VA L E
VITRINE DO
AÇO
D O M I N G O , 8 / A G O S T O / 2 0 1 0 E - m a i l : vitrine@jornalvaledoaco.com.br Te l e f o n e : ( 3 1 ) 2 1 0 9 . 3 5 5 0
C U L T U R A
Vinícius Ferreira Estagiário Neste segundo domingo de agosto, o Brasil comemora, tradicionalmente, o dia dos pais. Filhos prestam suas homenagens das formas mais varia das, reúnem as famílias, dão presentes para os patriarcas e exaltam as qualidades e o amor que o pai tem desempenhado durante todos estes anos. O jornal VALE DO AÇO também presta as suas homenagens para todos os pais da região, contando a história de dois homens que tiveram que tomar toda a responsabilidade pela criação dos filhos.
&
V A R I E D A D E S
Pais completos HISTÓRIAS DE HOMENS QUE SE DEPARARAM COM A RESPONSABILIDADE DE SER PAI E MÃE DE SEUS FILHOS ARQUIVO DE FAMÍLIA
H
ilton Lopes Faria tem 53 anos, reside no bairro Bela Vista, em Ipatinga, e hoje vive uma vida tranqüila. Aposentado, mora sozinho na casa que já ficou por um bom tempo cheia de crianças, em uma rua onde considerava ter "amigos", e não somente vizinhos. Até o começo do ano de 1993, a vida de Hilton seguia como a de muitas outras pessoas. Casado com Marilene Ferreira de Souza Lopes, tinham quatro filhos, Raquel com 9 anos, Ricardo ia completar 13, Renata tinha 12 e o mais velho, Rogério, 14. No começo de 1993 a história desta família, e o papel deste pai no lar, foi tragicamente alterado. Em um acidente automobilístico, no dia 2 de janeiro, Marilene faleceu. Passado o luto de sua esposa, Hilton se viu responsável pela criação de quatro adolescentes. Ele trabalhava na Usiminas, era líder de grupo do setor de Laminação de Tiras à Quente, trabalhava sempre das 23h às 6h da manhã, e não sabia nada sobre o funcionamento do lar. Então, contando com a ajuda de Deus e dos amigos, como ele relata, decidiu aprender o que era necessário para educar seus filhos e
MESMO COM TODAS AS DIFICULDADES, Sr. Hilton conseguiu criar seus quatro filhos, que hoje estão adultos, quase todos casados, e já gerando netos para ele continuar o trabalho que a esposa havia começado. Segundo Hilton, o período após a tragédia foi o mais difícil. "Eu não tenho nada, nunca tive muito dinheiro, nem muito conhecimento, mas eu perderia tudo e iria morar debaixo da ponte se isto a trouxesse de volta. Mesmo com a dor, tinha que continuar, tinha que cuidar dos meus quatro filhos. O começo foi muito difícil, mas com a ajuda dos vizinhos, dos amigos, fomos caminhando. A minha grande preocupação era como eu iria criar estes meninos neste mundo, cheio de drogas, de maus caminhos.
Pedi forças a Deus e fui em frente. Dei muita sorte, eles foram ótimos filhos", diz Hilton. COMO CUIDAR DA CASA? Uma das coisas que mais deu trabalho foi aprender as responsabilidades do lar. "Eu não sabia fazer nada na cozinha, nada de casa. Não sabia como limpar, como fazer almoço, então fui aprender. Hoje eu sei tudo, mas na época, até aprender foi complicado. A TV me ajudou bastante. Fiquei muito tempo vendo estes programas de receitas pela manhã e tentava colocar em prática. No meu caso deu certo",
contou. A rotina de Hilton, por ter que cuidar dos filhos e trabalhar à noite era bem complicada, mas a compreensão dos chefes e o auxílio dos amigos ajudaram bastante. "Todo dia eu tinha que sair às 22h para trabalhar. Não podia deixar os meninos sozinhos em casa a noite inteira. Eles eram adolescentes, estavam crescendo já, mas mesmo assim ficava preocupado. Então, eu conversei com o meu superior e consegui um cartão que autorizava a minha saída da Usina durante a madrugada, para vir em casa e ver como as coisas estavam. Fazia isto em três horários, todos os dias. Subia as 00h para ver se eles já estavam dormindo, depois voltava as 03h para ver se tudo continuava em ordem, e vinha novamente as 05h para deixar o café da manhã pronto para eles. Eles só tinham que levantar, tomar o café e ir para aula", relembrou. COMO EDUCAR OS FILHOS? A situação em que Hilton se encontrava era complicada, teve uma educação do modo antigo, e não sabia como era o jeito certo de educar seus filhos. Procurou fazer da forma que ele achava melhor, usando a força do diálogo. "Repito isto muitas vezes, mas é a verdade. Deus me ajudou demais a lidar com tudo o que aconte-
ceu. Não sabia qual era a forma certa ou a errada de cuidar de um filho. Até hoje não sei com certeza, mas procurei fazer do jeito que eu achava melhor. Conversei demais com eles. O diálogo me ajudou a entendêlos. Até mesmo com as meninas, que tinham assuntos diferentes que na época eu ainda não tinha coragem de conversar, eu tive amigas que conversaram com elas e me ajudaram a educá-las. Se eu pudesse dar um conselho para os pais hoje é este: converse com seu filho. Mesmo antes desta lei do Lula, sobre as palmadas, eu entendi isto. Se palmada resolve-se eu seria uma jóia do tanto que eu apanhei quando criança", brincou Hilton. Uma das prioridades foi que os filhos estudassem o máximo que conseguissem. Dos seus esforços resultam as duas faculdades que as filhas já completaram. Os dois filhos também ingressaram no ensino superior, o mais velho somente começou, mas não quis terminar, enquanto o outro está a um ano de conseguir o diploma. "Deixei de fazer muita coisa para que todos eles estudassem, e isto é uma das coisas que me orgulho. Fiz o possível para pagar escola para eles". Hilton gosta de lembrar que o sucesso na criação se deve a Deus, e também aos seus filhos. "Eu tentei ser um bom pai, mesmo sem saber como deveria ser feito. Mas os meus filhos foram muito bons também, não me deram trabalho nenhum. Hoje moro sozinho aqui nesta casa, mas sempre que eles podem eles vem me visitar, e eu vou à casa deles. Três estão casados, moram em outras cidades, a outra mais nova mora na Capital, mas todos são homens e mulheres de caráter, que sabem trabalhar, se esforçar, que aprenderam a viver. Agora estou no momento de cuidar dos meus netinhos", lembra Hilton, que tem uma foto da neta mais nova, Thais, na área de trabalho de seu computador. A casa que antes era cheia de gente hoje é silenciosa, recebendo a visita de amigos, dos filhos, e dos dois netos, Antônio Junior e Taís Lopes Franco. Aliás, no nascimento da neta, Hilton foi o primeiro a pegá-la no colo. "Foi um fato engraçado, fui cuidar da minha
ANDRESSA MOREIRA
WALLACE VIVEU A EXPERIÊNCIA de cuidar da filha por um ano e agora pretende conseguir a guarda de Dávila
1-A filha até a Taís nascer. Os meus filhos eu vi pelo vidro do berçário, peguei eles um tempo depois. Desta vez foi diferente, a médica veio e entregou a Taís no meu colo, quase tive um treco. Fui o primeiro a pegá-la nos braços, minha netinha. Ali eu vi que fiz um bom trabalho como pai, mesmo com todas as dificuldades, com todos os problemas. Minha netinha linda estava nos meus braços", relembrou emocionado. UM PAI APRENDENDO A história de Wallace Godói é um pouco diferente da de Hilton. Wallace é músico, tem 26 anos, solteiro e mora no distrito de Melo Viana, em Coronel Fabriciano. Ele não sofreu nenhuma tragédia, nem a mãe de sua filha. Wallace é conhecido por seus amigos como Gugu, e tem uma filha de 5 anos, chamada Dávila Mariana. Em 2009, em virtude do trabalho da mãe da garota, que mora em Contagem, região Metropolitana de Belo Horizonte, ele se viu em uma nova situação: cuidar da filha em tempo integral. Isto iria mudar a sua rotina, a sua forma de viver e sua responsabilidade. Ele aceitou o desafio. Wallace sempre teve contato com a filha, mas cuidar dela em tempo integral era uma situação inédita: só ele e ela. Mas, nas palavras dele, foram anos dos quais ele não se arrependerá jamais. "Este ano em que vivi com a minha filha aqui, cuidando dela em tempo integral, foi muito bom. A presença dela aqui, as mudanças que eu tive que fazer na minha rotina para ficar com ela, repetiria tudo. Aliás, espero que a partir do próximo ano ela já passe a morar definitivamente aqui comigo, é o que eu mais quero", diz Wallace, que se prepara para tentar a guarda de Dávila. A pequena mocinha estava um pouco tímida durante a entrevista, mas mesmo assim mostrava um lindo sorriso quando estava junto de seu pai. Em meio aos gracejos e algumas outras brincadeirinhas de pai e filha, disse que gosta de ficar junto de Gugu. Wallace conta que o relacionamento deles é muito bom. "Até na questão da música a gente está se entendendo muito bem. Pego o violão e fico cantando para ela. Tanto MPB quanto músicas que ela me ajuda a inventar na hora", conta o pai, orgulhoso. READEQUAR O TEMPO O músico afirma que uma das maiores dificuldades que teve estava relacionada ao tempo que ele tinha disponível e aos cuidados que uma criança necessita. "Eu já moro sozinho há um bom tempo, e não tinha muitos problemas. Cuidar de mim mesmo é simples, fácil. Mas com a Dávila aqui a situação muda, ela é uma criança, é dependente de mim, foi isto que eu tive que aprender, a ser o pai que ela precisa, centrar bastante nas necessidades dela, dos cuidados que a presença dela aqui demanda. Administrar o tempo, levar para a escola, dar comida, todas estas coisas que fazem parte da rotina de uma casa. Tinha também um outro problema, relacionado ao meu trabalho. Como músico, me apresento na noite, e era necessário encontrar alguém para ficar com ela, mas hoje tudo já está organizado. Com ela aqui novamente, focarei mais nas aulas durante o dia, para poder cuidar mais ainda da minha filha", deseja Gugu. Segundo ele, não é tão complicado cuidar de uma criança. Exige uma disciplina nova, uma rotina diferente, mas é possível sim, e muito prazeroso. "Tenho certeza de que, em um lar com mãe e pai, é bem mais fácil cuidar de uma criança. Os dois juntos podem ser um suporte maior para ela, e como casal, podem ajudar ainda mais um ao outro. Mas acho que a dificuldade, tanto para o homem criar um filho sozinho quanto para a mulher é a mesma. E cada um sozinho também consegue dar uma boa educação ao filho. O mais importante de tudo é o carinho", finalizou o músico.