tipográficas excêntricas dependeria da atuação combinada de ambos os hemisférios. Note-se que os conceitos de membro ‘forte’ e ‘excêntrico’ estão aqui intimamente ligados à memória do leitor enquanto locus dos processos de reconhecimento e identificação. Neste aspecto, podemos imaginar que, quanto mais complexos e dinâmicos forem os conceitos a respeito de letras e palavras presentes no que Kosslyn chama de ‘memória multi-modal’, mais rápida e eficiente será a identificação de uma letra ou palavra específica, mesmo que trate-se de um membro ‘excêntrico’ (não familiar) de sua categoria. Em seu estudo sobre a relação entre a identificação de letras em fontes tipográficas com características diferentes e campo visual, Wagner e Harris (1994) partem da hipótese de que ambos os hemisférios contribuam de modo significativo, porém diverso, no reconhecimento de letras. O hemisfério direito estaria, em geral, mais apto para o processamento inicial e global das formas de uma letra por focar a atenção em traços relevantes. Por sua vez, o hemisfério esquerdo contribuiria com a análise de aspectos mais abstratos e com a atribuição de nomes. Ao questionar os resultados de uma pesquisa anterior (Bryden e Allard 1976), que levavam à conclusão de que o fator crítico a determinar o envolvimento relativo dos hemisférios seria o fato de uma fonte tipográfica aproximar-se mais ou menos dos padrões a escrita cursiva, Wagner e Harris obtiveram resultados diferentes. Em um experimento utilizando adultos e crianças, oito fontes escolhidas pelos pesquisadores foram classificadas segundo seu grau de ‘dificuldade’ (o tempo que as letras de uma fonte demoraram para ser identificadas), ‘cursividade’, ‘confusabilidade’ (a partir de uma pontuação de 1 a 10 dada pelos participantes antes do experimento) e ‘complexidade’ (uma média entre as três primeiras).

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Os pesquisadores constaram que, independemente da idade dos participantes, a direção e o grau de participação dos campos visuais ligados aos dois hemisférios cerebrais variava de acordo com o grau de


complexidade da fonte. Aquela considerada mais ‘simples’ (Standard Medium) demonstrava uma maior participação do hemisfério esquerdo (ligado ao campo visual direito), o oposto ocorrendo com duas das fontes consideradas mais ‘complexas’ (Murray Hill Bold e Shotgun). Buscando compreender o processo de percepção de letras estilisticamente excêntricas a partir de uma abordagem estruturada, McGraw chega a resultados bastante interessantes, tais como a constatação de que as pessoas tendem a permitir que partes bastante duvidosas de letras sejam vistas como satisfatórias para dar sentido a formas não-usuais, especialmente sob pressão do tempo (McGraw 1995:309). Outra observação interessante é a de que tal flexibilidade daria margem a graus maiores de ambiguidade, quanto maior a excentricidade de um caractere. Segundo McGraw, o número de categorias de letras (contraditórias) às quais um dado caractere pode pertencer cresce consideravelmente na medida em que este se afasta demais do centro

Fonte experimental Fat Shadow com 5 layers

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de sua categoria, implicando ‘um continuum que podemos chamar ‘n-guindade’’(McGraw 1995:310). Infelizmente, os experimentos de McGraw não levaram em consideração o fato de que raramente nos deparamos com uma letra isolada. Seria interessante descobrir se a familiaridade com uma fonte, por mais excêntrica que seja, e independentemente do contexto da linguagem verbal, poderia nos ajudar a desfazer a ‘n-guidade’ seus caracteres. Um dos aspectos mais relevantes desta pesquisa, contudo, consiste no fato de seus resultados funcionarem como parâmetros para implementação e avaliação de um modelo informático de reconhecimento de caracteres (o módulo Examiner do Letter Spirit).

A Legibilidade do ponto de vista do computador

Os estudos sobre reconhecimento de caracteres por computadores fazem parte do campo mais amplo de pesquisas sobre reconhecimento de padrões. Grosso modo, o reconhecimento de padrões pode ser definido como a categorização dos dados de um input. Em classes identificáveis através da separação de traços ou atributos significativos de um pano de fundo de detalhes irrelevantes. Neste contexto, programas de reconhecimento de caracteres são sistemas de reconhecimento de padrões que recebem sinais gráficos como input as e os identificam com séries de caracteres. Se hoje os cientistas de computação buscam desenvolver sistemas de reconhecimento de caracteres tão potentes e flexíveis quanto os seres humanos, as primeiras pesquisas neste campo buscavam, ao contrário, desenvolver tipografias tão simples e formais quanto a reduzida capacidade de reconhecimento de padrões dos primeiros computadores. 22


Em 1958, a American Bankers Association desenvolveu um conjunto de caracteres consistindo dos números de 0 a 9 mais alguns símbolos específicos para transações bancárias chamado E-13B. Para cumprir os requerimentos dos primeiros métodos de leitura eletrônica, estes caracteres foram desenhados a partir de uma grade de 9x7 unidades, e impressos com uma tinta especial contendo material magnético. Logo depois, a European Computer Manufacturers Association patrocinava a criação de um conjunto alfanumérico completo chamado CMC7, também projetado para a impressão com tinta magnética. Assim como nos códigos de barras que utilizamos hoje, nestas primeiras experiências de reconhecimento de caracteres as formas das letras, números e sinais eram definidas pela capacidade de serem associadas a diferentes formas de ondas produzidas pelos sinais eletrônicos emitidos a partir da cabeça leitora do scanner. Estas formas de ondas eram então comparadas a ondas pré-arquivadas no sistema, que as classificava de acordo com a maior proximidade. Nos anos 60, com o desenvolvimento de aparelhos para o reconhecimento óptico (não mais magnético) de caracteres, a European Computer Manufacturers Association formou uma comissão técnica para recomendar critérios para sistemas de reconhecimento de caracteres. Um dos resultados do trabalho desta comissão foi a criação de duas fontes, OCR-Ae OCR-B. A primeira incluía números, letras, sinais para transações bancárias e alguns símbolos paragrafológicos desenhados de forma a satisfazer as restrições imediatas dos sistemas de leitura óptica por computador. A outra, produzida com a colaboração do tipógrafo Adrian Frutiger, é uma fonte completa concebida para satisfazer as restrições do OCR, sendo ao mesmo tempo aceitável enquanto fonte para propósitos gerais. Nos últimos 30 anos, muitos sistemas sofisticados de reconhecimento de caracteres foram desenvolvidos. Mesmo assim, levantamentos recentes sobre a performance de programas de OCR nos mostram que, embora sistemas de reconhecimento para um número restrito de fontes ou caracteres manuscritos dentro de certos padrões tenham atingido um nível satisfatório, estão ainda muito longe da flexível capacidade humana de leitura. Embora uma porcentagem de acertos da ordem de 99% para caracteres impressos pareça razoável, isso significa cerca de 30 erros em uma página comum de texto, contendo 3.000 caracteres. Se considerarmos os sistemas de OCR simplesmente como uma forma de transformar documentos impressos em arquivos de ASCII (padrão para a codificação

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binária de dados), a performance mínima requerida para um sistema, segundo Kahan et al. (1987), seria de 99,9% de reconhecimento correto, com todos os erros sendo na verdade rejeições teríamos, assim, cerca de 3 rejeições por página, o que é comparável ao número de erros esperados de uma digitação manual. Os números apontados por Kahan et al. certamente se referem ao reconhecimento de letras impressas em fontes ‘de texto’. Se é possível dizer que os programas de OCR que conhecemos hoje se aproximam bastante do patamar de 99,9% de acerto, isso é válido somente para impressos que não utilizam caracteres manuscritos ou caracteres impressos em fontes muito excêntricas. O reconhecimento das letras manuscritas sem restrições é comparável ao processo de identificação de letras em fontes que fogem à classificação de letras ‘de texto’ por estarem ambas afastadas, em menor ou maior medida, do centro das categorias canônicas de letras. Os problemas encontrados na leitura de letras manuscritas podem ser medidos tanto pela dificuldade que nós próprios encontramos em ‘decifrar’ certas caligrafias quanto no fato de muitas agendas eletrônicas baseadas no conceito de ‘tinta eletrônica’ dependerem de um aprendizado prévio, por parte do usuário, de uma limitada série de símbolos gráficos que serão efetivamente reconhecidos com letras, símbolos e números quando escritos na tela sensível do aparelho. O processo de reconhecimento de caracteres é muitas vezes dificultado pela presença de ruídos (rasuras que dificultam a discriminação entre figura e fundo, problema em grande medida existente no reconhecimento on-line). No reconhecimento de documentos impressos, o uso de diferentes tipos de fontes tipográficas em corpos diferentes também é um grande problema, principalmente para sistemas baseados prevalentemente na equiparação por gabarito (reconhecimento por semelhança simples). Este problema é agravado no reconhecimento de escritas manuais, onde uma mesma letra pode ser desenhada de muitas formas diferentes, até mesmo em uma única palavra. Ao descrever uma possível metodologia para um sistema capaz de reconhecer caracteres independemente de fonte ou tamanho, Kahan et al. (1987:275) enumeram cinco ‘grupos de confusão’ de caracteres, que mereceriam estratégias específicas para serem corretamente identificados: <a, e, s, g, 8, B>, <O, o, 0, D, Q>, <6, b>, <b, h> e <f, t> (poderíamos acrescentar a esta lista o grupo <i, I, l, 1>. 24


Os caracteres da fonte E-13B

Caracteres da fonte CMC7

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Segundo os autores, estes grupos podem gerar amiguidades no reconhecimento mesmo entre leitores humanos, assim como alguns pares de caracteres que, a partir de um certo grau de sobreposição podem ser interpretados como uma única letra (por exemplo <Io, b>, <nn, mm>, <cI, d>). Podemos imaginar que, em se tratando de leitores humanos, na maioria dos casos estas ambiguidades podem ser desfeitas com o auxílio de contextos maiores, como o da palavra ou do texto, no qual se inserem estes caracteres. Embora a grande maioria dos programas de OCR baseie-se no reconhecimento dos caracteres como formas isoladas, algumas tentativas foram feitas para resolver o problema a partir do reconhecimento de caracteres agrupados em palavras. em uma pesquisa publicada em 1986, Hull e Srihari apresentaram um algoritmo para a leitura de imagens de palavras baseado em alguns dados sobre as características do processo de leitura humano. No modelo apresentado por estes pesquisadores, o reconhecimento inicia-se com a geração de uma hipótese a partir do formato de uma palavra (em caixa baixa), e chega a uma resposta a partir de uma série de testes que checam a presença de características do nível das letras. A proposta de Hull e Srihari é uma das poucas, dentro do campo de reconhecimento de caracteres por computador, a partir de um contexto maior (palavra) para chegar se necessário,a um contexto menor (caractere). A maior parte dos sistemas de OCR faz uso de um certo conhecimento sobre o contexto linguístico apenas como última estratégia para desfazer eventuais ambiguidades. Este procedimento costuma estar baseado na implementação de pequenos dicionários, gramáticas formais, ou ambos. Uma das restrições deste procedimento é que ele depende das características léxicas, gramaticais e semânticas de uma língua. Um sistema que possua conhecimento somente da língua inglesa, por exemplo, nunca poderá tomar decisões linguísticas corretas para documentos em outras línguas, podendo até mesmo gerar um número maior de erros.

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Uma forma de contornar este problema foi a inclusão, em programas comerciais de OCR, de diversas opções de línguas, opção que deve ser determinada pelo usuário antes do início do processo de reconhecimento. Em uma pesquisa recentemente publicada, A. Lawrence Spits (Spitz 1997) descreve um sistema para a identificação automática de línguas escritas, indispensável para a capacidade de efetuar reconhecimento de caracteres em documentos escritos em mais de uma língua (japonês e inglês, por exemplo). Assim como no modelo de Hull e Srihari, no sistema proposta


por Spitz uma análise mais geral do padrão das palavras deve ser efetuada antes do reconhecimento dos caracteres de um texto. É possível dizer que grande parte da inflexibilidade dos programas de reconhecimento de caracteres deriva da unilinearidade de seus algoritmos e/ou de sua incapacidade de lidar com os diversos aspectos contextuais envolvidos no processo de leitura. Leitores humanos, por sua vez, apesar de potencialmente mais flexíveis, são aparentemente sensíveis a outros tipos de dados no decorrer da experiência sensória da leitura, o que faz com que seus relatos a respeito dessa experiência possam incluir aspectos qualitativos como ‘agradável’ ou ‘desconfortável’.

A Legibilidade e Tipografia

De acordo com o Oxford English dictionary, o termo ‘legible’ significa ‘O que pode ser lido. (...) Suficientemente claro para ser lido; facilmente decifrável’, enquanto para ‘readable’ encontramos: ‘Apto para ser lido, legível. (...) Apto para ser lido com prazer ou interesse. Geralmente empregado a respeito de trabalho literário: Fácil ou agradável de ler, de estilo aprazível ou atrativo’. Muitos textos em inglês, contudo, tratam ambos os termos como sinônimos ou evitam o uso do termo ‘readability’. Mesmo Herbet Spencer, pesquisar ‘legibility’ em seu livro The visible word (Spencer 1969). Se em português não encontramos sinônimos para ‘legibilidade’, determinar exatamente qual a diferença entre os dois termos parece não ser tarefa fácil, mesmo para pesquisadores de língua inglesa. Em um texto originalmente escrito para uma palestra ministrada em 1932, intitulada ‘The crystal goblet, or: printing should be invisible’, a chefe do departamento de publicidade da Monotype Corporation, Beatrice Warde, afirmava que:

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‘Se os livros são para serem lidos, devemos distinguir readability daquilo que os pesquisadores de fenômenos ópticos chama de legibility. Uma página composta com uma fonte bold sem serifa em corpo de 14 pontos é, de acordo com testes de laboratório, mais ‘legible’ do que uma composta em Baskerville com 11 pontos. A voz de um orador, neste sentido, é mais ‘audível’ quando ele berra. Mas uma boa voz é aquela inaudível enquanto voz. … A tipografia bem utilizada é invisível enquanto tipografia, assim como uma oratória perfeita é o veículo não perceptível para a transmissão de palavras, idéias’ (in McLean 1995:75. Itálicos e aspas da autora. Os grifos em versalete são nossos).

Em letters of credit: a view of type design, o tipógrafo Walter Tracy propõe a seguinte discriminação entre ‘legibility’ e ‘readability’: ‘Legibility é o termo a ser usado quando estivermos discutindo a clareza de caracteres isolados …. Refere-se à percepção, e sua medida é a velocidade com que um caractere pode ser reconhecido. Readability descreve uma qualidade de conforto visual … refere-se à compreensão, e sua medida é a quantidade de tempo que um leitor pode dedicar a um segmento de texto sem se cansar’ (Tracy 1986:31, grifo nosso).

Fonte Caslon: Bela, delicada, elegante, e aristocrática.

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Para exemplificar este argumento, Tracy diz que ‘os caracteres de uma determinada fonte sem serifa podem ser perfeitamente legíveis (legible) em si, mas ninguém pensaria em utilizá-los na publicação de um livro popular porque sua legibilidade (readability) é baixa’ (Tracy 1986:31). Embora seu argumento não esteja baseado na literatura científica, é fácil perceber que a maior parte dos livros, jornais, e até mesmo documentos eletrônicos utilizam fontes serifadas em seus textos. No sentido dado por Warde e Tracy, talvez ‘readability’, ao nível dos caracteres, pudesse ser definida como a capacidade de uma determinada fonte de dar forma a um texto sem requerer um esforço adicional do leitor. Se considerarmos, porém, que o ‘cansaço’ de um leitor frente a um texto pode ser motivado por muitos outros fatores que não o desenho da fonte com a qual ele foi atualizado, perceberemos porque o termo ‘readability’ é evitado por outros autores. Em todo caso, se concordarmos que qualquer leitor, razoavelmente experiente, é sensível à forma das palavras (ver os experimentos científicos descritos no início deste capítulo), podemos supor que um grupo de letras que modifique estas formas gerais e familiares influenciará a velocidade de reconhecimento dos caracteres e das palavras, e assim a velocidade e o ‘conforto’ de sua leitura. As pesquisas sobre rapidez e conforto da leitura relatadas em Spencer (1969:21-26), contudo, não chegaram a nenhuma constatação definitiva, a não ser à conclusão comum de que certos aspectos do processo de leitura dificilmente poderiam ser medidos de forma objetivo. No que diz respeito à legibilidade de fontes específicas, muitos concluíram que familiaridade e valores estéticos tem um papel importante na leitura de textos longos. De fato, dos nove itens relatados por Spencer em seu ‘sumário’das principais descobertas a respeito da legibilidade, apenas um diz respeito ao design de tipos: ‘Palavras compostas apenas com letras maiúsculas são consideravelmente menos legíveis do que palavras compostas em caixa baixa. Tipos itálicos reduzem a legibilidade, mas tipos bold não, uma vez que tenham rebaixos abertos. Tipos semi-bold são preferidos por muitos leitores. Para pessoas com problemas de visão, tipos semi-bold são essenciais’ (Spencer 1969:55).

A relação entre familiaridade e legibilidade é um tema recorrente entre os tipógrafos. Em seu livro An essay on typography, o tipógrafo inglês Eric Gill afirmou que: ‘Legibilidade, em prática, corresponde simplesmente àquilo [aos tipos de letras] a que acostumamos’ (Gill 1988[1931]:44). Relacionando legibilidade e memória, o tipógrafo suíço Adrian Frutiger argumento que os fundamentos da legibilidade baseiam-se em ‘uma espécie de cristalização

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Exemplos de conotações Respectivamente ‘Grito’e ‘Clareza’

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formada por uso secular, seletivo e mais determinante de certas tipografias,’ e foi mais além ao sugerir que ‘o que sobreviveu ao tempo (...) talvez já constitua uma leia estética irremovível’ (Frutiger 1995 [1978]:151).

Em sua célebre palestra, Beatrice Warde afirmava que uma tipografia eficiente deveria ser ‘invisível’ (cd. McLean 1995:73-77). Em um depoimento à revista UGlc, a tipógrafa norte-americana Zuzana Licko reformula o argumento de Warde, ao afirmar que: ‘Legibilidade é neutralidade. As fontes mais populares são as mais fáceis de ler; a popularidade fez com que elas desaparecessem de nossa cognição consciente. Depois de um certo tempo, é impossível dizer se elas são fáceis de ler porque são usadas, ou se são muito usadas porque são fáceis de ler’ (in Richardson 1990:15).

A polêmica em torno da (i)legibilidade das tipografias das décadas de 80 e 90 pode ser dividida em duas vertentes: uma diz respeito à popularização dos meios de produção, que teria levado a uma grande diversidade de fontes, talvez excêntricas demais; e outra, já um tanto superada, diz respeito aos próprios meios digitais enquanto suporte adequado para a tipografia. Se a linguagem Postscript e as impressoras de última geração parecem ter dado um fim ao problema do serrilhado típico dos computadores para saídas impressas, problemas de espaçamento, inconsistência do desenho e baixa legibilidade nas telas de computadores ainda persistem. Embora muitos dos princípios dados como certos na tipografia impressa não possam ser aplicados diretamente à tipografia ‘em tela’, os problemas que dizem respeito ao design de tipos podemos ser resolvidos a partir da edição dos bitmaps de uma fonte, como no caso da família Base da Zuzana Licko, na verdade, até mesmo uma fonte radicalmente fora dos padrões pode se tornar, neste sentido mais ‘legível’, se tiver seus bitmaps editados do que uma fonte tradicional gerada automaticamente para tela a partir de seus contornos.

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LEIS DA GES TALT

Por João Gomes Filho



a

A seguir, são colocados os rebatimentos operados sobre as leis da Gestalt, que dão o embasamento científico a este sistema de leitura visual. Ou seja, a partir destas leis, foi criado o suporte sensível e racional, espécie de abecê da leitura visual, que vai permitir e favorecer toda e qualquer articulação analítica e interpretativa da forma do objeto, sobretudo, com relação à utilização das demais categorias conceituais.

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Unidades

Uma unidade formal pode ser identificada em um único elemento, que se encerra em si mesmo, ou como parte de um todo. Em uma conceituação mais ampla, pode ser compreendida como o conjunto de mais de um elemento, que confia o ‘todo’ propriamente dito. Ou seja, o próprio objeto. As unidade são percebidas por meio da verificação de relações (formais, dimensionais, cromáticas etc.) que se estabelecem entre si na configuração do objeto como um todo ou em partes desse objeto. Uma ou mais unidade formais são percebidas dentro de um todo por meio de pontos, linhas, planos, volumes, cores, sombras, brilhos, texturas e outros atributos isolados ou combinados entre si. No caso de um objeto ser constituído por conjunto de numerosas unidades, para proceder à análise e interpretação visual da forma, pode-se adotar o critério de se eleger unidades principais, desde que estas sejam suficientes para realizar a leitura.

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Ariel Di Lisio Buenos Aires, Argentina

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Ariel Di Lisio Buenos Aires, Argentina

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Sig Vicious Reykjavik, Islândia

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Sig Vicious Reykjavik, Islândia

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Jerome Corgier Paris, Franรงa

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Jerome Corgier Paris, Franรงa

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Jerome Corgier Paris, Franรงa

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Segregação

Segregação significa a capacidade perceptiva de separar, identificar, evidenciar, notar ou destacar unidades, em um todo compositivo ou em partes deste todo, dentro de relações formais, dimensionais de posicionamento. Naturalmente, pode-se separar uma ou mais unidades, dependendo da desigualdade dos estímulos produzidos pelo campo visual – em função das forças de um ou mais tipos de contrastes. A segregação de elementos visuais pode ser feita por diversos meios: pontos, linhas, planos, volumes, cores, sombras, brilhos, texturas, relevos e outros. Para efeito de leitura visual, pode-se também estabelecer níveis de segregação. Por exemplo, identificando-se apenas as unidades principais de um todo mais complexo, desde que seja suficiente para o objetivo desejado de análise e interpretação visual da forma do objeto.

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Monica Fontana Ontรกrio, Canadรก

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Monica Fontana Ontรกrio, Canadรก

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Amber Rose Seppi Toronto, Canadรก

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Unificação

A unificação da forma consiste na igualdade ou semelhança dos estímulos produzidos pelo campo visual. A unificação se verifica quando os princípios de harmonia e equilíbrio visual e, sobretudo, a coerência do estilo formal das partes ou do todo estão presentes em um objeto ou numa composição. Dois princípios básicos concorrem fortemente para a unificação da organização formal: são as leis de proximidade e de semelhança quando presentes em partes ou no objeto como um todo, conforme se verá mais adiante. Importante salientar que, obviamente, a unificação também se manifesta em graus de qualidade, ou seja, varia em razão de uma melhor ou pior organização forma. Nesse caso pode-se atribuir índices qualificativos para uma dada leitura.

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Francisco Elias Lisboa, Portugal

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Thom Isom Liverpool, Reino Unido

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Thom Isom Liverpool, Reino Unido

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Fechamento

O fator de fechamento estabelece ou concorre para a formação de unidades. As forças de organização de forma dirigem-se, de maneira natural, para uma ordem espacial que tende à formação de unidades em todos fechados. Em outras palavras, obtêm-se a sensação de fechamento visual da forma pela continuidade em uma ordem estrutural definida, ou seja, por meio de agrupamento de elementos da maneira a constituir uma figura total mais fechada ou mais completa. Importante não confundir a sensação de fechamento sensorial, de quem trata esta lei da Gestalt, com o fechamento físico, contorno real, presente em praticamente todas as formas dos objetos.

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Emmeran Richard Toulouse, Franรงa

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Emmeran Richard Toulouse, Franรงa

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Marcos MontanĂŠ Buenos Aires, Argentina

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Continuidade

A continuidade, ou continuação, define-se como a impressão visual de como as partes se sucedem por meio da organização perceptiva da forma de modo coerente, sem quebras ou interrupções (descontinuidades) na sua trajetória ou na sua fluidez visual. Significa também a tendência dos elementos de acompanharem um aos outros, de maneira tal que permitam a continuidade de um movimento para uma direção já estabelecida, por meio de unidades formais como pontos, linhas, planos, volumes, cores, texturas, brilhos, degradês e outros. A continuidade com fluidez visual concorre, para sempre, no sentido de se alcançar a melhor forma possível do objeto, a forma mais estável estruturalmente, em termos perceptivos. Nesse caso, a Gestalt a qualifica utilizando o adjetivo de boa continuidade ou continuação.

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Liu Si Paris, Franรงa

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Liu Si Paris, Franรงa

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Pop Chang Shanghai, China

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Proximidade

Elementos ópticos, próximos uns dos outros, tendem a ser vistos juntos e, por conseguinte, a constituírem um todo ou unidades dentro do todo. Em condições iguais os estímulos mais próximos entre si, seja por forma, cor, tamanho, textura, brilho, peso, direção e localização, terão maior tendência a ser agrupados e a constituir unidades. Importa observar que a proximidade e a semelhança são dois fatos que muitas vezes agem em comum e reforçam-se mutuamente, tanto para formar unidades como para unificar a forma.

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Jorge Mendez San Jose, Costa Rica

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Greig Anderson Glasgow, Reino Unido

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Greig Anderson Glasgow, Reino Unido

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Semelhança

A igualdade de forma e de cor desperta também a tendência de se construir unidades, isto é, de estabelecer agrupamentos de partes semelhantes. Em condições iguais, ou estímulos mais semelhantes entre si, seja por forma, cor, tamanho, peso, direção e localização, terão maior tendência a ser agrupados, a constituir partes ou unidades. Em condições iguais, os estímulos originados por semelhança e em maior proximidade terão também maior tendência ao serem agrupados e ao constituírem unidades. Semelhança e proximidade são dois fatores que, além de concorrerem para a formação de unidades, concorrem também para promover a unificação do todo, daquilo que é visto, no sentido da harmonia e equilíbrio visual.

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Jordan Metcalf Cape Town, Ă frica do sul

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Jordan Metcalf Cape Town, Ă frica do sul

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Martin Malacek London, Reino Unido

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Pregnância da Forma

A pregnância da forma é a Lei Básica da Percepção Visual da Gestalt, assim definida: As forças de organização da forma tendem a se dirigir tanto quanto o permitiam as condições dadas, no sentido da harmonia e do equilíbrio visual. Qualquer padrão de estímulo tende a ser visto de tal modo que a estrutura resultante é tão simples quanto o permitam as condições dadas. Em outras palavras, pode-se afirmar que um objeto com alta pregnância é um objeto que tende espontaneamente para uma estrutura mais simples, mais equilibrada, mais homogênea e mais regular. Apresenta um máximo de harmonia, unificação, clareza formal e um mínimo de complicação visual na organização de suas partes ou mais unidades compositivas.

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Mark van de Vis AmesterdĂŁ, Holanda

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Mark van de Vis AmesterdĂŁ, Holanda

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Bran Cirk Los Angeles, EUA

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Bran Cirk Los Angeles, EUA

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Continuando, uma melhor pregnância pressupõem que a organização formal do objeto, no sentido psicológico, tenderá a ser sempre a melhor possível do ponto de vista estrutural. Assim, para efeito desse sistema de leitura visual, pode-se afirmar e estabelecer o seguinte critério de qualificação ou julgamento organizacional da forma: 1. Quanto melhor ou mais clara for a organização visual da forma do objeto, em termos de facilidade de compreensão e rapidez de leitura ou interpretação, maior será o seu grau de pregnância; 2. Naturalmente, quanto pior ou mais complicada e confusa for a organização visual da forma do objeto, em termos de facilidade de compreensão e rapidez de leitura ou interpretação, maior será o seu grau de pregnância;

Para facilitar o julgamento da pregnância, pode se estabelecer um grau ou um índice de pontuação, como por exemplo: baixo, médio, alto. Ou uma nota de 1 a 10 no sentido da melhor para a pior qualificação. É oportuno assinalar que na legibilidade da forma de qualquer objeto, para efeito desse sistema de leitura visual, a lei da pregnância da forma funciona efetivamente como uma interpretação analítica conclusiva acerca do objeto como um todo. Desse modo, trata-se de um juízo definitivo que se faz com relação ao nível de qualificação da organização visual da forma do objeto, conforme fica claro e demonstrado ao longo dos exercícios de leitura visual realizados nas páginas deste livro.

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GEST ALTTE RAPIA Por Therese Tellegen



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Apresentar aqui a Gestalt-terapia, sua origem e desenvolvimento, sua inserção no cenário psicoterápico, representa um esforço de síntese-pessoal e seletiva de informações espalhadas em várias obras. Abrem se dois caminhos possíveis. Um seria uma exposição sistemática de conceitos teóricos e suas aplicações práticas. Outro seria acompanhar o iniciador da Gestalt-terapia. Outro seria acompanhar o iniciador da Gestalt-terapia. Frederick S. Perls, na sua trajetória de vida, compartilhar sua busca, seus questionamentos, deixando emergir aqueles aspectos que hoje nos tocam como significativos e que dão sentido a tentativa de dar continuidade ao seu pensamento e à prática psicoterápica e educacional nele baseada. Não foi difícil escolher. O processo é o mais rico do que o produto, pois a obra de Perls é inacabada e fragmentária. Se, de um lado isto caracteriza uma obra aberta à reformulação, acarreta também o risco de fazer da Gestalt terapia uma tecnologia psicoterápica que gira no vazio por falta de bases conceituais claras. Indubitavelmente, Perls soube responder (através de sua abordagem gestáltica) as necessidades, inquietações e anseios da geração jovem adulta nos Estados Unidos na década de sessenta, Mais do que uma terapia, ela passou a ser para ele uma concepção de vida que contestava muitos dos valores típicos de uma sociedade industrial e comunista. Hoje, 1984 quatorze anos após a sua morte a Gestalt-terapia continua se afirmando e exercendo atração em muitas partes do mundo. Acredito que, ao retomar as intuições de Perls, revendo-as à luz de contribuições mais recentes das ciências humanas com as quais ele já não teve contato, é possível dar à Gestalt-terapia um suporte técnico mais sólido. Embora esta meta não esteja dentro do escopo deste livro, para reafirmar que acredito ser fundamental num esforço nesta direção para que a Gestalt-terapia não corra risco de se tornar um modismo, uma ilusão psicoterápica ou, pior. um instrumento de manipulação, inconsciente de suas premissas teóricas, filosóficas e ideológicas.

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Em 1920 graduou-se como médico e começou desde logo cedo a trabalhar como neuropsiquiatra, fazendo parte da boemia berlinense nas horas vagas. Desiludido com a hipocrisia a ganância e o nacionalismo, mesquinho da época, ela se associou ao grupo Bauhaus composto de artistas, arquitetos , poetas, filósofos, escritores, todos radicais políticos dissidentes da ordem estabelecida, lutando por novas expressões e por um estilo de vida menos rígido e preso aos códigos vigentes. Foi neste ambiente que encontrou o filósofo Sigmund Friedländer, que teria profunda influência sobre seu pensamento. Depois de muitos acontecimentos, entre os quais uma tentativa de se estabelecer nos Estados Unidos, Fritz voltou a Berlim onde faz análise com Karen Horney, que depois de algum tempo o aconselhou a sair de Berlim. Foi a ida para Frankfurt que se tornou decisiva para todo o seu desenvolvimento posterior. Fritz já interessava pelo trabalho de Kurt Goldstein, que estudava as manifestações comportamentais de lesões cerebrais, com base nas noções de Psicologia Gestalt de Wentheimer, Köhler e Koffka. Em 1926 trabalhou como assistente de Goldsten no Instituto de soldados portadores de lesão cerebral. Além disso, sentia-se atraído pelo pensamento existencial de Martin Bubeer e Tillich, ambos também radicados em Frankfurt. Não deixou de se submeter a psicanálise e, após um ano, sua analista o encaminhou para Viena para iniciar sua análise didática. Lá recebeu supervisão de Helene Deutsch, A. Hirshman, entre outros; assistiu seminários de Otto Fenichel e Paul Federn e trabalhou num hospital psiquiátrico dirigido por Paul Schilder. De Volta a Berlim, em 1928, foi novamente Karen Horney quem o orientou, desta vez para continuar sua análise com Wilhelm Reich. Temos aqui reunidas todas as correntes que exerceram influência duradoura em Perls e que, portanto, aparecem na Gestalt-terapia que mais tarde formulará. Em Frankfurt também conheceu Lore (Laura) Posner, graduada em psicologia dentro da escola de Gestalt, psicanalista formada, com quem se casou alguns anos depois, e que sempre esteve presente exercendo grande influência no desenvolvimento da Gestalt-terapia. Na época (já estamos em 1931), Perls se envolveu no movimento antinazista e, quando a oposição falhou, precisou, como muitos outros, buscar um esconderijo. Reich fugiu para a Noruega e Fritz, Laura e a primeira filha se separaram temporariamente. Fritz se refugiou em Amsterdam para onde a família seguiu mais tarde. Sem recursos e sem 78


licença para trabalhar, a situação se tornou insustentável. Em 1942 Perls novamente se encontrava envolvido numa guerra, como psiquiatra do exército sul-africano ao lado dos Aliados contra Alemanha depois do término da segunda guerra mundial pressentindo fascismo sul-africano da política de Apartheid o casal resolveu emigrar para os Estados Unidos onde encontrar ia inúmeros analistas europeus várias personalidades de destaque entre outros Karen Horney, Erich Fromm e Paul Goodman, havia se impressionado com o seu livro. Com Apoio sobretudo de Fromm, Perls e Laura Estavam bem estabelecidos como psicanalista ligados a um grupo neofreudiano. Nos seus próprios 10 anos em Nova York o casal se associou a grupos de intelectuais e artistas radicais e dissidentes, Cuja ênfase estava em ir até as últimas consequências No desmascaramento da banalidade é hipocrisia nas relações interpessoais e nas instituições sociais. Era um clima semelhante ao de Berlim na década de 20 só que Perls e Laura percebiam uma geração mais velha e como analista europeus, davam um certo peso ao grupo faziam parte de um grupo Julian Beck, Judith Malina e componentes do Living Theatre, o que reavivou em Perls o velho amor pelo teatro e também lançou numa radical tentativa de abolir as dicotomias entre vida pessoal e profissional. Cada vez mais se distanciava do estilo de vida e trabalho dos psicanalistas, com os quais acabou se dispondo irremediavelmente. Uma das personalidades centrais do grupo era Paul Goodman, intelectual, anarquista e crítico literário, que passou a fazer parte do primeiro círculo reunido em torno de Fritz e Laura, e que junto com Ralph Hefferline foi co-autor do segundo livro de Perls. Hefferline lecionava psicologia na Universidade de Columbia, e experimentou com seus alunos os exercícios da ‘terapia da concentração’, descrevendo os resultados com algumas elaborações teóricas , o que veio a construir a primeira parte do livro. Paul Goodman redigiu a parte teórica com base em anotações de Perls e muitas discussões com o casal. Foi Perls que insistiu no título ‘Gestalt Therapy’, apesar das fortes objeções de Laura, que previa dificuldades com os representantes da Gestalt-psicologia acadêmica ; de Paul Goodman que achou o nome esotérico, e também de Hefferline, cuja sugestão era algo como Terapia Interativa. O livro foi publicado em 1951, com o título proposto por Perls e em 1952. A nova abordagem terapêutica estava lançada. sua história própria começava. 79


Em 1962, num período de profundo questionamento, inclusive de seu papel de terapeuta, Perls fez uma viagem ao redor do mundo, ficando dois meses num mosteiro budista em Quioto, Japão, e um mês num kibutz em Israel. Em 1964, ele se radicou em Esalen (Califórnia), o mais conhecido dos centros (Growth Center) do movimento do potencial humano (human potential movement). Esalen era, e ainda é um lugar por onde passam milhares de pessoas em busca de novas experiências de vida e expressão pessoal em arte e ciência , filosofia oriental, conscientização sensorial, comunicação interpessoal, etc. Foi lá que Perls , durante cinco anos ensinou Gestalt-terapia em programas de duração variável e onde a maioria das fitas, vídeos e filmes dos seus seminários gravada. Seu terceiro livro publicado em 1969, Gestalty Therapy Verbatim, é a transição de palestras, seminários e sessões terapêuticas dessa época. foi também lá que escreveu sua autobiografia, In and out the garbage pail. Mais uma vez, em 1969, aos 76 anos, Perls mudou de país para formar uma comunidade gestáltica, uma espécie de kibutz, no Canadá, em parte motivado pela convicção de que a experiência de vida comunitária supera qualquer tipo de terapia, em parte por problemas e insatisfações em Esalene , finalmente, pela situação política nos Estados Unidos, na época da guerra do Vietnã, interpretada por Perls como o advento de um fascismo norte-americano. Assim iniciou-se o ‘Gestalt Institute of Canada’, onde Perls passou os últimos meses de sua vida, finalmente em paz, convicto de que sua abordagem gestáltica estava recebendo reconhecimento em muitos lugares nos Estados Unidos, como indicam os inúmeros convites que recebia para dar conferências. Estava preparando mais um livro, The Gestalt Appproach to Therapy publicado postumamente em 1973 quando, numa destas viagens, foi internado em Chicago, falecendo em 14 de março de 1970.

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GEST ALT À LUZ DA NEU RO CIÊNCIA

Por Marcelo Miguel



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Encantados com a natureza das percepções equivocadas que acometem a todos, pesquisadores alemães da Universidade de Frankfurt no final do século retrasado (Max Wertheimer, 1880-1943, Kurt Koffka, 1886-1941 e Wolfgang Köhler, 1887-1967) começaram a divulgar uma teoria da percepção, que ficou conhecida por Teoria da Gestalt, baseada em algumas anotações do filósofo vienense Von Ehrenfels. Uma teoria unificadora da forma e da percepção, que se preocupou em explicar o porquê de sermos muitas vezes ludibriados pelas ilusões ópticas, como estes famosos desenhos que viraram febre na internet, apresentados a seguir.

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Quantas patas tem o elefante?

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Quantas pontas tem o garfo?

Sabemos de antemão que um elefante possui 4 patas, mas nos confundimos ao contar as patas pois algumas delas são de fato espaço entre as pernas. O mesmo ocorre com o garfo, nossa percepção teima em afirmar que as linhas horizontais são tortas, mas na verdade elas são paralelas. Passando os olhos na figura, veremos pontos pretos cintilando entre os quadrados. Porém os tais pontos pretos não existem no desenho. Recentemente, com as conclusões de diversas pesquisas que se tornaram mais frequentes e intensas a partir de 1990, psicólogos cognitivos e neurocientistas, como António Damásio, Vilayanur S. Ramachandran, Oliver Sacks, Walter J. Freeman, Nikos K. Logothetis, Edouard Gentaz, Yvette Hatell, John McCrone e Steven Pinker, se debruçaram para compreender a maquinaria dos sentidos e, alguns mais ousados, a natureza do que chamamos consciência.

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As linhas estĂŁo paralelas ou tortas?

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Quantos pontos pretos existem no desenho?

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Com base nessas descobertas e redescobertas científicas, algumas somente possíveis graças aos avanços tecnológicos dos aparelhos que perscrutam o cérebro vivo e em ação, retomamos nesta pesquisa as premissas da teoria da Gestalt desenvolvidas no final do século xix e, à luz do estado da arte da Neurociência sobre a percepção e cognição, iremos reconsiderar e, principalmente, ampliar e respaldar os insights dessa teoria, que considerava a busca e a construção de um sentido unificador dos objetos percebidos pelo sentido da visão como uma condição anterior ao processo cognitivo, instintiva e, até certo 54 ponto, independente da vontade. Esta revisão dos preceitos da Gestalt a partir do olhar das pesquisas em neurociências nos serão úteis para compreender como a forma das letras podem suscitar novos sentidos ao texto ao leitor mesmo antes que seu processo cognitivo tome as rédeas da interpretação. Antes das pesquisas que esses alemães da Universidade de Frankfurt fizeram, havia um consenso entre os pesquisadores da área de que a percepção era resultado de uma soma simples das partes que compunham a cena, incluindo o cenário. Ou seja, que o sistema consciente observava cada objeto e depois compunha a cena com cada um dos seus elementos para obter um quadro geral. Porém, o que notamos no dia-a-dia é que a percepção é, para nossa consciência, instantânea. Então, se a percepção tende a ser instantânea, como se processa o ato de ver?

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O SENTIDO DOS SENTIDOS

É difícil conceber que os dois círculos azuis possuem o mesmo diâmetro. Mesmo depois de aferirmos as medidas iguais com instrumentos, nossa mente insiste em montar a mesma imagem inicial, que contraria a sua própria constatação métrica. Como ocorre este desencontro?

Qual dos círculos azuis é maior?

Para ficar mais claro, vamos retomar etimologicamente os sentidos do verbo Ver. Ele surge do latim videre, que era usado como sinônimo de ‘perceber pela vista, notar, observar, enxergar, presenciar, ir ter com alguém (como sentidos concretos)’e também ‘ver com os olhos do espírito, com o pensamento, imaginação, compreender, dar por conta, julgar, determinar (como sentidos abstratos)’(machado, 1967). 91


Nossos órgãos sensoriais da visão são capazes de registrar por volta de 24 quadros por segundo. O cinema de película, por exemplo, exibe 24 quadros em sequência por segundo, o que nos dá a sensação de continuidade. No vídeo, a taxa de fps (frames per second) é ainda maior (30), o que garante a sensação rítmica de estarmos vendo algo como se de fato acontecesse ao vivo, transformando cada imagem em minúsculos pontos, pequenos tijolos de imagem chamados pixels. A imagem chega aos olhos por meio da luz ambiente refletida, que é um feixe de ondas eletromagnéticas de diversas intensidades e comprimentos, e que por sua vez sensibilizar a retina, uma pequena camada de células nervosas especializadas em capturar dados de variados espectros da onda luminosa, que se encontra na parede interna da câmara ocular. De forma análoga à superfície do sensor CCD das câmeras digitais, a retina é constituída por um emaranhado de células, cada uma defendendo seu lugar ao sol, ou melhor, à luz, seja de fonte natural ou artificial. Na retina, temos duas espécies de células: os Cones, que são sensíveis às cores, e os Bastonetes, sensíveis aos tons de luminosidade (claro e escuro). Digamos que os cones vão delimitar o que é verde, o que é vermelho etc. Os bastonetes observam a quantidade de luz que está incidindo em cada ponto da retina, determinando claros e escuros, como uma imagem em preto e branco. Os três tipos de células Cone se dispersam sobre a retina, concentrando-se mais na fóvea, que corresponde à área da retina que mais recebe os raios de luz por estar a praticamente 90 graus da abertura do olho. Os cones se diferenciam pelas cores do espectro que mais admiram ou, em linguagem científica, estão mais sintonizados. Um tipo de cone é mais sensível ao verde, 56 outro mais sensível ao vermelho e saindo outra ao azul índigo, que são as cores primárias de luz, as mesmas que formam as cores das TVs e dos monitores (RGB: Red, Green and Blue). Na superfície interna do olho, cada ponto da imagem é processado como uma espécie de pixel, que depois é decodificado em sinais nervosos com suas qualidades de posição (coordenadas) cor brilho e intensidade. Segundo as pesquisas relatadas por McCrone, em seu livro Como o Cérebro Funciona (2002, p. 35 a 41), esses sinais viajam pelo cérebro e são enviados para o lobo occipital, onde fica o córtex visual primário (uma ‘tela’de neurônios, que não é senão uma lâmina com área similar ao tamanho da palma da mão, com cerca de dois milímetros de espessura, contando em torno de 500 milhões de neurônios interconectados). 92


O córtex humano possui trinta áreas distintas de processamento visual. Elas analisam o que os olhos vêem passo a passo, de maneira quase instantânea. Os cientistas distiguem cinco áreas mais importantes. A chamada V1, que corresponde ao córtex visual primário, é a área de mapeamento inicial, que analisa contrastes básicos, agrupando ou segregando partes da imagem para formar um todo coerente (que correspondem na Gestalt às tendências ao agrupamento ou segregação). Na sequência, a área V2 analisa as fronteiras e contornos, uma espécie de esboço dos principais objetos que compõem a cena. Na Gestalt, ela está diretamente relacionada com a tendência ao fechamento. A área V3 enriquece o quadro delimitando melhor as formas, dando noção de volume e recriando a profundidade da cena. Nos insights da Gestalt, a área V3, com seu potencial em compreender imagens em planos diferentes, é responsável pela tendência à tridimensionalidade. E também à tendência de agrupamento por proximidade e por semelhança. A área V4 inclui a cor e a V5 analisa o movimento, só depois dos esboços montados pela V2 e V3, que favorecem a visão em três dimensões. As dinâmicas de processamento da área V5 geram o que na Gestalt se estuda como tendência à boa continuidade. Figura 07 – Na figura A, nós não enxergamos imediatamente uma forma, que é clara na figura B, apesar de não se tratar de um triângulo propriamente, pois seus lados estão abertos. Como a forma se aproxima à de um triângulo, a percepção tende a fechar os contornos. Figura 08 – Similar à anterior, consideramos instantaneamente que o espaço formado entre os semicírculos pretos é um quadrado, ainda que ele não esteja completo. A percepção fica ambígua quando completamos o contorno dos círculos, mas ainda assim o quadrado é claro, indicando a tendência ao Fechamento. Figura 09 – Na imagem A, vemos claramente um cubo (uma imagem em 3D). Na imagem B, há um momento de ambiguidade. Já na figura C, é mais difícil imaginarmos imediatamente o Cubo. A tendência é ver uma forma plana.Com a quebra de continuidade de alguns traços, indicados na figura D, a percepção volta a ver instantaneamente o cubo, indicando uma combinação de tendências. Figura 10 – A percepção tende a unir elementos pela proximidade entre eles ou por sua semelhança de formas, cores, texturas etc. Figura 11 – Como em tempo real, a mente observa imagens em 2 dimensões também como objetos suscetíveis às leis empíricas do movimento. 93


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Fig 7. Tendência ao Fechamento

Fig 8. Tendência ao Fechamento

Fig 9. Tendência a Tridimensionalidade

Fig 10. Tendência ao agrupamento por Proximidade e Semelhança

Fig 11. Tendência a Boa Continuidade

Fig 12. Tendência ao Fechamento e a Boa Continuidade


No caso, na primeira imagem, vemos claramente que o traço B não corresponde naturalmente à continuidade do traço. A mente considera instantaneamente que o traço C é a continuidade natural do A, (reforçado inclusive pelo hábito da escrita ocidental). Na imagem ao lado, temos um exemplo que gera ambiguidade. Tanto o traço B quanto o C podem ser considerados como a continuidade do traço. Figura 12 – Na imagem A, devido à boa continuidade das linhas horizontais, nossa percepção entende a imagem como um retângulo cortado ao meio, e não dois trapézios colados, Por outro lado, na figura B, é clara a distinção de 2 hexágonos, demonstrando que a tendência à Boa Continuidade interfere na tendência ao Fechamento, e vice-versa. (Fonte: gomes filho, 2000, p. 05-17) Todo este processo não demora mais que milésimos de segundo e é totalmente inconsciente. Reorganizada a imagem, ela é novamente enviada por sinais nervosos, agora para dois locais do cérebro ao mesmo tempo. Uma cópia segue para o lobo parietal, que, com seu padrão de processamento especializado, tenta responder à pergunta ‘onde está?’. Os neurônios dessa área são especializados em detectar desvios de posição e de movimento, para deduzir, sem a participação consciente, se o objeto visto está indo em direção ao sujeito que olha, se está parado, ou indo embora etc. É nesse momento que a cena se transforma por completo em uma imagem tridimensional, reconstituindo a noção de espaço ao redor do observador a partir dos esboços de planos e volumes dados pelas áreas V2 e V3 do córtex visual primário. O outro ramo segue em direção aos lobos temporais, que, cruzando e analisando dados da memória, tentam responder à pergunta ‘o que é isto?’. A memória fornece neste momento os dados que facilitariam o trabalho dos lobos temporais, reconhecendo a imagem como sendo algo já conhecido ou novo. Ainda sem consciência do fato, o consciente aguarda pacientemente o trabalho dos lobos parietais e temporais para somente depois tomar, literalmente, consciência dos fatos. Mas a espera não é de fato demorada, aliás nem nos damos conta dela. Não superamos nem mesmo 1/4 de segundo, mas ainda temos muitos neurônios pela frente.

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SENTIDOS EM TODOS OS SENTIDOS

Da última vez, a imagem havia se duplicado e sido enviada a duas áreas do cérebro. Uma para o lobo parietal, responsável pelo sentido corporal e espacial, e outra para o lobo temporal, que possui centros de memória e audição. Até o presente momento, o lobo frontal, que é responsável pelo planejamento consciente e controle motor, não foi informado de nada. Mesmo depois de tornar-se consciente da imagem, há ainda o risco do consciente não dar a devida relevância para o objeto da imagem. Essa é a indicação das principais pesquisas sobre percepção e atenção seletiva, acompanhadas pela repórter científica Helen Phillips, da revista norte-americana New Scientist, editada em português pela Scientific American Brasil. Outro enigma surgiu de um famoso experimento de Dan Simons e Christopher Chabris, de Harvard. Eles pediram a voluntários que assistissem a um jogo de basquete gravado em vídeo e contassem os passes feitos por uma das equipes. No início do jogo, um homem fantasiado de gorila atravessava a quadra caminhando, e durante 45 segundos podia ser visto. Ainda assim, 40% dos espectadores não notaram sua presença. Mas quando se solicitou que assistissem ao jogo sem nenhuma tarefa a cumprir, todos o viram imediatamente. Para Simons, isso indica que, embora tenhamos a impressão de ver um panorama completo e detalhado do mundo, há muita coisa faltando. Usamos o cérebro para preencher as lacunas (phillips, 2006, p. 72).

A imagem, na consciência do observador, só terá lugar se o objeto em questão for considerado como relevante pelo lobo frontal. A concorrência para tomar a atenção da consciência é enorme. Por isso, a evolução do ato de ver (e também dos outros sentidos) investiu tanto em sistemas automáticos de percepção anteriores à consciência. Para filtrar o que é realmente relevante e não se distrair com o que é redundante.

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GESTALT, UM SOFTWARE DE CÓDIGO ABERTO?

Depois de toda essa introdução à maquinaria de nosso sentido da visão, podemos voltar à definição daquele conceito inicialmente impenetrável chamado Gestalt. Podemos considerar, para fins didáticos, que Gestalt é um conjunto de princípios de percepção sensorial, uma espécie de reunião dos mais úteis e rápidos logaritmos mentais de reconhecimento instantâneo, que funcionam automaticamente sem a participação consciente. Um sistema com o seguinte propósito: entender rapidamente o que estamos a olhar. Em poucas palavras, qual é o seu significado. O que ele representa (inicialmente para a nossa sobrevivência). Está vindo em sua direção ou está fugindo? Está com raiva ou tranquilo, é comestível ou perigoso etc. Esse sistema de reconhecimento funciona instantaneamente, e depois fornece pistas verossímeis sobre o real, permitindo que, com nosso ferramental consciente, analisemos em partes, raciocinemos, deduzindo com mais precisão. E encontremos erros datilográficos naquele texto que revisamos por mil vezes, por exemplo. Este sistema quer facilitar nossa vida e, acima de tudo, manter-nos vivos. Assim, ao invés de olhar cada objeto e depois juntar, ele considera tudo ao mesmo tempo, fazendo relações entre as partes, e tirando uma conclusão do todo. É um processo espontâneo e incessante, e que não exige ordem do consciente. É por isso que a principal premissa da Gestalt é a de que não vemos partes isoladas, mas relações, isto é, uma parte na dependência de outra. Para a percepção, segundo os Gestaltistas, as partes são dependentes do todo.

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O SIGNIFICADO DE GESTALTCATEGORIAS E PRINCÍPIOS

As traduções mais felizes de Gestalt são ‘forma’, ‘totalidade’, ‘configuração’. A tradução mais comum em português é ‘boa forma’. Um outro sinônimo como área de pesquisa no Brasil para Gestalt é ‘Psicologia da Forma’. Cientistas dedicados a esta área observaram que a mente, quando se depara com uma imagem que nunca viu, sempre tenta entendê-la ou aproximá-la de algo que já lhe é familiar, que já ‘catalogou’ou categorizou de maneira muitas vezes inconsciente, em um formato que os cientistas cognitivos chamam de padrão ou memória conceitual (e o que António Damásio nomeia como representação dispositiva padrão), que pode ser alimentada tanto pela memória declarativa (aquela organizada e acessada pelo consciente) como pela não-declarativa (organizada pelo inconsciente, de conteúdo em parte adquirido e parte inato, e de difícil acesso ao consciente). […] nossos conceitos desses objetos são progressivamente construídos com base em numerosos contatos com diferentes tipos de xícaras e diferentes tipos de cadeiras… Todos os dias, manipulamos as categorias, e a avaliação das similaridades entre as coisas que vemos é tão importante quanto a das diferenças. Que tipo de memória subjaz à capacidade de adquirir conhecimentos sobre as categorias? A resposta é surpreendente: certos tipos de categorizações são não-declarativas (inconscientes) (kandel e squire, 2005, p. 62).

Esse sistema Gestalt possui um dinamismo auto-regulador que, à procura de sua estabilidade, tenta juntar o que vê em ‘todos’coerentes e unificados. Com o aval do consciente, os dados da percepção se transformam em memória conceitual. Sem o aval, a memória dos dados captados permanece emocional, mas continua a interferir inconscientemente − como uma espécie de trilha sonora ao fundo do plano consciente − e, em alguns momentos, decisivamente em nosso julgamento. E não há como nos livrarmos facilmente 65 desse mecanismo. Ele se origina de nossa estrutura cerebral, do ritmo e organização de nosso sistema nervoso. É por isso que funciona com todos que são da espécie. 98


[…] os conceitos são armazenados no cérebro sob a forma de registros ‘inativos’. Quando são reativados, esses registros recriam as sensações e as ações associadas a uma entidade ou a uma classe de entidades. Uma xícara de café, por exemplo, evoca ao mesmo tempo representações visuais e táteis de sua forma, cor, textura e temperatura, o odor e o gosto do café, assim como a trajetória da mão e do braço quando levam a xícara à boca. Todas estas representações são recriadas simultaneamente em distintas regiões do cérebro’(damásio e h. damásio, 2005, p. 29).

Os dados sensoriais, vindos de diversas partes do sistema nervoso, organizam-se em redes de conexão (gerando um padrão sensorial particular) a partir de um fator inicial em comum: a sincronia de suas ativações ou disparos (priming) no cérebro. Assim, estas redes e suas memórias sinápticas são inicialmente armazenadas, como um filme multimídia ou uma memória holográfica: cada instante forma um padrão específico que armazena dados sensoriais de tato, olfato, audição, paladar e visão, além da associação com outras memórias já organizadas. Este protocolo de backup enredado foi desenhado pela própria evolução, já que quantos mais canais de acesso uma memória tiver e quanto mais pontes possuir com outras memórias já catalogadas, maiores chances ela terá em sobreviver como memória, enfim, em ser útil ao portador. O que as representações dispositivas armazenam em suas pequenas comunidades de sinapses não é uma imagem per se, mas um meio para reconstruir um esboço dessa imagem. Se você possui uma representação dispositiva para o rosto de tia Maria, essa representação não contém o rosto dela como tal, mas os padrões de disparo que desencadeiam a reconstrução momentânea de uma representação aproximada desse rosto nos córtices visuais iniciais (damásio, 2002, p. 130). Cada vez que a imagem é evocada, a memória se reorganiza, incluindo ou eliminando novos dados, podendo inclusive se reforçar nos casos em que o processo é capaz de gerar sensações de alegria, prazer, riso, bem-estar ou tranquilidade. É isso que prediz a lei de Hebb, proposta pelo psicólogo canadense Donald Hebb em 1949 (pinker, 2001), segundo a qual as sinapses entre neurônios que disparam simultaneamente se tornam reforçadas, sempre e quando o disparo simultâneo é acompanhado por uma recompensa, que pode ser interna (a liberação de hormônios que causam a sensação de prazer no cérebro, que nos faz lembrar de uma piada mais eficientemente que do assunto da reunião de trabalho) ou externa (as festas mais lembradas são aquelas com os melhores bolos, ou com os melhores beijos). Assim, quando uma parte dos neurônios da rede recebe um estímulo já conhecido, todo o conjunto é ativado, remodelando e atualizando o padrão inicial. Nada que as salivações dos

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cães de Pavlov já não tenham indicado, em seus famosos experimentos na linha behaviorista. A diferença é a riqueza inusitada da lembrança, muito mais aprofundada e enredada, muito mais multimidiática que se preconizava na década de 80. E o que compromete o raciocínio puramente behaviorista: são tantos os canais relembrados que não se pode prever com exatidão o passo seguinte. Somente tendências, probabilidades, como na física quântica. Nunca se sabe ao certo qual será a ponte escolhida pela mente humana para engendrar o próximo pensamento. O resultado é uma Gestalt, uma percepção carregada de significado, única para cada indivíduo. Para um cão, reconhecer o cheiro de uma raposa pode evocar o alimento e a espera de uma refeição. Em um coelho, o mesmo cheiro desperta lembranças de fuga e o medo de ser agredido (freeman, 2005, p. 32). Voltando ao nosso principal sentido de estudo, o visual, ao vermos algo que se parece, por exemplo, (por semelhança de formas) com uma árvore, nossa mente entende que 67 ela é de fato uma árvore porque se parece com a imagem que temos na memória, ou seja, um padrão visual ou conceito visual de ‘árvore’(relativo à última remodelação das sinapses sincronizadas dos neurônios que formam a rede que memorizou o conceito ‘árvore’). Geralmente este padrão não é idêntico à primeira que vimos, e sim uma imagem revisitada e melhorada de todas as árvores que já registramos (uma espécie de poutporri sintetizado em uma imagem padrão), seja na vida real, seja a partir de fotos ou ilustrações, ou mesmo a partir do que nossa imaginação elaborou na falta do objeto. E geralmente a árvore que guardamos como padrão é a mais bela delas, indicando que a estética do inconsciente confunde deliberadamente o belo e o bom antes mesmo do consciente ‘abrir os olhos’. A razão disso é que a memória dá vantagem hierárquica àquilo que é também emocionalmente prazeroso, como nos indica a Lei de Hebb, recentemente comprovada por pesquisas na área da Neurociência. Mas suponhamos o caso de uma pessoa que tenha batido recentemente seu carro em uma árvore qualquer.

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Mesmo que não queira, por um bom tempo, esta pessoa terá, muito provavelmente, aquela incômoda imagem, e nenhuma outra mais, em sua mente quando alguém ou algo lhe evocar o conceito ‘árvore’. Apesar disso contrariar em parte a Lei de Hebb (afinal, acidentes não geram prazer; no máximo, geram curiosidade mórbida dos que não participaram dele), essa foi a maneira quase que ditatorial que a evolução


escolheu para alertar seu consciente, absorto de tanta autoconfiança racional, dos perigos potencialmente recorrentes. Esta memória, de forte tempero emocional, cria associações sinápticas resistentes com os neurônios da amígdala (região localizada no centro do cérebro especializada na avaliação do conteúdo emocional dos estímulos sensoriais, entre o Córtex Olfativo e o Hipocampo, logo abaixo do Tálamo), que dispara um sinal de alerta máximo sempre que percebe um indício, mesmo que escandalosamente falso para o nosso ser racional, de que algo parecido com o que ocorreu possa acontecer de novo. Tudo menos passar por aquele trauma novamente. A amígdala, assumindo as vezes de mãe do corpo, 68 imagina perigo em tudo por uns tempos, superprotegendo o corpo e sobrepondo-se ao consciente racional, que se vê impotente e com sua clareza comprometida pelos hormônios liberados a partir das ordens alarmistas da mãe. No governo do cérebro, a mãe amígdala tem lá seu arsenal de medidas provisórias. E inclusive algumas são inatas e gerais à espécie, referentes a situações que a pessoa em sã consciência ainda não teve o prazer ou desgosto de vivenciar, como o que se sucedeu com Darwin, em suas pesquisas para o desenvolvimento de teoria da Seleção Natural. Aproximei o rosto da grossa placa de vidro, por trás da qual havia uma cobra venenosa, no jardim zoológico, com a firme intenção de não recuar se a serpente desse o bote em minha direção; contudo, no momento em que o réptil atacou, minha resolução foi por água abaixo e saltei um ou dois metros para trás com uma rapidez impressionante. Tanto a vontade como a razão mostraram-se insuficientes ante a suposição de um perigo que jamais experimentara (darwin apud ledoux, 1998, p. 101). Estudos recentes reforçam essa tese, apresentando que não só as memórias ligadas às emoções positivas são armazenadas com sucesso. As sensações perturbadoras que geram emoções traumáticas também são capazes de potencializar a memória relacionada. Resumindo, podemos atualizar a lei de Hebb e, ao invés de considerar somente as emoções recompensadoras, considerar também as emoções relevantes à nossa sobrevivência, sejam elas prazerosas ou perturbadoras. Nossa maneira de avaliar a informação – por exemplo, o fato de associar um sentimento positivo ou negativo a um estímulo, nossos gostos e aversões fundamentais – é fruto de aprendizagem inconsciente (não-declarativa). Temos sentimentos particulares em relação a um estímulo que se considera neutro, como um som, por exemplo, 101


por causa das experiências que tivemos com determinados alimentos, lugares e sons. A importância da amígdala para a memória emocional foi especialmente bem demonstrada por um estudo realizado em adultos jovens. L. Cahill, J. McCaugh e seus colegas mostraram a 8 voluntários trechos de um filme neutro ou trechos de um filme perturbador, enquanto mediam o metabolismo da glicose no cérebro (o metabolismo cerebral da glicose é fortemente ligado à atividade dos neurônios). Três semanas depois, sem que tivessem sido informados previamente, os participantes foram submetidos a um teste de memória a fim de determinar a qualidade da lembrança dos trechos dos filmes. Conforme se esperava, eles se lembravam mais dos trechos do filme com forte carga emocional […] Portanto, quanto mais a amígdala se mostrava ativa durante a aprendizagem, mais ela armazenava memórias declarativas que tinham conteúdo emocional (kandel e squire, 2005, p. 55). Sejam elas memórias com carga emocional positiva ou negativa, mais dia menos dia elas já não são as mesmas. Mesmo as declarativas (memórias acessíveis ao consciente), antes fluídas como água, vão aos poucos se cristalizando, congelando-se em formatos cada vez menos conectados com o dia-a-dia, submergindo de seu desktop diário e se escondendo em alguma pasta dentro de outra pasta da qual você já não se lembra mais do nome. Quando, por acaso ou por esforço, você consegue evocar novamente a imagem, o conceito descongela e se mistura com a fluidez das memórias do momento, tornando-se outra coisa, partilhando alguns dados com conceitos novos, ganhando novos odores, sabores, enfim, ganhando uma nova versão. Os sentimentos filtram, avaliam e destacam o que deve ser lembrado e vinculado às lembranças existentes. Ativam diversos sistemas cerebrais e contribuem para construirmos associações apropriadas (markowitsch, 2006, p. 53). Essa tela mental em incessante reorganização chamado consciente pode fazer malabarismos com muitos dos conceitos que carregamos, inclusive alguns que nós já havíamos considerado esquecidos. Basta uma desconfiança, uma curiosidade, um fio de uma 70 melodia, uma necessidade premente, ou mesmo um odor particularmente destacado, para nosso inconsciente abrir os freezers e colocar tudo à temperatura ambiente. Em busca de sentido, somos capazes de fundir conceitos e formas, criar novas, subtrair, multiplicar, completar, tudo a partir das sugestões que nos são dadas ou captadas pelos outros sentidos. 102


A experiência dos tipógrafos também comprova que, mesmo fontes desenhadas propositadamente para evitar a subvocalização ou suscitar sensações cinéticas ou táteis, quando aplicadas a textos da linguagem fonética, são contaminadas pelo olhar do leitor . Fontes que exageram ou fogem da versão padrão dos grafemas 146 mesmo sem pistas, sem dicas rítmicas, sem pontuações, sem deixar claras, acaba por recriar as sensações em busca de uma Gestalt. Estes estilos de fontes, que, ao interpretarem visualmente o grafema (o esqueleto de cada letra) básico de cada fonema, avançam nos dois extremos (afastando demais do desenho do grafema ou limitando a representá-lo mecanicamente), são criadas geralmente mais para serem vistas do que lidas, pois acabam dificultando o fluxo de leitura e o ritmo da subvocalização, se comparadas com a fluidez inspirada pelas fontes de texto. Em frases muito curtas, elas tendem as ser lidas instantaneamente ou letra por letra, como se estivéssemos soletrando em processo de alfabetização (de fato, em alguns casos como os exemplos ao lado, a estranheza da fonte ou sua simplicidade exagerada nos põe em processo de ‘realfabetização’). Há casos de fontes (chamadas genericamente de fontes ‘display’pelos tipógrafos, ou de fontes excêntricas, por Priscila Farias (2001), por fugirem do centro representado pelo grafema básico) que extrapolam ao apresentar interpretações do tema principal do grafema que chegam a comprometer a sua decodificação. A tendência é a subvocalização lerda, ou silábica. Dependendo da intenção do autor, ao comprometer o fluxo do pensamento, este subterfúgio pode, ao contrário do que possa parecer, possibilitar a leitura dos signos de maneiras não convencionais, potencialmente mais capazes de tecer novos sentidos. Como qualquer ruído na sequência de antecipação (como vimos nos capítulos sobre Gestalt), esta prática tem um grande potencial de inspirar o espírito ou de irritá-lo. Fontes que resumem ou indiciam a versão padrão dos grafemas 147 profundamente. É como se o autor (ou os co-autores, escritor e tipógrafo), ao frear (intencionalmente ou não) o ritmo da leitura automática, possibilitasse um olhar além do símbolo, transformando-o em um ícone em potencial, aberto, solteiro, livre da ditadura do dicionário, que o prende a um número limitado de parceiros semânticos.

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ALFA BETIS MO VISUAL Por Bruno Munari



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O maior perigo que pode ameaçar o desenvolvimento de uma abordagem do alfabetismo visual é tentar envolvê-lo num excesso de definições. A existência da linguagem, um modo de comunicação que conta com uma estrutura relativamente bem organizada, sem dúvida exerce uma forte pressão sobre todos os que se ocupam da ideia da mesma do alfabetismo visual. Se um meio de comunicação é tão fácil de decompor em partes componentes e estrutura, por que não o outro? Qualquer sistema de símbolos é uma invenção do homem. Os sistemas de símbolos que chamamos de linguagem são invenções ou refinamento do que foram, em outros tempos, percepções do objeto dentro de uma mentalidade despojada de imagens. Daí a existência de tantos sistemas de símbolos e tantas línguas, algumas ligadas entre si por derivação de uma mesma raiz, e outras desprovidas de quaisquer relações desse tipo. Os números, por exemplo, são substitutos de um sistema único de recuperação de informações, o mesmo acontecendo com as notas musicais. Nos dois casos, a facilidade de aprender a informação codificada baseia-se na síntese original do sistema. Os significados são atribuídos, e se dota cada sistema de regras sintáticas básicas. Existem mais de três mil línguas em uso corrente no mundo, todas elas independentes e únicas. Em termos comparativos, a linguagem visual é tão mais universal que sua complexidade não deve ser considerada impossível de superar. As linguagens são conjuntos lógicos, mas nenhuma simplicidade desse tipo pode ser atribuída à inteligência visual, e todos aqueles, dentre nós, que têm tentado estabelecer uma analogia com a linguagem estão empenhados num exercício inútil.

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Existe, porém uma, enorme importância no uso da palavra ‘alfabetismo’em conjunção com a palavra ‘visual’. A visão é natural: criar e compreender mensagens visuais é natural até certo ponto, mas a eficácia, em ambos os níveis, só pode ser alcançada através do estudos. Na busca do alfabetismo visual, um problema deve ser claramente identificado e evitado. No alfabetismo verbal se espera, das pessoas educadas, que sejam capazes de ler e escrever muito antes que palavras como ‘coletivo’possam ser aplicadas com juízo de valor. A escrita não precisa ser necessariamente brilhante; é suficiente que se produza uma prosa clara e compreensível, de grafia correta e sintaxe bem articulada. O alfabetismo verbal pode ser alcançado num nível muito simples de realização e compreensão de mensagens escritas. Podemos caracterizá-la como um instrumento. Saber ler e escrever, pela própria natureza de sua função, não implica a necessidade de expressar-se em linguagem mais elevada, ou seja, a produção de romances e poemas. Aceitamos a ideia de que o alfabetismo verbal é operativo em muitos níveis, desde as mensagens mais simples até as formas artísticas cada vez mais complexas. Em parte devido à separação, na esfera do visual, entre arte e ofício, e em parte devido às limitações de talento para o desenho, grande parte da comunicação visual foi deixada ao sabor da intuição e do acaso. Como não se faz nenhuma tentativa de analisá-la ou defini-la em termos de estrutura do modo visual, nenhum método de aplicação pode ser obtido. Na verdade, essa é uma esfera em que o sistema educacional se move com lentidão monolítica, persistindo ainda uma ênfase no modo verbal, que exclui o restante da sensibilidade humana, e pouco ou nada se preocupando com o caráter esmagadoramente visual da experiência de aprendizagem da criança. Até mesmo a utilização de uma abordagem visual do ensino carece de rigor em objetivos bem definidos. Em muitos casos, os alunos são bombardeados com recursos visuais (dispositivos, filmes, slides, projeções audiovisuais), mas trata-se de apresentações que reforçam sua experiência passiva de consumidores de televisão. Os recursos de comunicação que vêm sendo produzidos e usados como fins pedagógicos são apresentados com critérios muito deficientes para a avaliação e a compreensão dos efeitos que produzem. O consumidor da maior parte da produção dos meios de comunicação educacionais não seria capaz de identificar (para recorrermos a uma analogia com o alfabetismo verbal) um erro de grafia, uma frase incorretamente estruturada ou um tema mal formulado. 108


O mesmo se pode quase sempre afirmar no que diz respeito à experiência dos meios ‘manipuláveis’. As únicas instruções para o uso de câmeras, na elaboração de mensagens inteligentes, procedem das tradições literárias, e não da estrutura e da integridade do modo visual em si. Uma das tragédias do avassalador potencial do alfabetismo visual em todos os níveis da educação é a função irracional, de depositário da recreação, que as artes visuais desempenham nos currículos escolares, e a situação parecida que se verifica no uso dos meios de comunicação, câmeras, cinema, televisão Por que herdamos, nas artes visuais, uma devoção tácita ao não intelectualismo ? O exame dos sistemas de educação revela que o desenvolvimento de métodos construtivos de aprendizagem visual são ignorados, a não ser no caso de alunos especialmente interessados e talentosos. Os juízos relativos ao que é factível, adequado e eficaz na comunicação visual foram deixados ao saber das fantasias e de amorfas definições de gosto, quando não da avaliação subjetiva e auto-reflexiva do emissor ou do receptor, sem que se tente ao menos compreender alguns dos níveis recomendados que esperamos encontrar naquilo que chamamos de alfabetismo do modo verbal, isso talvez não se deva tanto a um preconceito como à firme convicção de que é impossível chegar a qualquer metodologia e a quaisquer meios que nos permitam alcançar o alfabetismo visual. Contudo, a exigência de estudo dos meios de comunicação já ultrapassou a capacidade de nossas escolas e faculdades. Diante do desafio do alfabetismo visual, não poderemos continuar mantendo por muito mais tempo uma postura de ignorância do assunto. Como foi que chegamos a esse beco sem saída? Dentre todos os meios de comunicação humana, o visual é o único que não dispõe de um conjunto de normas e preceitos, de metodologia e de nem um único sistema com critérios definidos, tanto para a expressão quanto para o entendimento dos métodos visuais. Por que, exatamente quando o desejamos e dele tanto precisamos, o alfabetismo visual se torna tão esquivo? Não resta dúvida de que se torna imperativa uma nova abordagem que possa solucionar esse dilema.

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Uma abordagem do alfabetismo visual

Temos um grande conhecimento dos sentidos humanos, especialmente da visão. Não sabemos tudo, mas conhecemos bastante. Também dispomos de muitos sistemas de trabalho para o estudo e análise dos componentes das mensagens visuais. Infelizmente, tudo isso ainda não se integrou em uma forma viável. A classificação e a análise podem ser de fato reveladoras do que sempre ali esteve, as origens de uma abordagem viável do alfabetismo visual universal. Devemos buscar o alfabetismo visual em muitos lugares e de muitas maneiras, nos métodos de treinamento de artistas, na formação técnica de artesãos, na teoria psicológica, na natureza e no funcionamento fisiológico do próprio organismo humano. A sintaxe visual existe. Há linhas gerais para a criação de composições. Há elementos básicos que podem ser aprendidos e compreendidos por todos os estudiosos dos meios de comunicação visual, sejam eles artistas ou não, e que podem ser usados, em conjunto com técnicas manipulativas, para a criação de mensagens visuais claras. O conhecimento de todos esses fatores pode levar a uma melhor compreensão das mensagens visuais. Apreendemos a informação visual de muitas maneiras. A percepção e as forças cinestésicas, de natureza psicológica, são de importância fundamental para o processo visual. O modo como nos mantemos em pé, nos movimentamos, mantemos o equilíbrio e nos protegemos, reagimos à luz ou ao escuro, ou ainda a um movimento súbito, são fatores que têm uma relação importante com nossa maneira de receber e interpretar as mensagens visuais. Todas essas reações são naturais e atuam sem esforço; não precisamos estudá-las nem aprender como efetuá-las. Mas elas são influenciadas, e possivelmente modificadas, por estados psicológicos e condicionamentos culturais, e, por último, pelas expectativas ambientais.

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O modo como encaramos o mundo quase sempre afeta aquilo que vemos. O processo é, afinal, muito individual para cada um de nós. O controle da psique é frequentemente programado pelos costumes sociais. Assim como alguns grupos culturais comem coisas que deixariam outros enojados, temos preferências visuais arraigadas. O indivíduo que cresce no moderno mundo ocidental condiciona-se às técnicas de perspectiva que apresentam um mundo sintético e tridimensional através da pintura e da fotografia, meios que na verdade, são planos e bidimensionais. Um aborígine precisa aprender a decodificar a representação sintética da dimensão que, numa fotografia, se dá através da perspectiva. Tem de aprender a convenção; é incapaz de vê-la naturalmente. O ambiente também exerce um profundo controle sobre nossa maneira de ver. O habitante das montanhas, por exemplo, tem de dar uma nova orientação a seu modo de ver quando se encontra numa grande planície. Em nenhum outro exemplo isso se torna mais evidente do que na arte dos esquimós. Tendo uma experiência tão intensa do branco indiferenciado da neve e do céu luminoso em seu meio ambiente, que resulta num obscurecimento do horizonte enquanto referência, a arte dos esquimós toma liberdades com os elementos verticais ascendentes e descendentes. Apesar dessas modificações, há um sistema visual, perceptivo e básico, que é comum a todos os seres humanos; o sistema, porém, está sujeito a variações nos temas estruturais básicos. A sintaxe visual existe, e sua característica dominante é a complexidade. A complexidade porém, não se opõe à definição. Uma coisa é certa. O alfabetismo visual jamais poderá ser um sistema tão lógico e preciso quanto a linguagem. As linguagens são sistemas inventados pelo homem para codificar, armazenar e decodificar informações. Sua estrutura, portante, tem uma lógica que o alfabetismo visual é incapaz de alcançar.

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Algumas características das mensagens visuais

A tendência a associar a estrutura verbal e a visual é perfeitamente compreensível. Uma das razões é natural. Os dados visuais têm três níveis distintos e individuais: o input visual, que consiste de miríades de sistemas de símbolos; o material visual representacional, que identificamos no meio ambiente e podemos reproduzir através do desenho, da pintura, da escultura e do cinema; e a estrutura abstrata, a forma de tudo aquilo que vemos, seja natural ou resultado de uma composição para efeitos intencionais. Existe um vasto universo de símbolos que identificam ações ou organizações, estados de espírito, direções-símbolos que vão desde os mais pródigos em detalhes representacionais até os completamente abstratos, e tão desvinculados da informação identificável que é preciso aprendê-los da maneira como se aprende uma língua. Ao longo de seu desenvolvimento, o homem deu os passos lentos e penosos que lhe permitem colocar numa forma preservável os acontecimentos e os gestos familiares de sua experiência, e a partir desse processo desenvolveu-se a linguagem escrita altamente desenvolvida, as imagens são abandonadas e os sons passam a ser representados por símbolos. Ao contrário das imagens, a reprodução dos símbolos exige muito pouco em termos de uma habilidade especial.

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O alfabetismo é infinitamente mais acessível à maioria que disponha de uma linguagem de símbolos sonoros, por ser muito mais simples. A língua inglesa utiliza apenas vinte e seis símbolos em seu alfabeto. Contudo, as línguas que nunca foram além da fase pictográfica, como o chinês, onde os símbolos das palavra-imagem, ou ideogramas, contam-se aos milhares, apresentam grandes problemas para a alfabetização da massa. Em chinês, a escrita e o desenho de imagens são designados pela mesma palavra, caligrafia. Isso implica as exigências de algumas habilidades visuais específicas para se escrever em chinês. Os ideogramas, porém, não são imagens. Em The Intelligent Eye, R. L. Gregory se refere-se a eles como ‘cartoons of cartoons’.


Porém, mesmo quando existem como componente principal do modo visual, os símbolos atuam diferentemente da linguagem, e, de fato por mais compreensível e tentadora que possa ser, a tentativa de encontrar critérios para o alfabetismo visual na estrutura da linguagem simplesmente não funcionará. Mas os símbolos, enquanto força no âmbito do alfabetismo visual, são de importância e viabilidade enormes. A mesma utilidade para compor materiais e mensagens visuais encontra-se nos outros dois níveis de inteligência visual. Saber como funcionam no processo da visão, e de que modo são entendidos, pode contribuir enormemente para a compreensão de como podem ser aplicados à comunicação. O nível representacional da inteligência visual é fortemente governado pela experiência direta que ultrapassa a percepção. Aprendemos sobre coisas das quais não podemos ter experiência direta através dos meios visuais, de demonstrações e de exemplos em forma de modelo. Ainda que uma descrição verbal possa ser uma explicação extremamente eficaz, o caráter dos meios visuais é muito diferente do da linguagem, sobretudo no que diz respeito a sua natureza direta. Não se faz necessária a intervenção de nenhum sistema de códigos para facilitar a compreensão, e de nenhuma decodificação que retarde o entendimento. Às vezes basta ver um processo para compreender como ele funciona. Em outras situações, ver um objeto já nos proporciona um conhecimento suficiente para que possamos avaliá-lo e compreendê-lo. Essa experiência da observação serve não apenas como um recurso que nos permite aprender, mas também atua como nossa mais estreita ligação com a realidade de nosso meio ambiente. Confiamos em nossos olhos, e deles dependemos. O último nível de inteligência visual é talvez o mais difícil de descrever, e pode vir a tornar-se o mais importante para o desenvolvimento do alfabetismo visual. Trata-se da subestrutura, da composição elementar abstrata, e, portanto da mensagem visual pura. Anton Ehrenzweig desenvolveu uma teoria da arte com base num processo primário de desenvolvimento e visão, ou seja, o nível consciente, e, num nível secundário, o pré-consciente. Elabora essa classificação dos níveis estruturais do modo visual associando o termo de Piaget, ‘sincrético’, para a visão infantil do mundo através da arte, com o conceito de não-diferenciação. Ehrenzweig descreve a criança como sendo capaz de ver todo o conjunto numa visão ‘global’. Esse talento, acredita ele, nunca vem a ser destruído no adulto, e pode ser utilizado como ‘um poderoso instrumento’. Outra maneira de analisar esse sistema dúplice de visão é reconhecer que tudo

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o que vemos e criamos compõe-se dos elementos visuais básicos que representam a força visual estrutural, de enorme importância para o significado e poderosa no que diz respeito à resposta. É uma parte inextricável de tudo aquilo que vemos, seja qual for sua natureza, realista ou abstrata. É energia visual pura, despojada. Várias disciplinas têm abordado a questão da procedência do significado nas artes visuais. Artistas, historiadores da arte, filósofos e especialistas de vários campos das ciências humanas e sociais já vêm há muito tempo explorando como e o que as artes visuais ‘comunicam’. Creio que alguns dos trabalhos mais significativos nesse campo foram realizados pelos psicólogos da Gestalt, cujo principal interesse tem sido os princípios da organização perceptiva, o processo da configuração de um todo a partir das partes. O ponto de vista subjacente da Gestalt, conforme definição de Ehrenfels, afirma que ‘se cada um de doze observadores ouvisse um dos doze tons de uma melodia, a soma de suas experiência não corresponderia ao que seria percebido por alguém que ouvisse a melodia toda’. Rudolf Arnheim é o autor de uma obra brilhante na qual aplicou a grande parte da teoria da Gestalt desenvolvida por Wertheimer, Köhler e Koffka à interpretação das artes visuais. Arnheim explora não apenas o funcionamento da percepção, mas também a qualidade das unidades visuais individuais e as estratégias de sua unificação em um todo final e completo. Em todos os estímulos visuais e em todos os níveis da inteligência visual, o significado pode encontrar-se não apenas nos dados representacionais, na informação ambiental e nos símbolos, inclusive a linguagem, mas também nas forças compositivas que existem ou coexistem com a expressão factual e visual. Qualquer acontecimento visual é uma forma com conteúdo, mas o conteúdo é extremamente influenciado pela importância das partes constitutivas, como a cor, o tom, a textura, a dimensão, a proporção e suas relações compositivas com o significado. Em Symbols and Civilization, Ralph Ross só falta de ‘arte’quando observa que esta ‘produz uma experiência do tipo que chamamos de estética, uma experiência pela qual quase todos passamos quando nos encontramos diante do belo e que resulta numa profunda satisfação.

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O que há séculos vem deixando os filósofos intrigados é exatamente por que sentimos essa satisfação, mas parece claro que ela depende, de alguma forma, das qualidades e da organização de uma obra de arte com seus significados incluídos, e não apenas dos significados considerados isoladamente’. Palavras como significado, experiência, estética e beleza colocam-se todas em constiguidade no mesmo ponto de interesse, isto é, aquilo que extraímos da experiência visual, e como o fazemos. Isso abrange toda a experiência visual, em qualquer nível e de qualquer maneira em que ela se dê.

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FOR MA DAS LE TRAS Por Ellen Lupton



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As fontes são um recurso essencial empregado por designers gráficos, assim como vidro, pedra, ferro e inúmeros materiais são utilizados por arquitetos. Os designers as vezes criam suas próprias fontes e letragens personalizadas. Mas é mais frequente vê-los consultando a vasta biblioteca de fontes existentes. Escolhendo-as e combinando-as em resposta a públicos ou situações específicas. Fazer isso com senso de humor e sabedoria requer conhecimento de como (e porque ) as letras evoluíram. A origem das palavras está nos gestos do corpo. As primeiras fontes foram modeladas diretamente sobre as formas da caligrafia. No entanto, elas não são gestos corporais, mais imagens manufaturadas para repetição infinita. A história da tipografia reflete uma tensão contínua entre a mão e a máquina, o orgânico e o geométrico, o corpo humano e o sistema abstrato. Essas tensões, que marcaram o nascimento das letras impressas há mais de quinhentos anos, continuam a energizar a tipografia hoje. Os tipos móveis, inventados por Johannes Gutenberg na Alemanha no início do século xv, revolucionaram a escrita no Ocidente. Ao contrário dos escribas, que fabricavam livros e documentos a mão, a impressão com tipos permitia a produção em massa. Grandes quantidades de letras podiam ser fundidas a partir de um molde e concatenadas em ‘formas’. Depois que as páginas eram revisadas, corrigidas e impressas, as letras eram dispensadas em caixas subdivididas para reutilização. Os tipos móveis haviam sido empregados antes disso na China, mas Ia foram menos úteis. Enquanto o sistema de escrita chinês contém dezenas de milhares de caracteres distintos, o alfabeto Latino traduz os sons da fala em um pequeno conjunto de sinai.s apropriados a mecanização. A famosa Bíblia de Gutenberg baseou-se no manuscrito. Emulando a densa e escura escrita manual conhecida como letra gótica, ele reproduziu sua textura errática criando variações de cada letra, bem como inúmeras ligaturas (caracteres que combinam duas ou mais letras em uma única forma).

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O HUMANISMO E O CORPO

Na Itália do século xv, escritores e acadêmicos humanistas rejeitam as escritas góticas em favor da lettera antica, um modo clássico de escrita manual. com formas mais largas e abertas. A preferência pela lettera antica fazia parte do Renascimento da arte e da literatura clássicas. Nicolas Jenson, um francês que aprendera a imprimir na Alemanha, estabeleceu uma gráfica influente em Veneza em tomo de 1469. Suas fontes mesclavam as tradições góticas que ele conhecera na França e na Alemanha com o gosto italiano por formas mais leves e arredondadas, e são incluídas entre as primeiras (e melhores) fontes romanas. Muitas das fontes que usamos hoje, incluindo Garamond, Bembo, Palatino, e Jenson, herdaram seus nomes de impressoras que trabalham nos séculos xv e xvi. Essas fontes são geralmente conhecidas como ‘humanistas’. Os revivals contemporâneos de fontes históricas são projetados para adequar-se às tecnologias modernas e as exigências atuais por pressão e uniformidade. Cada um deles responde ou reage aos métodos de produção, estilos de impressão e hábitos artísticos de seu tempo. Alguns baseiam-se em tipos de metal, punções ou desenhos que sobreviveram. A maioria fia-se unicamente em espécimes impressos. As letras itálicas, que também surgiram na itália do século xv (como seu nome sugere), foram modeladas em um estilo manuscrito mais casual. Enquanto as letras humanistas eretas apareciam em livros caros e prestigiados, a forma cursiva, que podia ser escrita com mais rapidez do que a cuidadosa lettera antica, era usada por gráficas mais baratas. Aldu Manutius, um impressor, editor e acadêmico, usou fontes itálicas em seus livros pequenos e baratos, distribuídos internacionalmente. Economizando espaço e a forma cursiva economizava dinheiro. Os livros de Aldous frequentemente punham as letras cursivas ao lado de versais romanas; os dois estilos ainda eram considerados fundamentalmente distintos.

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No século xvi, os impressores começaram a integrar as formas romana e etílica em famílias tipográficas com pesos e alturas-x (a altura do corpo principal da letra em caixa-baixa) correspondentes. Hoje, o etílico na maioria das fontes não é apenas uma versão inclinada do romano; ele incorpora as curvas. os ângulos e as proporções mais estreitas das formas cursivas.

Tipo romano por Nicolas Jenson, 1470

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ILUMINISMO E ABSTRAÇÃO

Os artistas do Renascimento buscaram padrões proporcionais em corpos humanos idealizados. Em 1529, o designer e tipógrafo francês Geoffroy Tory publicou uma série de diagramas que vinculavam a anatomia das letras a do homem. Uma nova abordagem, distanciada do corpo, despontaria na era do iluminismo científico e filosófico. Em 1693, um comite francês nomeado por Luiz x1v pôs-se a construir letras romanas em um diagrama finamente tramado. Ao contrário dos diagramas de Tory, que eram gravados em madeira, as representações da romain du roi (alfabeto do rei) eram buriladas em chapas de cobre. As fontes de chumbo derivadas desses diagramas de grande formato retém o caráter linear do processo e a atitude científica do comitê real. As letras entalhadas, cujas linhas unidas não se atém ao diagrama mecânico da prensa tipográfica, ofereciam um meio apto a letragem formal. Reproduções entalhadas da arte caligráfica disseminaram a obra dos grandes mestres calígrafos do seculo xviii. Livros como The Universal Penman (1743), de George Bickham, traziam letras romanas (cada qual gravada como um caractere único) e manuscritas profusamente curvas. A tipografia do século xviii foi influenciada por novos estilos manuscritos e suas reproduções gravadas. Impressores como William Caslon, na década de 1720, e John Baskerville, na de 1750, abandonaram a rígida pena humanista em favor da pena metálica Aurivet e da pena de ave com ponta fina-instrumentos que produzem linhas fluidas e ondulantes. Baskerville, um mestre calígrafo, teria admirado as linhas finamente esculpidas que apareciam nos livros de escrita entalhada. As fontes que ele criou eram tão definidas e contrastadas que seus contemporâneos o acusaram de ‘cegar os leitores do país, pois os traços de suas letras, de tão finos e estreitos, machucam os olhos.’Para aumentar a impressionante precisão de suas páginas, Baskerville fazia suas próprias tintas e passava a ferro suas páginas após imprimi-las. 122


Na virada do século xvx, o severo vocabulário de Baskerville foi levado ao extremo por Giambattista Bodoni na Itália e Firmin Didot na França. Suas fontes, com eixos totalmente verticais, contraste extremo entre traços grosseiros e finos e serifas nítidas como lâminas, foram a porta de entrada para uma visão da tipografia desvinculada da caligrafia.

A Romain du Roi (francês para ‘romana do Rei’).

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FONTES MONSTRUOSAS

Embora Bodoni e Didot tenha abastecido seus projetos com os hábitos caligráficos de seu tempo. Eles criaram formas que colidiram com a tradição tipográfica e desencadearam um estranho mundo novo, no qual os atributos estruturais da letra (serifada e haste, traços grossos e finos, ênfase vertical e horizontal) seriam submetidos a experimentos bizarros. Perseguindo uma beleza tão racional quanto sublime, ambos criaram um monstro: uma abordagem abstrata e desumanizada do desenho de letras. Com a ascensão da industrialização e do consumo de massas no século xix veio a explosão da propaganda, uma nova forma de comunicação que exigia novas formas tipográficas. Fontes grandes e pesadas foram feitas com a distorção dos elementos anatômicos das letras clássicas. Fontes com altura, largura e profundidade assombrosas apareceram: expandidas, contraídas, sombreadas, vazadas. engordadas, lapidadas e floreadas. As serifas deixaram de ser acabamento para tornarem-se estruturas independentes e a tensão vertical das letras tradicionais enveredou por novos caminhos. O chumbo, material com o qual se fundem tipos de metal, é mole demais para manter a forma em tamanhos grandes sob a pressão da prensa tipográfica. Os tipos talhados em madeira, por outro lado, podiam ser impressos em formatos gigantes. A adoção do pantógrafo combinado com a fresa, em 1834. revolucionou fabricação de tipos de madeira. O pantógrafo é um instrumento de cópia de traço que, ao combinar-se com a fresa, permite a um desenho original gerar variantes com inúmeras proporções, pesos e excrescências decorativas.

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Essa forma mecanizada tratava o alfabeto como um sistema flexível mais divorciado da tradução caligráfica. A busca por formas arquetípicas e perfeitamente proporcionais foi substituída por uma visão da tipografia como um sistema elástico de qualidades formais (peso, tensão, haste, barras. serifas, ângulos, curvas, ascendentes, descendentes). A relação entre as letras de uma fonte tornou-se mais importante que a identidade de cada caractere.


REFORMA E REVOLUÇÃO

Alguns designers consideravam a distorção do alfabeto grosseira e imoral, ligada a um sistema industrial destrutivo e desumano. Em 1906, Edward Johnston reanimou a procura por um alfabeto essencial e padronizado, alertando para os ‘perigos’do exagero. Inspirado no movimento Arts and Crafts do século xix, Johnston voltou-se para o Renascimento e para a Idade Média em busca de letras puras e não corrompidas. Embora reformadores como Johnston permanecessem romanticamente ligados a história, eles redefiniram a figura do designer como um intelectual distanciado do comércio. O moderno reformador do design era um critico da sociedade, esforçando-se para criar objetos e imagens que desafiaram e revisaram hábitos e práticas dominantes. Os artistas de vanguarda do início do século xx rejeitaram as formas históricas mas adotaram o modelo do crítico outsider. Membros do grupo De Stijl na Holanda reduziram o alfabeto a elementos perpendiculares. Na Bauhaus, Herbert Bayer e Josef Albers construíram alfabetos com formas geométricas básicas círculo, quadrado e triângulo que consideravam elementos de uma linguagem universal da visão. Tais experimentos entendiam o alfabeto como um sistema de relações abstratas. Assim como os impressores populares do século xix os designers de vanguarda abandonaram a busca por um alfabeto essencial e perfeitamente conformado, mas ofereceram alternativas austeras e teóricas em Iugar das novidades solicitas da grande propaganda. Montados como máquinas, com componentes modulares, esses projetos experimentais imitavam a produção fabril, mas a maioria deles foi produzida a mão e não chegou a ter versões mecânicas (embora muitos estejam disponíveis em meio digital). A Futura, projetada por Paul Renner em 1927, encarnou as obsessões da vanguarda em uma fonte multifuncional e comercial. Embora Renner rejeitasse o movimento ativo da caligrafia em favor de formas mais ‘tranquilizadoras’e abstratas, ele temperou a geometria da Futura com variações sutis em seus traços, curvas e proporções. Renner deu a Futura diversos pesos, vendo-a como uma ferramenta artística para construir páginas com gradações de cinza.

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A fonte New Alphabet desenhada Wim Crouwel.

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TIPOGRAFIA COMO PROGRAMA

Em 1967 o designer Wim Crouwel publicou desenhos para um ‘novo alfabeto’construído com linhas retas, em resposta a ascensão da comunicação eletrônica. Rejeitando séculos de convenção tipográfica, ele projetou suas letras para exibição ótima em telas de vídeo, nas quais curvas e ângulos são representadas por linhas de varredura horizontal. Na brochura promocional de seu novo alfabeto, que tinha como subtítulo ‘Introdução para uma tipografia programada’, Crouwel propôs uma metodologia de design onde as decisões são sistemáticas e regradas. Na década de 1980, computadores pessoais e impressoras de baixa resolução puseram as ferramentas da tipografia nas mão de um publico mais amplo. Em 1985, Zuzana Licko começou a projetar fontes que exploravam a textura grosseira desses sistemas. Enquanto outras fontes digitais sobrepunham o rude diagrama das telas e impressoras as formas tipográficas tradicionais, as suas aproveitavam a linguagem do equipamento digital. Ela e seu marido, Rudy VanderLans, cofundadores da fundição e da revista Emigre, se auto intitulavam ‘novos primitivos’, pioneiros de uma aurora tecnológica. No início da década de 1990, com a adoção das impressoras a laser de alta resolução e das tecnologias de desenho de fontes por contorno tais como a linguagem PostScript, os designers de tipos deixaram de limitar-se por dispositivos de saída de baixa resolução. A ascensão da internet, bem como de telefones celulares, videogames portáteis e PDAS (personal digital assistant), assegurou a relevância das fontes baseadas em pixels, a medida que mais e mais informação ia sendo projetada para publicação diretamente na tela.

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TIPOGRAFIA COMO NARRATIVA

No começo dos anos 1990, enquanto as ferramentas de design digital abriam as portas para a reprodução e a integração de diversos meios, crescia a insatisfação de muitos designers com as superfícies limpas e imaculadas. Procurava-se lançar a letra no mundo rude e cáustico dos processos físicos. Ela, que por séculos havia buscado a perfeição em tecnologias cada vez mais exatas, foi arranhada, dobrada, manchada e poluída. A fonte Template Gothic, de Barry Deck, projetada em 1990, baseia-se em letras desenhadas com um estêncil de plástico. Assim, a fonte refere-se a um processo ao mesmo tempo mecânico e manual. Deck fez este projeto quando era aluno de Ed Fella, cujos cartazes experimentais inspiraram uma geração de tipógrafos digitais. Após seu lançamento comercial pela Emigre Fonts, a Template Gothic passou a ser usada em todo o mundo, tornando-se um emblema da ‘tipografia digital’dos anos 90. A fonte Dead History, de P. Scott Makela, também projetada em 1990. e um pastiche de duas fontes existentes: a tradicional fonte serifada Centennial e a clássica pop VAG Rounded. Manipulando os vetores de fontes prontas, Makela adotou a estratégia de apropriação empregada na arte e na música contemporâneas, aludindo ainda a importância da história e do precedente, importantes para quase toda inovações tipográfica. Os tipógrafos holandeses Erik Von BlokJand e Just van Rossum combinaram as figuras do designer e do programador, criando fontes que contém acaso, mudanças e incerteza.Sua fonte Beowulf, de 1990, foi a primeira de uma série de fontes com contornos aleatórios e comportamento programado.

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DE VOLTA AO TRABALHO

Embora os anos 1990 sejam mais lembrados por imagens de decadência, os designers tipógrafos continuaram a construir um repertório de fontes de uso comum. projetadas para acomodar confortavelmente grandes quantidades de texto. Em vez de contar sua própria história, essas fontes fornecem aos designers paletas flexíveis de letras, coordenadas em famílias maiores. Enquanto fazia fontes display experimentais, Zuzana Licko, intrépida pioneira da aurora digital, produziu alguns revivals históricos nos anos 1990. A Mrs Eaves, desenhada em 1996 e inspirada nos tipos do século xviii de John Baskerville (seu nome vem de sua amante e governanta Sarah Eaves), tornou-se uma das fontes mais populares do seu tempo. Projetadas na Holanda, fontes como a Scala, de Martin Majoor, e a Quadraat, de Fred Smeijers, oferecem interpretações límpidas da tradição tipográfica. Essas fontes olham para a gráfica do século xvi de um ponto de vista contemporâneo, como denunciam suas serifas decididamente geométricas. Apresentada em 1992, a família Quadraat ampliou-se, incluindo formas sem serifa em numerosos pesos e estilos. No ano 2000, Tobias Frere-Jones apresentou a fonte Gotham, cujo desenho deriva de letras encontradas no terminal de ônibus da autoridade portuária de Nova York. Ela expressa uma atitude direta e utilitária que persiste ao lado de estéticas como o grunge, o neo futurista, as paródias da cultura pop e os revivals históricos que fazem parte da tipografia contemporânea. Ao escolher fontes, os designers gráficos consideram a história dos tipos e suas conotações atuais, bem como suas qualidades formais. O objetivo é encontrar uma combinação apropriada entre o estilo das letras, a situação social específica e a massa de conteúdo que definem o projeto. Nenhuma cartilha é capaz de fixar o significado ou a função de cada fonte; cada designer deve enfronhar-se nessa biblioteca de possibilidades a luz das circunstâncias únicas de cada projeto. 129


Anatomia das letras.

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CLASSIFICAÇÃO

No século xix, os impressores buscaram analogias entre a história da arte e a herança de seu próprio ofício, desenvolvendo um sistema básico de classificação de tipos. Letras humanistas estão intimamente conectadas a caligrafia e ao movimento da mão. As fontes transicionais e modernas são mais abstratas e menos orgânicas. Esses três grupos principais correspondem grosseiramente aos períodos renascentista, barroco e iluminista na arte e na literatura. Desde então, historiadores e críticos de tipografia tem proposto esquemas mais refinados que procuram capturar melhor a diversidade das letras existentes. Nos séculos xx e xxi os designers continuam a criar novas fontes baseadas em características históricas.

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GRANDES FAMÍLIAS

Um tipo romano tradicional de livro costuma ter uma família pequena um grupo nuclear consistindo de romana, italica, versaletes e talvez um peso. As famílias sem serifa possuem normalmente muitos outros pesos e tamanhos: fino, leve, preto, ultra estreito, estreito etc. Nos anos 1990 muitos designers de tipos criaram famílias com versões serifadas e sem serifa. Versaletes e algarismos não alinhados (uma cortesia normalmente reservada a famílias serifadas) foram incluídos nas versões sem serifa da Thesis, da Scala. e de muitas outras grandes famílias contemporâneas.

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FamĂ­lia da fonte Univers desenhada por Adrian Frutiger.

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PROJETANDO FONTES

Por mais de quinhentos anos, a produção de fontes foi um processo industrial. A maioria dos tipos eram moldados em chumbo até o surgimento da fotocomposição nos anos 1960 e 1970; as primeiras fontes digitais (também criadas nesse período) ainda requeriam equipamento especializado para o seu projeto e produção. O desenho de fontes só se tornaria um campo mais acessível com o advento dos microcomputadores. No final do século xx, ‘fundições tipográficas’digitais haviam aparecido no mundo todo, muitas delas lideradas por um ou dois designers. Contudo, produzir uma fonte completa ainda é uma tarefa enorme. Mesmo uma família pequena possui centenas de caracteres diferentes, e cada um deles requer muitas fases de refinamento. O designer tipográfico também precisa determinar como deve ser o seu espacejamento, que plataformas irá usar e como irá funcionar em diversos tamanhos, meios e linguagens.

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LOGOTIPO

Os logotipos usam a tipografia e a letragem para grafar o nome de uma organização de um modo memorável. Se algumas marcas são feitas com símbolos abstratos ou ícones pictóricos, um logotipo usa letras para criar uma imagem distinta. Os logotipos podem ser feitos com fontes existentes ou com letras personalizadas. Atualmente, muitos deles tem várias versões para uso em situações diversas. Um logotipo faz parte de um programa de identidade mais abrangente que o designer concebe como uma linguagem viva (e mutante) de acordo com as circunstâncias. Fui ficando cansado da gritaria por tipos mais suavizados que corrigissem o serrilhamento dos tipos digitais. Enquanto uma parte de mim chorava ao ver a Garamond retalhada na grade de pixels, a outra parte pensava, ‘E daí?’John Maeda, 2001

A suavização, que usa tons de cinza para criar a ilusão de contornos curvos, e eficaz para a reprodução de textos na tela em tamanhos grandes.

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Fonte bitmap abstrata desenhada por Mark Rosster.

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FONTES EM BITMAP

As fontes bitmap são feitas dos pixels (picture elements ou elementos pictográficos) que estruturam a tela. Se uma letra PostScript consiste de um contorno vetorizado, um caractere bitmap contém um número fixo de unidades retilíneas ‘ligadas’ou ‘desligadas’. Fontes de contorno são escaláveis, ou seja, podem ser reproduzidas em meios de alta resolução bem como impressas em quase qualquer tamanho. No entanto são difíceis de ler em pequenas dimensões na tela, onde os caracteres são traduzidos em pixels. (A suavização pode até piorar a legibilidade de textos pequenos.) Em uma fonte bitmap, os pixels não se dissolvem à medida que as letras crescem. Alguns designers gostam de explorar esse efeito, que chama a atenção para a geometria digital das letras. As fontes de pixels são amplamente utilizadas tanto no meio impresso quanto no digital. Crie um protótipo para uma fonte bitmap desenhando letras em uma malha quadrada. Substitua as curvas e diagonais das letras tradicionais por elementos retilíneos. Evite fazer ‘escadas’detalhadas, que não passam de curvas e diagonais disfarçadas. Esse exercício revisita os anos 1910 e 1920, quando designers de vanguarda faziam fontes experimentais baseados em elementos geométricos simples. O projeto também reflete a estrutura das tecnologias digitais dos recibos de caixas registradoras e placas de LEDS as fontes de tela, mostrando de que maneira uma fonte pode funcionar como um sistema de elementos.

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Design de Tipos

O fontlab e outros aplicativos permitem que os designers criam tipos funcionais, que se adaptam perfeitamente a programas como o inDesign. O primeiro passo para desenhar um tipo é definir um conceito básico. As letras serão serifadas ou sem serifa? Serão modulares ou orgânicas? Você as construirá geometricamente ou pretende baseá-las na escrita manual? Serão usadas em textos ou em situações de destaque? Você usará fontes históricas como base ou começará do zero? O próximo passo é criar desenhos. Alguns designers começam com lápis antes de trabalhar digitalmente, enquanto outros constroem suas formas de letras diretamente no computador. Comece desenhando algumas nucleares, tais como o, u, h e n, construindo curvas, linhas e formas que reaparecerão em outros caracteres. Todas as letras em uma fonte são distintas umas das outras, embora compartilhem muitos atributos, tais como a altura-x, o peso e a intensidade do traço, e um vocabulário comum de formas e proporções. Você pode controlar o espacejamento da fonte adicionando áreas vazias em torno de cada caractere, bem como criando certos pares de kerning, que determinam a distância entre caracteres específicos. Produzir uma família completa de tipos é uma tarefa enorme. Contudo, o processo pode ser altamente recompensador.

Tipo ou fonte?

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Um tipo de, ou face, é o desenho das formas das letras; uma fonte é o mecanismo de saída. No tipo de metal, o desenho se materializa nas punções a partir das quais são feitos os moldes. A fonte consiste nos tipos usados na impressão, moldados em metal. No sistema digital, o tipo é a configuração visual, enquanto a fonte é o software que permite a você instalar, acessar e dar saída ao design. Um único tipo pode estar disponível em vários formatos de fonte. Em parte porque o design de tipos digitais e a produção de fontes estão ligados tão fluidamente hoje, a maioria das pessoas usa os termos indistintamente. Os nerds tipográficos insistem, todavia, em usá-los precisão.


caractere ou glifo? Os designers de tipo distinguem caracteres e glifos para respeitar o Unicode, um sistema internacional para identificação de todos os sistemas de escrita reconhecidos no mundo. Apenas um símbolo com uma única função é considerado um caractere e a ele é atribuído, deste modo, um ponto de código em Unicode. Um caractere único, tal como uma letra a minúscula, pode se materializar em vários glifos diferentes (ä, à, å). Cada glifo é uma expressão específica de um determinado caractere.

romano ou Romano? O Império Romano é um nome próprio e portanto é grafado com iniciais maiúsculas, mas nós identificamos formas de letras romanas em letra minúscula, assim como as itálicas.

Formatos de Fontes

De onde vêm as fontes e por que há tantos formatos diferentes? Algumas vêm com o sistema operacional do seu computador, enquanto outras são incluídas em pacotes de software. Algumas dessas fontes amplamente distribuídas são da mais alta qualidade, tais como Adobe Garamond Pro e Hoefler Text, enquanto outras (incluindo Comic Sans, Apple Chancery e Papyrus) são execradas por designers esnobes em toda parte. Se você quiser expandir seu vocabulário além dessa provisão familiar, precisará comprar fontes das fundições de tipos digitais. Elas variam em grandes estabelecimentos como Adobe e FontShop, que licenciam milhares de fontes diferentes, até pequenos produtores independent, tais como Underware na Holanda ou Jeremy Tankard Typography no Reino Unido. Você também pode aprender a fazer suas próprias fontes, bem como encontrar tipos que são distribuídos gratuitamente na rede. Os diferentes formatos de fonte refletem inovações técnicas e acordos comerciais desenvolvidos ao longo do tempo. Formatos de fonte antigos em geral ainda são utilizáveis em sistemas operacionais modernos.

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Fontes de tela

Nos primeiros anos da World Wide Web, os designers eram forçados a trabalhar no âmbito do estreito conjunto de fontes comumente instaladas nos computadores de seus usuários finais. Desde então, várias técnicas surgiram para embutir fontes no conteúdo da web ou para disponibilizar fontes aos usuários que visitam um site. Em uma delas, fontes especialmente formatadas são hospedadas em um terceiro servidor e então baixadas pelos usuários; os designers pagam uma taxa pelo serviço. Outro caminho implementa a regra @font-face em css (Cascading Style Sheets), por meio da qual se pode baixar qualquer tipo de fonte digital hospedada em um servidor; apenas fontes licenciadas para esse uso podem ser acessadas legalmente via @font-face. A suavização digital (anti-aliasing) cria a aparência de uma borda suave ao mudar o brilho dos pixels ou subpixels da borda de cada letra. O Photoshop e outros programas permitem aos designers selecionar suavizações fortes ou fracas. quanto mostrados em tamanhos muito pequenos, tipo fortemente suavizados podem parecer borrados. Essa função também aumenta o número de cores num arquivo de imagem.

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Lettering

A criação manual de letras permite aos artistas gráficos integrar imaginário e texto, transformando o design e a ilustração em práticas fluentemente integradas. O design de letras pode emular tipos existentes ou derivar do estilo de desenho ou escrita do próprio artista. Os designers podem criar lettering à mão e por meio de software, em geral combinando diversas técnicas.

Lettering por marzipan.

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Pontuação

Uma vírgula bem desenhada leva a essência da tipografia aos seus mais deliciosos detalhes. A vírgula da Helvética é um corpulento quadrado engastado numa curva vistosa, enquanto a da Bodoni é uma esfera voluptuosa com uma fina haste. Os designers e editores precisam aprender várias convenções tipográficas além de dominar as regras gramaticais de pontuação. Um erro pandêmico é o uso de plicas simples ou duplas (em geral chamadas de aspas falsas) em lugar de apóstrofos e aspas (também chamadas de aspas curvas, aspas tipográficas, smart quotes ou aspas automáticas). Aspas simples e duplas são representadas por quatro caracteres distintos, cada um acessado por uma diferente combinação de teclas. Conheça tais teclas! Geralmente sobra para o designer a tarefa de purgar o manuscrito do cliente dessas pontuações espúrias. Nem todos os elementos tipográficos representam linguagem. Durante séculos, os ornamentos foram concebidos para ser integrados diretamente no texto. Na era da impressão tipográfica, os impressores reuniam elementos decorativos um a um para construir formas e padrões mais amplos na página. As réguas decorativas serviam para enquadrar e dividir o conteúdo. No século xix, os tipógrafos ofereciam aos seus clientes uma vasta coleção de ilustrações prontas que podiam ser facilmente combinadas com o texto. Hoje, inúmeras formas de ornamentos estão disponíveis como fontes digitais, que podem ser digitadas em um teclado, redimensionadas e impressas como qualquer outro tipo, Alguns ornamentos contemporâneos são sistemas modulares projetados para integrar-se em padrões e configurações maiores, permitindo ao designer gráfico inventar novos arranjos a partir de determinadas peças. Coleções temáticas de ícones e ilustrações também estão disponíveis como fontes digitais.

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Numerais

Os numerais alinhados ocupam larguras de espaço uniformes, permitindo que os números se alinhem quando tabulados em colunas. Eles foram introduzidos por volta da virada do século xx para atender as necessidades dos negócios modernos. Os numerais alinhados têm a mesma altura que as letras maiúsculas, de modo que algumas vezes parecem grandes e volumosos em um texto corrido. Os numerais não alinhados, também chamados de numerais de texto ou old style (estilo antigo), têm ascendentes e descendentes, como letras minúsculas. Eles voltaram à ordem do dia nos anos 1990, valorizados por sua aparência idiossincrática e sua atitude tipográfica tradicional. As formas dos numerais old style, são proporcionais; cada um tem sua própria largura de composição.

123456789 0 Respectivamente numerais alinhados e não alinhados no estilo antigo.

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Cartaz decorativo composto de mĂşltiplas fontes.

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Misturando Tipos

Combinar tipos é como fazer uma salada. Comece com um pequeno número de elementos representando diferentes cores, gostos e texturas. Empenhe-se em obter contraste em vez de harmonia, buscando diferenças enfáticas em lugar de transições piegas. Dê a cada ingrediente um papel a desempenhar: tomates doces, pepinos crocantes e o choque picante de um alici ocasional. Quando misturam tipos na mesma linha, os designers costumam ajustar o tamanho do corpo de maneira que as alturas-x fiquem alinhadas. Quando dispõem os tipos em linhas separadas, em geral faz sentido acentuar as diferenças de escala e também de estilo ou de peso. Tente combinar tipos grandes, claros, com tipos pequenos e escuros, para obter um cruzamento de sabores e texturas contrastantes.

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Famílias Tipográficas

A ideia de organizar tipos em famílias combinadas data do século xvi, quando os impressores começaram a coordenar tipos romanos e itálicos. O conceito foi formalizado na virada do século xx.

A forma romana É o núcleo ou a espinha de onde deriva uma família tipográfica. A forma romana, também chamada de ‘regular’, é a versão normal e ereta de um tipo. É tipicamente concebida como o pai de uma família maior.

Letras itálicas Baseadas na escrita cursiva, são bem diferentes das formas romanas. A forma itálica não é simplesmente uma versão mecanicamente inclinada da romana: é outra fonte. Note a diferença das variantes romana e itálica da letra e da Adobe Garamond.

Os versaletes Possuem uma altura similar à altura-x da caixa-baixa. Os versaletes são projetados para integrar-se às linhas de texto, onde as versais se sobressaem desajeitadamente. Eles são levemente mais altos que a altura-x das letras em caixa-baixa.

Tipos bold e semibold São usados para criar ênfase em uma hierarquia. No século xx, versões bold de tipos de texto tradicionais foram criadas para satisfazer a necessidade de formas enfáticas. Famílias não serifadas normalmente incluem uma ampla gama de pesos. Tipos bold (e semibold) também precisam incluir uma versão itálica.

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O designer de tipos procura fazer versões bold similares às romanas, sem tornar sua forma geral mais pesada. Os vazios precisam permanecer claros e abertos em tamanhos pequenos.


Itálicos não são letras inclinadas. Alguns itálicos não são nada inclinados. Na família de tipos Quadraat, a forma itálica é aprumada.

Família tipografia Ancizar projetada por César Puertas.

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escala

A escala é o tamanho dos elementos de design em comparação com outros elementos num leiaute, bem como o contexto físico do trabalho. A escala é relativa. Tipos de 12pt mostrados num monitor de 32 polegadas podem dar a impressão de ser pequenos demais, enquanto impressora na página de um livro podem parecer balofos e pesados. Os designers criam hierarquia e contraste ao jogar com a escala das letras. Mudanças na escala ajudam a criar contraste visual, movimento e profundidade, além de expressar hierarquias de importância. A escala é física. As pessoas intuitivamente julgam o tamanho dos objetos em relação ao próprio corpo e ao ambiente.

12pt

32pt

72pt

Em comparação, numerais da fonte Erato-Light em 12, 32 e 72 pontos respectivamente.

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Índice remissivo

a

d

Agrupamento 52, 64, 93, 94

Decifrar 24

Alfabetismo 106, 108, 109, 110, 112

Descendente 12, 19, 111, 124, 143

Analogia 106, 108, 131 Anatomia 122, 130

Designer 8, 12, 16, 118, 122, 125, 127, 128, 129, 132, 134, 135, 137, 138, 139, 140, 142, 145, 146, 148

Ângulo 121, 124, 127

Diagrama 12, 122, 127

Arquetípicas 124

Display 103, 129

Ascendente 12, 19, 111, 124, 143

b Barras 23, 124 Bitmap 136, 137 Brochura 127

c Caligrafia 24, 112, 118, 123, 125 Caracteres 8, 16, 18, 19, 22, 23, 26, 27, 29, 118, 134, 137, 138, 139, 142 Chumbo 122, 124, 134 Compacta 12 Contemporâneos 12, 120, 122 Contraste 14, 15, 44, 93, 123, 145, 148 Curvas 121, 122, 124, 125, 127, 137, 138, 142

150

e Eixo 8, 123 Equilíbrio Visual 48, 64,68 Estêncil 128 Excêntricas 20, 21, 24, 31, 103

f Fechamento 52, 93, 94, 95 Fontes 8, 19, 20, 21, 23, 24, 29, 31, 103, 118, 120, 121, 123, 124, 127, 129, 131, 134, 137, 138, 139, 140, 141, 142, 144


g

m

t

Gestalt 8, 52, 56, 68, 76, 79, 80, 84, 90, 93, 97, 98, 100, 103, 114

Manuscritas 24, 122

Textura 36, 44, 56, 60, 93, 99, 114, 118, 127, 145

h Haste 124, 142

i Impressão Visual 56 Impressoras 31, 120, 127

l Legibilidade 8, 12, 16, 18, 22, 27, 29, 31, 73, 137 Leiturabilidade 8 Linguagem gráfica 8 Logotipo 135

Maquinaria 87, 97

p Paletas 129

Tipografia 8, 12, 16, 22, 27, 28, 29, 31, 118, 122, 123, 127, 129, 128, 131, 135, 142, 147 Tipógrafos 12, 16, 29, 103, 128, 129, 142

Peso 60, 64, 79, 121, 124, 125, 127, 132, 138, 145, 146

Tipos 12, 15, 16, 24, 27, 44, 92, 98, 118, 120, 124, 126, 129, 131, 132, 134, 137, 138, 139, 141, 145, 146, 147, 148

Pixel 92, 127, 135, 137, 140

Traços 20 ,22, 93, 122, 123, 124, 125

Postscript 31, 127, 137 Proximidade 23, 48, 60, 64, 93, 94

u

r

Unificação 48, 64, 68, 114

Retilíneos 137

v

s

Vanguarda 125, 137 Versalete 28, 132, 146

Scanner 23 Segregação 44, 93 Semelhança 24, 48, 60, 64, 93, 94, 100 Sensações Cinéticas 103 Serifa 14, 15, 28, 29, 123, 124, 129, 132, 138, 146

151


Glossário

a

Agrupamento - Ação ou efeito de agrupar. Dispor em grupos. Reunião, ajuntamento. Alfabetismo - Sistema de escrita que se baseia no alfabeto, opondo-se aos que são ideográficos.

Compacta - Comprimida, estreita

Analogia - Relação de correspondência ou de semelhança entre coisas e/ou pessoas distintas

Contemporâneos - Que se pode referir ao período que, convencionalmente, teve seu início com a Revolução Francesa.

Anatomia - Estudo da estrutura dos seres orgânicos através da dissecação, tendo em vista a forma e a disposição dos órgãos.

Contraste - O que sinaliza a oposição ou a distinção entre coisas ou pessoas, quando comparadas.

Ângulo - Sob certo ângulo, de certo ponto de vista.

Curvas - Curvas vem do verbo curvar. O mesmo que: acorcovas, alcatruzas, alombas, arcas, arqueias, corcovas.

Arquetípicas - Todo e qualquer tipo de padrão ou modelo; paradigma. Ascendente - Ascender. Parte das letras de caixa baixa que se estende acima da altura de x.

B

Barras - Parte interna da fonte, que é apresentada como, por exemplo, na letra E. Bitmap - Imagem formada geralmente por uma grelha. Retangular de pixels ou pontos de cor. Brochura - livro com pequenas dimensões revestido com capa de papel ou cartolina colado na lombada.

C

Caligrafia - Arte de bem apresentar as letras escritas; forma de letra.

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Código de Barras - Código construído por linhas negras, verticais, de espessuras variadas, colocados sobre produtos de consumo ou cartões magnéticos para identificação por meio de leitura ótica.

Caracteres - Termo referente a todos os símbolos tipográficos

D

Decifrar - Compreender o sentido de uma escrita desconhecida ou pouco legível: decifrar um manuscrito. Descendente - Parte das letras de caixa-baixa que se estende abaixo da linha de base, por exemplo, ‘g’ ‘j’ e ‘q’. Designer - Profissional do Design. Diagrama - Delineação; modo de representação feito através de gráficos, de esquemas, de linhas, de pontos: diagrama elétrico. Dilema - Circunstância árdua e de difícil resolução em que é necessário escolher entre duas opções contraditórias, contrárias ou insatisfatórias; escolha excessivamente difícil.


Display - Mostruário destinado a atrair a atenção do comprador.

E

Eixo - Linha imaginária ou concreta capaz de atravessar o centro de um corpo, possibilitando que algo ao gire ao seu redor.

comportamental própria de um indivíduo ou de um grupo de pessoas. Impressão Visual - Sensação; consequência da influência de alguma coisa sobre os sentidos. Impressoras – Máquina que executa a impressão.

Equilíbrio Visual - Força que age de maneira igual entre duas ou mais coisas.

Input - Falha.

Estêncil - Papel parafinado em que se escreve, datilografa ou desenha aquilo de que se pretende tirar cópias ao mimeógrafo.

Legibilidade - Característica ou particularidade do que é legível.

Evidenciar - Fazer com que fique claro (evidente). Excêntricas - Que se comporta de modo incomum ou esquisito; que não obedece aos padrões considerados normais; que pensa diferente da maioria.A

G

L

Legível - Que se consegue ler com facilidade; cuja clareza e/ou nitidez facilita a leitura. Leiturabilidade - se relaciona a quantidade de esforço que uma pessoa tem para ler um texto. Linguagem gráfica - A linguagem gráfica, é os elementos que fazem conjunto de dão unidade ao elemento.

Gestalt - Teoria de que a percepção emocional ou estética de uma obra não está ligada à interpretação do espectador, sendo inerente à sua forma e conteúdo.

Logotipo - Símbolo que, composto por uma imagem, pela estilização de uma letra ou pelo agrupamento de letras de modo a formar um design particular, serve para identificar uma empresa, marca, produto.

Haste - Parte fina e que alonga a fonte.

Paletas - Conjunto de cores.

Identificar - Fazer com que fique igual; tornar-se semelhante; igualar-se

Pixel - Qualquer dos mínimos elementos discretos que em conjunto constituem uma imagem.

H I

Idiossincráticas - Particularidade

P

Peso - Tamanho da espessura da fonte.

R

Retilíneos - Que segue a direção da linha reta.

S

Scanner - Aparelho ou mecanismo em que dados (imagens) são captados, codificados através de um feixe eletrônico, e podem ser reproduzidos em computador. Sensações Cinéticas - Ciência, que tem por objeto a extensão das forças consideradas nos movimentos variados que elas produzem. Serifa - Pequeno traço ou espessamento que remata, de um ou ambos os lados, os terminais das letras.

T

Tipografia - Processo de impressão, no qual se usam formas em relevo. Tipógrafos - Aquele que trabalha em serviços de tipografia (composição, paginação, impressão etc.).

U

Unidade - Qualidade do que é um ou único

V

Vanguarda - Movimento que apresenta conceitos novos e modernos, de conteúdo geralmente artístico: vanguarda modernista. Versalete - Tipografia Versal com a altura do tipo em caixa baixa.

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Bibliografia 154

Gomes, João F. Gestalt do Objeto: Sistema de Leitura Visual da Forma. 8ª ed. São Paulo: Escrituras Editora, 2008. Farias, Priscila L. Tipografia Digital – O impacto das novas tecnologias. 3ª edição. Rio de Janeiro: 2AB, 2001. Dondis, Donis A. Sintaxe da Linguagem Visual. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. Miguel, Marcelo G. Tipografia. A voz do texto: Uma abordagem das relações entre forma e vibração na construção de sentido na mídia impressa. Outubro de 2007. 269 páginas. Dissertação de Mestrado Universidade Estadual Paulista. Bauru-SP. Arquivo em pdf. Tellegen, Therese A. Gestalt e Grupos, Uma Perspectiva sistemática. Volume 22. São Paulo.Summus Editorial, 1984. Lupton, Ellen. Pensar com Tipos: Guia para Designers, Escritores, Editores e Estudantes. 2ª edição. São Paulo: Cosac Naify, 2013.


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